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DIARIO DO GOVERNO.

aquelle Estabelecimento, seria a segurança da subsistencia da Capital naquelle tempo muito precaria, mal que (louvado Deos) hoje não existe.

Quanto á Legislação do Terreiro, fonte donde o illustre Senador divisou outros argumentos para provar a insufficiencia ou mesmo a inutilidade do Parecer da Commissão, tambem isto me não parece satisfatorio. Disse o illustre Senador que o principio de toda a Legislação, ou da existencia e fundação do Terreiro, vinha do exclusivo daquelle Estabelecimento, isto é, daquelle pelo qual elle queria que em mais parte alguma se vendessem generos Cereaes senão no Terreiro, e que concorrendo para este fim todas as Leis do mesmo Estabelecimento, alterando uma só dellas se perdia esta harmonia, e que por tanto não era dado ao Legislador mudar um só artigo dessa Legislação sem fazer baquear lodo o systema della. Sr. Presidente, quando um systema é entre si ligado de tal maneira, que suas partes jogam inteiramente na dependencia umas das outras de sorte, que umas são consequencias das outras, e tirada uma se destroe infallivelmente o effeito da outra, eu então conheço que as partes deste systema não podem ser tocadas, sem derribar o systema; então será exacta a theoria porque uma vez destruida uma parte se destroem todas, mas, nem eu vejo essa harmonia na Legislação do Terreiro, nem vejo que o Parecer faça baquear tudo o mais que tiver relação com elle; por exemplo, dizia o Regimento do Terreiro = só no Terreiro se venderá trigo =, e dizia mais a respeito de vendagem, e a respeito de medida: fallava em numeristas, etc. etc. diz agora o Parecer da Commissão = venda-se trigo no Terreiro, e fóra delle. = Em que se altera com isto toda a Legislação do Terreiro, em que se prejudica a que fica existindo? Não fica subsistindo o Terreiro? Não ficam todas as Leis que dizem respeito a este Terreiro? Não ficam todos os objectos, a que ellas diziam respeito! A differença é que estas Leis não hão de vigorar, depois de certo ponto, senão para aquelles que trouxerem o seu trigo ao Terreiro, mas sómente para aquelles que lá o quizerem vender; em consequencia não fica desharmonisada a Legislação do Terreiro.

Disse mais o illustre Senador que o Terreiro não póde ser deposito; logo para que diz o Parecer da Commissão = será deposito publico = isto é, uma expressão inutil ou falsa. Digo eu: a Commissão não faz questão da palavra deposito, e muito mais se se quizer entender Por esta palavra que o Terreiro ha de conter todo o espaço necessario para receber dezeseis ou dezesete mil moios de trigo; mas terá o Terreiro por este Parecer menos capacidade do que antes tinha? Não se dizia elle edificado para contêr vinte mil moios de trigo, pelo Regimento, e deixava de se considerar. O deposito gera de Cereaes, porque os não podia conter? Creio que não. — Quando eu fallo como a Commissão fallou, entendo não só aquelle local, mas todos os depositos que estiverem debaixo da sua inspecção: eu agora hei de tirar uma differente conclusão; se o Terreiro até aqui não tinha a capacidade necessaria para armazenar todo o trigo, e se lhe chamava mercado exclusivo, e deposito geral, agora diga eu, que, elle está em melhor condição para se poder chamar deposito dos que o quizerem, porque o Parecer dá liberdade de cada um poder levar o seu trigo para casa, e então mais desembaraçado fie:» o Terreiro para guardar os generos daquelles que ía os quizerem ter, e melhor corresponde, ao que lhe chama a Commissão.

Diz mais o illustre Senador, que é da utilidade dos Lavradores a sua existencia, porque de hoje em diante não acharão as commodidades que achavam até aqui, e quererão vender o seu trigo, e não acharão quem lho compre; não posso conceber semelhante razão, confesso que tendo ouvido, minhas idéas ficam em surpreza; até aqui venda-se só no ferreiro, agora vende-se em toda a parte, e não achará o Lavrador quem lhe compre o genero; não achará o Lavrador comprador pelos muitos locaes em que o trigo se venda? Eu entendia que os Lavradores deviam achar mais facilidade pela multiplicidade dos logares de venda. — Se eu disser, = eu não quero que se venda azeite se não em um ponto; e se outro disser = nada, venda-se por toda a parte, poderá algum productor deste genero julgar-me mais seu favorecedor, do que aquelle que em toda a parte expunha ao publico o seu genero? Dizer que haverá menos quem compre porque ha mais quem renda? Contradição exquisita, opposta ao bom senso, e á ordem das cousas. — Agora quanto á facilidade que parecia ser o melhor argumento; quanto á facilidade de o armazenar que o Lavrador encontra em Lisboa quando traz o seu genero; eu concordo, porque um Lavrador gostará de achar um local aonde pôr o seu trigo para o vendar: mas não teve a Commissão esta mesma idéa? Não providenciou ella tudo, para evitar este inconveniente? Quiz conservar a liberdade de Commercio compativel com as circumstancias do Lavrador, com o bem, e prosperidade da agricultura, mas attendendo igualmente á fiscalisação: logo não se nos póde fazer esta arguição sem injustiça. O Terreiro Publico lá está, lá tem as portas abertos, alli póde o Lavrador encontrar quem se lhe encarregue do seu trigo, quem lhe responda por elle, tanto nós não quizemos destruir suas commodidades, lá está a medida, nós quizemos conserva-la alli para o pagamento dos direitos, a fim de melhor provêr á fiscalisação. Em consequencia, por este lado não vejo que se possa pôr de melhor condição o Lavrador, ou o Negociante, quem quer deposita alli, quem não quer leva para sua casa. Ora, era possivel que o nobre Senador entendesse que o Lavrador ficaria de melhor condição não podendo receber sobre os seus generos algum dinheiro se o precisasse; eu não sei o que o nobre Senador teve em vista, quando usou do argumento que eu tenho refutado, mas deve ficar som susto, porque elle tem as mesmas vantagens que tinha a este respeito.

Outra razão do nobre Senador, é que o Marquez de Pombal tinha lá em Oeiras uma Obra que o illustre Senador leu, e que lhe indicara o motivo da creação do Terreiro, e a sua necessidade, e agora já a razão das vendedeiras, que no principio assignou por causa, fica em minoria; foi um exemplo que elle tirou da Suissa, porque nas suas viagens tinha visto alli um estabelecimento destes, concebeu a idéa de fazer um igual em Portugal; essa foi a razão, essa sim, essa era digna do grande Legislador; um Paiz que como nós carecia dos generos de primeira necessidade produzindo poucos Cereaes, tinha necessidade de um Estabelecimento que lhe assegurava a sua existencias e elle o transplantou para cá por identidade de circumstancias; esta razão foi fortissima para o Marquez de Pombal; mas se elle existisse hoje, e visse todos os depositos entulhados de Cereaes sem haver quem os queira, se visse uma tal producção de generos que já não é possivel consumir no nosso Paiz, não queria tal Estabelecimento, elle o julgaria desnecessario, se o não suppozesse nocivo. — É a para conservar, e para dividir, dizia o distico ou legenda desse portico, porque o Orador de tudo tirou argumentos; pois bem, é dahi mesmo que eu os tirarei, para mostrar a desnecessidade do Terreiro qual existe. Quando ha muita abundancia não se tem muito cuidado de conservar, nem muita precisão; e quando superabunda pouca difficuldade ha para repartir; os Suissos queriam conservar, porque receiavam não ter, e queriam ter um modo, e um meio de repartir para lhes chegar, e que escassamente tinham; e estas razões, que eram as nossas, que foram as do Marquez de Pombal acabaram cá.

Outra razão do illustre Senador, a mais forte á primeira vista, mas que me parece não vale mais que aquellas que tem produzido para conservar as cousas no estado em que estão, é a sanidade dos generos. — Sr. Presidente, não ha nada na Sociedade mais transcendente do que a saude publica; a Sociedade é feita para os homens vivos, e não para os defunctos; se a vida, e a saude dos homens não occupasse o Legislador, o que o occuparia? Em consequencia, tudo o que fôr conducente a conservar a saude, é transcendente; mas pergunto eu, não ficam conservados para isso os necessarios meios? Ficam todos, e não vejo nenhum destruido; é preciso vêr que cinco homens reunidos que têem uma razão, e um coração que palpita pelo bem publico, deixariam de ter isto em vista. Qual é a razão por que se marcaram tres porias para entrar a farinha? Esta foi uma das razões; todo o trigo vai do Terreiro, todo o trigo ha de ser alli medido, e então não podem os Regimentos do Terreiro ser proficuos a este respeito? As farinhas admittem muito mais vicio do que o trigo; neste, depois de desfeito, é muito mais difficultoso conhecer o defeito: ora pergunto eu, haverá nada mais facil do que levar do Terreiro com guia um meio detrito bom, e introduzir um meio de farinha avariada. Eu creio que não haverá nada mais facil; e entendendo tambem que agora haverá muito mais garantias do que até aqui, porque era assim que se fazia: as providencias porém que houvessem para evitar este mal todas ficam intactas.

Sr. Presidente, ainda que talvez não fôsse este o logar, por que estâmos na generalidade do Projecto; com tudo como o nobre Senador se fez cargo de tractar da estiva; eu me farei tambem de lhe responder. — Com effeito, se a Commissão tivesse adoptado o principio invariavel, no qual não podesse influir circumstancia alguma da liberdade absoluta do commercio, sem respeito a conveniencias sociaes, o nobre Senador teria razão de tachar a Commissão de contradictoria; mas a Commissão não julga que é preciso seguir invariavelmente, sem a menor quebra, um qualquer principio por mais luminoso que este possa julgar-se: a liberdade de commercio é um principio luminoso, mas a liberdade de commercio bem entendida, com referencia ás circumstancias de qualquer Paiz, ou mesmo de qualquer Cidade; a mim parece-me que não será difficil mostrar, que esta liberdade para os Lavradores e Negociantes, no caso em questão é prejudicial, e aproveita unicamente aos padeiros com grave prejuizo de todos. Como se ha de esperar, que os Lavradores de differentes municipios, que pela maior parte senão viram, nem ouviram uns aos outros para fazerem um monopolio de trigo, elles que quasi se não conhecem Elles que vendem por antecipações o seu trigo, porque andam sempre em mingoa de dinheiro, como se póde pensar, que elles se colliguem para sustentar preço ao seu genero? — Vejamos agora que differença fazem os padeiros dos Lavradores. Os Lavradores estão espalhados por um grande territorio; e os padeiros vivem dentro do recinto d'esta Cidade, ou quando muito em um pequeno raio fóra d'ella, aonde todos os dias lêem a ordem do dia -(Algumas vozes: — Isso é impossivel.) Impossivel não ha nada n'este mundo na ordem moral — Demais, Sr. Presidente, como existe o effeito, a causa ha de tambem existir necessariamente: o trigo barato, o pão caro, ou mais caro comparativamente, não póde ter outra origem. Lembra-me que quando em 1834 e 1835 se vender o trigo a 800 réis, e amais, não se vendia então o arratel de pão, por mais de dois vintens; a hoje que estão os padeiros comprando trigo a tres tostões, e a dezeseis vintens, vende-se o pão a trinta réis! Note-se porém a grande differença que ha entre o preço por que o compram: e aquelle por que o vendem, e indague-se a razão disso, e conhecer-se-ha depois que essa theoria só vinha a ser util aos padeiros, e prejudicial para todas as outras classes da Sociedade. — Mas, disse um illustre Senador como póde haver Estiva, se está destruido o mercado? (E forneceu-me um mappa para eu vêr, e para saber que para haver Estiva, era necessario saber o estado do mercado). Pouca idéa tinha eu do que era Estiva, mas até aqui já eu chegava; isto é, que o preço do pão cozido havia de ser regulado pelo estado do grao no mercado: e creio que é d'aqui que a palavra Estiva tira a sua ethymologia. E se nós conservamos o mercado publico no Terreiro para os generos Cereaes, como é que se diz que se extingue? Além de que, para a Camara saber a como se vendia o grao não era necessario Terreiro; em Lisboa sabe-se o preço de tudo sem mercado exclusivo de nada. Não se extingue, Sr. Presidente, o Terreiro Publico fica, e lá ha de haver necessariamente, e sempre, o maior mercado de trigo; por que, como já disse, o Lavrador que aqui não tem relações nem casa, não quererá por certo alugar um armazem para recolher o seu trigo; e por isso não deixará por certo de preferir antes o leva-lo ao Terreiro para alli o depositar. Não me parece pois que tal argumento se possa produzir com vantagem contra a Estiva. (Apoiados.)

Por ultimo, apresentou o illustre Senador um argumento, com o qual quiz mostrar que o Terreiro deve ficar como está, por que tem a seu favor a antiguidade (razão esta a que eu já respondi), e que além disso tam tambem as sympathias de muitos proprietarios, e lavradores. — Sr. Presidente, até aqui não está o illustre Senador de melhor partido do que eu estou; por que, se por um lado ha muito quem o quer, pelo outro lado tambem ha muito quem o não queira; e eu não posso conhecer que a maioria de razões tenham uns sobre os outros. — Concluo pois dizendo, que eu de bom grado me sujeitarei ao que a Camara assentar ser o melhor, por que nada mais desejo que acertar.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Sr. Presidente, é necessaria uma medida Legislativa que ponha termo aos abusos e vexames que actualmente se