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DIARIO DO GOVERNO.

praticam, no Terreiro Publico, maximé depois da ultima Legislação ou refórma, é questão que ninguem poderá pôr em duvida. (Apoiados.) A minha posição especial nesta discussão é por certo muito desvantajosa, porque tenho que contender com Oradores abalisados, que possuem vastos conhecimentos sobre a materia, e que além disto são ha muitos annos meus particulares amigos: farei todavia diligencia para pôr a questão nos seus verdadeiros termos, porque me parece que ella ainda não foi encarada pelo lado por que o devia ser.

Sr. Presidente, tem-se dito, e apregoado, não sei com que fundamento, que eu desejo a extincção do Terreiro Publico; porém isso não é verdade. Eu reconheço que o Terreiro, nas actuaes circumstancias, nem é util, nem é necessario; e todavia não desejo a sua extincção; o que desejo é extirpar-lhe os abusos porque seio grandes, e intoleraveis. Desejo que se façam as reformas, e as economias; mas que se façam com juizo, e prudencia, para que o remedio não seja pior do que o mal. Nem permitia Deos, que eu profira no sanctuario das Leis palavra alguma que leve as lagrimas ou a consternação ao centro de alguma familia. Se porém os illustres Senadores que pugnam pela conservação do Terreiro, o quizerem com os abusos e odioso que elle tem, então eu direi que são elles, e não eu, quem concorre para a extincção do Terreiro. (Apoiados.) — Não me farei cargo de refutar circumstanciadamente os argumentos do primeiro Orador que abrio a discussão, e de quem eu me honro de ser particular amigo, não só porque em parte já o foram, mas tambem porque não tinham muita relação com, a materia sujeita. A questão, Sr. Presidente, reduz-se ao seguinte: — Será util o Terreiro Publico nas circumstancias actuaes? Concorrerá elle para augmentar a Agricultura? Evitará elle á introducção de generos Cereaes Estrangeiros? Eu creio que nenhum dêstes fins preenche; e se alguem me demonstrar que da maneira que o Terreiro está constituido os preenche, ou satisfaz, eu serei o primeiro á mudar de opinião; mas creio que não poderão provar.

Sr. Presidente, nem a Legislação actual, nem as providencias consignadas no Parecer da Commissão pódem conseguir que o Terreiro satisfaça ao que é impossivel; porque contra factos não ha argumentos. Eis-aqui está o Orçamento do Terreiro Publico, o qual não direi que é falso, mas posso affirmar que em parte é illusorio; porque a receita figurada nesse Orçamento é tirada do termo medio dos ultimos tres annos: — diz elle o seguinte: (leu). Já se vê pois que estando absolutamente prohibida a entrada dos Cereaes Estrangeiros, é impossivel a receita destes 38 contos que dellas se esperavam; e então já se vê que em logar de haver um saido, existirá um deficit. A vista disto como poderá o Terreiro applicar dinheiro para Estradas, ou para emprestar aos Lavradores? Não é possivel (Apoiados.) Está provado pois que o Terreiro Publico não serve para beneficiar a Agricultura; nem para evitar a introducção dos Cereaes Estrangeiros, por contrabando; e muito menos para emprestar dinheiro aos Lavradores, ou para applicar algum ás Estradas: e tudo isto porque, Sr. Presidente? Porque não tem dinheiro! De tudo isto se conclue, que o Terreiro hoje serve unicamente para cobrar esses miseraveis e oppressivos impostos!

Vamos agora vêr o que no Terreiro se pratica, e depois não será muito difficultoso demonstrar que a continuação do Terreiro é mais nociva aos Lavradores, do que util. (Apoiados) Sr. Presidente, no Terreiro exigem-se 30 réis por alqueire como direito, ou imposição, e nisto creio eu que ha má intelligencia; porque imposição legal não conheço eu outra senão a de 11) réis em alqueire applicada para a Junta do Credito Publico pela Lei de 31 de Março de 1827, porque os 20 réis de vendagem só os devia pagar quem vendesse dentro do Terreiro; mas eu para conciliar vontades, e obter algum bem para o Publico, não vou fóra de que se continuem a pagar esses 30 réis pelos generos Cereaes que entrarem pelas portas da Cidade: além disto paga-se mais o seguinte, a titulo de braçagens, e outras alcavalas, que anda por 780 rs. em moio; e que junto ao valôr dos dois alqueires que tambem se perdem em moio pela differença da medida da Fanga, por que entram os generos, e á do alqueire vem a dar uns quinze e meio por cento contra o Lavrador, e o consumidor; accrescendo demais a mais as despezas da conducção em barcos, carros, bestas, e outros incommodos, sem que esqueça a perda de dois ou de tres dias que os conductores alli perdem; o que reunido tudo dá, a meu vêr, um prejuizo para o Lavrador, de metade talvez do custo primitivo do genero.

Agora, Sr. Presidente, aproveitarei a occasião de estar aqui presente o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, para pedir a S. Ex.ª que queira ter a bondade de nos mandar ornais breve possivel uma nota que declare a quantidade, e qualidade dos generos Cereaes entrados mensalmente pelas portas da Cidade, desde a promulgação dos Decretos de 12 de Julho, e 4 de Agosto de 1838, bem como a importancia dos direitos por elles recebidos; porque eu estou persuadido que talvez a importancia desses chamados direitos não chegue 4:800$000 réis, para pagar aos empregados que se crearam de novo para fazer essa fiscalisação ás portas.

Já se vê, pois, que nesta parte não posso concordar com as idéas do primeiro illustre Senador que abrio a discussão, o que ainda acho inefficazes as providencias corridas no Projecto da Commissão. Os Lavradores do Termo de Lisboa, fazem muito maiores despezas com a cultura e custeio da Lavoura de suas terras, do que os da maior parte das Provincias do Reino. Atites da promulgação dos Decretos de 12 de Julho, e 4 de Agosto de 1838, não pagavam cousa alguma os generos Cereaes que entravam pelas portas da Cidade, nem eram sujeitos ás alcavalas a que hoje estão, a titulo de Companhias, armazens, saccaria, etc.; e alguma razão poderosa deveria haver para se conservar esta pratica por tantos annos. Nem se diga que as oppressivas providencias contidas naquelles Decretos, vieram igualar a condição dos Lavradores do Além-Téjo com os do Termo, porque essa razão não colhe. Os generos Cereaes produzidos fóra do Termo de Lisboa, são conduzidos para a Cidade por agua, quando os elo Termo são conduzidos em carros, e cavalgaduras, que fazem uma despeza immensa; e eu desejo que a Lei proteja a todos com igualdade relativa, e não absoluta, porque isso é impossivel. E demais, que direito terão os Lavradores para imporem aos consumidores da Capital a obrigação de comerem o Pão pelo preço que a elles lhes convier vender-lho?.. Eu não o conheço, nem o admittirei jámais. O interesse dos Lavradores consiste em que haja quem lhes consuma a maior quantidade possivel dos generos que produzem; e pelo que respeita aos preços, a abundancia, ou a escassez dos generos é que os hão de determinar, e não as manobras indirectas e violentas do Terreiro; o contrario do que digo seria violento, ou conceder um privilegio aos productores agricolas, á custa dos outros productores de industria, ou dos consumidores, o que seria injusto, e prejudicial á prosperidade geral da Nação que todos devemos desejar. Repito outra vez, que o unico meio de conservar o Terreiro Publico, é torna-lo menos odioso, ou toleravel, quero dizer, é determinar que os conductores dos generos paguem ás portas as imposições estabelecidas, que não são pequenas, e que depois tenham a liberdade de levarem os generos para onde quizerem, sem terem obrigação de os levarem ao Terreiro. Objecta-se, porem, a isto dizendo: e como ha de o Terreiro verificar qual é a verdadeira quantidade de generos Cereaes que existem na Capital? Ao que eu respondo: e que tem o Terreiro com isso? Que utilidade teem os Lavradores, ou os consumidores, com esse conhecimento que tanto se inculca? Nenhuma.

Se houver falta de generos Cereaes na Capital (o que é moralmente impossivel) póde o Terreiro obrigar alguem a que os traga aqui por força? Não. Quem os ha de trazer ha de ser o Commercio, que, conhecendo os seus interesses melhor que as authoridades do Terreiro, está sempre alerta para saber aonde ha falta, e aproveitar a occasião de melhorar os seus interesses, porque é esse o seu officio. Desenganemo-nos, Srs. ninguem é melhor Juiz em materias taes, do que os productores e os consumidores; os primeiros hão de empenhar-se em vender pelo mais que poderem; e os segundos em comprar pelo menos que lhes fôr possivel: deixemo-nos por tanto a uns e outros ampla liberdade para regularem as suas transacções, ou permutações; porque o contrario será um ataque ao direito de propriedade garantido pela Constituição.

Disse alguem que não sendo a venda dos generos Cereaes, exclusivamente feita no Terreiro, poderia havei monopolio, pelo conloio dos Negociantes que traficara nestes generos. Sr. Presidente, confesso a V. Ex.ª que me admirou ouvir proferir nesta Assembléa tão grande absurdo Monopolio, a ser possivel have-lo, só poderia existir vendendo-se os generos exclusivamente em um local determinado; e não sendo livre a todos a compra e venda, como eu desejo que o seja. Quando ha abundancia de generos, como acontece com os Cereaes, e ha liberdade ampla de comprar e vender, ha sempre mais quem offereça do que quem procure; e se ha algum meio conhecido de evitar Monopolios, é este.

No estado de prosperidade a que felizmente tem chegado a Agricultura Nacional, pela abundancia dos productos, o que convém aos Lavradores é estender o consumo, e procurar novos mercados aonde se levem esses generos por preços commodos. Este anno deparou o acaso um em Inglaterra que deveria ser aproveitado com todo o cuidado e empenho, enviando-se áquelle Paiz Estrangeiro os generos Cereaes da melhor qualidade que houvesse em Portugal, e por um preço razoavel, ainda mesmo que os especuladores ganhassem pouco, ou cobrissem só as suas despezas. Porém que succedeu? Envergonho-me de o referir como Portuguez, mas não posso deixar de o declarar como Legislador. Esses especuladores, dominados pela avareza, e desconhecendo os seus verdadeiros interêsses, mandaram para Inglaterra os peiores trigos em qualidade, o demais a mais sem os mandarem limpar, separando-lhes a grande quantidade de impuridades que de ordinario tem os generos de Sanefa em Portugal. O resultado foi, como era natural, perderem os especuladores Inglezes que manaram ir generos Cereaes de Portugal, e perder-se, talvez para sempre, aquelle mercado, que tão util poderia ser á Agricultura Nacional. Na presença dêste facto recente, e de muitos outros analogos, como querem os Lavradores e os Negociantes que o Corpo Legislativo, ou o Governo suppram por meio de Leis injustas e oppressivas a sua ignorancia, ou avareza? Isso não póde ser.

O que succedeu este anno com os generos Cereaes, succede ha mais alguns com os vinhos do Douro (a que geralmente se chamam do Porto.) Aboliu-se a Companhia (e ainda bem), e todos ficaram com liberdade de expoliar vinhos para os mercados de Inglaterra. Em vez de levarem alli os vinhos mais generosos, e vende-los como taes; procuraram enganar os consumidores, vendendo-lhes vinhos ordinarios por vinhos generosos; e a final os enganados têem sido aquelles que obraram de má fé, dominados pela avareza; sem se lembrarem que o unico Juiz, no preço dos generos, é o consumidor, e que sendo este enganado uma vez, foge de quem o enganou procurando tractar com diversas pessoas. Eis aqui o que tem arruinado o Commercio dos vinhos; e agora pedem alguns Lavradores a resurreição da Companhia, cuidando que ahi está o remedio para seus males; quando aliàs elles e os Negociantes pouco sincero é que são os culpados.

Resumindo pois o meu discurso, que já vai longo de mais, direi que o Projecto da Commissão deve ser admitido na sua generalidade, sem que com isto eu o approve em Lodos os seus Artigos, porque alguns delles hei de combater. Por esta fórma tenho motivado o meu voto, e peço desculpa á Camara por ter abusado da sua paciencia por tão longo espaço de tempo.

O Sr. Barão do Tojal: — Eu sempre farei algumas observações sobre a generalidade do Projecto. Apoio inteiramente as idéas do meu illustre amigo o Sr. Miranda; e as do Sr. Luiz José Ribeiro: póde ser que ainda não esteja chegada a occasião de abolir de lodo o Terreiro Publico; mas espero ao menos que este seja o primeiro choque para sua extincção final.

Eu tenho existido a maior parte da minha vida era Paizes aonde se não toleram monopolios, e aonde comtudo prospera o commercio, e a agricultura muito mais, sem comparação, que entre nós, sem que para isso se julgue preciso ampara-los com alcavalas. Do estabelecimento e existencia do Terreiro Publico, não tem, na minha opinião, resultado senão effeitos contra-producentes e ruinosos, tanto aos interesses da Agricultura como nos dos consumidores, e do Commercio em geral. O Terreiro Publico para hoje satisfazer a fins uteis, era necessario que tivesse um capital consideravel e efficaz, que não possue, para como um Banco agricolo ou rural, podesse sempre adiantar aos Lavradores que viessem alli depozitar os seus generos, até dous terços do provavel liquido del-