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DIARIO DO GOVERNO.

tributos: devendo concluir-se tambem que tal classe de despeza não pôde ser sujeita a operações de Credito sem grandes inconvenientes para o Serviço Publico; e as razões são obvias. A despeza extraordinaria póde ser considerada diversamente, apesar de ser menos sujeita a reduções periodicas.

Qual é o fim principal por que os povos são collectados com impostos annualmente? Para decorrer com promptidão ás precisões quotidianas dos individuos que fazem o serviço corrente e ordinario do Estado. E quem são esses individuos? É o Exercito, do qual depende a tranquilidade publica, e a segurança interna e externa do paiz; é a Armada naval, porque della depende a segurança das nossas colonias, é a protecção devida ao commercio; e a Magistratura, porque della depende a imparcial administração da justiça; é a Administração Geral é Fiscal, a Diplomacia, a Instrucção Publica, etc. etc. porque de todas essas classes depende a ordem social. E dirá alguem que com os vencimentos destas classes se podem fazer operações de credito com prejuizo dos interessados, sem offensa da justiça e da moral? Eu creio que não.

Já que tenho abusado da paciencia da Calmara, talvez fóra de tempo, direi tambem alguma cousa sobre o conceito que eu formo do Orçamento, e por conseguinte sobre os resultados que da sua discussão se poderão tirar.

A despeza total orçada sobe a 11:800 e tantos contos de réis, em que se comprehendem 5:300 e tantos contos de réis de Despesa extraordinaria, que pela sua natureza não poderá soffrer redacções, como a discussão mostrará; e detrahindo esta somma da Despeza total, ficarão 6:400 e tantos contos de réis para provêr á Despesa ordinaria e corrente do Estado. Sendo certo que é nesta somma que poderão ter logar as reformas, ou economias com que se pertende atenuar o Deficit annual, e montando este, aproximadamente, a 2:300 contos de réis, se fôr deduzido de 6:400, ficarão 4:100 contos de réis: e dirá alguem que com uma tal quantia se poderá provêr ao pagamento annual de toda a Despeza corrente e ordinaria da Estado? Eu digo que não, e a experiencia o demonstrará. Então qual será o centro das Repartições aonde se devem levar as economias e as reformas até desapparecer o Deficit? Eu não o vejo, e fico esperando que alguem me aponte palpavelmente. Sr. Presidente, eu dei-me ao trabalho de investigar os jactos, que acabo de expender em resumo, e que a seu tempo apresentarei mais detalhadamente para ver se sahimos do vago dos palavrões e logares commmuns, porque é o peior terreno, em que póde marchar quem tem assento nas Cortês. Os povos dão grande importancia, e com razão, a tudo quanto se profere no Parlamento; mas em vendo que aqui se procede em leviandade, e que se referem os factos com inexactidão, os Representantes da Nação perderão a força moral, e serão desacreditados; e isso não desejaria eu (Apoiados).

Quando o Orçamento se discutir, o que eu muito desejo, haverá occasião demonstrar d'um modo incontroverso, que o pessoal do Serviço Publico em Portugal não absorve o que muita gente pensa, e geralmente se apregoa. Ver-se-ha então que ha um numero demasiado de Empregados, pelo furor de estar sempre a despachar gente, e que a maior parte delles recebem pagas miseraveis, que os obrigam a morrer de fome, ou a fazerem uma figura triste e despresivel; ver-se-ha finalmente que a mão mais desapiedado e terrivel não é capaz de diminuir 300 contos de réis na despeza do pessoal, sem prejuizo do serviço, e sem recrutar um exercito de desgraçados d'onde deve concluir-se em rigorosa analyse que o mal está em outra parte, e que o remedio radical deve ser outro.

É necessario estabelecer os principios solidos e permanentes da organisação social, e sahirmos do estado provisorio e indeciso, que é o peior de todos os estados; é por essa fórma, e só por ella, que o tempo nos póde levar o campo das economias reaes. Um genio emprehendedor, prudente e vigoroso, é que nos póde salvar da crise que nos ameaça, sendo coadjuvado sincera e lealmente pelas luzes e lealdade de todos os bons Portuguezes.

Como primeira providencia julgo eu necessario que se estabeleçam quanto antes os quadros permanentes não só do Exercito, e Armada mas de todas as Repartições Publicas do Estado; e estejam todos certos que em quanto se não der esse grande passo nada teremos feito (Apoiado). Bem sei eu que o Exercito tem mais do dobro dos Officiaes que precisa; que a Marinha está no mesmo caso; e que a uma grande parte das Repartições succede o mesmo, proporções guardadas; mas é por essa mesma causa, e para evitar a repetição de taes abusos no futuro, que a medida é de absoluta necessidade. Nem se diga que os seus effeitos serão morosos ou dilatados, porque o tempo é um devorador constante da especie humana, e que nem se descuida, nem dá satisfações do que faz. Eu tenho um documento de facto que produzir em abono da doutrina que tenho expendido, que alguma cousa pôde provar. Ainda não ha quatro annos completos que Sua Magestade me honrou com a sua confiança, nomeando-me Commissario em Chefe do Exercito naquella época achei eu a Repartição sobrecarregada com 344 Empregados, e tendo fallecido muitos, e sido demittidos outros por causas justas, eu não tenho admittido nenhum de novo, apesar dos muitos empenhos, ha hoje 106 Empregados de menos; e se a Repartição continuar, e se adoptar a mesma regra, haverá dentro de dous ou tres annos só o numero absolutamente necessario. Adoptando-se esta grande providencia, não terão os Ministros occasião de abusar, nem de serem censurados, não veremos um Exercito de Officiaes Militares desnecessarios, morrendo de fome, sem terem dado causa á sua penosa situação; não veremos uma Legião de Empregados benemeritos aposentados, ou pertencentes a Repartições extinctas, fazendo uma grande despeza (e morrendo de fome!) para darem logar á entrada d'um enxame de rapazes, entre os quaes ha alguns de prestimo, e que dão grandes esperanças, mas tambem ha muitos que nada sabem fazer, nem copiar bem (apoiados repetidos). Eis-aqui porque não ha dinheiro que chegue, é porque pouco bom serviço apparece feito.

Voltando outra vez á questão das finanças, ou dos meios, direi: que sendo de rigorosa justiça reconhecer todas as dividas por que a nação é responsavel, qualquer que seja a época em que foram contrahidas, porque a Nação não morre; e sendo igualmente justo applicar meios para o seu pagamento, todavia pedem esses mesmos principios de justiça que se principie por pagar aquellas que foram especialmente contrahidas para restaurar as Patrias Liberdades, e resgatar o Throno da RAINHA das garras do Usurpador. Eis-aqui a razão porque eu desejo que venham os esclarecimentos do Governo com a distincção exigida.

Não sendo o estado de nossas finanças muito lisongeiro, tambem o não considero tão desesperado como por ahi se tem apregoado, talvez de boa fé, mas de certo com pouca reflexão, e menos prudencia. Nós temos dous annos de decimas e impostos annexos, vencidos, e por cobrar, que são os de 1837—1838, e 1838—1839; os quaes eu avalio, muito favoravelmente, em 3:600 contos de réis; temos além disso 5:000 e tantos contos de réis de dividas activas por cobrar, como consta do Mappa n.° 19 annexo ao Relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, as quaes, por muito mal paradas que se considerem, sempre produzirão 1:000 contos de réis effectivos.; e aqui ternos nós, pelo menos, 4:600 contos de réis de imposições vencidas, e realisaveis, em mais ou menos tempo. Eu não supponho que a Companhia Confiança seja neste momento credora ao Thesouro por mais de 1:600 contos de réis, e detrahindo este da somma disponivel, ficarão livres, e á disposição do Governo 3:000 contos de réis. Destes 3:000 contos de réis, 1:800 em que avalio a decima e impostos annexos do anuo financeiro, que acaba em 30 de Junho corrente, estão livres e desembaraçados, sem estarem sujeitos a obrigação alguma; e não ha dúvida em poder o Governo representar esta quantia por quaesquer titulos, que sejam recebidos, sem grande difficuldade, e talvez com pouco ou nenhum prejuizo. Por este meio se pagarão as dividas que mais urgem, e a quem melhor direito tem a ser embolçado, e quando a Companhia Confiança fôr integralmente paga pelos rendimentos, que lhe estão especialmente hypothecados, que são os vencidos até 30 de Junho de 1838, poderá o excedente desses rendimentos, que ha de ser grande, applicar-se para pagamento das dividas atrazadas pertencentes a classes não activas, que pela maior parte estão em poder de especuladores, que as compraram por 18 ou 20, e nenhuma injustiça se lhes faz diffirindo-se-lhes o pagamento, preferindo as classes activas.

Eu não supponho a divida, que exige prompto pagamento, tão avultada como alguem a considera; são muitos os credores, mas a uma grande parte delles devem-se-lhes pequenas quantias.

Muitos outros recursos ha, que eu não aponto agora, e que todavia são d'algum vulto; e de tudo concluo eu que o nosso estado de finanças está mais desordenado do que desesperado.

Peço perdão á Camara por ter sido tão extenso n'uma questão accidental, que me levou inconsideradamente a fallar fóra de tempo e logar; mas a materia era tão importante, e eu estou tão acostumado a ser tractado com indulgencia, que espero que V. Ex.ª e a Camara relevarão qualquer excesso que da minha parte pareça ter havido.

Rogo por tanto a V. Ex.ª queira pôr á votação da Camara o meu requerimento, independente do illustre Senador que me precedeu a fallar, porque entre um e outro ha grande differença, como S. Ex.ª ha de reconhecer; desejando que no officio, que se expedir ao Governo, se lhe recommende que não podendo satisfazer a tudo d'uma vez, vá remettendo o que tiver mais prompto, a fim de que a Camara, e a Commissão de Fazenda, a quo tenho a honra de pertencer, possa estar habilitada para entrar na questão com o possivel conhecimento de causa, quando ella aqui chegar depois de passar na Camara dos Deputados.

O Sr. Miranda: — Não é a primeira vez que eu tenha examinado os Orçamentos da receita e despeza; alguma prática tenho desta materia como membro que fui dos Corpos Legislativos não só durante as Côrtes das Necessidades, mas igualmente durante as Camaras de 1826 a 28, e de 1834 a 1836. Era costume quando se enviavam os Orçamentos virem acompanhados de todos os esclarecimentos relativos ás suas differentes verbas; e assim as Commissões entravam facilmente no conhecimento dos promenores de cada uma d'ellas: deste modo podia saber-se com toda a precisão qual era a classe e natureza dos diversos pagamentos, etc. etc. Porém desde 1833 para cá perdeu-se este costume, e até agora não tem sido reclamado pelas Camaras. Eis aqui porque não só para esta verba, mas para todas eu pediria que o Governo remetta todos os documentos. Isto que eu digo não é novo; porque sempre vieram os Orçamentos ás Camaras acompanhados de todos os documentos, que comprovam as suas verbas, e eu hei de instar para que assim se faça para illustração das Camaras. Por agora, attendendo a que o Sr. Ministro da Fazenda póde das as informações que dezejo, eu desisto da minha petição, porque talvez se entenda que ella póde demorar as informações que pede o meu collega, e que entram na conta das que eu pedia.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Sr. Presidente: — Eu pedi a palavra a V. Ex.ª para dar uma explicação, que julgo de absoluta necessidade, paras, Camara conhecer d'um modo indubitavel que não convém confundir com o meu requerimento aquillo que posteriormente indicou o illustre Senador que acabe de fallar.

S. Ex.ª ao tempo em que eu pedi a palavra, pareceu impugnar com anticipação ò que eu teria a dizer, antes de me ouvir. Isto tem realmente alguma cousa de novidade; e posto que eu reconheça os abalisados talentos do illustre orador, não posso todavia conceder-lhe a faculdade de adivinhar os meus pensamentos. Sei muito bem que o zêlo pelo bem publico nos arrebata algumas vezes, conduzindo-nos a dizer o que não desejamos; e por isso confio em que S. Ex.ª me achará razão.

Os esclarecimentos que o illustre Senador pede não nos podem explicar cousa alguma além do dia 30 de Julho de 1838, por ser aquelle a que se refere o mappa n.° 30 annexo ao Relatorio do Ex.mo Sr. Ministro da Fazenda; e o que eu peço propõem-se a saber o estado dos pagamentos até 31 de Maio ultimo; e então já se vê que os esclarecimentos que pede o illustre Senador, posto que de muita utilidade sejam, como eu reconheço, não podem servir para o que eu dezejo; porque do primeiro de Janeiro deste anno em diante deve a Companhia Confiança ter recebido muito dinheiro; e tambem se devem ter feito muitos pagamentos aos Estipendiarios do Estado; e d'aqui se deve concluir que os esclarecimentos que eu peço são diversos, e hão de produzir tambem diversos effeitos.

Á vista do que acabo de expender, e que a Camara avaliará, é fóra de toda a duvida, que não convém confundir com o meu requerimento o do illustre Senador, pólo qual eu hei de votar, mas em occasião separada.

O Sr. Miranda: — Principiou-se por dizer