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DIARIO DO GOVERNO.

O Sr. Trigueiros: — Mas esse de 35 réis ninguem o póde comer, e o de 30 réis, ainda que seja bom, diga-me alguem se está guardada a proporção de 40 réis para um arratel, no tempo em que o trigo se vendia a 800 réis, e 30 réis para o mesmo arratel, quando elle se vende a 360 ou 400 réis o alqueire? Porém, Sr. Presidente, este principio, que ninguem pôde negar, é o da experiencia, V da pratica, e é o que este povo está soffrendo, sem proveito de ninguem, senão de uns poucos de padeiros, com escandaloso prejuizo dos consumidores, e até com detrimento da agricultura, pois quanto mais barato fôr o pão cozido, mais consumo terá o grão, não vendo eu motivo para sacrificar diante a theoria vãs razões tão solidas. O que os illustres Senadores dizem, será com tudo muito bom, porém repare-se que é como a musica, que fere o ouvido; mas ha de saber como o fel, que fere o paladar.

Sr. Presidente, disse um illustre Senador que: a Camara Municipal não teria os dados necessarios para estabelecer a estiva, porque deixava de existir o mercado, mas isso é o que eu nego, porque o Terreiro Publico fica sendo o mercado, e ha de ser sempre o maior mercado de Lisboa: logo a Camara Municipal tem Sempre um meio prompto e facil para estabelecer o preço da estiva. Entretanto, proseguiu o illustre Senador, sempre que ouve estiva em Lisboa, o pão se vendia mais barato do que essa estiva; eu convenho em que assim seja; mas em que prejudica a estiva? Em cousa nenhuma, uma razão de mais a favor della. Agora o nobre Senador que o seguiu disse que em Inglaterra.... eu não entendo bem o que disse o illustre Senador; mas parece-me que elle diz que em Inglaterra havia estiva, e que se aboliu; pois eu lhe darei a França por Inglaterra: em França ha estiva, e não é terra aonde hajam menos theorias ou aonde menos se respeite a liberdade de commercio. Paizes aonde ia princípios muito luminosos de commercio, e lá ha estiva; não sei se em Inglaterra gostavam della, nem quaes os motivos porque a reprovaram; eu sei o que convém ao meu paiz, e é o que me importa saber. A liberdade de commercio é muito bom principio; a Commissão o reconhece, e tanto assim, que foi nessa liberdade de commercio que estabeleceu todo o Systema deste Projecto; mas a liberdade de Commercio é sempre subordinada ao bem estar dos povos, e principalmente nesta parte ao bem estar desta populosa cidade; e a não ser assim eu rejeito a theoria: a liberdade do commercio é uma necessidade do Commercio conveniente á Sociedade, mas restricta ao bem publico, quando este reclamar que ella não seja tão extensa, e é da obrigação do legislador o limita-la. O illustre Senador recorreu a um argumento, que me parece produz o contrario do que elle queria concluir; foi o preço da carne com Lisboa: ainda resta averiguar se a carne se comeria mais barata do que se está comendo, porque se nós regularmos os preços porque estão as carnes fóra de Lisboa, e muito perto, assim mesmo ha ainda razão para crer que se a carne fosse por arrematação, ella se comeria mais barata. Ha ainda outra razão para que á carne se arrematasse, e é que todas as Camaras o tem reclamado; todos os dias se vêem reclamações pedindo authorisação para as arrematarem: o nobre Senador referiu-se ao preço por que a carne se come no Campo Grande, é dalli que eu concluo que se fosse por arrematação havia de ser muito mais barata. Em consequencia estou persuadido que nós faremos um grande beneficio a esta cidade, se recuando diante desse principio de liberdade de commercio, que assim como todos, tem limites, e sem subordinação não é nada, limitado pelas exigencias de circumstancias, logar, e tempo, é tudo, e que eu reputo muito, se estabelecermos a estiva para Lisboa, porque os habitantes hão de comer o pão mais barato.

O Sr. Miranda: — Eu rejeito o artigo, por que elle tem por fundamento um principio que não póde admittir-se; em uma boa administração qual é a das taxas, e porque o preço de qualquer genero depende da livre convenção mutua, entre o comprador, e o vendedor, os quaes se arranjam entre si, ou cada um per si, para illudirem a determinação da Lei, quando ella não está em harmonia com os seus interesses. Com muitos exemplos poderia eu provar o que acabo de dizer; um bastará. Tinha-mos uma Lei, e ainda a lemos, porque expressamente ainda não foi revogada, posto que de facto esteja sem vigor, a qual marcava o preço da oliva de ouro em barra de 22 quilates em 1$400 réis, quando no commercio se comprava com dinheiro em prata a 1$800 e 1$900 réis; e então que faziam os ourives? Recorriam a um expediente muito simples: faziam a conta do ouro segundo a Lei, e carregavam o excesso por conta dos feitios.

Citou-se o exemplo da venda livre da carne de açougue; mas no Porto, e Lisboa o povo não se tem dado mal com esta franquia, e creio que nenhumas saudades tem das antigas arrematações; come melhor carne porque a venda é livre, e porque tem differentes preços, segundo a qualidade; entretanto devo lembrar o que se passou no tempo das Côrtes de 1822; uma vez que se fallou na franquia deste genero, levantou-se o clamor de que os habitantes experimentariam falta, e disseram-se muitas outras cousas, que razões não falham quando se advoga uma causa por má que seja. Porém veio o Sr. D. Pedro; passou a Lei da livre venda, e hoje ninguem se lembra de lhe pôr objecções. Nos Concelhos pequenos não acontece o mesmo, pela falta de consumidores, o que não permute a concorrencia dos vendedores, e por conseguinte as vantagens de uma venda livre. É esta portanto uma excepção, não da regra, mas de necessidade. Quanto a cereaes, se o pão tiver um preço no mercado estabelecido por taxa, necessariamente todo o pão ha de ser de inferior qualidade, porque os padeiros não tem interesse em fabricar o melhor em relação ao preço; o que não aconteceria se os preços fossem livres e correspondentes aos diversos grãos de bondade; porque então aquelle que consome o pão grosseiro, o quer barato; outro o quer melhor, e outro o quer da primeira qualidade; e por consequencia taxar o preço é um acto de violencia, que a authoridade não pôde exercer em beneficio do publico. Quando pela primeira vez li este artigo julguei que houvesse alguma razão de força maior, por assim dizer, razões de necessidade para atalhar abusos ou fraudes, de outra maneira irremediavel; mas depois de bem informado, em relação ao preço dos cereaes, e ao do pão cozido, achei que não havia grande desproporção; porque tambem é necessario attender á sua qualidade, nem havia facto algum que podesse justificar esta medida: em consequencia a minha opinião é contra a estiva, e por que esta traz como necessaria consequencia todos os maus effeitos das taxas que são bem conhecidos; voto pela suppressão do artigo.

O Sr. Barão do Tojal: — Em quanto aos preços da carne, direi que quando pela ultima vez eu estive em Lisboa, em 1819, havia então estiva de carne, e custava a 65 réis; era tão nojenta que parecia carne de cavallo, e não de boi; e quanto á estiva do pão, ha de acontecer pouco mais ou menos a mesma cousa. Se a Commissão pertende que seja livre a qualquer o vender por menos, ou por mais da estiva, então é ocioso o Artigo; ninguem me póde privar a mim de pagar um genero por maior preço do que está taxado em attenção á sua superior qualidade; eu sou livre, e da mesma maneira a qualquer lhe é livre vender abaixo daquelle preço, e então a estiva já não serve senão para marcar um termo medio, e para abrir a porta tambem a toda a casta d'adulterações, e fraudulentas medidas da parte dos padeiros para illudirem a Lei. Por exemplo na Turquia, onde ha a estiva do pão, estão pregando continuamente as orelhas dos padeiros contra as paredes de suas casas, porque elles apesar do rigor daquelle castigo estão amiudo commettendo fraudes no peso do pão, ou na adulteração da sua qualidade. Por tanto acho até pernicioso, ocioso, e desnecessario este Artigo; nós estamos antes nas circumstancias de promover tudo quanto seja possivel em favor do commercio. Eu não sei aonde o illustre Senador compra o seu pão, eu posso recommendar-lhe o meu padeiro que me vende pão a 25 réis excellente, tão bom que vindo um padeiro inglez trazer-me pão á porta muito mais caro, a minha familia prefere o pão Portuguez.... Em consequencia, pela prática que tenho tido dos paizes aonde não ha estiva, e mesmo da ilha da Madeira aonde existia a estiva, estou persuadido que tudo reclama a eliminação deste Artigo.

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — A Commissão não ignora os principios da economia politica; e apesar disso não deixou de apresentar este Artigo. Entre tanto, tudo que tem dito estes Senhores não é applicavel; nós não vamos taxar no preço do trigo: o que é a estiva? É a repartição desse preço por arrateis de pão, fitando sempre livre o seu, valôr no Terreiro. Assim dado um preço, qualquer do trigo, diz a Camara = corresponde a tanto o arratel = isto é, o pão commum, não é o pão de luxo. É o sustento exclusivo do povo, e como tal deve ser vigiado. Clama-se por toda a parte que a agricultura está em desgraça; que os generos não valem nada; e entretanto o pão em Lisboa é tão caro como em Londres, e mais caro que em França, posto que um Francez coma mais pão que três Portuguezes. Por consequencia, ou esses clamores são falsos, ou os padeiros fazem ganhos excessivos; e isto é o que acontece; portanto, repito, que aqui o que se faz não e taxar o genero; diz-se que a authoridade declare quanto vale um pão segundo o preço do trigo; e assim vai-se com os interesses do povo. Foi por estes principios que a Commissão não duvidou apresentar este Artigo; eu como Membro della, opinei neste sentido, não me arrependo disso; e creio que a Commissão não alterou os principios.

O Sr. Miranda: — A admittir-se o Artigo da Commissão, seria só em casos extraordinarios; mas não em regra; e, naquelles mesmos, só para o pão de inferior qualidade; porque se os padeiros quizessem faze-lo melhor, embora o preço fosse mais alto. Em qualquer caso, estas palavras = pão de uso commum = acho-as um pouco vagas, e desejaria que a idéa que ellas exprimem ficasse mais clara para se não obstar a que os padeiros possam fabricar pão de melhor qualidade que o do luxo, e este o do uso commum, creio eu, que será o primeiro na ordem da qualidade. Quanto ao expediente da panificação, e á concorrencia que poderia esperar-se da economia do trabalho não podemos argumentar de -França para Portugal. Entre nós ainda não são concluidos diversos machinismos para fabricar o pão com grande economia de tempo, de força, e despeza, apezar de se acharem muito popularizados em outros paizes: ha um estabelecimento em París onde se fabricam diariamente perto de 50 mil libras de pão. Neste estabelecimento o pão é joeirado em grão moído, e depois de reduzido a farinha, amassado por uma maquina de vapôr. Em Lisboa onde os methodos são mais dispendiosos, e os conhecidos e communs, não ha por agora razões para operar grande beneficio da concorrencia dos maquinismos, ou dos processos. Por tanto a approvar-se o Artigo, é necessario redigilo com mais clareza.

Julgando-se o artigo discutido, foi posto a votos e approvado, e sem discussão o

Art. 10.º Fica derogada a Legislação em contrario.

O Sr. Castro Pereira, relator da Comissão especial Diplomatica, apresentou o seguinte

Parecer.

A Commissão, encarregada de examinar os documentos relativos á negociação de um Tractado, para a abolição do trafico da escravatura, pendente entre os Governos Portuguez e Britanico, julgou dever primeiro que tudo ouvir a opinião do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros ácerca da conveniencia de tal publicação; mas tendo S. Ex.ª declarado á Camara que actualmente se tornava urgente que os referidos documentos se publicassem, e havendo convidado a Commissão a dar sobre isto a sua opinião; parece á Commissão que se devem mandar imprimir. Sala da Commissão, em 18 de Junho de 1839. = Duque de Palmella = M. G. de Miranda = Conde de Villa Real = Marquez de Fronteira = Sá da Bandeira = Manoel de Castro Pereira.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: — Pela Acta vejo que se devem nomear tres membros para a Commissão de Guerra...

Vozes: — A Mesa. A Mesa.

O Sr. Visconde de Beire: — Deve ser por escrutinio: aqui estão muitos Militares todos dignos, se a Commissão se não attreveu a propôr os nomes de tres, como ha de a Mesa faze-lo? (Apoiado). Está no mesmo inconveniente, em que se acha a Commissão.

O Sr. Presidente: — Nesse caso proceder-se-ha ámanhã á eleição. A ordem do dia é a discussão do Projecto da Camara dos Deputados sobre ampliar o contracto com a Empreza da navegação do Téjo e Sado por vapôres; havendo tempo continuará a tractar-se do Projecto sobre o Tribunal de Contas. — Está fechada a Sessão.

Eram quatro horas menos um quarto.