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DIARIO DO GOVERNO.

le da desigualdade; e com um erro não se argumenta para a verdade. Quanto ao Alémtejo, deixo essa tarefa aos Srs. Senadores, que mais inteirados nas circumstancias desse local, sustentaram com argumentos o que julgaram conveviente.

Agora responderei ao que ponderou o Sr. Ministro da Justiça; disse que o Artigo deve ser adoptado porque tem em si o seu correctivo; isto e que os collectados são obrigados a pagar só pela oitava parte: se S. Ex.ª tivesse a bondade de reparar no principio, que eu estabeleci, parece-me que não poderia fazer similhante asserção; eu estabeleci o principio de que esses individuos, além de victimas de um formal acinte, não tem alli os justos defensores de seus direitos, e então correndo o negocio á revelia, sempre seria exorbitante essa oitava parte, e assim claro está que a consequencia, que tirou o Sr. Ministro, não é exacta. Agora responderei a outro argumento de S. Ex.ª, relativamente ao minimo, apoiando o Sr. Miranda; e parece-me que a conclusão, que tirou tambem não é exacta. A Commissão, quando tractou desta materia, sendo eu quem teve a honra de abrir a discusssão, estabeleceu que Freguezias haviam, que sendo pobres, não podiam pagar, e não podiam ser annexadas, e que em tal caso supprisse o deficit o Thesouro que julgava que uma Congrua, de cem mil réis, que talvez não chegue a treze vintem por dia, não era tanta que podesse sustentar um Parocho, e manter-lhe a necessaria dignidade; e disse mais, que, vergados os Parochos á dependencia, era melhor não os ter assim porque taes Parochos seriam o descredito da Religião; disse S. Ex.ª que nós estabelecendo este principio e excluindo os proprietarios de fóra, eramos incoherentes; não é assim, nós quando calculamos aquellas impossibilidades, já era sobre a base de não entrar para a Congrua senão o patrimonio dos freguezes, isto é daquelles, que recebiam o fructo dos soccorros espirituaes. Creio que tenho respondido ás reflexões de S. Ex.ª

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Como Senador, e como proprietario, ainda que pequeno, devo offerecer ao Senado algumas reflexões a respeito do paragrapho. O minimo estabelecido é grande, e se os proprietarios não residentes forem isentos, eu receio que em muitas aldeias não seja possivel satisfazer a Congrua. A quota que se pede é muito tenue, é a oitava parte, e decerto quem paga isto não paga uma grande somma. Se a Junta de Parochia abusa, lá está o recurso: além disto o que dirão os Povos se virem que os proprietarios das Freguezias, ainda que alli não residam, não pagam nada para os encargos do Concelho, quando os Povos que trabalham são obrigados a pagar tudo? Eu creio que a rejeição do paragrapho excitaria reflexões a que eu julgo que se não deve dar motivo; porque esta Casa é uma Casa de proprietarios que todos conhecem; e nas aldeias, quando vissem que o meu Caseiro não pagava nada, haveria um certo resentimento que não chega á Corte mas que, nem por isso deixa de ser prejudicial. Disse um illustre Senador que a Lei deixa um recurso ocioso; mas a reclamação de um rico contra um pobre em uma aldeia, raras vezes deixa de ser attendida, contra esse homem rico ninguem se levanta; ahi é que está a aristocracia, o homem mais rico da Freguezia é o homem mais influente nella. Eu sou pequeno proprietario em uma aldeia, não posso desconhecer estas verdades: se algumas vezes deixa hoje de ser assim, é quando, por motivos das nossas discordias politicas, ha opposição de principios. Appello para o testemunho de todos os meus collegas. Um illusttre Senador dezejava que os Clerigos como empregados do Estado fossem pagos com os mais, mas quem dúvida disto? Ninguem. Mas são necessarios 370 contos; e aonde se hão de ír buscar? (Apoiados). Aonde os foram buscar em 1835 e 1836 em que elles ficaram a morrer de fome. O mal é grande; applicar-lhe um remedio terminante, é quasi impossivel; mas depois de votado o minimo de cem mil réis o illustre Senador deverá concorrer para que os não residentes concorram com alguma cousa, para os seus Parochos, porque se assim não fôr não sei quem ha de pagar, e isso seria muito duro.

O Senado certamente está mais bem informado do que eu posso ser, mas eu sou filho de uma Provincia, e offereço estas reflexões que a Camara tomará na consideração que lhe parecer.

O Sr. Tavares d'Almeida: — O Sr. Visconde do Laborim já expendeu muitas das principaes razões, pelas quaes se sustenta o parecer da Commissão; e eu direi, que sou tambem de opinião de que é mais conforme ao direito Divino, á razão, e á justiça, que para sustento dos Parochos só paguem aquelles que recebem delles algum serviço, e são seus freguezes. Considera, e não posso deixar de considerar, que esta materia tem toda a sua base no direito Divino, que é imutavel, e não variavel; e por tanto não é livre ter uma opinião qualquer. Considero tambem, que a obrigação de alimentar aos Parochos não é mais do que a remuneração dos serviços que elles nos fazem; isto é, do pasto espiritual que elles nos ministram. Não sou eu que o digo, é o Apostolo na 1.ª aos de Corintho: — Si nos vobis spiritualia seminavimus, magum est si carnalia vestra metamos. Se nós vos damos, diz elle, o alimento espiritual, justo é que vós nos deis o alimento corporal. Eis-aqui está, Sr. Presidente, a base da obrigação dos fieis para deverem sustentar o seu Parocho; e quem tiver alguma leitura do direito publico ecclesiastica ha de achar isto mesmo. Esta obrigação moral preencheram os fieis dos primeiras seculos, até que arrefecendo nelles a caridade foi necessario estabelecer os dizimos primeiramente nos Concilios, e se bem me lembro do 6.° seculo; e depois, á força de pregações dos padres, se até de embustes; e ultimamente o apoio de Carlos Magno no seculo 8.°, fizeram com que as oblações que até alli eram prestações pessoaes, fossem depois convertidas em onus reaes. Ora este tributo e onus real dos dizimos estava extincto entre nós, mas elle quer outra vez reviver, e vai sobresahir no projecto, e eu que o persentí votei pela eliminação do artigo. Sr. Presidente, que eu dê alimentos. (carnalia) ao Parocho, porque elle me administra os Sacramentos, e pasto espiritual (spiritualia), isso entendo eu muito bem, e se conforma com os textos; mas que eu pague; para a Congrua do d'um Parocho estranho, que não vi jámais, nem conheço por nenhum dos seus bons officios; e, deixem-me dizer, de que eu não careço, nem me posso utilisar, ou finalmente, que eu pague o serviço pessoal que elle faz a outros, não acho razão que o convença. O argumento que aqui muito se tem produzido é, que a religião é do Estado, e que devem pelo Estado ser sustentados os seus ministros. Mas porque a religião christã é a do Estado, segue-se logo que os Parochos se devam sustentar por tributos sobre todos os predios? E porque não se ha de seguir que os alimentem aquelles a quem os Parochos servem? O Evangelho diz: = Qui servit altari de altari participiat. = Similhante ao rifão portuguez: o clerigo donde canta dahi janta. E como serve o Parocho ao altar senão exercendo o munus parochial? E este exercicio é sobre os bens sitos na parochia, ou sobre os freguezes? É sobre as pessoas dos freguezes: logo é destes que devem receber os alimentos. E por tanto, ainda que a religião é a religião do Estado, não se segue mais, nem tanto, que ella deva ser sustentada pelos tributos directos nas propriedades da freguezia, do que por encargos pessoaes dos freguezes; e parece-me, Sr. Presidente, que esta segunda consequencia é a propria doutrina do systema do projecto por que elle não diz que os Parochos serão sustentados pelo Estado, porém diz que os Parochos hão de ser sustentados por freguezias; que não são outra cousa do que a congregação dos freguezes; logo é um absurdo o querer que as congruas sejam satisfeitas por freguezes, e ao mesmo tempo pelos não freguezes; e até uma manifesta contradicção. Sr. Presidente, a religião é do Estado; mas dada a paz á Igreja no tempo de Constantino Magno (creio foi nó seculo 3.°, e póde ser que me engane, porém não será em muito): dada a paz á Igreja, ficou a religião christã sendo tambem a religião do Estado; mas eu pergunto: se então foram sustentados os seus ministros por tributos directos; na propriedade? Ninguem me mostrará isso; e então já se vê que uma cousa não acarreta a outra. Agora ponderarei, que se tem fallado; aqui em religião do Estado, e nos Parochos como empregados publicos; palavras estas em que póde haver alguma amphibologia, e por isso cabe dizer que a religião não é do Estado em sentido possessorio, porque ella é sociedade independente em seu ser, é a crensa do povo, e outra cousa é o Imperio: os ministros da religião são ministros desta sociedade, e no exercicio das suas funcções nada tem como empregados publicos. Que terão elles de empregados publicos? Será porque ensinam a moral? Essa missão receberam elles do Divino Fundador da religião; por conseguinte, no seu espirito a religião está no Estado, mas não é do Estado. Ora, se ella não é do Imperio no sentido possessorio, como disse, e os seus ministros, como taes, são inteiramente independentes, tambem as obrigações do christão para com os ministros da Igreja não tem por fundamento os principios civis, ou a qualidade de cidadão; porque se um christão fôr vassallo entre os turcos, por exemplo, onde a religião do estado é outra, lá mesmo se tiver um Parocho, isto é, quem lhe ministre os Sacramentos, ainda occultamente, tem obrigação de concorrer para a sua sustentação. Aqui surge novamente a idéa de que esta obrigação é pessoal, e do individuo, e é preciso que este projecto não vá desnaturalisar os direitos e obrigações. A obrigação do christão para dar a congrua resulta do direito do Parocho; porque a fonte de todas as obrigações são os direitos, e direitos e obrigações são correlativos. Ora o direito do Parocho não é o jus in ré nos predios da freguezia, é sim o jus ad rem sobre os freguezes que nasce do seu serviço, porque dignus est operarios mercede sua; e como a Igreja não tem coacções ou execuções, mas persuasões e conselhos, deve a lei civil juntar a sua sancção para fazer effectiva a obrigação moral e religiosa do citado preceito; mas deve tomar as obrigações como as acha, e não desnaturalisa-las: achou o jus ad rem, que é in personas, não deve substituir-lhe o jus in ré, que a Igreja não conhece. Em conclusão, é manifesto que o direito que o Parocho tem é sobre a pessoa do freguez, e não sobre as cousas da freguezia; e o projecto mesmo não desconheceu inteiramente este direito, antes o reconhece, mas reconhece-o em parte, e não no todo: diz que os proprietarios de fóra não pagarão mais do que o oitavo da decima predial; mas, Sr. Presidente, ou os de fóra da Parochia devem, ou não devem? Se devem, devem então inteiramente, senão devem não lhes cumpre pagar nem por fracções, nem devem nada. Já um illustre Senador observou que esta fracção do oitavo da decima, da maneira que são collectados nella os senhorios de fóra, póde ser maior do que um inteiro; e eu sigo o mesmo parecer. Não sei eu qual fôsse o fundamento do absurdo §. 3.º da Lei de 5 de Março do anno passado; mas o que me parece, que os Srs. que defendem a sua doutrina defendem (sem o pensarem) a saudosa idéa dos dizimos (Apoiados).

Disse o illustre relator da Commissão (que é por certo um dos mais distinctos membros della), referindo-se a um papel que leu, que em algumas aldêas do Alemtéjo os Parochos ficarão sem congrua, ou reduzidos a muito pouco, senão fossem collectados os donos das herdades residentes n'outra parte, porque n'essas aldêas os moradores são pobres; porém eu responderei, Sr. Presidente, dizendo que as razões de conveniencia dos pobres moradores não destroem as razões de justiça dos proprietarios: que a especialidade de alguma charneca do Alemtéjo não deve alterar a base do direito para se fazer uma injustiça a todos os outros proprietarios das outras provincias, e a quasi todos do mesmo Alemtéjo. Em todo o caso era necessario provar primeiro que os moradores de fóra tinham obrigação de contribuir. Similhante argumento da necessidade e pobreza destas freguezias poderia levar-se ao ponto de querer que os proprietarios de fóra remediassem outras necessidades dos moradores, por exemplo, que os tractassem tambem de medico, cirurgião, e até mesmo de botica! Sr. Presidente, eu não vi entre as muitas representações que foram presentes á Commissão, nenhuma em que se pedisse que fôssem collectadas as propriedades de fóra. O decreto de 19 de Setembro de 1836 observou-se em toda a parte, e sem resistencia dos povos: e toda a idéa de serem collectados os bens de fóra nasceu nas Côrtes Constituintes, fôsse isso pelo que fôsse, e não das reclamações dos povos. Uma unica representação houve a este respeito, e essa está na mão do illustre relator da Commissão: e que dizia esta representação? Que deviam continuar os bolos e premios que no Algarve e Alemtejo constituiam a melhor parte da congrua de alguns Parochos; porém essa mesma representação, que está attendida no Projecto, é uma disposição especial para hypoteses da mesma natureza; porém um ou outro caso especial não é para se fazer lei geral para todo o paiz.

Não sei que mais outras reflexões se tenham feito, porque estou tão certo da doutrina que defendo, que se mais alguma reflexão me lembrasse teria a honra de lhe responder.