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DIARIO DO GOVERNO.

mesmo orador que os dizimos só pertenciam em regra ao Parocho da situação aonde os fructos eram produzidos, excepto se por disposição especial eram concedidas a outro individuo, ou corporação; mas nunca prova isto exactamente o que eu estabeleci no meu primeiro discurso, que os dizimos eram uma prestação dos freguezes para o Parocho, e que desde que os Papas quizeram excitar as guerras das cruzadas, e a de seus proprios interesses, se arrogaram, bem como os Reis, o direito de os distruir? Eu agradeço ao meu nobre amigo um tão concludente argumento.

Resta responder ao ultimo argumento, e é esse, que a maioria da Commissão era contradictoria, querendo que os proprietarios pagassem em sua freguezia pelos bens que possuissem nas outras; e produzindo depois razões de difficuldade para se fazer a derrama sobre esses bens. Quando o illustre Senador dirigiu na outra Sessão, em que este mesmo objecto se discutiu, uma interpelação á maioria da Commissão, antes de se entrar na materia, eu conheci bem onde se encaminhava, e vi depois que me não enganava, esperava eu por isso que S. Ex.ª não produzisse o argumento de contradicção, depois da resposta dada pelo meu amigo o Sr. Visconde de Laborim, que foi, que a Commissão tivera em vista com a eliminação das palavras, a que o Sr. Senador se refere, estabelecer que só o freguez pagasse; e por tanto não ha contradicção, porque ainda que os predios sejam situados «m outras freguezias, nós queremos que estes entrem em linha de conta para sustentação do proprio Parocho, do seu possuidor; e nisto provamos nós que não queremos que o grande proprietario deixe de pagar por todos os seus bens. As razões de difficuldade estão destruidas pela pratica: que acontece com o recenceamento para Senadores e Deputados? Não se lhe calculam em uma só freguezia todos os bens que elles possam possuir em toda a extensão do Reino, e até em seus dominios? Para que produzir razões que não existem, crear difficuldades que não ha; só um usurario, que tudo o que possue occulta, e que o póde depositar debaixo d'uma pedra, poderá illudir as Juntas de lançamento; a propriedade e a riqueza não se esconde, e não ha homem, principalmente em um paiz tão pouco extenso como o nosso, que deixe de ser justamente avaliado em seus teres pelos seus visinhos, e co-parochianos.

O Sr. Visconde de Laborim: — Quando o meu nobre collega, o illustre Senador o Sr. Duarte Leitão fez o seu eloquente discurso, eu não tive a satisfação e honra de o ouvir, porque me achava fóra da Sala, e só entrei quando S. Ex.ª estava acabando d'orar; e assim, até pouco senhor da sua recapitulação, não poderei seguir com exactidão, nas minhas dobeis refutações, o trilho de todos os seus argumentos, nem mesmo a força de cada um em particular; mas peço desde já a S. Ex.ª, que se vir que eu toco, de qualquer maneira inexacta, algum dos pontos que fizeram objecto do seu discurso, me advirta, porque eu serei prompto em me retractar.

Parece-me que o nobre Senador disse, que sendo a Religião do Estado a Catholica Apostolica Romana (segundo se acha estabelecido pela Constituição), deviam por isso os Ministros do Culto, ou Sacerdotes ser sustentados pela fórma que estabelece o Projecto de Lei, vindo da Camara dos Srs. Deputados, porque de outra sorte a conclusão seria alheia daquelle sagrado principio; isto é, que os Parochos deveriam ser mantidos pelas localidades, quer dizer pelos freguezes, e ainda se avança mais, pela propriedade daquelles que o não são.

Sr. Presidente, o principio geral de que S. Ex.ª se serviu, e que eu reconheço como verdadeiro, não só porque o recomenda a Religião e a politica, mas tambem porque se acha consignado na Constituição do Estado, deve ser como tal, por esta Camara seguido; mas concordando eu com elle em toda a extensão da palavra, não posso com tudo tirar a conclusão que S. Ex.ª tirou; a conclusão que tiro,

e que, a meu vêr, é logica, Sr. Presidente, é de que os Parochos hão de ser sustentados sim pelo Estado, mas este Estado não o considero como S. Ex.ª o considera, pois o avalio como o composto de todos os Cidadãos, ou membros da familia Portugueza, sem que deva haver differença entre o pobre e o opulento; e julgo verdadeiro e bem dedusido o corollario que apresento, Sr. Presidente, porque estou persuadido de que os soccorros espirituaes prestados até a esses mendigos, não são menos obrigatorios e proveitosos do que aquelles que se administrara aos opulentos. (Apoiados.)

O sustentar porém que Os Parochos hão de ser mantidos pelas localidades, e avançar até que hão de tambem ser pagos por aquelles que tem propriedades fóra da Freguezia; isso não acho eu que seja coherente e justo. (O Sr. Leitão: — Não disse tal). O Orador continuou: — Quando eu comecei a fallar fui logo cautelloso no que disse, e pedi que se me advertisse quando referisse alguns argumentos menos exactamente; direi comtudo que, se S. Ex.ª não estabeleceu esta doutrina, ella foi então estabelecida por outrem, e tem vogado na Assembléa, e tanto basta para eu seguir o meu discurso: não é coherente, por isso que, reconhecendo-se o principio de que os Parochos devem ser pagos pelo Estado, que é o mesmo que estabelecer que o devem ser pelo monte commum, destinado para as despezas publicas; se pretende decretar que as localidades lhes prestem o necessario para a sua sustentação e decoro; não é justo, porque só está obrigado a pagar quem deve, é nada deve ao Parocho aquelle freguez, que delle não recebe officio algum Religioso (Apoiados).

Disse S. Ex.ª que os dizimos tinham sido bem extinctos, e que mil bençãos merecia a mão que os extinguiu, sendo por isso digna de eterno louvor; porém que seria um dos maiores defeitos se lhes não fosse substituida alguma previdencia sobre a sua primaria applicação, isto é, sobre a sustentação dos Parochos, e que por isso elle considerava este Projecto, vindo da Camara dos Srs. Deputados da Nação Portugueza, como uma subrogação dos mesmos, e que, no seu intender, era esta uma Lei justa e digna de igual louvor. Que este Projecto de Lei, Sr. Presidente, seja uma subrogação dos dizimos, isso é exacto, e por que o é, segundo as minhas pequenas forças, o tenho combatido, e parece-me, se não me falha a memoria, que sobre este objecto fez algumas reflexões o Sr. Tavares d'Almeida, o que deu logar a que S. Ex.ª, o Sr. Leitão, recebesse alguma pequena impressão desagradavel no seu melindre; entre tanto, se estou pela proposição de que este Projecto é uma subrogação dos dizimos, não estou coherente com S. Ex.ª em que seja digno de louvor; odiar os dizimos, e amar a subrogação delles, é sobre maneira contradictorio, porquanto, não podendo deixar de haver na subrogação o mesmo vicio que elles continham, odiada uma cousa, deve odiar-se a outra; e por conseguinte, nesta parte, torno a dizer, não estou de accôrdo com a opinião de S. Ex.ª

Disse tambem S. Ex.ª que as propriedades, apezar da extincção dos dizimos, tinham passado gravadas com este onus (isto é, com a obrigação de sustentar os Parochos) de possuidores para possuidores. Tambem, Sr. Presidente, isto (que não sei com que fundamento juridico se podesse avançar, e menos sustentar) não está de maneira alguma ajustado com os meus principios; porque, se se extinguiram os dizimos, como é possivel que essas propriedades, que foram salvas de uma tal epidemia, desse mal contagioso, desse tormento, que tanto flagelava a Sociedade, continuassem a ficar oneradas? De mais, Sr. Presidente, quando se promulgou a Lei da extincção dos dizimos, o sabio Legislador, por outra Lei, desta diversa, não só na origem, roas tambem nos meios, occorreu á sustentação dos Parochos, não querendo que com a abolição daquella se irrogasse, na falta de providencia, uma tão grande injustiça; logo como se póde dizer que ficaram as propriedades gravadas? Não ficaram; grande razão tenho para o asseverar.

Disse S. Ex.ª que os proprietarios em geral deviam grandes serviços aos Parochos, porque estes pregavam a moral, e que a moral unida á Lei, era a maior das garantias da propriedade; este principio é digno do meu Collega, é um axioma, é uma verdade; mas não sei se esta verdade terá a applicação que S. Ex.ª lhe quiz dar: porque, disse que em virtude desta moral, resultava o beneficio aos proprietarios de não serem arrancadas as suas vinhas, e as suas arvores, de não serem lançados por terra os muros das suas propriedades, e incendiadas as suas cazas; em uma palavra, fez S. Ex.ª uma exclamação, pela qual figurou que a conservação da propriedade particular era devida ás homilias de moral, que os Parochos prégavam aos povos: responderei que essas homilias, e dellas concedendo, que provenha immediatamente essa moral, são um beneficio nascido d'um dever em que estão constituidos os Parochos e todo o Sacerdote em geral para com a Sociedade, e que não constituem obrigação especial dos proprietarios; porque, se esse Parocho préga essa moral, o da minha Freguezia faz outro tanto; e por conseguinte é um bem pago com outro, e de que gozam todos os Cidadãos Portuguezes; os serviços de que se tracta, praticados pelos Parochos para com os seus freguezes; são particulares e individuaes, e são aquelles que provém de se lhes administrar os Sacramentos, conforta-los nas suas necessidades, consola-los nas suas afflicções, e quebrar a força á intriga, e semear a paz, etc. estes actos são aquelles que os freguezes estão constituidos na obrigação de pagar. De mais, Sr. Presidente, como se póde tirar por concluzão que os proprietarios, que não rezidem na Freguezia, mas que tem ahi seus bens, gosam dessa garantia de propriedade? Seria necessario que, tirados esses bens d'ali, se fosse possivel, o Parocho não tivesse essa mesma obrigação, ou podesse afrouxar n'ella; mas se tiradas as propriedades, o Parocho continua da mesma fórma no cumprimento do seu dever; como está constituido então o dono dellas na obrigação de sustentar o Parocho? Isto é estranho!

S. Ex.ª disse que a Commissão sustentava um impossivel, tractando de estabelecer o principio, de que os freguezes deviam pagar aos seus Parochos, por todos os seus bens; a isto respondeu victoriozamente o meu particular amigo, o Sr. Trigueiros, porém eu me contentaria em dizer, que era desnecessario o responder, porque a Commissão o não estabeleceu; no que a Commissão accordou foi que cada um dos freguezes era obrigado a pagar ao seu Parocho na presença da respectiva collecta, sem se intrometter em fallar no todo dos bens, ou na parte delles; e se este foi o principio que ella estabeleceu, como póde prevalecer o argumento de S. Ex.ª, que tem por fundamento a impossibilidade que as Juntas podem ter de tomar conhecimento das propriedades, que estão fóra da Freguezia?

Por todas estas razões, de que me tenho servido para apoiar a doutrina da Commissão, voto outra vez pela eliminação da paragrafo 1.º do Artigo 7.º

O Sr. Ministro da Justiça: — Tem-se divagado muito sobre a natureza dos dizimos, e brilhantes discursos se tem ouvido nesta Casa, ao mesmo passo que muito convém que esta Lei passe quanto antes. Não entrarei por tanto extensamente na questão da natureza dos dizimos, porque julgo isso uma divagação, muito propria certamente para mostrar a erudição dos dignos oradores que tem entrado na materia, mas muito pouco conveniente para o caso em questão. Tem-se tocado a idéa da natureza das funcções parochiaes, se os Parochos são ou não empregados publicos, para d'ahi se deduzir se elles devem ser pagos por uma contribuição local, ou geral. Eu entendo que os Parochos, posto que destinados para ensinar a Religião, e a Moral, não se podem considerar independentes do Poder Civil; a sua nomeação é do Imperante Civil pelo direito do padroado, e por isso, quanto á sua origem, já se vê qual é a influencia que tem sobre elles o Poder Civil. Agora pelo que respeita á natureza das suas funcções, em quanto elles ensinam a Religião, e a Moral, vê-se que estes funccionarios tendem a conservar a boa ordem da sociedade, e que o Estado é obrigado a promover que elles tenham a necessaria sustentação, porque nisso é interessado. Por tanto é evidente que os Parochos são, em certo modo, empregados publicos, a sua nomeação na origem é do Poder Civil, e as suas funcções interessam á Sociedade: o Estado tem pois interesse em os manter. Sendo isto assim, e não havendo actualmente uma dotação propria para o Clero, porque os dizimos se acabaram, e foi um grande bem, de que a agricultura já sente o beneficio, posto que isso se poderia ter feito provendo logo á sustentação dos Parochos, que d'ahi tinham seus alimentos, e talvez se podesse tirar partido desta extincção acudindo a outros ramos de serviço publico; mas felizmente os dizimos acabaram, e a agricultura tem tirado d'ahi grande proveito, e póde ser que tempo venha em que, como já temos por experiencia, saiam dos nossos portos valiosas carregações de trigo nacional; não é estranho a esta Camara, que no tempo de D. Fernando, segundo conta Mariz, estavam constantemente no porto de Lisboa 500 navios carregando o nosso trigo, o nosso sal, e o nosso azeite; póde ser que uma época venha em que isto