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DIARIO DO GOVERNO.

sobre este objecto uma medida geral, para todas as Barcas do Reino, entregando a sua administração ás Camaras Municipaes, fazendo distincção entre as Barcas sobre as passagens das estradas reaes, e as outras. Esta medida geral é a que está neste Projecto. As Barcas que estão sobre as passagens das estradas reaes, é claro que devem ficar pertencendo ao Governo; porque o reparo destas estradas compete ao Estado; aquellas porém que estão nos Districtos dos Municipios, isto é, que são só para serviço das Municipalidades, devem ficar pertencendo ás Camaras: mas como hoje o Governo não póde reparar as estradas reaes, e os reparos que nellas se fazem, se se fazem, são feitos pelas Camaras Municipaes, entendeu a Camara dos Srs. Deputados, que tambem ás Camaras ficasse provisoriamente pertencendo os rendimentos dessas Barcas, já que tinham o encargo. — Agora direi, que não acho tão insustentaveis como o quiz mostrar um illustre Senador, as disposições que se acham tanto no paragrapho unico, como no artigo 2.° do Projecto, e que dizem assim: (leu). Por quanto, Sr. Presidente, é indubitavel que os rendimentos de uma Barca que está sobre a passagem de uma estrada, devem pertencer a quem sustentar a estrada; e se o Governo a não sustenta, mas a Camara Municipal respectiva, claro está que é de razão e de justiça que esta receba os seus rendimentos. Ora, no estado actual qualquer particular póde pôr uma Barca, te-la hoje, e não a ter ámanhã, exigir o que quizer pelo transporte dos viandantes; fazer seus os proveitos, sem algum encargo, e nem ao menos o de assegurar uma passagem certa e inalteravel, de que resulta manifesto prejuizo publico; é esta desordem e este prejuizo que o Projecto pertende evitar.

O Sr. Bergara: — No Riba-Téjo algumas Camaras ha a quem estão commettidas estas Barcas; comtudo ellas cuidam tanto das estradas como o Governo cuida: e porque? Porque para isso não tem meios (apoiados). Eu concordaria de boamente em que se entregasse a direcção das Barcas ás Camaras, se na mesma Lei se determinasse que o rendimento das Barcas seria applicado para concerto das estradas, e isto se fizesse extensivo áquellas que já as administram; porém em quanto isto assim não vier não o posso approvar. — Sr. Presidente, eu não fallo de cór nesta questão, porque a experiencia me tem dado a conhecer o estado de miseria em que isto está. Eu passo muitas vezes os rios Zezere e Téjo, e vou ás vezes até em perigo de vida pelo mal servido que são estas Barcas, que já se acham entregues ás Camaras respectivas. O porto d'Abrantes, um dos pontos mais essenciaes de Portugal, pelo grande movimento de commercio que alli ha, não se póde atravessar o rio quando ha grandes cheias; por quanto as Barcas sendo tripuladas por homens muito velhos não podem fazer o serviço que a corrente demanda; e mesmo em tempo ordinario commettem faltas vergonhosas; e não vejo por isso que a Camara, a quem se acham entregues, preveja o seu melhoramento fazendo-as trabalhar com a necessaria presteza e regularidade; e, por isso a maior parte dos cidadãos que tem meios, e que querem alli passar o fazem por meio de botes, e a que são obrigados principalmente depois do sol posto; tempo em que deixam de navegar as Barcas; e é Por esta razão que tambem me opponho a este Projecto que parece vai dar o odioso exclusivo ás Camaras. Já me aconteceu, Sr. Presidente, que sendo eu encarregado do melhoramento dos quarteis de Santarem, estivesse por espaço de meia hora (armado, e ao sol), esperando que os barqueiros me transportassem no rio Zezere do poente ao nascente! — Digo pois, Sr. Presidente, que uma vez que se queira que passe esta Lei nesta casa, é indispensavel fazer-lhe um additamento o qual vem a ser = que o producto das Barcas seja applicado para o concerto das estradas, e para o melhoramento da navegação = Da fórma que o Projecto está concebido, rejeito-o; porque não vejo que delle resulte commodidade alguma para o publico; e antes pelo contrario eu votaria que as Camaras se lhes tirassem as Barcas que ellas administram, pelo mal que o fazem.

O Sr. Serpa Saraiva: — Tambem eu, Sr. Presidente, rejeito este Projecto, por trazer comsigo o principio de uma flagrante injustiça, que é o exclusivo; contra o qual nós devemos sempre estar álerta, porque delle tem nascido a desigualdade, a emulação, e a ruina do commum interesse e direitos sociaes dos cidadãos (Apoiados).

Naquelles portos, onde não houvesse Barcas, ou que havendo-as, fossem insufficientes: mesmo ainda em quaesquer outros portos, cuja estrada estivesse contractada pelo Governo com certa Empreza, conviera eu no estabelecimento de Barcas, reguladas debaixo das vistas da publica Administração; sem com tudo embaraçar o livre uso dos Barcos particulares. Mas onde ha Barcas já estabelecidas, e sufficientes para o uso publico, e para o particular de seus donos, generos, e gados, e dos moradores, ou proprietarios de uma, ou ambas as margens cultivadas do rio navegavel, eu não posso comprehender, como uma administração exclusiva dê o lucro todo á Camara e obrigue os moradores a servir-se sómente de Barcas Municipaes. Não tardaria que por paridade de abuso todos os mais transportes fossem Municipaes. Se o progresso caminhar nesta direcção, só haverá liberdade para os oppressores do povo; e o chamado bem publico será antes um monstro que ataque, e devore os bens, e o interesse dos particulares, mas nunca será a somma provada destes bens como é mister que seja; para se cumprirem os fins, a que se propõe uma Nação, quando se congrega: o cidadão só sacrifica parte de seus direitos, e interesses, quando este se torna incompativel com o bem, e conservação nacional.

Será no caso presente applicavel esta doutrina? Nem estas migalhas escaparão aos Exactores publicos. Tem ainda de passar por maiores provas a paciencia do lavrador, e proprietario? Que não sente já, que ha Governo, senão na pessoa dos Contadores, em milhares de execuções de Fazenda, na arbitrariedade das Camaras Municipaes, e de centenares de empregados, que opprimem e pesam sobre a Nação, sem poder governa-la, nem dar segurança á propriedade, e pessoa do cidadão pacifico?

Qual seria o resultado de reduzir a Lei semelhante Projecto? Além dos expostos, ou uma administração de Barcas mais custosa que proveitosa, ou mais uma addição aos rendimentos Municipaes, (que já dispõem quasi livremente de tudo quanto é nosso) para augmentar os ordenados de seus empregados, emprehender obras de pouco proveito, e muitas vezes prejudiciaes, e de mero capricho, ou de parcial conluio (Apoiados).

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — É vizivel que este Projecto não tem as simpathias da Camara, e (é perciso dizer a verdade) não teve tambem muitas simpathias na Commissão; entre tanto, a Commissão observou que este ramo do serviço publico estava muito mal regulado, por quanto cada um que quer pôr Barcas, põem-as, e eleva o preço a seu arbitrio; e os passageiros não encontram meios de continuar a sim jornada, ficando embaraçados á primeira passagem dos rios: em consequencia disso procuravamos vêr se este ramo de serviço se poderia melhorar entregando-o ás municipalidades. Eu estou persuadido que se o rendimento destas Barcas fôr concedido ás Camaras, ellas o aperfeiçoarão pelo effeito do interesse, e que o povo será muito mais bem servido. As difficuldades do Sr. Miranda provêm de achar neste Projecto uma especie de generosidade mal intendida, entre tanto que o Estado está em precisão: este argumento do meu illustre amigo seria bom se o Estado recebesse alguma cousa destas Barcas; mas eu tenho recorrido o Orçamento muitas vezes e nunca lá encontrei um real de rendimento proveniente de Barcas, não fallando na do Douro: por consequencia o Estado não faz nenhuma generozidade nem perde cousa alguma porque d'ahi não recebe nada. Olhada a questão debaixo destes dous pontos de vista, entendeu a Commissão que seria conveniente concederas Barcas temporariamente ás Camaras Municipaes, por isso que se diz que ellas estão faltas de antigos rendimentos, e para accorrer ás suas despezas carecem de onerar os povos. Entre tanto as reflexões que fez o Sr. Bergara parecem muito judiciozas e as apoio, não por parte dos Membros da Commissão, porque não sei a intenção dos meus collegas, mas pela minha parte adopto o additamento do Sr. Bergara, para que se o Projecto passar na generalidade se declare, quando se tractar na especialidade, que todo o rendimento das Barcas, seja exclusivamente applicado para construcção das estradas.

O Sr. Miranda: — Toda a Camara ouviu com muita attenção tudo o que se tem dito para sustentar este Projecto. As razões que deu o illustre Senador que primeiro sustentou o Projecto reduzem-se simplesmente ás vantagens que se tiravam do exclusivo das Barcas em relação ás estradas porque, visto que o Governo não cuidava nellas, as Camaras applicariam esse rendimento a beneficio das mesmas estradas. O segundo orador que fallou a favor do Projecto, disse que o Governo nada recebia do rendimento dellas, e concluiu que faria um additamento para que o producto das Barcas fosse applicado para o melhoramento das estradas. Em quanto á primeira parte parece que não é exacto o argumento, porque neste Projecto não se impõe a obrigação de que o producto das Barcas seja applicado para o melhoramento das estradas, e ainda mesmo que se impozesse esta condição não se podiam encarregar os Concelhos destas obras: e como se ha da encarregar a uma Camara o melhoramento de uma estrada que sahe fóra do seu Concelho? No Concelho aonde estivesse a Barca muito bem, mas o resto da estrada não teria melhoramento nenhum, e este melhoramento devia ser em beneficio do publico e não limitado ao dos Concelhos em que se acham as Barcas, dos quaes muitos talvez não sejam os que mais soffrem pelo mau estado das suas estradas. Por conseguinte se se adopta a idéa de que o producto das Barcas deve ser em beneficio do publico, então é necessario tomar isto debaixo de outro ponto de vista; o Estado não arrecada os rendimentos das Barcas, e então o melhor seria arremata-las por conta do Estado, coso em que não se dá privilegio exclusivo. É necessario que eu diga que as Camaras arbitram o preço á proporção dos rendimentos do Concelho porque isto é natural, é a tendencia de qualquer privilegio exclusivo. Por conseguinte não póde haver beneficio nas estradas. Eu cito um exemplo; ha uma pequena Villa em Traz-os-Montes; a Barca do Pocinho tem rendido muitos contos de réis; e a que titulo se ha de dar o rendimento daquella Barca áquelle Concelho? Em beneficio da Provincia de Traz-os-Montes e da Beira Alta já se projectou fazer uma ponte de ferro, junto áquella Villa, e o rendimento da Barca era um dos elementos com que se contava para auxilio da companhia; um conto de réis, ou tres mil cruzados annualmente ajudaria muito esta empreza. Então que utilidade tira o resto da Provincia de Traz-os-Montes, e da Beira se fosse entregue a um Municipio que não póde tractar de estradas senão dentro do seu Concelho? Isto são dons de prodigo, que dá o que tem a quem encontra sem distincção de individuos: não ha outra razão para approvar este Projecto (apoiados). Os rendimentos das Barcas estão sobre as estradas geraes, devem estar a cargo da Administração Geral, e debaixo da inspecção das Juntas de Districto; ás Camaras Municipaes compete especialmente o cuidado das estradas concelhiaes ou particulares de seus Municipios. Mas de estradas geraes, segundo o Projecto quem lhe tomaria contas? Ninguem... (Sussurro). Tomam-se-lhe contas, mas como? Aqui não se lhes marca a despeza, e podem applicar o rendimento das Barcas para o que bem lhes parecer; podem tractar sómente das estradas do seu Concelho, e a Nação em geral nada lucra nisto: debaixo deste ponto de vista geral, e em attenção aos interesses propriamente nacionaes, o concerto d'uma estrada particular com a renda diurna Barca, é um monopolio. Bastaria esta consideração para rejeitar o Projecto, senão houvessem os inconvenientes que apontou o meu illustre collega. Pela Constituição é garantida a liberdade do transito, e nós ás cegas tornaríamos illusoria esta garantia; porque uma Camara tem uma Barca a que se dá o privilegio extraordinario de ninguem poder passar naquelle sitio senão naquella Barca: e será isto admissivel? Não, porque é incompativel com a natureza de um Governo Representativo. Digo mais, seria crear um novo exclusivo o exclusivo do transito, (apoiado geral) quando se deve dar a liberdade a todos de caminharem por onde quizerem, e conforme lhe convier. Os privilegios exclusivos, Sr. Presidente, só se concedem temporariamente a favor daquelles que tomam empreza de uma obra interessante, a uma invenção etc: é a recompensa do seu trabalho; mas fazer um dom gratuito, e dar ao mesmo tempo um privilegio exclusivo, é cousa inaudita e que ninguem acreditará. Por esta e por outras muitas razões, que é escusado repetir, está visto que este Projecto não satisfaz aos seus fins. Se ha alguma Camara no Reino a quem de justiça se deva conceder o rendimento d'uma Barca de passagem, conceda-se-lhe; mas tomar por fundamento as representações de algumas para uma concessão geral de todas as Barcas que cortam as estradas, isto sem conhecimento de causa, é

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