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SESSÃO N.° 19 DE 12 DE JULHO DE 1911 17

poder elle ser resolvido, é exactamente no sentido de dar supremacia ao poder executivo, o que eu não admitto.

A dissolução, tal como existe estabelecida em França, só pode dar-se com o voto affirmativo do Senado, isto é, vae buscar-se a uma parte do poder legislativo o correctivo a applicar á parte restante, o que é inadmissivel, mesmo porque vae criar-se um conflicto maior, entre a Camara dos Deputados, por um lado, e o Senado e o poder executivo, por outro, ou entre este e todo o poder legislativo.

Affirma-se que, não adoptando a Republica os processos condemnaveis da monarchia, certo é que se não abusará da dissolução.

Mas é esta uma affirmação que se não pode admittir em absoluto; e, em todo o caso, não se deve dar logar, sequer, a que os mesmos antigos abusos se possam repetir.

Diz-se ainda que esses abusos do tempo da monarchia, se não darão na vigencia da Republica, visto que existirá a genuidade do suffragio e as eleições serão livres.

Mas, Sr. Presidente, o suffragio não tem absolutamente nada com esta questão.

Suppondo mesmo que depois de dissolvida uma Camara venha outra que devidamente represente a vontade nacional, a verdade é que o Presidente fica, ou deve logicamente ficar, com o direito de a dissolver tambem quando um novo conflicto se venha a dar, e, pelo menos, emquanto a nova Camara não funccione, o Governo e o Presidente ficam absolutamente á vontade para fazerem o que quiserem.

Diz se ainda que, não querer a dissolução, representa medo do poder legislativo, na consulta ao país.

Não é assim; então para não mostrar tal medo, devia estabelecer-se que o Presidente poderia dissolver a camara sempre que que o quisesse.

O caso está em que, emquanto o país não é consultado e os seus novos representantes não entram no exercicio das suas funcções, temos o poder executivo á vontade, demorando por seu livre alvedrio quaesquer medidas importantes, fazendo o que lhe approuver, e até pondo-se em ditadura.

O Sr. Jacinto Nunes: - Mas se o país manda a mesma Camara, o cheque cae em cheio na Presidencia.

O Orador: - De acordo.

O Sr. Dr. Egas Moniz veio trazer uma ideia nova ao debate.

Lembra a S. Exa. que o Presidente possa dissolver a Camara dos Deputados, mas só quando as duas Camaras reunidas deem o seu voto affirmativo.

Mas isto não é o direito da dissolução que se tem discutido; isto é antes uma auto-dissolução.

O Sr. Antonio Macieira: - Suicidio parlamentar.

O Orador: - Sim senhor. Um suicidio parlamentar; mas é uma formula que nada resolve.

Se ha um conflicto entre o poder legislativo e o poder executivo, não é de esperar que aquelle logo se submetia, indo-se embora, e portanto votará contra a dissolução, mantendo-se e aggravando-se o conflicto.

E se votasse a favor, renunciaria o mandato que recebeu da Nação.

É isso admissivel?

E só o poderia fazer a convite?

Não poderia espontaneamente fazê-lo?

Mas, Sr. Presidente, se na proposta- do Sr. Egas Moniz, alem do absurdo, ha o caso estranho de ir levantar um conflicto maior do que o que já existe, no direito de dissolução ha uma cousa mais grave, que é contrariar-se o proprio direito civil, porque o que se não pode comprehender, é que o poder legislativo, que é quem escolhe o Chefe do poder executivo, que é quem lhe dá todos os poderes que elle tem, quem lhe confere o mandato, seja depois dissolvido por esse seu mandatario, e que o mandato seja assim revogado por elle, e não pelo mandante.

O Sr. Jacinto Nunes: - Retirando-se o mandante, tambem se deve retirar o mandatario.

O Orador: - Não ha duvida. Não se comprehende que, saindo o mandante, o mandatario continue.

Dissolvida a Camara ou uma das Camaras, o Presidente deveria então sair tambem e consequentemente o Governo que elle nomeou.

O Sr. João José de Freitas: - V. Exa. não admitte que o poder legislativo pode, num dado momento, estar em desacordo com a Nação?

O Orador: - Admitto, mas então a Nação que se manifeste, e que não seja o Presidente ou o poder executivo o arbitro d'esse conflicto, que não seja esse poder, eleito por nós, que possa amanhã, com os poderes que nós lhe demos, atirar-nos para o meio da rua.

O Sr. Egas Moniz: - Mas com o voto da Camara.

O Orador: - Mas, repito, isso seria então a renuncia do mandato. Se se dá um conflicto entre o poder executivo e o legislativo, não se comprehende que seja o poder legislativo que tenha de ceder, de recuar, de por sua propria vontade se ir embora. O natural e o que deve ser é que o poder legislativo se mantenha no seu posto.

O Sr. João José de Freitas: - E quem pode garantir a V. Exa. que a Nação não estará muitas vezes ao lado do poder legislativo?

O Orador: - Ella então que se manifeste revogando o mandato que conferiu, e em outro caso que recorra á revolução, porque é esse um direito que não pode deixar de ser considerado e reconhecido por nós.

Ou, melhor ainda, estabeleça-se nesse caso o referendum, como lembra o Sr. Dr. João de Menezes, e que me parece acceitavel.

O Sr. Ladislau Piçarra: - Mas haverá inconveniente em que o poder executivo seja por eleição do poder legislativo?

O Orador: - Eu digo a V. Exa.

Eu não me opponho e antes desejo essa eleição para o chefe do poder executivo; mas não quero transportar para Portugal, de um jacto, o regime da Suissa, o que poderia produzir maus resultados.

Nem quero mesmo ficar com a responsabilidade de defender uma tal doutrina, visto dizer-se que a importação de certos costumes estrangeiros, poderá ser nociva e prejudicial á Republica Portuguesa.

O que eu desejo é que se estabeleça um regime misto. Desejo que o Presidente seja eleito pela Gamara" mas que seja elle que, de accordo com as indicações d'ella, escolha os Ministros.

Expostas assim as minhas ideias sobre o poder executivo e sobre a dissolução, eu vou agora, Sr. Presidente, entrar no estudo da organização do poder legislativo.

A eate respeito eu declaro-me absolutamente contrario a todos aquelles que teem vindo a esta tribuna discutir o assunto.

Eu defendo a doutrina de uma só Camara.

E para o fazer, Sr. Presidente, eu não preciso desenvolver o famoso argumento de Sièyes, de que: sendo a lei a vontade do povo e não podendo o povo ter duas vontades differentes sobre um mesmo assunto, o corpo legislativo, que representa o povo deve ser essencialmente um.