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SESSÃO N.° 17 DE 27 DE NOVEMBRO DE 1911 5

O Sr. Presidente: - Vai abrir-se inscrição especial.

Vários Srs. Deputados pedem a palavra.

O Sr. Presidente: - O primeira Deputado a quem vou dar a palavra é ao Sr. Machado dos Santos, porque foi quem pediu para tratar, em negócio urgente, da questão da ordem pública.

Tem, portanto, S. Exa. a palavra.

O Sr. Machado Santos: - Sr. Presidente e meus ilustres colegas: é com grande prejuízo para a minha laringe que falo nesta Casa, mas eu cometeria um crime contra o Dever, um crime contra a República, um crime contra a integridade da Pátria, se calasse a dor que me vai n'alma e me conservasse silencioso ante os acontecimentos que tenho visto desenrolar nas duas cidades de Lisboa e Pôrto.

A bem da nacionalidade portuguesa - meus colegas! - eu faço um apelo à Câmara: Que seja dada uma outra orientação aos seus trabalhos, uma outra orientação aos negócios públicos, porque como tive ocasião de observar ontem, o povo anda descontente, bastante descontente até, e nas ruas de Lisboa dava largas ao seu descontentamento, protestando com consciência do que fazia, mas sem concretizar a razão do seu protesto.

Reconheci ainda, em pleno Rocio, quando pretenderam desacatar-me que, por entre a grande massa popular, havia um grupo de arruaceiros que, ouvindo vitoriar o meu nome, se dirigiu contra mim e contra os que me aclamavam, em atitude agressiva, impelindo-me para a Casa das Aguas. Êsse grupo, que se tem salientado, mais ou menos, em várias agitações populares, dadas na cidade de Lisboa, não é um grupo formado por republicanos, por socialistas ou por anarquistas; êsse grupo é composto de homens que se aproveitam da arruaça para fins que se não atrevem a confessar, não ignorando que a desordem nas ruas trará o descrédito para a República e pode causar a perda da nacionalidade portuguesa.

São homens sem pátria, que vivem simplesmente do tumulto e da desordem, homens que excitam as turbas, para que elas os auxiliem nas suas especulações. (Apoiados). Contra êsses homens é que eu peço à Câmara, apelando para o patriotismo de todos, para que alguma cousa se faça no sentido de que o povo veja que a República foi feita para êle e só para êle, mas não para os arruaceiros, para os perturbadores da paz pública

A continuarmos, assim, pelo caminho que temos trilhado, mal vai para a nacionalidade portuguesa!

Sr. Presidente, faço êste apelo aos meus colegas da Câmara e ao Govêrno, qualquer que êle seja, para que o povo sinta bem a diferença que há entre uma monarquia e uma república, e também para que, duma vez para sempre, acabe o espectáculo deprimente que temos presenciado, há uns tempos para cá.

Já disse que a hora era de perigo para a nossa nacionalidade, e disso devem estar convencidos todos os que me escutam.

Infelizmente, a forca armada já teve que intervir para restabelecer a ordem nas ruas, e, a maioria dos que foram vítimas da sua intervenção encontraram-se envolvidos no motins como Pilatos no Credo; os culpados, os arruaceiros, os profissionais da desordem, sabem por-se a coberto (Apoiados). Contra êsses é que nós temos de proceder, o que me leva a perguntar qual a razão por que ainda os vê mós à solta!

O Sr. Joaquim Ribeiro: - São bem conhecidos.

Sr. Presidente, permita-me V. Exa. que eu ainda diga mais duas palavras: tiveram a infâmia, querendo com isso tirar o pouco ou muito prestígio do meu modesto nome

de dizer que eu tinha feito fogo sôbre o povo. Essa infâmia, repito a com a ponta do pé.

Findo por aqui as minhas considerações, porque, creio, o patriotismo de todos, deve sentir bem o estado de desânimo que se apodera das almas e os esforços que necessitamos conjugar para salvarmos a nossa querida Pátria. (Apoiados).

O Sr. António Granjo: - Sr. Presidente, os acontecimentos que ontem se desenrolaram em Lisboa hão de ter necessariamente em todo o país um eco doloroso, e lá fora, nessa imprensa, que se acha ao serviço da reacção monárquica, hão-de ser explorados torpemente.

As palavras proferidas pelo Sr. Presidente do Conselho não me parecem suficientes, e por isso eu achei que a Câmara cumpria o seu dever, generalizando a discussão do assunto.

Sr. Presidente, eu não conheço bem a situação interna internacional do país, porque, nem como Deputado, nem orno cidadão, tenho elementos de apreciação suficientes; nas, em todo o caso, creio ter um tal ou qual conhecimento dessa situação interna e internacional, e êsse tal ou [Uai conhecimento tem feito com que eu tenha passado horas amargas e pensar seriamente no destino desta minha pátria e na marcha da República.

E se a situação interna não se pode considerar grave, e que é certo é que a situação internacional se me afigura gravíssima. Se nós não vivemos numa atmosfera de asfixia internacional, o que é certo é que os apetites das as grandes potências andam à solta; o que é certo é que os povos pequenos, se acaso não tiverem muita prudência e tino, se não tiverem boa política e boas finanças, se não tiverem uma cordura que se imponha à consideração do mundo, tem o destino infalível e irremediável de serem detalhados pelos outros. (Apoiados). O momento histórico á de tal forma favorável a êsse desenvolvimento das ambições das potências, que o direito internacional é hoje uma verdadeira ficção, uma verdadeira lenda.

Haja vista a acção da Itália sôbre a Cirenaica e Tripolitana, e haja vista a protecção concedida pela Espanha aos conspiradores.

Vozes: - Não apoiado.

Vozes:-Apoiado.

O Sr. Jacinto Nunes: - É o que se vê.

O Orador: - Se acaso o direito internacional existisse, a intervenção dever-se hia dar na Espanha, obrigando-a a cumprir os preceitos internacionais.

Como quer que seja eu entendo que o país e a Câmara não lucram absolutamente nada desconhecendo a situação.

A Câmara, que não a conhecerá pelas minhas simples palavras, a Câmara, ao menos, precisa conhecê-la.

Eu tenho a presunção de que conheço as responsabilidades que me impedem, para saber que não há nenhum perigo para a nacionalidade portuguesa em dizer estas pequenas cousas.

Sendo assim, nós precisamos ter uma cautela infinita, e sabermos pôr em todos os actos um infinito amor à Pátria, para podermos dar à República a segurança duma marcha, duma situação que permita desenvolver as nossas forças económicas e sanear a nossa situação financeira. (Apoiados).

Sr. Presidente, a política é feita de cobardia, e é preciso que seja feita de franqueza de coragem. É certo é que, desde há muito tempo, quem domina os Governos e os partidos é a rua. (Apoiados).

Sr. Presidente, se à rua se dá o significado de povo, bem está, porque nós não somos aqui mais do que representantes do povo.