O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 89

EM 9 DE ABRIL DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar do Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva

Sumário.— Abertura da sessão.
Leitura da acta.
Correspondência.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se, da carestia da vida, fazendo algumas considerações sôbre a compressão das despesas e chamando a atenção do Sr. Ministro da Justiça para o sentido calunioso dalgumas palavras proferidas numa assemblea da Companhia das Águas de Lisboa.

Responde-lhe o Sr. José Domingues dos Santos (Ministro da Justiça}.

O Sr. Jorge Nunes inala pela remessa de documentos que pedia e faz algumas considerações sôbre o modo como o delegado do Govêrno em Setúbal está desempenhando as funções do seu cargo.

Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Jorge Nunes volta a usar da palavra para explicações, seguindo-se lhe os Srs. Tavares de Carvalho e António Correia.

O Sr. João Luis Ricardo (em nome da comissão de previdência social) envia para a Mesa um projecto de lei.

O Sr. Presidente do Ministério (Álvaro de Castro), envia para a Mesa uma proposta de lei.

É aprovada a acta.

Ordem do dia. — Interpelação do Sr. Vitorino Guimarães ao Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente lembrando à Câmara o aniversário da batalha de La Lys, propõe um voto de saudação ao exército de terra e mar e que a Câmara se associe à homenagem de 2 minutos de silêncio em recordação dos soldados mortos na guerra.

Usam da palavra, associando-se ao voto proposto, os Srs. Almeida Ribeiro, Garcia Loureiro, Carlos Olavo, Moraes Carvalho, Lelo Portela, Lino Neto, António Maia e Álvaro de Castro (Presidente do Ministério).

MJ aprovado o voto proposto pelo Sr. Presidente.

O Sr. Vitorino Guimarães realiza a sua interpelação e termina enviando para a Mesa o projecto de lei.

Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Sampaio Maia chama a atenção do Govêrno para algumas colectas lançadas sôbre diversos comerciantes do concelho da Feira, colectas desiguais conforme as opiniões políticas dos meemos,

Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte, com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 16 horas e 10 minutos.

Presentes à chamada 44 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 29 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Afonso do Melo Pinto Veloso.

Alberto Ferreira Vidal.

Albino Pinto da Fonseca.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Amaro Garcia Loureiro.

Ângelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Correia.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar do Almeida Teixeira.

Página 2

2 Diário da Câmara dos Deputados

Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Maldonado de Freitas.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Cruz.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

João de Ornelas da Silva.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Diais da Fonseca.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel de Sousa da Câmara.

Mariano Martins.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Valo Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Sebastião de Herédia.

Tomé José de Barros Queiroz.

Vergílio Saque.

Vitorino Máximo do Carvalho Guimarães.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Lelo Portela.

Alberto da Rocha Saraiva.

Álvaro Xavier do Castro.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Ginestal Machado.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomos.

António Pinto do Meireles Barriga.

António do Sousa Maia.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Cândido Pereira.

Constando de Oliveira.

Ernesto Carneiro Franco.

Hermano José de Medeiros.

João José da Conceição Camoesas.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

Joaquim Brandão.

José Carvalho dos Santos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

Lourenço Correia Gomes.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Paulo Cancela de Abreu.

Vasco Borges.

Viriato Gomes da Fonseca.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Abílio Marques Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto Xavier.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Américo da Silva Castro.

António Abranches Ferrão.

António Dias.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Maria da Silva.

António de Mendonça.

António Vicente Ferreira.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão.

Augusto Pereira Nobre.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Custódio Martins de Paiva.

David Augusto Rodrigues.

Delfim Costa.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Germano José de Amorim.

Página 3

Sessão de 9 de Abril de 1924 3

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Júlio do Sousa.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

José António do Magalhães.

José Cortês dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Mendes Ribeiro Norton do Matos.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José do Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo:

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Lúcio de Campos Martins.

Luís da Costa Amorim.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Duarte.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sonsa Coutinho.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Maximino de Matos.

Nono Simões.

Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomás de Sousa Rosa.

Valentim Guerra.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

Vitorino Henriques Godinho,

Às 14 horas principiou a fazer-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 8 Srs. Deputados.

Não há número.

Estão interrompidos os trabalhos.

Às 15 horas principiou a fazer-se a segunda chamada.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 44 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Foi lida a acta e deu-se conta do

Expediente

Ofícios

Do Senado, com uma proposta de lei que concede amnistia a determinadas infracções disciplinares, crimes sociais e políticos e delitos de imprensa.

Para a comissão de legislação criminal.

Das câmaras municipais de Batalha, Mora, Ovar e Paredes, apoiando a representação da Câmara Municipal de Miranda do Corvo, relativa a tesoureiros das câmaras.

Para a Secretaria.

Antes da ordem do dia

O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: não é demais intercalar no assunto da carestia da vida a compressão do despesas.

Segundo informações que tenho, gastaram-se 50 contos na instalação de um telefono do Lisboa para a quinta do chefe da contabilidade das Alfândegas, a fim de servir durante os meses de estio.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos) (interrompendo): — Em que mês foi?

O Orador: — Não sei. O que eu quero é protestar contra todas as despesas desnecessárias, quando o País necessita de compressão de despesas, como esta, que serve apenas para comodidade de um funcionário.

Por diversas vezes tenho pedido para o meu círculo vários telefones para utili-

Página 4

4 Diário da Câmara dos Deputados

dado geral. Nunca fui atendido, quando a despesa seria insignificante. Mas para a quinta do um funcionário gastam-se 50 contos com um telofone que se destina a servir três meses ao ano.

Tenho pena de não ver presente o Sr. Ministro do Comércio para lhe pedir que fizesse aos telefones o mesmo que o Br. Ministro da Guerra fez aos automóveis, que os retirou a quem dêles não precisava.

Desejo também que o Govêrno me informe se tem conhecimento do que se passou numa assemblea da Companhia das Águas, onde se disse que havia alguns Ministros que se vendiam.

Nessa as s embica atacou-se a República; e eu pregunto qual é a pena que o Govêrno aplica a quem disso que havia Ministros que se vendiam.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos): — Insisto com o Sr. Tavares de Carvalho para me dizer em que mês se fez a instalação do telefone, para saber se foi durante a vigência dêste Govêrno. Parece-me que não; porque êste Govêrno tem tomado medidas para terminar com o abuso dos telefones, como acabou com o abuso dos automóveis.

No meu gabinete há apenas um telefone; e tenho até negado a concessão de telefones, ainda mesmo pagando os funcionários as despesas.

O que posso afirmar é que o abono dos telefones vai acabar; e o Sr. Tavares de Carvalho prestou um serviço ao Govêrno lembrando o que há a fazer.

O Sr. Tavares de Carvalho: — Nunca foi meu intuito criar dificuldades ao Govêrno. Apenas desejo informar V. Exas.

O Orador: — O facto é q no toda a gente brama; e os que mais bramam são os que menos razão têm e que nenhum remédio dão.

Sr. Presidente: outro assunto tratou o Sr. Tavares do Carvalho: o que se passou na Companhia das Águas.

Eu sou informado de que a essa assemblea assistiu alguém que já foi mem-

bro desta Câmara e que não deixaria passar sem protesto qualquer calúnia; é o Sr. Manuel José da Silva.

Eu sei que se fazem afirmações caluniosas, e que — doloroso é dizê-lo — se fazem-se por toda a parte.

Apoiados.

Por toda a parto se acusam os homens da República de vendilhões, quando são os acusadores quem menos autoridade tem para o fazer.

É preciso reagir contra êste estado de cousas.

E preciso mostrar que não estamos dessorados, o punir por todas as formas essas campanhas.

De outra forma acabaremos por ser varridos daqui.

Eu não tenho dúvida em chamar a atenção dos meus delegados. Mas, uma vez êsses homens chamados, dirão que, nada sabem, que nada ouviram.

O Sr. Carlos Olavo: — Nem testemunhas se arranjariam.

O Sr. Vasco Borges: — Resume-se tudo nisto: um accionista referiu-se em termos-inconvenientes aos Ministros da República, mas o director da Companhia repeliu essas afrontas, sendo o accionista censurado pela assemblea.

O Orador: — Repito: não tenho dúvida em chamar a atenção dos meus delegados para êstes factos.

Apoiados.

É preciso acabar com estas calúnias.

O orador não reviu.

O Sr. Jorge Nunes: — Como não está presente o Sr. Ministro da Agricultura nem o Sr. Ministro do Interior, peço ao Sr. Ministro da Justiça o favor de transmitir a S: Exas. as minhas considerações.

Até hoje não mo foram fornecidos os documentos que pedi pelo Ministério da Agricultura, apesar do o Sr. Presidente, por duas vozes, por intermédio da Secretaria do Congresso, ter instado por Ossos documentos, que me são indispensáveis.

Peço ao Sr. Ministro o favor de transmitir ao Sr. Ministro das Colónias estas minhas palavras.

Página 5

Sessão de 9 de Abril de 1924 5

Eu peço, ainda, a S. Exa. o favor do comunicar ao seu colega da pasta do Interior as considerações que vou fazer:

O Govêrno entendeu que no seu rol de economias devia incluir a supressão dos lugares de administradores de concelho. E para que dêles não restasse sequer memória, fê-los substituir por delegados do Govêrno sem direito a qualquer espécie de remuneração caso êste muito para estranhar num país de interesseiros e ganhões.

Nessas condições foi para Setúbal como delegado do Govêrno um indivíduo que generosamente aceitou o cargo sem qualquer remuneração. A verdade, porém, é que se diz lá por Setúbal que êsse cavalheiro fértil em habilidades de baixa política, tendo conseguido apear, com o apoio da oposição monárquica e de certos elementos democráticos, os restantes membros da Comissão Executiva, percebe os seus ordenados de administrador pelos cofres do município, muito embora êle só vá a Setúbal para tratar do que lho interessa.

Há pouco, o povo de Palmeia, essencialmente ordeiro, pediu autorização para realizar a procissão dos Passos. O tal delegado do Govêrno a quem a Câmara paga, na véspera à noite naturalmente para satisfazer os desejos de meia dúzia de indivíduos que supõem personificar o Registo Civil em Palmeia — resolveu proibir a realização da festa.

Como as cousas se passaram di-lo O Século. E quem ler a notícia há-de reconhecer que ela mão foi escrita por um adversário do Govêrno...

É, pois, para estas irregularidades a que acabo de me referir, praticadas pelo actual delegado do Govêrno em Setúbal, que eu chamo a atenção do Govêrno, pois, a verdade é que pessoas há que não deviam ocupar certos lugares; pessoas há que tinham tudo a lucrar eu viver o mais possível ignoradas. E esta é uma doía s.

Sr. Presidente: já que estou 110 uso da palavra permita-me V. Exa. que eu aproveite a ocasião para dizer alguma cousa relativamente às considerações feitas pelo Sr. Tavares do Carvalho.

Devo dizer a V. Exa. que por mais de uma vez, como Ministro do Comércio, tive relações com a referida Companhia.

Essas relações foram sempre as mais

lisas e respeitosas, não tendo nunca visto no procedimento do Sr. Carlos Pereira, director da Companhia das Águas de Lisboa, nenhuma atitude incorrecta, não só para o Govêrno, como para os homens da República.

Não sei, Sr. Presidente, qual seja a sua política; mas creio bem que êle não deva ser republicano. No em tanto, repito nunca ouvi da sua boca uma palavra sequer incorrecta para com os homens da República, limitando-se unicamente a defender intransigentemente, e a todas as horas, os interêsses que lhe foram confiados, e tratando sempre os homens da República com a máxima lealdade e correcção.

Não me admira, Sr. Presidente, do que se passou na assemblea geral daquela Companhia; pois, a verdade é que o accionista que agora tam desprimorosamente tratou os homens públicos, foi o mesmo que, numa outra assemblea geral, tratou os seus directores de igual forma, pelo que esteve prestes a ser pôsto na rua.

O que a mim me admira, Sr. Presidente, é que por toda a parte se ataquem o a homens públicos, e os delegados do Ministério Público não dom sinal de si.

Eu lembro a V. Exas. o que se disse na Praça dos Restauradores. Homens que são funcionários públicos e outros que vestem uma farda sem, no emtanto, a saberem honrar, bolsaram contra os homens do regime toda a espécie de calúnia.

Sr; Presidente: esta situação tinha remédio, desde que os agentes do Ministério Público cumprissem o sou dever; e, então, talvez houvesse mais continência da linguagem.

Eu não peço que se vá fazer um inquérito ao que só passo a na assemblea geral da Companhia das Águas; mas o que desejo é que aos agentes do Ministério Público, seja lembrada a conveniência do lançarem as suas vistas sôbre o que se escreve nos jornais, para que seja aplicada a devida sanção.

Disse o Sr. Ministro da Justiça que nas associações comerciais também se tem dito verdadeiros pavores, o que se torna necessário aplicar uma sanção.

Sr. Presidente: não há dúvida de que assim é; mas êsses pavores que se tem dito nessas associações, por via de regra,

Página 6

6 Diário da Câmara dos Deputados

são o céu longínquo do que se tem dito na imprensa. Existe, portanto, uma certa diferença.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos): — Sr. Presidente: nada tenho com a primeira parte do discurso do Sr. Jorge Nunes. Ela refere-se exclusivamente aos actos de um delegado do Govêrno, que não é meu subordinado e com cujos actos, portanto, nada tenho.

A minha acção será transmitir ao Sr. Ministro do Interior as considerações de S. Exa.

Lastimo de passagem que S. Exa., a respeito da apreciação dos actos do delegado do Govêrno, viesse falar no que se diz na cidade, a respeito da honorabilidade dos homens que estão à frente da Câmara Municipal de Setúbal e da do administrador.

Eu, em geral nunca me refiro ao que se diz; e entendo que cada um de nós deve ter o necessário escrúpulo para se cingir, apenas, ao que sabe.

Quanto à afirmação feita pelo Sr. Jorge Nunes, relativamente à incúria dos delegados do Ministério Público, quando se trata de agravos feitos em público aos Poderes Legislativo ou Executivo, devo dizer que, há cêrca de 15 dias, fiz expedir pelo Sr. Procurador Geral da República, uma circular para que os delegados lessem os jornais e levantassem autos sôbre as notícias que se refiram à honorabilidade alheia.

O sistema da impunidade que até hoje se tem seguido, procuro ou removê-lo. Já o teria feito se, porventura, não soubesse que, se adoptasse uma atitude mais violenta contra os delegados que não cumprem o seu dever, seria logo acoimado de perseguidor, no caso de êsses delegados não serem meus correligionários.

Sei bem o meio em que vivo; e por conseqüência tenho adoptado uma corta tolerância, para que não seja acoimado daquilo que não sou.

O Sr. António Correia (interrompendo): — V. Exa. dá-me licença?

Eu posso afirmar que as ordens do V. Exa. têm sido tomadas na devida consi-

deração, já anteriormente a elas o procedimento dos delegados da Boa-Hora não merecia qualquer censura, porque, a despeito de cartas anónimas o de pressões de outra qualquer espécie, êles tOm cumprido rigorosamente o seu dever.

Do que há absoluta necessidade é de revogar a lei de imprensa.

O Orador: — Sr. Presidente: eu suponho que todas as leis de imprensa, que venham a ser publicadas, serão inúteis.

Em minha opinião, o que havia a fazer ora revogar a lei do imprensa, o ficar de pé o processo civil, aplicando-se as sanções que estão cominadas no Código Penal.

Êste é o meu critério.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Jorge Nunes, (para explicações): — Sr. Presidente: duas palavras apenas. O Sr. Ministro da Justiça, a propósito dos acontecimentos de Palmeia, declarou que, não sendo êste um assunto que corresse pela sua pasta, comunicaria as minhas considerações ao seu colega do Interior, lastimando, no emtanto, que me tivesse feito eco de qualquer apreciação menos lisonjeira ao carácter dos homens que constituem a Câmara Municipal de Setúbal.

Ora esta simples declaração, feita por S. Exa. nestes termos, não podia ficar de pé, som que eu pedisse a palavra para explicações.

Disse-o e repito, porque é a expressão da verdade: — os membros da Câmara Municipal do Setúbal pedem ao Govêrno que, pelos seus agentes, proceda a um inquérito acerca do que se disse da Câmara de Setúbal, do que se escreveu num jornal dirigido pelo actual chefe da comissão monárquica, e que não sofreu desmentido.

Todos os termos os mais injuriosos foram lançados à cara dos membros da comissão executiva da Câmara.

E se isto é verdade, se não só trata de uma calúnia, o Govêrno tem de ver até que ponto é conveniente a estada em Setúbal dum homem que tem com essa gente qualquer entendimento.

É, portanto, uma cousa muito diferente do que me foi atribuído pelo Sr. Ministro da Justiça.

Não caluniei nom acusei ninguém.

Página 7

Sessão de 9 de Abril de 1924 7

Das suas palavras pode tirar-se a conclusão de que estava chamando ladrão a um homem u quem foi feita essa acusação.

As acusações feitas aos membros da Câmara Municipal de Setúbal não sofreram desmentido.

Sendo verdadeiras as acusações dêsse jornal, o Govêrno só tem um dever a cumprir: dispensar do serviço o seu delegado que com essa gente só entenda.

As minhas palavras, chamando um delegado ao cumprimento do seu dever, não podem ter a interpretação dada pelo Sr. Presidente do Ministério. Chamei a atenção do Govêrno para o cumprimento do seu dever.

Quanto ao outro facto, o Estado não faz economia nenhuma porque presta à companhia um serviço.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Tavares de Carvalho: — Tive ocasião de protestar contra um orador que proferiu acusações contra o Parlamento. Não acusei o Sr. Carlos Pereira, como disso o Sr. Jorge Nunes, nem conheço êsse senhor.

Não tenho outro interêsse senão chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para essas acusações publicamente feitas, para que fôssem punidos os seus autores.

Aproveito a ocasião para requerer a V. Exa. já consultada a Câmara para que, antes da ordem do dia, sejam votadas umas ligeiras emendas feitas pelo Senado ao projecto n.º 100.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia: - Sr. Presidente: pedi a palavra porque das palavras do Sr. Jorge Nunes, pedindo que sejam chamados ao cumprimento do seu dever os delegados da Procuradoria da República, poderia depreender-se uma intenção diferente daquela que S. Exa. tinha ao pronunciar as suas palavras.

O Sr. Jorge Nunes declarou que não queria referir-se a quaisquer factos sôbre processos que êsses magistrados tenham tratado, mas sim à circunstância deles não terem promovido processo criminal ou levantado auto contra quaisquer pessoas que em lugares públicos têm ofendido os homens públicos da República.

Efectivamente temos de verificar a benevolência que tem havido para com êsses cavalheiros.

Não temos uma lei de imprensa que possa aplicar-se-lhes, fazendo-lhes assumir as suas responsabilidades e prestar contas à justiça.

Estas explicações foram necessárias para ver se o Sr. Ministro da Justiça, realmente, ou propõe a revogação pura e simples da lei do imprensa ou a sua modificação em termos de podem ter aplicação em tais casos.

Não desejo alargar as minhas considerações visto que vai passar-se à ordem do dia; portanto peço a V. Exa. que me reserve a palavra.

Rogo a S. Exa. o Sr. Ministro da Justiça o favor de transmitir ao Sr. Ministro do Trabalho as explicações que vou fazer.

O Sr. Presidente: — V. Exa. não pode continuar a falar. Se V. Exa. quiser inscrevo-o para falar amanhã.

O Orador: - Neste momento — e nisto não vai qualquer censura à presidência da Câmara, por quem tenho a maior consideração — V. Exa. não teve para comigo a mesma atitude que usou para com o Sr. Tavares de Carvalho. É com sentimento que o digo.

Aproveitou S. Exa. o estar no uso da palavra para fazer um requerimento.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Êsse requerimento não teve seguimento.

O Sr. João Luis Ricardo: Pedi a palavra para, em nome da comissão de previdência social, mandar para a Mesa um projecto para o qual peço a urgência.

A comissão de previdência social julgou o resultado do Congresso das Misericórdias.

Estudando o assunto, verificou-se que muitas das aspirações dêsse congresso podem, realmente, tornar-se numa realidade; e, assim, espero trazer à Câmara, amanhã ou depois, um projecto de lei nesse sentido.

Em nome da comissão de providência-social expus já ao Sr. Ministro das Finanças a necessidade que existe de o Estado acudir imediatamente às Misericórdias no sentido de lhes cobrir o déficit

Página 8

8 Diário da Câmara dos Deputados

até Dezembro findo, por isso que só muito tardo êsses estabelecimentos de assistência poderão obviar à situação desastrosa em que se encontram.

O Sr. Ministro das Finanças disse me particularmente que concordava com a minha proposta, aproveitando, para, socorrer as várias Misericórdias do País, a parte excedente dos rendimentos das loterias da Santa Casa do Lisboa.

Sr. Presidente: o assunto deve merecer urgentemente a atenção da Câmara; o por isso peço para esta proposta a urgência, solicitando ao Sr. Ministro das Finanças o obséquio do declarar a esta casa do Parlamento se concorda ou não com ela.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: declaro que concorda com o projecto mandado para a Mesa pelo Sr. João Luis Ricardo, estando igualmente de acordo com o pedido de urgência que S. Exa. apresentou para a discussão do mesmo, contando que essa discussão só faça simultaneamente com a da minha proposta.

Aproveito a ocasião para requerer que seja inscrito na primeira parte da ordem do dia da próxima sessão o parecer n.° 668-A.

O orador não reviu.

Foi aprovado o requerimento do Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à

ORDEM DO DIA

Foi aprovada a acta, sem discussão.

O Sr. Presidente: — Passa hoje o aniversário de uma data que ficou celebre na nossa história — a da batalha de La Lys.

Em homenagem à, memória dos que morreram nesse combato e a todos os portugueses mortos na Grande Guerra, eu proponho um voto de saudação ao exército português de terra e mar e que esta Câmara se associe à comemoração dos dois minutos de silêncio, às 17 horas.

O orador não reviu.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: êste lado da Câmara associa-se comovidamente à saudação por V. Exa. proposta.

A guerra é sempre um mal. Para nós ela foi um mal que está ainda actuando, posada e cruelmente, na nossa vida, na nossa economia e até nos nossos costumes.

Mas, a guerra revê aspectos, teve acontecimentos que deram ensejo a revelações e demonstrações que legitimamente nos satisfazem e nos orgulham.

Efectivamente nos manifestamos qualidades de tanto brilho que dir-se-ia que a nossa raça não decaiu.

O dia 9 do Abril foi para nós a data de uma derrota militar; mas nessa derrota os que directamente a sofreram demonstraram a sua valentia, o seu denodo o, dum modo geral, a noção bom nítida do cumprimento do seu dever.

Apoiados.

A essa saudação, portanto, êste lado da Câmara RO associa comovidamente.

Tenho dito.

O orador não revia.

O Sr. Garcia Loureiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar em nome dêste lado da Câmara, às homenagens prestadas por V. Exa. aos mortos da Grande Guerra.

Delegou em mim o Partido Republicano Nacionalista, o honroso encargo de falar em sou nome. Agradeço-lhe a distinção que se dignou conferir-me e de que dificilmente poderei desempenhar-me, por isso que a minha palavra sem brilho faz com que esta missão seja demasiadamente grande para a minha pessoa.

Sr. Presidente: é com aquela simplicidade com que se descrevem as cousas verdadeiras e os sentimentos reais, que eu vou falar,

É a arte que, nas suas variadas modalidades, perpetua a grandeza moral e intelectual de um povo.

Percorrendo as principais ruas e praças, vilas e cidades, encontramos a cada passo, monumentos como o do Jerónimos, a atestarem o valor do sempre do exército português.

Temos junto de Leiria o magnificou to templo da Batalha que sintetiza em si as brilhantes vitórias alcançadas desde 1383 a 1400, no reinado de D. João I.

Página 9

Sessão de 9 dê Abril de 1924 9

Em sucessivas batalhas, e muito, principalmente na de Aljubarrota, afirmou-se sempre a superioridade da arma de infantaria.

Nas lutas empenhadas contra Castela e mais tarde em Alcacer-Kibir, foi ainda, a infantaria que desempenhou a mais valorosa acção.

Depois, durante o período das invasões francesas, vimo-la ainda a praticar os mais extraordinários prodígios.

E tais foram êsses prodígios que numa ordem do exército, publicavam-se, os relatórios dos generais, ingleses, dos quais ressaltava a opinião de que a infantaria portuguesa era a melhor da Europa.

Na realidade, assim era. Napoleão êsse grande génio, não hesitou em confessar que com um exército como o português, venceria o mundo inteiro.
No campo da Flandres e em África ainda o exército português soube manter o brilho da sua gloriosa tradição.

No combate de 9 de Abril, lutou-se a ferro e fogo. Só à tardei é que o exército português, esmagado pelo número das tropas inimigas, mas vencedor moralmente, abandonou o campo.

E devemos salientar que as nossas fôrças se achavam depauperadas por uma longa permanência nas trincheiras.

Nesse dia Portugal alcançou com o sangue dos seus valentes soldados, uma página mais para a brilhante história portuguesa.

As nações não devem esquecer as datas gloriosas, da sua história e, assim, o Govêrno vai hoje, oficialmente à Batalha em homenagem de respeito aos soldados desconhecido que simbolizam o valor do exército de Portugal.

O orador não reviu.

O Sr. Carlos Olavo: - Sr. Presidente: o grupo parlamentar de Acção Republicana, que tem no seu seio alguns antigos combatentes à Grande Guerra, não pode deixar de associar-se comovidamente à homenagem que se presta a neste momento aos soldados que heroicamente se bateram no dia 9 de Abril.

Por minha parte, essa homenagem é tam sentida que no meu, espírito não poderão jamais desaparecer as horas emocionantes que vivi como modesto soldado dessa valorosa divisão que na defesa das

suas posições atingiu, as supremas alturas do heroísmo.

Vozes: — Muito bem.

O Orador: — Sr. Presidente: eu sou uma testemunha que depõe sôbre factos que presenciou.

Se até aí eu tinha do soldado português a idea que nos vem dos feitos gloriosos-que a história regista, daí por diante eu fiquei com a noção exacta do seu valor, da sua coragem, da sua resistência e do seu patriotismo.

Sr. Presidente: a batalha de 9de Abril foi a prova decisiva. Todos sabem, pelos relatórios dos comandos, pelo depoimento de muitos dos combatentes e especialmente pelo livro do general Sr. Gomes da Gosta, como estava reduzida a divisão portuguesa que naquele momento ocupava 8 quilómetros de linha de combate. De todos êsses escritos ressalta que, num dado momento, em Portugal se praticou o crime sem nome, de abandonar as tropas portuguesas que se batiam na Flandres, não enviando nem mais um soldado para render aqueles que lá estavam ou para suprir a falta daqueles que dia a dia caíam no campo de batalha.

É indispensável recordar êstes factos, para que se possa fazer aos homens dessa época a justiça que merecem.

É preciso, proclamar bem alto que a atmosfera que se estabeleceu em volta dos soldados que se bateram, e em volta da nossa intervenção na guerra, foi uma atmosfera de derrotismo e capitulação, e a tal ponto, que o quadro de honra que fora colocado numa das salas desta Câmara e em que figuravam os retratos dos parlamentares que tinham ido para a guerra foi apeado pelos homens que, por um golpe de audácia, nesse momento ocupavam as cadeiras do Poder.

Êsse estado de espírito de derrotismo não podia deixar de atingir o moral das tropas que se bateram, tanto mais que elas tinham perdido por completo a comunicação com â Pátria.

Sr. Presidente: eu ouvi-as maldizer, aqueles que as haviam abandonado; e presenciei depois quanto pode o coração simples e humilde do nosso soldado.

O 9 de Abril foi o maior e mais alto esfôrço das nossas tropas, em campanha,

Página 10

10 Diário da Câmara dos Deputados

Quem sabe o que foi essa batalha, que na nossa história ficará com o nome. «Batalha do Lys», verifica que ela representa para todos nós uma confirmação o uma esperança—a confirmação das virtudes superiores, da nossa raça, e a esperança dos dias gloriosos que hão-de vir.

Já aqui ouvi dizer que a batalha do 9 de Abril foi uma derrota.

Eu protesto com todas as minhas fôrças.

Na guerra moderna, «derrota» é a acção de que resulta o aniquilamento completo de uma das fôrças, e as tropas portuguesas não foram aniquiladas.

Pode falar-se das derrotas búlgara, romaica, mas não da derrota das tropas portuguesas.

E se as fôrças portuguesas não continuaram tendo a sua primitiva organização nas linhas da batalha, não foi isso devido ao 9 de Abril, mas sim ao procedimento dos homens públicos de então (Muitos apoiados) que deixaram perder o Corpo Expedicionário Português, que, embora fôsse a suprema representação da nossa Pátria, lá ficou por França abandonada como uma cousa odiada, que era preciso primeiro desacreditar e depois destruir.

Oxalá que a saudade pelos que caíram varados pelas balas inimigas e o exemplo daqueles que se bateram valentemente vivifique o nosso espírito, guiando-nos através da nossa continuidade histórica.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: passa hoje o sexto aniversário da batalha de Lys, tem que tantos dos nossos soldados, depois de se terem batido com bravura e heroicidade que são timbro da gente portuguesa, tombaram em terra estrangeira em defesa do prestígio o do bom nome de Portugal.

É-me grato por, neste momento, em releva o facto de o próprio marechal Hin-denburgo, comandante das fôrças inimigas, que no seu célebre livro sôbre a Grande Guerra havia escrito algumas palavras depreciativas do nosso esfôrço, não hesitar em reconhecer mais tarde que tanto os soldados como os oficiais se tinham batido valentemente.

Isto representa o reconhecimento, por parte do inimigo, do valor nunca desmentido das tropas portuguesas.

Sr. Presidente: a minoria monárquica, julgando que êste não é o momento oportuno para, apreciar a nossa intervenção na guerra, associa-se inteiramente à proposta de V. Exa.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Lelo Portela: — Sr. Presidente: é duro, às vezes, ser-se sincero. Mas eu sou militar e não sei falar senão a linguagem da verdade.

O 9 de Abril foi, de facto, uma derrota — embora uma derrota gloriosa — das armas portuguesas.

Sr. Presidente: para analisar as causas dêsse desastre material, temos evidentemente de ter em consideração a acção exercida pela política no decurso da guerra.

A guerra o a política estão intimamente ligadas, pois não há política separada da guerra, nem há guerra separada da política.

A guerra é o meio, diz um general, do que se serve a política para obter os seus fins e para atingir o seu objectivo.

As nacionalidades, por vezes, vêem-se na necessidade, depois do esgotados todos os recursos diplomáticos, de lançar mão da guerra.

A guerra, Sr. Presidente, é o meio político.

E, assim, resta-me saber se esse objectivo político que nos levou à guerra foi conseguido; resta-me saber se de facto nós obtivemos algumas vantagens dêsse objectivo político.

Neste momento, Sr. Presidente, o meu pensamento é para os mortos, para aqueles que no dia 9 do Abril souberam derramar o seu sangue pela Pátria.

Não é demais, Sr. Presidente, louvar o esfôrço de todo o povo português, pois a verdade é que êle soube obedecer às ordens dos seus Governos.

Sr. Presidente: será o momento de lembrar agora a propaganda deletéria que então se fez no País no sentido de deminuir o moral das nossas tropas.

Se na verdade é lícito lembrar essa propaganda deletéria, não menos lícito é lembrar a acção que as nossas tropas ti-

Página 11

Sessão de 9 de Abril de 1924 11

-veram no 9 de Abril, em que foram derrotadas; e a forma como essa derrota foi apreciada nos relatórios publicados.

A verdade é que essa derrota foi de tal maneira retumbante que não podemos deixar de nos curvar ante o esfôrço dêsses homens na Grande Guerra.

Decerto, Sr. Presidente, houve um objectivo político a atingir. Nós somos um povo pequeno em território e em habitantes; mas somos grandes porque nos fomos bater por uma causa grande, pela liberdade, pelo direito e pela justiça.

Sr. Presidente: a guerra terminou, o inimigo foi vencido; e eu pregunto a V. Exa. e pregunto ao país se o objectivo foi atingido.

O inimigo que foi vencido não cumpriu o tratado em que pôs a sua assinatura; e nós vencedores, não exigimos dêsse inimigo o cumprimento daquilo a que se obrigou.

O discurso será publicado na integra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.

O Sr. Lino Neto: — Honra às tropas de terra e mar e a todos aqueles que souberam morrer pela Pátria! A batalha de La Lys é um cemitério da Pátria.

Eu penso como o ilustre Deputado que há pouco falou, o Sr. Carlos Olavo, que á batalha de La Lys não foi uma derrota; porque derrotas são aquelas em que os objectivos não são atingidos. E, neste caso, foram-no.

Representa a batalha de La Lys um sacrifício? Sim; mas ouça a Câmara: a grandeza dos povos, assim como a dos indivíduos, fizeram-se sempre à custa de sacrifícios. E os nossos soldados luzitanos mostram-se iguais, senão superiores, aos soldados de todos os países.

Muitos apoiados.

Se sob o ponto de vista moral, esta data orgulha o coração dos portugueses, sob o ponto de vista político, a ela devem a solidificação do nosso domínio colonial e até o nosso destino através da História, que sempre se tem afirmado diverso do da Espanha. Ao passo que a Espanha, afastando-se da guerra, manifestou uma indiferença nacional, nós pertencendo; à civilização que tantas vezes defendemos através da- mesma história damos um exemplo de grandeza moral.

Por isso, eu não acompanho aqueles que dizem que a batalha de La Lys foi uma derrota!

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — São cinco horas: chegou o momento da invocação do soldado desconhecido. Peço à Câmara, que, de pé, se conserve em' silêncio durante dois minutos.

O orador suspendeu as suas considerações conservando-se a Câmara e as galerias de pé e em silêncio durante dois minutos.

O Orador: — Sr. Presidente: depois dêste silêncio profundíssimo em que a alma dos vivos vibram com a alma dos mortos, seja-me permitido dizer, que cumpramos o nosso dever honrando a nossa bandeira, símbolo da nossa Pátria, que foi à mesma que esteve em La Lys e em Aljubarrota que é a bandeira de nós todos: — é a bandeira da nossa Pátria.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar ao voto proposto por V. Exa. em homenagem àqueles que na batalha de 9 de Abril deram a sua vida e o seu sangue pela Pátria.

Todavia sou daqueles que entendem que esta data é mal escolhida para solenizar a nossa acção na guerra e aqueles que deram o seu sangue pela Pátria. E digo porquê.

Não posso de forma nenhuma deixar de ligar a esta data duas cousas que são absolutamente antagónicas: — aqueles que combateram lá fora pela sua Pátria e aqueles que na Pátria a atraiçoaram.

Entendo que se devem comemorar aqueles que deram a vida pela Pátria, e os seus esfôrços e valentia.

Há, porém, outra data que deve ficar marcada na história: é aquela em que os homens públicos levaram o país à guerra atravez de uma campanha de despeitos e traições, para combatermos pela justiça.

Essa é a grande data a comemorar: E senão vejamos, pela nossa história, senão vamos buscar os factos primaciais dela para os comemorar.

Página 12

12 Diário da Câmara dos Deputados

Recordo apenas uma data, a data de 1 de Dezembro de 1640. Não foi precisamente essa data que fixou a nossa independência; mas ela foi a princípio, a origem, a que se seguiram muitas batalhas e actos de valentia e coragem.

Nós temos na nossa história as batalhas de Montes Claros, Asseiceiras, e quantas outras, onde correu muito sangue, e se praticaram muitos mais actos de valentia e sacrifício, de que nessa data de 1 de Dezembro de 1640.

Mas é sempre esta data que comemora a independência de Portugal.

É por isso que eu sou de opinião que não é esta a data a comemorar.

É certo que, de todas as batalhas, a que hoje celebramos foi a mais importante. Se queremos comemorar essa data, façamos essa comemoração, mas só como sentimento de patriotismo, e de saudade pelos soldados que souberam dar à sua Pátria o seu sangue.

E mais nada.

Quando se fala no 9 de Abril ligo logo a esta data dois factos que não posso esquecer: — uns batiam-se em França, dando o seu sangue pela Pátria, e outros divertiam-se em S. Carlos, vendo os bailados russos.

Nós temos que apreciar nitidamente a política dos que quiseram a guerra, e a política dúbia dos que a não quiseram.

Diz o Sr. Lino Neto, que foi o 9 de de Abril que marcou-a separação de Portugal da Espanha ante o conflito.

Mas, a grande data foi essa: foi a da entrada na guerra por parte de Portugal.

Veja-se até que ponto os homens públicos do nosso País querem confundir nesta data as duas correntes de opinião a dos que quiseram a guerra e a dos que não a quiseram.

Estou certo $e que, nesta hora em que recordamos êsses homens que se souberam bater, se existem as almas dêsses dois soldados desconhecidos, elas hão-de sentir como eu.

Termino, dizendo a V. Exa., Sr. Presidente: que me associa ao voto que foi proposto em homenagem àqueles que se bateram pela Pátria..

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Br. Presidente do Ministério, Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): -
Sr. Presidente: pedi a palavra para em nome do Govêrno me associar ao voto de saudação às fôrças de mar e terra, e à homenagem a prestar aos militares falecidos nas campanhas em França e em África.

Reconheço que a data de 9 de Abril foi bem escolhida para tal manifestação, porque essa data não foi um desastre como muitos julgam, e antes uma exaltação do nosso esfôrço, muitas vezes superior ao que seria possível esperar.

Conseguiu demonstrá-lo o capitão Nuno Antunes, que, dirigindo-se ao marechal Hindenburgo, alcançou que êle escreveu-se palavras de justiça para os soldados portugueses, rectificando o que anteriormente havia escrito no seu relatório:

É, na verdade, uma data bem escolhida.

Não apoiados.

Apoiados.

É uma data que recorda a nossa vitalidade, e que pode ser inscrita nas páginas de ouro da história militar portuguesa. Ela não deslustra nada o nosso exército.

A guerra actual não tem as cousas espectaculosas das guerras antigas.

É muito diferente.

Uma retirada do exército não constitui ama situação desgraçada para êle, mas sim uma página digna de louvor.

Temos o prazer de nos associar ao voto proposto.

O orador não

O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara considero aprovado por unanimidade o voto proposto.

Vai realizar-se a interpelação do Sr. Vitorino Guimarães ao Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Vitorino Guimarães: — Sr. Presidente: embora não possa dar a minha concordância à série de medidas de ordem económica e financeira que tem sido promulgadas pelo actual Govêrno, não quero neste momento referir-me senão ao diploma publicado em 11 de Fevereiro que modifica as condições do empréstimo de 1923, empréstimo êsse que tinha sido cometido à sombra da lei n:° 1:424, que

Página 13

Sessão de 9 de Abril de 1924 13

(não é demais recordá-lo neste momento) é da responsabilidade dêste Parlamento.

Apoiados.

O meu intuito ao fazer esta interpelação, tendo responsabilidades na promulgação dêsse decreto — responsabilidades que não enjeito, porque ainda hoje me não arrependo de o ter feito — e determinado não só por êste motivo, mas porque factos novos se produziram durante o espaço de tempo em que foi anunciada a interpelação, até hoje.

Posteriormente, foi publicado o decreto n.° 9:900 em que à sombra da autorização dada para legislar sôbre câmbios, o Govêrno publicou uma nova base de um acordo a realizar com o Banco de Portugal, que novamente vão modificar várias disposições da lei n.° 1:424.

Parece-me que não deve a Câmara estranhar á minha atitude e antes achá-la coerente e correcta.

Devem-se lembrar todos de que, apenas tive conhecimento no dia 11 de Fevereiro, pela imprensa, do decreto que no mesmo dia fui publicado no Diário do Govêrno, neste mesmo lugar lavrei logo o meu protesto veemente contra o acto praticado, considerando-o, como ainda hoje o considero um êrro praticado contra os interêsses nacionais.

Não é de estranhar que nesse momento não tivesse levado mais longe o meu protesto. Desejei fazê-lo; mas reconheci também que não tinha inteira liberdade de acção.

Militando num partido político, reconheci que quem se filia num partido tem antes de tudo obrigação de abdicar em grande parte do seu modo de ver pessoal. Se assim não fora, mal iria a essa colectividade.

Além disso, dava-se o caso de eu desempenhar dentro dêsse agrupamento funções dirigentes, visto fazer parte da sua junta parlamentar. E mal parecia que, depois do o Partido de que faço parte ter lealmente prometido o seu apoio ao Govêrno, eu viesse abrir um parêntesis intempestivo nesse auxílio que ao Govêrno estava sendo prestado:

Disse aos meus correligionários a minha situação, pedindo escusa dessas funções que desempenhava; mas êles, numa delicadeza de atenções, negaram-me essa escusa, mas deram-me a liberdade para

poder tratar livremente aqueles actos do Govêrno de que eu discordasse.

É isso que vou fazer. E, embora possa ter discordado de mais alguns dos actos
praticados pelo actual Govêrno, não me referirei a outros que não sejam aqueles
que me puseram em causa.

Sr. Presidente: na interpelação que vou fazer, com a qual julgo que cumpro o meu dever do patriota o de republicano, apenas procurarei demonstrar as razões que houve no procedimento que segui quando desempenhei o cargo de Ministro das Finanças.

Não é meu intento ser desagradável ao Govêrno a cujos intuitos patrióticos presto à, minha homenagem, nem também me move qualquer paixão política, o que na hora grave que passa seria verdadeiramente criminoso.

Sr. Presidente: a avaliar pelas numerosas notas oficiosas que têm sido publicadas na imprensa, parece que é objectivo do Govêrno suprimir, ou pelo menos atenuar duma forma considerável, o déficit orçamental, o actuar directamente na situação cambial, estimulando as exportações e limitando as importações.

Sendo, na verdade, êstes os objectivos do actual Govêrno, poderá dizer-se afoitamente que elo não se afasta do critério dos governos do Partido a que me honro de pertencer.

Simplesmente, como há diversos meios para atingir o mesmo fim, eu discordo dos meios adoptados por êste Ministério.

Sr. Presidente: eu creio não praticar nenhuma injustiça para com o meu querido amigo Sr. Álvaro de Castro, dizendo que S. Exa., no caminho seguido até agora, tem abandonado muito o futuro.

S. Exa. preocupa-se domais com o dia presente, com as dificuldades de momento, em prejuízo do que pode vir a ser o dia de amanhã.

Eu tenho um critério completamente diverso. Acho que um homem de Estado» deve preocupar-se muito com o futuro da Nação e ter nina grande previdência.

É que eu estou na boa razão demonstram-no os factos que se estão passando.

A situação que hoje atravessa o mundo inteiro é tam grave e cheia de dificuldades, que as medidas tomadas agora e que se apresentam acertadas o inteligentes.

Página 14

14 Diário da Câmara dos Deputados

podem daqui a algum tempo de nada servir.

Poderia, a êste respeito, citar numerosos exemplos; más. basta aludir ao que se passou com a Tcheco-Slováquia que, apesar de ter à frente das suas finanças uma criatura de alta envergadura que realizou uma obra verdadeiramente extraordinária, necessitou de dois anos para que os resultados da sua política económica pudessem apreciar-se. E note-se que na Tcneco-Slováquia não houve nenhuma solução de continuidade na obra financeira dos seus governantes.

Entre nós, infelizmente, vemos em cada homem que vai ocupar a pasta das Finanças uma orientação nova e diferente. Assim nunca podemos chegar a ver os resultados duma medida. Não há coesão de ideas, não há concentração de esforços; e, a continuar-se desta forma, creio que não há maneira alguma do resolvermos a situação difícil que o país atravessa.

O meu sistema é ou governar ou deixar governar, os outros.

Sr. Presidente: o decreto que modifica as. condições do empréstimo de 1923 é, mesmo para os espíritos simplistas e menos, conhecedores do assunto, tudo quanto há de mais pernicioso. E eu faltaria ao cumprimento dos meus deveres se não levantasse contra êle o meu protesto e não impusesse a minha maneira de ver a seu respeito.

Sr. Presidente: foi em 12 de Janeiro de 1923 que eu tive a honra de apresentar nesta casa do Parlamento o projecto de lei para a emissão do empréstimo, que depois foi convertido em lei.

Sr. presidente: não é sem mágoa que eu vejo ainda nas ruas, da cidade afixados nas paredes êsses prospectos que eu, como Ministro da República, em nome da Nação, e devidamente autorizado pelo Parlamento, anunciava a nacionais é estrangeiros as condições em que êsse empréstimo se fazia. E, Sr. Presidente, foi em 11 de Fevereiro dêste ano, isto é, sete meses depois da emissão do empréstimo, que apareceu, um decreto modificando absolutamente os compromissos que perante o mundo, e em nome da República portuguesa, se haviam tomado: transformando o empréstimo ouro em escudos e reduzindo os juros dêsse empréstimo.

Êste acto, Sr. Presidente, praticado pelo Govêrno, é, na verdade, indefensável sob o ponto de vista dos interêsses financeiros do país, pois a verdade é que era a primeira grande operação que era realizada pelo regime republicano.

Nestas minhas palavras, Sr. Presidente, não vai - e S. Exa. sabe-o muito bem - a menor intenção de o agravar. A verdade é que S. Exa., pelos muitos afazeres da sua pasta, pode não apreciar bem todas as questões; mas a verdade é que o acto praticado por S. Exa. foi ilógico em face do objectivo que se procurava alcançar.

Um tal empréstimo tinha para muitos o grande defeito de ser o primeiro que se contrata sem recorrer a banqueiros. Era o primeiro empréstimo que o Estado lançaria directamente ao público.

Li detidamente os relatórios e decretos relativos a êste assunto, e colhi a impressão de que não se chegará a obter o objectivo que se tem em vista.

É o Sr. Álvaro de Castro uma pessoa por quem eu tenho ,a máxima consideração, a qual vem da circunstância de reconhecer toda a sua honestidade, toda a, inteligência e toda a sua dedicação republicana. Das minhas palavras não pode ficar no espírito de S. Exa. qualquer ressentimento que faça esmorecer os laços de amizade que nos prendem desde os bancos das escolas.

Não hesito, nestas condições, em declarar que se doutra pessoa se tratasse, que não de S. Exa., eu poderia ser levado a acreditar que o seu principal fim, com a promulgação dos seus decretos, era inutilizar um critério político e financeiro, que tendo toda a razão de ser podia, se não houvesse solução de continuidade, resolver, pelo menos em grande parte a situação financeira do país.

Todos sabem que na actualidade, de preferência a quaisquer fórmulas utilataristas, é geralmente o respeito pelos princípios morais que traz às sociedades aquela confiança necessária para vencerem a grande crise que atravessam.

Infelizmente o decreto que reduz o juro do empréstimo de 1923 ofende as leis que regulam a moral dos contratos.

Em 1914 o primeiro Ministro do Império Britânico protestando perante o mundo contra o procedimento do Império Alemão que negava a validade dos contra-

Página 15

Sessão de 9 de Abril de 1924 15

tos, afirmando que êles eram bocados do papel sem valor, dizia que pedaços de papel eram as notas do Banco de Inglaterra, e nom por isso deixaram do ser recebidas em toda a parte sem contestação.

São decorridos já dez anos e os factos vim dar razão ao primeiro Ministro inglês. A situação presente não é melhor que a daquela época, porque infelizmente os males que a guerra gerou não os remediou a paz, antes os agravou. Daí resulta, ligar-se cada vez maior importância ao cumprimento exacto de todos os deveres.

É nesta orientação que uma grande autoridade financeira inglesa, no seu último livro sôbre o Orçamento, quando se refere às dívidas provenientes dos créditos, diz o seguinte:

Leu.

Estas palavras são inteiramente exactas e oportunas. Hoje mais do que nunca, sem o respeito pelos compromissos tomados, não pode existir confiança de Estado para Estado nem dos cidadãos, para com o Estado.

O que não se compreende, Sr. Presidente, é que, tendo o Parlamento aprovado essa lei para a realização do empréstimo, o depois do êle estar tomado, viesse sete meses depois o Sr. Presidente do Ministério modificar por completo os compromissos tomados para com o Pais e com a agravante, necessário é dizê-lo, dêsse empréstimo ter uma característica muito especial, isto é, de êle ter sido na sua maior parte tomado por indivíduos que não possuem fortuna, aplicando apenas as suas pequenas economias.
E facto averiguado que nas listas distribuídas não figuram lá os grandes potentados, os grandes financeiros e os grandes proprietários.

Foi, Sr. Presidente, na verdade um êrro tremendo o acto praticado pelo Govêrno.

Pois a verdade é que, não havendo hoje meio do realizar um empréstimo senão com estas características, ou outras semelhantes, difícil será, senão impossível, realizar-se qualquer outro empréstimo amanhã, se necessário fôr, visto que o Estado modificou por completo os compromissos que havia tomado.

Digo isto, Sr. Presidente, cora verdadeira mágoa, pois a verdade é que, sen-

do um homem do bom e honrado, não mais poderei voltar a ocupar aquelas cadeiras, visto que o Estado Português não cumpriu os compromissos que havia tornado.

De facto, Sr. Presidente, não mais poderei voltar a ocupar aquelas cadeiras; de facto e na verdade, sob o ponto de vista pessoal, não tenho razão alguma para efectivamente estar magoado, estou-o no emtanto o profundamente, como português e republicano.

Sr. Presidente: dizia eu que devia respeitar-se os contratos. Mais do que isso, acho ilógico o acto para afixação do câmbio de 3/8.

E a meu ver o mais alto pendão do descrédito que pode erguer-se, dizendo que da parte do Govêrno não há confiança nas medidas que vai promulgar para resolver a questão cambial. Por um lado estabelece-se a doutrina verdadeiramente peregrina do que nada valo o ouro que não está nas mãos do comércio, tendo quási como seguro o estabelecimento do crédito comercial, e ao mesmo tempo diz-se que isso não deve dar resultado porque nem sequer há aquela esperança de que venha a restabelecer-se uma divisa cambial mantida durante tanto tempo.

Na verdade bem mesquinha é a economia que o Govêrno vem fazer.

É preciso não se esquecer que do empréstimo estavam apenas colocadas na praça 3.400.000 libras.

Nestas condições a única economia resultante do decreto n.° 9:416 é a seguinte:

Leu.

Multiplicando esta diferença por 340:000 títulos, obtemos uma economia de 3:180 contos, ou sejam 870 contos, por trimestre.

É esta de facto, até agora, a economia real realizada pelo Govêrno com a promulgação daquele decreto que tamanha perturbação nos trouxe.

Ninguém pode, sob qualquer raciocínio, juntar a êstes 3:480 contos a verba do 31:603 contos só a dispender no caso da emissão e colocação no mercado de 4.000:000 de libras da 2.ª série, que não pode ser considerada despesa senão quando der origem à receita extraordinária do mais do 90:000 contos, além da amortização do igual quantia na circulação fiduciária existente.

Página 16

16 Diário da Câmara dos Deputados

Ninguém pode, também, sob qualquer raciocínio juntar a êstes 3:480 contos verba correspondente a títulos que estão na posse do Estado, porque recebendo os juros respectivos não oneram, desta forma, o Orçamento Geral do Estado.

Assim a apregoada economia de mais do 35:000 contos cifra-se uma forçada economia de 3:500 contos ou seja por trimestre 890 contos!?

Efectivamente nos momentos de crise nacional é natural que o Govêrno lance mão dos meios extremos, mas de uma maneira geral e não como no caso presente.

Um dos compromissos tomados era que nenhum imposto, presente ou futuro, sobrecarregaria êste empréstimo.

Sr. Presidente: eu sei o que dizem vários tratadistas sôbre o alcance que se tem dado a esta palavra, e que, sôbre a questão dos juros, muito haveria a dizer; mas o que 6 certo, é que a redução dos juros, não foi mais do que um imposto especial e excepcional.

Eu não a posso considerar de outra maneira.

Eu não quero demorar-me muito a fazer citações sôbre o que se tem passado na Europa o na América sôbre impostos; o que posso porém dizer é que na América, embora no orçamento do ano passado se inscrevam certos impostos novos, pela sua legislação não deixa de cumprir aquilo a que se obrigou.

Nós desejamos imitar muito a orientação política da França e da América e outros países; mas é pena que só imitemos o que é mau, e não o que é bom, dêsses figurinos.

Ainda há pouco vi nos jornais os esfôrços extraordinários feitos pelo Sr. Poincaré para acudir à desvalorização da moeda, tendo sido tomadas medidas de carácter riscai o tributário, talvez, as mais violentas, para remediar essa situação.

Foi aberto, porém, uma excepção de imposto sôbre os títulos de defesa nacional que é uma medida de salvação pública.

Segue-se ali pois uma política exactamente contrária àquela que nós seguimos.

Em meu entender, o que havia a fazer era honrar cada vez mais o crédito do Estado; e essa medida do Sr. Álvaro de Castro, teve uma orientação oposta.

Quando tive a honra de apresentar nesta Câmara a proposta do empréstimo interno, não pude convencer o Sr. Barros Queiroz na questão do juro que havia de ser pago.

Efectivamente o caso foi aqui discutido, mas foi esquecido que o Estado tinha ao seu alcance meios para remediar as inconvenientes da questão, por isso que reservara para si 5/8 do quantitativo de títulos autorizados a emitir, podendo-as lançar no mercado quando julgasse mais conveniente.

Nestas condições, quando estivesse lançadas a totalidade do empréstimo, seria a média das importâncias recebidas.

Sr. Presidente: o que se tornava urgente fazer era não lançar suspeitas que atemorizassem os prestamistas, e antes efectuar a imediata troca dos títulos provisórios pelos títulos definitivos, para que uma vez feito isto podesse vigiar a cotação dos títulos nas praças estrangeiras, e aproveitasse as suas melhores cotações, para, para o mesmo encargo, recolher maior soma de escudos, como receita, e como amortização da sua circulação fiduciária.

Eu já tive ensejo de dizer nesta Câmara, quanto perigoso seria realizar um empréstimo que fizesse entrar repentinamente uma grande caudal de ouro para o País, e originasse uma melhoria cambial muito brusca, visto que, teríamos mais tarde de pagar em escudos valorizados, os escudos desvalorizados que tinhamos recebido.

Porém, em vez de se efectuar o que há pouco disse, sucedeu o seguinte:

Leu.

Deve em tudo isto haver uma causa que tivesse influído no espírito inteligente do Sr. Ministro das Finanças.

Leu.

E preciso ler e reler este relatório; porque a primeira impressão não se compreende bem o que escreveu nele.

Por exemplo esta passagem:

Leu.

Esta é que é a razão fundamental. E confesso que poucas vezes como ao ler estas palavras eu tenho sentido uma tam grande tristeza, uma tristeza tam interior e profunda.

Há papéis de crédito do Govêrno Português que estão na mão dos argentários

Página 17

Sessão de 9 de Abril de 1924 17

e que podem, era dada ocasião, exercer pressão sôbre os Governos que pouco se preocupem com os interêsses do Estado e da colectividade.

O pagamento de juros é de 30 milhões de libras, mas pagar um só dia. Mas neste caso a média é do câmbio durante um trimestre. Estão a ver o que tudo isto dá...

Como é triste esta circunstância!

E como êstes documentos nós o sabemos são lidos no estrangeiro, que idea se fará da nossa mentalidade!

Os argentados, especialmente, sabem bem que um empréstimo, em que pelo menos a décima parte da emissão é ouro, tem a característica do câmbio.

Quero também chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para as conseqüências que muitas vezes podem advir das afirmações que se fazem.

É pena que S. Exa., que tem demonstrado qualidades de energia que já lhe conhecíamos, no exercício da suas funções, não tenha sido melhor orientado, obedecendo a um plano preconcebido.

S. Exa. com as suas faculdades de trabalho podia bem ter seguido nas resoluções que tomou.

Podia ter feito uma obra mais útil e proveitosa para o País.

Parece, pelas palavras de S. Exa., que já não pensa em tornar extensiva ao ouro essa disposição.

E eu chamo a atenção de V. Exa. para a especulação que pode ter lugar, e para os efeitos que isso podia ter, dando margem a fazerem-se lucros fabulosos.

Sr. Presidente: permita V. Exa. que aproveite a ocasião para chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério, a fim de que desconfie dos constantes alvitres e prometimentos de ajuda que a alta finança todos os dias lhe faz, e que são ditados, segundo ela diz, na defesa dos sagrados interêsses do Estado.

Eu não quero fatigar demasiadamente a atenção da Câmara, o por isso vou encurtar o mais possível as minhas considerações.

Todavia, permitam-me V. Exas. que eu releia uns períodos da proposta de empréstimo que tive a honra do apresentar nesta Câmara em 2 do Janeiro. São os seguintes:

Leu.

Como a Câmara vê, era esta a maneira que nós tínhamos de fazer face à situação que se nos deparava; e esta proposta devia ser seguida de outras medidas de ordem financeira e económica.

Foi nesta instrução que eu apresentei a proposta do empréstimo.

Mas, como V. Exas. sabem, algumas medidas que depois apresentei nem sequer obtiveram parecer da comissão, devendo acrescentar que êsse trabalho não resultou de todo improfícuo.

Mas não resultou improfícuo o que se fez então, porque se não fôsse a lição de alguns meses o actual Govêrno talvez não tivesse conseguido as autorizações que o Parlamento lhe tem votado, porque todos nós reconhecemos que devem melhorar as condições em que se encontra o País.

Eu votei essas autorizações. Não as irei atacar porque as acho necessárias; mas para serem completas era necessário que houvesse antes um plano concebido e que nós soubéssemos o que o Govêrno vai fazer.

Mal parece que o Parlamento lhe tenha votado essas autorizações e não saiba o que delas pode o Govêrno fazer.

Ninguém melhor do que eu faz justiça ao Sr. Ministro das Finanças, reconhecendo que lhe não sobeja o tempo para longos debates.

Mas eu vou, daqui a pouco, dizer o que penso; e talvez S. Exa. lhe encontre alguma cousa de aproveitável.

Quando apresentei a minha proposta para o empréstimo era esperança minha que ola fôsse convertida em lei nos fins de Abril.

Se assim tivesse acontecido, a situação seria diversa.

Eu não quero censurar o Parlamento pelo seu procedimento; mas por sua culpa o empréstimo só foi realizado em Junho e a mudança de Abril para Junho foi o pior que poderia acontecer.

Temos ao mesmo tempo que pagar as contas no estrangeiro — e daí o principal agravamento das despesas do Estado.

Depois, em conseqüência da lei que aumentou os vencimentos ao funcionalismo, houve necessidade de lançar na praça mais de 50 por cento do empréstimo.

Sr. Presidente: as disponibilidades do Tesouro, em Junho eram de:

Leu.

Página 18

18 Diário da Câmara dos Deputados

Efectivamente, eu tinha ouro para ocorrer a tudo; mas o empréstimo tinha de ser lançado e nós não podíamos proceder por outra maneira.

Só havia o processo de recorrer à circulação fiduciária; mas isso era mau, pois trazia a desvalorização da moeda, o que ora muito pior do que o juro.

O Govêrno aumentou de uma maneira apreciável o juro dos bilhetes de Tesouro, mas achou isso preferível a aumentar a circulação fiduciária.

Eu confiei nesse empréstimo e ainda hoje confio.

O empréstimo foi lançado em fins de Junho, ainda estivo no Govêrno até meados de Agosto. Nos meses de Julho e Agosto tive esperanças de que algumas medidas seriam votadas. Era também para esperar uma melhoria, o anúncio que me faziam de que o ano cerealífero era bom. Parece que até a própria natureza vinha em nosso auxílio. Pois até isso se desprezou.

Autoriza-se a importação de trigo de uma maneira tam desordenada que determina a saída, dentro OJIJL pouco, de 600 mil libras. É claro que não há planos que possam cumprir-se em presença de toda a espécie de dificuldades levantadas a todo o momento.

Mas, apesar de tudo, de tal maneira se havia estabelecido o princípio na confiança no Estado, que o câmbio que estava a 2 quando entrei para o Ministério, ficava, quando abandonei o Poder, numa divisa, mais elevada, notando-se que durante o ano que estive no Ministério se deram dois aumentos de circulação fiduciária. É que de alguma cousa ainda serve inspirar confiança e haver respeito pelo crédito do Estado.

A Bélgica tem feito uma grande obra na diminuição da sua circulação fiduciária; mas, apesar disso, ainda não conseguiu de maneira alguma resolver a sua situação, porque não lhe foi possível por enquanto obter a confiança precisa.

Mas, posso ainda apresentar um outro exemplo, talvez melhor do que o da Bélgica. Refiro-me à Roménia que, tendo uma vez suspendido os seus pagamentos de nada lhe valeu ainda a obra financeira que depois disso tem realizado.

Sr. Presidente: talvez não pareça muito a propósito repetir mais uma vez os

motivos que me levaram a seguir essa política da emissão do empréstimo; mas eu devo afirmar que o objectivo que tive em vista foi aquele que entendo dever ser hoje o do Govêrno, isto é, o de atenuar a carestia da vida.

Eu tenho sôbre êste assunto um critério um pouco diverso do de muitas pessoas, o assim sou de parecer que não existe no nosso País o problema da carestia da vida, mas sim o da desvalorização monetária o crise cambial.

A carestia da vida não é mais do que o reflexo dessa desvalorização da moeda e só poderá evitar-se com a vinda ao mercado dos valores-ouro que, sendo português, estão no estrangeiro.

É, portanto, indispensável, estimular a exportação e restringir a importação.

Quanto à exportação, só lenta e gradualmente a podemos desenvolver; mas quanto ao problema da importação, êsse é que me parece ser de fácil resolução, visto que a metrópole e as colónias podem produzir muitos dos principais artigos que levam para o estrangeiro a maior parte do ouro português.

As medidas que o Govêrno de que fiz parte tomou, acerca da exportação, deram bom resultado e levaram-nos a crer que não é muito difícil realizar a obra que preconizo.

A nossa exportação pode computar-se em 15 milhões de libras, incluindo a de Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné.

Segundo os dados estatísticos que possuo para 1922, a nossa importação foi a seguinte:

Leu.

Desde que se conjuguem os esfôrços da metrópole com os das colónias, numa obra de conjunto, nós podemos fazer com que Portugal entre em melhores dias.

Agora tem razão o partido do Sr. Jorge Nunes, pedindo que se faça êsse sacrifício pela Pátria e que só trabalhe para que o País se salve; mas não vejo modo de melhorar essa situação.

Talvez estejamos a apresentar uma espécie de programa; mas, fazendo-o, não fico mal colocado, desde que o Sr. Presidente do Ministério disse que era preciso saber para onde caminhamos, porque todos faziam críticas mas ninguém queria apresentar remédios.

Página 19

Sessão de 9 de Abril de 1924 19

O trabalho que vou apresentar é só de minha responsabilidade pessoal; e, estando filiado num partido, procurei dar-lhe uma orientação democrática que é a feição dêsso partido.

Tinha obrigação de apresentar êste trabalho, para que o Sr. Presidente do Ministério, se quiser aproveitar alguma cousa dele o faça e não diga que estamos aqui só para destruir.

Sr. Presidente: entendo que se devo trabalhar para aumentar em gerai a produção, criando maior riqueza e tornando-nos mais independentes dos mercados estrangeiros.

Eu digo o seguinte ainda:

Leu.

Sr. Presidente: para fazer isto na parte financeira, seria necessário a redução do desposas públicas, e também o aperfeiçoamento do actual sistema tributário, para garantir a produtividade do imposto, atendendo também ao imposto pessoal.

Quando se discutiu o novo regime tributário não havia o necessário pessoal o ss o devia-se reconhecer.

Efectivamente, quando só faz uma reforma tributária é necessário ver quanto custará o pessoal necessário e qual o futuro rendimento.

Não se fazendo isso assim, é legislar no ar.

Transitoriamente temos de tomar medidas sôbre a contribuição industrial do seguinte modo:

Leu.

Será necessário estabelecer ainda outras formas de impostos nas indústrias para que não haja dificuldades na cobrança.

Sr. Presidente: até aqui as minhas considerações limitaram-se à parte propriamente do crédito relativa a modificação das condições do empréstimo de 1923.

Largo tempo decorreu entre o anúncio da minha interpelação o a sua realização. Durante êsse período de tempo factos vários se produziram dos quais divulgo inteiramente o aos quais eu não posso deixar do mo referir, embora ligeiramente, de tal forma filós se ligam ao assunto da minha interpelação.

Quero referir-me, em primeiro lugar, ao decreto n.° 1:505. Não voa impugnar a medida tomada pelo Govêrno. Conheço do porto as necessidades do Estado e sei,

por isso, que muitas vezes se impõe a necessidade de lançar. Mão de medidas desagradáveis,

Em todo o caso não posso deixar de chamar a atenção da Câmara para algumas circunstâncias que me merecem creio que justos reparos.

Mal foi que o Govêrno não tivesse exercido sôbre o Banco de Portugal aquela enérgica e decidida acção que tem desenvolvido em volta do outras questões e do outras entidades, porque se tal se tivesse dado os resultados alcançados teriam sido, sem dúvida, mais vantajosos do que na realidade foram.

É preciso que nos convençamos de que este problema das relações do Estado com o Banco de Portugal não pode ser resolvido com simplismo, mas sim mediante um estudo profundo e um franco desejo de acautelar os interêsses do Estado.

Eu faço justiça ao Sr. Álvaro de Castro, acreditando que S. Exa. ao publicar o decreto de 11 de Fevereiro estava mal informado sôbre as faculdades do Tesouro o sôbre os meios que tinha à sua disposição. E acredito nesse êrro de informação, porque estou absolutamente convencido do que, a não ser assim, S. Exa. não teria publicado êsse decreto.

Para melhorar a situação cambial procurou o Govêrno em 11 de Fevereiro:

Leu.

Êste é o programa que o Sr. Álvaro do Castro promete realizar em relação ao Banco. Não terei que lhe mover grande combate. Simplesmente entendo que por tam pouca cousa não valia a pena travar um duelo com o Banco.

Vejamos agora quais foram os resultados obtidos. Quanto à prata, eu sempre achei grande êrro o não se ter promovido a sua venda há mais tempo.

O Banco nada perdia, mas também não ganhava nada.

Como nada ganhava, não prestou ao Estado as facilidades que poderia dar-lhe.

Como o interêsse era só para o Estado, o Banco nada cedeu.

Assim o Banco, Sr. Presidente, não apresentou nenhumas dificuldades; é foi lógico até certo ponto na sua cedência, pois é ao Estado, e não aos Bancos emissores, que compete decidir acerca da pó-

Página 20

20 Diário da Câmara dos Deputados

lítica financeira que melhor convém à economia da Nação;

Se na verdade mais uma vez os objectivos foram atingidos é porque directamente visaram o próprio Estado e apenas indirectamente atingiram o Banco de Portugal.

Já a 22 do Fevereiro findo, apenas onze dias depois da primeira publicação, aproveitando-se mais uma vez a conhecida fórmula «por ter saído com inexactidões» novamente se publicou no Diário do Govêrno o decreto n.° 9:418; mas já o director geral da Fazenda Pública não fica fazendo parte do Conselho Fiscal do Banco de Portugal, nem são modificados os estatutos e regulamento administrativo do mesmo Banco.

Apareceram as bases do novo contrato, e verifica-se por elas que a submissão é completa: nem representante no Conselho Fiscal, nem alteração dos estatutos, nem modificação anti-contratual do capital realizado nem igualdade de procedimento para com o Banco de Portugal relativamente a quaisquer imposições que venham a fazer se às entidades que negoceiam em cambiais.

É desnecessário fazer sobressair o que isto representa de importante e de vantajoso para o Banco.

Não nego a justiça desta concessão, mas a verdade é que não passo deixar de tirar êste corolário.

Devo dizer com toda a sinceridade que não vejo uma única disposição que redunde em benefício do Estado. Vejo, apenas, satisfeitos todos os desejos do Banco. Sr. Presidente: não desejo alongar as minhas considerações e vou, por isso, terminar pedindo ao Sr. Ministro das Finanças que tome as minhas palavras por aquilo que elas realmente valem e nunca pelo propósito de estabelecer confrontos entre a obra de S. Exa. e a minha.

Tem demonstrado o Sr. Álvaro de Castro no desempenho dos altos cargos que exerce uma rara e persistente energia.

Não tenho senão de louvar S. Exa. apor êsse motivo.

Todavia S. Exa. que se não deixe arrastar por aplausos que nem sempre são sinceros e que partem, muitas vezos, não se sabe de que lado.

Sr. Presidente: não sei que ataques

contra as liberdades públicas nos ameaçam.

Só temos, para nos salvar, a fôrça da democracia; mas para isso é necessário que o Sr. Presidente do Ministério, que tem mostrado energia, deixe que lhe diga: oriente essa energia bem.

Sr. Presidente: deixe-me V. Exa. terminar citando à Câmara e a todos, apenas como um conselho, sem intuitos de agravar quem quer que seja, as palavras de Alexandre Herculano a respeito dos homens políticos do seu tempo.

Escrevia êle o seguinte:

Leu.

Sr. Presidente: termino, mandando para a Mesa um projecto relativo ao pagamento dos juros do empréstimo de 6 1/2 por cento.

E em ocasião oportuna pedirei à Câmara a urgência e dispensa do Regimento para o mesmo projecto.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se ao período de antes de se encerrar a sessão.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Sampaio Maia: — Sr. Presidente: desejo chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o modo como tem sido aplicada a contribuição industrial no concelho da Feira, que tenho a honra de representar nesta casa do Parlamento.

Sr. Presidente: verificando as colectas lançadas a vários contribuintes, vejo o seguinte:

Leu.

Assim chamo para o caso a atenção do Sr. Ministro das Finanças.

Sr. Presidente: que paguem todos os que devem pagar; mas não se faça política dêste modo no concelho da Feira.

Os primeiros seguem a política democrática.

Os outros, que seguem a política do meu partido, foram colectados com as importâncias que indiquei.

Página 21

Sessão de 9 de Abril de 1924 21

Chamo, pois, para o caso a atenção do Sr. Ministro das Finanças.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — E simplesmente para declarar que tomei em atenção as palavras do Sr. Deputado que acaba de falar e que vou dar as necessárias providências.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanha, sendo a ordem dos trabalhos a seguinte:

Antes da ordem do dia: A que estava marcada.

Ordem do dia:

Interpelação do Sr. Vitorino Guimarães.

Proposta de lei n.° 668-A, que eleva, respectivamente, a 30 e 40 por cento os adicionais criados pelo artigo 68.° da lei n.° 1:368.

Pareceres n.ºs 642-C, 616-E, 615, 447 e 568, que estavam marcados.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Documentos mandados para durante a sessão

Projectos de lei

Da comissão de previdência social, autorizando o Govêrno a liquidar os deficits de gerência existentes e referentes até 31 de Dezembro de 1923 em certas Misericórdias do País pela verba constante do artigo 51.° do capítulo 4.° (lucros das lotarias) do Orçamento em vigor.

Aprovada a urgência.

Para a comissão de finanças.

Para o «Diário do Governo».

Do Sr. Lourenço Correia Gomes, isentando de direitos de importação, durante cinco anos, os materiais para assentamento e funcionamento das linhas férreas com tracção eléctrica.

Para o «Diário do Governo».

Pareceres

Da comissão de finanças, sôbre o n.° 678-A, que abre um crédito de 500.000$

a favor do Ministério do Trabalho para um subsídio extraordinário à Misericórdia do Pôrto.

Imprima-se.

Da mesma, sôbre o n.° 616-C, que abre um crédito de 350.000$ a favor do Ministério da Guerra para as despesas com a tumulização do Soldado Desconhecido no Mosteiro da Batalha.

Imprima-se.

Da mesma, prorrogando por mais seis meses, desde a promulgação desta lei, o prazo a que se refere o artigo 3.° da lei n.° 1:170, de 21 de Maio de 1921.

Imprima-se.

Da mesma, sôbre o n.° 588-A, que autoriza a Câmara Municipal de Santarém a contrair um empréstimo para abastecimento de água e conclusão da luz eléctrica.

Imprima se.

Da mesma, sôbre o n.° 432-B, que altera designadas receitas para o Instituto de Socorros a Náufragos.

Imprima-se.

Da mesma, sôbre o n.° 555-B, que determina que as disposições das leis n.ºs 971 e 1:344, relativas a provimento de vacaturas e promoções que delas resultem, não tenham aplicação nos serviços da Administração Geral dos Correios e Telégrafos.

Imprima-se.

Da mesma, sôbre o n.° 668-A, que eleva respectivamente a 90 e a 40 por cento os adicionais de 75 e de 25 por centos criados pelo artigo 68.° da lei n.° 1:368, de 21 de Setembro de 1922.

Para ordem do dia.

Da mesma, sôbre o n.° 651-Q, que isenta de direitos o material para a Associação de Bombeiros Voluntários de Angra do Heroísmo.

Imprima-se.

Da comissão de finanças, sôbre o n.° 590-B, que dá nova redacção ao artigo 1.° da lei n.° 1:158, no sentido de serem aplicáveis as suas disposições aos oficiais

Página 22

22 Diário da Câmara dos Deputados

que tiverem de passar à situação de reserva.

Imprima-se.

Última redacção.

Do projecto de lei n.° 684-E, que abre um crédito especial a favor do Ministério da Guerra, destinado a despesas de alimentação de praças e solípedes do exército.
Dispensada a leitura da última redacção.

Remeta-se ao Senado.

O REDACTOR—João Saraiva.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×