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REPÚBLICA PORTUGUESA

SESSÃO LEGISLATIVA DE I9IH9I2

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.° 39

EM 13 DE FEVEREIRO DE 1912

SUMARIO. — Chamada e abertura da sessão.—Leitura e aprovação da acta.— O Sr. Presidente, comemorando a morte do Barão do Rio .Branco, Ministro dos Negócios Estrangeiros no Brasil, propõe que em homenagem à memória deste ilustre estadista a sessão seja interrompida por dez minutos e assim foi resolvido por unanimidade. — Reaberta a sessão, fazem o elogio do Barão do Rio Branco os Srs. Senadores Eusébio Leão, Anselmo Xavier, Machado de Serpa, Sousa Fernandes, Rodrigues da Silva, Bernardino Machado, Cupertino Ribeiro, e o Sr: Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos) associa-se a esta manifestação do Senado em nome do Governo. — O Sr. Presidente da Câmara propõe, e é aprovado por unanimidade, que se desse conhecimento ao Senado Brasileiro das homenagens prestadas no Senado Português à memória do Barão do Rio Branco. — Lô-se o expediente, entre ele três representações da Associação Comercial de, Lisboa e da Associação de Classe dos Vendedores de Víveres a Retalho,- relativas à questão do azeite e à lei do inquilinato. — E relevada a falta do Sr. Senador José de Castro à sessão. — Tem segunda leitura, sendo admitido, o projecto de lei, do Sr. Senador Tomás Cabreira, autorizando as câmaras municipais a transformarem as suas escolas primárias em e?colas primárias agrícolas. — O Sr. Senador José de Pádua pede que se torne conhecido o resultado da sindicância feita aos serviços da extinta câmara dos pares. — O Sr. Senador Sousa Júnior apresenta uma proposta interpretativa da Constituição na parte aplicável ao preenchimento duma vaga de Senador, e a Câmara resolve que esta proposta seja enviada à comissão de verificação de poderes. — O Sr. Senador Fortunato da Fonseca envia para a mesa o parecer da comissão do Fomento relativo ao projecto' sobre apicultura e o Sr. Senador Alves da Cunha requere um documento respeitante à estrada distrital n.° l de Viana do Castelo.

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DIÁRIO DO SENADO

Presidência do Ex,™ ST, Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Ex,mos Srs,

\ ftntóEio BernardlDO Roque

) Evaristo Luis dis Neves Ferreira de Carvalho

Srs. Senadores q~u.e c -j.i apareceram à sessão: Abílio Baeta da& N^ves Barreto, Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Alberto Carlos da Silveira, Alfredc Botelho de Sousa, Alfredo José Durão, Amaro de Azevedo Gomes, Aníbal de Sousa Dias. Anselmo Augusto ca Costa Xavier, Anselmo Braamcamp Freire, Antão Fernandes c.e Carvalho, António Augusto Cerqueira Coimbra, António Bernardino Roque, António Caetano Macieira Júnior, António Joaquim de Sonsa Júnior, António Ladislau Parreira, António Ladislau Piçarra, António Maria da Siiva Barreto, António Pires de Carvalho, António Ribeiro Seixas, António da Silva Cunha, António Xavier Correia Barreto, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Garcia, Bernardino Luís Machado Guimarães, Bernardo Paes de A]meida, Carlos Richter, Celestino Germano Paes de Almeida, Cristóvão Moniz, Domingos Tasso de Figueiredo, Eduardo Pinto de Queiroz Mootenegro, Elísio Pinto de Aimeida e Castro, Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho, Faus-tino da Fonseca, Francisco António Ochoa, Francisco Correia de Lemos, Francisco Eusébio Lourenço Leão, Inácio Magalhães Basto, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Pedro Martins, José António Aranies Pe-droso Júnior, José de Cupertino Ribeiro Júnior. José Estêvão de Vasconcelos, José Machado de Serpa, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, Joaé Maria de Pádua. José Miranda do Vale, Luís Fortunato da Fonseca, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues cia Silva, Manuel de Sousa da Câmara, Narciso Alves da Cunha, Pedro Amarai Boto Machado, Ramiro Guedes, Sebastião Peres Rodrigues e Tomás António da Guarda Cabreira.

Srs. Senadores que não compareceram: Abel Ac;'.eic de Almeida Botelho, Adriano Augusto Pimenta, Albano Continha, Augusto Almeida Monjardino, João José de Freitas, Jo ;é de Castro, José Maria Pereira, José Nunes da Mata, José Relvas, Leão Magno Azedo, Manuel José Fernandes Cosia, Manuel José de O.iveira, Ricardo Paes Gomes e Sebastião de Magalhães Lima.

Au 14 horas e 30 minutos, o Sr. Presidente mandou proceder à chamada,.

Tendo-se verificado a presença de 34 Srs. Senadores } S- EzG.3' declarou aberta a sessão.

Foi lida, e aprovada sem. reclamação, a acta da sessão

Feiro isto, S. Z£o?.a disse haver já número l<_.gal p='p' pura='pura' resoluções.='resoluções.' serem='serem' tomadas='tomadas'>

O Sr. Presidente : — Tenho de cumprir o doloroso dever de comunicar ao Senado o falecimento, no Rio de Janeiro, do Barão do Rio Branco, que ilustrou grandemente o seu nome, tanto p^la maneira como dirigiu es negócios diplomáticos do Brasil como pela erudição manifestada nas suas obras, e que muito honrou a SUE origem lusitana. (Apoiados gerais^.

Alérn disso devemos lembrar-nos de que o Barão do Rio

Branco era Ministro do Governo que primeiro reconheceu a República Portuguesa. (Apoiados gerais).

Por consideração, pois, para com todos estes aspectos daquele vulto notável, proponho que a sessão seja interrompida durante 10 minutos, conservando-se os Srs. Senadores sentados nos seus lugares e silenciosos durante esse espaço de tempo. (Apoiados gerais).

As 14 horas e 45 minutos foi, portanto, suspensa a sessão, reabrindo-se às 14 e 55 minutos.

O Sr. Presidente:—Proponho que da homenagem que acaba de ser prestada pelo Senado à memória do Barâo do Rio Branco se dê conhecimento ao Governo Brasileiro. (Apoiadcs gerais).

l O Sr. Eusébio Leão: — A maneira como o Senado ; acaba de acatar as indicações de V. Ex.a demonstra bem £ alia consideração que tem pela memória do Barão do Rio Branco. "•*

Não há dúvida alguma de que o ilustre extinto se impôs ao nosso respeito e à nossa consideração, por isso que ele ocupava um lugar de destaque no Governo que primeiro reconheceu a República Portuguesa.

Há pouco eu tinha pedido a palavra para fazer idêntica i proposta à que fez V. Ex.a, Sr. Presidente, isto é, para ! qae o Senado comunicasse ao Governo Brasileiro a home-I nagem que aqui acaba de ser prestada à memória do Ba-1 rão do Rio Branco.

O Sr. Anselmo Xavier: —Pedi a palavra, Sr. Presidente, para, em nome dos Senadores independentes, • me associar á proposta de V. Ex.a

Evidentemente, o Barão do Rio Branco era um grande

amigo de Portugal, e tanto assim que, sendo brasileiro,

! prestou-lhe mais serviços que muitos portugueses degene-

" rados, que não entregam a Pátria ao estrangeiro porque

não podem.

Quando foi da proclamação da República o Barão do ; Rio Branco esteve imediatamente a nosso lado.

Por isso do coração me associo a esta manifestação de pesar pela perda de tam ilustre cidadão.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): — Pedi a palavra, Sr. Presidente, para me associar em nome do Governo à manifestação sincera e eloquente que acaba de ser prestada por esta Câmara à memória do Barão do . Rio Branco.

O emioente estadista que o Brasil acaba de perder fa-

i zia parte do Governo que foi o primeiro a reconhecer a

República Portuguesa, e esse importante serviço ao nosso

uaís e à democracia mundial não o poderemos esquecer

! jamais. (Apoiados).

O Barão do Rio Branco era uma das intelectualidades mais distintas e mais brilhantes da nossa raça. ;' Fo: um estadista que, pela marcha que imprimiu acs í negócios públicos, se tornou verdadeiramente notável e de poderosa influência em todo o mundo.

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SESSÃO N.° 39 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1912

O Sr. Machado de Serpa: — A impressão funda e geral que a morte do Barão do Rio Branco causou no Brasil não podia deixar de ecoar sentidamente nesta terra irmã e amiga e em especial aqui no seio da representação nacional.

O Barão do Rio Branco foi um grande diplomata das terras de Santa Cruz, um homem versadíssimo em direito internacional, e que conseguiu enfileirar-se na ala dos grandes diplomatas, razão por que adquiriu, nessa situação especial, foros de consumado estadista.

Por mais de uma vez teve ocasião de demonstrar que ao direito da força se antepõe a forca do direito.

Foi um grande brasileiro e foi também um grande amigo de Portugal. (Apoiados).

O Sr. Presidente do Conselho acaba de salientar o serviço inestimável, jamais esquecido, que ele prestou, reconhecendo, como Ministro do Exterior naquela República, a República irmã, a joven República Portuguesa, serviço este que está no coração de nós todos (Apoiados).

Se nós, portugueses, devemos cultivar relações com todos os povos e, felizmente, com todos os povos as cultivamos lialmente, com o Brasil as devemos manter espe-cialíssimas, porque é com o Brasil que mantemos o nosso comércio no exterior e é no Brasil que temos a nossa grande colónia emigratória.

Dizendo e^cas palavras creio prestar, por este lado da Câmara, a homenagem devida à memória de quem, por todos os motivos, a mereceu.

-S. Ex* não reviu.

O Sr. Sousa Fernandes : — Sr. Presidente : tendo falado já alguns Srs. Senadores por parte dos diferentes grupos políticos de que se compõe o Senado, desejo eu também fazer uso da palavra para associar-me à homenagem que acaba de ser votada à memória do morto ilustre que se chamou em vida Barão do Rio Branco.

Tenho para isto razões especiais que de sobra justificam a minha obrigação de neste momento falar.

Vivi por muitos anos no Brasil, lá tendo ainda interesses, muitos amigos e até pessoas de família: e se isto só não bastasse para justificar a minha simpatia por aquele Portugal do novo mundo, restava-me a gratidão devida ao carinhoso e deveras fraternal acolhimento que ali tive durante um quarto de século, para justificar o entranhado afecto que voto àquele país, que considero a minha segunda pátria, e aos seus homens ilustres que, como os meus próprios compatriotas, admiro.

O brasileiro insigne que a morte, há dias, bruscamente «mpolgou, e a quem o Senado da República Portuguesa acaba de votar uma tain significativa homenagem, foi, a conceito do Sr. Presidente do Conselho e dos Srs. Senadores que falaram em nome das diversas parcialidades politicas desta Câmara, um dos vultos primaciais da actual fase politica da República irmã. Assim é, e tanto basta para que na coordenação deste preito do Senado Português nem eu cale o meu testemunho nem a minha homenagem pessoal desde que, pelas razões já expostas, aquele constitui para mim um dever e esta uma grata manifestação da minha alma afectiva.

Sr. Presidente: tem-se dito e publicado na nossa imprensa a propósito deste lutuoso facto, muito do que se disse há dias na Câmara dos Srs. Deputados e do que se está dizendo hoje aqui: isto é, que o Barão do Rio Branco deixou da sua vida pública um rasto luminoso e inapa-gável. E isto é profundamente verdadeiro. Todavia, convém notar, a beneficio da verdade, que alguns jornais tiveram nas referências que fizeram ao falecido estadista algumas notas biográficas menos exactas. E porque da rectificação de tais inexactidões mais avulta ainda a estatura moral e intelectual desse homem superior, permita-

me o Senado que eu me entregue a essa tarefa, pelo me, nos em relação a dois determinados pontos.

Disse se, por exemplo, em um jornal, que o Barão de Rio Branco descendia duma dinastia de estadistas.

Isto não é verdade.

O ilustre extinto era efectivamente filho do Visconde de Rio Branco, estadista notabilíssimo na política brasileira do segundo império, onde foi chefe do partido conservador e por vezes Presidente do Conselho de Ministros. Mas, a seu turno, o Visconde do Rio Branco descendia pura e simplesmente dum honrado e modesto negociante português da Bahia.

Modesta origem de que, diga-se já agora, o precursor da libertação dos escravos no Brasil tanto se desvanecia que, vindo à Europa aí por 1883 ou 1884, não deixou de visitar nas cercanias do Porto aquela pitoresca freguesia de Paranhos, onde tinha nascido seu velho pai. Recordo-me bem disto porque estava então no Porto, lembrando-me até de que foi o falecido cônsul brasileiro naquela cidade, Manuel José Rebelo, que ali acompanhou o eminente brasileiro.

Não e, pois, descendente de uma dinastia de estadistas

0 Barão do Rio Branco, e nem por isso a sua glória perde.

A outra inexactidão que desejo rectificar, Sr. Presidente, é aquela que dá o morto ilustre que pranteamos como uma figura de destaque desde os primeiros passos que deu na política e na vida pública. Não, não é isto verdade também.

Formado em direito na Academia de S. Paulo, o Barão do Rio Branco, então simplesmente José Maria da Silva Paranhos, entrou logo na política, é certo, o que não admira desde que se tratava do filho do chefe de um dos grandes partidos do Governo, que, se me não engana a iremória, estava então no poder.

O deputado Paranhos não era, porém, orador; não tinha aquele brilho de palavra que de pronto põe em evidência nas assembleias os parlamentares

Pertencia, como depois demonstrou, ao número dos homens para quem o rés non verba é divisa de acção, e assim se explica que não deixasse na sua passagem pelo Parlamento senão um nome muito apagado.

Só mais tarde, quando a sua acção prática teve de exibir-se como auxiliar de sen pai em questões diplomáticas, como diplomata ele mesmo em questões de transcendente importância, como negociador de tratados, de limites e afinal director da política internacional do seu país; só ontão, Sr. Presidente, é que o Barão do Rio Branco teve ensejo de mostrar o muito para que prestava, as enormes faculdades de trabalho, critério, inteligência e saber que marcavam a nota característica do seu espírito.

Fica assim corrigida, Sr. Presidente e Srs. Senadores, a segunda inverdade de que alguns órgãos da nossa imprensa, aliás na melhor das intenções, se fizeram eco.

De resto não fatigarei a atenção do Senado com a reedição do muito que disseram os oradores precedentes para mais porém em relevo a figura histórica do grande cidadão que o Brasil acaba de perder. Basta singelamente associar-me á condolência de todos, e frisar bem que não só a memória do Barão do Rio Branco merece a homenagem que lhe tributamos, como também o Brasil tem direito à prova de simpatia que neste doloroso transe lhe é testemunhada pela nossa querida República.

Foi o Brasil a primeira nação que reconheceu a nossa

nova organização política, é lá que temos como que um

prolongamento da nossa própria Pátria. É lá, naquela ou-

\ tra riba do Oceano Atlântico, onde também se fala a

nossa língua, e a raça, a tradição e os costumes são iguais

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DIÁRIO DO SENADO

irmão que por tudo se recomenda à estima e ao reconhecimento do povo português.

O português no Brasil, passado o natural período da saudade, nem dá tento que esteja em país estranho nem experimenta muito os males que da ausência da família poderiam advir-lhe. Por tal modo ele encontra naquele país os mesmos atractivos e cómodos da terra natal, e nos brasileiros o mesmo carinho e dedicação da sua própria família!

Não somos estrangeiros no Brasil: sentimos nós os portugueses que o não somos, e é, ao demais, uma verdade já superiormente afirmada pelos mesmos brasileiros.

Para o comprovar vou citar ao Senado o seguinte facto:

Quando há anos se celebrou no Rio de Janeiro o tri centenário Camoneano, brilhante solenidade pública para que concorreram com o mesmo esforço e entusiasmo portugueses e brasileiros, o orador oíicial escolhido para a sessão magna que a propósito se celebrou no Teatro D. Pedro II foi o Dr. Joaquim Nabuco, notável tribuno e diplomata que também já não pertence ao número dos vivos.

Chegou o dia da solene sessão.

O teatro, enorme, o maior do Rio de Janeiro de então, que comporta alguns milhares de pessoas, estava repleto.

Joaquim Nabuco surge na tribuna e, apcs as saudações que o acolhem, começa assim o seu magistral discurso dessa noite:

tíNós os brasileiros y os portugueses e os estrangeiros. ,. .B

Não pôde continuar por alguns minutos.

Os milhares de ouvintes, onde predominavam portugueses e brasileiros, compreenderam de salto a tão amável quanto sincera e verdadeira discriminação do orador, e tanto bastou para a monumental ovação com que intempestivamente o honraram. É que estava no ânimo de todos que naquela terra irmã da nossa terra, os portugueses como os brasileiros não fazem parte dos estrangeiros que lá residem.

Aqui está, Sr. Presidente e Srs. Senadores, por que é que eu me associo de alma e coração a esta manifestação do Senado. É qus nunca é demais testemunhar ao Brasil a nossa simpatia, e não praticamos mais do que um dever de solidariedade fraternal honrando a memória dos seus grandes homens, máximo quando eles tiveram em vida a colossal estatura moral do Barão do Rio Branco.

Tenho dito.

O Sr. Rodrigues da Silva: — Sr. Presidente: merece bem a manifestarão de sentimento do Senado essa bela terra brasileira, à qual me prendem doze anos da minha já distante mocidade e merece-o o Barão do Rio Branco, nome tazn grande que enchendo o Brasil trasbordou para além das fronteiras, produzindo a sua morte uma impressão profunda nos que admiravam a sua bela obra de estadista e de intelectual.

Associo-me pois, como português e corno patriota, às manifestações do Senado, que não são mais do que um preito de justiça às altas qualidades do finado e o pagamento duma enorme dívida que contraímos com o Brasil, pelo carinho com que nos acompanha nas nossas dores e regosijos, e pela prova de simpatia que nos deu. sendo, como foi, a primeira nação que reconheceu a República Portuguesa.

O Sr. Bernardino Machado: — Sr. Presidente: associo-me do coração a todas as homenagens prestadas ao Barão do Rio Branco, que não foi só uma grande figura política do Brasil, mas uma figura que ficou sendo histórica para todos os portugueses e principalmente para iodos os corações republicanos.

Eu não posso esquecer que a primeira mão que se estendeu fraternalmente para a República Portuguesa, foi a, do Barão do Rio Branco, que em nome do seu. Governo

reconheceu e saudou, logo após o seu advento, as novas

instituições lusitanas. -

-f-. • • » • • i.

E pois, com a maior comoção que me associo a homenagem saudosa que o Senado está prestando á sua querida memória

O Sr. Cupertino Ribeiro : — Há um ponto que desejo frisar para que possa servir de exemplo aos portugueses.

O Barão do Rio Branco foi um homem que exerceu funções políticas dentro da monarquia brasileira.

Proclamou-so no Brasil a República j e ele, um grande patriota, não hesitou em juntar-se aos seus patrícios para continuar a servir a pátria.

Era isto o que desejava dizer aqui no Senado, para que sirva de exemplo càqueles portugueses que tanto mal estão fazendo ao nosso país.

O Sr. Presidente: — Fui procurado por delegados da Associação Comercial de Lisboa e pela Associação dos Vendedores de Víveres a Retalho, que pedem a publicação de representações relativas ao projecto sobre a entrada do azeite, já aprovado na Câmara dos Deputados, e também, por parte da Associação dos Vendedores de Vi veres, me foi entregue uma representação acerca da lei do inquilinato. As três representações vão ser lidas na mesa.

EXPEDIENTE

Representações

Leram-se na mesa as representações a que o Sr. Presidente se referiu e que foram integralmente publicadas no a /Sumario» n.° 39.

Também foram lidas representações :

Da Câmara Municipal de Famalicão contra a regulamentação do jogo.

Para a Secretaria.

Da comissão política republicana de Pinhel, no mesmo sentido.

Para a Secretaria.

Ofícios

Da Presidência da Câmara dos Deputados comunicando a eleição para Senador do Sr. Augusto Vera Cruz.

Da Presidência da Câmara dos Deputados, acompanhando as propostas de lei que tem por fim autorizar um empréstimo até 200:000$000 réis, destinado à construção do edifício para o Liceu Central do Porto e a pagar as rendas vencidas do Mouchão do Esfola Vacas, da Quinta da Fonte e do Paul da Anana.

Para a comissão de finanças.

Do Ministério das Colónias, satisfazendo um requerimento do Sr. Senador António Bernardino Roque.

Para a Secretaria.

Telegramas

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SESSÃO N.° 39 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1912

Presidente Senado, Lisboa. — Espinho tem sido extraordinariamente invadido últimas marés. Esta noite enorme derrocada, sendo desmoronados mais de trinta prédios. Centenas famílias sem casa; situação miseranda. Câmara municipal, junta paróquia e comissão política reunidas nesta administração, pedem instantemente acuda Governo esta miséria, ordenando pronto subsídio desgraçados, e reclamam imediatas providências obras de defesa. = O Administrador do concelho, Montenegro dos Santos.

S. Pedro do Sul. — No caso de ser-aprovado projecto regulamentação do jogo, peco que ele seja extensivo e abranja importantíssima estância termas de S. Pedro do Sul. por ser de toda a justiça. = O Vice Presidente Comissão Administrativa, José Joaquim Borges Pinto.

Porto. — A Direcção do Centro Bernardino Machado, julgando interpretar o- sentimento dos seus associados, protesta contra projecto legalização jogo. = O Secretário, Marcelino Cunha.

Figueira de Castelo Rodrigo. — Comissão paroquial republicana, freguesia Vilar Torpim, protesta contra aprovação projecto jogo de azar.=0 Presidente, António Me-xedo.

Figueira de Castelo Rodrigo. — Comissão paroquial republicana, freguesia Reigada, protesta contra aprovação projecto jogo de azar. = O Presidente. Francisco Coelho.

Figueira de Castelo Rodrigo. — Comissão paroquial republicana, freguesia de Cinco Vilas, protesta contra aprovação projecto qualquer jogo de azar. = O Presidente, Inocèncio Couto.

Figueira de Castelo Rodrigo. — Comissão paroquial Figueira de Castelo Rodrigo, protesta contra jogo azar. = O Presidente, Soares Paulo.

Figueira de Castelo Rodrigo — Comissão municipal republicana, concelho Figueira de Castelo Rodrigo, protesta contra aprovação projecto qualquer jogo de azar. — O Presidente, Freire Falcão.

•Alijo. —Comissão municipal republicana Alijo, considerando jugo grande imoralidade e contrário bons princípios republicanos, protesta contra projecto sua regulamentação. =Vice-Presidente; António Cândido Barbosa.

Alijo. — Comissão municipal administrativa Alijo protesta energicamente contra projecto regulamentação jogo. = Servindo Presidente, Amândio Barros.

O Sr. Presidente: — Devo dizer á Câmara que, tendo recebido de Espinho, há dias, o telegrama que foi lido na mesa, logo dei conhecimento dele ao Sr. Ministro do Interior. Chamo a atenção do Senado para um ofício que vai ler-se.

Leu-se na mesa:

Do juiz do 2.° distrito criminal de Lisboa, pedindo autorização para depor, como testemunha, nesse juízo, o •Senador Sr. António Caetano Macieira.

A Câmara autorizou.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma comunicação.

Leu-se na mesa:

Do Senador Sr. Bernardino Roque, participando que o Senador Sr. Dr. José de Castro faltou hoje à sessào por motivo de serviço profissional.

Foi relevada a falta.

O Sr. Presidente: — Vai fazer-se uma segunda leitura.

Leu-se na mesa:

Projecto de lei

Considerando que a agricultura é o principal ramo da riqueza nacional;

Considerando que é conveniente que o ensino agrícola principie com a escola primária nas povoações rurais ;

Considerando que o ensino da agricultura na escola primária é um incentivo para que o lavrador mande os seus filhos à escola;

Considerando que o estabelecimento das escolas primárias agrícolas deve ser da iniciativa das corporações administrativas locais;

Proponho o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São autorizadas as câmaras municipais a fundarem ou transformarem as suas escolas primárias, tanto do sexo masculino como o sexdo femenino, em escolas primárias agrícolas.

§ único. As câmaras devem fornecer, além da casa para a escola, um pequeno terreno para jardim experimental, e tomarem o compromisso de pagar, ao professor ou professora da escola primária agrícola, uma gratificação suplementar de 5$000 réis mensais que dobrará no fim de dez anos de bom e efectivo serviço, e de dar um compêndio de agricultura a cada aluno ou aluna da escola.

Art. 2.° Os professores que quiserem concorrer às escolas primárias agrícolas do sexo masculino devem, depois de aprovados no curso normal, fazer um curso complementar de três semestres na escola de regentes agrícolas, com aprovação no exame de saída.

Art. 3.° Na escola normal fenienina de Lisboa serão criadas duas cadeiras, uma de agricultura regida por um agrónomo, e outra sobre tratamento e higiene dos animais domésticos regida por um veterinário, que constituirão o curso complementar para as professoras de instrução primária agrícola.

Art. 4.° O professor da escola masculina fará aos alunos, que tenham obtido aprovação no primeiro grau ou ficassem habilitados para esse exame, um curso de agricultura durante um ano lectivo.

§ 1.° O curso será feito por meses de trabalhos Agrícolas da região, segundo ô tipo do calendário agrícola das escolas francesas, e em cada mês o professor explicará os trabalhos próprios dessa época e a sua razão de ser.

§ 2.° As lições serão completadas com trabalhos feitor pelos alunos no jardim e com excursões a propriedades rústicas particulares.

Art. õ.° A professora da escola femenina fará, durante dois anos, às alunas que forem aprovadas em 1.° grau ou ficassem habilitadas para esse exame, um curso de agricultura em três lições por semana.

§ 1.° O curso compreenderá lições sobre: cultura hortícola, avicultura, sericicultura, agricultura, tratamento dos animais domésticos, lacticínios, conservação de legumes e frutos, higiene e arranjo de casa^ e primeiros cuidados em caso de acidente.

§ 2.° As lições serão completadas com trabalhos hortícolas e outros feitos pelas alunas e excursões às propriedades rústicas.

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DIÁRIO DO SENADO

escolares onde realizarão conferências de propaganda agrícola e associativa.

§ único. A estas associações fornecerá o Estado prémios pecuniários para os concursos que elas venham a estabelecer para os melhores estábulos, capoeiras, leitarias, quei-jarias e outras instalações.

Art. 7.° Os compêndios de agricultura, adoptados nas escolas primárias agrícolas, serão impressos gratuitamente na Imprensa Nacional e as câmaras municipais só pagarão o custo do seu papsl e cartonagem.

§ único. Haverá trC-s tipos de compêndio para as escolas masculinas, segundo elas pertencem às regiões do norte, do centro e do sul do país. As esco.as femeninas terào um único tipo de compêndio.

Art. 8.° O Governo fará os necessários regulamentos para a execução da presente lei.

Art. 9.° Fica revogada toda a legislação era contrário.

Lisboa, em 8 de Fevereiro de 1912. = Tornas Cabreira.

Foi admitido e enviado à comissão de instrução.

O Sr. José de Pádua:— Mais uma vea venlio falar num assunto de grande importância para o prestígio da .República. Entendo qus é urgente que sejam apresentados os resultados das sindicâncias a que se tern prccadido. Fui procurado por um empregado da extinta cí.mara dos pares contra quem se formularam acusações, motivo por que o raeamo empregado me pediu que fosse apresentado o resultado da sindicância que lhe diz respeito, por issc que a respectiva comissão já concluiu os seus trí-ba.bos. É uma questão de moralidade e de justiça e por isso peçc que se tomem as tlevi£as providências neste sentido.

S. Ex.* não reviu.

O Sr. Sousa Júnior: — Sr. Presidente: vou ler ura a proposta, que precedi de considerandos, 03 quais C:ara-mente a explicam, e que, devo dizê-lo, não tem nenhum intuito pessoal.

Proposta

Considerando que o n.° 2.° do artigo 26.° da Constituição estatui que compete ao Congresso velar pela observância da mesma Constituição;

Considerando que, nLo obstante a opinião contrária do seu Presidente, a Câmara dos Deputados resolveu eleger, ela só, e elegeu uni seu membro para a vaga actualmente existente no Senado;

Considerando que ?: Constituição não ccntêm disposição expressa que autorizasse tal resolução da CâmarL dos Deputados;

Considerando que o ai-tigo 86.° da Consthuiçâo determina que as vagas dadas no primeiro Senado serão preenchidas na forma de disposto no artigo 84.° e seus parágrafos ;

Considerando que para a aplicação da referida vaga só podem ter aplicação os referidos parágrafos do artigo 84.°;

Considerando que c § 2.° do artigo 84.°, definindo c/aem sejam os eleitores, fala da escolha dos Sanadores pela Assembleia Nacional Constituinte; mas

Considerando que a antiga Assembleia Nacional Constituinte passou a ser o Congresso e não somente a Câmara dos Deputados, e tanto assim que ?.& leis do Governo Provisório, quási sempre acompanh£.das da declaração, de que seriam submetidas à Assembleia Constituinte, vão de facto ser revistas pelo Congresso e nãc exclusivamente pela Câmara dos Deputados ;

Considerando que nestes condições, o Deputado £•:*. Yera Cruz, escolhido pela s.;a Câmara para Senador, n?.o e&íá eleito, segundo os precei:os constitucionais;

Considerando que c Sr. Vera C^uz merece ao Seuaiic

toda a consideração, nenhuma dúvida havendo sobre o seu ingresso nesta casa, desde que a sua eleição seja feita constitucionalmente;

Considerando que o § único do artigo 13.° da Constituição dá a cada uma das Câmaras a competência exclusiva para reconhecer os poderes dos seus membros ;•

O Senado resolve:

1.° Xão reconhecer os poderes do Sr. Vera Cruz, por o julgar eleito com infracção da Constituição;

2.° Comunicar esta resolução à Camará dos Deputados, significando-lhe a necessidade de ser convocado o Congresso, para se pronunciar sobre se a razão está do lado da Câmara dos Deputados ou do Senado;

3.° Propor á Câmara dos Deputados que no caso do Congresso resolver, ccmo entende o Senado, que só a ele compete eleger o Deputado que há-de ocupar o lugar de Senador, na mesma reunião do Congresso, em que o conflito se derimir, se faça a eleição.=/S'cmsa Júnior. •

O discurso será publicado na íntegra quando S. Ex* devolver as notas taquigráficas.

Foi lida no mesa a proposta do Sr. Senador Sousa Júnior.

O Sr. Presidente:—Fica para segunda leitura.

O Sr. Sousa Júnior:—Requeiro a urgência.

A Câmara reconheceu a urgência.

C Sr. Presidente:—Está em discussão a proposta.

O Sr. EuséMo Leão (para uma questão prévia): — Pelo nosso Regimento existe uma comissão de verificação de poderes.

Portanto parece-me que o que se deve fazer é mandar à comissão os documentos vindos da outra Câmara e con-juntamente a proposta do Sr. Sousa Júnior.

O Sr.. Presidente: — Formule V. Ex.a por escrito a sua questão prévia.

O Sr. Rovisco Garcia: —A comissão de verificação de poderes não está ainda instalada, porque não esperavar rnos que fosse necessário ter de apreciar com urgência qualquer processo, mas posso dizer à Câmara que a comissão se constituirá e dará o seu parecer o mais rapidamente possível.

O Sr. Sousa Júnior: — Eu concordo com qualquer solução oue o Senado tome a este respeito, não me oponho a que a minha proposta vá à comissão, mas o meu receio é que disso venha ^alguma demora neste assunto e que o Sr. Vera Cruz tenha de ser demorado numa situação indefinida.

O Sr. Eusèbio Leão: — O Sr. Vera Cruz é ainda Deputado.

O Sr. Sousa Júnior:—Peço licença para dizer a y. Ex.1 que talvez a Câmara dos Deputaàos não aceite essa maneira de ver.

Como o Senado aprovou a urgência da minha proposta, V. Ex.a, Sr. Presidente, sabe qual é o caminho a seguir para que ela entre imediatamente em discussão.

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SESSÃO N.° 39 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1912

Neste sentido mando para a mesa a seguinte

Proposta

«Proponho que o processo de eleição do Sr. Vera Cruz e a proposta do Sr. Sousa Júnior vão para a comissão de verificação de poderes. — Eusébio Leão.

A Câmara admitiu a questão prévia.

O Sr. Presidente: — Está em. discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Foi aprovada.

O Sr. FortunatO da Fonseca: —Pedi a palavra para mandar para a mesa o parecer da comissão do fomento sobre o projecto do Sr. Nunes da Mata, relativo à apicultura.

Foi a imprimir para ser distriluído.

O Sr. Alves da Cunha: — Mando para a mesa um requerimento.

Foi lido:

«Requeiro que, pelo Ministério do Fomento, me seja remetida, com urgência, uma nota donde conste: 1.° qual a verba votada no corrente ano para empedramento da estrada distrital n.° l, de Viana do Castelo, na parte já terraplenada na freguesia do Bico, concelho de Paredes ,de Coura; 2.° qual a verba votada, no mesmo ano, para a continuação da mesma estrada na refei-ida freguesia do l Bico, na parte já expropriada e paga; 3.° se pelas obras j públicas daquele distrito se anunciou a arrematação dal gum daqueles trabalhos, isto é, empedramento e continuação da construção».—O Senador, Alves da Cunha.

Mandou-se expedir.

O Sr. Presidente: — Vamos passar à ordem do dia.

OEDEM DO DIA

Continuação da discussão sobre o projecto do turismo

O Sr. Peres Rodrigues : — Sr. Presidente, eu ontem tinha declarado que aceitava ficar com a palavra para hoje por querer ainda referir-ine á Praia da Rocha: mas como esse assunto deve ser considerado na discussão da especialidade, abstenho-rne por agora de lhe fazer qualquer referência e vou resumir as minhas considerações.

Trata-se de saber se nós temos as condições precisas para atrair o turismo.

Condições naturais não nos faltam.

O que temos é de escolher os locais e as regiões que melhor se prestem a- ser transformados em estações de turismo.

Essa escolha será uma função da Câmara, que tem aliás muito por onde escolher.

Condições naturais não nos faltam. Isso não sofre dú- j vida.

Também é certo que esta questão do turismo anda modernamente ligada ao jogo.

No Diário do Governo de 14 de Dezembro de 1909 foi publicada uma portaria que nomeou uma comissão para estudar quatro estações de turismo.

Leu.

Aqui está já uma prova da necessidade de se regulamentar o jogo.

Leu.

Há, por consequência, a ligação dos dois casos, isto é, o turismo e o jogo.

Estou abreviando as minhas considerações, tanto niais que a discussão já vai bastantemente adiantada.

Eu entendo, como muita gente entende, ou antes, como quási toda a gente entende, que o jogo é um vício.

O Sr. Ladislau Piçarra: — É pernicioso,

O Orador: — Isto foi dito por abalisados jurisconsultos, que tinham voz na matéria, e cuja opinião, portanto, é muito mais autorizada do que a minha.

Mas então é preciso considerar outros vícios, que sào mais ou menos tolerados, mais ou menos admitidos.

Esses vícios que se podem citar em voz alta são : a libertinagem, o alcoolismo, o tabaco e o luxo.

Ora o mal destes vícios é diferente conforme a sua natureza, e diversamente são encarados por parte dos poderes públicos.

Uns são considerados imorais e outros atingem um alto grau de-nocividade, não só para estes ou aqueles indivíduos, mas até para toda a espécie humana: daqui resulta a diferença de tratamento com que são julgados

A libertinagem não é permitida em condições que a tornem repugnante ou afrontosa.

A participação do Estado na exploração da libertinagem é mínima.

A proibição da libertinagem não é absoluta; mas tende a tornar-se cada vê/ maior por meios indirectos.

Vem depois o álcool.

Não se dá para o Estado com o álcool o mesmo que se dá com a libertinagem.

O Estado participa das indústrias relativas ao álcool e, portanto, do vício do alcoolismo frui importantíssimas receitas, por onerar esses artigos com largas tributações.

O vício do álcool não é tam imoral como o da libertinagem, não é tam adverso aos bons costumes, e dá ao Es- -tado um lucro que não deixa de ser importante.

O Estado participa das indústrias do álcool, se bem q::e indirectamente contrarie o alcoolismo por meio de fones contribuições.

Dá-se o mesmo com o tabaco.

NSo se pode dizer que o tabaco não seja nocivo à sociedade em certas e determinadas circunstâncias.

O tabaco não só deteriora o organism), como dá origem a acidentes de ordem social. Há sinistros que tem por origem o uso do tabaco.

A maior parte dos incêndi-js são, incontestavelmente, devidos ao uso do tabaco. Portanto, justíssimo é que o Estado faça o que faz, que é tributá-lo fortemente, por forma que os remediados ou os ricos possam ser atingidos.

Sobre o luxo incide a contribuição chamada sumptuária.

O jogo também deve ser tributado e tem mais facilidade do que o álcool e o tabaco em o ser.

É claro que da tributação do jogo resulta uma proibição benéfica para as classes a que .esse vício poderia trazer consequências mais funestas.

O partido republicano não tinha só o jogo como matéria detestável: abrangia com o jogo as lotarias.

Pergunto eu agora: ,; Pensa-se em proibir as lotarias?

Decerto que não.

 receita que elas dão à assistência pública não é fácil substituí-la dum momento para outro.

Ora o jogo anda hoje aliado ao turismo, auxiliam-se por uma evolução dos costumes modernos.

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DIÁRIO DO SENADO

E não se diga que isto ó um modo sofistico de argumentar, porque há factos, que mesmo mima dada época, sào imorais ou não, conforme o local e a ocasião em que se praticam.

Darei um exemplo:

Estão em uso na sociedade vestidos femeninos extremamente decotados, por modo a porem em relCvo as linhas do colo.

Esta toilette é permitida nos bailes e teatros ; ruas se uma dama vier para a rua assim decotada praticará uma imoralidade.

Podia citar factos semelhantes em que o mesmo facto é encarado à face da moral por uma forma eu outra, segundo um determinado critério, conforme a ocasião 3 o local em que se praticam.

Pois com o jogo dá-se isto: outrora ele inspirava uma repugnância que os pais tratavam de avolumar perante os filhos a fim de lho tornarem aborrecido. Xás issc passou à história.

O jugo do turismo é, repito, uma cousa bem diferente.

Eu vi, e muitos colegas também o sabem, que por esse país fora, em terras de somenos importância, em terras que nada tem que permita apontarem-se como foces de imoralidade, se joga muito. Nas vilas sertane^s do Alentejo joga-se em épocas de descanso agrícola desesperada-mente.

Esse é outro jogo.

Vejam se podem aplicar critério diverso a este assunto.

Do turismo pretende-ss tirar o máximo proveito com relação às indústrias subsidiárias, à economia da nação.

E que a questão é urgente não há dúvida. Já o era há uns anos para cá, já o ?ra em 1909.

Leu.

Isto era há três anos. Hoje maior razão teai de ser.

Em conclusão, o meu receio é que a nossa Toouca habilidade, porque o movimento hodierno traz formas vá riadas para aquisição da meios, o meu receio, repetirei, é que a nossa pouca habilidade neste campo não nos permita realizar o que c projecto do Sr. Tomás Cabreira prevO e defende, ou outro qualquer projecto que o substitua, bem preparado, porque estou certo de que é muito mais fácil fazer um relatório de todas as vantagens e conveniências do turismo aliado com o jogo do que um enunciado de todas as desvantagens e inconveniências que daí poderão resultar,.

Esta c a minha opinião.

E tenho dito, reservando-me para, na especialidade, fazer mais detidas considerações sobre o assunto.

S. Ex.3- não reviu.

O Sr. Presidente:—Devo participar ao Senado que acaba de chegar da outra Camará a proposta de lei levantando o estado de s.'i:io.

Esta proposta é de tal importância, que o Senado certamente concordará em que se faca imediatamente a discussão, dispensadas as formalidades regimentais. (Apoiados).

i

O Sr. Presidente:—Em vista da manifestação ia Gamara vai ser lida a proposta de lei.

Leu-se na mesa.

Artigo 1.° E levantado c estado de sítio no distrito de Lisboa, ficando restabelecidas as garantias individuais nos termos desta lei.

Art. 2.c As respectivas autoridades continuarão es investigações, só podendo sar presos os indivíduos que por

elas se mostrarem agentes dos crimes enumerados no artigo 1.° da lei em vigor de 3 do corrente mês de Fevereiro, publicada no Diário do Governo n." 29, de õ deste mês.

Art. 3.° Esta lei entra em vigor logo que for publicada no Diário do Governo.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrário».

O Sr. Presidente: — Está em discussão.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos):— Como o Senado sabe, depois de terem sido suspensas as garantias no distrito de Lisboa, rapidamente se restabeleceu a ordem.

Não foi imediatamente levantado o estado de sítio porque, como eu tinha afirmado nesta Câmara, havia fora de Lisboa e dentro do distrito, vários núcleos de propaganda do mesmo género daqueles que tinham promovido as graves perturbações que motivaram a suspensão de garantias.

Foi a esse trabalho de saneamento junto dos núcleos que havia fora de Lisboa, mas dentro do distrito, que o Governo se entregou rios dias em que estiveram suspensas as garantias e posso dizer ao Senado, com satisfação, que se tomaram as providências necessárias para que os principais dirigentes desses grupos tenham sido detidos e, por conseguinte, para que o efeito da propaganda perniciosa que se estava fazendo junto das ciasses trabalhadoras esteja, se não completamente debelado, ao menos diminuído em termos de não constituir perigo.

Essa perniciosa propaganda estava-se fazendo há tempo, o Governo sabia o, mas não tinha, dentro das leis actuais. meios de a coibir eficazmente.

Usou, por conseguinte, da suspensão de garantias.

E espera fazer uma fiscalização activa junto das associações, sem que essas associações, por fornia alguma, dentro da lei, sejam tolhidas nos seus legítimos direitos, nem deixem de cuidar dos seus interesses, mas sem que, ao mesmo tempo, possam perturbar os legítimos interesses do esíado e da ordem pública.

Evidentemente o estado de sítio, neste momento, não é necessário; o que. é necessário é que os culpados sejam julgados.

Os tribunais farão justiça, separando das honradas classes trabalhadoras do Pais aqueles que pretenderam lançá-las num caminho perigoso para elas e para o Estado.

É isso o que estou convencido que se poderá fazer com as providências que o Governo pede ao Senado e que já ontem foram aprovadas na .outra Câmara.

O Sr. Ladislau Piçarra: — Sr. Presidente: congratulo-me pelas declarações que acaba de fazer o Sr. Presidente do Ministério.

Disse S. Ex.a que tem esperança de que as medidas adoptadas farão cessar a propaganda de agitação feita junto das classes operárias.

Ora eu acentuei aqui o outro dia que uma das causas fundamentais por que vingava essa propaganda subversiva era devida à profunda ignorância das nossas massas laboriosas, e eu desejaria muito que o Governo promovesse que em cada uma das associações de classe, principalmente as que foram envolvidas neste movimento tumul-tuário, apresentasse uma relação dos indivíduos analfabetos que pertencem a essas associações e, podendo ser, até as habilitações literárias daqueles que dirigem essas associações, para nós vermos, em face desses documentos oficiais, qual o estado mental dessa população.

Tenho dito.

O oradar não reviu.

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que me tinha manifestado contra a prorrogação do estado de sítio, tenho satisfação de que esse estado anormal durasse poucos dias.

Significando a minha satisfação por este facto, quero também, Sr. Presidente, enviar daqui os meus louvores às autoridades militares pelo procedimento correcto que tiveram na manutenção da ordem.

Há, porem, dentro desta proposta de lei um artigo que me desagrada: é o que se refere aos tribunais mili-lares.

A esse artigo deixo aqui significada a minha reprovação.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos):— Eu direi ao ilustre Senador Sr. Ladislau Piçarra que S. Ex.a tem muita razão.

É absolutamente necessária a instrução, mas é também necessário que da parte dessas classes haja a boa vontade de se deixarem instruir.

O Sr. Ladislau Piçarra:

urna relação.

O Governo podia pedir

O Orador:—Tomo nota do alvitre de S. Ex.a

Ao Sr. Senador Bernardino Machado agradeço as palavras que dirigiu ao Governo por ter levantado o estado de sítio.

Nós nunca tivemos tenção de, prorrogando o estado de sitio, armar em ditadores e tiranos; o que tivemos em vista foi sanear a sociedade portuguesa, o que não se podia fazer sem a suspensão das garantias individuais.

O Governo disse que o fez cora desgosto, pois não é sem ele que nos podemos afastar dos deveres que a Constituição nos impõe.

Eu não tenho ssnão que me associar àa palavras do Sr. Bernardino Machado com respeito às autoridades militares.

Tudo quanto se diga dessas autoridades ó pouco, porque não fui só a dedicação inexcedível com que procederam: foi o tino, a sensatez, ajusta medida que sempre empregaram em toda esta difícil situação.

Finalmente, S. Ex.a fez um reparo, que de resto está de acordo com a sua atitude anterior, relativamente aos tribunais militares.

Sr. Presidente, a este respeito, eu direi que o Governo fez o que devia fazer: entregou os presos aos tribunais militares, desde que às autoridades militares tinha entregue o governo do distrito, estando certo de que eles terão ocasião de dar ao país um alto exemplo de respeito e de moralidade.

Não pode, pois, dizer ao Parlament) que os tribunais que. ontem julgava bons já hoje o não são.

É, por conseguinte, coerente a nossa atitude e eu e.-tou certo de que o Senado a aplaudirá.

O Sr. Goulart de Medeiros: —Sr. Presidente: acompanho os meus" ilustres colegas nos elogios que fizarara às autoridades militares pela maneira por que foi mantida a ordem pública, mas julgo um dever mencionar também os agentes que tam prudente e dedicadamente as coadjuvaram.,

Não se podem realmente esquecer os serviços prestados pelos oficiais, sargentos e soldados que de dia e de noite policiaram a cidade e o distrito de Lisboa, debaixo duma chuva torrencial.

Parece-me que o Sr. Presidente do Ministério se referiu apenas às autoridades militares. Ora, a polícia, a meu ver também merece os mais rasgadoj elogios.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vás concelos): — Eu, quando falei das autoridades militares quis também referir-me às autoridades policiais. Eviden

.emente, os serviços prestados pela polícia são dignos dos maiores louvores.

O Orador: — Não posso deixar de acompanhar as pa-avras de V. Ex.a, porque tire ocasião de verificar que o modo como a polícia procedeu durante esses dias foi muito diferente do que tinha sido até aqui.

Não faço elogios ao Governo porque ele desapareceu, ou devia desaparecer, desde que teve de abdicar dos seus direitos e confiar a manutenção da ordem ao comandante militar.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vas-soncelos): — Não apoiado.

O Orador:—'Eu refiro-me apenas à manutenção da ordem pública no distrito de Lisboa. A este respeito entendo que o Governo não merece elogios nem censuras. Reservo me, como disse na minha declaração de voto, para mais tarde, quando tudo estiver serenado, exigir dele as responsabilidades dos actos praticados anteriormente a ser decretado o estado de sítio,

Lamento porém, c profundataente, desde já que, tendo nós sido obrigados a usar duma medida tam severa a tam pouco tempo da votação da Constituição, vamos fazer agora ainda o que a Constituição não permite, que é uma espécie de meia suspensão de garantias. Ou há necessidade das garantias estarem suspensas, e nesse caso a autoridade militar tem tiinta dias para fazer as precisas averiguações, ou não temos necessidade alguma de tal medida. Meio termo em questões destas é que eu não compreendo.

Mas o Governo pede que lhe concedamos uma meia suspensão de garantias. .. que outra cousa não c a conservação de tribunais de excepção.

E contra isso que eu protesto, c protesto porque me tenho sempre pronunciado contra medidas de excepção, que não tem dado resultado favorável ou antes tem dado resultado contraproducente.

Não quis ha ocasião em que se votaram as leis dos conspiradores e a de 3 de Janeiro levantar a minha voz de protesto para nà'o criar dificuldades aos Governos que as achavam indispensáveis para a conservação da ordem, e por isso me limitei a sair da sala e a abster-me de votar.

O mês de Fevereiro, Sr. Presidente, é fatídico para a sociedade portuguesa. Já tivemos a Jei de 13 de Fevereiro e agora temos esta de 3 de Fevereiro, que é talvez pior...

Eu neste momento apenas protesto contra o procedimento do Governo, que pede ainda leis de excepção.

Já teve nas suas mãos as armas precisas para se defender contra os inimigos das instituições e se já não precisa dessas armas para que quere, então, uma meia suspensão de garantias?

Os Governos tinham nos tribunais ordinários todos os meios para poder defender a ordem pública e quando a revolta estalasse franca, se por acaso tresloucados a isso chegassem, reprimia-se por meio das balas, porque quem agride a tiro não pode esperar que o recebam doutra maneira.

As leis existentes eram suficientes, mas o Governo achou melhor recorrer a medidas excepcionais que julgo que mais tem prejudicado do que consolidado a República e continua a pedi-las sem ver o seu erro.

E por esta razão que eu voto contra o projecto.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos) : — Eu tenho que me vangloriar pelo procedimento que o Governo adoptou.

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O que o Governo fez foi evitar o derramamento de sangue, salvar muitas vidas, tanto dos defensores da ordem corno dos desgraçados que foram arrastados a actos de violência contra o regime.

DIÁRIO DO SENADO

O Sr. Goulart de Medeiros : depois falar.

-Eu reservo-me para

O Orador:—S. Ex.s disse que o Governo, por esta proposta de lei, pedia apenas o levantamento de meia suspensão de garantias.

O Governo o que pede é que, aos indivíduos que ainda não estão presos e entraram no movimento, possam ser aplicadas as mesmas disposições da lei que vão aplicar-se aos que já estão presos.

Pelo facto de não estarem ainda presos alguns dirigentes do movimento, que fugiram, não devem conservar-se suspensas as garantias à espera dessas prisões.

O Sr. Presidente:—Está esgotada a inscrição sobre a generalidade.

Vai votar-se.

Posta à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente:—Vai ler-se o artigo 1.°

Leu se na mesa.

O Sr. Presidente: — Está cm discussão.

Pausa.

Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Lido na mesa foi aprovado.

O Sr. Presidente:—Vai ler-se o artigo 2.°

Leu-se na mesa.

O Sr. Presidente: — Está em discussão.

O Sr. Bernardino Machado:—Mo reputo os tribunais militares como um acto de coerência do Governo.

Quando o Sr. Presidente do Conselho apresentou a proposta para a suspensão de garantias e criação de tribunais marciais, eu uào aprovei a instituição desses tribunais durante o estado de sítio, mas nessa ocasião ainda se poderia admitir que alguém entendesse que, abolidas as garantias individuais, entregue o Governo à autoridade militar, os tribunais militares fossem uma consequência do estado de sitio o se julgasse coerente que todos os indivíduos implicados ou supostos implicados nr> movimento tivessem de responder perante esses tribunais.

A^ora o que não compreendo, o que não me parece admissível de modo algum, é que, abolido o estado de sítio, continuem tribunais militares.

Voto contra a manutenção desses tribunais, como já votei contra a sua criação.

O Sr. Ministro da JustLça (António Macieira): — Pedi a palavra apenas para dar à Câmara um esclarecimento.

A constituição do antigo regime não permitia o estado de sítio; falava apenas em suspensão de garantias.

Na Constituição republicana permite-se o estado de sítio, isto é, o estado de guerra com todas as suas consequências. Pode ser entregue uma parte do país ou todo o país ao Governo militar, para que ele proceda a seu modo para que a ordem pública seja mantida.

Portanto a esfera de acção do estado de guerra estabelece uma lei militar. Mas não se trata de tribunais marciais; trata-se de conselhos de g;uerra, em que são aplicadas todas as disposições do Código de Justiça Militar, que tem sido e é considerado como um Código muito liberal em que intervêm o júri.

O Sr. Goulart de Medeiros: — V. Ex.a refere-£e ao Código de Processo Militar?

O Orador: — Sim, eu queria referir me ao Código de Processo Militar. V. Ex.a fez-me a justiça de rectificar o meu equívoco.

Adopta-se nestes conselhos de guerra a forma de processo estabelecida no Código de Processo Militar onde há um júri que julga os réus com todas as formalidades c garantias de larga defesa.

O Sr. Bernardino Machado.:—Eu não quero insistir nas minhas considerações de há pouco, mas continuarei a dizer que se não devem manter os tribunais militares.

Apenas duas palavras mais.

Julgo preciso que, duma vez para sempre, se demonstre a grande confiança da República nos poderes constituídos, e uni desses poderes é o judicial.

É mister que não vamos desrespeitá-lo,desde que se nos depara a sombra duma dificuldade govcrnativa.

Desabituemo-nos desse velho mau sestro.

;Se se verifica que os tribunais não garantem a justiça, expurguem-se! (Apoiado*).

Mas, desde .que, efectivamente, os poderes públicos estejam identificados com o espírito do justiça das' novas instituições — e devera estar, e é indispensável que estejam ou obrigá-los a isso — a desconfiança para com eles representa evidentemente um perigo para a disciplina social.

E forçoso que essa desconfiança não exista em relação a nenhum dos poderes constituídos, e não abale nem de leve a autoridade que deve pertencer-lhes.

Não havendo ninguém mais inscrito, foi aprovado o artigo 2.° e sucessivamente, sem discussão, os artigos j(.°, 3.° e 4.°

O Sr. Presidente: — Atenta a urgência da proposta que acaba de merecer a aprovação da Câmara, peço aos Srs. Senadores que dispensem que ela seja enviada à comissão de redaoção. (Apoiados gerais}.

Pausa.

O Sr. Presidente: —Vai entrar em discussão a proposta de lei n.° 47-E, parecer n.° 43, que também está dada para ordem do dia da sessão de hoje.

Foi lida na mesa, e é do teor seguinte:

19-M

Deseja a Câmara Municipal de Alcobaça realizar diversas obras no seu concelho que representam melhoramentos de grande alcance e vantagem para o desenvolvimento económico do mesmo concelho.

Entre esses melhoramentos, dois se avantajam pela sua urgente necessidade: a conclusão da estrada que há de ligar a importante freguesia de Pafcaias com a sede do concelho e com o apeadeiro que serve a mesma freguesia, na linha de oeste, e a canalização das águas de Chiqueda para abastecimento da vila de Alcobaça, onde a falta de água de boa qualidade para consumo público se faz sentir de há muito anos.

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metros, jfaltando ainda cerca de quatro, aos quais há a acrescentar uma ponte e dois pontões. O custo por quilómetro orça por 1:000$000 réis e a ponte e pontões devem custar cerca de 60(J$000 réis. As nascentes de Chiqueda, aonde se hão-de captar as águas para o abastecimento da vila, distam da mesma vila aproximadamente três quilómetros e a canalização deverá ser feita em tubagem de ferro, tendo também de ser construído na vila o reservatório geral das águas, donde há-de derivar a sua conveniente distribuição.

Para fazer face às despesas com a realização das citadas obras, 'não conta o município com recursos financeiros bastantes e não lhe será fácil obtê-los pela elevação do imposto directo ou qualquer outro, pois que essa elevação, que a Câmara será obrigada a fazer em vista da insuficiência das suas receitas, vai ser absorvida pelos novos encargos provenientes da criação de grande número de escolas no concelho e ainda da nova organização da instrução primária, além do natural aumento dos seus encargos ordinários.

Desta maneira, a Câmara, tendo estudado o assunto, reconheceu que, para a imediata execução daquelas obras, a forma mais prática e mais rápida de obter os necessários recursos sem sobrecarregar mais os contribuintes, será a alienação da propriedade do município denominada a Pinhal da Câmara», o qual mede cerca de mil geiras de área e cuja venda em glebas ou num só lote proporcionará ao município os capitais necessários, sem que tal alienação represente desfalque nas receitas municipais, pois que o rendimento do pinhal é, a bem dizer, absorvido pelas despesas com a sua conservação e guarda.

Nestas condições tenho a honra de submeter à aprovação da Assembleia Nacional Constituinte o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É autorizada a Câmara Municipal de Alcobaça a alienar, em glebas ou num só lote, a propriedade do município denominada «Pinhal da Câmara».

Art. 2.° É a mesma Câmara autorizada a aplicar o produto dessa alienação à conclusão da estrada que há--de ligar a freguesia de Pataias à sede do concelho, e à canalização das águas de Chiqueda para abastecimento da vila de Alcobaça.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da Assembleia Nacional Constituinte, em 8 de Agosto de 1911. = O Deputado, Afonso Ferreira.

N." 46

Senhores. — A vossa comissão de administração pública foi presente o projecto de lei em que a Câmara Municipal de Alcobaça (administrativa) pede autorização para alienar, em globo, ou num só lote, a propriedade do município denominada «Pinhal da Câmara» consignando o produto dessa venda à conclusão da estrada que há-de ligar a freguesia de Pataias à sede do concelho de Alcobaça, e â canalização das águas de Chiqueda para abastecimmento da vila de Alcobaça.

E de parecer esta comissão que o projecto deve merecer a aprovação da Camará, porquanto o rendimento do pinhal referido é quási absorvido pela despesa, e os me lhoramentos reclamados tem uma importância extraordinária para o comércio e para a higiene da referida vila de Alcobaça.

Sala das Sessões, em 12 de Janeiro de 1912. = Jacinto Nunes = Barbosa de Magalhães = José Vale de Matos Cid = Francisco Maria Tavares = francisco José Pereira—= José Dias da Silva = Gaudêncio Pires de Campos.

N.» 47-E

PKOPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É autorizada a Câmara Municipal de Alcobaça a alienar, em glebas ou nurn só lote, a propriedade do munícipio denominada «Pinhal da Carneira».

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Art. 2.° É a mesma Câmara autorizada a aplicar o produto dessa alienação à conclusão da estrada que há-de ligar a freguesia de Pataias à sede do concelho, e à canalização das águas de Chiqueda, para abastecimento da vila de Alcobaça, e este produto da venda só poderá ter esta aplicação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário. - Palácio do Congresso, em l de Fevereiro de 1912.= António Aresta Branco. Presidente = Baltasar de Almeida Teixeira. 1.° Secretario = Francisco José Pereira, 2.°" Secretário.

Parecer n.° 48

Senhores.— A vossa comissão de administração pública, tomando conhecimento da proposta de lei n.° 47-E, já aprovada pela Câmara dos Deputados, entende que ela merece também a aprovação do Senado.

Senado, em 7 de Fevereiro de 1912. = Anselmo Xavier =Eusébio Leão = Bernardo Paes de Almeida = Artur Costa = José Miranda do Vale.

O Sr. Presidente:—Está em discussão na generalidade.

O Sr. Cupertino Ribeiro:—A Câmara Municipal de Alcobaça dá mais urna prova de que sabe administrar os haveres que lhe estão confiados, porque trata de alienar uma propriedade que lhe acarreta encargos e nenhum proveito.

Vendida essa propriedade, empregará a Câmara Municipal de Alcobaça o produto dessa venda em obras de verdadeira e reconhecida utilidade.

E esta a razão que me leva a dar a minha plena aprovação ao projecto.

Não havendo mais ninguém inscrito, foi aprovado, a generalidade, sendo a especialidade também aprovada.

O Sr. Presidente : — Vai continuar a discussão do projecto do Sr. Tomás Cabreira, sobre o turismo, e têm a palavra o Sr. Cupertino Ribeiro.

O Sr. Cupertino Ribeiro: —Antes de dizer algumas palavras sobre o assunto de que se trata, seja-me permitido dar breves explicações, para que se não imagine que eu estou absolutamente em contradição com opiniões exaradas em documentos que tenho subscrito; isto é, em representações que tem sido trazidas ao Parlamento, tanto no tempo da monarquia, como já na vigência da República.

Essas representações dimanam de colectividades a cujos corpos gerentes eu tenho pertencido.

Os assuntos que constam dessas representações são versados em assembleias gerais, e nestas se concorda, por maioria, na redacção que devem ter tais documentos para seguirem ao seu destino-.

Foi exactamente o que sucedeu com a representação da Associação dos Lojistas. Claro está que eu, subscrevendo essa representação, não abdiquei da minha opinião individual. Apenas me submeti às deliberações da maioria dessa colectividade.

Eu não sou, positivamente, um fervoroso apologista da regulamentação do jogo. mas também não me pronuncio, em absoluto, contra a sua regulamentação.

Imaginei que seria possível coibir esse vício, mas a experiência demonstrou-me que tal se não poderia conseguir.

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conseguir; e o mesmo sucedeu aos Governos saídos da Constituição, pelo que eu concluo que a proibição de jogo se torna difícil, se não impossível, e era tal caso entendo que do mal se deve evitar o maior, e será isso que sucederá com a regulamentação do jogo, que decerto 2iá-de concorrer para a diminuição de muitos desastres, por ele causados pela forma abusiva como se tem exercido.

Sendo a sua regulamentação feita em termos bastante cautelosos, grandes benefícios podem vir para os nossoa nacionais e alguns prcventos apreciáveis podará auferir o Estado.

Pensando assim, formulei esta minha moção, cms vcu mandar para a mesa.

Leu.

«A Câmara, aceitando em princípio a regulamentarão do jogo, com devidas precauções e reservas, continua na ordem do dia. = José Cupertino Ribeiro».

Sr. Presidente: Nós vamos encarar a regulamentação do jogo por duas maneiras: ou por ela ser precisa para os visitantes estrangeiros que vem procurar o nosso país e que gostam dtsse entretenimento, or, então, por uma necessidade de, da regulamentação^ tirar-se algum rendimento para o Estaio.

Julgo que pelo proje;-to, por mais bem elaborado que seja, para que possa ser útil, melhor seria aprovar ou aceitar a admissão do jogo de azar no país deixando aos Governos a liberdade para eles poderem contratei? com quaisquer indivíduos, or. entidades (empresas) que queiram vir ao nosso país fazer construções nas praias, nas termas ou estações higiénicas, para ali serem construídos edifícios próprios para receber convenientemente os s sus visitantes, edifícios que eu entendo devem ser fiscalizados por uma comissão de construtores e higienistas, L fin de £c£> rem em termos que possam satisfazer todas LS necessidades exigidas por gente costumada a viver confortávsl-mente.

Deveria ter-se apenas em vista que esses contractos e regulamentos nunca possam ter validade sem que a votação do Congresso recaia sobre eles. Poder se Iião fazer negociações neste sentido, que, como já disse, serão provisórias, e depois trazem-se ao Congresso para sobre :las recair a sua aprovação eu rejeição.

Nestes termos, Sr. Presidente, creio que £*guma cousa se pode fazer.

Quanto ao jogo. diz se que o jugo é imoral e per isso deve ser banido do nosso país. Parece-me que es.se argumento não tem grande fundamento. Imoral é Cudo que vai de encontro ou repugna £os nossos costumes.

O j figo em nada repugna aos nossos costumes, porque está inveterado nos povos desde as rnais pequsaas aldeias até às maiores cidades. E exactamente por £,e raconhacsr que é mau e prejudL-ial esse costume, que se pretende regulamentá-lo. E costume mantido em todos os -jaises, e os homens que jogam cos países mais adiantados nào julgam quem joga digno de desprezo.

Homens que tem grande fortuna espalhf.na o dinheiro por esse mundo fora. Jcgf.ni na Bolsa que é tão prejudicial como qualquer outro j figo.

Uma voz: — liais...

O Orador:—Mais cinda. Esses homens estão acostumados a jogar, ganhando e perdendo grandes somas e por isso gostam de fic£.r ELS estâncias onde exista o j figo em grande escala, porotie apreciam as sensações dos gi-ancL-s azares da luta.

Por isso quereiiL'; DÓS atrair aqui es?a gente, a que mais viaja e gasta, diremos permitir o jugo para qus j o guein à sua vontade. Nào devemos ter vehL.dc.de de dar

lições a essas nações qu.e estão muito mais adiantadas que

nos.

i A moralidade varia com a evolução das sociedades. i Há cousas que parecem em certa época imorais, e depois

passados anos, são normais na vida social e até as leis as

; sancionam.

i

i Por isso me parece que esse argumento também não

i pode ser aceito. ,

i Tem-se dito que nós precisamos de aqui atrair os es-

j trangeiros para que eles nos tragam o seu dinheiro.

: Para iaso nós precisamos, como já disse, ter no nosso país habitações que ofereçam o conforto necessário a que eles estão habituados.

Sr. Presidente: para se fazer essas construções são necessárias quantias de que nós não dispomos. Nem as câmaras municipais nem o Estado podem tam cedo iniciar esses me.horamentos com o fim de criar estações de turismo. Neste caso alguma cousa se tem de fazer para que pessoas mais ricas do'que nós aqui venham fazer as construções necessárias e nas condições exigidas. E preciso, contudo, que se dêem vantagens e que se ofereçam garantias. Ora, sendo o Governo e o Parlamento que ':êm por dever zelar os interesses gerais da Nação, é a eles que compete adoptar qualquer medida neste sentido tendente a beneficiar o nosso país.

Sr. Presidente: eu tinha-me inscrito para faiar contra o projecío, porque na verdade ele não' me satisfaz. Entendo que o jogo deve ser regulamentado, mas acho este projecto bastante deficiente.

Tratemos, pois, do assunto quando o pudermos fazer e olhemo-lo a sério porque ele é realmente digno de toda a. nossa atenção.

Ltu-se na mesa a moção cio Sr. Senador Cupertino Ei-'• leiro e foi admitida.

O Sr. Magalhães Basto:—Entendo que o jogo ' deve ser regulado e fiscalizado.

Justamente porque ~o jogo é um mal, porque é um vício nocivo à humanidade, é que pretendo a sua regulamentação e fiscalização.

Disse se que, aprovado o projecto, se poderia dizer que a República era batoteira. Não. A República nunca pó-dera ser alcunhada de batoteira emquanto não estabelecer banca de jogo. A forma como no país se está jogando é que é indigna, é que a República não pode tolerar.

Regulamentando o jOgo, nào se permitindo a entrada nas casc.s de jogo senão a quem apresente a sua cédula, i não se permitindo que jogue senão quem tenha assinado D livro de registo, aqueles que não forem jogadores de profissão lião-de hesitar.

O jogo clandestino só pode aproveitar aos jogadores . viciosos que queiram passar por pessoas que não são.

Os contrabandistas causam menos prejuízos â sociedade , q"Jie QS jogadores e, no emtanto, tem sido mais castigados que estes.

Temos que aceitar as cousas como elas são e fazer que o jfigo cause o menor dano possível.

l

•S'. EÍC.* não revia.

O Sr. Correia de Lemos: — Sr. Presidente: sinto--me em embaraços para usar da palavra numa assembleia desta natureza; conheço a minha insuficiência. .. (Vozes: Não apoiado) sobretudo a minha dificuldade na mobilização de ideias.

Eu nesta parte cornparo-me com o Estado que, dispondo, aliás, de gente para poder pôr em pé de guerra, tcdavia tem dificuldades imensas para fazer a mobilização.

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SESSÃO N-° 39 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1912

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Senado seja benévolo para comigo, porque nem a todos foram dadas faculdades de orador.

Por outro lado, eu peso a responsabilidade que impende sobre miin e receio que a minha palavra possa fazer baixar o nível das discussões nesta casa.

Por outro lado tenho uma alta compreensão da eloquência para conhecer que esta faculdade não me foi distribuída.

Eu ponho a arte da palavra muito acima de todas as outras belas artes.

A música desperta em nós variados sentimentos, mas estes sentimentos tem alguma cousa de vago. Tentaram adaptá-la à expressão de ideias (Wagner). Por este caminho estragá-la hiam. Felizmente, valem mais as obras de arte deste homem de génio do que as suas teorias, que ele foi o primeiro a não seguir. Os «leit-motiv» das suas óperas são em número restrito, setenta ou oitenta.

Ora um vocabulário de oitenta palavras é uma bem pobre língua, infinitamente inferior à mais ínfima das línguas dos selvagens.

Wagner foi grande, mas não pelas suas teorias.

Prezo as belas artes, mas a pintura, a escultura, a arquitectura serão eternamente impotentes para, ao passo que nos emocionam e comovem, despertarem ideias precisas^ e complexas.

Este condão só pertence â arte da palavra, a arte por excelência, que comove como nenhuma outra, sem faltar á justa expressão do pensamento, e isto servindo se da linguagem humana, que é, no dizer de Flaubert, urn caldeirão rachado.

Sr. Presidente: por estas e por outras razoes eu sinto-me vergar ao peso- da responsabilidade que contraio ao assumir a palavra.

Sr. Presidente: trata-se do jogo; eu fiz parte da comissão que elaborou aquele parecer que mereceu a censura do Sr. Artur Costa.

Reconheço que o parecer é pobre, mas o parecer é pobre porque não havia elementos a que a comissão pu desse recorrer para a apreciação mais ou menos completa da jquestão.

Esse parecer, diga-se com franqueza, pesa me na consciência como um remorso.

Eu, Sr. Presidente, ainda não sou tão falho de habilidade que não fosse capaz de arquitetar qualquer razão para sustentar o projecto.

Podia mostrar-me' habilidoso.

A tudo porem prefiro a sinceridade. Sou adversário da regulamentação do jogo.

No parecer há uma palavra apenas que deu origem ao meu remorso; é a palavra aprovação: deveria antes ter sido a palavra apreciação. Traduziria bem o pensamento da comissão.

Mas num regime de condescendências como aquele em que vivemos, sempre receosos de causar dificuldades ao regime, a comissão foi levianamente condescendente até o tím.

Tem a desculpá-la o tê-lo sido para com o Sr. Tomás Cabreira, uma figura de tanto relevo no nosso meio, e que merece todas as homenagens.

Acima de tudo prezo os princípios, a única força orientadora das nossas acções. Tive aqui um desfalecimento, de que muito me arrependo.

A cada instante ouço dizer aos partidários da regulamentação do jogo que, já que queremos a proibição do jogo, proibamos também a lotaria.

O jogo como a lotaria são cousas contrárias aos princípios republicanos ; mas a lotaria è o facto, cousa sempre dum extraordinário poder. Desse facto resultam determinados benefícios.

O tabaco é também um vício ; mas desse vício recebe o Estado para mais de seis mil contos de réis anualmente.

A indústria da fabricação do tabaco faz viver milhares e milhares de operários e de operárias.

Podemos nós suprimir a lotaria? Podemos nós suprimir o tabaco ? Não, decerto, ao menos, para já.

Mas eu declaro com inteira franqueza que, se dependesse de mim, nunca s.e teria introduzido nem a lotaria nem o fumo na nossa legislação, a não ser para os reprimir.

s

O Sr. Sousa Júnior: — Diz muito bem. O vício do fumo produz a metade das lesões cardíacas a que os portugueses sucumbem.

O Orador : — Quanto ao jogo, eu reconheço nele não só um vício, mas um crime, que é castigado pelo Código Penal.

Eu sei que a humanidade tem o vício do jogo há muitos séculos, e sou até obrigado a reconhecer que na, evolução humana, o sentimento da repulsão pelo jogo é um produto serôdio.

Eu mesmo, combatendo-o, faço-o mais pela inteligência do que pelo coração.

Em 33 anos de experiência da magistratura tenho julgado muitos crimes de morte, e nunca encarei sem indignação o homicídio.

Nunca compreendi que o homem pudesse dar criminosamente a morte ao seu semelhante.

Não sou, não posso ser insensível perante a mesa das autopsias, como a Câmara vê.

Todavia, o jogo nada em mim desperta de semelhante.

Diz-se por isso que acto não desperta indignação não é, não pode ser, um crime. Seja. Mas, ninguém me contradirá quando eu afirmar que o jogo tem perniciosas consequências e cria tipos de homem que são autênticas dege-nerescências,"terror e flagelo das famílias. Não será um crime o jogo (sempre o de^ azar), mas dizei-me: ç,qual de vós daria uma filha em casamento a um jogador ?

Alega-se que o jogo não desperta sensível repulsão, como os outros crimes.

Pois é exactamente por isso que eu entendo que o jogo deve ser castigado, e deve ser proibido.

Quando a sanção da opinião é insuficiente adiciona-se-lhe a legal.

O que eu desejaria era que uma parcela de bom senso entrasse nesta discussão.

Não é o dinheiro que deve seduzir-nos. Acima das questões de dinheiro estão as de honra e de dignidade da Nação. (Apoiados^1.

Sinto-me pequeno quando a consciência me acusa de não ter procedido com a devida correcção. Nunca me encolhi perante os que tem os cofres a abarrotar de ouro, nem me senti amesquinhado por ser pobre.

O jogo é uni crime, e os crimes não se regulamentam, ainda que daí venha receita.

O jogo ha muito tempo que não é senão tolerado criminosamente.

Esta raça deperece. A tantos motivos de decadência não ajuntemos mais um — a legalização do jogo de azar. Emquanto o não tivermos, um pouco de vaidade nos é lícito.

Eu pensava que Portugal era a naçcão em que se bebia menos álcool e isso me envaidecia algum tanto. Mas acabo de saber que, infelizmente, não é assim; acima dele estão a Itália e a Espanha.

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DIAEIO DO SENADO

O mesmo digo do tabaco, reconhecendo, aliás, que os prejuízos que causa são muito menores.

A sombra do tabaco vivem milhares e milhares de pessoas ; vivem as agências de transportes, os cultivadores da América e doutras partes, os manipuladores, os revendedores, etc.

Nós não podemos, sob pena de produzirmos um desequilíbrio imenso, proibir o tabaco.

Com respeito ao jogo não temos que suprimi-lo, porque ele, se é um facto, é um facto criminoso ; o que temos é de impedir por todas as formas ao alcance da autoridade que não se divulgue. Não é um facto consagrado pela lei; não o consagremos.

A regulamentação do jogo c Criação e introdução na nossa sociedade dum elemento novo, cujas consequências a niguêm é dado prever, porque cria relações muito complexas.

É a aventura com todas as suas incertezas, ou antes com a certeza dum desastre, porque não se infringem impunemente os princípios.

Há nesta casa médicos, e médicos distintos: pergunto-lhes se é ao de leve que eles introduzem uma substAncia medicamentosa nova nos corpos dos seus clientes.

Seria preciso que fossem inconscientes.

Apoiado do Sr. Soiisr1 Júnior.

A morfinomania não carece do longo uso da morfina para produzir-se.

Muitas vezes a criminalidade do adulto e do vellao è a resultante dum simples traumatismo da criança.

O jogo regulamentado vai ser um elemento perturbador da nossa sociedade.

O Sr. Peres Rodrigues: o jogo...

A regulamentação não é

O Orador: — A regulamentação quere dizer que ura facto que estava fora da lei passou a ficar dentro dela; que o que era crime passou a ser facto lícito em certas condições.

Srs. Senadores, não vos c permitido nesta questão serdes opiniões pessoais.

Mais do que nunca tendes aqui que insoirar-vos no modo de pensar e sentir dos vossos sentimentos: e os vossos constituintes não são só os maridos que jog^m; são as mulheres que muitas vezes tem que chorar a sua desgraça por os maridos jogarem.

O jogo é um elemento perturbador. Ver jogar é prcp?.-rar-se para se ser jogador emérito. Não ofereçamos- às gerações futuras o espectáculo do jogo garantido e aprovado pela lei.

Srs. Senadores, tendes obrigação de renunciar ás vossas ideias pessoais, e inspirar-vos no que sentem as mães e os filhos-famílias.

Eu penso que nesta assembleia, se porventura sã conseguisse provar que c jogo era uma cousa que não rendia, todos estaríamos cê acordo. (Apoiados).

Pois bem, eu confio muito pouco nos rendimentos cia regulamentação do jogo. Os casinos serão frequentados por estrangeiros, homens r afines, que não se contentarão com o que podemos oferecer-lhes.

Viverão nos grandes hotéis (de estrangeiros seguramente) e pouco nos consumirão.

Interrupções que se ',mo perceberam bem.

O Orador : —Eu julgo que o que nos ofereceram pelo monopólio do jOgo, mas eni todo o país, foram 6:000 contos de réis duma vez. Corresponde isto a SCO ccr.tos de réis de renda anual. £ Limitando-se a concessão ao Estéril, Cascais, Cintra e Praia da Rocha, poderá render 50, ICO,

150 contos de réis ? Não tentemos por tal preço uma aventura perigosa.

Sr. Tomás Cabreira: nós temos todos por V. Ex.a muita consideração. Admiramos V. Ex.a como um homem de projectos grandiosos. A irrigação do Alentejo e o porto franco de Lisboa são realmente cousas belas. V. Ex.a deseja que a sua Pátria seja grande; não queira, pois, au torizar com o seu nome uma obra mesquinha e criminosa. Este projecto está muito abaixo do desejo que V. Ex.a tem de arrancar o seu país da pobreza para o lançar num mar de ouro. Faço justiça à sinceridade de V. Ex.a Para mim não "há dúvida nenhuma de que o seu intento foi principalmente favorecer o turismo, estabelecendo o jogo para que os visitantes estrangeiros, em vez de fugirem, ficassem por cá.

Mas parece que tudo se amesquinha nas nossas rnãos. E que nós somos pequenos.

Não queiramos lançar o país, do pé para a mão, nesse mar de ouro em que sonba o Sr. Cabreira. Podemos lá chegar, não há dúvida nenhuma, mas há-de ser pela aplicação de medidas modestas e pelo exercício sistemático de virtudes modestas; fazendo, em suma, de cada português uni trabalhador honesto e modesto. Isto é que nos interessa, muito mais do que tudo o que se possa fazer para conquistar de assalto a torre de ouro. O assalto pode falhar; a acção das virtudes será de resultados certos.

O grande património duma nação é e será sempre a qualidade da sua população.

Façamos, pois, da Nação Portuguesa uma nação essencialmente trabalhadora, moralizada e amiga de cumprir o seu dever. Não aspiremos a conquistar de assalto esse famoso Eldorado.

Sr. Presidente: terminando, e para tranquilizar a minha consciência, eu peço ao Sr. Tomás Cabreira que retire o seu projecto.

Tenho dito.

O Sr. Bernardino Roque : — Não pedi a palavra snbre a ordem, mas vou apresentar urna moção que concretiza a minha maneira de pensar sobre o assunto qua se discute; vou ler :

aO Senado, considerando que o JOgo é um dos meios mais práticos e eficazes para o desenvolvimento do turismo, recp-ihece a necessidade da s;«a regulamentação, vota a generalidade do projecto e continua na ordem do diau.

Sr. Presidente: eu deveria abster-me, talvez,.de tomar a palavra, nesta altura da discussão já bastante adiantada, porque o Senado está saturado de jugo (ay^oiados) e deve ter formado a sua opinião sObre o assunto (apoiados], não sendo os meus argumentos que poderão fazer mudar a sua opinião.

Fui ouvir o Sr. Correia de Lemos com a máxima atenção, firmemente resolvido a desistir da palavra se por acaso S. Ex.a me apresentasse argumentos contra a regulamentação do jogo; infelizmente para mim, S. Ex.d não apresentou argumento algum, argumentando mais coin cri sentimentalidade do que com a realidade dos factos e eu 2ontinuarei, portanto, no uso da palavra, quando mais não

i seja. para justificar o meu voto, que é pelo regulamento

' o j-"ígo.

O j<_>go, Sr. Presidente, é um mal social, um rnal colectivo, e nisso creio que não há duas opiniões diferentes; no que porém eu discordo dalguns dos Srs. Senadores e contra o que eu protesto, é por considerarem o jogo como um

; vício.

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que pode levar aos maiores extremos e à maior degradação.

E no facto de ser o jugo uma distracção, é que está precisamente o seu aspecto simpático e utilitário. Deste simples enunciado, tam simples como um aforismo, ressalta a parte proveitosa do jogo, que é a dispersão, a circulação dos capitais.

Efetivãmente, Sr. Presidente, muitas vezes o meio dalgumas fortunas, tiradas sabe Deus de que origem, voltarem ao ponto primitivo donde foram arredadas é exa-tamente o jugo.

Evidentemente que sim.

A psicologia do jogador é uma psicologia muito extraordinária. Sr. Presidente: com a facilidade com que Gle, quando vai para o jogo, com a bolsa abarrotada de ouro, recusa um vintém a uma desgraçada que tem fome, com a mesma facilidade vai despejar na mesa do jugo esse ouro que, como disse, muitas vezes não lhe custou a ganhar.

Sr. Presidente: o jugo é tam antigo como o homem e acompanha-o, por assim dizer, na sua evolução, desde que dá os seus primeiros passos.

Sem querer mostrar erudição barata que se encontra nos livros, farei apenas, muito ao de leve, a história do jugo.

Jogou-se em toda .a Grécia, menos em Sparta, jogou se na velha Roma, descabeladamente, a ponto que os imperadores romanos se viram na necessidade de prescrever o jugo, não o conseguindo.

Tácito, o historiador, diz-nos que os antigos germanos chegaram a jogar aos dados a sua própria liberdade.

Na índia chegou a ser uma virtude.

Na idade média jogou-se desenfreadamente .em toda a parte, havendo cidades que monopolizaram o jugo, como a capital da República Genovesa, havendo Papas que o perfilharam; e modernamente tem-se jogado e joga-se por toda a parte.

- Em alguns países como na Alemanha, em que a repressão do jugo ó violentíssima, não deixa de se jogar e os Governos toleram o jugo nas estâncias balneares, nas estações climatéricas e nas feiras que mais concorridas são pelos estrangeiros.

O Sr. Ladislau Piçarra : —

£ Fazendo concessões a companhias exploradoras ou fechando os olhos?

O Orador: — Tolera-o. A palavra é esta e V. Ex.a sabe bem o que ela significa; deixa jogar.

•Entre nós tem-se feito tudo; tem se empregado todos os meios para evitar o jugo, mas não se conseguiu o fim desejado, nem se consiguirá.

Há de jogar-se sempre.

Como conhecedor do assunto, posso aqui afirmar peremptoriamente, que o meu amigo Sr. Dr. Eusébio Leão, empregou todos os esforços compatíveis com a sua boa vontade e com os meios ao seu alcance, para acabar com o jugo. Não o conseguiu, tendo só colhido alguns desgostos, pelas medidas que adoptou para ver se atingia o fim desejado: acabar se com o jogo.

A polícia sabe onde se joga e como ela todos nós o sabemos; mas torna-se impossível a repressão efectiva.

Conclusão: é indiscutível que não se pode de maneira nenhuma reprimir, em absoluto, o jogo.

Tanto o passado como o presente demonstram a impossibilidade, que há°de realizar semelhante repressão. Ninguém pode vir aqui dizer que ela é possível, quando o passado e o presente, demonstram o contrário.

Se é assim, e de facto é, só uma cousa há a fazer que o bom senso aconselha que se faça.

É a regulamentação do jogo, tirando dele o máximo partido possível.

Ppdia alongar-me em mais considerações demonstrativas da necessidade de regulamentar-se o jogo, mas não o faço, para não fatigar a atenção da Câmara.

Não posso deixar, porem, de manifestar o meu pezar pelo facto dalguns Srs. Senadores, e alguns meus duplamente colegas, falarem aqui contra a regulamentação do jogo, por mostrarem nisso uma incoerência a toda a prova.

Os que tem vindo argumentar contra a regulamentação do jogo, e querendo ser coerentes, deviam previamente apresentar uma proposta pela execução da qual se acabasse com o alcoolismo, ou para que ele fosse reprimido o mais possível, com a prostituição e com as lotarias.

O álcool, ninguém o contesta, e os médicos sabem isso melhor do que ninguém, é um verdadeiro flagelo da humanidade.

Pois bem, Sr. Presidente, a lei tolera que qualquer indivíduo vá à taberna ou ao café alcoolizar-se, e que depois no delírio alcoólico gere um ente que há-de ser uni pesado encargo para a sociedade, visto que a procriação nestas condições origina sempre um tarado, epiléptico ou cretino, etc.

Também a prostituição é tolerada pelo Governo. E essa tolerância vai até o ponto de dar-se um papel a uma desgraçada, a quem se diz: j Vai prostituir-te!

O Sr. Ladislau Piçarra:—A lei não permite...

O Orador: —A lei autoriza isso. Com relação às lotarias, pode dizer-se também que são outro flagelo.

Alguém disse, creio que Cavour, que a lotaria c um imposto lançado sobre os imbecis. Não creio, visto que a ser assim, seria infinito o seu número, à semelhança dos parvos de que falam as Escrituras.

Eu prefiro dizer que a lotaria vem a ser um imposto lançado sobre os desgraçados, sobre os miseráveis, sobre os pobres.

É preciso que se saiba que três quartas partes dos bilhetes na lotaria são divididos em fracções de 100 e 50 réis que são compradas quási que exclusivamente pelos pobres. "

Então a parte moral, Sr. Presidente, essa é mais revoltante e mais desgraçada visto que não ha casa de pobre onde não se compre uma cautela, ensinando-se deste modo às crianças que um papel que elas compram por 60 réis pode trazer-lhes uma fortuna, tirando-lhes assim o amor ao trabalho.

<_0 que='que' ser='ser' desde='desde' muito='muito' senão='senão' momento='momento' o='o' moral='moral' p='p' remédio='remédio' acto='acto' regulamentá-lo='regulamentá-lo' se='se' reprimir='reprimir' pode='pode' um='um' não='não' jogo='jogo' mas='mas' _='_'>

Eu poderia apresentar as vantagens que podem advir da regulamentação do jogo. mas basta-me apresentar um facto. Sou um dos indivíduos que passam a estacão calmosa no Estoril.

Já no tempo • da monarquia, havia ali um casino com uni luxo relativo, onde, além das representações teatrais, e boa música, havia uma sala de jogo.

Fui lá algumas vezes, não para jogar, porque odeio o jogo de azar, não o tolero; mas fui para observar e distrair-me. Pois notei que a maior parte dos indivíduos que ali concorriam não eram jogadores, não jogavam, mas iam para lá como eu para se distrair.

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DIÁRIO DO SENADO

muito simples, porque não havia verba para sustentar o teatro e outros divertimentos.

^Queremos nós fazer da nossa baía azul uma estação de turismo, apenas para os estrangeiros gozarem a bonita vista da baía e o rolar das ondas na areia? será um ideal para namorados, mas não para quem vem tratar da saúde e se quere divertir.

Para isso é preciso arranjar capitais para desenvolver e criar estas estações de divertimento e eu não vejo, Sr. Presidente, outro meio que não seja a regulamentação do jogo, tanto mai.s que ele é um dos principais passatempos nas estações de turismo.

Vou terminar, não co:no o Sr. Antão de Carvalho, que num rapto oratório pediu ao autor, do projecto para o retirar, eu não faço este pedido, mesmo porque o Sr. Tomás Cabreira já não o poderia fazer, porque sobre esse projecto já incidiram votações da Câmara não permitindo que ele fosse retirado; eu apenas pedirei ao Sr. Tomás Cabreira que, depois de aprovado o projecto nas ua generalidade, o chame a si e o refunda, porque, como está, não satisfaz na sua totalidade. Esse projecto não deve visar o jogo, mas sim o turismo, sendo a regulamentação do jogo uma parte dele..

A República não quere estabelecer o jogo; o que ela quere é criar estações de turismo e, fazendo este pedido ao Sr. Senador Tomás Cabreira, termino as minhas considerações,

Foi lida na mesa e admitida a moção do /Sr. Senador Ber-nardino Roque..

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Faustino da Fonseca. Lembro a S. Ex.a que só tem um quarto J e hora e que portanto tem que limitar as suas considerações.

O Sr. Faustino da Fonseca:—Para que o projec to do jogo fosse devidamente discutido devia ser outra a constituição do Senado. Precisávamos aqui de monárquicos para diante deles termos pudor de renegar o progra ma republicano, de renegar as acusações que havíamos feito à sua devassidão.

Precisávamos aqui de socialistas, para aproveitarem devidamente no interesse da sua propaganda esta flagrante J exposição de moral burguesa, acima da moral dos que in- ; vocam a miséria para servir de taboleta á mais vil exploração, j

Perante uns e outros havia de cessar esta política de miseráveis expedientes; havia de ter fim a cobardia polí-tÍ3a, era que se vai repetindo tudo quanto fez a monar- j quia, como se se pudesse viver com os meios de acção (Io antigo regime. !

Aproveito o ensejo da discussão do jogo, para fazer j afirmações que doutra forma não consente o meio poli- j tico.

Sofre-se duma crise de inteligência, reina uma pavorosa ingnorância, debatem-se os homens como cegos procurando ás apalpadelas uai remédio que os salve, sem compreenderem que se precipitam na mais ridícula das falências.

A frio, com a serenidade das soluções scientíficas, nada se pode dizer nesta terra triste e desgraçada, ondr> nem se compreendem os axiomas da economia política nem se entrevê a ânsia palpitante dos que estudam e praticam a nova ordem social.

Precisamos, pois, de agarrar pelos cabelos os assuntos, quaisquer que sejam, que tragam a emoção das paixões, o ardor dos conflitos, para moldar como no ferro em braza as massas resistentes a qualquer espécie de raciocínio.

É preciso repetir aqxi. no momento em que a Câmara se encontra no ponto mais irritante do debate, que

sem se fundamentar em nova base económica não pode consolidar-se nenhuma mudança política.

À República Portuguesa falta o alicerce que só lhe podia dar uma energia e liai remuneração económica que tivesse encontrado o equilíbrio em novos elementos de ordem social.

Ao contrário disso julgou se que se podia viver, como rio passado, adulando as ruinosas forças depressivas de então.

É em nome desse passado, em nome do direito cívico dos ricos, do gozo insultante, do casino para ricos, do jogo para ricos, das mundanas para ricos, que se faz perder o tenipo aos representantes da Nação.

Em nome do passado honesto falam os que como eu defendem o programa republicano, em nome de cuja doutrina redentora incitamos o povo à revolução. Esse programa diz textualmente: «abolição' das lotarias e de quaisquer jogos de azar, embora com fins caritativos».

Uma VOZ:—Quere abolir a lotaria; e quem sustentava os pobres da Misericórdia?

O Orgvdor :—Respondo coma doutrina de Mousinho da Silveira em 1834. Os conventos arruinavam o povo para fazer depois alarde do caldo da portaria, emquanto que os bens de mão morta, devidamente aproveitados pelo povc, deviam diminuir o numero dos miseráveis.

Outra voz: — Mas consentem o jogo de bolsa.

O orador: — O Deputado Jaurés, que ainda há pouco foi recebido na outra Câmara, representa esse grande partido mundial que se revolta contra as bolsas, que promete abclir a dívida pública, arrancar o braço cansado, dos que trabalham à perfídia dos seus exploradores.

A noção autêntica do valor é a da utilidade social. Os acambarcadores das bolsas fazem flutuar o valor à mercê das suas conveniências arrastando na rede das suas criminosas combinações os que tem a ingenuidade de lhes confiar as suas economias.

Portugal viveu durante largos anos à custa do credor externo, burlado nas grandes bolsas internacionais e espoliado, por fim, pelo Governo que reduziu os juros da divida.

Não ó decente que o novo Portugal, que tanto apela para a justiça da Europa, queira viver à custa do estrangeiro na exploração do jogo, como à custa do estrangeiro viveu na exploração da dívida externa.

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Pois, durante esse período de falsa opulência, o povo foi mais faminto e mais miserável.

[Quando morreu o rei nem havia, sequer, com que pagar o enterro!

país exausto ?

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SESSÃO N.° 39 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1912

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derem roubar impunemente a carga ao comércio holandês carregado de ouro?

Não! Criou fábricas, fomentou a indústria, abriu escolas, desenvolveu o trabalho.

O Sr. Cupertino Ribeiro: — Pois para desenvolver o trabalho precisamos do dinheiro do jogo.

O Orador: — £ Quando V. Ex.a precisa dinheiro para a sua fábrica, vai buscá-lo à roleta? Não, porque se desonrava. Dirige-se a um banco e recebe capital em troca duma letra em que põe honradamente a sua firma.

Uma voz:—Já se jogava no tempo dos romanos.

O orador: — Relego esse assunto ao Senador ^r. Nunes da Mata. O jogo é mais antigo do que o crédito; assim como o roubo é anterior à noção da solidariedade social.

Mas é exactamente por causa do jogo, do roubo e da usura que surgem na idade média os bancos italianos dos Medíeis e que no tempo de D. João I fazem os comerciantes do Porto o honrado acordo da sua Bolsa.

Uma VOZ: — Se não fosse o jogo. nunca os pobres obteriam alguma cousa dos ricos milionários americanos.

O Orador : — Xão! Os milionários americanos fazem doações de õ a 10 mil contos de réis para bibliotecas e para universidades. Toda a sua paixão é a das escolas. E como os portugueses pensam mais, do que em escolas, no iôgo e na exploração dos estrangeiros, permanecendo ignorantes e analfabetos, Oles proíbem a entrada dos portugueses: quere dizer dos ignorantes e dos analfabetos, pela lei de emigração de 1903.

Mas se a proposta do jogo tem apenas o propósito de fazer dinheiro e não o de dar foros de cidade a um vício vergonhoso, eu lhes vou indicar alguns alvitres que deviam fazer parte dum plano de reorganisação nacional, se a nossa anémica mentalidade permitisse mais do que expedientes de jogo com mundanas à mistura.

Sigamos o exemplo do Brasil.

Ali o progresso da República não foi devido ás modificações de bandeira, mas â descentralização que permitiu multiplicar por vinte o esforço económico do Rio de Janeiro.

Dei-se autonomia administrativa, financeira e económica às colónias. Não contemos que elas possam servir-nos de utilidade, estiolando-se no imoral regime em que avulte como uma maravilha a receita do jogo do Fantan. É pre-

ciso repartir com elas a dívida que para elas contraímos; partilhar com elas os sacrifícios que por causa delas suportamos. Com liberdade para disporem utilmente dos seus grandes recursos hão de progredir economicamente, fazendo-nos partilhar da sua prosperidade.

É o exemplo da Inglaterra.

Este plano poderá falhar, mas nem por isso deixará de ser uma nobre e bela cousa.

E o jogo, quer falhando quer dando resultado, será sempre uma imundície.

£ Querem dinheiro? tem o imposto de rendimento, a contribuição da riqueza, a tributação da propriedade; as bebidas alcoólicas, as cartas de jogar e as roletas, a licença para a venda de jóias, os direitos de alfândega em ouro, os Montes de Piedade, a Caixa Geral de Depósitos, a tributação e as multas de agiotagem, tudo quanto representou durante a dissipação da monarquia a opulência crescente das classes que apoiavam o trono, à custa da miséria das classes trabalhadoras.

^ Para quem se fez a República: para os trabalhadores ou para os opulentos ?

O povo que se bateu nas ruas julgou que se fazia em seu proveito, para lhe diminuir a fome, para lhe dar mais pão e mais justiça.

Este projecto em discussão no seu pretendido intuito social representa para o povo o mais atros insulto.

A Eepública não pode viver de expedientes.

O seu futuro depende duma alta moralidade e duma inteligente noção de equilibro social.

O Sr. Sousa Júnior : — Sr. Presidente : mando para a mesa, por parte da comissão respectiva, a última redacção do projecto 51-C. E peço a urgência.

O Sr. Presidente: — Faltam 10 minutos para se encerrar a sessão. O Senador Sr. Sousa Júnior requereu a urgência para a última redacção do projecto õl-C.

A Câmara concordou: e aprovou a última redacção daquele projecto.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental". Antes da ordem do dia entra em discussão o projecto n.° 47-D e proceder-se há à eleição dum membro para cada uma das comissões de engenharia, negócios estrangeiros e legislação operária.

: A ordem do dia será a continuação da que vinha para hoje. Está levantada a sessão.

Eram 18 horns e 30 minutos.

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