O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

REPÚBLICA

PORTUGUESA

IN". 26

EM 10 DE FEVEREIRO DE 1926

Presidência do Ex,mo Sr, Domingos Frias de Sampaio e Melo

Luís Inocêncio Ramos Pereira.

Secretários os Ex.m08 Srs,

Joaquim Correia de Almeida Leitão

Sumário. — Feita a chamada, compareceram 32 Srs. Senadores. O Sr. Presidente declarou aberta a sessão. Procedeu-se à leitura da acta e deu-se conto do expediente. O Governo represen~ tado pelo Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva}.

Antes da ordem do dia.—O Sr. Ferraz Chaves requere a imediata discussão do projecto de lei n.° 42, que codifica a legislação em vigor. Fala sobre o assunto o Sr. Augusto de Vasconcelos, o que leva o orador antecedente a retirar o seu requerimento.

O Sr. Fernando de Sousa trata do saneamento da cidade da Guarda e do abastecimento de carne em Lisboa.

O Sr. Joaquim Crisóstomo alude ao destino dos implicados na última revolução e no caso do Angola e Metrópole.

O Sr. Júlio Ribeiro interroga o Chefe do Governo sobre o que pensa e tenciona fazer acerca dos tabaco." efóiforos. Refere-se à mobilização das respectivas fábricas.

O Sr. Querubim Guimarães refere se à publicidade de uma carta atribuída aum conhecido revolucionário.

O Sr. Alvares Cabral pede a nomeação de auditores administrativos para os Açores.

Sobre o mesmo assunto fala o Sr. Medeiros Franco.

O Sr. Álvaro de Mendonça chama a atenção do Governo para factos graves que se estão dando na Golegã com o posse da Câmara.

O Sr. Constantino refere-se às opiniões sustentadas pelo missionário Pêra acerca do Padroado do Oriente, e o Sr. D. Tomás de Vilhena protesta contra o que se passa no concelho de Amarante com algumas juntas de freguesia.

A todos os Srs. Senadores responde o Sr. Presidente do Ministério (Aníónio Maria da SilvaJ. O Sr. Presidente encerra a sessão.

Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.

Presentes à chamada 32 Srs. Senadores.

Entraram durante a sessão 18 Srs. Senadores.

Faltaram à sessão 20 Srs. Senadores.

Srs. Senadores presentes à chamada:

Afonso Ilouriquos do Prado Castro e Lemos.

Allrcdo Narciso Marcai Martins Portuga1;

Álvaro António Bulhão Pato.

António Alves de Oliveira Júnior.

António da Costa Godinlio do Amaral. '

António Maria da Silva Barreto

António do Medeiros Franco. -

António Xavier Correia Barreto.

Artur Augusto da Costa.

Artur Octávio do IlOgo Chagas.

Domingos Frias de Sampaio e Melo.

Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.

Francisco de Sales Ramos da-Costa.

Francisco Vicente Ramos.

Frederico António Ferreira do Simas.

Henrique Josó Caldeira Queiroz.

Herculano Jorge Galhardo.

João António de Azevedo Coutiulio Fragoso de Siqueira.

João Augusto do Freitas.

Joaquim Correia de Almeida Leitão.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Manuel dos Santos Garcia.

Página 2

Diário das Sessões do Senado

José Joaquim Fernandes de Almeida. José Joaquim Fernandes Pontes. José Mendes dos. Róis. José Varela.

Júlio Augusto Ribeiro da Silya. -Luís Augusto Simões de Almeida. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Pedro Virgòíino Ferraz Chaves. Querubim da Rocha Vale Gaimarães.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Álvaro César de Mendonça. _,

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Augusto César .-de Almeida Vasconce: los Correia.

Constantino José dos Santos.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Ernesto Júlio Navarro. , .•Francisco António de Paula.

Francisco José Pereira. „. João Carlos da Costa.

João Manuel Pés sanha Vaz das" Neves.

Joaquim Pereira !Gil do Matos.

José António da Costa Júnior. *' José Machado Serpá.

Miguel do Espírito Santo Machado.

Rodrigo Guerra Alvares Cabral.

Silvestre Falcão.

Tomás dê Almeida Manuel de Vi-Ihena (D.).

Vasco Gonçalves Marques.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

António Martins Ferreira.

Aníónio dos Santos Graça.

Augusto do .Vera Cruz.

Ernesto Maria Vieira da Rocha.

Francisco Xavier Anacleto da Silva.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

João Catanho de,Meneses.

João Maria' da Cunha Barbosa.

João Trigo Motinho.' ,

Joaquim Teixeira da Silva. /José Augusto Ribeiro de Melo. v?"~!Tosé Nepomuceno Fernandes "Brás.

Júlio Dantas.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

"Luís Filipe de Castro (D.). ""'Manuel Gaspar de Lemos.

Nicolaa Mesquita.

"Raimundo Enes Meira.

Roberto da Cunha Baptista. Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente (às 15 horas e 20 minutos):— Vai proceder-so à chamada. fez-se a chamada.

O Sr. Presidente (às lõ horas e 2õ minutos}:— Estão presentes 32 Srs. Senadores. .

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Leu-se.

O Sr. Presidente:—Como ninguém pede a palavra, considera-só aprovada. Vai ler-se o

Telegramas

Da Junta.de Freguesia de Monte Real, concelho de Leiria, pedindo lhe seja concedida a residência'paroquial, vaga pela morte do respectivo pároco.

Para a Secretaria.

Da Associação Naval 1.° de Maio, da Figueira da Foz, saudando o Ex.mo Sr. Presidente do Senado e o Grupo Parlamentar Desportivo.

Para a Secretaria.

Projecto de lei

N.° 42— Nomeando junto de cada Mi: nistério uma comissão encarregada de compilar e reduzir a um só os diferentes diplomas ou disposições legais em vigor sobre cada ramo de direito ou de serviço público.

A imprimir e distribuir.

Antes da ordem do dia

O Sr. Ferraz Chaves : — Sr. Presidente: 'pedi 'a palavra a fim de que V. Ex.a fizesse o favor de me inscrever para qu»n-do estivesse presente o Sr. Ministro dos Estrangeiros e tarábéni para que V. Ex.a consulte a Câmara se consente que entre em discussão o projecto de lei n." 42.

Página 3

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

. O Sr. Augusto de Vasconcelos (sobre o modo de votar): — Sr. Presidente : acho o. projecto do Sr. Ferraz Chaves tauí interessante, podendo trazer resultados tam vantajosos para a nossa legislação, que julgo haver toda a necessidade em tornar esse projecto muito conhecido de todos.

Estou convencido que o Sr. Ferraz Chaves está neste ponto de vista de acordo comigo.

O Sr. Ferraz Chaves (para explicações] : — Sr.. Presidente : quando fiz o meu requerimento era por reconhecer a necessidade urgentíssima que há de se proceder à codificação da nossa legislação.

Mas, Sr. Presidente, como a minha única pretensão é que o trabalho saia perfeito, o como também não pretendo ter feito um trabalho intangível desejando até que estivesse presente o Sr. Ministro da Justiça para por parte do Governo nos elucidar e dar-nos o seu conselho sempre valioso, peço a V. Ex.a que consulte a Câmara se permite que retire o meu requerimento, pedindo ao mesmo tempo à Câmara a fineza de apreciar esse projecto com a máxima urgência visto ser um assunto muito importante.

foi retirado o requerimento.

O Sr. Fernando de Sousa : — Sr. Presidente : já tencionava ontem usar da palavra para me referir a um assunto, que roputo da máxima importância e para o qual peço a atenção do Sr. Presidente do Ministério.

Ontem discutiu:se aqui um projecto, que merecia toda a nossa simpatia, para se providenciar de um modo especial e excepcional sobre o saneamento da cidade da Guarda, falando-se da necessidade de combater a tuberculose que está sendo o flagelo máximo do nosso país. São verdadeiramente assustadoras as proporções que vai tomando.

Ora, Sr. Presidente, com este flagelo liga-se intimamente o caso de que vou tratar.

V. Ex.as sabem bem as deficiências da alimentação pública.

As estatísticas acusam, por exemplo, na cidade de Lisboa uma deminuição gradual no consumo de carne por habitante.

Ainda ante-ontem, por exemplo, na cidade não houve carne de vaca, havendo apenas péssimo carneiro e carne de porco.

Isto é um facto- que nem no tempç mais agudo da guerra se verificou em Paris, onde tive ocasião de ir todos os, anos. Entre nós quási todos os dias-se verifica.

E já não me refiro a países como a Bélgica, a Holanda e a Inglaterra que têm abundância de pastos e onde a criação de gado se faz em larga escala. Nós tínhamos gado para exportar, e, se agora há falta no país, com o que há faz-se uma torpe especulação.

É o contrabando para Espanha que faz rarear o gado?

Isto é uma situação gravíssima; a falta do carne é cada vez mais acentuada e n3o há succedâneos. As hortaliças caras e' o peixe raro, e quási tudo quanto existe-em matéria d.e alimentação é mau2 dando-se até o facto daqueles que dispõem d0 alguma abastança não terem muitas' vezes possibilidade de adquirir mais que um bocado de carne de porco, ou -de carneiro.

Esta situação não pode continuar.

Chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério para o caso. Quando tanto, falamos no rejuvenescimento da raça, es-' tamos pelo contrário definhando-a, porque, como V. Ex.a sabe, o pão é mau e roubadíssimo, a carne não a temos e ou^ tros alimentos escasseiam e são caros. ;

Estamos pior do que num estado de guerra, em que muitas vezes é necessário o regime de racionamento.

Parece-me que este assunto é de grande importância e por isso deve merecer, a atenção da V. Ex.a ' - - • •'.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do. Interior (António Maria da Silva):—-Sr. Presidente : tomei nota das considerações que acaba de fazer o ilustre Sena; dor Sr. Fernando de Sousa acerca das carnes.

Este assunto já deve ter sido tratado pelo meu colega da Agricultura e pela câmara municipal.

Página 4

Diário das Sessões do Senado

tando isso tem exportado clandestinamente para Espanha algum gado.

Como S. Ex.a sabe, importa-so gado da Argentina, 'mas essa importação se trouxe algumas vantagens, por outro lado torna-•so prejudicial.

Espero pelas medidas .que se vão to-mar, que ôsto assunto só modifique sem deixar do ter em atenção a lavoura e, principalmente, os justos interôsscs do público.

O Sr. Augusto de Vasconcelos (interrompendo) : — A manobra começa por haver falta do carne cm Lisboa. Ora isso ó o pretexto para se aumentar imediatamente o preço.

Parece-me bem que só se acabará com osso tremendo abuso quando se meterem na cadeia os negociantes de carne.

O Orador : —Em certa altura a lavoura pediu para ser reduzida a importação; 'depois há pessoas, como diz o público, que não têm coração.

Perdeu-se a dignidade, o brio do velho comerciante. Antigamente o comerciante dava a sua palavra de honra e, ou a cumpria, ou suícidava-so. Depois da guerra perdeu-se tudo isso.

- Do maneira que, apanhavam o gado com o preço alto, mercê do se ter travado a importação, e trataram de elevar ft carne o respectivo preço.

O Sr. Caldeira Queiroz (interrompendo): — Nem por isso o gado tem subido jias feiras. Há um conluio dos marchantes para só comprarem o gado por um determinado preço.

O Orador:—Mas não é metendo os marchantes na cadeia que se dá carne do vaca em boas condições ao consumidor. É preciso tratarmos do resolver o problema para termos carne sem ser a do marchante, o só assim ficariam todos satisfeitos.

E da minha responsabilidade a criação do Tribunal dos Pequenos Delitos.

Mas, o que ó certo, ó que embora quási toda a gente mo batesse como cm centeio verde (Risos), quando foi da sua criação, só depois é que começou a haver ordem muni certo número de cousas o pena é

que outro tribunal não se possa também constituir para pequenas cousas.

Acabaram-so as rabulices, corno aquelas a que se referia Josó Dias Ferreira, quando dizia que podia demorar uma questão durante 30 anos.

Pelos processos ordinários nós temos maneira do resolver o assunto, conformo vou comunicar ao Sr. Ministro da Agri-culturs, o creio que da acção combinada do S. Ex.a com a da Câmara Municipal do Lisboa o Governo resolverá o assunto.

Tenho dito.

Vozes:"—; Muito bem. O orador não reviu.

O Sr. Joaquim Crisóstomo:—Na sessão cm cuo se discutiu o incidente suscitado pelo Sr. Presidente do Ministério, respeitante ...

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— Incidente suscitado por rnim, não.

O Orador: — S. Ex.a suscitou osso incidente legitimamente e no cumprimento dum dever como Presidente do .Ministério,

' Mantenho o termo. Incidente é qualquer assunto alheio ao decorrer dos tra-ballios da Câmara. Será terminologia, lexicografia, como lho queiram chamar.

Nessa sessão deixei do pedir a palavra para explicações, depois do ter falado o !ár. Presidente do Ministério, porque a hora ia bastante adiímtada e não queria tomar mais tempo à Câmara. Mas, hoje aproveito o ensejo de tornar a versar o mesmo assunto.

Nas considerações, que então produzi, permiti-mo preguntar ao Sr. Presidente do Ministério qual era o destino que pensava dar aos dirigentes do último movimento.

Página 5

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

h minha. Portanto, quando me referir a esses indivíduos chamar-lhes hei sempre dirigentes.

Neste movimento,- como oní outros, podemos classificar os indivíduos que neles entram cni duas classes, os dirigentes o os dirigidos, isto ó os que promoveram o movimento, o os que nulo entraram por ordem, ou por determinação de outros.

O Sr. Presidente do Ministério falou-apenas para justificar a medida tomada pelo Governo acerca dos soldados, c S. Ex.a disso que dentro dos regulamentos militares havia disposições que permitiam ao Sr. Ministro da Guerra, cm virtude dos crimes praticados pelos soldados, transferi-los para qualquer unidade, ou fosso do continente da República, ou fosse da Madeira, ou das ilhas adjacentes.

Não contesto osso princípio, nem tain pouco deixo de reconhecer ao Govôrno o direito de o pôr em execução. Todavia já vi nos jornais a notícia do que os soldados não iam ser transferidos, mas sim julgados em conselho do guerra, porquanto a sua situação não era idêntica à dos soldados que tomaram parto nos movimentos do 18 do Abril o 19 do Junho.

Diz-so que estes últimos obedeceram às ordens dos seus oficiais, ao passo que os soldados que entraram no movimento de 2 do Fevereiro foram orientados, foram di-r'gidos, por civis.

Pregunto: ^c exacta a informação quo o Sr. Presidente do Ministério nos deu aqui de que o Governo somente usaria dos regulamentos disciplinares do cxérr cito para castigar os soldados, ou já só mudou do opinião e pretendo-so fazer julgar ossos soldados ern conselho do guerra o aplicar-lhes penas mais graves do quo as penas disciplinares?

O Sr. Presidente do Ministério reparou na palavra por ruim empregada para clasr sificar a forma como expôs à Câmara o quo havia ocorrido : chamei lacónicas às suas expressões.

S. Ex.a foi lacónico da primeira vez, extremamente lacónico quando tratou do responder aos numerosos oradores que fizeram uso da palavra, o no uso legítimo de um direito lhe fizeram algumas prc-guntas.

S. Ex.a é um velho parlamentar, tem pertencido a todos' os Parlamentos desde 1911 c tem sabido, mais de uma vez, tor-

nar efectivos os seus direitos parlamentares. S. Ex.a conhece bem as praxes paiv lamentares o direito que assisto a quem ccupa este lugar, e a obrigação daqueles quo se sentam nas cadeiras do Poder.

Ora S. Ex.a, em vez do prestar esclarecimentos sobro pontos concretos a que eu aludi, deixou-os ficar perfeitamente em claro. .

Todos nós sabemos que esta atitude não constitui uma novidade, e to:los sabemos também, que S. Ex.a; sendo um ha-bilíssiino político c não menos hábil parlamentar, sabo aproveitar as situações -e sair-se delas como melhor supõe convir aos interesses da sua política.

Isso, repito não constitui para mim novidade, mas eu é que mo julgo na necessidade de versar de novo o assunto.

S; Ex.a não nos disse as causas que determinaram a deportação dos dirigentes do último movimento, nem leu qualquer preceito legislativo quo justificasse a sua determinação.

Muito longo de mim levantar aqui a minha voz para pedir piedade 'e misericórdia para os revolucionários. Muito longo de mim essa idea, porque entendo quo quem delinquo tem do assumir a responsabilidade dos seus actos, o quo as leis do j)ais têm do ser cumpridas.

Esses homens foram encontrados com armas na mão e portanto foram presos e no tribunal competente hão-de ser julgados. Mas ato lá o Governo devia conservá-los reclusos, presos, mas dentro da cidade do Lisboa.

Esses homens que cometeram um crime previsto o punido nas nossas leis podem ser amanhã absolvidos, como têm sido tantos outros quo. entraram em movimentos.

Ê preciso conhecer piincípios do direi» to para saber que, nem todo o indivíduo que infringe os preceitos legais incorro cm qualquer pena. É preciso atendermos às circunstâncias.

Basta vor o quo se passou com o julgamento dos implicados no 18 de Abril.

Página 6

Diário das Sessões do Senado

E preciso considerarmos que esses homens que entraram no último movimento revolucionário podem amanhã ser absolvidos, e então quem os indemniza dos incómodos porque passaram, pois os meteram a bordo de um navio que tem detestáveis condições náuticas, porque a verdade reconhecida por todos é de que o rebocador Patrão Lopes não tem condições de navigabilidade.

" O Sr. Carlos Costa (interrompendo): — S. Ex.a esquece-se de que é um navio de salvação."

O Orador: — Mas -ó da salvação junto das cestas e não no alto mar, e nunca foi Um navio-de passageiros.

Portanto a determinação de mandar sair imediatamente, sem consultar barómetros e outros instrumentos para fazer previsões acerca do tempo, esses homens, constituiu para todo o país, que é formado essencialmente por uma população sentimental, uma violência inqualificável, um acto anti-huruanitário.

E preciso que nos lembremos de que nem todos os indivíduos são adextra-dos ua arte do mar, nem possuem condições paru suportar uma tempestade no alto mar. Para certas criaturas o enjoo constitui um incómodo tam grande como só íôssc uma doença gravo.

O temporal era de sal natureza que o navio teve de arribar à Trafaria, e depois do ter singrado um determinado número de milhas teve de voltar ao porto a fim 'de tomar carvão, pois não tinha levado a quantidade necessária para a viagem nessas condições.

O Sr. António Maria da Silva, foi do encontro ao seu passado de republicano mandando para os Açores, figuras como a do Sr. JustinianoEsteves, contra o qual não há a mais insignificante prova de estar envolvido no . movimento revolucionário.

- Esse senhor foi preso quando passava com um grupo do indivíduos junto do quartel de Campolide. Ninguém pode positivamente afirmar as intenções quo levaram ali esses indivíduos.

- Ret-lto: o Sr. Justiniano Esteves foi mandado para os Açôies sem que coutra 'ele se ti\esse feito a mais pequena prova, quer testemunhal, quer por confissão.

Nessas condições, condeno hoje, como condenei-ontem e hei-de continuar sempre a condenar o procedioiouto do Governo.

E digo mais. Se eu pertencesse a um partido, e houvesse dentro dele homens que praticassem actos dessa natureza, sairia do mesmo partido, desde que me não dessem uma justificação cabal, porque os partidos só se prestigiam quando os indivíduos que os compõem cumprem a lei. Desde que a lei é infringida esses homens perdom o direito à consideração geral do país, porque estão traindo a sua missão.

E em tais circunstâncias devem ser, não digo castigados, porque o castigo hoje não tem significação, mas condenados perante a opinião pública pelas irre-gularkladcs que praticaram. Mas isso, ó evidente, só pode ser levado a cabo por quem tenha a audácia e a coragem necessárias.

O quo ó verdade, porém, é que ainda se não sabe no país para onde é que vão os dirigentes do último movimento revolucionário.

<_ que='que' de='de' saber='saber' governo='governo' trata='trata' elaborando='elaborando' uma='uma' dependerá='dependerá' segundo='segundo' se='se' para='para' saída='saída' dias='dias' triunfe='triunfe' ela='ela' destino='destino' não='não' corre='corre' mas='mas' terão='terão' _24='_24' a='a' seu='seu' homens='homens' os='os' sabe='sabe' _0u='_0u' meses='meses' ou='ou' qualquer='qualquer' circunstância='circunstância' o='o' p='p' conforme='conforme' está='está' pode='pode' depender='depender' vencida='vencida' ou-seja='ou-seja' revolução='revolução' sua='sua'>

IZííiOS.

Era o qnc eu desejava jsaber. £ Tenciona o Governo deportá-los para a Ilha de S. Miguel? Parece-me que não se trata ae nenhum, segredo de Estado, ou diplomático, que impeça o Sr. António Maria da Silva de me esclarecer.

O Sr. Presidente do Ministério e "Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Orador: — Isso, claro, não impedirá que o Diário de Lisboa nos últimos dias diga que os presos vão para o castelo de S. Jcão Baptista em Angra. <_ de='de' porosos='porosos' diário='diário' delgada='delgada' quo='quo' segura.-='segura.-' do='do' diz='diz' isto='isto' para='para' lisboa='lisboa' não='não' veniência='veniência' mas='mas' como='como' ter='ter' ponta='ponta' vão='vão' os='os' e='e' ou='ou' posso='posso' o='o' p='p' pró='pró' informação='informação' esta='esta' será='será'>

Página 7

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

9

Sr. Alves Ferreira, dirigente das investigações referentes ao Banco Angola e Metrópole.

Quando há dias usei da palavra neste mesmo' lugar, pronunciei-me pela conveniência e necessidade de se ultimarem no mais curto espaço de tempo os trabalhos de inquérito, para que os criminosos não tivessem tempo de preparar o terreno e não pudessem, visto quê dispõem de largas quantias, preparar uma atmosfera favorável à- sua absolvição. Vi depois nos jornais que tais investigações iam terminar e com isso fiquei satisfeito e me felicitei. Pois pelo que ultimamente vi no Diário de Lisboa as investigações não terminarão tam depressa.

O Sr. Dr. Ferreira, fazendo umas contas muito reduzidas, naturalmente — nestes casos as contas são sempre muita reduzidas— diz quo ainda levará dois meses para fazer numerosos exames e ainda pára inquirir 200 testemunhas.

Estou certo que estas investigações se hão-de prolongar indefinidamente.-

Há dias foi aberto um crédito de 300 contos para ocorrer a estas despesas, mas ainda hão-de ser abertos meia dúzia de créditos para tal fim, porque as investigações hão-de prolongar-se, á opinião pública há-de esquecer se deste acontecimento, e no dia que os criminosos foreni mandados para juízo já ninguém se lembrará deste caso. Nessa altura as cousas arranjam-so de tal forma que eles se não forem absolvidos hão-de ter uma pequena pena.

Ainda há dias o Sr. Presidente do Mi. nistério fez o elogio da sua obra por .ter nomeado o Sr. Alves Ferreira para essas investigações, mas esse elogio cai pela base, porque, a j ulgar pelas informações que têm vindo na imprensa, ainda temos inquérito para quatro ou seis meses.

Compreendia-se que, se o inquérito fosse executado só por um- juiz se demorasse tanto tempo, mas um inquérito que é dirigido por S. Ex.a e executado por meia dúzia de juizes podia fazer-se no prazo de um mês.

Mas há mais. O Sr. Alves Ferreira, sendo consultado pelo jornalista, diss&: «eu não trabalho, eu dirijo».

^.Será um trabalho parlamentar que tenha um presidente com as funções de dirigir ?

Tenho visto, Sr. Presidente, vários regentes do orquestra que tocam uni instru* mento e vão ao mesmo tempo regendo com a batuta. . . ' • :•

Não me parece demais1 que o Sr. Aí* vês Ferreira, com a sua superior inteligência, vá dirigindo qs trabalhos e ao mesmo tumpo vá executando alguns, porque quando no alto mar se desencadeia uma tempestade o capitão deixa' o seu beliche e vai para a pante do transporte desempenhar funções de governo:

Quando se trata duma situação nofí mal, compreendo que um magistrado simplesmente se limite a dirigir; mas, qaiando a opinião pública'reclama rapidamente o apuramento de responsabilidades, o-magistrado não se pode limitar a dar.or;-dens, tem também de trabalhar. . ;

Este caso não se po.de prolongar indefinidamente, porque já se vai fazendo uma lamúria à roda dele, já.lhe vão fazendo a defesa, dizendo que eles- são umas vítimas, porque a incomunicabilii dado representa uma violência. Tornar incomunicável um indivíduo é afastá-lo-da sociedade e, se ele é sociávelj è.conder ná-lo à morte. - . ,.-.. . .. -. r

Perante esta opinião que se vai for-: mando, favorável aos acusados, o Sr: Presidente do Ministério tem que chamar o Sr. Alves Ferreira ao seu gabinete .e dizer-lhe : — .& preciso que o senhor-no prazo de 30 dias termine os seus trabalhos, pois quando assumiu a • direcção desse serviço já tinha elementos mais quo suficientes para o .habilitarem a trabalhar; e, com dois meses de trabalho, cinco auxiliares da magistratura judicial, alguns escrivães, chefes, etc., policiais, o senhor não pode prolongar esse serviço, o tem do o ultimar rapidamente.

Para outro assunto ainda desejo chamar a atenção do- Sr. Minis-tro do Interior.

O Sr. Presidente (interrompendo): — j S. Ex.a já está falando há meia hora!

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — V. Ex.a e que é o responsável, porque é quem dirige os trabalhos.

Risos.

Página 8

8

Diário das Sessões do Senado

há poiico advertiu o orador" do que já estava a falar havia meia hora.

Ora o Regimento diz que o Senador que desejar usar da palavra antes da ordem do dia o deve fazer dentro do 15 minutos. Por consequência, V. Ex.a tinha todo o direito em cbaniar à ordem o referido Sr. Senador.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— Sr. Presidente: o Sr. Joaquim Crisóstomo não pediu a palavra para um negócio urgente, nem tam pouco para uma Interpelação c, afinal, S. Ex.B realizou, do facto, uma interpelação.

Sr. Presidente: nunca trouxe para a discussão travada nas Cfimariis a profissão que cada parlamentar exerce; mas há circunstâncias que levam a sair os homens dos seus hábitos c, assim, vou liojo cometer um delito, fazendo rcíerCncia á profissão que o ilusSonador Sr. Joaquim Crisóstimo exerce fora desta casa.

Sr. Presidente: conforme V. Ex.a ouviu, bem como o Senado, o Sr. Joaquim Crisóstomo, que faz parte da magistratura do nosso país, permitiu-se a Liberdade de dizer hoje ao Presidente do Ministério oquo acabo com essa história», dando como que uma reprimenda ao magistrado encarregado das investigações.

Com franqueza, dizer-só ao Presidente do Ministério uma cousa destas, representa, por parte do quem o diz, a absoluta negação do sentimento do justiça, que ficaria mal a um paisano, quanto mais a um magistrado.

Nunca há absolnta incomunicabilidado do presos. A do Alves dos Reis era ir visitar a mulher a casa.

Isso foi permitido por um magistrado.

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — E V. Ex.a não o demitiu.

O Orador: —Não, porque não era Ministro.

Quando na polícia estavam simplesmente paisanos, ainda certas cousas eram desculpáveis, mas, desde que é preciso aplicar a uns, coletes dó forças, e a outros capacetes de gelo, os bolchevistas andam à solta, porque há receio .de os condenar*

O Sr. Joaquim Crisóstomo ó um magistrado o não tem direito a proferir essa frase «acabo lá com isso», sempre que lhe apraz.

Há frases que se não proferem. E por isso que esta sociedade está decadente moral e fisicamente.

E, então, vá do se procurar enlamear todos : — As Câmaras não produzem nada. O Governo não trabalha. Quem defender a régie ó um bandalbo, é um criminoso, ó um gafado.

Assim se faz política na minha terra, o até nos órgãos da imprensa de maior circulação.

Isto ó sério? Isto é justo? ^Isto ó que ó fazer política?

E depois a perfídia constante a pretender desmantelar os partidos, a intrigar os homens públicos uns com os outros, a enaltecer as qualidades de certos homens, que são grandes na sua terra, mas com os quais*na'da temos, visto ser-nos vedado interferir nu política dos outros povos.

Depois zangam-so quando ou refiro factos corno o que se passou com um grupo que procurava o sítio por onde mais facilmente podia sor escalado o quartel do artilharia.l.

Fazia parto desse grupo um sargento da própria unidade. A sentinela mandou--os retirar.

Não fizeram caso, meteu uma bala na câmara da arma.

^So a sentinela desfechasse contra o grupo, não cumpria com a sua obrigação?

Há um juiz que declara:

«Se não conseguir provar quo o meu critério é quo ó o verdadeiro, dou um tiro nos miolos».

O Sr. Joaquim Crisóstomo: — ,»Mas o que tenho eu com isso?

O Orado? : — Tcni, porquo veio aqui defendê-lo.

Página 9

Seasfto de 10 de Fevereiro de 1926

9

. O Orador: — Mas acusou outros. Permitiu-se a liberdade de me dizer: «Acabe com isso» ... não se lembrando que o .processo leva muito tempo a instruir.

S. Ex.a condena os tribunais de excepção, e, no emtanto, já íez parte dum dês-.ses tribunais.

S. Ex.a o que já devia ter feito era pe-dir^a sua demissão de magistrado!

E a primeira vez que profiro palavras desta natureza aqui no Senado; mas também o Senado não deve consentir que alguém procure aqui deminuir a respeitabilidade desta alta instituição.

Tudo tem limites, e quando a sociedade anda convulsionada como todos sabem, e se usam processos destes, os meus nervos atingem uma,tal tensão que dificilmente os posso dominar.

Chega a parecer incrível que pessoas •com responsabilidades inerentes à situação que ocupam se permitam apreciar, levianamente, determinados assuntos aqui no Senado.

Alves. Ferreira não precisa das hossa-nas do ilustre Senador e fica muito bein colocado na situação em que se acha. . Fui. buscar um homem que não conhecia, e mal me ficaria a mim que tendo levado esse magistrado a ocupar um lugar que não desejava, deixasse passar aqui p que se não diz claramente referente a esse magistrado de carreira brilhante.

Quando ele iniciou a sua carreira de magistrado, batia-me eu pela causa da Eepública. Se ele me prendesse não tinha que me queixar, os regimes defendem-se.

Vem um magistrado alegar em benefício dos revolucionários o enjoo que de certo padeceriam. Se se conhecessem estas palavras lá fora,

Tudo tem limites!

Não prometi arranjar um «Avenida Palace» para transportar esses indivíduos. Mais vale assim transportá-los, como foram, do que transportar para o outro mundo donde se não volta.

Tem-me chegado diversas notícias. Essas criaturas já devem saber que não sou D. Quichote para andar a bater-me com os moinhos, e a proclamar-me herói, mas, não são essas notícias que me entibiam. Aceito as cousas como aparecem. Cada

um bate-se como pode, com a diferença que não serei eu quem provoque, mas, quando me chegarem, eu farei o que puder.

E se vencido for, eu, numa disposição .testamentária, diria que seria a maior ignomínia para mim junto da minha cova ter um elogio daqueles que andam a .proferir discursos de violências contra mim.

Vozes:—Muito bem. O orador não reviu.

O Sr. Joaquim Crisóstomo : — O Sr.

Presidente do Ministério saiu dos seus hábitos serenos. Não soube interpretar as minhas palavras.

Sr. Presidente: S. Ex.a sentiu-se como homem público ferido e atingido pelas minhas palavras.

O meu propósito não é fazer ao Sr. António Maria da Silva nma oposição política, nem tarn pouco criar dificuldar dês ao seu Governo.

Mas emquanto entrar aqui hei-de emitir as considerações que entender.

E, no emtanto, Sr. Presidente, nunca as minhas considerações foram ao ponto de atingir o primeiro magistrado da nação, como S. Ex.a o atingiu em referências menos corectas só porque o Sr. Presidente da República enviou um telegrama de saudação a um adversário de S. Ex.a

O Sr. Presidente do Ministério naturalmente ainda está sob a impressão da leitura duma carta que veio ontem publicada no Diário de Lisboa, assinada pelo Sr. Armando de Azevedo, em que S. Ex.a diz que o Sr. Domingos Pereira o tinha chamado para defender, a vida do Sr. António Maria da Silva.

Tenho a impressão, Sr. Presidente, que nós vivemos num país de canibais ao ler cartas desta natureza; tenho a impressão que há pessoas que hão sentem a sua consciência tranquila, porque, Sr. Presidente, quem tem a sua consciência tranr qúila não precisa andar vigiado.

Página 10

10

Diário deu Sessões do Senado

Livremente a exponho e com a máxima sinceridade, tendo todos a liberdade de a aceitar, ou de a contestar, mas tendo todos também a obrigação de reconhecer a sinceridade com que falo.

Mas vamos aos factos que tanto excitaram a sensibilidade do Sr. Presidente do Ministério.

S.'Ex.a, referindo-se à minha qualidade de magistrado e avocando a si a qualidade de padre-mestre, a situação de sábio dos sábios, de homem supremo do seu país, porque realmente o é, pois ainda ninguém conseguiu manter-se tanto tempo no Poder como S. Ex.a em 1922, supondo tirar efeitos, recorreu ao sistema de parlamentar velho.

S. Ex.a devia saber que o Sr. Alves Ferreira não está exercendo uma função própria de magistrado judiem!. S. Ex.a está desempenhando uma comissão de carácter administrativo.

S. Ex.a não está numa comarca, não está no Supremo Tribunal de Justiça; S. Ex.a, está numa missão que lhe confiou o Governo e que, dum momento para o outro, lha pode retirar, o que não acontece em qualquer outra circunstância a não ser por motivo de ordem disciplinar.

EQ, Sr. Presidente, não disse uma única palavra em desabono do Sr. Alves Ferreira, como o Sr. Presidente do Ministério quis insinuar à Câmara.

S. Ex.a usou do balões, de fantasias, de sonhos, mas de sonhos diabólicos. S. Ex.a não teve um Anjo da Paz por si; teve uma asa do Diabo a roçar-lhe pela cabeça.

Foi sob esta impressão tétrica, como se acabasse de ler o Inferno de Dante, como se entrasse numa dependência do Inferno, vendo lumes e diabinhos por todos os lados. Então S. Ex.a, que é aliás um homem ponderado, descarrilou o invectivou-me. Porquê?

£ Só porque eu disse aqui à boa paz, embora fale alto como é característico em mim, mas sem má vontade seja contra quem for, mas, repito, só porque eu disse que era preciso activar as investigações e que, para tanto, S. Ex.a chamasse ao seu Gabinete o Sr. Alves Ferreira e lhe fizesse sentir essa conveniência?

Um Presidente do Ministério que pro-

cedesse assim não podia ser acusado por ninguém, nem o Sr. juiz sindicante poderia supor que lhe queria fazer imposições, pois se ^tratava tam somente de conciliar os interesses da justiça com as funções em que S. Ex.a estava investido.

O Sr. António Maria da Silva deturpou as minhas palavra, fez um mau juízo a meu respeito; eu não o faço a respeito de S. Ex.a

Não tive intençfio de hostilizar o Sr. Alves Ferreira..Posso, é claro, discordar da morosidade com que correm as investigações, de S. Ex.a se ter limitado a dirigi-las o não trabalhasse, mas tal discordância não envolve ofensa, nem desconsideração à pessoa a quem é dirigida.

S. Ex.a falou de vários assuntos ao mesmo tempo. Disso, por exemplo, que os homens que os jornais dizem estar incomunicáveis que o não estão, pois podem comunicar com quem querem.

Então tudo isto ó um bluf, uma blague.. Estamos iludindo o país.

Os jornais dizem que esses homens estão incomunicáveis e o Sr. António Maria da Silva diz que não.

H; portanto um facto escuro a esclarecer.

E se me referi a essa incomunicabilí-dade não íoi com o propósito do me solidarizar com os presos, mas, unicamente com o desejo que se esclarecesse a sua situação, que fossem julgados, para depois não poderem invocar a circunstância de estarem incomunicáveis, a seu favor, contra o espírito e disposições da lei.

De mais, o Sr. António Maria da Silva falou do respeito à ordem.

Lembra-me sempre que três desgraçados, só porque estavam examinando o automóvel de S. Ex.a, em 1923, foram encarcerados durante dois ou três meses, e não sei qual foi o destino que depois lhes deram.

Esto procedimento de. S. Ex.a difere em muito do procedimento doutras individualidades que, sondo vítimas de qualquer ataque, intercedem a favor dos presos.

Página 11

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

11

Esse homem político a quem a sabujice duns engraxa as botas, e outros incensam, realçando-lhe a importância, julga-se já um deus sôbre^a terra.

É daí que derivam essas atitudes bélicas o hostis em resposta às minhas palavras.

No Parlamento eu interpreto o sentimento nacional, represento o país. Não obedeço a intuitos políticos, a conveniências pessoais. Entrei nesta casa e jurei a mim mesmo dizer sempre a verdade e do cabeça levantada. N fio vou a conciliábulos, nem ando a bajular seja quem for. Daí as más vontades e os rancores .contra mim. '

Apesar de tudo, não peço um castigo para quem tam mal serve o país, porque entendo que o remorso lhe basta. Jii talvez invadido por esse remorso que o Sr. António Maria da Silva se julga já na câmara mortuária, prestes a entrar no cemitério e convencido de que, pela sua-sua morte, ninguém verte uma lágrima. Jii a sua consciência a condená-lo, porque S. Ex/*1 íoi injusto quando usou da palavra.

Não preciso dizer mais nada.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Ribeiro: — Sr. Presidente: como b Senado poucas vezes tem o prazer de aqui ver o Sr. Presidente do Ministério, as nossas razões acnmulam-se e, em o cá apanhando, todos descarregamos as nossas fúrias sobre S. Ex.a

Risos.

Por consequência, tenha paciência, que a paciência ó uma grande virtude.

Por minha parte pretendo fazer apenas uma sugestão ao Governo. Todos sabem que a Companhia Portuguesa de Fósforos, durante o tempo em que foi a monopolizadora no país, se conservou sempre fora da lei, não respeitando os contratos, nem cumprindo as disposições a que, pelos mesmos, se tinha obrigado. Era, por assim dizer, um Estado dentro do próprio Estado.

Pelo que vem publicado na imprensa, depreende-se que essa Companhia quere continuar a ser um poder nesta terra. Afirma-se que vai em breve encerrar as suas fábricas, deixando na miséria milhares de operários, isto com o fim de obrigar o Governo a satisfazer-lhe as suas exigências.

Ora a sugestão que PU pretendo fazer ao Governo é a seguinte:

Apoiados.

O Governo esclarecerá," na certeza de que não se esquecerá de que vale mais prevenir do que remediar.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: não corro pela minha pasta o assunto a que se acaba de referir o ilustre Senador que rue antecedeu no uso da palavra, mas sim pela do meu. colega das Finanças, o qual já ontem na Câmara dos Deputados, a propósito da questão dos tabacos, teve ocasião de só referir ao mesmo assunto.

Sr. Presidente: é fácil fazer afirmações duma certa ordem neste país, mas é muito difícil dar a solução conveniente a casos que por vezes surgem, principalmente quando se exercem certas funções para o desempenho das quais nem sempre se encontram as facilidades que desejamos-. Introduzem-se por vezes alterações em • determinadas propostas de lei na melhor das intenções, e mais tarde, ao executar a lei, é que se deparam as dificuldades.

Toda a gente entende que se deve aca*-bar com o monopólio dos fósforos e com o dos tabacos, mas o que é certo é que-não é preciso acabar com eles; acabam?, por si próprios.

Terminado o paazo da respectiva con>~ cessão, o monopólio acaba por sua natu1-reza.

Ao discutir-se, pois, a questão dos fósforos e a dos tabacos, no que se devia pensar não era em acabar com os monopólios, porque eles acabam por si, mas deliberar sobre qual o regime que os deve substituir.

Página 12

12

Diário das Sessões do Senado

Pretendeu a actual Companhia concessionária obter do'Governo uma prorrogação de prazo para se colocar dentro da .lei, mas o que é certo ó que o meu colega das Finanças indeferiu o pedido.

Mas, como o consumidor necesbitava de iósforos, tivemos de adoptar uni processo -que não era contrário à lei: o de abastecer o mercado por meio da importação. Daí o Estado tem auferido alguns lu--cros, porque a diferença de preço .compensa a renda que deixou de receber.

Não é este, porém, o regime definitivo. - '

O Sr. Ministro das Finanças declarou -ontem que se não podia permitir a continuação (ia laboração das fábricas-, mas a Câmara sabe que nós temos um problema que pode revestir uma, acuidade, que não teve até agora, mas que pode ter, e •é que a despedida de operár'os pode pro-vduzir uma certa perturbação.

O Estado pode subvencionar esses operários, mas isso representa uma conta que não tem contrapartida.

O que é certo é que o Governo tem de cumprir a lei, e como não é moral deixar essas criaturas na miséria, algumas das quais tem já vinte e cinco anos de profissão, necessariamente o Estado terá de olhar para esses indivíduos e subvencioná-los.

Até agora o Sr. Ministro.das Finanças "tem indeferido todos os pedidos que não estão em harmonia com a lei, boa ou má, e o que convém saber é se convirá manter ou não a lei anterior.

A característica da indústria dos fósforos é inteiramente diversa da dos taba-,cos. As fábricas de fósforos são de par--ticulares e as dos tabacos não são.

Mobilizar! Becordo-me que no tempo da guerra cabia no âmbito da lei de 1923 a acção do Governo no sentido da mobilização" das fábricas. Essa lei permitia ao Governo tomar conta de todas as fábri--cas nessa ocasião.

Ora eu tenho receio de mobilizar as fábricas, tanto mais que, se a memória me não atraiçoa, há uma entidade que quere montar uma fábrica e que só por um pe-,queno nada é que não está dentro da lei. E assim, naturalmente, tomos de dizer aos outros qme se coloquem também dentro

Mobilizar! Se o.fizéssemos tínhamos de

dar algum valor ao que existisse nas fábricas, e isso é um caso um pouco com-.plicado.

De maneira que temos que atentar nas circunstâncias o emquanto pudermos vamos abastecendo o mercado.

Se há uma entidade que pretende colo-car-pe dentro da lei, tanto melhor. . Mas tem-se dado este facto curioso. As .fábricas de fósfosos produziam até aqui uma certa quantidade de fósforos. Acabou o regime do monopólio e essas fábricas começaram a produzir muito mais. e con-,tudo há algumas terras do norte onde se .não encontram fósforos.

O que fez o Governo? Independentemente do concurso mandado abrir para 50 milhões de caixas, o Sr. Ministro das .Finanças levou a Conselho de Ministros a aceitação de uma proposta de lõ mil-hões de caixas de fósforos, por um preço quási igual ao do último concurso.

Há, portanto,- açambarcameuto do público e das pessoas que vendem, para depois exigirem pelos fósforos um preço superior ao que é justo.

Creio ter dado as explicações que podia prestar, na parte que me diz respeito, visto não ser o titular da pasta das Finanças.

Se S. Ex.a entende que eu não fui bem claro na minha resposta, peço o favor de me dizer para eu comunicar ao meu colega das Finanças, que se apressará a vir prestar todas as informações precisas.

O orador não reviu.

O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente j chamo a atenção de V. Ex.a e do Senado para uma carta que veio publicada no Diário de Lisboa de ontem e de que já aqui se falou.

Não quero, nem pretendo de maneira nenhuma interferir, a não ser como observador e crítico, no uso legítimo do meu direito de crítica, nos acontecimentos lamentáveis que há muito tempo se vão desenrolando neste país.

Não me parece, porém, que deva passar sem protesto com que, pelo menos, intimamente, todos os Srs. Senadores concordarão, porque ele é justo, uma passagem da carta a que me refiro n e que casualmente li hoje.

Página 13

Sessão de 10 de Fevereiro de 19-6

13

Sr. Presidente: não pertenço ao grupo dos revolucionários civis, nunca pertenci, nem espero jamais pertencer.

Vozes: — Não diga isso, não diga isso!

O Orador:—Não pertenço ao grupo dos revolucionários civis vermelhos, nem ao grupo dos revolucionários civis brancos, mas esto estado anormal cm que lemos vivido desde que a República se implantou c mesmo antes disso, —o que já era a sombra da República que se avizinhava— desde o regicídio, é de tal maneira confrangedor que não sabemos se é melhor sair do país ou conservarmo-nos Lesta terra, aliás de uma grande tradição de bondade, mas onde actualmente a vida do nosso semelhante ó uma cousa inútil e absolutamente dispensa aquele respeito, que sempre mereceu cm todos os países não instalados em plena selva.

Mas, não ó propriamente ôsss assunto, que ó também interessante e digno do nota, que mo faz chamar a atenção do V. Ex.a o da Câmara para tal carta.

Nessa carta há a referência a um facto quo, a meu ver, sendo verdadeiro ô absolutamente de desprestígio para o Poder.

É o pedido feito ao revolucionário signatário da carta pelo Presidente do Ministério a fim do que intervenha de modo a evitar o projectado atentado ^contra o Sr. António Maria da Silva. E inacreditável!

Nosso pedido há uma nota interessante de afectividade que ó digna de registo, quo estaria muito bem na pessoa a quem a carta se refere como amigo e correligionário do Sr. António Maria da Silva. Nunca poderia estar bem na boca de um Presidente do Ministério, porque representa a abdicação do Poder, porque ó absolutamente impróprio de uma pessoa da categoria do Sr. Domingos Pereira, a ser vôrdadciro o que vem nesta carta.

Um Presidente do Governo não tem o direito de rebaixar a dignidade do seu cargo até o ponto de ir pedir a um revolucionário, qualquer quo ôlo seja, quo do-. fenda o guardo a vida do quem quer quo seja. Isso pertence à polícia.

Estou até cm crer, que tal' notícia não é verdadeira, porque, se porventura o é, merece absoluta censura o procedimento do Sr. Domingos Pereira como Presidente

do Ministério. Se S. Ex.a não estivesse nesse lugar, se fosso um simples correligionário o amigo do Sr. António Maria da Silva que, sabendo quo se tramava contra a sua vida só servisso desse meio, estava certo; mas o quo o não está é quo um Presidente do Ministério ponha de lado as suas forças regularmente constituídas, o vá mendigar o auxílio de um revolucionário e até o ponto do pedir, por tudo quanto há e por .todos os meios quo estivessem ao seu alcance, quo poupasse a vida do Sr. António Maria da Silva.

Isto é a transigência da autoridade com a desordem; isto é a humilhação mais flagrante o a prova mais completa da fra-gueza do Poder perante os díscolos o os turbulentos de quem aliás precisa c dianto do quem, por essa mesma razão, só pros-tcrna.

O Sr. Fernando de Sousa (interrompendo'):—; Esse revolucionário, sobre o qual posaram graves acusações, foi sentado ao lado do Chefe do Estado num banquete quo se realizou em Coimbra, quando da sua visita àquela cidade!

O Orador : — j Sei qne è&so facto se deu, Sr. Presidente, mas ó assim neste desmanchar de feira que a dignidade do Poder se vai deminuindo, é assim quo os seus representantes se vêem .absolutamente destruídos de autoridade cm face da força, quando a desordem campeia o então o Sr. António Maria da Silva admi-ra-so désto constante estado de revolta cm que vivemos!

Ter um Presidente do Governo de mendigar o auxílio dos revolucionários, para que não se vá atacar a vida de um cor-rel

E muito fácil, como só verifica, desencadear revoluções; o quo se torna difícil é prover-lhes- as consequências trágicas e saber evitá-las. Mas a República tem vivido em constante revolução e jamais só podorá suprimir o espírito revolucionário; isso só acontece quando há uma boa administração pública.

Página 14

14

Diário das Sessões do Senado

seus próprios irmãos de armas que saem contra ele os gritos de morte.

Se consultar a sua consciência, ela o acusará de ser um dos principais, culpados da anarquia brava em que vivemos. Não me surpreendeu a carta a que me refiro porque eu já não tenho surpresas neste país, mas deixou me' revoltado. j Tais têm sido os factos, Sr. Presidente, que se têm dado, que eu já não tenho surpresas!

Repugna acreditar, mas ainda não veio .o desmentido. Não posso porém, deixar de, desde já, protestar contra essa forma tam extranha de manter o prestígio e a autoridade do Poder.

Tenho dito.

Ò orador não reviu.

Q Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— "Sr. Presidente: o ilustre Senador que se me referiu nuns termos que eu não posso deixar de agradecer, fez também referências a uma carta publicada nos jornais.

Não é a primeira vez que o facto apontado se dá.

Há pessoas que são de um extraordinário exibicionismo, outras passam a vida a desmentir. Estava eu arranjado se enveredasse pelo caminho do desmentido, tanto mais, que até o ilustre Senador pôs na sua boca uma frase minha, mas com complemento.

Sou essencialmente parlamentarista; julgo que o Parlamento é ainda uma boa válvula, e, embora ele seja acusado de demorar muito na elaboração de medidas, a. verdade é que muitos males se têm poupado ao país, quan'do ele está 'aberto.

Não julgo que o Presidejite do Ministério cessante, porque conheço o seu carácter, o seu patriotismo e as suas-intenções, fizesse esta cousa . simples do aparecer qualquer revolucionário, civil ou não civil, e dizer-lhe que evitasse o a poupasse os atentados que contra mim se fizessem.

São os ossos "do ofício. Qaem se encontra numa situação como a minha,

numa cidade conturbada, tem de ouvir isto mesmo— que se fosse pedir a uma criatura com voz perturbada para ela obstar a atentados.

Não acredito. Tive conhecimento de qualquer cousa de anormal em uma ocasião de quaisquer perturbações.

Muitas vezes não há maneira de saber quem lançou o boato. Um cavalheiro inventa qualquer cousa e depois diz que a ouviu num café, ou em qualquer outra parte. Por isso por inais que se indague • não há maneira de saber quem foi o autor.

Eu, como todos os homens públicos, tenho o maior respeito pela imprensa, que considero um grande factor do progresso dos povos.

No emtanto temos de concordar que à imprensa anuncia revoluções como anuncia espectáculos. Quando se procura saber a origem dos boatos nada se consegue, porque a isso se opõe o que chamam p sigilo profissional.

Depois destas considerações gerais voltemos ao caso.

Estávamos na véspera do acto eleitoral e eu, como todo o cidadão, tinha o direito de votar, direito que não queria deixar de exercer. Houve, porém, a notícia de que alguns ilustres cidadãos entendiam que eu não devia votar, ou que queriam aproveitar as cireunstâucias para me liquidarem.

Não sou de bravatas. Fui votar, ninguém me disse nada, nem caso algum anormal se passou.

Não sei se devo agradecer este facto a alguém, mas devo a vida a tanta gente que, francamente, não sei bem a quem possa dirigir os meus agradecimentos. Lembro até a polémica que se deu acerca da pessoa que tinha conseguido salvar-me a vida quando eu voltasse de cumprimentar o Chefe do Estado.

Isto, de resto, são os ossos do ofício: sujeitei-me a amar, sujeitei-me a padecer.

Página 15

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

10

A final Deão houve acontecimento nenhum, como eu já disse, talvez porque a defesa foi feita de tal maneira que não permitiu que nada se esboçasse.

Sobre a minha acção, como revolucionário civil, tenho a dizer ao Sr. Querubim Guimarães que nunca pretendi sor mais do que sou, e até já tenho sido bem mais do que desejava ou pensava ser.

Mas desejo sempre, quer como Ministro, quer como Deputado, quer como simples cidadão, contribuir para que os cousas públicas marchem em boa ordem no meu país.

De maneira que não tenho o desejo de ser considerado revolucionário no sentido pejorativo. Após uma revolução esqueço me dela, só o que não me esqueço é de olhar pelas vidas dos meus semelhantes-, porque essa é a obrigação dos homens públicos.

Em boa doutrina o ilustre Senador que me interpelou deve confessar que também ó revolucionário. Na sua evolução progressiva há-de encontrar quem não concorde com as suas ideas; nascem assim os conflitos, e S. Ex.a há-de procurar por todos os meios vencer os seus adversários.

É preciso distinguir entre os que fazem uma revolução pelo amor às instituições, ou aqueles que mesmo pacificamente são revolucionários, porque pugnam pelas suas ideas, e os que são criminosos.

Eu distingo entre políticos e criminosos, embora haja pessoas que medem todos pela mesma bitola.

O Sr. Querubim Guimarães (interrompendo}:— S. Ex.a não quero nada com os criminosos.

Mas S. Ex.a se porventura observar um. pouco a nossa história dos últimos tempos, da qual S. Ex.a tem sido um das mais assíduos colaboradores — período histórico esse de tal grandeza, que há-de ter um lugar de destaque na história de Portugal—S. Ex.a verá que tem existido a confusão entre o revolucionário político o o criminoso.

Consiga S. Fx.a fazer entrar na ordem iodos esses criminosos, que logo acabam as cartas nos jornais.

O Orador: — Através da sua história política S. Ex.a também verá essa con-r

fusão, muitas vezes os inimigos da Ke-pública se misturaram com os criminosos para nos atacar.

O Sr. Querubim Guimarães {interrompendo}:— Desde 1919, desde que V. Ex.as nos desafiaram para a luta no campo legal, nunca mais se viram monárquicos metidos em revoluções.

E mesmo, ao ver o caminho que as cousas públicas estão tomando em Portugal, ao ver esto enorme descalabro, nós monárqqicos, em nossa consciência sentimos nascer o sentimento da revolta.

O Orador:—Dizem, Sr. Presidente', que eu sou homem de habilidades.

Pois agora, sem habilidade nenhuma, consegui que o ilustre Senador se confessasse revolucionário naquela acepção mais interessante do termo, . . _ Risofi.

Dizer que os correligionários de S. Ex.!X não tem entrado em movimentos revolucionários é interessante, porque os meses do almanaque Já não chegam'para assinalar, as tentativas que eles" têm feito...

Risos.

O orador não reviu.

«.

O Sr. Álvares Cabral:- Aproveito a presença do Sr. Presidente do Ministério para dizer o seguinte:

O decreto que criou os tribunais administrativos, criou também um auditor nos Açores com sede em Ponta Delgada.

Até agora não tem sido possível nomear-se o auditor. Os processos são muitos. Não tem sido julgados è não há possibilidade de os mandar para os tribunais judiciais, por isso que está em vigor o decreto que criou os tribunais administrativos.

Ora esta situação precisa de ser devidamente considerada. Há um projecto de lei na Câmara - dos Deputados que está nas comissões, sobre o assunto.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):__

Ouvi as observações de S. Ex.a e a resposta é como S. Ex.a deixou entrever.

Página 16

16

Diário das Sessões ao Senado

r o abgrigo do autorizações concedidas no Poder Executivo.

Como houve dúvidas na interpretação da moção, pcdiu-sc que o Governo exprimisse o seu modo de ver.

Tomou um corto compromisso, o não fica bem o estar .a saltar sobre os seus compromissos.

Desde que o caso projudicr, a recrio dos tribunais cspecia's que tratam do julgamento de eleições, não tenho d ávida do levar o assunto a Câmara dos Deputados.

O orador não reviu.

O Sr. Álvares Cabral: — Agradeço as explicações que me deu o Sr. Presidente do Ministério, c confio na boa vontade do S. Ex.a para resolver urgentemente Osto assunto, que tanto interessa os povos açoreanos.

O Sr. Medeiros Franco: — Ouvi com muito interesso as considerações, quo acaba de fazer o Sr. Presidente do Ministério acerca do provimento possível do lugar do auditor administrativo dos Açores.

Efectivamente o decreto n.° 11:250, criou aos Açores uma auditoria. Êsso clo-cro!o foi à Câmara dos Deputados, baixou as comissões o tenho idea quo então o Sr. Presidente do Ministério assumira, de certa forma, o compromisso de não fazer nomeação alguma à, sombra dôsse decreto.

Reconheço quo ó necessário o provimento desse lugar, mas chamo a atcnçcão do Sr. Presidente do Ministério para o fiol cumprimento da lei convencido antecipadamente como estou do que S. Ex.a não desejará saltar por cima dela.

O quo há em matéria de provimento de auditorias administrativas? Sabemos o que a lei cm vigor diz no seu artigo 3.°

Ora, Sr. Presidente, sei que na Repartição do Ministério do Interior existe pendente um requerimento de um juiz do direito de l.a instância quo pede o provimento provisório, nos termos do artigo 3.° da lei n.° 74G, do 25 de Julho de 1917 do cargo do auditor administrativo dos Açores.

Sei, por outro lado, que se pretendo fazer a nomeação do um bacharel cru direito que se encontra nas condições do ser nomeado.

Entendo, Sr. Presidente, mesmo por-

que é Csso o meu critério, sob o ponto do vista geral o filosófico., que estes lugares devem ser dados de proibi Gncia a magistrados judiciais; o, sendo assim, entendo que o requerimento a que mo refiro, e que, aliás, está bom informado, devo ser atendido.

Desejo chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para quando, porventura tenha necessidade do fazer o provimento provisório dôste cargo, olhe, cmfim, para o artigo 3-.° da lei e faça justiça, a verdadeira justiça exigida pelo mesmo artigo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— Sr. Presidente: já há pouco tive ensejo de, cm resposta ao ilustre Senador Sr. Alvares Cabral, dizer o que se mo oferecia relativamente à questão da auditoria administrativa dos Açores e acrescentei que, tendo a Câmara dos Deputados votado uma moção fazendo baixar às comissões os decretos publicados pelo GovCrno anterior à minha acção, terá, necessariamente, do diligenciar que seja dado parecer o mais rapidamente possível e, entretanto, para não parar a máquina administrativa fazer o provimento do cargo •mas com carácter provisório.

O Sr. Álvaro de Mendonça : — Sr. Presidente: desejo chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para factos anormais quo se têm -passado na Golegã com a posse da comissão executiva da Câmara Municipal.

A comissão executiva da Câmara Municipal legalmente eleita em sessão plenária da Câmara, quando ia tornar posse, encontrou os Paços do Conselho guardados pela guarda republicana impedindo a entrada a esses vereadores.

Certamente, não.

Página 17

Sessão de 10 de fevereiro de W16

17

Isto tom uma história.

Numa certa data, em meados de Janeiro último, foram convocados os membros da câmara para reunir em sessão plenária; mas, antecipadamente, reiiairam apenas 7 desses membros e nomearam por sua conta uma comissão executiva.

Ora, não tendo havido aviso aos restantes membros da Câmara, esta comissão executiva não ó válida.

Foi um artifício. A própria Câmara, reunida depois cm sessão plenária, nomeou a sua comissão executiva, nos termos legais.

Pois é esta comissão executiva, nomeada nos termos legais, que não podo tomar posse! E porque? Porque o administrador do concelho não quero, porque o administrador do concelho emprega contra ela a força pública.

O Sr. Ministro do Interior afirma-se uma pessoa de ordem—tem do o ser mesmo por dever do seu cargo.

Apoiados.

Por isso, estou certo de que tomará estas minhas palavras em consideração o que fará o necessário para que esse administrador do concelho não continuo abusando da força, que lho ó dada, c se restrinja ao exercício das suas airibuiçõcs.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: o Sr. Álvaro do Mendonça referiu-se a um caso passado na Grolegã, ou seja, ao facto de não tomar posso a Comissão Executiva da Câmara Municipal do mesmo concelho, ou do ela ser impedida de exercer a sua acção.

É velha doutrina minha, que tenho seguido sempre em todas as ocasiões que tenho ocupado a pasta do Interior^ ou ainda nos Governos a que tenho presidido, mesniD sem sobraçar essa pasta, que o Poder Executivo não pode intervir na acçãD dos organismos administrativos. A Constituição taxativamente marca a ossos organismos unia absoluta indcpendôncia. De maneira que, afasto sempre o Poder Executivo, ou "os" seus delegados dessa acção intervencionista, que só podo exercer-se depois de uma sentença passada em julgado nos tribunais.

Quere isto dizer que, se o auditor administrativo declara que determinadas pessoas têm razão, faço cumprir a sentença.

Mas se não passa cm julgado no auditor administrativo o vai ao Supremo Tribunal Administrativo, faço também cumprir a sentença.

Nunca-permitirei que delegados meus impeçam a entrada nos organismos administrativos .a pessoas que estejam legalmente eleitas. Só consentirei em tal quando haja alteração da ordem pública.

Se os tribunais mo disserem que fulanos ou cicranos estão lá* indevidamente, evidentemente que eu tenho do impedir essas pessoas do exercerem o seu mandato.

De maneira quo nada tenho com o oxer-cicio da função administrativa da Câmara da Golegã. Porém, impedir a entrada no edifício municipal a qualquer pessoa quo tenba o seu mandato e que fosse proclamado, não SP fará com o meu conhecimento.

Pode S. Ex.a, portanto, ter a certeza de quo me vou informar do que se passou a osso respeito e se houver motivo para eu intervir procederei com toda a justiça.

O orador não reviu.

O Sr. Constantino José dos Santos: — Sr. Presidente: sendo esta a primeira vez que nesta sessão uso da palavra, permita-me que eu lho envie as minhas saudações, bem como a toda a Câmara.

Pedi a palavra para tratar dum assunto quo diz respeito principalmente às pastas dos Estrangeiros o das Colónias.

Mas, como não estão presentes os respectivos titulares, peço ao Sr. Presidente do Ministério- o favor de lhes transmitir estas minhas considerações.

Trata-se de uns artigos que apareceram num jornal da manhã sobro a defesa do Padroado da índia.

O jornal foi iludido, do quo não mo admiro, porque qualquer pessoa de bem podo sor iludida quando nos aparece um. padre com vinte o tantos anos de serviço no Oriento, quo só propõo dizer cousas em defesa desse Padroado.

Li com toda a atenção esses artigos e vi quo neles não se fazia a defesa do Padroado, mas sim dum Sr. Padre Porá. °

Página 18

18

Diário das Sessões do Senado

Sabe V. Ex.a, Sr. Presidente, que o Governo Português tem o direito de nomear esses padres, mas não tem o direito nem de os demitir, nem de os transferir.

Se o Governo Português tivesse esse direito, estou certo de que já há muito tempo esse senhor teria sido demitido.

O que se poderia fazer era algumas démarches junto do Sr. Patriarca das n-dias a ver se se conseguia a sur. transferência.

Creio que num Govêrno^anterior, ao que V. Ex.a actualmente preside, se começaram fazendo essas démarches.

Desejava, pois, que os Srs. Ministros respectivos me esclarecessem sobre se essas démarches foram efectuadas e que resultado deram, porque tenho a impressão que essa campanha, que agora vem feita nos jornais, é exactamente o resultado dessas démarches.

Já que o assunto foi tratado na im-prena, acho que o público tem o direito de saber toda a verdade.

Se o facto de discutir o assunto na imprensa vem trazer desprestígio para o Padroado a culpa 6 do Sr. Padre Pêra, e é mais um mau serviço que elo presta ao Padroado da índia.

Tenho dito.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: devo dizer ao Sr. Senador que usou da palavra, que transmitirei aos Srs. Ministros as considerações de S. Ex.a

Não conheço, como S. Ex.a calcula, esse assunto., mas os Srs. Ministros na devida oportunidade darão, todos os esclarecimentos a S. Ex.a

Tenho dito.

O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: venho também dizer ao Sr. Presidente do Ministério o Ministro do Interior, que no concelho de Amarante, os eleitos para as juntas do paróquia dá várias" freguesias foram também impedidos de tomar posse, e foram substituídos por uma comissão, tendo-se desta forma traído completamente a vontade do povo daquelas rciJões.

Estes factos estão-se r.apetindo com uma insistência muito desagradável.

Peço ao Sr. Presidente do Ministério para dar instruções aos seus delegados a fim de que não consintam nestes desmandos e subretudo para que não se associem a eles.

S. Ex.!l, como eu ainda há pouco tive ocasião de ouvir, e nisso tem todo o meu aplaso, disse que está disposto a meter todos^ estes casos na ordem.

Tem-me sempre ao ^eu lado paranesse campo o auxiliar. O que desejo é que S. Ex.a efectivamente traduza essas suas promessas, mantendo a ordem, fazendo justiça e garantindo os direitos dos cidadãos.

E, nesta ordem deideas,peço a S. Ex.a mais alguma cousa:

É que, por-amor de Deus, S. Ex.a diga a estas autoridades de Lisboa, a estes regcdorecos, que não estejam constante-mente a praticar tropelias em matéria de recenseamento eleitoral.

No ano passado cortaram roais do 2:000 eleitores e este ano os Srs. regedores negam-so a passar os atestados do residência que é uma das suas obrigações.

Bem sei que S. Ex.a me vai responder que tudo isto está previsto na lei.

Mas desde que os regedores estejam convencidos de que o Ministro do Interior não está disposto a consentir nesses desmandos, não se metem nessas habilidades.

De resto, toda a gente sabe que não há maneira do fazer ir ao tribunal um regedor porque,não cumpre com os seus deveres.

E esses desmandos são de tal ordem que, por exemplo, o Sr. Fernando de Sousa, aqui presente, pessoa de alta categoria, é cempletamente desconhecido pelo regedor da sua freguesia; o Sr. Agostinho Lúcio, que há 25 anos é subdelegado de saúde "em Lisboa, foi dado por desconhecido; outras pessoas têm sido dadas por analfabetas. Tudo isto tem dado lugar a um grande número de reclamações, e por isso eu peço a S. Ex.a a sua atenção cuidada para o assunto,

S. Ex.a compreende que este processo de consultar o eleitorado e fazer eleições não convém a ninguém.

Página 19

Sessão de 10 de Fevereiro de 1926

19

sentasse uma feição bem mais favorável aos interesses nacionais.

Trago ainda para exemplo aquela desgraçada eleição de Alenquer. Meteram-se na cadeia dois homeias honrados só porque dispunham de força eleitoral, e Ia os mantiveram durante oito meses, tudo isto feito com a proteção das autoridades. E o próprio acusador desses homens, que declara ao seu advogado, que os fez meter na cadeia para conseguir o êxito das eleições e quê estava disposto a'despronúncia los desde que os presos lhe dessem dois terços dos seus votos.

Era então administrador um tal Eobin e mandaram para lá substituí-lo o Marques das Barbas. Está claro que chegou o Marques das Barbas, que eu conheci levando o pendão dos Senhor dos Passos, sempre contentíssimo, quando lá chegou a primeira cousa que fez foi pôr na rua dois dos três presos que lá estavam, mas com a condição do não, saírem do casa durante o tempo das eleições. Mas o Marques das Barbas foi retirado do serviço e mauiU-ram para lá outro pior.

Agora tudo isto é da responsabilidade de V. Ex.a e portanto não queira ter delegados dessa ordem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva) : — Tomo nota das considerações que

acaba de fazer o ilustre Senador e meu amigo Sr. D. Tomás de Vilhena, referentes às queixas acerca da Junta da Freguesia do concelho de Amarante, tanto mais que na Câmara dos Deputados já se tinha ventilado esse assunto.

Quanto aos outros casos, S. Ex.a compreende que não se pode evitar que se pratiquem certos desmandos.

Pelo que diz respeito a eliminação de nomes de várias pessoas nos cadernos eleitorais, S. Ex.a sabe que isso até se tem dado aqui na cidade de Lisboa, em que as pessoas a que estão afectos esses serviços encontram sempre maneira de iludir. Tomos de aperfeiçoar esse sistema; se eu pudesse transformava todos esses processos rio sentido de assegurar todos ~os direitos do cidadão; no emtanto pode S. Ex.a crer que tudo quanto esteja na minha alçada eu farei cumprir.

O orador não reviu.

Ò Sr. D. Tomás de Vilhena ^— Sr. Presidente : pedi a palavra para agradecer ao Sr. Presidente do Ministério as explicações quo S. Ex.a acaba de dar.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é no dia 12, à hora regimental, sem ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

O REDACTOR — Albano da Cunha.

Página 20

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×