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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DO SENADO

3ST. 44

EM 13 DEJABRIUDEU926

Presidência do Ex,mo Sr, António Xavier'Correia Barreto Luís Inocêncio Ramos Pereira

Secretários os Ex,mos Srs,

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal

Sumário. — Tendo-se verificado a, presença de 33 Sr.t. Senadores, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Procedeu-se à leitura da acta, que foi aprovada, e deu-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Presidente propôs um voto de sentimento pela catástrofe dos Açores, que especialmente atingiu a Ilha do Faial. Associaram se os Srs. Joaquim Crisóstomo, Machado de Serpa, Júlio Dantas, Martins Ferreira, Azevedo Coutinho, Ferras Chaves, Alvares Cabral, Vasco Marques e O. Luís de Castro, que propôs também um aditamento, que foi aprovado. Em nome do Governo^ apreciou-o, o Sr. Ministro da Instrução (Santos Silva}. Foi por unanimidade aprovado o voto de sentimento.

O Sr. Lima Duque anunciou uma nota de m-terpelação acerca de serviços anti-rábicos.

O Sr. Joaquim Crisóstomo, elogia a acção da imprensa no descobrimento do crime de Maria Alves e do caso das notas tipo Vasco da Grama espalhadas nas ilhas do Pico e Flores.

O Sr. -Fernando de Sousa tratou da mudança da hora.

O Sr. Vasco Marques pediu que o Governo autorizasse que os navios estrangeiros levem carga para a Madeira.

A todos os Srs. Senadores responde o Sr. Ministro da Justiça (Catanho de Meneses).

Ordem do dia — Verifica-se a interpelação do Sr. Júlio Ribeiro ao Sr. Ministro da Instrução (Santos Silva}.

Disculem-se as emendas apresentadas pelo Sr. •Júlio Dantas ao orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Falam os S~rs. Júlio Dantas, Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges). Santos Graça (relator) e Herculano Galhardo, que fica com a palavra reservada.

Seguidamente o Sr. Presidente encerra a sessão.

Abertura da sessão às 15 horas e 15 minutos.

Presentes à chamada 33 Srs. Senadores.

Entraram durante a sessão 31 Srs. Senadores.

Faltaram 16 Srs. Senadores.

Srs. Senadores presentes à chamada:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

Álvaro António Bulhão Pato.

António Alvos de Oliveira Júnior.

António da Costa Godinho do Amaral,

António Maria da Silva Barreto. ' ^António Martins Ferreira. ,

António dos Santos Graça.

António Xavier Correia Barreto.

Artur Octávio do Rego Chagas*

Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.

Ernesto Júlio Navarro. .

Francisco José Pereira.

Francisco de Sales Ramos da Costa. '

Francisco Vicente Ramos.

Herculano Jorge Galhardo.

João Augusto de Freitas.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Correia de Almeida Leitão.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

José António da Costa Júnior.

José Fernando de Sousa.

José Joaquim Fernandes de Almeida.

José Machado Serpa.

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Diário das Sessões do Senado

José Varela.

Júlio Augusto Ribeiro dá Silva.

Júlio Dantas i

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Lq,ís Inocêncio Ramos Pereira. 'Miguçl do Espirito Santo Machado/ c-Pedro* Virgolino Ferraz Chaves.

Sr s. Senadores que entraram durante a sessão:

Álvaro César de Mendonça.

Artur Augusto da Costa.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Augusto César de Vasconcelos Correia.

Augusto de Vera Cruz. •

Constantino José dos Santos.

Domingos Frias de Sampaio e Melo.

•Elísio Pinto-de Almeida e Castro.

Francisco António de Paula.

Frederico António Ferreira de Sim as.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás. .

João António de Azevedo Coutinho Fragoso de Siqueira.

João Carlos da Costa..

João Catanho de Meneses.

José Joaquim Fernandes Pontes.

Luís Filipe de Castro (D.)

Roberto da Cunha Baptista. • Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

Silvestre Falcão.

Tomás' de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.).

Vasco Gonçalves Marques. „

Srs. Senadores que não compareceram:

'António de Medeiros Franco.

Ernesto Maria Vieira da Rocha.

Francisco Xavier Anacleío da Silva.

Heáriqne José Caldeira Queiroz.

João Maria da Cunha Barbosa.

João Trigo Motinho. „ Joaquim Manuel, dos Santos Garcia. .' 'Joaquim Teixeira da Silva.

José Augusto Ribeiro de Melo. • José Nepomuceno Fernandes Brás.

Luís Augusto Simões de Almeida.

Manuel Gaspar dó Lemos.

Nicolciu Mesquita. . .- 'Querubim da Rocha Vale Guimarães.

Raimundo Enes Meira.

Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente (às 16 horas e 12 minutos)'.— Vai proceder-se à chamada. fez-se a chamada.

O Sr. Presidente (às lõ horas e 17 minutos):— Estão presentes 33 Srs. Senadores.

Está aberta a sessão.

Vai ler se a. acta.

Leu-se.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada.

Vai ler-se o

Expediente

Ofícios

Da Presidência da Câmara dós Deputados, acompanhando a proposta de lei que concede pensões à viúva do general Fernando Tamagnini de Abreu e Silva e à viúva e filhas do general António Júlio da -Costa Pereira de Eça.

Para a l.a Secção.

i

Da Administração dos Caminhos de Ferro do Estado, enviando seis exemplares do relatório da sua gerência.

Para a Secretaria.

Do Ministério das Finanças, convidando os .Srs. Senadores a assistir à reunião do Conselho Superior de Estatística que se reaiiza nos dias 16 e 17 do corrente.

Para a Secretaria.

Da Câmara Municipal da Pampilhosa, protestando contra o subsídio de 350 contos Ê- conceder à Federação do Remo.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Guerra, respondendo ao requerimento n.° 45, do Sr. Ferreira de Simas.

Para a Secretaria.

Para dar conhecimento ao interessado.

Telegramas

Dos chauffeurs do Famalicão, Santo Tirso, Vizela, Arcos de Valdevez, Póvoa de Víirzim, Barcelos e Viana do Castelo, protestando contra o projecto de lei do Sr. Elísio de Castro relativo à carta de chauffeurs.

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Requerimentos

Dos cidadãos José de Oliveira Fonseca e José António Nunes, pedindo para serem reconhecidos revolucionários civis.

Para a comissão de petições.

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública, me seja enviada nota especificada das despesas feitas com a instalação dos serviços anti-rábicos da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e relação nominal do pessoal em exercício no respectivo instituto.—Júlio Ernesto Lima Duque.

Mandou-se expedir.

Requoiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecida uma nota proveniente da .importância das custas, emolumentos, salários, percentagens e outros proventos respeitantes às execuções fiscais recebidas por cada um dos funcionários de qualquer categoria dos tribunais das execuções fiscais de Lisboa o Porto e no juízo das mesmas execuções nas capitais dos outroe distritos do continente no ano civil de 1925. — Joaquim Crisóstomo.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecida uma nota da importância da multa da contribuição de registo imposta aosjierdeiros do falecido Abraão Bensaúde, com indicação da parte que pertenceu ao Estado, ao denunciante, e da que coube a cada empregado, e bem assim a depositada na Caixa Geral.— Joaquim Crisóstomo.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecida uma nota das importâncias do imposto pessoal do rendimento distribuído nos anos de 1922-1923 e 1923-1924 aos seguintes contribuintes :

1.° Marquês de Val-Flor.

2.° Alfredo da Silva. '

3.° José Ferreira Amaral.

4.° Henrique àe Mendonça.

5.° António dos Santos Jorge. — Joaquim Crisóstomo.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério da Instrução Pública, me seja fornecida com a,

máxima urgência uma nota detalhada das propostas aprovadas na comissão .nomeada pelos Srs. Ministros da Instrução o1 do Comércio para dar o se;u parecer sobre o conflito académico.—Álvares Cabral. Mandou-se expedir.

Nota de interpelação

Desejo interpelar o Sr. Ministro da Instrução Pública sobre a instalação dos serviços anti-rábicos anexos ao Instituto de Patologia Geral da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.—Júlio 'Ernesto Lima Duque.

Mandou-se expedir.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente : —Como V. Ex.as sabem, ocorreu no dia 5 do corrente mês um terremoto nos Açores.

Aos Açores, ligam-me a gratidão e a amizade daquela santa gente, entre a qual estive quási um ano.

Julgo, pois, ser um- dever da minha parte propor que se lance na acta am voto de sentimento, por semelhante catástrofe.

Repetidos apoiados.

O Sr. Joaquim Crisóstomo::—Sr. Presidente: associo-me, ao voto de sentimento proposto .por V. Ex.a, porquanto, segundo as notícias telegráficas que tenho recebido dos Açores, ocorreu no dia 5 do corrente mês um terramoto, ou um grande abalo sísmico, que causou colossais prejuízos aos povos daquelas ilhas.

A situação especial em que se encontram os Açores e sobretudo a vida económica dos povos do distrito da Horta sofreu consideràvelmente com esta tremenda catástrofe.

Cumpre, portanto, ao Sr. Ministro das Finanças tomar providências urgentes e imediatas, como se tem-feito já em casos perfeitamente idênticos.

Espero que S. Ex.a não regateará os necessários recursos, não para compensar, não se fala em compensações, mas para atenuar, tanto quanto possível, os prejuízos ocorridos.

Calcula-se que os danos causados pelo terremoto se elevam a 2:000'contos.

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mero, destruídas completamente, estando conseqúentemente milhares de pessoas sem abrigo e que, comp é fácil de calcular, não têm recursos para reconstruir as suas casas.

Espero, também, Sr. Presidente, que, como tem sucedido em casos idênticos, a imprensa portuguesa, principalmente a de Lisboa, sempre pronta a aplaudir iodas as iniciativas tendentes a minorar a desgraça dos outros, abra uma subscrição, ou em dinheiro, ou em qualquer espécie, do forma a tornar menos dolorosa a situação desta pobre gente.

Outro ponto que ouvi já versar, parece-me qae na outra Câmara, refere-se à suspensão das contribuições do corrente ano, e mesmo de mais alguns.

Bem sei que o Tesouro Público não está em. condições de poder dispensar as ssuas receitas, mas também ha casos de natureza tam aflitiva e que interessam a população do País inteiro que não podem, nem devem deixar de merecer a atenção dos poderes públicos. • Creio que durante um ou dois anos devido àfdeficiência de pessoal competente não foram cobradas contribuições rio distrito da Horta, devendo agora ser pagas.

E se porventura o Governo não pode prescindir do pagamento dessas contribuições ó certo que 'pode. prorrogar o prazo para o seu pagamento, e prorrogá-lo por uma forma a torná-lo mais suave, qual seja do pagamento em prestações.

Associo-me ao voto proposto por V. Ex.a, Sr. Presidente, e sinto não estar presente o Sr. Ministro das Finanças para que S. Ex.a ouvisse as minhas considerações, sendo, porém, certo que S. Ex.a ]á conhece o assunto, não só pelos jornais, como por o terem comunicado alguns parlamentares açoreanos, principalmente do distrito da Horta.

Nestas circunstâncias, peço a V. Ex.a que lhe dê conhecimento das reclamações que apresentei, afim de que S. Ex.a exerça a sua influência no sentido de trazer ao Parlamento uma proposta consignando uma determinada dotação para os inteli-zes da Horta.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente : — Comunicarei ao Sr. Ministro das Finanças as reclamações de S. Ex.a

O Sr. Machado Serpa: —Sr. Presidente: pelos telegramas publicados nos jornais de larga circulação e informação, como sejam Século e Diário de Noticias, V. Ex.a, e naturalmente todo o Senado, têm conhecimento de que no dia 5 do corrente a ilha do Faial, pertencente ao distrito que tenho a honra de representar, foi flagelada por um terramoto, porventura o mais violento de todos os abalos sísmicos de há anos para cá naquelas vulcânicas paragens.

O desastre assumiu feição e proporção de catástrofe e como é natural traz, e trará, por,muito tempo alarmada a angustiada população.

Se bem que não tenha havido vítimas pessoaiis, o terramoto'acarretou graves e sérios prejuízos, especialmente nas freguesias rurais, computados a grosso modo em 2:000 contos.

Há casas arruinadas e outras completamente arrumadas, e há gente que não tem recursos para reedificar as suas moradias, e há porventura também gente sem abrigo, não sendo ainda conhecida pormenorizadamente a extensão do fenómeno rias outras ilhas do distrito.

É bem certo que nunca uma desgraça vem desacompanhada de outra. E que não há muitos meses aquelas ilhas foram acoitadas por um rijo ciclone que grandemente prejudicou e quási arrasou as culturas e searas. E porque isto é assim, não preciso carregar as cores do triste quadro.

Mas o que ó crença para mim, e crença bem firme, é que o Senado acompanha aquela parcela de terra e de gente bem portuguesa na sua desdita da hora presente.

Louvo a simpática e eloquente iniciativa de V. Ex.a, que de resto estava no ânimo de nós todos, açoreanos, submetendo à aprovação do Senado um voto de pesar por aquela catástrofe.

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adopção de providências tendentes a atenuar os efeitos daquela catástrofe, que uns segundos mais redundaria numa tragédia. De sua natureza, o caso .urge; ó inadiável.

O Governo deve saber, e em especial, o Sr. Ministro das Finanças, que aquela pobre gente do distrito da Horta, que eu tenho a honra de representar aqui,' há muitos meses que não, vem fazendo outra cousa do que estar à boca dos cofres públicos a pagar contribuições, muitas delas atrasadas de há anos, não por culpa deles, mas pela falta de oportuna cobrança.

Nestas condições, a mim me quere parecer que não ó exigir muito um desconto, um abatimento nas contribuições vencidas e ainda não pagas, ou nas que proximamente se vençam, e conseqúente-mente um alargamento no-prazo para o pagamento das que estão em dívida.

Sr. Presidente: nesta altura em "que está nesta Câmara e na outra o Orçamento geral do Estado, não posso legal e regimentalmente apresentar um projecto de lei abrindo um crédito especial para acudir aos efeitos da catástrofe açoreana.

Podia invocar a suprema e dura necessidade, que não conhece lei, mas confio absolutamente na acção que o Governo vai desenvolver, tanto mais que já conversei com alguém do Governo que me garantiu a sua boa vontade.

Sr. Presidente : mais, e mais eloquentemente que eu pudesse dizer e fazer, dizem dos factos do terramoto na ilha do Faial os telegramas que me foram enviados, e que só agora trago à Câmara, porque é esta a primeira sessão depois da catástrofe. Apresento-os ao critério do Senado, acrescentando que eles são de entidades oficiais e de organismos locais.

Vamos ao primeiro : é o da Junta Geral representativa de todo o distrito.

Por agora só sabemos dos danos e estragos ocasionados pelo medonho terra> moto na ilha do Faial, ignorando-se os efeitos do terramoto nas outras três ilhas do distrito.

São telegramas da Junta Geral representativa de todo o distrito; do presidente da Associação Comercial e do Presidente da Câmara Municipal. Todos eles lamentando os terríveis efeitos do terramoto impetram o urgentíssimo auxílio do

Governo para combater tamanha desgraça atingindo milhares de pessoas.

Sr. Presidente: quem como eu ali tem presenciado os efeitos destes fenómenos é que pode «avaliar o que vai nesta hora de pavor naquela gente.

De factos concretos apenas tenho conhecimento de ' que ficou completamente inutilizada uma igreja paroquial e que o farol no extremo da ilha deixou 'dê. funcionar por efeitos, do abalo violento de terra. Também me disseram, mas não asseguro, que durante muitas horas foram vistas na orla do horizonte grandes chamas, ou labaredas.

Não é de admirar que isso tenha acontecido, porque podia perfeitamente existir um vulcão submarino no mar dos Açores. Ainda bem que foi no mar que isso se deu, porque se acontecesse em terra seria dos mais nefastos efeitos.

Este vulcão alcançou parte da ilha, o norte, que foi o mais castigado e onde mora a população mais pobre, que reside em casinhotos e que não está em condições nem tem recursos para a readifica-ção das suas moradias.

Sr. Presidente: creio que depois da leitura deste telegrama nada mais se pode dizer se não confiar na boa vontade do Parlamento, apoiando qualquer medida que o Governo aqui traga nesse sentido, e peço a S. Ex.a o Sr. Ministro da Instrução a fineza do transmitir ao Sr. Presidente do Ministério e ao Sr. Ministro das Finanças estas minhas considerações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Dantas: —'Sr. Presidente : pedi a palavra para me associar, comovidamente, em nome da minoria nacionalista, ao voto proposto por V. Ex.a, e para declarar a V. Ex.a e ao Senado que este-lado da Câmara, embora em princípio não concorde com isenção de contribuições, dará no emtanto o seu apoio a qualquer medida que, porventura, aqui seja apresentada nesse sentido pelo Governo, ou por qualquer Sr. Senador.

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por V. Ex.1 acerca da enorme catástroíe que tanto feriu a laboriosa região da ilha do Faial.

O Sr. Azevedo Coutinhô:'-— Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome deste lado da Câmara, me associar ao voto que V. Ex.a exprimiu.

Devo dizer a V. Ex.a que a minoria monárquica acompanha com o maior sentimento os grandes prejuízos e os grandes desastres que a cidade da Horta e a Ilha de Faial sofreram.

Como antigo marinheiro muito especialmente o faço por se tratar do uma população de marinheiros dos mais bravos o valentes que têm existido em Portugal. Significo, pois, toda a minha admiração a essa gente tam honrada e tam sacrificada.

O orador não reviu.

O Sr. Alves Monteiro: — Ern nome da maioria associo-mo ao voto de sentimento proposto por V. Ex.a

O Sr. Ferraz Chaves: — Sr. Presidente: pedi a palavra para individualmente me associar ao voto proposto por V» Ex.a Faço-o conio cidadão português, cumprindo, portanto, o meu dever e, também, por solidariedade o gratidão para com os ilustres parlamentares que me acompanharam tam dedicadamente quando, em condições aflitivas para o meu distrito, solicitei providências superiores.

Como V. Ex.as sabem, o meu distrito é dos mais castigados em catástrofes desta natureza e ainda ultimamente em Martosa, Furadouro e Espinho a fúria dos elementos om luta se lançou contra essa população tam laboriosa.

Sempre i ncontrei por parte dos parlamentares açoreanos a maior solidariedade o, assim, pela mesma razão por que se acudiu a esses sinistrados, acho de toca a justiça que o Governo acuda, na medida do possível, àqueles portugueses de boa têmpora, não só satisfazendo às suas justas necessidades, mas acudindo-lhes com socorros imediatos.

Ao Sr. Machado de Serpa peço licença para fazer uma pequena rectificação nas suas afirmações.

S. Ex.a como bom açoreano aânnou quo as suas considerações estavam no

coração de todos os parlamentares açoreano^.

Não está só no coração dos parlamentares açoreanos, porque está no coração de todos os portugueses.

Apoiados repetido».

O Orador:—Porque eu, Sr. Presidente, não distingo entre açoreanos e continentais quando se trata de calamidades . que assolam, qualquer ponto do País.

Dito isto que, com certeza, estava no espírito do ilustre parlamentar, termino acompanhando esse meu colega no voto proposto por V. Ex.a

O orador não reviu.

O Sr. Machado Serpa: — Sr. Presidente: ao terminar a sua exposição sugestiva, e eloquente alocução, o meu ilustre colega o Sr. Ferraz, (Jhaves. fez inteira justiça às minhas intenções.

Não podia ser propósito meu, Deus me livre disso, fazer a mais leve arguição aos meus colegas desta Câmara.

Tenho contado sempre com o apoio seguro, incondicional do Senado inteiro para poder ser essa a minha intenção quando me associei ao voto proposto por S. Ex.a o Sr. Presidente.

Creio que o Sr. Ferraz Chaves me dispensa quaisquer outras explicações.

Apoiados.

O Sr. D. Luís de Castro': —Falando pela primeira vez no Senado, saúdo V. Ex.R e a Câmara cumprindo assim um dever de cortesia que a praxe estabeleceu.

Saindo do isolamento doloroso em que tenho estado confinado e vencendo a minha repugnância de colocar-me em qualquer evidência, por motivos de ordem íntima sentimental, que não vou pára aqui expor, vim hoje ao Senado para me associar a todas as manifestações de pesar e do que certamente a Câmara havia de votar pelo cataclismo que assolou um 'dos distritos mais lindos, activos e dignos da simpatia de todos aqueles que formam Portugal.

Se o faço, apesar de não ser açoreano, é porque tenho para com os Açores uma dívida de gratidão aumentada por uma dívida de admiração.

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pó sou o único .que tem assento nesta Cagara e mal me ficaria e muito doeria ao meu coração., deixar de comparecer hoje aqui para me associar sincerlssimamente aos votos propostos por V. Ex.a aos .quais nio permito acrescentar uma proposta: é que esses votos sejam transmitidos tele-gràficamente ao presidente da Câmara Municipal da Horta para' quo se saiba imediatamente ali que aquele povo assolado por tamanha desgraça é acompanhado, em pensamento, na sua desdita poios representantes legislativos da Nação.

Não sou açoreano de nascimento, mas sou-o pelo sentimento e pela inteligência. Unias, semanas que lá me demorei foram as bastantes para me ligar estreitamente à idea e ao interesse açoreano. Uma vez que se visite aquelas ilhas com olhos e coração de português, não se pode deixar de ficar apaixonado por província tani so-berbamente encantadora e tam deliciosamente possante, povoada por uma grei que se notabiliza pela sua estrutura de patriotismo, de actividade, de inteligência e de iniciativa.

U que a população^ daquelas ilhas tem feito pelo fomento da sua economia é um alto exemplo'para todos os continentais. Digo-o com a convicção profunda de que }-rofiro uma verdade.

Muitos dos que estão a ouvir-me certamente, pela leitura ou por observarem estampas, conhecem os Açores, mas é preciso ir lá: ver, visitar, ilha a ilha, as suas belezas, entrar em contacto com a' sua população, para reconhecer bem que aquela região, privilegiada pela natureza, é digna de mais acurada atenção da parte do continente do que aquela que lhe tem sido dispensado.

A Ilha do Faial é um jardim onde não só se colhem flores para delícia dos nossos sentidos, mas é um jardim onde se trabalha activamente, e se a percorrermos, não com os olhos de economista, ou de agricultor, mas com aquele espírito moderno que liga o interesse económico ao interesse artístico, paisagístico e monumental, com aquele espírito que poderemos denominar turístico, incorrendo em grave galicismo, espírito deambulatório .que domina a humanidade culta,x nós vemos que temos ali uma região privilegia-díssima, para onde deveríamos procurar drenar todas as correntes de viajantes de

todo o mundo, aproveitando suas riquezas incomparáveis no enriqúeciníento daquelas ilhas, que são Portugal tanto como Lisboa e Porto, único território julgado" por muitos, infelizmente, como motivo dá única preocupação digna de Governos-é governados.

j Que explêndidas belezas nessas ilhaá "admiráveis! A cratera grandiosa que há na Ilha do Faial é a realização dum' sonho dantesco, é uma verdadeira dedada trágica de Deus, naquele formosíssimo-parque que ó toda a ilha, tornando, pelo contraste, mais bela aquela paisagem de colinas bonançosas, aveludadas, onde1 o olhar descansa-das negruras da vida co-tidiana. E tantas, tantas outras formidáveis ou gracis, viridentes ou fragosas, oceânicas ou terrenas paisagens se espalham, à compita, por todas as ilhas, sem se saber qual a mais bela.

E a paz é tam grande que até as sebes divisórias das propriedades são constituídas por hortenses do pujantes e enormes flores azues. substituindo as piteiras agressivas e aculeadas do 'continente. Lá nem sequer há espinhos a ferirem-nos nesta tremenda questão, cada vez mais esfacelante, da defesa do direito de propriedade. . , • •'•'••'•'.

Em frente da Ilha.do Faial ostentasse altivamente o Pico, formosíssima.estátua vulcânica, ora encoberta de nuvens, ora desnuda de qualquer véu,-que nos oferece panorama duma deslumbrante perspectiva e matéria turística de ascencionisnio admirável. . ,,-•/,

E se procurarmos as outras ilhasj como a Terceira, com *• uas altas e>' bravias ^pastagens de touros, com sua .angra surpreendente ; a Ilha de S. Miguel, com- o seu Vale das Furnas, que pede .meças a todas as bele/as extraordinárias'quê apresentamos no continente aos olhos dos' estrangeiros, em Sintra, no Bussaco, nó vale do Vouga ou de Besteiros'; o-antro vastíssimo e verdejante, com suas lagoas fundeiras e azues das Sete Cidades^que mais parece uma criação das arábicas Mil e uma noites, teremos de concordar úa extranheza de como realmente possam existir essas maravilhas em ilhas de Por; tugal, que nós, infelizmente, tanto ignoramos, e das quais tanto se esquecem os Governos da nossa terra.

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da às vítimas do tremor de terra faia-lense.

Passando às .outras ilhas, lembremos .allha de S. Jorge, .que, porventura, foi agora também atacada polo cataclismo (não há a certeza, pois não chegam telegramas por estarem interrompidas as linhas^ e que é. um pedaço da Holanda transportado do mar do norte e colocado no alto duma negra montanha que emerge do Atlântico. -

Mas deixemos esses aspectos, fixe-se bom que nesssa paisagem maravilhosa se agita e referve uma indústria importantíssima, que, por sinal, muito abandonada, muito perseguida tem sido nos últimos anos. E, facto a relevar e verificar com admiração: sendo esta indústria importantíssima perseguida cruelmente por doenças nos animais e nas plantas, esses males são como que estímulos para a pujante e inteligentíssima iniciativa dos dirigentes daqueles povos.

Não caem em marasmo, não apelam para os Governos. Seu forte estrato, intelectual, destas suas fortes vontades chegam e sobejam. Novas iniciativas surgem e novas, indústrias se criam.

São sucessivamente explorados, o explorados magistralmente, os laranjais, a cultura da botata doce, a dos ananases, quo ó uma riqueza da agricultura açoreana, é a espadana de cajás folhas os açoreanos criaram uma indústria portuguesa, é a açucena de cujos bolbos souberam os açoreanos criar uma mercadoria de exportação.

E é tanto mais de notar esta actividade quanto .é certo que, encontrando-so isolados nas ilhas, não tinham facilidade na exportação dos seus produtos.

ffV. Ex.as julgam que isto fosse uma dificuldade para aqueles .fortes portugueses?

Não foi.

Criaram uma cooperativa, meio companhia, meio cooperativa, e principiam por fretar paquetes, acabando por comprados e adquiri-los, e constituindo uma frota .que nós, produtores continentais, nem podemos sonhar de ter; com ela lançam os seus produtos em todo o mundo. É este um traço admirável da energia, do~talento e do tino açoreano.

Não me quero alongar, mas Mo terminarei sem dizer- aos ilustres representan-

tes do arquipélago dos Açores que, se. não sou demais, comigo podem contar para tudo quanto de bom se possa fazer em prol desse arquipélago.

Não sou um açoreano de nascimento, repito, mas sou-o pelo coração e pela inteligência.

Uma região que deu tam brilhantes espíritos a Portugal, Tiomens como Hintze Eiboiro, cuja voz eloquentíssima ainda ressoa 'nesta sala,, como Manuel de Ar-riaga, como Antero do Quental, como Teófilo Braga o outros, onde a inteligência abundou e a honradez foi notória, dú--nos a garantia de que os Açores é ,um viveiro português de inteligências, do trabalhadores benernorentes, e bom merece do continente todo o carinho, toda a protecção e todo o tratamento que nós, lavradores, consagramos aos nossos viveiros e seminários, que nos hão-do dar os frutos belos, penhor duma vida feliz.

O Sr. Machado Serpa (interrompendo}:— A V. Ex.a esquece um.açoreano cujo busto está nesta sala. ..

O Orador:—Tem V. Ex.a razão e agradeço-lhe a interrupção ao ter-me lembrado esse autêntico estadista. E o duque de Ávila, grande patriota, nascido justamente nessa ilha assolada pelo sismo.

Sr. Presidente: termino repetindo a proposta com que iniciei estas considerações: que seja mandada telegràficamente ao presidente da Câmara Municipal da Horta a expressão do nosso íntimo sentir magoado e aflito pelo cataclismo que assolou o Faial. .Resta-mo agradecer a V. Ex.as, Srs. Senadores, o sacrifício que fizeram ouvindo-me ...

Vozes : — Não apoiado ! Não apoiado !

O Orador:— ... sacrifício que se podo talvez medir, visto o estado de meu espírito, por aquele que eu faço em estar aqui a falar no cumprimento do quo eu reputei um dever.

Tenho dito.

O orador foi muito cumprimentado.

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pelo flagelo que assolou a ilha do Faial. Qualquer que fosse a região do País ferida por um terramoto, sempre tam trágico nas suas consequências, nós daríamos sem hesitar o nosso v.oto para expressarmos o pesar que sentíamos em face de semelhante catástrofe.

Mas, Sr. Presidente, sou madeirense, sou ilhéu, e ninguém me levará a mal que nesta minha qualidade eu sinta mais profundamente o cataclismo que feriu a ilha do Faial, pondo em angustioso sobressalto de minutos, que parecem anos de pavor, aqueles que considero meus irmãos pelo coração.

Foram enormes os prejuízos sofridos por aquela ilha, assim o afirmam as notícias oficiais e particulares de lá recebidas.

O Estado não fará mais do que cumprir uma obrigação instante votando aquelas verbas destinadas a socorrer os povos flagelados. Temos de dar essa prova de solidariedade e de carinho; aos habitantes do Faial e demonstrar assim que os poderes constituídos olham atentamente p ara as ilhas adjacentes, tam devotadamente portuguesas e patriotas como aquelas que melhor o são.

Na qualidade de leader da União Liberal Republicana e como madeirense, asso-cio-ine ao voto de sentimento da iniciativa da presidência e declaro que votaremos todas as verbas indispensáveis para acudir aos prejuízos sofridos pela ilha açoreana.

O Sr. Álvares Cabral:— Sr. Presidente: como representante de um dos distritos açoreanos, associo-me ao voto proposto por motivo do terramoto que assolou a ilha do Faial.

Nós, os açoreanos, somos por vezes divergentes' nas nossas opiniões, mas quando alguma desgraça sucede ao nosso arquipélago, unimo-nos todos, sentindo igualmente a mesma dor.

É por isso, Sr. Presidente, que eu não só me associo ao voto de sentimento, mas declaro também que votarei qualquer verba que seja proposta para acudir ao flagelo.

O Sr. Ministro da Instrução Pública

(Santos Silva): — Sr. Presidente : depois da manifestação que o Senado acaba de prestar às populações das ilhas, tenho

também, como representante do Governo, de me associar ao voto de sentimento proposto, mas associar-me não pelo motivo apontado pelo Sr. Ferraz Chaves, de que nos devemos unir às ilhas perante as desgraças por elas sofridas.

Não ó preciso que as ilhas estejam em desgraça para o Governo a elas se unir e as acarinhar. O continente tem sempre prestado às ilhas o seu concurso.

Com relação ao que agora se passou na ilha do Faial não tenho notícias oficiais a tal respeito.

Sei apenas que não há mortos a lamentar, mas só prejuízos materiais.

O Sr. Machado Serpa (interrompendo):— Trata se de um violentíssimo terramoto.

O Orador: — Não sei. É natural que se trate de um terramoto. O que posso, po-rérn. afirmar é que o Governo, depois de só colherem as necessárias informações, proporá ao Parlamento as medidas que os factos aconselharem ou a abertura de um crédito para acudir aos prejuízos havidos. Entretanto será bom não tomar como corto o montante de prejuízos materiais indicado nos telegramas lidos à Câmara.

Vou pôr o Sr. Presidente do Ministério o os outros membros do Governo ao corrente dos votos desta Câmara.

Devo também dizer a V. Ex.a que não posso concordar com o parecer de um Sr. Senador que disse que o melhor seria propor um novo adiamento das contribuições, que os povos dessa região têm que pagar.

O Sr. Machado Serpa (in ter rompendo):— Creio que V. Ex.a não será capaz de provar que os efeitos desse terremoto fossem benéficos para alguém.

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' Era "lugar de chorarmos os desastres, estabeleçamos antes um plano para uma vida da trabalho em melhores condições.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara considero aprovada a minha proposta com o aditamento do Sr. D. Luís de Castro.

O Sr. Lima Duque: — Mando para a Mesa uma nota de interpelação ao Sr. Ministro da Instrução, e urn requerimento pedindo uns documentos fornecidos pelo seu Ministério.

O Sr. Joaquim Crisóstomo : — Sr. Presidente : na manhã do dia l do corrente foi a população de Lisboa alarmada por um crim'e horrível. A notícia circulou em toda a cidade, despertando na opinião pública 'p maior interesse devido ao carácter terrível desse crime.

Fizeram-se conjecturas.

Uns entendiam que se tratava de um crime de roubo praticado por um grava-teiro. Outros supunham que se tratava de uma vingança, ou do propósito de inutilizar uma mulher em resultado de factos de carácter amoroso.

As suspeitas recaiam sobre um tal Augusto Gomes. Sem embargo a polícia de Lisboa teimava em o deixar completa-mente em liberdade, gozando as mesmas regalias que qualquer cidadão sobre quem não recaíssem suspeitas de,criminalidade.

í\ji necessário que se levantasse a voz portentosa do jornal O Século, protestando contra ò facto de a polícia de Lisboa estar, por assim dizer, inerte, para quo as diligências começassem a ser devidamente orientadas, apurando, de momento a momento, novos elementos, até que ontem se chegou a descobrir o automóvel que conduziu a vítima e o indivíduo que a acompanhava.

Não falo porque SP trata de um jornal de larga tiragem, mas por um alto espírito de justiça.

Porque, Sr. Presidente, se essa orientação fosse errada, O Século ficaria desprestigiado perante a opinião pública.

A contrastar com esta atitude há a comentar, como já muito bem disse o meu

ilustre colega Sr. Fernando de Sousa, a maneira como procedeu a polícia.

Da cidade do Porto foram enviados telegramas ao Sr. Presidente do Ministério pedindo para confiar as investigações aos agentes daquela cidade, isto porque ali tinham a impressão de que as deligências seguiam aqui sem a indispensável normalidade com que deviam correr.

Há dias, porque uns cidadãos distribuíam uris manifestos da Acção Realista, foram presos e metidos num calabouço infecto do Governo Civil.

Porque uns amigos de Martins Júnior, dirigente da revolução de 5 de Fevereiro, se reuniram em casa de um irmão daquele senhor, foram presos também, contudo toda a gente compreende que esses homens quisessem conspirar não iam escolher aquela casa.

A pol.cia prende na rnaior parte dos casos na mellior das intenções, porque supõe que das prisões pode apurar alguma cousa. ^Mas porque é que houve esta excepção com Augusto Gomes? ^Porque é que ôsse indivíduo andou em liberdade durante cerca de oito dias depois de todos o acusarem de autor do crime? ..

Disse um dos directores da polícia que Augusto Gomes era vigiado convenientemente, o que constituía um processo para descobrir o crime.

Esta explicação não colhe.

Não desejo .lançar qualquer suspeita sobre a polícia.

De modo algum.

Estou absolutamente convencido de que a polícia procedeu de boa fé, mas isso não justifica o seu procedimento.

Apoiados.

A policia não procedeu com o bom senso exmi que devia ter procedido e de que tem usado noutros casos.

Não peço um inquérito à polícia, nem uma penalidade para ninguém. Desejo'simplesmente manifestar de uma forma clara o meu modo de pensar sobre este assunto, para que a polícia de futuro seja mais cuidadosa no cumprimento dos seus-deveres. De nada serve afastar este ou aquele funcionário.

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e competente, de forma que afastar um membro do pessoal superior, ou um dos agentes, não produz vantagem alguma.

O necessário ó que se faça sentir à polícia que no caso de Augusto Gomes procedeu com menos inteligência e com menos acerto. E isso simplesmente o que eu desejo, e ao mesmo tempo entendia quo da parte do Governo devia ser enviado um ofício no sentido de apreciar os serviços por ela prestados.

A imprensa, se algumas vexes merece censura, neste caso merece o meu mais incondicional elogio.

Assim, entendo que todos ficamos devendo ao Século um dos mais belos e relevantes serviços.

Passando a outro assunto, tenho pena, Sr. Presidente, que não esteja presente o Sr. Ministro das Finanças, porque os casos que proponho versar correm pela pasta pé S. Ex.a ,0 primeiro refere-se às notas de 500$ quo se encontram presentemente no distrito da Horta.

Há neste distrito uma avultada soma de contos de notas de 500$.

Nào procuro indagar como elas ali foram parar, mas o que me interessava saber é se são verdadeiras ou falsas, porque, se são verdadeiras muito bem, se são falsas então a polícia não pode deixar de trabalhar no sentido de saber como olas ali foram parar.

Mas, Sr.. Presidente, o principal e que interessa muito especialmente os meus eleitores é o de ficarem lesados, pode mesmo dizer-se ficarem roubados, porque isto não é outra cousa senão uma ladroeira do Banco de Portugal. E assim como tenho visto às vozes criar-se nos meios sociais uma atmosfera tornando quási impossível uma censura aos créditos do Banco, também desejaria ver esses defensores da honra e crédito do Banco de Portugal virem em meu auxílio e igualmente em auxílio do Banco, para que sejam trocadas as notas no distrito da Horta, e indagar qual a forma como elas ali foram adquiridas. Sr. Presidente, uma nota do Banco ó, para todos os efeitos, um título ao portador.

Não é portanto legítimo a qualquer entidade que emite títulos ao portador recusar-se a pagá-los, uma vez que fossem adquiridos de boa fé. O Bauco não é obrigado a pagar as notas a Alves dos Reis e

Bandeira, mas é obrigado a pagar àqueles que as adquiriram, repito, de boa fé.

Já o Sr. Ministro da Justiça disse que esta questão deveria ser tratada por ocasião da liquidação do Banco Angola e Metrópole. Acho isso tardio.

Este assunto tem de ser tratado quanto antes, porque, se há muita gente rica que podo esperar por essa liquidação, há muitas pessoas para quem 000$ ó quási uma fortuna e não podem esperar.

Quando se descobriu o caso das. notas, o Banco de Portugal abriu as suas portas para trocar as que lhe aparecessem, e, entre os que lá foram, muitos havia certamente que as possuíam do má fé. Agora trata-se de portadores de reconhecida boa fé, e o Banco fecha-lhes as portas ou os guichets.

Isto. Sr. Presidente, ó unia verdadeira ladroeira — ladroeira que o Governo não pode,, não deve tolerar. . . ,

Tenho 'dito. ' O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Catanho de Meneses): — Sr. Presidente:, emquanto o Sr. Joaquim Crisóstomo se limitou nas s nas. considerações a fazer a acusação ao Banco de Portugal, o Governo, que não pode, nem deve ser aqui, procurador desse Banco, conservar-se-ia inteiramente silencioso. Mas, desde que S. Ex.a com a sua autoridade de juiz tantas vezes por mim invocada, umas vezes com satisfação e outras com mágoa, fez uma afirmação monos verdadeira, desculpe-me S. Ex.a que lhe diga que foi até certo ponto inconveniente.

Disse S. Ex.a qu3 o Governo é culpado do que se dá neste caso.

O Sr. Joaquim Crisóstomo' (interrompendo}-.— Desculpe-me S. Ex.a; não falei, no Govôrno, acusei apenas o Banco de Portugal.

O Orador : — Mas S. Ex.a disse mais de uma vez, que o Governo não devia tolerar este caso e, por consequência, entendia que devia intervir nele.

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que não posso, nem devo deixar passar em claro as suas acusações.

,; Como é quo S. Ex.a pode demonstrar que o Governo é culpado do facto a que se referiu?

Creio que sim e S. Ex.a foi até dos que se demoraram a tratá-lo com grande lar-guoza.

O Governo não podia, nem devia obrigar o Banco de Portugal a pagar notas falsas.

De maneira que, Sr. Presidente, tenho de repelir energicamente e em nome do Governo semelhantes afirmações feitas de mais a mais por um membro da magistratura portuguesa que tantas vezes tenho defendido e exalçado aqui.

Não pode ser.

Segando essa proposta do lei que aqui foi discutida, todos aqueles quo se julgarem prejudicados pelo quo fez o Banco Angola e Metrópole têm direito a vir reclamar., na altura própria, para serom indemnizados na parte que lhos competir nos beas arrolados.

S. Ex.a sabe que esse foi o sistema adoptado, sistema quo aliás S. Ex.a combateu nesta casa do Parlamento.

Até foi dito que o projecto era demasiado violento, quando arrolava bens que se entendia que não deviam sor arrolados.

O que eu quero, e devo acentuar com toda a energia, é quo o Go°vêrno não pode, nem deve aceitar como buas as afirmações do Sr. Joaquim Crisóstomo, que merece toda a consideração, mas que parece às vezes ter verdadeira fobia contra o Governo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Fernando de Sousa: — Sr. Presidente : como é sabido, adoptou-se, durante a guerra, a praxe do antecipar de sessenta minutos a hora oficial de verão.

Depois essa prática foi posta de parte.

Entre nós, em 1922, publicou-se um decreto que acabou com a mudança da hora

que fora estatuída em 1917, e de então para cá houve sempre na península a unidade da hora.

A Fraoça acha vá-se entre duas correntes opostas, a dos rurais que queriam a hora natural, sem avanço no verão, e a dos habitantes das cidades que achavam cómodo sair mais cedo dos seus escritórios» e fábricas para gozarem o resto da tarde, e do embate destas duas correntes resultou em França o regresso à antecipação da hora no verão.

Quando estivo cm Junho último em Paris, na conferêneki semestral do tráfego francc-espano-portug;;ês, ficou assente que, embora a França emendasse a hora no verão, a península a manteria, pois a Espanha n£o a queria rnudar, o Portugal procederia como o país vizinho para assegurar a unidade da hora peninsular.

Soube pois com surpresa, no sábado, que a Espanha ia mudar a hora, no dia 17. sem dis.to dar prévio conhecimento ao .Governo Português.

Logo que desse facto tive conhecimento, e que a Legação de Espanha ignorava, comuniquei-o aos Srs. Ministros do Comércio e dos Negócios Estrangeiros.

Telegrafou este imediatamente ao Sr. Ministro de Portugal em Madrid, convidando-o a pedir esclarecimentos c diligenciar que o Governo espanhol tivesse em conta os nossos interesses.

Do telegrama recebido em resposta não compreendo a parte final, pois não sei como se entre num horário com avanço da hora, parando os comboios durante uma hora. Seja, porém, como for, achá-mo-nos nesta situação.

A hora vai antecipar-se em Espanha quando o nosso País supunha que ela não seria alterada, de modo que se mantivesse a unidade da hora peninsular, e neste pressuposto organizou os horários das diversas empresas dos caminhos de ferro para o próximo verão e harmonizou-os de forma .a assegurar as relações internacionais.

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rem perturbadas as ligações de comboios nas fronteiras.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): — Pedi a palavra para dizer a V. Ex.a e à Câmara que ouvi com a maior atenção as considerações produzidas pelo ilustre Senador Sr. Fernando de Sousa e que as comunicarei aos Srs. Ministros do Comércio e Es^-trangeiros.

O Sr. Vasco Marques: — Sr. Presidente: por mais de uma vez tenho chamado a atenção do Senado e do Governo para o enorme prejuízo que resultara para a Madeira da publicação de um decreto, pela pasta do Comércio, proibindo aos vapores estrangeiros de levarem carga do continente para o porto do Funchal e atribuindo aos barcos portugueses o exclusivo do transporte de mercadorias.

Ainda recentemente, Sr. Presidente, na sessão de 19 de Janeiro, tive ocasião de salientar os inconvenientes de tal medida que, sem vantagem absolutamente alguma e até sem justificação possível no que respeita à ilha da Madeira, nos privou de uma regalia que para o distrito do Funchal era primacial. Não consegui, Sr. Presidente, não obstante os meus protestos e as razões aduzidas, quo esse estado de cousas fosse modificado, estado de cousas que acredito ser vantajoso para o arquipélago dos Açores, mas prejudicial para a Madeira, razão por que aventei que, não havendo possibilidade de conciliar, neste ponto, os interesses dos dois arquipélagos, se estabelecesse qualquer subsídio ou qualquer vantagem para que os vapores da Empresa Insulana de Navegação garantissem aos povos açoreanos regulares comunicações, mas sem daí resultar prejuízo para a Madeira.

Não vejo presente o titular da pasta do Comércio por onde foi publicado 6 malfadado decreto. Mas chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça para o casoj que conhece muito bem o assunto, e que, certamente, fará o obséquio, não só de transmitir as minhas considerações ao Sr; Ministro do Comércio, mas também de chamar a atenção do mesmo para o mo-

mento que decorre, porque, sem ter a pretensão de conseguir a imediata revogação do pernicioso decreto, desejo bem ique o Governo atente no assunto, visto estarmos em frente de uma greve do pessoal da marinha mercante portuguesa, que dura há bastantes dias já, não se sabendo , quando terminará, motivo pelo qual recebi telegramas de diversas colectividades madeirenses a pedir a minha inter1 venção no caso, a fim de que a Madeira não continue privada de receber carga do . continente.

Por virtude do aludido decreto encontra-se a Madeira de facto proibida de comerciar com o continente (!), porque estando inibidos os vapores estrangeiros de transportar carga, e os vapores portugueses paralisados no Tejo, não há forma de efectivar transacções comerciais entre o continente e a Madeira, com gravíssimos prejuízos para todos.

O Sr. Álvares Cabral: — A greve está já solucionada.

O Orador: — Como S. Ex.a o afirma quero creio, muito embora os jornais da manhã nada noticiem a esse respeito. Mas são tam frequentes as greves na marinha mercante portuguesa, tantas vezes nos flagelam com o seu irrequietis-mo, que reclamo, com toda a energia e com toda a justiça, que seja publicada uma providência determinando que, sempre que se declarem greves nos vapores portugueses, possam imediatamente os vapores estrangeiros conduzir carga para a Madeira.

Croio que o Sr. Ministro está de acordo em que se publique a indispensável providência a este respeito, que representará até um aviso e um correctivo para os que só pensam nos seus caprichos, tendo o máximo desprezo pelos legítimos direitos dos outroSv

Aproveito a oportunidade para declarar que me merece o maior aplauso a atitude do Sr. Ministro da Marinha perante a greve do pessoal dos vapores mercantes.

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assim sein autoridade moral para ditar--Ihe as suas ordens de serviço e serem pronta e disciplinadamente obedecidos.

E daqui resulta também que muitas faltas no serviço do bordo, que têm origem bem diversa, vão buscar a ela a sua explicação, para se dizer aos passageiros e carregadores que não reclamem riem se queixem, por isso que o comandante, não lhe tendo permitido escolher o seu pessoal, não pode também garantir bons serviços.

Ora o Sr. Ministro da Marinha deu todo o apoio à classe dos oficiais de marinha, assegurando-lhe, de harmonia com a lei, a livre escolha do seu pessoal. Nem outra podia, nem devia ser a atitude do Governo. E a falta de disciplina a causa essencial de quási todos os males que lavram na sociedade portuguesa. Evidentemente, não podia continuar a subsistir uma situação em que a tripulação dos navios, por virtude de ser escolhido por outra entidade que não o seu comandante, não mantinha aquela atitude de respeito e de subordinação que são indispensáveis em todos os serviços de responsabilidade e muito mais a bordo, em que dum homem só depende a conduta ' de muitas dezenas de indivíduos, a quem se encontram entregues a segurança de homens,, mulheres e crianças, e confiados valores materiais de grande monta.

É, pois, com prazer que declaro que a atitude enérgica e sensata do Sr. Ministro da Marinha merece, o meu incondicional aplauso.

Compreendo que as classes se defendam, que procurem a maior soma de regalias e benefícios para os seus componentes, mas sem que isso vá contender com aqueles princípios de disciplina que é absolutamente indispensável que subsistam, sob pena de tudo se subverter, esmagando nos escombros toda a gente, a principiar pelos indisciplinados, que terão •' vítimas de doutrinas perniciosas, cujos frutos estão bem patentes aos que contemplam atentamente o quadro doloroso que oferecem os países onde se pretendeu fazer a felicidade do povo governado de baixo para cima.

O Sr. Ministro da Justiça e 'dos Cultos

(Catanho de Meneses):—Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as observações

feitas pelo ilustre Senador Sr. Vasco Marques, achando-as perfeitamente razoáveis no ponto em que S. Ex.a deseja que fique assente que, uma vez que a carga para a Madeira não possa ir em navios portugueses por motivo de greve, ela vá mesmo em navios estrangeiros. Estou convencido de que o Sr. Ministro do Comércio há-('íe concordar com essa doutrina, que me parece absolutamente justa. Comunicarei a S. Ex.a as' observações do ilustro Senador, e ao Sr. Ministro da Marinha darei conhecimento do elogio que lhe fez pela maneira enérgica o previdente como se conduziu nesta ocasião da greve., fazendo com que haja a disciplina que é indispensável haver.

O Sr. Presidente:—Vai passar-se à

- ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente : — Tem a palavra o Sr. Júlio Ribeiro para realizar a sua interpelação ao Sr. Ministro da Instrução.

O Sr* Júlio Ribeiro:—-Se a pasta da Instrução não fosse neste momento sobraçada pelo Sr. Santos Silva, um verdadeiro Ministro, 'na mais alta acepção da palavra, na frase justa do Sr. João de Barros, em um interessante artigo de jornal, eu não faria esta interpelação, porque de antemão sabia que a resposta seria, resumida e sinteticamente, esta: dura lex sed lex.

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elogios, principia assim um artigo, referindo-se a S. Ex'.a«:

«Por felicidade, a pasta da Instrução, neste momento, está a cargo dum homem superiormente inteligente e culto, professor liceal há mais de vinte anos. Médico e pedagogo, liberto de preconceitos de toda a ordem, o Sr. Santos Silva-não é daqueles Ministros que assinam de c uz, conforme a indicação dos seus direciorei. gerais, desvanecidos com a publicação de importantes diplomas que não elaboraram, que algumas vezes não mandaram elaborar, e que lhes entregas? feitos e acabados para lustre do seu nome e provento do ensino!».

São do todo o ponto justas e merecidas estas palavras.

Posto isto, vou entrar rapidamente no assunto, resumindo as minhas considerações, porque não é meu costume fatigar a Câmara e porque estou desprevenido de certos elementos, pois só hoje, na altura de Santarém, ao regressar do Porto, soube que tinha marcado esta interpelação.

De que se trata? Dum processo disciplinar em que envolveram o professor de Cortegaça, Francisco Maria Soares.

De que é acusado este professor? Inicialmente eram dez as acusações; agora estão generosamente reduzidas a quatro.

V. Ex.as vão ver de que natureza elas são:

1.° Ler jornais nas aulas — horrível!

2.° Faltar à escola para se entregar a ocupações particulares — mas os seus serviços foram sempre classificados de bons!

3.° Empregar alunos em serviços seus — sem que haja uma reclamação dos pais!

4,a Ser mal visto na freguesia — pelos cegos!

No processo de sindicância este professor conseguiu, por meio de testemunhas, destruir todas as acusações, menos uma: a de que costuma num certo tempo negociar.

• Ante este libelo o conselho disciplinar porpôs, e o Ministro concordou, que lhe fosse imposto o castigo de 31 dias de suspensão.

Desejaria preguntar ao Sr. Ministro da Instrução se há no seu Ministério um

instrumento tam aperfeiçoado por meio do qual se consegue rigorosamente marcar, dia a dia, a penalidade que compete a qualquer falta, pois não compreendo, ou, melhor, compreendo demais, porque se aplicaram 31 dias de suspensão, e não 29 ou 30.

Mas, como ia dizendo, esse professor destruiu todas as acusações, menos uma: a de negociar. ^Mas será realmente um grande crime um professor negociar, principalmente sabendo-se que no período da guerra não houve ninguém que não negociasse?

Sei que, segundo as boas normas dos pedagogos, o professor não se podo distrair do sou mester. Tem só que dar as suas aulas o preparar-se para as do dia seguinte. É o que dizem os príncipes da pedagogia.

Mas pregunto:

Há funcionários do Ministério da Instrução que, pelo regulamento, têm obrigação de estar na sua secretaria das 11 horas às 17, que são também professores do liceu.

O Sr. Ministro da Instrução Pública

(Santoi Silva): — E pelo regulamento têm de ir ao liceu.

0 Orador: — Imagine V. Ex.a!

1 Até são obrigados ao dom da ubiqtii-dade!

Mas eu preguuto se até os próprios directores gerais não exercem mais do que a profissão de professor.

Por isto e por tudo S. Ex.a não pode concordar com a idea de que uma falta destas praticada por um professor de instrução primária possa ser castigada com 31 dias de suspensão, mesmo que ele não tivesse sido um professor distinto e de comportamento exemplar.

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das elas são unanimemente da mesma opinião, declarando ^por sua honra que é falso tudo o que se diz desse professor. Mas, Sr. Presidente, não seria preciso que eles o dissessem. Os factos falam rnais alto que as próprias testemunhas.

Este professor, com 18 anos de serviço, levou neste período a exame 101 alunos do primeiro grau e 44 do segundo, tendo o seu serviço sido classificado de bom durante todos esses anos pelo respectivo inspector.

Este professor, que durante uma vida inteira se dedicou ao sacerdócio do magistério, ainda mesmo que praticasse a falta do que o acusam —negociar— não podia ser castigado assim.

Digo-o com o regulamento disciplinar dos funcionários públicos nas mãos.

Assim, a um professor que tem dedicado toda a sua vida ao ensino, que, como V. Ex.as vêem é um professor qua não descansa, que leva todos os anos em media 9 alunos a exame, a este professor, que pela primeira vez prevarica, aplica--se-lhe logo a 7.a penalidade do regulamento disciplinar. E sabem para quê? Para lhe destra ir o lar. Para o afastar da mulher, que também é professora, o dos filhos, porque desde que a penalidade fosse além dos 30 dias ele tinha de ser transferido. E aí está a razão moral, ou imoral por que lho foram aplicados 31 dias.

Sr. Presidente: é manifesta, é clara, é evidente a injustiça, a animosidade, a perseguição praticada para com este funcionário por alguém que pontificou no conselho disciplinar.

Tendo também o regulamento disciplinar- circunstâncias a que se devia atender, não lhe é reconhecida uma única no processo disciplinar.

Depoi^ 3r. Presidente, nos termos do artigo 18.° do regulamento disciplinar as faltas que são punidas por este artigo da 5.a à 8.a são as seguintes : Leu.

j Pois, Sr. Presidente, o professor, que não praticou nenhuma das faltas taxativamente marcadas no regulamento disciplinar, é punido com 31 dias!

Tenho a certeza de que o Sr. Ministro da Instrução está bem identificado com este processo, e não lhe venho dar

nenhuma novidade. Pela leitura dos depoimentos- das testemunhas V. Ex.as verificariam, que todas elas reprovam e se indignam contra esta perseguição odienta e cruel.

Faz-se o processo de revisão. É incumbido dêle< um funcionário de absoluta confiança do Sr. Ministro da Instrução, um dos mais distintos professores, verdadeiro ornamento da sua classe. ^E sabem V. Ex.as como termina o seu relatório?

Da seguinte forma:

«Terminando: Estou convencido da inocência do condenado que é um velho republicano e tem sido um bom • professor e chefe de família honesto e que justiça será que fique sem efeito a pena de suspensão e transferência que lhe foi aplicada. (Artigo 43.° do -Kegulaniento de 22 de Fevereiro de 1913). Eis o que muito respeitosamente tenho a hoara de propor a V. Ex.a

Porto, 16 de Setembro de 1925.— Henrique Sant'Ana, professor».

Pois apesar deste diploma de honra para o professor, apesar de 53 testemunhas desmentirem o que dizem 13, apesar de tudo, o relator na revisão, e devo dizer que houve também um membro do conselho disciplinar que serviu1 duas vezes, diz o seguinte:

«Verificou-se em todo o processo, hoje, como ontem, que o professor de Corte-gaç.a, especialmente, descura os deveres da sua pofissão e educação dos alunos.

E não pode deixar de descurar quem, como o argíiido, tem as seguintes ocupações como consta do processo: negociante, comprando e vendendo cascaria, cartorário da associação de socorros mútuos, .agente da Companhia de Seguros Portugal Previdente, escriturário de algumas casas comerciais da freguesia de Corte-gaça e ajudante do-registo civil».

Quere dizer, destes empregos o mais rendoso é o de ajudante do registo civil que não rende no ano para se sustentar durante 15 dias.

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esse cargo ninguém mais poderá ser nomeado.

O Orador:—Pois ele é acusado do crime horrendo de ser ajudante de registo civil, frisando-o o relator com o critério e boa vontade que V. Ex.as estão vendo.

Emfim, não quero maçar a Câmara com mais explicações porque estou plenamente convencido de que o Sr. Ministro da Instrução há-de, por qualquer forma, sanar esta enorme injustiça, tanto mais que S. Ex.a tem'no regulamento disciplinar forma de o fazer. E mandar proceder a nova revisão conforme o artigo respectivo.

Como o Sr. Ministro da Instrução está perfeitamente identificado com b assunto, -espero que S. Ex.a, confirmando mais uma vez o seu alto espírito de justiça e de dignidade, fará justiça a este professor a quem querem separar, até que venha a velhice e com ela a reforma, da sua mulher e dos seus filhos, desfazendo-lhe o lar, e sustentando assim uma das mais flagrantes e injustas crueldades que conheço e que faz revoltar os mais serenos e indiferentes.

Disse.

Apoiados.

O Sr. Ministro da Instrução Pública

(Santos Silva): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às considerações do ilustre Senador Sr. Júlio Eibeiro. Mas antes de o fazer, agradeço com muito reconhecimento, não ao Senador, mas ao amigo as palavras de boa amizade que pronunciou.

E feitos estes cumprimentos, devo dizer, como S. Ex.a: Dura lex, sed lex...

Ó professor Sr. Francisco Maria Soares teve o seu primeiro processo disciplinar e não devem causar impressão ao Sr. Júlio Kibeiro os trinta dias de suspensão que ele teve. De uma nota que tenho presente consta qual a atitude do conselho disciplinar e a transferência daquele professor.

Feito o primeiro pedido de revisão, a ele se deu andamento. O encarregado do processo respectivo foi o presidente da junta escolar, que era também o presidente da Câmara de Ovar, já falecido. Esse processo parece que não foi organizado devidamente, faltando-lhe formalidades, a cujo cumprimento o Ministério

da Instrução obrigou. O relatório foi, pois, adiado.

• E justo dizer que o conselho disciplinar se orienta sempre por normas de sã justiça.

E doloroso, entretanto, ter de afirmar que dentro do Ministério da Instrução não se vive na atmosfera de afectividade que seria para desejar, mas antes se vive num estado de conflito permanente: condito dos directores das escolas com os professores, dos directores com os inspectores, etc. Esta situação fez com que eu, tendo pedido a nota das sindicâncias, obtivesse o número de 300 processos!'

Tais conflitos dão-se por circunstâncias várias. O processo disciplinar não é um processo de organização rápida. Processos por fúteis motivos ocupam centenas de páginas. Há processos que poderiam ser muito bem da competência dos inspectores.

É necessário acabar com esta situação e nesse sentido anda empenhado o Ministério da Instrução.

Devo dizer que tenho a máxima confiança no conselho disciplinar.

Fiz a minha análise ao processo a que se referiu o Sr. Júlio Eibeiro.

E de facto digo a S. Ex.a, com sinceridade, que suponho também que a pena foi violenta, que a suspensão de trinta dias seria talvez bastante, que a transferência foi talvez exagerada.

Mas o professor Soares foi vítima de se ter talvez imiscuído exageradamento na vida política e partidária.

E digo isto tanto mais à vontade, quanto é certo que esse professor é meu correligionário.

O Sr. Silva Barreto: — <_0 p='p' supremo='supremo' professor='professor' recorreu='recorreu' para='para' não='não' tribunal='tribunal' o='o'>

O Orador:—Não senhor. Entendo que, de facto, o professor primário tem, como todos os cidadãos, o direito de livre exerr cicio da sua missão política, mas em> verdade não deve querer viver dentro das nossas paixões partidárias.

Apoiados.

Ao Parlamento e aos homens de governo cumpre afastar os professores primários dessas lutas, que são sempre violentas.

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tenho indeferido pedidos de professores para irein ocupar o lugar de administradores de concelho.

Entendo que assim sirvo bem os interesses do ensino.

Devo, contudo, dizer que não houve da parte de nenhum dos meus ilustres antecessores o desejo de prejudicar esse professor. O próprio conselho disciplinar propôs que ele fosse transferido para uma escola dentro do seu círculo, mas ao tempo não havia dentro do círculo nenhuma cadeira vaga.

Mas acontece que, neste momento, tenho forma de dar a esse professor, que tem dezoito anos de excelente serviço, uma compensação pela penalidade que lhe foi imposta.

No círculo de Espinho, em Cortegaça, há uma vaga e eu amanhã vou nomear esse professor para a cadeira dessa localidade. Outra atitude não posso tomar, visto tratar-se de uma sentença proferida em última instância.

O orador não reviu.

O Sr. Júlio Ribeiro: — Sr. Presidente: lamento profundamente que, depois do qu'e disse com absoluta verdade e com documentos na mão, demonstrando que apenas fica de pé uma das quatro acusações que fizeram ao professor de Corte-gaça, falta essa que todos cometem sem excluir o titular da pasta da instrução, S. Ex.a tenha ainda um critério jurídico diferente do meu.

Entende S. Ex.a que não pode mandar fazer uma nova revisão do processo.

O Sr. Ministro da Instrução Pública

(Santos Silva):—.Eu não posso mandar fazer a revisão do proceso, porque ela já foi feita.

0 Orador:—j ,;Mas se ò professor adquiriu novos documentos, novas provas da sua inocência, ha-de ficar condenado?!

1 (jEntão-S. Ex.a não dá valor a 03 testemunhas e dá .o valor a 13?!

O Sr. Ministro da Instrução Pública (Santos Silva):—Sobre esse processo já se pronunciou o Conselho Disciplinar.

O Orador:— Eu não respeito a decisão do Conselho Disciplinar porque'entendo

que ela é iníqua e infamante e não honra nada o Ministério da Instrução.

Compreendo a situação de S. Ex.tt o Ministro da Instrução de não poder daquele lugar desprestigiar os mais altos funcionários do seu Ministério. Mas S. Ex.a, no íntimo da sua consciência, sente com certeza que este processo representa uma infâmia e a condenação do professor uma tremenda e impudica injustiça.

Disse.

O Sr. Ministro da Instrução Pública

(Santos Silva):—Sr. Presidente: pedi a palavra para informar o Sr. Júlio Eibeiro de um facto que parece S. Ex.a desconhece: este processo já foi. à revisão, sendo confirmada a sentença.

Em seguida, o professor sindicado argumentou que algumas testemunhas tinham falseado as suas declarações. Em vista disso., o Conselho Disciplinar foi de opinião que o processo tivesse uma revisão, e em Junho, quando eu tomei pela primeira vez conta desta pasta, mandei fazer essa revisão por uma pessoa da maior confiança, o professor Henrique Santana, que foi de opinião quo o professor Soares estava inocente.

Com isso não concordou o Conselho Disciplinar,,

Depois disto, o professor Soares não argumentou com factos novos que pudessem dar motivo a uma nova revisão. Portanto essa nova revisão não pode realizar-se. Mas se esses motivos aparecerem, não tenho dúvida eití satisfazer os desejos do Sr. Júlio Ribeiro.

No entretanto, como entendo dever reconhecer os 18 anos de bons serviços prestados à causa da instrução pelo professor Soares, vou colocá-lo dentro do círculo escolar a que pertenceu, e como tenho ensejo neste momento de o colocar próximo da, localidade onde exercia o magistério, de novo tomo o compromisso de nomear o professor Soares para uma cadeira vaga em Espinho. Outra cousa não posso fazer.

Errar é dos homens, mas, regra geral, o Conselho Disciplinar tem julgado dentro das mais perfeitas normas da justiça.

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• apresentadas durante a discussão do projecto de lei n.° 72.

A primeira foi rejeitada pela Secção. .

O Sr. Júlio Dantas : — Confesso que foi com verdadeira mágoa que este lado da' Câmara viu o tratamento dado às propostas de emenda pela secção do Orçamento.

Eu tive a honra de quando se discutiu este orçamento, na generalidade, lazer considerações de ordem técnica que mereceram /i aprovação do Sr. Ministro dos Estrangeiros.

Converti essas considerações quando se discutiu na especialidade om propostas de emenda.

Elas foram todas rejeitadas não obstante o Sr. Ministro ter dito que concordava. f

Evidentemente este ladu da Câmara não pode ter a pretensão de que todas as emendas sejam aprovadas; mas tratando--se de emendas que tinham a aprovação do Sr. Ministro era lícito esperar que isto fosse considerado na Secção.

Isso mostra que a nossa colaboração ó dispensada .no que toca aos trabalhos da boa regularização de contas do Estado.

Era nosso propósito dar ao Governo na discussão do orçamento o nosso apoio, mas já vejo que este nosso propósito não encontra daquele lado a simpatia de que era digna.

Eecordo-me da frase de um estadista eminente, pai de um ilustre Senador que se senta naquele lado, que quando lhe reprovaram algumas emendas, levantou a sua.voz para dizer: — «bem se vê que aquele lado da Câmara não tem emenda possível».

Não repetirei a frase. Mas guardo a minha mágoa pelo tratamento que as minhas propostas tiveram na Secção.

Devo explicar que não assisti à sessão da Secção, porque não ouvindo às vezes bem as palavras do Sr. Presidente, julguei que a respectiva sessão tinha sido marcada para às 15 horas e não para as 14 horas.

Eram as minhas emendas sobretudo atinentes a facilitar a acção do Poder Executivo.

Eram mais emendas daquele lado da Câmara do que deste; a primeira reportava-se à integralização da verba consigna-

da no Orçamento a missões extraordinárias ao estrangeiro. Essa verba foi demi-nuída na outra Câmara de 10.000$ ouro.

Lembro apenas que o Ministério dos Estrangeiros vai ter em muitas oportunidades necessidade de enviar missões extraordinárias ao estrangeiro, Lembro também o julgamento que, em breve, se fará no tribunal da Haia da questão do Guadiana; e a necessidade de enviar a Londres missões para tratarem da nossa dívida à Inglaterra.

Não desejo estar a individualizar, mas sim frisar que muitos assuntos nos obrigarão amanhã a enviar missões extraordinárias ao estrangeiro, sobretudo neste momento em que a vida internacional se intensifica enorrnemento.

Deminuir uma verba que é vital parece-me um erro,.como OITO mo parece de-minuir a verba que. no Orçamento, se consigna a despesas de propaganda e de publicidade no estrangeiro.

E lamentável, e todos o temos sentido nas várias vezes que esse assunto ó tratado nesta Câmara, é lamentável, dizia, o que bastas vezes se repete na imprensa estrangeira a respeito do Portugal.

As campanhas de descrédito que têm sido feitas lá fora não podem ser combatidas convenientemente no País onde se produzem, porque as disponibilidades dos nossos representantes não permitem o pas-sez a Ia caísse.

E necessário que os nossos chefes de missão disponham de verbas especiais para custear a necessária propaganda e a necessária publicidade. E entretanto essa verba foi deminuída de 50.000$!

Lembrei também, e nesse sentido apresentei uma proposta, que era preciso dotar os serviços respeitantes a assistência portuguesa aos emigrantes o às colónias sem bandeira, quer no que toca às escolas e jornais, quer no que toca a assistência de vária ordem.

No Orçamento há apenas ;4.000$ e pouco mais para esse serviço. É lamentavelmente insuficiente.

Lembrei, repito agora, que.há instituições, mesmo nas nossas colónias mais ricas, como por exemplo o Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, que vivem com extraordinárias dificuldades.

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pelo seu valor moral ainda, do que propriamente pelo seu valor material.

Trocam-se explicações entre o Sr, relator e o orador.

Mas. se fiz algumas considerações, foram todas atinentes'a facilitar a acção do Poder Executivo no que respeita à nossa representação no estrangeiro.

Lembrei a S. Ex.a que, não estando inscrita no Orçamento a legação em Varsóvia, amanhã o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros se poderia ver embaraçado para pagar ao chefe de missão que Lá foi colocado recentemente, e ainda chamei a atenção da Câmara e de V. Ex.a para o lacto de ser inscrita na tabela orçamental a legação de Petrogrado, que não existe.

Com uma candura a que presto homenagem, um dos Srs. Senadores que faz parte da comissão do Orçamento emendou a minha proposta : em vez de Petro-grado pôs Leninegrado.

Mas foi pior a emenda que o soneto.

Não tenho dúvida nenhuma de que na tabela orçamental foi inscrita a legação de Petrogrado; mas, desde que se inscrevia Varsóvia e Petrogrado ficava o Sr. Ministro dos Negócios Estrangairos no direito de determinar que a residência do Ministro seria em Varsóvia e não em Petrogrado, emquauto não fosse reconhecida a República Social do Soviets.

Também lembrei à Câmara que seria mais conveniente, atendendo ao princípio de reciprocidade que todos os países têm em consideração, e tendo nós aqui um representante da Tcheco-Slováquia e sendo este um pais de mais recursos que a Áustria, que aqui não tem representante algum, a residência do nosso Ministro devia ser em Praga.

Isto são cousas de carácter técnico, que correspondem a factos e que aqui não foram tratadas.

Por conseguinte mantenho a minha dolorosa estranheza de ver o tratamento, que foi feito na comissão do Orçamento, da emenda que apresentei, e aproveito o ensejo de estar no uso da palavra para dizer ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que dirige a sua pasta com tanto brilho e nobreza, que me permita S. Ex.a que discorde do seu ponto de vista e ainda das palavras com que S. 'Ex.a res-pod u às considerações feitas pelo Sr. Relator deste Orçamento, considerações

que demonstravam que S. Ex.a não estava suficientemente conhecedor dos assuntos que se tratavam. O orador não reviu.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges): — Sr. Presidente: pedi a palavra para, responder às considerações que acaba de fazer o ilustre Senador Sr. Júlio Dantas, e nesse sentido direi n V. Ex.a e ao Senado que, se for-, mós buscar propriamente o fundo da questão não posso deixar de concordar coui S. Ex.&

Trata-se, com efeito, de uma questão de técnica e ao mesmo tempo que respeita à Drgânica do Ministério dos Estrangeiros.

Afirma o ilustre Senador Sr. Júlio Dantas que, neste momento, não temos representação diplomática em Petrogrado.

E exacto, não temos, não só de facto, mas até, de certo modo, de direito, por quanto o decreto que nomeou o actual Ministro de Portugal em Varsóvia foi redigido da seguinte forma — estou citando de memória — mas parece-me que sem íalsear o que nesse decreto está escrito: não existindo actualmente relações entre o Governo da República Portuguesa e o governo dos soviets, nem se sabendo quando serão restabelecidas, por conveniência de serviço é transferida a legação de Petrogrado para Varsóvia e nomeado paia essa legação o actual Ministro.

De maneira que, efectivamente, de facto não temos representação alguma em Petrogrado, designação geográfica que já não existe, e mesmo, quanto a mim essa representação, se a houvesse, não devia ser em Petrogrado, mas em Moscou, que é a sede do governo dos» soviets, (Apoiados do Sr. Júlio Dantas] e de certo modo de direito, porque foi publicado no Diário do Governo o decreto a que me referi.

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foi um decreto que de certa forma alterou essa disposição legal.

Isto pelo que respeita à legação de Petrogado, como ainda se chama na proposta orçamental.

Vou agora referir-mer à legação de Portugal em Viena de Áustria para depois tirar a conclusão das minhas considerações.

Como V. Ex.as sabem, a lei orgânica é que determina os países em que Portugal tem a sua representação diplomática. Essa lei é de 1911, e então não era natural que Portugal não tivesse representante junto ,do governo de Viena de Áustria que era dos mais importantes da Enropa e do mundo, visto que a Aus-tria-Huugria era unia das grandes potência^.

A iei orgânica estabelece uma legação em Viena de Áustria, como estabelece legações em Paris, em Berna, no Eio de Janeiro, etc.

Quere dizer : o número de postos diplomáticos — de Portugal são legações ou embaixadas — que Portugal tem no estrangeiro e as suas sedes e categorias estão fixados todos pela lei orgânica.

Portanto, resalta claramente porque é que na lei orgânica se fala de uma legação em Viena de Áustria e não de legação em Praga, em Budapest ou até em Varsóvia à data da publicação dessa lei. Em Varsóvia não havia possibilidade de existir representação diplomática de Portugal porquanto não era capital de país soberano.

Pela mesma razão não podia fixar uma legação em Praga ou em Budapest. Também nela não havia embaixadas em Londres e no Rio de Janeiro; eram legações. Foi, porém, mediante lei ou decreto ditatorial— para o caso vale o mesmo — que essas legações foram elevadas a embaixadas. Á embaixada do Rio de Janeiro, se não estou em erro, foi elevada a essa categoria por uma lei; a de Londres foi elevada por um decreto ditatorial depois reconhecido como lei.

Temos, portanto, que a lei orgânica foi alterada por outras leis.

Ora o Orçamento, nesta parte, não é, nem pode deixar de ser, senão o reflexo da lei orgânica. Se não o fosse, bem podia .estabelecer uma confusão prejudicial, porque afinal ficaria sem se saber o que

é que regulava a organização e funcionamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, se a sua lei orgânica, se os diplomas orçamentais.

Mas acontece que, não obstante esta circunstância, as necessidades da vida internacional resultantes da guerra impuseram a conveniência de termos representação diplomática em países onde até ontão a não poderíamos ter. E o caso de Praga, de Budapest, e seria também o caso de Varsóvia.

(j E então o que aconteceu? Foi que o Governo Português começou a acreditar representantes seus junto desses Governos.

^Mas como começou a acreditá-los? Dentro do uso adoptado — digamos assim porque é esse o termo — uso qne está em vigor. E digo uso, porque não há lei nem decioto que autorize Portugal a ter representação diplomática em Praga, Budapest e em Varsóvia. Todavia, forçado por circunstâncias de necessidade ou de conveniência, os Governos da República acreditaram representantes, primeiro em Budapesth e depois em Praga.

Como digo, não há nem lei nem decreto que autorize, mas também não havia cousa alguma que o proibisse, e isso importava às. conveniências e interesses do país.

Á respeito das legações de Praga, Viena e Budapest, o Sr. Júlio Dantas 'alvitrou que a legação passasse para Praga, em lugar de continuar em Viena.

S. Ex.a aludiu também ao facto de no orçamento se falar em Washington e Havana.

No orçamento faz-se alusão a este grupo de países, onde temos um funcionário acreditado junto dos respectivos Governos, e não se alude ao grupo de Varsóvia, Praga e Budapest.

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Apresentei, portanto, circunstâncias de direito e circunstâncias de facto. Perante estas últimas, alguma cousa tenho a acrescentar que me leva a concordar com o ponto de vista do Sr. Júlio Dantas,.

Com efeito, considero hoje mais interessante e mais vantajoso para os interesses do País a representação diplomática em Praga do que em Viena de Áustria.

Viena de Áustria, tendo sido a capital dum grande Estado, é hoje a capital dum pequeno Estado, dum Estado de 5 milhões de habitantes, capital quási de si própria.

Há até a^tendência de a Áustria se en-corporar no Estado da Alemanha, e o que é mais significativo é qae esta tendência, se não parte directamente dos habitantes, encontra, pelo menos, grandes defensores entre os próprios austríacos, o que é negatório daquela individualidade como Estado.

Por todos estes factos deminuíu muito a importância do Governo de Viena de Áustria para que tenha um representante permanente de Portugal. E ainda por esta circunstância: que são poucos os países que tom um representante junto do Governo de Viena de Áustria.

Além disso, o Governo da Áustria não tem, com carácter permanente ou transitório, um representante acreditado janto de nós, e eu, sob este aspecto, deíeudo que para o efeito da nossa representação diplomática, quando não atendamos apenas aos nossos interesses, pelo menos atendamos à reciprocidade que em relação a Portugal se estabelece. Não entendo que Portugal tenha representante permanente num país a que nos não liguem interesses fundamentais, ou que, pelo menos, não tenha um representante permanente em Portugal.

O Governo de Praga não tem um representante junto de nós, mas tem-nos noutros países, e sucede ainda que hoje este país, de que Praga é a capital, interessa mais a Portugal do que Viena de Áustria, e não só a nós como a outros países.

É um país ainda em formação, mas em termos de vir a constituir um grande Estado.

Sob o aspecto económico com Portugal tudo indica que, de preferência a Viena

de Áustria, seja em Praga que tenhamos o nosso representante diplomático.

Como já expliquei a V. Ex.as, esta representação permanente não resulta da lei orgânica; pelo contrário, a lei orgânica não incluiu Praga, porque esta capital não existia nesse tempo. De facto a situação podo remediar-se.

Como S. Ex.a sabe, o artigo 42.° da lei orgânica permite ao Ministro dos Negócios Estrangeiros fixar o país de residência como permanente a uni representante acreditado em vários países, e assim, de harmonia com este artigo, é possível ao Ministro dos Negócios Estrangeiros determinar que o Ministro,de Portugal em Viena de Áustria resida em Praga; resida com carácter definitivo ou temporário, um ano junto de um Governo e o.utro junto do outro, ou em períodos de meses.

De maneira que, voltando ao início das -minhas considerações e descendo ao fundo da questão, pelo que respeita a estas duas emendas do Sr. Júlio Dantas^ tenho de estar de acordo com S. Ex.a E urna questão de técnica, e seria quási que desconhecer os assuntos que correm pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros se não o afirmasse.

Resta ainda uma outra questão, que, se não é de direito substantivo, será de direito adjectivo, uma'questão processual, de lei orgânica, que, possivelmente, terá mais lugar numa rectificação a fazer em termos de estabelecer de direito o que de facto já existe.

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volve uma discussão do orçamento. As competências técnicas que os parlamentares são chamados a exercer na análise do orçamento podem não ser as mesmas que devem intervir numa discussão da reforma do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de maneira que não me parece ser o Parlamento o órgão mais competente para avaliar desse assunto.

Trata-se de uma discussão muito interessante eni que o Sr. Júlio Dantas devo ter razão, mas deve ser tratada quando se discutir a orgânica do Ministério.

Era isto o que tinha a dizer a V. Ex.a, Sr. Presidente, ao Senado c ao Sr. Júlio Dantas para esclarecimento do assunto.

O orador não reviu.

O.Sr. Santos Graça:—Pedi a palavra, coino relator do orçamento, para significar o meu desgosto pelas palavras proferidas pelo ilustre Senador Sr. Júlio Dantas.

S. Ex.a foi injusto.

Pertenço a duas secções onde devo di-zê-lo, com a máxima franqueza, não se encontram partidas, nem grupos, mas simplesmente Senadores com o desejo de aperfeiçoarem os projectos que lhes são presentes, e do trabalharem pelo engrandecimento da Pátria.

Vou, portanto, expor à Câmara, ou pelo menos àqueles Senadores que não assistiram à Secção, as razões que nos levaram a rejeitar estas'emendas. S. Ex.a terá ensejo de verificar que não houve a mais pequeoa intenção de o melindrar, bem como o Partido Nacionalista.

Nem S. Ex.a deveria ter pensado isso, tanto mais que sabe que dentro desta Câmara . todos o consideram o respeitam, como é merecedor, pelo seu formosíssimo talento e por ser um nome glorioso das letras pátrias.

A emenda número três, em que S. Ex.a faz a mudança de legações, foi a Secção de parecer que não era a ela que competia fazer essa mudança, pois somente

lho cumpria tratar única e simplesmente da parte orçamental, isto é, da questão dos números; a outra parte," a da mudança das. legações, era da competência do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que a podia fazer de harmonia com a lei orgânica do Ministério.

A Secção não rejeitou por rejeitar, mas sim porque teve esta orientação, que aliás o Sr. Ministro acaba de confirmar.

Eis as razões por que, tendo a Secção orientado desta maneira os seus trabalhos, não podia de maneira nenhuma aprovar as emendas de S. Ex.;i

O Sr. Júlio Dantas'. — ,;S. Ex.a permitia-me uma ligeira pregunta?

Se S. Ex.'1 e a Secção são de parecer que não é da competência da Secção a mudança de legações, como a de Varsóvia que não consta da lei orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros, nem está inscrita no orçamento, ^como paga S. Ex.a a esses funcionários?

O Orador: — Eespondo a S. Ex.a com o maior prazer:

Quem organiza os projectos orçamentais são os funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros e eles, por certo, sabem como hão-de pagar a esses funcionários, que decerto receberão pela mesma verba que têm recebido até hoje.

O Sr. Júlio Dantas: — Foi um lapso que eu pretendi remediar com a minha emenda.

O Orador: — Aceitaríamos a emenda de S. Ex.a se de facto entendêssemos que o poderíamos fazer. Como a orientação que a Secção tomou foi a que já expendi não as pôde tomar em consideração.

O Sr. Júlio Dantas:—Eu só pregnnto como é que S. Ex.as pagam ao chefe de missão em Varsóvia se a respectiva verba não está inscrita no Orçamento Geral do Estado.

O Orador: — Mas se se trata de um lapso, S. Ex.a compreende que essa emenda deveria partir do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

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O que é- necessário ó criar receita para só pagar a esto funcionário.

Verificando o lapso havido, eu nada mais fiz do que chamar para ele a atenção do Senado.

Julgo ter cumprido o meu dever.

O Orador: — Mas parece-me que a respectiva emenda deve ser introduzida por intermédio do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A não ser assim, não sei por que verba se paga ao Ministro.

O Sr. Júlio Dantas :—r j Pois, aí é que está o mal! • .

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangbi-' ros (Vasco Borges):—O Sr. Augusto de Vasconcelos vai daqui a pouco fornecer a chave do enigma a S. Ex.a3

O Orador: — Foi esta a orientação que tomou a Secção, sem olhar a que a proposta era de S. Ex.íl, ou de qualquer outro Sr. Senador.

Na emenda n.° 4 propõe S. Ex.a a redução da verba da Embaixada em Londres.

O Sr.. Júlio Dantas: — Quando apresentei a proposta foi no intuito de substituir uma outra que tinha apresentado primeiro, tendo irroflectidamente mencionado a Legação em Londres.

O Orador: — Uma das razões da rião aceitação desta proposta foi todos na Secção reconhecerem que a Legação de Madrid estava mal dotada. Mas a verdade é que não dispúnhamos de verba para ôsse efeito.

Não podíamos, evidentemente, reduzir a verba a outra legação para aumentar à da de Madrid.

Quanto à emenda respeitante à redução dos 50 contos (ouro), eu já tive ensejo, em sessão plena, de expor as razões por que entendia que essa verba devia ser mantida. Sustentando- na Secção esta ordem do ideas, a mesma Secção concordou com elas.

A rejeição desta emenda não envolve, pois, a menor desconsideração para com o ilustre Senador Sr. Júlio Dantas, aquém

tenho o prazer de prestar a minha maior homenagem.

O orador não reviu..

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges): — Sr. Presidente: em primeiro lugar, quero agradecer ao Sr. relator do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Sr. Santos Graça, o ter consentido há pouco que me fosse concedida a palavra.

S. Ex.", o Sr. relator, acaba de referir--se à minha a conformação» com a demi-nuíção que foi feita na verba destinada às despesas reservadas e do propaganda e publicidade.

S. Ex.a repetiu a palavra que eu proferi aqui nesta Câmara há dias, e vou explicar porque a proferi.

Eu na outra Câmara sustentei que essas despesas reservadas em qualquer momento podein ser as mais necessárias até à segurança do País, e que as de publicidade e propaganda eram das mais úteis. ..

Os Srs. Júlio Dantas e Augusto de Vasconcelos : — Apoiado.

• O Orador: — Dependendo tudo, é'claro, da aplicação que se desse a essas verbas. E o seu mau emprego em qualquer ocasião — nilo sei se isso terá acontecido — não justificava que se privasse desses meios até a defesa do País quando ele precisasse.

O Sr. Santos Graça (interrompendo): — <_ que='que' no='no' a='a' ano='ano' ex.a='ex.a' do='do' verba='verba' anterior='anterior' p='p' passado='passado' as='as' votou='votou' se='se' informar='informar' para='para' chegou='chegou' podia-me='podia-me' s.='s.' despesas='despesas'>

O Orador: — Já responderei a S. Ex.a Essas despesas têm uma base de cálculo que é um tanto ou quanto precária. Os acontecimentos, os factos durante um período orçamental, podem tornar necessário o dispêndio,- sobretudo no que respeita às despesas reservadas, de toda a quantia e até haver necessidade de mais, e podem os factos e os acontecimentos fazer com que se ,fique aquém do quantitativo fixado.

O Sr. Júlio Dantas (aparte): — E claro.

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Não me preocupou muito o que a Câmara dos Deputados resolvesse porque, tanto no que respeita a essa verba como a outras, desde que elas não chegam o Ministro vem às Câmaras pedir um reforço de verba, e desde que as circunstâncias o imponham às Câmaras concedem-no logo.

Aí está por que me «conformei».

O ilustre Senador Sr. Júlio Dantas propôs que a verba fosse restabelecida mas, retirando-se dela a quantia de 20 coutos (ouro) para.

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo}: — Era para reforçar àquela verba que é inscrita no artigo 18.° do capítulo 2.°, e que se destina a cursos de estudos portugueses nas escolas estrangeiras, jornais, e outras instituições de assistência.

O Orador: — A razão da emenda tinha--me feito ficar um pouco em dúvida.

Não "sei se o ilustre Senador se referia a escolas que poderiam pertencer ao Ministério dos Estrangeiros, se li escolas que pertencessem ao Ministério da Instrução e, conseqúentemente, se tais escolas eram as escolas portuguesas que o Estado cria e que hoje estão suspensas em várias regiões onde há colónias portuguesas importantes.

Quereria eu dizer ao ilustre Senador que, se se tratasse da primeira interpretação, as respectivas despesas deviam pertencer ao Ministério da Instrução; e se se tratasse da segunda, que seria melhor aguardar a reorganização dessas escolas, que está determinada, para então se lhes atribuir uma verba, porque, sendo assim, a verba também teria>a sua apii-cação.

. O ilustre Senador aludiu à verba de 20.000$ na parte destinada a despesas de propaganda e publicidade.

Falou o ilustre Senador no gabinete português de leitura no Rio de Janeiro.

A reclamação a que S. Kx.-a fez referência deriva naturalmente de conhecimento directo dos factos, mas a verdade é que ,eu ainda até hoje nenhuma reclamação tive com aquele gabinete relacionada, nem conhecimento de qualquer pé-, dido de arixílio feito.

Passo agora a referir-me à proposta n.° 4, do ilustre Senador, que diz respeito

a rectificações a fazer nas despesas de representação dos funcionários diplomáticos.

Não posso deixar de chamar para este assunto a atenção do Senado, pois que ele o merece, parecendo-me até'que o autor da proposta está de acordo comigo.

A verdade é que nós não temos uma indicação exacta do que a este, àquele ou àqueloutro diplomata se deve pagar como despesas de representação; não temos indicação precisa do que são as despesas de representação dos diplomatas acreditados no estrangeiro e, não tendo essa indicação, não poderemos fixar-nos em base positiva.

Não é segredo para ninguém que há funcionários diplomáticos acreditados no estrangeiro, que procuram até fazer economias, reduzindo os proventos que recebem ou que limitam ao mínimo.

Estas despesas importam a dignidade do País e, porque assim é, o Estado fez o sacrifício de colocar os seus representantes em situação de poderem arcar com ela.

Conseqúentemente, desviar essa verba da aplicação para que é destinada e trans-foriná-la em pé de meia, sé uma cousa abusiva e até menos patriótica.

Ora tenciono publicar brevemente um decreto, que não é senão a reprodução do que há feito em outros países, visando a estabelecer para os representantes diplomáticos a obrigação de justificar a aplicação de dois terços da sua verba para despesas de representação.

Do resultado desse decreto podemos verificar quem recebe mais do que precisa e quem recebe menos, e depois haverá que lazer a rectificação na lei orçamental.

Suponho que o próprio autor da emenda estará de acordo comigo.

Era isto que eu queria dizer.,

O orador não reviu.

O Sr. Herculano Galhardo: — Não tencionava intervir nesta discussão, e não o faria se não fosse a atitude tomada pelo Sr. Júlio Dantas, leader do Partido Nacionalista, ao dirigir-se a este lado da Câmara.

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caso presente temos de abrir uma excepção, porque as palavras de S. Ex.a foram absolutamente inesperadas.

S. Ex.a trouxe a propósito, ou a despropósito para aqui uma f rãs o que o pai de um Senador deste lado da Câmara, a respeito de uma emenda sue, que fora rejeitada, pronunciou, dirigindo-a ao outro lado da Câmara, e que foi «a maioria não tem emenda».

Ora este lado, da Câmara tem a consciência de'cumprir o seu dever e ainda está à espera que outros partidos, com representação parlamentar, adquiram a autoridade suficiente para lhe dar lições,,

Digo estas palavras que têm um aspecto de irascibilidade, mas sem violência, guardando sempre pelo ilustre Senador a quem mo referi aquela alta consideração e singular estima que lhe devo pelos seus altos merecimentos, e porque a.S. Ex.a mó ligam velhos laços de amizade. '

O Sr. relator do orçamento já declarou ao Sr. Júlio Dantas que, em nenhum Senador da Secção descobriu o propósito de melindrar S. Ex.a

S. Ex.a ao referir-se à Secção esqueceu-se de que o Regimento do Senado não é o mesmo que o Regimento da Câmara dos Deputados. Nós temos aqui secções e não comissões, e para essas secções os Senadores são eleitos por sistema proporcional. Quere dizer, a representação parlamentar das secções é inteiramente semelhante à representação parlamentar do Senado, e as minorias ou maiorias têm tanta força relativa nas secções como a têm nas sessões plenas.

Portanto nas secções a minoria nacionalista trabalha como trabalha em sessão plena, e é ouvida com tanto respeito como em sessão plena.

Tem S. Ex.a entre os seus correligionários amigos todos por testemunhas do que se passa em todas as secções e de que a minoria nacionalista é tratada com o respeito que merece, tendo a maioria parlamentar o maior agrado em aceitar a colaboração de' S. Ex.as

As palavras do ilustre Senador só revelam uma cousa: é que S. Ex.a tem frequentado pouco as secções, e só a isso posso atribuir esse seu lapso.

Magoou portanto S. Ex.a, injustamente, ,a maioria. S. Ex.a certamente se ihá-de

arrepender das palavras absolutamente injustas que atribuiu à maioria, e que a maioria teria de repelir energicamente se não soubesse que não houve da sua parte o menor intuito de nos ofender.

Pelo que respeita ao assunto em discussão tenho de intervir nele.

Também o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros já pôs a questão no seu lugar.

Efectivamente, quando se quiser estudar no Senado o ponto de vista 'brilhantemente tratado pelo Sr. Júlio Dantas em pleno acordo com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o assunto terá de ser tratado pela 2.a Secção. A 3.a Secção, a Secção do Orçamento, encara apenas este assunto pelo critério orçamentológi-co. É esse apenas o seu dever.

A Secção tinha portanto de estudar a questão sob o ponto de vista orçamento-lógico, e o que tinha a fazer era ver só as verbas inscritas efctão de acordo com uma lei pre-existente.

Já o Sr. Ministro cios Negócios Estran-geiços o disse. Mas S. Ex.a, com os hábitos do fino diplomata que tem, e como pessoa distinta, S. Ex.a, querendo conciliar as cousas, fez um discurso primoroso, ao qual tenho também de m? referir em primeiro lugar para felicitar S. Ex.a pela forma brilhante como conseguiu expor os seus pontos de vista e depois para estabelecer as divergências que há entre o Sr. Ministro e a maioria, quanto à maneira de interpretar as leis, principalmente sob o ponto de vista orçameutológico.

Porque, Sr. Presidente, é preciso acentuarmos isto. O Orçamento tem de ser feito de harmonia com a lei orgânica, e deste modo foi que o Orçamento saiu do Ministério. Nem podia sair de outra maneira.

Passou o orçamento pelas mãos do Sr. Ministro das Finanças, que lhe deu também o seu acordo, e sobre ele baseou a lei geral de receitas e despesas do Estado, apresentando-o em seguida às Câmaras.

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Apenas se poderia opor a qualquer modificação que S. Ex.a considerasse pertmv badora dos serviços do seu Ministério.

Mas, repito, S. Ex.a não fez nenhuma-alteração fundamental ao que estava proposto, e conseqúentemente continua a fazer-se referência à nossa representação na Kússia e na Áustria e a uma possível representação na Polónia e na Tcheco--Slováquia.

Mas, Sr. Presidente, S. Ex.a não fez nenhuma alteração, porque, pensando agora numa reorganização de 'serviços, entendeu que oportunamente traria ao Parlamento as alterações aos créditos. Nem para isso preciso de autorização parlamentar, porquanto, aprovada a sua reforma, ficaria autorizado a modificar todos os créditos orçamentais no sentido de cumprir a lei que foi votada.

Apoiados.

Vem prevista uma representação na Kússia e não discuto agora onde há-de ser, se em Petrogrado, se em Leninegrado, como já ouvi dizer a um Sr. Senador, se ainda em Moscow.

Deixemos isso, porque mesmo, como o Sr. Ministro disse, pode instalá-la onde quiser. O que S. Ex.a, porém, não pode fazer é nomear um Ministro em Varsóvia e acreditá-lo na Kússia; nomear um Ministro em Praga e acreditá-lo em Viena, mas pode nomear um Ministro em Viena e acreditá-lo em Praga.

Disse S. Ex.a o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que, nomeando um Ministro em Estocolmo, Copenhague e Cristiânia, pode mandá-lo residir em qualquer destes países. E exacto. Mas nomear Ministros para países que não existiam ainda ao tempo em que foi promulgada a lei orgânica do seu Ministério é que S. Ex.a não pode íazer sem trazer ao Parlamento um projecto de lei orgânica. O que pode é acreditar.

S. Ex.a o Sr. Júlio Dantas, num aparte ao Sr. relator, disse: <ícomo que='que' praga='praga' ou='ou' governo='governo' em='em' é='é' nosso='nosso' ao='ao' o='o' p='p' pagar='pagar' varsóvia='varsóvia' ministro='ministro' há-de='há-de'>

Isso é uma questão que o Ministro resolverá apresentando ao Parlamento uma proposta nesse sentido.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges) (interrompendo]: — Se S. Ex.a quere eu respondo.

O Orador: — S. Ex.a pode responder ao Sr. Júlio Dantas, porque S. Ex.a é que está inquieto com as dificuldades que há-de ter o Governo para pagar ao Ministro em Varsóvia.

Ainda bem que nesta altura já vejo o Sr. Júlio Dantas. com uma atitude um pouco diferente da que tinha no princípio da discussão.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges) (interrompendo) : — ^S. Ex.a dá-me licença para um esclarecimento? E que pelo motivo de se nomear o Ministro para Viena e acreditar para Praga não tom por isso maior vencimento.

O Orador: — S. Ex.a está a dar-me razão. De outra cousa não saberei eu, mas de contas talvez, por mal dos meus pecados, saiba razoavelmente.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges) (interrompendo): -Mas desculpe-me S. Èx.a Por emquanto não vejo divergência alguma entre a maioria e a minoria.

O Orador : — Folgo com a declaração de S. Ex.a Tomo boa nota de queS.Ex.3 está de acordo comigo e com o Sr. Júlio Dantas. Portanto, estamos felizmente todos de acordo.

Felicito S. Ex.a pela sua habilidade e talento político, porque está concorrendo para fazer desaparecer um mal-entendido que é lamentável para uma casa do Parlamento como esta, onde a harmonia é por tal forma evidente que até mesmo da minoria monárquica não temos senão uma excelente colaboração (Apoiados). E senão a midoria que nos diga se alguma vez foi ofendida por esta Câmara. Não é costume nesta Câmara, acentuo-o bem altamente, praticar-se dessas ofensas que o Sr. Júlio Dantas atribuiu à maioria.

Apoiados.

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo): — Eu não pronunciei a palavra «ofensa».

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Não pertenço à secção do Orçamento, raras vezes Já vou. Mas fui a esta reunião.

O Senado não pode fazer alterações que não estejam previstas por uma lei anterior. Não existe o Ministro em Varsóvia; existia apenas um diplomata em Praga.

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo): — Se S. Ex.a me permite eu dir-lhe hei que S. Ex.a está colocando mal o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Fica a S. Ex.a a responsabilidade de dizer que a nomeação para Varsóvia foi ilegal porque, não existindo na orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros a Polónia, visto que a esse tempo ela não existia como Estado independente, e não existindo também nas tabelas orçamentais descrita a legação de Varsóvia, o Sr. Vasco Quevedo "foi nomeado para uma legação que não existia. Creio que não poderá haver discrepância de critério sobre este assunto.

O gesto que daqui fiz proveio de qae essa afirmação deixa ficar mal o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, como mal o tem já querido deixar ficar o Sr. relator.

S. Ex.a o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tem sido apenas apoiado por ôste lado da Câmara. Registo, sem intenção de fazer política, este facto, e agradeço a S. Ex.a a oportunidade que me proporcionou de fazer estas considerações.

O Sr. Augusto de Vasconcslos (interrompendo) : — Vou esclarecer este case e atirar as culpas para cima de quem as tem.

O Orador (aparte): — É a Sociedade das Nações. Èisos.

O Sr. Amgusto de Vasconcelos: — A culpa tem-na a comissão do Orçamento.

Há dois ou três anos, quando se discutiu este caso da legação da Rússia, a comissão do Orçamento da Câmara dos De-

putados e depois a do Senado introduziram uma emenda —mal, a meu ver — estabecendo que a legação seria em Pe-trogrado e em Varsóvia.

E um acto legal. Por conseguinte, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros nomeou muito bem, e o Senado encontra--se. perante uma situação perfeitamente legal.

O Orador: — Peço ao Sr. Augusto de Vasconcelos que não veja nas minhas palavras nenhuma referência desamável, ou alguma cousa que possa magoá-lo, peis que a S. Ex.3, como ao §r. Júlio Dantas, me liga, além dos laços de boa camaradagem, uma velha amizade. Sabemos também que os serviços prestados pelo Sr. Augusto de Vasconcelos são dignos do respeito de todos.

Mas, Sr. Presidente, continuando.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que não tem dúvidas também a respeito da situação e quê, no'fundo, está de acordo comigo, já começou, perdoem--me o pleboísmo,' a sacudir a água do capote, dizendo que não foi S. Ex.a que fez a nomeação. Portanto, S. Ex.a não está absolutamente seguro da legalidade da nomeação.

Quanto à explicação dada pelo Sr. Augusto de Vasconcelos também não colho, porque não é costume sancionar erros por meio de verbas orçamentais.

Quere dizer: a proposta do Sr. Júlio Dantas, no sentido de se modificar a designação de Petrogrado por Varsóvia e de Praga por Viena, não remediará o mal, porque as designações ou alterações que se façam nas tabelas orçamentais não podem servir para sancionar actos ilegais, se os houver.

Quanto à preocupação de S. Ex.a, relativamente à situação do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, estou muito mais sossegado do que S. Ex.a O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros está ha-bitaado a ver a sinceridade com que falo a todos os governos meus correligionários. Por outro lado, também já prestei a minha homenagem à minoria nacionalista, não acuí3ando-a, mas apresentando fac tos.

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Isso mesmo eu já reconheci, porque», quando se discutiu a proposta de lei dos duodécimos, disse que a .maioria preferia ser uma almofada de boa palha de milho do que a fofa almofada de penas quo era à minoria nacionalista.

O Sr. Júlio Dantas: — S. Ex.a foi tam amável permitindo-me que eu o interrompesse há pouco, que peço mais uma vez a V. Ex.a licença para o interromper.

O Orador: —Pode S. j£x.a interromper--me sempre e quando quiser.

O Sr. Júlio Dantas: — S. Ex.a, com as suas considerações muito judiciosas e animado de um belo espirito de lógica, chegou a esta conclusão: cometeu-se um acto ilegal nomeando-se um Ministro para Varsóvia. Registamos.

O Orador: — ,;S. Ex.a julga que me incomoda tirando essa ilação das minhas palavras? Pois não me incomoda.

V. Ex.a, Sr. Presidente, sabe que quando falo peço aos Srs. taquígrafos o favor de registarem muito cautelosamente as minhas palavras, porque só costumo dizer o que quero.

Pode o Sr. Júlio Dantas tirar das minhas palavras as conclusões que quiser.

Ora eu não íalo, Sr. Presidente/ senão para que me ouçam, e estou falando com voz suficientemente clara. Não falarei com aquela linguagem portuguesa com que desejaria exprimir-me, mas estou certo de que S. Ex.a me perdoará essa falta e ninguém com mais autoridade do que S. Ex.a para ter essa benevolência para comigo.

Mas dizia eu que não devemos, por meio de mudança de palavras, ou de verbas, caucionar actos que não tenham a força legal necessária.

Não discuto agora se a nomeação do Ministro para Varsóvia é muito ou pouco legal; isso é-me compl.etamente indiferente neste momento.

O que digo é quo não será com o meu voto que nós caucionaremos qualquer cousa que tenha um aspecto menos legal.

Mas há, de facto, um Ministro em Varsóvia. Brevemente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros apresentará ao Parla-

menta uma proposta, de reorganização que será, por assim dizer, um bill de in-demnidade.

Já não sucede o mesmo com o nosso representante em Praga. S. Ex.a fez o que mais convinha aos interesses do País: nomeou-o nosso representante para Viena.

Disse S. Ex.a o Sr. Júlio Dantas que achava mais interessante ter um Ministro em Praga do que c:;i Viena. É uma afirmação que S. Ex.a traduzirá numa proposta de loi; e, nessa ocasião, S. Ex.a verá como a sua iniciativa é recebida.

Possivelmente ter-me há também a seu lado.

Se o ilustre Senador ocupasse o lugar de Ministro dos Negócios Estrangeiros veria como era acolhida a iniciativa que tomasse a este respeito.

Veja S. Ex.a como estamos caminhando um para o outro como bons portugueses.

Afastado o problema de Varsóvia e de Praga, que está inteiramente explicado e cujas explicações dadas pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros justificam também a ,atitude da Secção do Orçamento do , Senado,. tenho ainda de me referir à transferência da verba proposta pelo Sr. Júlio Dantas relativa a uma redução que uma determinada verba do Orçamento teve na Câmara dos Deputados — verba de 50.000$ ouro.

Estas verbas no Ministério dos Negócios Estrangeiros tem isto com elas: é que 50 contos neste Ministério não são estes 50:000 escudos que estamos habituados a receber em Portugal; são ouro.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Vasco Borges) (interrompendo): — Mas também em contrapartida fornece a sua segunda maior receita ao Estado.

O Orador: — Não o ponho em dúvida.

Mas ia eu dizendo que na Câmara dos Deputados foi proposta uma redução de verba e S. Ex.a sabe, que este Governo se apresentou com o propósito de reduzir despesas. Logo de princípio este lado da Câmara, se colocou ao lado do Governo nessa parte do programa.'

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cumprir esta promessa, tem-se afastado consideràvelmnente dela pelo caminho oposto.

Aqui tem S. Ex.a — pode registá-lo. Estou neste ponto contra o Governo, inas creia que não lhe faz grande mal...

O Sr. Presidente: — Se V. Ex.a deseja pode ficar com a palavra reservada.

O Orador: — Aceito o alvitre de V. Ex.a O orador não reviu.

O Sr. L^esidente: — A próxima sessSc é amanhã, à hora regimental, sendo do-signado para ordem do dia o projecto de lei n.° 15.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e õ minutos.

O REDACTOR- A1ba.no da Cunha.

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