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Sessão de 23 de Abril de 1926

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lei, habituados a aplicar a lei—- não são nunca os melhores para apreciar da matéria do facto, para ouvir apenas a voz da sua consciência. Ouvem-na, mas coada através desse império da lei, da qual são escravos e que estão habituados desde o início da sua carreira a fazer aplicar e cumprir. É assim, sem dúvida nenhuma, que se altera profundamente o sentimento que norteia a instituição do júri, sem dúvida nenhuma que se falta ao princípio que se quis observar: — o respeito pela consciência pública, pela sociedade, ouvindo a voz da consciência através dos homens do povo, dos. «homens bons», que são chamados na generalidade dos casos a apreciar a doutrina do facto em sua consciência.

Esta disposição é uma disposição que não devia estabelecer-se.

Sei muito bem a que obedeceu esta resolução do Sr. Ministro da Justiça, sou o primeiro a fazer justiça à sinceridade do seu intuito, mas em bom princípio não é de admitir nem de defender esta disposi-ção\ que pode trazer grandes inconvenientes.

Mas há mais outro facto que já foi apontado pelo Sr. Alfredo Portugal: — a deslocação das respectivas comarcas de 36 juizes, são 36 comarcas que ficam assim sem juiz.

Mas — dir-se há — unicamente em-quanto durar o julgamento dos incriminados do Angola e Metrópole.

E que tempo levará isso?

Estou a ver que perante uma enormidade destas, um processo extraordinariamente volumoso como é este, tanto a acusação como a defesa, hão-de- ser representadas por brilhantes homens de leis, hão--de fazer todos os esforços para esmiuçar os processos, detalhar a acusação e a defesa de modo a esclarecer, uns os interesses da sociedade, outros os dos seus constituintes. E assim, os julgamentos hão-do ter uma forma tam morosa que há-de se fazer sentir a falta dos juizes nas comarcas onde exercem a sua jurisdição.

Ficam entregues as comarcas aos juizes substitutos, mas como V. Ex.a, Sr. Ministro da Justiça, sabe, o substituto nunca é um juiz a quem se -possam exigir res-ponsabilidades como a um juiz de carreira, de categoria, porque esses têm obrigação, embora errem, de saber cumprir e apli-

car a lei, ao passo que aos substitutos não se pode exigir, embora o lugar o exija, aquela soma de conhecimentos, aquela preparação que é precisa a um homem que se senta numa cadeira para julgar.

Mas como resolver o problema?

Desde que temos de caminhar para uma situação excepcional, para um sistema de julgamento especial, necessário se torna ir recrutar a qualquer classe os julgadores.

Começa-se por verificar que há um grande respeito, um demasiado respeito pela perfeição constitucional, pela Constituição da Eepública que tantos ataques tem sofrido, tem sido transformada em farrapos, rasgada.

Encontra aqui a Constituição defensores da sua pureza e virgindade que, sem dúvida, não se compadece com atitudes anteriores tomadas pelos poderes públicos.

Tenho verificado e íácil é de verificar a todos aqueles que compulsam a legislação republicana que quási toda ela é ditatorial.

As próprias leis do Governo Provisório que deviam ter a sanção das Câmaras Legislativas nunca a tiveram.

Estamos, pois, vivendo em regime ditatorial.

Com esta lei que se vai revogar por inconstitucional dá-se até a circunstância de ter sido elaborada no Governo do Sr. Ber-nardino Machado, actual Presidente da Eepública, um dos homens que mais têm pugnado pela pureza constitucional, e esta lei é agora publicada à sombra da lein.° 1:275, de 8 de Agosto de 1914, que, sem dúvida nenhuma, entre as atribuições que confere ao Poder Executivo não inclui atribuições para legislar sobre matéria de notas e moeda falsa, como afinal se fez no diploma que vai agora ser revogado.

Mas quantas e quantas vezes nós temos assistido aos abusos das autorizações con-ce,didas pelo Legislativo ao Executivo, a forma como o Executivo tem interpretado à vara larga essas autorizações que o Legislativo lhe concede, fazendo publicar decretos que não estão compreendidos nessa autorização, e é o próprio Ministro da Justiça que veio apresentar à Câmara a confirmação das minhas afirmações.