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REPÚBLICA

PORTUGUESA

EM 27 DE ABRIL DE 1926

Presidência do Ex.mo Sr, António Xavier Correia Barreto

Secretários os Ex,mos Srs,

Luís Inocêncio Ramos Pereira Joaquim Correia de Almeida Leitão

Sumário. — Procedendo->se à ohamada e verificando-se a presença de 30 Srs, Senadores, o Sr. Presidente abriu a sessão.

Leu-se a acta. que foi aprovada e deu-se conta do expediente.

- Antes da ordem do dia. — O Sr. Mendes dos Méis dá .conta da forma agradável como o Sport Club do Porto recebeu os representantes do Grupo Parlamentar Desportivo.

O Sr. Vicente liamos requere e a Câmara aprova, que o projecto de lei n," 97 entre em discussão. Foi aprovado e dispensado da leitura da última redacção.

O Sr. João de Azevedo Coutinho, referindo-se às negociações com a União Sul Africana por causa da delimitação do Sul de Angola, produz várias considerações a que responde o Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha).

Ordem do dia. — Continua a discussão da proposta de lei relativa à criação do júri especial para julgamento dos implicados no caso do Banco Angola e Metrópole.

Falam os Srs. Alfredo Portugal, Oliveira Brás, Querubim Guimarães e Ministro da Justiça (Ca-tanho de Meneses), que respondeu a todos os Srs. Senadores, e apresentou proposta de artigos novos.

Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Fernando de Sousa alude ao incidente que se produziu em Alcanena eom o administrador do concelho lembrando o maior escrúpulo na escolha das autoridades. Responde o Sr. Ministro da Justiça (Catanho de Meneses).

Seguidamente o Sr. Presidente encerra a sessão.

Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.

Presentes à chamada 30 Srs. Senadores*.

Entraram durante a sessão 23 Srs, Se* nadores,

Srs. Senadores presentes à chamada','

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Álvaro António de Bulhão Pato.

António Alvos de Oliveira Júnior.

António da Costa Godinho do Amaral.

António Maria da Silva Barreto.

António Martins Ferreira.

António Xavier Correia Barreto.

Artur Augusto da Costa.

Artur Octávio do Rego Chagas.

Constantino José dos Santos.

Ernesto Júlio Navarro.

Francisco José Pereira.

Francisco de Sales Karnos da Costa.

Francisco Vicente Ramos.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

Herculano Jorge Galhardo.

João António de Azevedo Coutinho Fragoso de Siqueira.

João Augusto de Freitas.

João Catanho de Meneses.

Joaquim Correia de Almeida Leitão.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

José António da Costa Júnior.

José Joaquim Fernandes Pontes.

José Mendes dos Eeis.

José Varela.

Luís Augusto Simões de Almeida.

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Diário das Sessões do Senado

Querubim da Kocha Vale Guimarães. Kodrigo Guerra Álvares Cabral. Vasco Gonçalves Marques.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

Álvaro César .de Mendonça. 'António dos Santos Graça.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Augusto de Vera Cruz.

Domingos Frias de Sampaio e Melo.

Duarte Clodomir Patten de Sá 'Viana,,

Francisco Maria Vieira da Rocha.

Graneis co António de Paula.

Frederico António Ferreira de Simas.

Henrique José Caldeira Queiroz.

João Carlos da Costa.

João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

José Fernando de Sousa.

José Joaquim Fernandes de Almeida.

José Machado Serpa.

Júlio Augusto Eibeiro da Silva.

Júlio Dantas.

Manuel Gaspar de Lemos.

Miguel do Espírito Santo Machado.

Roberto da Cunha Baptista.

Silvestre Falcão*

Tomás de Almeida Manuel de Vi-•Ihena (D.).

Sr 8. Senadores que não compareceram:

António de Medeiros Franco.

Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.

Elísio Pinto de Almeida e Castro.

Francisco Xavier Anacleto da Silva.

João Maria da Cunha Barbosa.

João Trigo Motinho.

Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Manuel dos Santos Garcia.

Joaquim Teixeira da Silva.

José Augusto Ribeiro de Melo.

José Nepomuceno Fernandes Brás.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Luis Filipe de Castro (D.)

Nicolau Mesquita.

Pedro VirgoKno Ferraz Chaves.

Raimundo Enes Meira.

Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada.

Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 30 Srs. Senadores.

Eram 15 horas e 26 minutos. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta. Leu-se a acta.

O Sr. Presidente: — Está em discussão a acta.

Pausa.

Como ninguém pede a palavra considera-se aprovada.

Vai ler-se o

Ofícios

Da Câmara Municipal do concelho de Boticas, pedindo para ser" votada a proposta de lei do Sr. Ministro do Comércio, respeitante a um empréstimo destinado à construção e reparação das estradas.

Para a Secretaria.

x

Do Ministério das Finanças, mandando eliminar do capítulo 17.°, artigo 61.°,'u do capítulo 25.°. artigo 110.°, da prç-pos'ta orçamental do Ministério das Finanças, nos termos do decreto n.° 11:597, de 20 de Abril de 1926, determinadas verbas.

Para a 3.a Secção.

Telegramas

Dos funcionários de todos os quadros do serviço do distrito de Inhambane, pedindo a revogação do diploma n.° 86 por ser anti-colonizador.

Para a Secretaria.

Da Liga de lustrução e Educação da Escola Industrial de Fonseca Benevides, pedindo a aprovação do projecto que revoga o decreto n.° 11:225.

Para a Secretaria.

Da Junta de Freguesia de Armamar, pedindo a aprovação do projecto de lei concedendo personalidade jurídica à igreja católica.

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Sessão de 27 de Abril de W26

Idêntico do Senado Municipal de Ar-mamar.

Para a Secretaria.

Dos funcionários da Eepartição de Finanças do concelho de Valongo, solicitando a aprovação do projecto de lei da autoria do Sr. Júlio Ribeiro sobre a distribuição da multa de 3:600 contos.

Idêntico dos funcionários de finanças de Coimbra, Bragança, Vila Flor, Baião, Amarante, Gaia, Pçrtalegre, Vila do Conde, Mirandela, Óbidos, Matosinhos, Beja, Freixo de Espada-à-Cinta, Batalha, Valença, Alcotiaça, Porto, Vinhais, Car-razeda, Marinha Grande, Mogadouro, Paredes, Bombarral, Monforte, Macedo de Cavaleiros, Maia, Bragança, Caldas da Rainha, Leiria, Viseu, Felgueiras, Aveiro, Portalegre e Oliveira de Frades.

Para a Secretaria.

Bepresentação

Do conselho do Instituto Industrial e Comercial do Porto, defendendo a justiça que cabe aos engenheiros diplomados por este Instituto.

Para a l.a Secção.

Requerimentos

Do cidadão Balduíno Gameiro da Mata que pretende ser reconhecido revolucionário Civil.

Para a comissão de petições.

Requeiro que, pelo Ministério da Agricultura, me seja fornecida a seguinte informação :

Enumeração das escolas de ensino elementar, secundário e superior do Ministério, com a indicação respectiva da população escolar, discriminando o número dos alunos que vivem nas mesmas escolas em regime de internato.—Ferreira de Simas.

Mandou-se expedir,

Requeiro que, pelo Ministério do Comércio e Comunicações, me seja fornecida ' com a maior urgência, nota das quantias concedidas ou autorizadas depois da publicação da portaria n.° 4:443, de 30 de Junho de 1920, para a Companhia das Águas de Lisboa fazer quaisquer obras ou adquirir qualquer material para o seu serviço.

No caso de haver qualquer concessão no referido sentido, a nota deve indicar a importância autorizada, a data em que o foi, e o fim a que se destina. — J. Carlos Costa.

Mandou-se expedir.

Projectos de lei

Do Sr. Silva Barreto, mandando entregar à administração municipal o ensino infantil e primário geral.

Para a l.a Secção.

Do Sr. Santos Garcia, aposentando na categoria de primeiros oficiais, quando forem julgados incapazes do serviço, os actuais segundos e terceiros oficiais do quadro privativo do Ministério da Agricultura que foram escriturários de l.a classe da antiga Direcção Geral da Agricultura.

Para a 2.a Secção.

Antes da ordem do dia

O Sr. Mendes dos Reis: — Sr. Presi- -dente: desejo informar a Camará, e principalmente os Srs. parlamentares que fazem parte do Grupo Parlamentar de Educação Física, de que tendo ido uma delegação desse grupo assistir às festas do Sport Club do Porto, foi recebida por uma forma agradabilíssima, tanto por parte da direcção do Club, como de todos os seus membros. Foram-lhe dispensadas todas as gentilezas e provas de consideração e estima.

Sr. Presidente: o Sport Club do Porto tem apenas cinco anos de existência, mas durante eles tem afirmado tal valor na propaganda e desenvolvimento da educação física, que tem merecido da parte do público os maiores elogios.

Apoiados.

O Governo da República entendeu, por esse motivo, galardoá-lo com o oficialato de Cristo. Assistimos à solenidade da en-,trega das insígnias e a uma demonstração de gimnástica feita de uma forma brilhante, interessante e metódica.

Apoiados.

É conveniente acentuar também a obra de assistência que esse Club presta aos estabelecimentos de caridade, realizando saraus anuais e festas, até com sacrifício dos seus associados/

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Diário das Sessões do Senado

Instituições destas bem merecem todo o respeito e carinho da colectividade, e o estímulo e protecção dos poderes constituídos,

Apoiados.

Vozes : —Muito bem.

O Sr. Vicente Ramos. — Sr. Presidente : requeiro a V. Ex.a que consulta o Senado se permite que, sem prejuízo dos oradores inscritos e emquanto nuo vem. algum dos Srs. Ministros, seja discutido o projecto de lei n.° 97, que está na ordem do dia, e em último lugar.

Foi aprovado o requerimento.

O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão o projecto de lei n.° 97. Lê-se na Mesa. E o seguinte;

Projecto de lei n.° 93

Artigo 1.°' São extensivas as disposi--coes da lei n.° 786, de 24 de Agosto de 1917, coni as alterações constantes do artigo 1.° do decreto n."0 5:283, de 20 de . Março de 1919, ao segundo sargento torpedeiro electricista, reformado, da armada, José Maria Vivo.

Art. 2.° É concedida a pensão anual de 48$, emquauto estiver ao serviço activo, ao primeiro sargento condutor de máqui-, nas da armada José Joaquim Ucha.

§ único. Quando este sargento for julgado incapaz de serviço cessa o abono desta pensão, sendo-lhe aplicáveis as disposições legais referidas no artigo 1.° desta lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

O Sr. Presidente: — Está em discussão.

Foi aprovado na generalidade e na especialidade.

O Sr. Vicente Ramos: — Requeiro dispensa da leitura da última redacção. Foi dispensada.

O Sr. João de Azevedo Coutinho: —Sr.

Presidente: em uma das últimas sessões tive a honra de me dirigir a V. Ex.a. solicitando que, pelo Governo, me fosse dada uma resposta a respeito da comissão que foi para a África do Sul proceder à

delimitação da fronteira da província de Angola, e da antiga colónia alemã sul-afri-cana do Ovampo.

O Sr. Ministro das Colónias, em poucas palavras, respondeu-ane, e por uma forma que me deixou satisfeito.

Hoje, porém, surgem novos elementos de consideração sobre o assunto, em vista dos quais aquelas reservas que mantive me parecem desnecessárias.

Segundo se lê no Times, de 23 do corrente, na câmara sul-africana estabeleceu--se há dias um diálogo interessante entre os generais Hertzog e Smuths. Trataram do status internacional da África do Sul e do que a esse respeito havia a declarar no próximo Congresso do Império Britânico. As conclusões foram estas:

«Não há mais a lutar por um status de independência. Essa já nós temos», declarou Hertzog. «Estamos num pó de absoluta igualdade com a Grã-Bretanha. Se tomarmos essa atitude perante o mundo, abertamente, isto ó, que a África do Sul ó independente, todas as dificuldades dos tempos, passados desaparecerão...».

O que, em vista disso, parece, pois, é que realmente vamos negociar com um Estado absolutamente nas mesmas condições de igualdade dentro do Império Britânico, em que está a própria Inglaterra, visto que o Governo Inglês, perante estas declarações oficiais dos actuais primeiro Ministro e ex-Ministro da União Sul-Africana, não consta que as contestasse.

£ Vamos, pois, tratar da delimitação com um país que tem atribuições^ iguais às da própria Inglaterra?

Creio que ainda aão reconhecemos a África do Sul como um país soberano, mas a verdade é que a União parece pretender já encontrar-&e nesta situação, que Lord Eussell há mais de cem anos previa para as colónias inglesas sem excepção.

& Podemos nós de facto reconhecê-la? É evidentemente impossível.

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Sêsaâo de $7 de AM de 1920

tava perfeitamente regulado e assegurado definitivamente. Isto ó, que as colónias de-mandato que estão nas mãos da União nunca sairão dessas mãos.

Já disse aqui que há negociações pendentes entre os habitantes da colónia de mandato do oeste africano alemão, ou Ovampo, e a União para que essa antiga colónia seja integrada na União. Parece--me utopia pensar que a ex-colónia alemã possa de futuro j amais tornar a ser considerada como uma colónia de mandato. Será, ó este o nosso-vaticínio, uma parte integrante da União Sul-Africana. Mas, mesmo que essas previsões se não realizassem, não vejo como temos que negociar com a Sociedade das Nações; só vejo que vamos negociar com a União Sul-África-na, domínio britânico.

^ Mas devemos nós, nação soberana, negociar directamente com um domínio ou colónia, embora ela se arrogue um status de independência igual ao da Inglaterra? - .

Parece que ainda não estamos nessa situação.

Entra o Sr. Ministro das Colónias.

Eecapitulando, pois, verifica-se:

Que se.considera a si própria a União Sul-Africana um país independente, embora nós não . lhe possamos ainda reconhecer essa qualidade.

Que é verdade que também foi insinuado por várias maneiras, incluindo a da imprensa inglesa, quedas antigas colónias da Alemanha em África têm o seu destino definitivamente fixado.

O Ovampo procura entender-se com o mandatário e deseja fazer parte integrante da União Sul-Africana, o que fatalmente vem a dar-se mais tarde ou mais cedo.

Vamos, pois, negociar com a União, Sul-Africana e não com a Sociedade das Nações. E devemos considerar como facto iniludível que não haverá forças humanas, nem a Sociedade das Nações nem qualquer dos países a ela pertencentes, que consigam subtrair o Ovampo à atracção, afatalabsorpção pela União Sul-Africana.

Vamos, por conseguinte, negociar com a União Sul-Africana e era sobre este facto que eu desejava ouvir a opinião do Sr. Ministro das Colónias.

O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha): — As considerações muito espe-

ciais feitas pelo ilustre Senador Sr. Azevedo Coutinho são firmadas num artigo publicado no jornal o Times, que, embora" seja um jornal de muita circulação na Inglaterra e em todos os Estados da Europa, não ó bem o órgão oficial da Inglaterra, como nós aqui poderemos chamar ao Diário do Governo.

S. Ex.a afirmou que nós íamos negociar com a União Sul-Africana.

De facto assim é.

Mas a África do Sul ainda não está de* clarada independente e, assim, são consi-deradas colónias inglesas com independência administrativa, com maior ou menor independência parlamentar, mas ainda debaixo da suzerania inglesa.

De modo que, tratando directamente com a África do Sul,.tmtamos de harmonia com a melhor fornia de dirigir as negociações por nos ser mais fácil tratar desses assuntos no Cabo apesar de ao princípio se ter pensado em fazê-lo na Inglaterra.

Não se tratando de um Estado independente, temos de considerar que as negociações feitas são ao mesmo tempo aceitas pela Inglaterra, por isso que V. Ex.a sabe qual a ligação que hoje existe entre a Inglaterra e a África do Sul, em que a Inglaterra tem um seu representante na África do Sul e, por sua vez a África do Sul um seu representante na Inglaterra.

Pode dizer-se que é uma ligação muito ténue que em um período mais próximo do que se julga venha a desaparecer.

Convirá isso à África do Sul? Convirá isso à/Inglaterra? Parece que não.

A África do Sul não tem esquadra própria e necessita da esquadra inglesa para manter—permita-se-me o termo—o statu quo de equilíbrio internacional.

Disse o ilustre ^Senador que nós íarrios negociar com a África do SuLe não com a Sociedade das Nações.

Aqui há vários pontos desvista. O Sr. Augusto de- Vasconcelos apresentou o outro dia aqui o seu, que não é o mesmo do Sr. Ministro dos Estrangeiros, cuja interpretação é a que me parece melhor.

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Diário das Sessões do Senado

da soberania dos Estados não pode estar subordinado a uni corpo único como a Sociedade das Nações, visto que isso representaria a perda da própria soberania dos Estados que dela fazem parte.

Trata-se de unia forma transitória ? Será o que se quiser, mas julgo que não é unia forma a manter.

Tornando-se um Estado, a Sociedade das Nações não tem ao mesmo tempo, nem a forma de ligação, nem personalidade jurídica.

Por um princípio de educação e civilização de povos, resolveram os Estados que constituem a Sociedade das Nações, entregar os mandatos às mesmas nacionalidades qiie já administravam certos territórios logo após a guerra, visto que essa Sociedade não os podia chamar a si directamente. Assim,, íoi confiado à África do Sul o Cvampo (leste africano), antiga colónia alemã.

É a forma a manter? Pára mim isso é um ponto de interrogação.

De maneira que, tratando com a África do Sul, nós tratamos com uni país que tem um mandato sobre um determinado território, mas não com a Sociedade das Nações. Não é a Sociedade das Nações que irá dar o seu voto sobre a questão.

Não está definida em princípios de direito internacional, de direito de conquista e de direito dos povos, a fórmula que, a meu ver, não pode prevalecer, se um mandato irá para a independência, ou se se vai integrar no próprio Estado, ou se continuará indefinidamente pertencendo à tal «(Sociedade».

Em vista, pois, das considerações de V. Ex.a, podemos ter a certeza de que vamos tratar com a África do Sul., e não com a Sociedade das Nações. Tenho dito. O orador não reviu.

0 Sr. João de Azevedo Goutinho :—Sr. Presidente: vejo com prazer que S. Ex.a o Sr. Ministro das Colónias está inteiramente de acordo com a minha opinião,.

No emtanto peço licença para ler o relato daquilo a que chamei um elemento de consideração novo, e que surgiu agora, sobre o que a África do Sul pensa acerca da soa independência.

01 general Smuts, em resposta ao ge-

neral Hertzog, declara na Câmara Sul Africana:

«Considero o Império Britânico uma combinação orgânica de Estados perfeitamente iguais.

A atitude dos primeiros Ministros dos Domínios e do primeiro Ministro britânico nas suas relações entre si confirma o que digo.

Não há no Império um super Estado ou uma super autoridade.

É uma- reunião de iguais com um só soberano».

O general Hertzog, primeiro Ministro da União, havia i eito referências ao modo de ver do general Smuts no assunto, dizendo que este admitia dentro do Império Britânico um'a super autoridade.

O general Smuts respondeu como disse.

É este um facto,, até- certo ponto não inesperado, comunicado em telegrama da África do Snl para o Times, e que eu me permiti trazer ao conhecimento da Câmara, pelo aspecto novo, embora previsto, que traz para a política internacional no que respeita sobretudo à África do Sul. Por agora é, segundo disse o Sr. Ministro das Colónias, um facto assente que nós vamos negociar com a União Sul-Africana, e portanto parece-me que Portugal não podo, sobretudo quando se registam declarações como as dos generais Hertzog e Smuts, ir tratar com a África do Sul como de potência para potência.

Quanto a mina, entendo que deveria ter sido nomeada a comissão de delimitação pela colónia de Angola para tratar com a nossa rica e boa vizinha a'.União, cujo status internacional, como lá dizem, eu não sei bem realmente definir, mas a Inglaterra decerto ainda considera como um domínio seu.

Disse V. Ex.a no outro dia, em resposta a algumas considerações por mim produzidas, que essa comissão não poderia ser nomeada pela província de Angola, visto ser constituída por funcionários da metrópole.

Sabe V. Ex.a muito bem que isso não é um óbice invencível, visto que a colónia requisitava à metrópole os funcionários de que carecesse.

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Sessão de 2? de Âlrit de 1926

sua Câmara de Deputados, pela boca do seu primeiro Ministro, considerar-se um Estado absolutamente igual ao Estado inglês, e independente.

Como já tive também ensejo de dizer a V. Ex.a, estou convencido que não mais o antigo Oeste africano alemão se separa da União, porque tanto a União, como o Ovampo o desejam. Não há país, integrado ou não na Sociedade das Nações, que tenha força para lho arrancar e para cortar os laços naturais, geográficos, etnográficos e políticos que estreitamente os unern.

Nunca mais dali sairá.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Vieira da Rocha):—Sr. Presidente: disse S. Ex.a o Sr. Senador Azevedo Coutínho, que este assunto devia ser tratado pela província de Angola.

Ora como S. Ex.a deve saber, para que essa nossa província pudesse directamente tratar com a União Sul-Africana, esta teria de ser um Estado soberano.

Sendo a província de Angola uma colónia portuguesa, não pode tratar dessa questão.

Quando outro dia disse que não tinha funcionários para tratar dessa delimitação, quis frisar a S. Ex.a que era o Estado português que realmente ia tratar, e não a colónia em si.

A colónia pode fazer acordos de pequena monta, como são os de mão de obra, etc.

Agora para tratar com um Estado, sobre uma delimitação de fronteiras, não tem a capacidade de independência para o fazer.

O Sr. João de Azevedo Coutinho (interrompendo) :— Mas a metrópole dava a autorização' necessária a Angola para ò fa-. zer.

O Orador:—Para isso se poder fazer, à face do direito internacional, era preciso que Angola fosse um Estado, não o sendo, é a Portugal que pertence regular toda essa situação.

O Sr. João de Azevedo Coutinho (interrompendo^):— Se nós fôssemos tratar com a Inglaterra, estava muito bem, mas é

preciso notar que vamos tratar com a África do Sul, que é um domínio inglês.

O Orador :— Nós vamos negociar com a União Sul-Africana.

Como S. Ex.a sabe, ó uma colónia que pertence ainda hoje, apesar de todas as .leituras que S. Ex.a fez no Times, à Inglaterra.

Portanto vamos negociar com essa colónia, mas fizeram-se primeiro as démar-ches em Inglaterra.

O Sr. João de Azevedo Coutinho:— (TVamos negociar no Cabo com funcionários ingleses ou com funcionários da União Sul-Africana ?

O Orador:—Vamos negociar no Cabo, com funcionários sul-africanos.

O Sr. João de Azevedo Coutinho:—Então devia-se delegar na nossa colónia que fizesse as negociações com a colónia inglesa.

Desde que não negociamos com a metrópole inglesa, vamos negociar com uma , colónia, e portanto as negaciações deviam fazer-se entre a nossa colónia e .1 União.

O Orador: — Mas ó que esses delegados apesar de serem da União Sul Africana são considerados ingleses.

É claro que eles têm vontade de se tornarem independentes, e quando o forem as cousas correrão de outra maneira. Em-quanto porém eles não tiverem outra bandeira. :

O Sr. João de Azevedo Coutinho: —

Eles não querem guardar,, um pequeno sinal que seja, da bandeira inglesa.

O Orador: — Emquanto não tiverem bandeira própria, e exército e marinha próprios, emquanto não forem declarados independentes continuam a ser suzeranos da Inglaterra.

Sabem S. Ex.as que é aspiração de Smuts, Hertzog e da gente do Cabo, o quererem-se separar da Inglaterra, mas não o têm conseguido. E se o não têm feito é porque precisam da Inglaterra e hão-de precisar ainda dela por muito tempo.

Tenho dito

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ÍHdrío âas Sessões 'ao Senado

ORDEM DO DIA x>

O Sr- Presidente: — Continua a * discussão na generalidade do projecto de lei n.°f104. • É o seguinte:

Projecto de lei n.° lOé

Artigo 1.° E declarado irrito e nulo, por iaccnstitucional, desde a sua publicação, o decreto n.° 1:116, (lê 30 de Novembro de 1914.

§ único. Não obstante o disposto neste artigo continuarão a aplicar-se as disposições do mesmo decreto nos processos em que os réus já tenham sido julgados e rcspeitar-so hão as sentenças transitadas e as prescrições já concluídas ao tempo da publicação desta lei.

Art. 2.° No julgamento dos acusados pelos crimes de fabrico, passagem e fal-sificaçfio de moedas e notas de bancos nacionais, bem como no julgamento dos acusados pelos crimes .cuja existência soja averiguada nas investigações a que so referem os decretos n.os 11:337 e 11:381, de 10 de Dezembro de-1925 e 11 de Janeiro de 1926, intervirá sempre o júri, que será composto do juizes de direito indicados polo Conseího Superior Judiciário, que determinará também a forma da organização do júri.

§ único. Os crimes mencionados neste artigo serão julgados na comarca de Lisboa, no distrito ou distritos criminais que o mesmo conselho indicar.

Art. 3.° Para os efeitos do artigo anterior a pauta será composta do 36 jurados, procedendo-so ao sorteio na audiência da discussão e julgamento.

§ 1.° Esta audiência não poderá ser adiada senão por falta de testemunhas, por uma só vez, a requerimento da acusação ou da defesa, e por doença ^dos réus, devidamente comprovada.

§ 2.° Os agravos interpostos antes do despacho do pronúncia nunca terão efeito suspensivo.

Ari. 4.° Esta lei entra imediatamente dm vigor e revoga a legislação em contrário.

O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Alfredo Portugal, que ficou com a palavra reservada. .

O Sr. Alfredo Portugal i — Vou continuar as considerações, que ia fazendo acerca da proposta de lei da autoria do Sr. Ministro da Justiça, e em discussão nesta casa do Parlamento a requerimento de S. Ex.a desde a sessão de sexta-feira.

S. Ex.a perfilhou, como se fosse seu autor, o § 2.° e seguintes dessa proposta, e quando usou da palavra na sessão de sexta-feira disse: «o juiz de direito é um cidadão probo, digno, e ó quem melhor poderá julgar de facto».

Ora eu pregunto a S. Ex.a:

<_ que='que' de='de' os='os' facto='facto' ex.a='ex.a' do='do' bem='bem' p='p' aeha='aeha' julgar='julgar' simplesmente='simplesmente' s.='s.' juízos='juízos' direito='direito' capazes='capazes' são='são'>

S. Ex.a, assim como toda a Câmara, sabem o que sucede por essas comarcas além com o júri comum, e, principalmente, o que sucede em Lisboa em que realmente ó difícil recrutar jurados.

,; Porque é quê o Sr. Ministro da Justiça não traz ao Parlamento uma proposta fazendo a remodelação do júri ?

Conhece S. Ex.a o que se- tem passado em Itália, a esse respeito. Os Governos por mais de uma vez têm chegado até a estabelecer grandes prémios destinados à interessar e 'estimular tratadistas de direito criminal na solução de tam grave e complexo assunto como é o da constituição do júri.

S. Ex.a sabe muito bem que não é uma solução a que acaba de dar ao caso, por esta proposta, chamando os juizes de direito a julgar os casos especiais de passagem e fabrico de moeda falsa.

Isso traz, indubitavelmente a perturbação dos serviços judiciais como tive ocasião de dizer na última sessão.

Por consequência, essas comarcas, apesar do Sr. Ministro da Justiça dizer quo pelo Conselho Superior Judiciário sairão escolhidos aqueles dos juizes que melhores substitutos tiverem, essas comarcas, ia eu dizendo, necessariamente se hão-de ressentir.

Disse o Sr. Ministro da Justiça que o juizes de direito, em polícia correccional e em processo correccional, ou seja de galão branco julgam também de facto.

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Sessão de 27 de Abril de 1926

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Catanho de Meneses) (interrompendo): — Eu não me referi à polícia ou processos correccionais, o que me referi foi às polícias correccionais.

O Orador:—Perfeitamente; faço a rectificação do que S. Ex.a se referiu única e simplesmente a polícias correccionais.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Catanho de Meneses) (interrompendo) :~-Ein processos correccionais há apelação, e por consequência tribunais superiores para resolver.

O Orador: — Todavia, ao estabelecer-se o júri formado de juizes de direito para julgar os casos de fabrico e passagem de moeda falsa, o Sr. Ministro da Justiça talvez se lembrasse do que se passa nalguns cantões da. Suíça, em que, para dar às decisões judiciais um carácter de maior uniformidade e um timbre legal, o julgamento é efectuado pelos jurados, juntamente com o juiz, que examinam e estudam a prova, conhecendo tanto de facto, como de direito.

Para isso, preciso era que S. Ex.a dissesse que esse júri julgaria como te fosse um tribunal colectivo; mas S. Ex.a afirma que os juizes que formam o júri são jurados de facto e não têm que intervir na aplicação da lei.

Também esta proposta vai alterar o que há sobre competência dos tribunais, disse-o já e não me enfado de o repetir. A competência não ó cousa que se possa pôr de parte, modificar ou alterar à vontade de quem quer que seja.

Precisamos respeitá-la, é da -ordem pública, está consignada na lei.

Entendo que o Sr. Ministro da Justiça poderia ter apresentado, senão nesta proposta numa outra, uma alteração à constituição actual do júri e aí incluiria advogados, médicos, contabilistas, guarda-li-vros, notários, engenheiros, etc., pois nessas classes encontraria, como em outras, indivíduos probos e honestos.

Mas S. Ex.a quis antes estabelecer a perturbação na administração da justiça com o -júri criado nesta proposta, pela deslocação a que se obriga os juizes.

Disse eu na sessão em que apreciei a proposta que não criaria entra vês à mesma.

Eu sei, Sr. Presidente, que quando a proposta veio para esta Câmara e foi requerida a sua discussão se poderia considerar aprovada. jDe que serviria apresentar a esta proposta qualquer proposta de emenda? Fazendo-o, terá de voltar à Secção e aí, com um simulacro de discussão, seria essa emenda rejeitada, o votada a proposta tal como o Sr. Ministro da Justiça o entendesse.

A maioria dispõe dos votos e não precisa de que as minorias a auxiliem.

Uma voz : —Não apoiado.

O Orador: — Todavia, e para'terminar, continuo a entender que o Governo faria melhor vindo mais desassombradamente dizer ao Parlamento, que esta proposta só respeita ao julgamento da burla do Banco Angola e Metrópole.

Necessário se torna punir crimes desta natureza. E preciso que quem se mostre culpado responda e sofra as penas da lei, e se o Governo não tinha realmente no decreto de 1914 a verdadeira defesa da sociedade, então bem andou em trazer ao Parlamento uma proposta de lei anulando-o.

É necessário que essa tremendíssima burla, a do Angola e Metrópole, seja considerada como sendo "o motivo determinante de o Governo apresentar esta proposta excepcional.

Tenho dito.

O Sr. Henrique Brás: — Sr. Presidente: na discussão da proposta que estamos analisando têm sido apresentados argumentos, pró e contra, muito interessantes, mas ainda não vi produzir certas razões, quanto a mim dignas de atenção, que a tornam dificilmente exequível.

óQue teve inicialmente em vista esta proposta?

O que se pretendia, essencialmente, era dar ao País as mais seguras garantias de que essa monstruosa burla do Banco Angola e Metrópole fosse julgada com aquela imparcialidade e rectidão, e também com aquela justa severidade que tam tenebroso ataque ao crédito e bom nome nacional imperativamente exigia.

Esta era a característica essencial dessa proposta e a esse respeito estávamos todos inteiramente de acordo.

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Diário das Sessões do Senado

com essa proposta tinha os aplausos de todos os lados do Senado, porque todos nós pretendíamos que se fizesse justiça pronta e certeira, e o que todos lamentávamos era que as investigações sobre esse caso se tivessem protelado e se continuem protelando tanto, porque, se por um lado as diligências complicadas e morosas, a que se tem procedido, dão garantia de acerto na decisão, e a demora importa também serenidade no veridictum, por outro lado, e isso é grave, o efeito social da penalidade, quando a decisão não é rápida, dilui-se, esvai-se, piilver:za~se e não dá à consciência nacional, justiflcadamente alvoroçada com esse crime, aquela tranquilidade que seria necessária.

"Vi aqui acusar essa proposla, como vindo a constituir mais uma lei de excepção da República.

Pois eu critico a proposta, porque ela não vem com desassombro, às claras, estabelecer unicamente uma lei de excepção.

O crime que se procura "punir foi de uma gravidade tamanha, e fez extravazar por cima dos poderes do Estado uma tam infecta onda de suspeições, salpicando de lama instituições que precisamos ver rodeadas de prestígio, incorruptíveis ria ele-.vada função que são chamadas a desempenhar, que o Estado tem não só-o direito, tem o dever de punir esse crime excepcional com excepcional penalidade. , Apoiados.

Em vez disso, a proposta inicial apresentada na Câmara dos Deputados e trazida aqui com as emendas daquela casa do Parlamento, não é mais do que uma .tímida e eclótica lei de compromisso, em que se procura salvaguardar princípios, como ? — sufismando-os,.

Apoiados.

Procurou-se evitar a criação de uma lei de excepção, mas afinal a proposta, em parte, é uma lei de excepção.

Deve-se a preocupação de não ir.de encontro à Constituição, e afina), em parte, a proposta é manifestamente anti-constitu-cional.

Antes da Eepública, os crimes de fa-Íj:!co, passagem e falsificação de moeda e notas de banco eram julgados na comarca competente, por um tribunal colectivo de três juizes.

Com a Kèpública, esses crimes passa-

ram a ser julgados pelo júri criminal comum, mas verificou-se que o júri era, em regra, benévolo e complacente com os agentes dos crimes chamados de moeda falsa, e então veio o decreto n.° 1:116, de 30 de Novembro de 1914, que fez julgar esses crimes em processo correccio-nal, nos quais se aplicava uma penalidade relativamente ligeira.

O júri criminal comum é uma instituição organizada por modo a, pelo menos em teoria, representar a sociedade.

Não se compreende um júri constituído apenas por uma classe social.

O júri criminal comum 'é constituído dentro dos homens bons de todas as classes.

Sió assim é que o júri pode dar garantias de equidade e de justiça nas suas decisões.

Um júri constituído, por exemplo, apenas por burgueses capitalistas, que tenham do direito de propriedade a noção de que é um direito sagrado e intangível, que não pode sofrer limitações, que não pode ser condicionado pelas modernas concepções sociais, esse júri será naturalmente muito mais severo e rigoroso da decisão de um crime de furto do que um júri constituído exclusivamente por proletários, sem eira nem beira.

A proposta que está em discussão tinha de adoptar necessariamente um critério para a escolha dos julgadores dos crimes que se verificassem no caso do Angola e Metrópole.

O br. Ministro da Justiça, por escrúpulos de isenção, que apenas são de louvar, escolheu um júri constituído'por magistrados judiciais.

^ Como'.não se podia voltar aos tribunais colectivos, porque era contra a Constituição, como não convinha voltar ao júri criminal comum, porque a prática tinha demonstrado que era ineficaz, de que se lembrou o Sr. Ministro da Justiça? Lembrou-se de um compromisso, e aceitou uma solução que compartilha ao mesmo tempo de tribunal colectivo e tribunal comum: é um júri de magistrados judiciais.

Eu sou dos que entendem que a escolha do Si*. Ministro da Justiça foi acertada lembrando-se da magistratura judicial.

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tiessão de 2'1 de Abril de 1926

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da Justiça, testemunhou mais uma vez que tem inteira e plena confiança nas altas qualidades de isenção, no saber e no zelo da magistratura judicial que com efeito se tem manifestado incorruptível, quando em redor dela parece que tudo se esboroa na venalidade, quando a corrupção alastra por toda a parte.

Fez S. Ex.a muito bem, porque com efeito o País pode confiar inteiramente na magistratura judicial. Mas, estender esta luxuosa organização de júri a todos os crimes de moeda falsa, desorganizar a vida normal de 36 comarcas para o julgamento de qualquer crime vulgar de passagem de moeda falsa que se averigue em qualquer recanto do País, compelir e sujeitar trinta e seis magistrados de uma vez, aos transtornos e despesas que ocasiona a sua vinda a Lisboa, e a sua estadia na capital, ó que se me afigura digno de crítica, e até de certo modo inútil, e na prática dificilmente exequível. Pois se todos nós reconhecemos que a magistratura judicial vive numa situação de mediania, que £ qaási uma honrada pobreza, se todos nós reponhecemos que a magistratura judicial tem proventos extremamente exíguos, o que constitui até uma vergonha para o Estado, se todos nós ré" conhecemos que no em tanto ela continua dignificando-se e mantendo em alto aprumo a função elevada que é destinada a desempenhar, £ como vamos recompensar a magistratura judicial desta/sua mediania e desta sua honestidade? ,;É trazendo-lhe um novo encargo, e encargo formidável, e que resultará para muitos magistrados num desequilíbrio terrível para os seus exíguos orçamentos?

Eu não vejo que exista na proposta qualquer disposição que possa ressarcir os magistrados, que tiverem de ser jurados, das despesas que o exercício desse novo encargo lhes acarretará.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): — V. Ex.a dá-me licença? Justamente numa das emendas que tenciono enviar para a Mesa essa hipótese está prevista.

O Orador: —Vejo assim que tive a sorte de fazer uma observação que também S. Ex.a já tinha previsto EO seu alto es-pírito.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(Catanho de Meneses): — Eu é que tive a sorte de ver que S. Ex.a pensava como eu.

O Orador: — E o contrário. Nem podia deixar de ser.

Em minha opinião, a proposta do Sr. Ministro da Justiça estava excelente e bem merecia o nosso inteiro aplauso se estabelecesse esta nova modalidade do júri apenas para o caso do Angola e Metrópole, e aplicando-se aos crimes vulgares de moeda falsa aquelas disposições legais que os manda julgar pelo júri criminal comum, até que, pela revisão da Constituição, se pudesse regressar, se tanto fosse necessário, à organização anterior do tribunal colectivo.

É neste sentido que eu, na discussão de especialidade, tomarei a liberdade de enviar uma proposta de emenda para a Mesa.

Tenho dito.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

'(Catanho de Meneses): — Sr. Presidente: da última vez que falei acerca da proposta de lei em discussão tinham-me ficado a soar nos ouvidos as palavras do Sr. Querubim Guimarães, quando S. Ex.a dizia, num trocadilho de palavras sempre elegantes, que o Ministro da Justiça devia fazer justiça e que não podia ficar de bem com a sua consciência se justiça não fosse feita.

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Diário das Sessões do Senado

natureza das suas funções, pelo feitio do seu espírito, o mais hábil para julgar questões de facto.

Ora precisamente por es§as razões é que eu digo que, pela sua instrução, pela responsabilidade que lhe pesa na administração da justiça, ó o mais competente para julgar da questão de facto.

Pois então um magistrado que na polícia confeccionai, embora 'se traio de uni crimo de pequeno vulto em geral, mas que pode ser grando pura um homem de bem, e S. Ex.1" o Sr. Alfredo Portugal acentuou bem esta nota frisanto, que eu já sabia, embora S. Ex.a saiba muito melhor do qae eu, que há processos de policia cprreccional o processos correccioriais vulgarmente chamados do galão branco.

Nos processos de polícia correccional segundo decreto de 22 de Março de 1890, o juiz julga de direito o de facto, pois não há recurso, tem liberdade ampla do julgar o ninguém o pode impedir do julgar até pela sua consciência.

Não se pense, nem se diga que a interpelação da prova testemunhal não exige uma preparação especialíssima para julgar o o;ue a testemunha disse, de quo se ocupa no seu depoimento, o que ela quis traduzir.

S. Es.a muitas vezes certamente interveio em processos de polícia corrcccional, e creio bem, quo o Sr. Alfredo Portug.nl, com a sua alta envergadura, nunca deixou que a sua consciência ficasse triturada dianto do depoimento das testemunhas interpretando de forma diferente o que a testemunha queria dizer.

Sobro as modernas teorias de direito a que já aqui me referi, todos sabem quo uma das cousas quo o processo austríaco nos' veio trazer foi o de movimentar o juiz, não o tornando íani passivo.

Mas, se isto assim é, como se pode dizer que o juiz não é pessoa competente para apreciar a prova?

Então S.Ex.a, se um dia estiver ao seu alcance, fará aprovar qualquer medida acabando com a justiça correccional porque o juiz não pode julgar com provas.

Disse-se mais a esto respeito, e nesse ponto insisto eu, que o júri devia ser escolhido entre todas as classes populares, como o era até aqui.

O júri, diz*se, é a representação da Vontade popular. Essa instituição, extre-

mamente democrática, nasceu em Roma, mas infelizmente, para aqueles que estudam e conhecem o assunto, e eu cito, por exemplo, Tomazini e outros, como se pode ver na Revista de Direito Comparada .Italiana, todos esses pugnam hoje pelo princípio de que o júri deve ser constituído por uma especialidade de técnicos, que tenham conhecimento do assunto que lhes vai ser submetido-

A experiência dó júri, deve dizer-se, é extremamente penosa. E assim,! quando eu tinha diante de niirn, o problema árduo do Angola e Metrópole, quando eu via que era necessário castigar, que era indispensável não deixar impune um crime que não ficava unicamente de portas a dentro de Portugal, mas que tinha a sua retumbância lá fora, porque o que se atentava era oontra a integridade nacional, de modo nenhum se podia estabelecer uma lei que não tivesse aqueles princípios necessários à justa punição de quem havia assim atentado tam malèvo-lamente contra a integridade nacional.

Diz-se—e disse-o aqui o Sr. Henrique Brás — a quem eu, permita-me V. Ex.;l, Sr. Presidente, e permita-me o Senado — endereço os meus cumprimentos de respeito e de admiração, porque S. Ex.a, pela maneira como versou este assunto, imparcial, preciso, dizendo o que queria, com a consciência do que queria, sem sofismas, usando emfim desta arma leal que dá gosto em combater com S. Ex.a e até apetece ser 'seu adversário, mas disse o Sr. Henrique Brás que era pena que a lei não fosse toda de excepção. E eu digo: não me fica mágua nenhuma na minha consciência de ter procedido do modo como o fiz. E não fica porque, recorrer às .leis de excepção, só, quando não seja possível recorrer às leis usuais.

Lei de excepção não é esta. Lei de excepção, para mim, é a que se afasta dos princípios que servem de garantia ao^ acusado. Ela representa -outras regras que lhe tiram aquela garantia que todos devem ter para se deiendor.

^E por ventura subtraem-se algumas garantias neste caso? De modo nenhum.

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Sessão de Ê7 de Abril de Í92Ô

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cão, e S. Ex.a fez essa afirmação fundado no n.° 21 do artigo 3.° da Constituição que todos conhecemos.

(fEm que é que esse artigo foi infringido?

<íPor de='de' a='a' os='os' constituição='constituição' termos='termos' maneira='maneira' nenhuma.='nenhuma.' do='do' quando='quando' p='p' se='se' júri='júri' processo='processo' modifica='modifica' acaso='acaso' alteram-se='alteram-se'>

Os termos do processo continuam absolutamente os mesmos, a competência do júri é inteiramente a mesma.

Não vejo, portanto, em que se houvesse infringido o disposto no n.° 21 do artigo 3.° da Constituição. Por mais que procure, com inteira franqueza o digo, nflo encontro motivo para tais reparos.

Se não me arrecea-se de enfadar a Câmara ler-lhe-ia o que diz uma grande autoridade no assunto, o Sr. Dr. Mar-nouco e Sousa, comentador deste artigo.

o

O Sr. Querubim Guimarães: — S. Ex.a em todo o capítulo desse comentador, encontra argumentos que são de opinião contrária a essa.

O Orador: — ^Quem é a autoridade competente no julgamento? E o júri. ;E o que é que a Constituição , diz ? É que o processo seja estudado pela autoridade competente.

O Sr. Querubim Guimarães: — S. Ex.a é escravo da palavra, não é escravo da Constituição e tanto assim que aos jurados que têm de resolver o caso do -Angola e Metrópole chama-lhe júri. E uma questão de palavras.

O Orador: — Se S. Ex.a ler a minha proposta, verá que ela fala em jurados e em júri. Os jurados são os que são recenseados para a constituição do júri e o júri é composto dos que hão-de julgar. Não se trata, pois, de uma lei de excepção.

Resta saber qual foi o meu procedimento ao escolher os juíze? de direito, para a constituição do júri. Mas afinal o Sr. Henrique Brás deu-me toda a razão— e não era preciso que S. Ex.a ma desse, para que eu estivesse j>ersuadid o disso.

Não sou partidário, como o Sr. Alfredo Portugal, de que o júri pode ser constituído por quaisquer pessoas.

O Sr. Alfredo Portugal: -Perdão, eu não devo iconsentir que a afirmação de S. Ex.a passe em julgado. Eu disse que, além dos juizes de direito, frá outros cidadãos probos, dignos e honestos.

O Orador: — jFelizmente não tenho a memória absolutamente perdida, louvado Deus!

Lembro-me que quando o outro dia S. Ex.a falou, seguindo, mais ou menos, ò critério do Sr. Querubim Guimarães, S. Ex.a disse que um magistrado, acostumado à função de julgar em face do Direito, não era aquele que mais se adaptava ao conhecimento da prova.

O Sr. Alfredo Portugal:—Bem. Isso já é diferente.

O Orador: —S. Ex.a o que disse foi isto, o que acabo de citar, mais palavra, menos palavra. Mas se S. Ex.a diz que é diferente, responda-me a esta pregunta:

O Sr. Alfredo Portugal: — Julgo, mas não são só esses magistrados. E bom que isso fique registado.

O Orador: — Era bom que isso tivesse ficado outro dia registado.

Mas, visto que o ilustre Senador contesta, então digo de outra maneira: daquele lado da Câmara, um Sr. Senador, que é magistrado, acabou de reconhecer que um magistrado judicial, ou juiz tem competência para conhecer do facto, unicamente o júri não deve ser só composto por juizes, mas também por outros cidadãos ...

O Sr. Alfredo Portugal:—Faça S. Ex.a o amálgama que quiser.

O Orador: — Perdão! Amálgama, não! Eu fiz sempre justiça à magistratura judicial.

O Sr. Alfredo Portugal:— Diga S. Ex.a o que quiser;

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Diário das Sessões ao Senado

O Sr. Alfredo Portugal :—Oh! Sr. Presidente ! Parece-mo que o Sr. Mialstro desconfia das minhas palavras. Ora isso é que não pode ser.

O Orador: —O Sr. Alfredo Portugal pronunciou estas palavras textuais: «diga V. Ex.'1 o que quiser». Com certeza que S. Ex.a não nega ter preferido estas palavras.

Mas eu vou nesta discussão pôr as cousas no pé om que elas se acham.

Não estou arrependido de ter estabelecido na minha proposta que o júri fosse constituído por magistrados judiciais.

A classe dos magistrados é aquela que, no meio do todas as outras, nos dá hoje as melhores garantias de imparcialidade e de justiça. Hei-de pugnar por esta proposta até ao fim, e estou convencido de que o Senado, vendo qual é o intuito que a ela presidiu, não deixará de a aprovar, pois que outra qualquer solução não seria a melhor nesta ocasião. Quando não, era caso para dizer que todos desejam que os criminosos sejam punidos, todos desejam que se faça justiça, mas quando se trata de aprovar os preceitos necessários para que isto se efective, nós encontramos 'dificuldades de toda a ordem.

Não creio que tenha de pedir isto a esta Câmara, porque o Senado, pela maneira elevada como tom procedido, há-de consubstanciar-se nesta idea: é que em assunto de tam alta importância não temos de olhar a cores políticas, mas simplesmente à honra nacional.

O Sr. Henrique Brás (intervindo):—Desejo salientar que aprovo inteiramente a proposta do Sr. Ministro da Justiça, até com esse júri especial para julgar o caso do Angola e Metrópole. Só entendo que não seria necessária tam luxuosa organização para julgamento dos crimes chamados de moeda falsa.

O Orador: — Entre as propostas de emenda que aqui tenho há uma que corresponde perfeitamente ao que S. Ex.a deseja;

E, portanto, a respeito dos crimes de fabrico e passagem de notas falsas, que não estejam ligados com o caso do Angola e Metrópole, conservo a legislação anterior» Quefe dizer, não vem o júri. Mas,

para crimes maiores, é preciso que ele exista. E porquê?

Porque a prática tem demonstrado que assim é absolutamente necessário.

Nós tivemos primeiro o júri comum até 30 de Novembro de 1914. Tivemos depois o regime de '1914, e a seguir pelo decreto n.0 2:511, durante o estado de guerra, um júri militar, mas a verdade é que nenhum desses júris deu garantias.

O Sr. Henrique Brás: — Ao tribunal colectivo, quando se alterar a Constitui-

0 Orador: — O tribunal colectivo é inconstitucional. Mas S. Ex.a vê bem quê eu n&o posso garantir, nem posso estar à espera que se faça qualquer alteração na Constituição. Quando ela se fizer, será ,então ocasião de se modificar a Constituição nesse sentido.

Foi aprovada a proposta na generalidade.

Entrou em 'discussão na especialidade, sendo lido na Mesa o artigo 1.°

O Sr. Querubim Guimarães: — Sr. Presidente: poucas palavras. direi acerca deste assunto, mas como ali se declara a inconstitucionalidade de um decreto, o n.° 1:116, de 30 de Novembro de 1914, têm cabimento as ligeiras considerações que poderia ter feito se usasse da palavra, pela segunda vez, quando da discussão na generalidade.

- Aproveito por isso a ocasião para dizer que afirmei, afirmo e afirmarei que, declarando-se a inconstitucionalidade do aludido decreto de 1914 eu também o considero inconstitucional, em virtude do n.° 2L° do artigo 3.° da Constituição, a que o Sr. Ministro da Justiça se referiu, e todos conhecem.

Citou o Sr. Ministro da Justiça, em abono daqueles que entendem que este diploma ó inconstitucional, a doutrina expendida pelo Sr. Dr. Marnoco e Sousa, que foi ilustre professor da Universidade de Coimbra e corneníador da nossa Constituição.

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Sessão de 21 de Abril de 1926

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Sousa e, caso curioso, notei que S. Ex.a defende uma doutrina contrária àquela que tem o Sr. Dr. Lopes Praça, que foi um distintíssimo advogado e mais tarde um dos mais ilustres ornamentos da Universidade de Coimbra.

E a mini me quere parecer que a boa e pura doutrina de direito constitucional ó sem dúvida a daquele distintíssimo lente de direito. Ora é de harmonia com esta doutrina que, tanto na Constituição da Monarquia, como na Constituição da República, só determinou que ninguém pode ser sentenciado, a não ser pela autoridade competente, por virtude da lei anterior e na forma por ela prescrita.

i Kto ó claro e muito claro!

Vamos agora à doutrina do falecido Dr. Marnoco e Sousa, à qual se referiu o Sr. Ministro da Justiça.

Disse o Sr. Dr. Marnoco e Sousa que, em matéria de competência, entendia que nSo era do aceitar a doutrina do Sr. Dr. Lopes Praça, mas defendia absolutamente a doutrina do que não pode. de maneira nenhuma, em matéria substantiva, legis-lar-sc de novo, com efeito retroactivo, a não ser quando, por efeito do artigo 6.° do Código Penal, essa retroactividade vá beneficiar o delinquente. E osta doutrina da retroactividade, perante os apologistas da pureza da retroactividade da lei, é muito~ contestada.

Mas onde o Sr. Marnoco e Sousa não vai de maneira alguma do encontro à doutrina do Sr Lopes Praça é em matéria de direito substantivo.

E agora pregnnto:

Alterou-se, porque se vai restituir ao Código Penal a autoridade que lhe tinha sido atribuída por esta proposta.

Pelo Código Penal a. pena aplicada aos fabricantes e passadores de moeda falsa era uma pena de prisão maior celular de 8 anos, seguida de 12 no degredo. E a segunda pena na escala penal. .

Pelo decreto que V. Ex.as agora querem fazer revogar essa-pena deixa de ser maior celular, mas apenas correccio-nal, sendo aplicada pelo juiz de direito e não por um júri.

Alterou-se pois, sem dúvida alguma, em, matéria de direito substantivo, a lei.

E claro que os Criminosos,, que neste

capítulo do Código Penal tivessem de ser submetidos às sanções das respectivas leis, tinham, de harmonia com este decreto, de responder pelos seus actos perante um juiz de direito, e sofreriam a pena de prisão correccional, sendo postos, depois, à disposição do~ Governo. Pelo regime que se pretende agora estabelecer, volta-se ao regime do Código Penal, tendo, portanto, a pena de ser aplicada por um júri, como diz o Sr. Ministro da-Justiça.

Alterou-se, poisj mais uma vez o digo, a lei anterior.

Isto apenas serve para explicar que o Sr. Ministro da Justiça se viu em dificuldades, visto que não pode deixar de se achar em situação difícil, sendo um. jurisconsulto o um profissional do foro, para sustentar a constitucionalidade deste diploma.

Não pode, em boa doutrina, sustentar-se semelhante hipótese.

Vamos considerar irrito e nulo esse decreto, quando a proposta com .a qual nós vamos anular esse decreto é em sua essência inconstitucional.

Apoiados.

É o mesmo sistema incoerente, contra-ditório, que só tem seguido em toda a obra legislativa da República. „ Aparte do Sr. Ministro da Justiça, que se não percebeu.

O Orador: — Quando S. Ex.a quiser, e entender, e nisso dá-me muita honra, estou pronto a sujeitar-me a uma sabatina acerca da nossa legislação de 1910. e estou convencido que os nobres ideais de S. Ex.a se sentirão em má situação, querendo defender esse sistema rígido de boas normas e de coerência de princípios.

Isto é a verdade". Não estou aqui a fazer política, creia-me S. Ex.a Pretendo unicamente dizer a verdade.

Mas? Sr. Presidente, há nesta proposta umas palavras que não sei para que vieram para aqui.

^ Como ó que se vai declarar irrito e nulo, por inconstitucional, o decreto n.° 1:116 desde a sua publicação?

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Diário das Sessões ao Senaâf?

fazer aqui a afirmação que ele é inconstitucional e como tal considerá-lo desde a sua publicação'?

£ Que lucra a sociedade com esta expressão «(desde a sua publicação»; que necessidade há em pôr aqui estas palavras ?

Sr. Presidente: em virtude de eu considerar desnecessária a conservação destas palavras, a não ser que o Sr. Ministro da Justiça consiga convencer-ne de que há nisto uma conveniência prática, não concordo com essas palavras e mando para a Mesa uma proposta de eliminação.

Igualmente mando para a Mesa uma proposta de eliminação ao § único deste artigo, porque da forma como está não o entendo, e devo até dizer que este § único com certeza não é da autoria do Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses) (interrompendo]:— Devo dizer a S. Ex.a que este parágrafo foi da minha autoria e a redacção foi apresentada pelo Sr. Pinto Barriga, tendo nós estudado o assunto devidamente.

O Orador: — Julgavao que o Sr. Ministro da Justiça estivesse perante os meus olhos, e perante o Senado-numa situação um pouco melhor.

Não o felicito pelo esclarecimento que acaba de dar, porque, diga-se a verdade, isto, o que aqui está, seja quem for o autor, permita-se-me o termo, não tem pés nem cabeça.

Pois o que diz o parágrafo?

£ Então legislamos para o futuro ou para o passado ?

j Então nós vamos reclamar direitos sobre uma cousa que já passo a?

Esta disposição não tem valor e não honra, o seu autor, seja ele quem. for, digo-o som desprimor e digo-o apenas como des&Dafo de jurisconsulto.

Sr. Presidente: espero que o Sr. Ministro da Justiça, coin o seu esclarecidis-símo critério, • consiga convencer-rne de que tal disposição é precisa, assim como são precisas as palavras «desde a sua publicação», que se encontram no corpo

do artigo.

Parece-me que a proposta, tal corno foi apresentada pelo Sr. Ministro da Justiça e tive ocasião de ver no relatório qnn a

precede e que vem junta a esta proposta vinda c.a Câmara dos Deputados, era uma proposta mais própria da autoria do Sr. Ministro da Justiça do que a que nos foi remetida pela Câmara dos Deputados. Mando para a Mesa as duas propostas de eliminação:

Proponho a eliminação das palavras

Proponho a eliminação do § único dos artigo 1.°—Querubim Guimarães.

Lidas na Mesa, são admitidas.

O Sr. Ministro da Justiça e'dos Cultos

(Catanho de Meneses): — Sr. Presidente: perante as arguições feitas pelo Sr. Querubim Guimarães, tenho de tomar um pouco mais de tempo ao Senado para explicar o motivo por que o projecto está redigido e do modo. como foi apresentado nesta casa do Parlamento.

S. Ex.a disse que este artigo 1.° é inconstitucional por motivo de ir aplicar uma lei que não estava em vigor ao tempo em que os delitos foram praticados, e acrescentou que isto era filho da necessidade que havia de encontrar um meio de não ser aplicada uma pena ínfima àqueles que cometeram a grande burla do Banco Angola e Metrópole.

Afirmou S. Ex.a que a proposta de lei em discussão é inconstitucional, donde resulta que a doutrina do Sr. Querubim Guimarães não poderá ser outra senão a de que se tem de aplicar aos criminosos desse Banco o decreto de 30 de Novembro de 1914, que vigorava ao tempo em que os crimes foram praticados.

Chega-se a esta conclusão e é por isso que eu disse há pouco que, apesar de todos estarem de acordo em que, para um crime de semelhante vulto, era necessária uma punição rigorosa, quando se chegava ao termo de encontrar uma lei que não fosse tam benévola como a do decreto de 30 de Novembro de 1914, aparecia então o argumento da inconsti-tucionalidade.

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Sessão de 27 de Abril de 1926

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aos criminosos do Banco Angola e Metrópole.

^ Tinha o Poder Executivo as faculdades necessárias para expedir o decreto de 30 de Novembro?

No caso afirmativo bem está porque, nesse caso, o decreto tem de ser respeitado; mas, desde que se declare que foi expedido sem autorização legal, é como se não existisse.

. Não pode, portanto, ser aplicada a lei anterior.

Não sou eu o primeiro que apresento esta doutrina ao Parlamento. Na outra Câmara, o Sr. Almeida Ribeiro, juiz do' Supremo Tribunal de Justiça, que é um dos melhores ornamentos daquele • tribunal, apresentou uma proposta para que se decidisse se o decreto de 30 de Novembro de 1914 era, ou não constitucional.

. Marnoco e Sousa, numa carta que íoi publicada e que todos conhecem dirigida ao Sr.'Di'. Sousa Monteiro, sustenta que esse decreto é inconstitucional. A Relação de Lisboa decidiu já também pela incons-titucionalidade do decreto e vários jurisconsultos, como, por exemplo o Sr. Dr. Pedro de Castro, delegado do Procurador da República junto da Relação do Porto, sustentam a mesma opinião.

A excrescência de palavras a que se referiu o Sr. Querubim Guimarães fez-se para acentuar e nâ^o ficar dúvidas de que a nulidade vem desde a publicação.

Concordo com S. Ex.a em que se ele fosse nulo era como se não^existisse, mas' essas palavras servem somente para acentuar que essa nulidade ó desde a sua publicação. Evidentemente nem se pode compreender que um decreto fosse inconstitucional desde a sua origem e que não fosse nulo desde a sua publicação, porque, sendo nesse caso o Governo o mandatário, tudo o que ele fizesse além dos poderes conferidos, era nulo.

Disse S. Ex.a também a respeito deste § único, que lhe mereceu as maiores censuras. Pondera que as sentenças ríão produzam todos os seus efeitos.

Mas S. Ex.a, o Sr. Querubim Guimarães, sabe muito bem que as próprias sentenças passadas em julgado podem ser anuladas por meio de uma a'cção segundo o artigo 148.° do Código de Processo Civil, quando se alcance um documento

novo em -virtude do qual se mostre que não devem ser cumpridas. Ora se efectivamente existisse este artigo 1.° e não viesse o § único dizendo que essa sentença produziria os seus efeitos, podia ser intentada uma acção de anulação juntando um documento novo ao processo.

Se esse decreto tinha sido inconstitucional tudo o que se tinha feito até aí era absolutamente nulo porque se baseava nuin diploma que nunca teve existência legal.

Não me arrependo de ter apresentado à comissão esta redacção. Redigi eu próprio este parágrafo e dei-o ao Sr. relator. Aí tem S. Ex.a a razão da responsabilidade que me pertencia e que nunca sei enjeitar em parte nenhuma.

Disse S. Ex.a que quando eu quiser está pronto a ter uma sabatina comigo a respeito do procedimento da República nos seus actos de incoerência.

S. Ex.a verbera asperamente o facto de a República ter apresentado uma lei retroactiva. Mas eu também sei que o § 10.° do artigo 145.° da carta constitucional exarava precisamente a mesma doutrina da nossa Constituição No emtanto .a monarquia rasgou essa disposição; considerou-a como se fosse um, trapo sem nenhum valor.

Assim tivemos o decreto que já outro dia citei, de 31 de Janeiro de 1908, de triste memória para a nossa legislação, que não duvidou em coartar absolutamente toda a defesa aos acusados. Bastava que houvesse o despacho de pronúncia para logo haver a deportação.

E dizia o mesmo decreto : «Esta disposição aplica-se a factos passados antes dele ser publicado». .

Não só estabelecia defesa contraditória como fez a República. Os indivíduos eram deportados s6 porque estavam pronunciados, sem lhe dar possibilidade de se defenderem.

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Diário das Sessões do Senado

Não sou só eu que assim o penso, mas também os Srs. Drs. Caeiro da Mata, Barbosa de Magalhães e muitos outros jurisconsultos distintos.

Estou em boa, companhia. Não temo que me faça ataques sob este ponto de vista, disposto estou a entrar neles.

E veja V. Ex.a no tempo da monarquia até o Eegimento da Câmara permitia que os parlamentares fossem expulsos da sala quando, porventura se excedessem nas suas acusações o hoje, tanto nesta casa como na outra, do Parlamento, pode o parlamentar dizer o que quiser e nunca é expulso.

Insultam e deprimem a República e todavia podem passar avante.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Querubim Guimarães : — Sr. Presidente: o Sr. Ministro da Justiça tem o raro condão, quando responde às nossas considerações, de nos obrigar a falar.

S. Ex.a que aqui disse que toda a gente reclama a publicação de um diploma que sirva para julgar no caso do Banco Angola e Metrópole devia-nos ter poupado em dar-lhe resposta,; mas S. Ex.a, que vê sempre nos outros atributos de combatividade política e ó queni faz mais política, obriga-me a tomar tempo à Câmara a fim de que não sejam desvirtuadas as nossas intenções e amanhã a imprensa venha dizer que a mino ria monárquica está a fazer obstrucionismo à proposta do Sr. Ministro da Justiça e quere que venham para a rua os criminosos, aqueles mesmos que andavam, antigamente, de braço dado nas ante-cáma-ras com os Ministros e altos funcionários da República.

O Sr; Silvestre Falcão (em aparte]: — E com criaturas- cotadas no partido de S. Ex.a Ponhamos as cousas no seu devido lugar.

O Orador: — O que se não pode admitir ó que se desvirtuem as intenções daqueles que procuram concorrer para que um diploma saia daqui o mais perfeito possível.

Aqui não está ninguém a desejar que não sejam punidos os criminosos do Angola e Metrópoles

Se porventura nós fôssemos poder, sem dúvida nenhuma que num caso destes iríamos para a frente porque tínhamos a coragem, da nossa responsabilidade e diríamos nesse momento: não há constituição possível neste caso.

Mas faríamos isso francamente, sem sofismas. Lançar ao Parlamento um trapo que é absolutamente inconstitucional isso é que não Sr. Ministro da Justiça!

Tenha S. Ex.a a coragem de afirmar e dizer que investiu com a própria Constituição :; está ao meu lado e eu estarei ao lado de'S. Ex.a

Sofismas ó que de modo nenhum!

Para que não se desvirtuem as nossas atitudes e as nossas palavras é que há necessidade de ripostar ao Sr. Ministro da Justiça porque senão, poupava-me a este incómodo.

£ O Sr. Ministro da Justiça quero mais umas palavras de resposta?

Dir lhas hei.

E verdade que houve uma lei no tempo da monarquia que determinava a deportação para as colónias, após o despacho de pronúncia, de certos e determinados indivíduos; mas o que nunca se fez no tempo da monarquia foi mandar para as colónias sem o mais leve despacho de pronúncia, indivíduos sem que as suas responsabilidades tivessem sido explicadas por qualquer modo perante os tribunais.

Há uina grande diferença:—no tempo da monarquia tinham a pronúncia, agora condenam-os antes da sentença; há esta diferença que é bein grande!

Mas se o Sr. Ministro da Justiça quere mais eu digo mais.

A célebre e odiada lei de 13 de Fevereiro, a que já me referi noutra ocasião, lei odiosa que fez revolucionar os espíritos incultos através das palavras dos idealistas dos comícios, essa lei de 13 de Fevereiro e a lei de 1902 davam ao juiz da instrução criminal uma jurisdição excepcional, mas não continha disposições tam latas como as que foram dadas aos investigadores do Banco Angola e Metrópole, nem sequer se podem comparar de longe.

Mas se S. Ex.a quere mais eu respondo-lhe mais.

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Sessão de ê? de Abril de Í92&

tempo não sentia revoltas contra o regime monárquico — mas aqueles que se sacrificaram pelo ideal republicano, numa época em que era perigoso ser republicano, andavam nesse tempo pregando a necessidade de derruir o regime, o que ó que pretenderam?

Nem mais, nem menos do que garantir maiores liberdades para os cidadãos, exigir que a intangibilida.de do estatuto fundamental fôs^Se um axioma que não merecesse dúvida alguma em espírito algum. £ Então a monarquia foi derrubada unicamente para assaltarem o Poder as clientelas dos republicanos, ou foi para se estabelecer um sistema que diziam estar sendo adulterado pela monarquia?

£ Como é que respondem hoje a essa propaganda?

<_ p='p' carta='carta' a='a' rasgou-se='rasgou-se' constitucional='constitucional' monarquia='monarquia' da='da' _='_'>

Rasgou-se, sim, ninguém o oculta, toda a gente o sabe.

Para se regressar à mesma situação anterior. A vida dos portugueses, a liberdade dos cidadãos portugueses, as suas garantias, tudo isso é, nem mais, nem menos do que a razão fundamental do toda a doutrina política constitucional.

A crítica é fácil, mas perante os factos; não há pessoa nenhuma que possa afirmar o contrário do que eu digo: — entre a República e a monarquia não há comparação possível.

E pena que o Sr. Ministro da Justiça não se apresentasse mais cedo, antes da hora redentora do 5 de Outubro a investir com ess?, multidão de indignidades que foi a monarquia, a contribuir com a sua inteligência e a «ua acção como político para derrubar a monarquia e sujeitando-se a todos os precalços, a todas as contrariedades e intranquilidades a oue se sujeitaram aqueles sinceros e verdadeiros propagandistas do ideal republicano, a quem eu embora eles sejam adversários, presto à minha maior homenagem e o meu máximo respeito-

Isto é assini e tem de ser assim eternamente. Nem mesmo as situações psico-

lógicas das comunidades, como as dos in* divíduos, se sucedem por acaso, por sortilégio de ideias, sem uma verdadeira e extraordinária sinceridade de homenagens.

A crise que atravessamos — diz-se — ó de inteligências, é de capacidades. Não! A crise é de carácter, é uma crise morar; estão os bons sentimentos, as virtudes da nossa Raça e do nosso povo absolutamente em cheque; essa é que é a verdadeira, a grande crise, a pior das crises.

Já vê o Sr. Ministro da Justiça que quando queira dar nos a honra de unia conversa tem sempre-quem lhe possa responder.

O Sr. Ministro da Justiça diz que ó absolutamente preciso estar aqui este parágrafo único do artigo 1.°

Quero dizer, vamos decretar que mesmo para aqueles casos julgados, com sentenças passadas em julgado, podem os prejudicados requerer que sejam anuladas as sentenças.

Em primeiro lugar, o Sr. Ministro da Justiça, como advogado distinto que é, sabe muito bem que não se pode argumentar em matéria penal com casos de analogia.

Em segundo lugar, o Sr. Cutanho de Meneses sabe muito bem que nesie caso não se pode aplicar o artigo 148.° do Có = digo de Processo Civil.

Há um Código de Processo Civil para a jurisdição civil, subsidiário para a legislação penal em certos e determinados casos omissos, e há a Novíssima Reforma Judiciária para a matéria penal.

O Sr. Ministro sabe muito bem que a Constituição permite a revisão de procesos crimes. À face desse princípio constitucional, que apresenta uma garantia para todos os cidadãos, qualquer delinquente, embora julgado, podo requerer a revisão do processo.

Quem diz ao Sr. Ministro da Justiça que qualquer pessoa interessada numa solução diversa daquela que pretendemos não venha invocar o parecer do Poder Legislativo, considerando esse decreto inconstitucional e assim requeira a revisão do seu processo?

A revisão, porém, referia-se a uma questão 'de mecânica de provas.

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Otário das Sessões do Senado

depois desta nossa decisão, como se pode obstar a qu6) pelo menos, os tribunais sejam incomodados com esses processos de revisão?

Além de que, desde que nós substraís-semos do texto do artigo aquelas palavras «desde a sua publicação», nenhuma dificuldade havia em ficar esse parágrafo.

Se nós partimos do princípio de quf» o decreto era inconstitucional, ninguém pode legitimamente invocar essa disposição, para conseguir de qualquer modo anular unia sentença que lhe dissesse respeito.

Não, não vinha.

Agora, nós mesmo, expontaneamente, com o texto deste artigo 1.°, vamos assim favorecer essa interpretação.

Suprimindo essas palavras não há necessidade do parágrafo.

Espero fazer mais algumas considerações em outros artigos e tenho o máximo desejo de limitar essas considerações ao mínimo período de tempo, com a declaração de que ao Sr. Ministro da Justiça, ou a qualquer meu ilustre e presado colega, se porventura entendem que eu estou com a atitude que tomo fazendo qualquer espécie de obstrucionismo, pedirei a generosidade de me ouvirem em tréplica, respondendo a essas considerações da mesma maneira como respondi à causa que r,s criou.

C) que desejo é varrer a minha testada, como legislador e homem de foro, fazendo votos para que acabe de uma vez para sempre em Portugal este sistema de rectificações a leis e decretos publicados no Diário do Governo.

Dizia um velho mestre, já falecido, que se porventura se fosse examinar a complexa e profusa legislação da República ficaríamos com a impressão de que tinha sido feita por cavadores e não por jurisconsultos.

É isto o que eu não desejo, por consideração para com o Poder Legislativo, por consideração para com o meu País, por consideração para com todos os legisladores e por consideração para comigo próprio.

O orador não reviu.

O Sr. Hiaistro da Justiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): — Sr. Presidente: eu não podia, nem devia ficar silencioso ante as. palavras que foram proferidas,

decerto devido ao calor extremo da discussão, pelo Sr. Querubim Guimarães.

Diz S. Ex.a que repele completamente a audácia daqueles, que se tinham expressado naturalmente como eu quando tive a honra de responder a S. Ex.a

Não ouvi, os meus ouvidos não puderam alcançar, em ,que consistia essa audácia. <_ de='de' no='no' alguma='alguma' lugar='lugar' expressão='expressão' ex.a='ex.a' pessoalmente='pessoalmente' dirigido='dirigido' consistia='consistia' respeitosa='respeitosa' calor='calor' para='para' menos='menos' resposta='resposta' s.='s.' _='_' ter='ter' a='a' seu='seu' senador='senador' ou='ou' em='em' o='o' p='p' eu='eu' minha='minha' da='da'>

S. Ex.a não mo disse, nem podia, na verdade, exemplificar para mostrar ao Senado que eu tiuha sido menos correcto para com S. Ex.a

Esta casa do Parlamento conhece-me há, muito tempo e sabe que eu faço, tanto quanto é possível, por guardar aquela correcção que é devida ao lugar que ocupo, e a que eu devo à minha própria pessoa.

Diz-me a consciência que eu não merecia de modo algum as censuras que me fez o Sr. Querubim Guimarães Censuras de tal ordem, censuras várias, que não se concretizaram, porque era necessário que S. Ex.a, quando assim me acusava acremente neste lugar, S. Ex.a, com a hombridade de homem de bem, que o é, dissesse que eu o ofendi nesta, ou naquela frase.

Nem uma frase eu proferi que o pudesse ferir; não é esse nunca o meu sistema. Sei o que devo a esta casa do Parlamento e tenho a consciência tranquila; não proferi uma única expressão que pudesse melindrar S. Ex.a ou qualquer outro Senador.

E então permita-me S. Ex.a que diga que foi injusto, e estou convencido de que, saído desta discussão, serenamente, a sua consciência lhe dirá que S. Ex.a não foi de maneira nenhuma justo para comigo.

S. Ex.a sabe a justiça que eu aqui lhe tenho prestado, ao seu carácter, à sua inteligência, à sua maneira de discutir, embora o faça acaloradamente às vezes.

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de È7 de Abril de 1926

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podia eu conservar-me absolutamente fraco e inerte perante S. Ex.a, a não ser que eu me tivesse alheado completamente deste regime.

S. Ex.a, com aquela habilidade que" o caracteriza, disse que eu não havia feito uma propaganda contra a monarquia nos tempos mais agitados.

Deixe-me S. Ex.a dizer-lhe o seguinte: a monarquia, a República nunca se fecharam para aqueles que nesses regimes quiseram entrar.

Já aqui acentuei, Sr. Presidente, um facto da minha vida particular, que não era obrigado a manifestar. Mas visto que o ilustre Senador trouxe à tela da discussão um semelhante facto, não devo deixar de dizer que desde 1907 estava absolutamente desviado de qualquer partido político.

Sendo assim, <_ que='que' de='de' prestado='prestado' lugar='lugar' ex.a='ex.a' increpa='increpa' grandes='grandes' por='por' um='um' me='me' s.='s.' tem='tem' república='república' _='_' a='a' país='país' senador='senador' regime='regime' ilustre='ilustre' aqui='aqui' ao='ao' serviços='serviços' o='o' p='p' estar='estar' deste='deste' ministro='ministro' porque='porque' defender='defender' agora='agora'>

A monarquia não caiu pelos ataques qne lhe fizeram, nem pela revolução de 5 de Outubro; a monarquia caiu porque estava a esboroar-se e a Rotunda não foi o primeiro golpe...

O Sr. Fernando de Sousa '(em aparte):— Caiu com as traições.

O Orador: — A monarquia caiu pela podridão, e o. povo português não aceita o regime que os Srs. Senadores monárquicos defendem. Pode haver dissensões entre os republicanos, mas a monarquia sabe bem que—lá está Monsanto a atestá-lo — quando é preciso que os republicanos se unam eles aparecem à carga cerrada.

O que, porém, não aconteceu com a monarquia foi cair-lhe o grande cataclismo que se chamou «a Grande Guerra», cataclismo que não foi filho da República, mas que, mercê das circunstâncias, desarranjou as nossas finanças, como desarranjou as doutros países; a nós, todavia mais, porque o nosso País, sendo de pequenos recursos, não pôde refazer-se rapidamente.

O Sr. Querubim Guimarães sabe que o sangue português caído na Flandres...

O Sr. Fernando de Sousa (em aparte):— E melhor não falar nisso.

O Orador: — Tenho o direito de responder a quem a mim se dirigiu.—E melhor falar, porque devo responder ao Sr. Querubim Guimarães e -citar os factos.

O Sr. Fernando de Sousa: — Tristes

factos esses. •

O Orador: — Tristes factos são os que V. Ex.as, .daí desse lado, apontam.

- Repito : a monarquia não caiu pela revolução, mas pela podridão!

O Sr. Querubim Guimarães (em aparte): — A Grande Guerra tem as costas tam largas.

O Orador: — Tem costas tam largas, tem.

Ouça S. Ex.a como eu o ouvi. Quere mais ?

Pense S. Ex.a nm pouco no que eu lhe disse e pode vendar os seus olhos para não os abrir à verdade.

S. Ex.a, que é uma pessoa de inteligência clara, nesta argumentação, reconhecendo decerto a sua superioridade, superioridade que reconheço, disse que estava pronto a sujeitar-se a uma sabatina. E quando lhe pedi para que S. Ex.a me-demonstrasse o motivo por que o artigo que'apresentei era contra a Constituição, S. Ex.a não deduziu um único argumento!

S. Ex.a não me respondeu.

Se S. Ex.a me demonstrasse que o Poder Executivo não tinha a competência necessária para julgar da inconstituciona-lidade duma lei, quere dizer, decidindo no caso presente se o Poder Executivo tinha então direito delegado pelo Parlamento de promulgar aquele diploma, se S. Ex.a me fizesse essa demonstração, podia então dizer com o seu ar de graça : — Ganhei a sabatina.

Mas S. Ex.a foi mudo a semelhante respeito.

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Diário 'das Sessões ao Senado

inconstitucionalidade se devia contar desde a sua publicação.

Serão, talvez, no rigor do direito, escusadas. Mas é bom que elas fiquem bem acentuadas para se reconhecer que esse decreto é inconstitucional desde a sua origem, e por consequência ele é como se não existisse.

Outra afirmação ÍQY. S. Ex.a, e estou certo cie que neste momento se há-do estar rindo, não para fora, o que muito me agrada, porque o riso não é um argumento que incomode, mas dizendo para consigo: j Como eu tive a habilidade de mostrar que o artigo 148.° do Código do Processo Civil não tinha aplicação em matéria penal! j Como eu tive a habilidade de mostrar que o que cabia aqui neste caso era um processo de revisão e não de anulação!

Basta ser um jurisconsulto mediano, não precisa ascender a grandes alturas, para se ver que o artigo 148.° bem como toda a legislação civil é sempre subsequente da legislação penal.

<_:Quando p='p' a='a' se='se' processo='processo' revisão='revisão' do='do' dá='dá'>

Dá-se essa revisão quando o réu apresenta provas para demonstrar que aquelas em que se firmou a sentença não eram verdadeiras.

HOUVTO erro judiciário, portanto, que é necessário emendar.

Neste caso, pois, ó que se faz a revisão.

Mas., Sr. Presidente, outra cousa muito diversa é pedir a anulação dum processo.

Pede-se a anulação do processo, porque se tem um documento novo para mostrar que, sendo esse decreto inconstitucional, tudo aquilo que se processou era inconstitucional desde a sua origem.

O Sr. Querubim Guimarães (interrompendo) : — j Não serve então para nada a Novíssima Beforma Judiciária!...

O Orador : — Serve, e lastimo até não ter presente o próprio comentário à Novíssima Eeforma do Dr. José Dias Ferreira.

O artigo 148.°, asseguro a S. Ex.% é aplicável às sentenças crimes. Não se discute com factos, discute-se com a lei.

Lastimo •—isto sem ofensa para S. Ex.a— que o Sr. Querubim Guimarães, sendo um espírito tam atilado, não entre

nesta discussão com aquela luz e soma de conhecimentos que possui, pondo de parte a tendência e paixão política que costuma pôr nas questões que aqui se debatem, deixando multas vezes em branco aquilo que lhe deveria merecer especial atenção.

Fique cada um de nós no seu papel: S. Ex.a contrariando a proposta por inconstitucional, quando eu estou convencido de que ela é constitucional, e contrariando-a ainda quando sem ela seria mínima a pena a aplicar a muitos dos grandes burlões do Angola e Metrópole; e eu defendendo-a e defendendo a República dos ataques que tam acrimoniosa-mente lhe dirige.

Eu, com todo o respeito por S. Ex.a, convencido que cumpro o meu dever, certo de que não o magoei de modo algum, faço votos para que os mais estejam tam bem com a sua consciência como eu estou.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. B. Tomás de Vilhena: —Sr. Presidente : não há dúvida que a discussão tem sido perfeitamente interessante. Uma luta acesa entre dois jurisconsultos, cada um no seu campo brandindo com verdadeiro vigor as suas armas.

Como V. Ex.as sabem eu não estou habilitado a meter-me nessas argúcias de foro e, por consequência, tenho apenas a minha impressão de profano.

Mas a minha impressão de profano, Sr. Presidente,- é que tudo isto que consta deste artigo é anti-constitucional, é contrário à Constituição. A Constituição é clara e insofismável quando diz que ninguém pode ser julgado senão pela lei anterior, pelo processo nela bem expresso e determinado.

Isto que aqui se nos tem apresentado é o contrário do que está na Constituição.

Apoiados.

Ora agora, eu sou franco ,e claro; S. Ex.a pode dizer-me: ^mas então para um crime duma gravidade tam extraordinária, tam estrondosa como o do Angola e Metrópole podemos ir aplicar as disposições que estão em vigor salus populi suprema lex est?

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Sessão de 27 de Abril'de 1926

e com franqueza nos dissesse: «meus Senhores, nós temos de fazer alguma cousa superior ao que está feito».

S. Ex.a não fez isso e tem-se mantido em discussão com o meu colega não tendo chegado a conclusão alguma.

Agora há um outro ponto.

S. Ex.a tem sempre aqui o costume, quando nós lhe fazemos acusações ao ré' gime, de falar nos erros da monarquia.

Eu já aqui contei uma vez a história do menino Alberto e do menino Alberti-no e não estou para a contar todos os dias, mas ela aqui é bem cabida.

O menino Alberto era chamado ao mestre e não sabia a sua lição. Apanhava uma palmatoada. Mas o menino Alberti-no quando o chamavam também não a gabia.

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos

(interrompendo): — E S. Ex.a agora é o Alberto. Risos.

O Orador: — O mestre então dava-lhe duas palmatoadas porque o menino tinha visto que o mano tinha apanhado uma e não estudava.

O que eu quero dizer ó que a República foi feita para dar ao País um regime mais útil, mais agradável; era preciso ter aprendido muitas virtudes da monarquia e não lhe copiar os erros que lhe prepararam a queda.

Ora isso é que era preciso fazer.

Creio, Sr. Ministro da Justiça, que S. Ex.a pondo 'a sua mão na consciência, comparando o que se tem passado nestes quinze anos de República com o que se passou mesmo nos últimos anos da-monarquia, lá no seu íntimo tem saudade da monarquia.

Mais nada.

O orador não reviu.

Postas à votação as propostas de eliminação do Sr. Querubim Guimarães, são rejeitadas.

Em seguida é aprovado o artigo 1.°

Entra em discussão o artigo 2.°

O Sr. Alfredo Portugal: —O artigo 2.° refere-se a todos e quaisquer crimes de fabrico e passagem de moeda falsa e ainda àqueles que porventura se venham a

apurar nas investigações a que se tenha procedido, respeitante à burla do Angola e Metrópole.

Sr. Presidente: dizia eu, há pouco, que achava mais natural que o Governo, por intermédio do Sr. Ministro da Justiça, tivesse vindo, com a coragem precisa, apre- • sentar esta proposta de lei só para o caso da burla do Angola e Metrópole. Foi isto, sem dúvida, o que o Governo quis fazer, conquanto na proposta esteja unia cousa diferente.

Não faz sentido que qualquer crime de passagem duma simples cédula de $20 falsa, praticado na comarca da Ilha das Flores, que é a mais distante do arquipélago dos Açores, tenha de ser julgado na comarca de Lisboa e tenham para esse julgamento de ser chamados, como jurados, 36 juízos de direito.

Ainda hoje, no Diário de Noticias, vem relatado um caso de passagem de cédula* ou de notas falsas, passado em qualquer canto da província.

Tem esse crime de ser julgado, segundo esta proposta, na comarca de Lisboa^

Entendo que seria preferível que o Go« vêrno apresentasse as cousas como real» mente são.

Nesse sentido envio para a Mesa uma proposta eliminando as primeiras palavras e deixando ficar a parte que se refere propriamente ao Angola e Metrópole e, por consequência, se esta proposta for aprovada, será eliminado o § único, eliminação que vou justificar em duas palavras.

Todos sabem que a b ária do Angola e Metrópole se passou em Lisboa. Por conseguinte o julgamento desse crime compete aos tribunais de Lisboa. Assim desnecessário se torna o § único.

Envio para a Mesa a proposta a que acabo de me referir.

Proposta

Proponho que no artigo 2.° da proposta em discussão se eliminem as palavras «no julgamento dos acusados pelos crimes de fabrico, passagem e falsificação de moedas e notas de Bancos nacionais, bem como», e, como consequência, a eliminação também do § único. — Alfredo Portugal.

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Diário das Sessões do Senado

O Orador:—Muito bem, Sr. Presidente. Concordo em que a minha proposta seja considerada de eliminação.

É admitida a proposta.

. O Sr. Henrique Brás: — Sr. Presidente: de harmonia com as considerações que há pouco proferi, tinha também redigida uma proposta de eliminação daquelas mesmas palavras do artigo 2.° que constam da proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Alfredo Portugal.

Quero aproveitar o ensejo para declarar, e creio que o posso fazer em nome do Partido Nacionalista, que embora nós consideremos que a proposta em discussão é, em parte, anti-constitucional, e é também, em parte, lei de excepção, lhe damos o nosso voto, para que se estabeleça uma forma de julgamento rápido e eficaz da burla do Angola e Metrópole. .Fique isto bem assente, pois é esse o sentir do Partido Nacionalista. Apenas a nossa divergência a respeito da proposta do Sr. Ministro da Justiça incide no facto de S. Es.a pretender alargar essa nova .organização do júri a toda esta espécie de crimes de moeda falsa, quaisquer que eles sejam. Nós julgamos que a esses crimes, que eu designarei por crimes vulgares de moeda falsa, podia ser aplicaàa a lei aaterior; sendo os criminosos julgados pelo júri criminal comum até que pela revisão dei Constituição se pudesse voltar ao sistema do tribunal colectivo, se assim fosse julgado conveniente.

O Sr. Querubim Guimarães:—Sr. Presidente: concordando com esta maLeira .de pensar dos Sr, Senadores, entendo que deve haver, no emtanto, uma distinção entre crimes grandes de fabrico de moeda falsa e os de qualquer outro menos importante, porque se não compreende que se esteja a incomodar trinta e seis juizes para vir de diversos sítios para os-julgamentos.

Não se compreende esta jurisdição excepcional a não ser para casos excepcionais como este.

O meu ataque, não é de modo nenhum ao sistema de excepção que seja preciso impor neste caso, mas ataque à forma sofística da lei, como se nós não tivéssemos vivido há bastante tempo à margem da Constituição.

Não concordo com este sistema de legislar.

Mando para a Mesa uma proposta de substituição ao § único do artigo 2.°

Proposta de substituição

Proponho a substituição do § único do artigo 2.1> pelo seguinte:

§ único. Os crimes cuja existência seja averiguada nas investigações a que se referem os citados decretos n.os 11:339 e 11:381 serão julgados na comarca de Lisboa, no distrito criminal que o mesmo Con~ selho indicar, para o qual transitará o processo, concluídas as investigações.— Que-rubim Guimarães.

Lida na Mesa, é admitida.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:: — As propostas de eliminação apresentadas ao artigo 2.° têm de ir à Secção, visto que esta proposta de substituição colide com aquelas.

O Sr. Ministro daljJustiça e dos Cultos (Catanho de Meneses): — Sr. Presidente: pedi-a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de substituição ao artigo 2.° e que comporta uns poucos de artigos. _

Proposta de substituição

Proponho que o artigo novo seja subs-tuído pelos artigos novos seguintes :

Artigo novo. No julgamento dos acusados pelos crimes de fabrico, passagem e falsificação de moedas e notas de bancos nacionais, em que o júri tenha de intervir, bem como no julgamento dos acusados pelos crimes cuja existência seja averiguada nas investigações a que se referem os decretos n.os 11:339 e 11:381, de 10' de Dezembro de 1925 e 11 de Janeiro de 1926, em que intervirá sempre o júri, será a respectiva pauta organizada pelo Conselho Superior Judiciário e composta de trinta e seis jurados, todos juizes de direito de l.a instância do continente, incluindo os que estiverem em comissão de serviço.

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Artigo novo. Os acusados pelos crimes mencionados no artigo anterior serão julgados na comarca de Lisboa, no distrito criminal que o mesmo Conselho indicar.

§ 1.° Transitado em julgado\> despacho de pronúncia, o delegado do Procurador da República assim ò comunicará, no prazo de três dias, ao Conselho Superior Judiciário, a fim de que este organize a pauta dos jurados, na conformidade do artigo anterior.

§ 2.° As suspeições opostas aos jurados serão restritas aos casos dos artigos 292.° e 293.° do Código do Processo Civil.

§ 3.° A nenhum juiz incluído na-pauta a que este artigo se refere é permitido alegar escusa sem motivo justificado, que apenas poderá consistir em doença que o impossibilite por completo de exercer as funções de jurado, atestada por dois médicos, facto este que, não obstan-te, pode ser mandado verificar superiormente.

Artigo novo. Nenhum dos acusados poderá indicar mais de vinte testemunhas para a instrução contraditória, não lhe sendo, em todo o caso, permitido indicar maior número do que aquele que a seu respeito tiver deposto no corpo de delito.

Artigo novo. O juiz presidente do distrito criminal em que se tenha de efectuar a audiência de discussão e julgamento, desde que designe dia para este, assim o comunicará a cada um dos jurados, em ofício registado, que valerá para todos os efeitos como intimação judicial, a fim de que compareçam nessa audiência.

Artigo novo. Na audiência de discussão e julgamento, feito o sorteio do júri, tomarão os jurados assento, conforme a sua antiguidade, prestando o seu compromisso de honra, servindo de presidente o mais antigo.

§ único. A falta do jurado a esta audiência só poderá considerar-se justificada nos termos prescritos no § 3.° do artigo (segundo artigo novo).

Artigo novo. A audiência de discussão e julgamento não poderá ser adiada senão por falta de testemunhas, a requerimento da acusação ou da defesa, na conformidade do parágrafo seguinte.

§ único. Tanto a acusação como a de-íesa não têm direito a requerer mais de uma vez este adiamento.

Artigo novo. A pedido do respectivo representante do Ministério Público po-

derá o Conselho Superior Judiciário indicar um ou dois delegados de Procurador da República que auxiliem aquele magistrado em todas as diligências e serviços relativos às audiências de julgamentos a' que esta lei se refere.

Artigo novo. O escrivão do segundo ofício do 1.° distrito criminal de Lisboa que tem servido nas investigações a que se refere o primeiro artigo novo continuará a ser o escrivão do processo até definitivo julgamento, em l.a instância, dos crimes a que se refere a segunda parte do mesmo artigo. — O Ministro da Justiça, Catanlwde Meneses.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Fernando de Sousa: — Sr. Presidente: fui procurado há pouco por uma comissão de habitantes de Alcanena — visto não estar presente o meu ilustre colega D. Luís de Castro — que me vieram transmitir as suas reclamações a propósito do facto muitíssimo grave que se deu ontem em Alcanena e que os jornais noticiam,

O administrador do concelho, porque um indivíduo se recusou a vender-lhe um fato pelo preço que ele ofereceu, prendeu-o e deu-lhe um tiro dentro da administração, pelo que o ferido teve de ser transportado para Lisboa em gravíssimo estado. j Essa autoridade dizem que se encontra a passear livremente em Santarém, para onde foi levada pela guarda republicana, que a livrou de ser linchada pelo povo.

Esse administrador, chamado Matafome, é useiro e vezeiro em violências, pois ainda há pouco prendeu o pároco quando ia num enterro, com o pretexto de que levava hábitos talares.

; Como se isso não fosse permitido depois de modificada a Lei da Separação!

O povo quis assaltar a administração do concelho e os estabelecimentos fecharam as suas portas em sinal de protesto contra o criminoso procedimento do administrador.

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Viário das Sessões do Senado

O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (CatanLo de Meneses):—Sr. Presidente: é para responder ao Sr. Fernando de Sousa que transmitirei as suas considerações ao Sr. Presidente do Ministério, e tenho a certeza de que S. Ex.a não há-de consentir que fique impune um crime desta natureza,

O Sr. Fernando de Sousa:—Muito obrigado a S. Ex.a

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã com a mesma ordem do dia excepto o projecto n.° 79, que foi hoje discutido.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

O BEPACTOR— Álbano dçt Cunha.

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