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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO: DO SENAD

SESSÃO 2sT,°

EM 2G DE MAIO DE 1926

Presidência do Ex,mo Sr, António Xavier Correia Barreto

Secretários os Ex,mo8 Srs,

j António da Costa Godinho do Amaral ' Joaquim Correia do Almeida Leitão

Sumário. — Procedendo-se à chamada e verificando-se a presença de 35 Srs. Senadores, o Sr. Presidente declara aberta a sessão. Lê-se a acta. que foi aprovada, e dá se conta do expediente.

O Sr. Presidente convoca o Congresso para reunir em sessão conjunta.

Antes da ordem do dia. — O Sr. Medeiros Franco faz largas considerações acerca da questão dos tabacos.

C Sr. Pereira Gil requere, e a Câmara aprova, a generalização do debate. Sobre o assunto falam os Srs. Augusto Monteiro, apresentando uma moção que foi admitida, Júlio Dantas, D. Tomás de Vilhena, Vasco Marques, Caldeira Queiroz, Roberto Baptista, Herculano Galhardo, Afonso de Lemos, Ferraz Chaves e o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva), tendo o Sr. Presidente feito declarações acerca da admissão da moção do Sr. Augusto Monteiro. Foi aprovada, tendo o Sr. Herculano Galhardo requerido votação nominal.

Seguidamente o Sr. Presidente encerra a sessão.

• Abertura da sessão às l õ horas e 20 minutos.

Presentes à chamada 28 Srs. Senadores.

Entraram durante a sessão 25 Srs. Senadores.

Faltaram à sessão 11 Srs. Senadores.

Srs. Senadores presentes a chamada:

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Álvaro António de Bulhão Pato. Álvaro César de Mendonça.

António Alves de Oliveira Júnior. António da Costa Godinho do Amaral. António Maria da Silva Barreto. António de Medeiros Franco. António Xavier Correia Barreto. Artur Augusto da Costa. Artur Octávio do Eêgo Chagas. Augusto Casimiro Alves Monteiro. Duarte Clodomir Patten de Sá Viana. Francisco Vicente Ramos. Henrique José Caldeira Queiroz. Herculano Jorge Galhardo. João António de Azevedo Ccwtinho Fragoso de Siqueira. João Augusto de Freitas. João Catanho de Meneses. Joaquim Correia de Almeida Leitão. Joaquim Pereira Gil de Matos. José António da Costa Júnior. José Joaquim Fernandes de Almeida. José Machado Serpa. Júlio Dantas.

Pedro Virgolino Ferraz Chaves. Querubim da Rocha Vale Guimarães. Roberto da Cunha Baptista. Vasco Gonçalves Marques.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Alfredo Narciso Marcai Martins Portugal.

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Diário das Sessões do Senado

Ernesto Maria Vieira da Eocha. Francisco António de Paula. Francisco «José Pereira. Francisco de Sales Eamos da Costa. Frederico António Ferreira dê Sim as. Henrique Ferreira de Oliveira Brás. João Carlos da Costa. Joaquim Manuel dos Santos Garcia. José Mendes dos Reis. José Xepomuceno Fernandes Brás. José Varela.

Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Luís Augusto Simões de Almeida. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Manuel Gaspar de Lemos. Miguel do Espírito Santo Machado. Rodrigo Guerra Alvares Cabral. Silvestre Falcão.

Tomás de Almeida Manuel de Vilhe-na (D.).

- Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

António Martins Ferreira..

António dos Santos Graça.

Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.

Ernesto Júlio Navarro. ' Francisco' Xavier Anacleto da Silva.

João Manuel PessanhaVaz das Neves.

João Maria da Cunha Barbosa.

João Trigo Motinho. '" Joaquini Crisóstomo da Silveira Júnior.

Joaquim Teixeira da Silva.

José Augusto Ribeiro de Melo.

José Fernando de Sousa.

José Joaquim Fernandes Pontes.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Luís Filipe de Castro (D.). ''Nicolau Mesquita.

Raimundo Enes Meira.

Vítor Hugo de Azevedo Cootinho,

O Sr. Presidente (às.lô horas e 20 mi' nutos): —Vai proceder-se à chamada. r» Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente (às 16 horas e 25 minutos}:— Estão presentes 28 Srs. Senadores.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

Leu-se.

O Sr. Presidente: — Está em discussão a acta. Pausa.

O Sr. Presidente: — Como nenhum Sr. Senador pede á palavra, considera-se aprovada.

Vai ler-se o

Ofícios

Do Ministério da Instrução Pública, enviando os documentos pedidos na sessão de 9 de Abril próximo passado pelo Sr. Júlio Augusto Ribeiro da Silva.

Para. a Secretaria, a Jim de dar conhecimento ao interessado.

Do Comité Olímpico Português, agradecendo o voto de louvor aprovado na última sessão do grupo parlamentar de educação física e desportos.

Para a Secretaria.

Da comissão dos padrões da Grande Guerra, convidando o Senado a assistir à sessão comemorativa do 30.° dia do falecimento do glorioso chefe militar e distinto colonial general José Augusto Alves Roçadas, na Câmara Municipal de Lisboa.

Para a Secretaria.

Da Câmara dos Deputados,'enviando a proposta de lei n.° 169, sobre a cadeia comarca de Chaves.

Para a 2.a Secção.

Da Câmara dos Deputados, comunicando que foram ali rejeitadas as alterações introduzidas pelo Senado à proposta de lei n.° 19, sobre oficiais generais.

Para a Secretaria.

Representações

Da Associação de Classe dos Vendedores de Produtos Agrícolas e Hortícolas, reclamando contra o imposto de transacção.

Para a Secretaria.

Da Associação dos Engenheiros Civis do Norte de Portugal, pedindo a regulamentação do uso do título de engenheiro.

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Requerimentos

Kequeiro que ao projecto de lei n.° 456, aprovado pelo Senado em sessão legislativa de 1922-1924, se aplique o disposto no artigo 32.° da Constituição Política da Kepublica. — José Joaquim Fernandes de Almeida. • Para a Secretaria.

Dos cidadãos Cipriano Augusto Mendonça, Manuel dos Santos, António Martins, José Júlio Palma e Joaquim Mendes Alves, pedindo para serem reconhecidos revolucionários civis, ao abrigo da lei n.° 1:158.

Para a comissão de petições.

Pareceres

Da comissão de faltas, justificando as dos Srs. António dos Santos Graça, Tomás de Almeida Manuel de Vilhena, José Nepomuceno Fernandes Brás, Nicolau Mesquita e José Machado de Serpa.

Aprovados.

O Sr. Presidente: — Convoco o Congresso para reunir em sessão conjunta na sexta-feira, pelas 17 horas e 30 minutos, a fim de serem apreciadas as emendas do Senado ao projecto de lei referente à liquidação dos bens do Banco Angola e Metrópole.

Antes da ordem do dia

O Sr. Medeiros Franco: — Sr. Presidente: começo por, mais uma vez, prestar a V. Ex.a a minha melhor e mais sentida homenagem pela forma, pelo cunho de ponderação e de justiça que V. Ex.a tem posto sempre na direcção dos trabalhos desta casa, revelando-se em tudo e por tudo um modelo de democracia, rés peitando a todos, e as opiniões de todos nós, venham elas, embora da direita, do centro ou da esquerda.

Par.a as declarações que vou fazer não podia deixar, não me permitia a minha consciência, de não começar por dirigir a V. Ex.a o rendido preito' da minha homenagem.

Sr. Presidente: vai conturbada a vida nacional. O problema dos tabacos, um dos maiores senão o maior dos problemas da vida actual apaixonou, aqueceu a opi-. nião pública, e, através da imprensa, da maior parte da imprensa do País, e atra-

vés dos comícios e da propaganda a consciência nacional despertou na convicção de que, pela adopção da régie a Nação suportará um dos actos mais nefastos da administração pública.

Não apoiados.

E pelo procedimento daqueles que pretendem a todo o transe significar as justas aspirações dos que defendem a liberdade, desmoronaram-se as últimas, as vívidas e acalentadas esperanças dos que punham efectivamente na questão dos tabacos, como que o motivo, o paradigma da ressurreição nacional e do revigora-mento das finanças públicas.

Sr. Presidente: o problema dos tabacos, disse eu, aqueceu, apaixonou a opinião pública. E teve, nem podia deixar de ter, o seu naturalíssimo reflexo na Câmara dos Deputados, onde foi apresentada uma proposta de lei no sentido de resolver esse gravíssimo, esse altíssimo problema da vida pública nacional.

Chegou todavia o dia 30 de Abril sem que o Parlamento tivesse tomado uma deliberação acerca do regime da administração dos tabacos. Em qualquer país do mundo onde a sensibilidade política dos governos fosse de facto elemento de conta, só essa circunstância, tratando se como se trata de um dos mais altos problemas da vida moderna, seria mais do que suficiente para levar o Governo dapr'esi-dência do Sr. António Maria da Silva a abandonar as'cadeiras do Poder.

O actual Governo longe de seguir essa naturalíssima conduta, que muito lisonjearia o seu amor próprio, no dia 30 de Abril, por uma nota oficiosa do Conselho de Ministros, deliberou entrar no regime da régie, usurpando assim,— note V. Ex.a e note a Câmara — apenas com uma nota oficiosa, as nobres funções e prerrogativas do Congresso Legislativo.

Sr. Presidente: não é afirmação arrojada dizer-se que foi apenas uma nota oficiosa o instrumento de que se serviu o Governo para levar ao conhecimento do País que havia resolvido entrar em aberto regime de ditadura pela adopção da régie. que o Governo sabia estar sendo interpretada pela opinião pública como elemento pernicioso da sua administração.

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xe um célebre despacho-lei, cousa absolutamente inédita em matéria de Governo, pelo qual assume e usurpa as funções do Parlamento e passa a fazer a administração de bens nacionais sem lei que a tanto o autorize, infringindo a Constituição que nos termos do n.°-23,° do artigo 26."termina atem ente diz :

o Compete privativamente ao Congresso da República regular a administração dos bens nacionais e decretar a alienação dos bens nacionais».

Mas dizia eu: no dia 19 de Maio, apenas pela imprensa havia conhecimento de que o Governo entrara no caminho da ditadura, que nem era aquela que a própria Constituição autoriza, por isso que a Constituição nos termos do n.° 16.° do artigo 26.° "e dos §§ 1.°, 2.° e 3.° desse n.° lô.° autoriza actos de ditadura. São actos de ditadura constitucionais, m&s ao mesmo tempo prescreve a obrigação por parte do Governo que os comete de, no prazo de 30 dias, convocar o Parlamento e dar-lhe conta dos seus actos administrativos.

No dia 19 de Maio é que o Governo entendeu vir com o^ célebre despacho-lei, dizendo entre outras cousas que o abastecimento do mercado do consumo devia fazer-se imediatamente, a seguir à posse do Estado pelos processos habituais.

Isto não é outra cousa senão invadir a esfera do Poder Legislativo, estabelecendo por uni despacho um regime que só ao Parlamento competia.

Ora, no seu n.° 9.° desse célebre despacho, diz o Sr. Ministro das Finanças estabelece uma disposição absoluta, centraria ao n.° 23.° do artigo 26.° da Constituição.

Mas não se contenta o Governo em publicar um despacho para o estabelecimento de administração pública, pois no dia seguinte publicou uma portaria que tem ainda a agravante de ser um instrumento que nos termos dos tratadistas é considerado como emanação do chefe c o Estado para as autoridades suas subordinadas. É assim que dizem todos os tratadistas de direito quando definem o que é uma portaria : são ordens do chefe do Estado transmitidas e assinadas pelo respectivo ministro às autoridades subordinadas, e têm

muitas vezes por fim satisfazer interesses não garantidos nas leis.

Sr. Presidente: dizia eu que o Governo abandonou o campo dos despachos de lei e encaminhou-se para as portarias, que não pociiam deixar de ser, como há pouco disse, emanações do chefe do Estado e assinadas pelo respectivo ministro, às autoridades subordinadas, mas para estabelecer lei.

Mas as leis, segundo a Constituição, devem executar-se pelas normas votadas pelas duas casas^do Parlamento, ou ainda por decretos. Esses decretos podem ser de vária espécie; há os decretos legislativos, os chamados delegados que contêm disposições substantivas quando o Parlamento autoriza o Governo a praticar vá-'rios actos.

Há decretos ditatoriais que a própria Constituição admite, como sejam os que constam dos §§ 2.° e 3.° do n.° 16.° do artigo 26.° da Constituição, ou seja todo o decre:;o publicado pelo Poder Executivo ao abrigo do n.° 9.°

Chamam-se ditatoriais porque a Constituição assim os designa, mas tais decretos não constituem crime ministerial, visto que a própria Constituição diz em que termos devem ser publicados.

Há depois os decretos de natureza regulamentar, são os que não criam direitos e apenas se limitam a fazer a regulamentação dos votados pelo Parlamento.

Há também os simples decretos de expediente, e há as portarias quo são diplomas emanados do Poder Executivo tendentes a facilitar a administração, mas nenhuma delas tendente, a suprir ar, deficiências que de momento aparecem.

E a portaria publicada pelo Governo com a assinatura do Sr. Ministro das Finanças insere cousas que estão em absoluta contradição, sobretudo no seun.°l.°, com o que impõe o n.° 22.° do artigo 26.° da Constituição Política da República Portuguesa.

Não podia o Governo legislar sobre assuntos desta natureza, mantendo em vigor disposições contidas no decreto de 11 de Junho de 1907. Quando o Parlamento deseja que se mantenha determinada disposição legal tem forma de o fazer, mas não por meio de portarias.

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despacho do Sr. Ministro das Finanças é absolutamente significativa da forma como o Governo da presidência do Sr. António Maria da Silva, esquecendo o que devia ao Parlamento da Kepública, saltou por cima desse Parlamento entrando em franca, completa, e porque não dizê-lo, em destrambelhada ditadura.

Não apoiados da esquerda.

Não pretendia eu trazer para esta Câmara um assunto desta ordem.

O Sr. Artur Costa (interrompendo): — Não pretendia, nem desejava; faço essa justiça a S. Ex.a

O Orador : — Tem razão; nem desejava trazer esse assunto ao Senado da Kepública que, na tranquilidade fecunda que tem apresentado, procurou sempre trabalhar serenamente pelo engrandecimento da Pátria, pelo engrandecimento do País. O Senado da República não tinha necessidade de vir pela boca das suas oposições fazer neste dia declarações terminantes e concretas acerca do problema actual, e acima de tudo acerca do conflito que se gerou na Câmara dos Deputados, não entre os próprios Deputados, não um conflito de natureza interna, mas sim um conflito entre a oposição da Câmara dos Deputados e o Governo, única e simplesmente entre as oposições e o Governo. Não pelo facto da régie, não pelo facto da liberdade condicionada ou da liberdade absoluta, mas sim pelo simples facto de o Governo no dia 30 de Abril, não estando habilitado a regular a administração de deter--minados bens nacionais, nos termos da Constituição, e com o Parlamento aborto o ter feito, quando devia aguardar que o Parlamento se pronunciasse, visto que o Poder Executivo não pode ter a pretensão de que é mais patriota, de que à mais amigo da Nação e de que deve zelar mais cuidadosamente os interesses nacionais do que o próprio Parlamento.

O Sr. Artur Costa (interrompendo): — (jComo se explica então a atitude de uma parte do Parlamento antes de 30 de Abril?

O Orador: — O Parlamento deveria pró-nunciar-so até o dia 30 de Abril sobre O regime dos tabacos,

O Sr. Artur Costa (interrompendo): — Quem tem a culpa?

O Orador : — O Parlamento não pôde, ou. não quis pronunciar-se. <_ de='de' pronunciar-se='pronunciar-se' a='a' obrigação='obrigação' ramo='ramo' governo='governo' administração='administração' do='do' quando='quando' o='o' p='p' determinado='determinado' sobre='sobre' parlamento='parlamento' qual='qual' quere='quere' não='não' pública='pública'>

Trocam-se apartes.

O Orador: — Unia só cousa restava ao Poder Executivo: é que não tendo podido arrancar ao Parlamento qualquer medida que resolvesse o problema, só tinha outra cousa a fazer, que era abandonar o Poder.

Vozes da maioria : — Não apoiado. Não apoiado.

O Sr. Presidentes — Já terminou o prazo respectivo e temos de entrar na ordem do dia.

Vozes : — Fale, íale.

O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara pode S. Ex.a continuar.

O Orador: — Muito agradeço à Câmara a amabilidade com que me quis distinguir.

Sr. Presidente: em poucas palavras desejava responder aos apartes com que tarn apaixonadamente contrariaram as minhas palavras.

Apenas direi isto: ó que se a memória me não falha o Sr. Presidente do Ministério na outra Câmara fez esta declaração parecp.-me — e S. Ex.a está para depois dizer se foi assim ou não — ó que se até o dia 30 de Junho não tivesse os seus orçamentos aprovados não estaria nem^mais um dia nas cadeiras do Poder.

Parecs-me que não.

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suscitado entre o Governo e as oposições, e nunca entre o próprio Parlamento, porque eu não conheço que haja conflito algum entre as minorias e a maioria.

O Senado aguardaria, serenamente como sempre, que a outra Câmara resolvesse esse conflito e nenhuma necessidade teria de chamar para o terreno da luta uma -questão tam desagradável.

Mas, ontem, foi publicada uma nota oficiosa emanada da Presidência da República, que me obriga a fazer estas claras afirmações acerca deste problema e da minlia posição nesta casa, da posição da Esqcerda Democrática no Senado.

De facto, essa nota da Presidência da República foi para mim desagradável.

Tenho, tive sempre, pela alta figura moral do actual Presidente da República, um verdadeiro culto.

S. Ex.a, educado na velha escola da Democracia e da Liberdade, tem sido o exemplo vivo do que podem os horáens com um passado honesto e honrado como o do Sr. Presidente da República.

Mas chego a ter a noção de que, por vezes, no desenvolver, no desencadear das tempestades, o Governo não faz chegar à Presidência da República o Diário do Governo que lhe há-de levar sssa fantástica lei que ó a portaria de 20 de Maio de 1926.

Chego a supor que o S]'. Presidente da República não tivesse tomado ainda conhecimento dos factos, e aguardava o melhor momento para intervir de forma a que o conflito existente sanasse sem prejuízo para a República e para o País.

A nota oficiosa, porém, obriga-me a dizer que, como as oposições da outra Câmara., também reconheço estar o Governo fora da lei, que o Governo é um Governo de ditadores, e, como tal, não podem as oposições colaborar com ele, trabalhando em diplomas legislativos que facilitem a sua vida porque o mesmo seria que auxiliar a vida dos que nos estrangulam a nossa energia e a nossa própria vida. visto que o Governo usurpou prerrogativas sagradas das duas casas do Parlamento.

Sr. Presidente: a Esquerda Democrática do Senado não foi nunca perturbadora. A Esquerda Democrática do Senado, côuscia do que deve a si própria, sabe ou procura saber revelar o seu sen-

timento , sem perturbações, sem conflitos. Mas tem a obrigação de se erguer no seu lugar e a assumir uina atitude desassombrada e clara, para que perante o País fiquem perfeitamente definidas todas as posições.

Não vamos, Sr. Presidente, nós os da Esquerda Democrática do Senado fazer barulho ; limitamo-nos às nossas declarações, que, repito, são feitas forçadamente, por causa da nota oficiosa que da Presidência da República foi enviada à imprensa, para dizer que o conflito, se trava entre as oposições e o Governo e a que o Senado não tinha que intervir neste problema da vida pública senão depois de a Câmara dos Deputados o ter resolvido mediante o diploma legal que, por essa Câmara, costuma ser expedido.

Mas, porque o Sr. Presidente da República nos força a fazer essas declarações, mal iríamos se nos calássemos, porque então dir-se-ia em público que a Esquerda Democrática do Senado concorda inteiramente com os iictos do Governo, que não reconhece serem esses actos de natureza ditatorial, e que a Esquerda Democrática do Senado era o desmentido da forma altiva e desassombrada com que as oposições da outra Câmara estão atacando o Governo.

Tenho por quási todos os membros do Governo uma alta consideração. Tenho ato recebido de muitos deles as mais inequívocas provas de estima e de atenção e S. Ex.as sabem bem que a minha posição nesta casa, e neste momento, não pode de forma nenhuma bulir, num ápice sequer, com aquela estima, com aquela consideração, e com aquele prestígio de que muitos dos membros do Governo estão revestidos dentro da minha alma.

Não quero de forma alguma que S. Ex.as suponham que o facto de eu tomar esta atitude significa qualquer agravo para a sua honra pessoal.

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desse diploma fundamental, não merecendo por isso nem a colaboração, nem o auxílio, antes merecendo a luta sem tréguas por parte da Esquerda Democrática do Senado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— Sr. Presidente: como o debate está generalizado, e como sobre o assunto mais algum Sr. Senador pode desejar usar da palavra, pedia ao Sr. Medeiros Franco que não tomasse como uma desconsideração o não lhe responder imediatamente.

O Sr. Pereira Gil: — Requeiro que o Sr. Presidente consulte a Câmara para nos termos do artigo 52.° do Regimento ser aberta uma inscrição especial sobre o assunto tratado pelo Sr. Medeiros Franco sendo considerado de ordem até a sua completa discussão.

Foi aprovado.

O Sr. Augusto Monteiro:—Sr. Presidente : o ilustre Senador Sr. Medeiros Franco, por quem todo o Senado, e principalmente a maioria desta Câmara, nutre a mais alta consideração, acaba, forçado, segundo S. Ex.a disse, pela nota emanada da Presidência da República, de declarar nesta casa do Parlamento a sua absoluta oposição ao Governo e a sua absoluta discordância dos actos que S. Ex.a apelidou de ditatoriais.

O Sr. Medeiros Franco, que todos nós estamos acostumados a ver discorrer com brilho e com clareza, perdeu-se num maré magnum de citações e de definições de projectos e de diplomas legais que S. Ex.a apelidou de emanações da Presidência da República, de decretos puramente ditatoriais, e outras leis propriamente ditas.

S. Ex.a, numa longa divagação de jurisconsulto, e sobretudo de publicista, perdeu-se completamente querendo dar à Câmara a convicção de que os actos do Governo eram absolutamente ditatoriais. Não vamos nós perdermo-nos também, Sr. Presidente.

O assunto é claro, ó nítido. Pode ser apreciado rápida e claramente, sem que nós procuremos escurecê-lo com aprecia-

coes, como as do Sr. Medeiros Franco, que, se mostram a alta cultura deS.Ex.a, nada trazem, no emtanto, para o esclarecimento do debate. •"

Disse o Sr. Medeiros Franco que o Governo, tomando as medidas que conhecemos para a laboração das fábricas dos tabacos, usurpou poderes ao Congresso da República, e citou o artigo 26.° da Constituição.

Foi sobre este número que S. Ex.a baseou, em grande parte, a sua argumentação, querendo demonstrar à Câmara que os actos do Governo eram ditatoriais. Para demonstrar que os-actos do Governo são perfeitamente legais escusamos de ir à Constituição, porque temos as leis ordinárias, ao abrigo das quais o Governo tinha o direito e o dever de providenciar, como fez.

Esta questão dos tabacos não é um problema só dos tempos actuais, mas de todos os tempos, que tem sempre dado origem ao tumultuar das paixões.

Não quero agora fazer a história pre-gressa do assunto, e limito-me simplesmente a ir ao contrato de 23 de Março de 1891, em que o Governo, por carta de lei de 28 do mesmo mês, concedeu ò exclusivo do fabrico de tabacos.

Este contrato é baseado na lei de 1888,

que expressamente, no seu artigo 1.°,

•ressalvava para o Estado o exclusivo

único do fabrico, comércio e distribuição

dos tabacos em Portugal.

Baseado nesta lei é que se fez este contrato.

Desde o momento em que o Governo não anunciou essa liberdade ficou ipso facto em vigor o exclusivo em poder do Estado, e como tinha o dever de fazer laborar as fábricas para abastecer o mercado não podia o Governo deixar de tomar as medidas que tomou e que estão de harmonia com a lei.

Isto é, continuavam com o direito de receber os seus honorários.

Mas pregunto : qual era nesta altura a obrigação do Governo?

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honorários, e que então viriam para a rua?

Por aqui se vê que o acto do Governo não loi ditatorial. Foi, pêlo contrário, necessário, indispensável, não só para a segurança pública, mas também para o cumprimento integral da lei.

Mas, Sr. Presidente, o Sr. Medeiros Franco declarou que o Governo se pôs em ditadura porque não pôde, não quis, ou não soube arrancar do Parlamento uma providência legislativa que regulasse o assunto. Ora se a solução do problema dos tabacos não foi ainda realizado pelo Parlamento não pertence ao Governo a culpa do tal, visto que o Governo apresentou em tempo competente um projecto de lei sobro o assunto ao Parlamento.

O Parlamento demorou-se numa longa discussão, conforme quis e pôde, e quan-do estava próximo o dia 30 de Abril o Governo, ainda no seu alto intuito de conciliação e para que a vida nacional não ficasse parada, apresentou ao Parlamento um projecto de solução provisória do problema quási próximo da extinção do contrato, mas em todo o caso dentro do tempo necessário para que uma -Gamara já elucidada sobre o assunto não pudesse deixar de dar uma solução condigna ao mesmo.

Quando ainda a Câmara não estivesse habilitada para dar solução ao problema dos tabacos, nada impedia quo cia, reconhecendo a impossibilidade que tinha em se julgar competente para o resolver, consentisse em dar aquela autorização provisória e mais tarde resolveria definitivamente.

Mas o Parlamento não resolveu ainda, e nesta altura, se não é lícito ao Senado discutir, apreciar ou censurar os actos da outra Câmara, pode, porém, apreciar, discutir, censurar ou louvar os actos do Governo. E os actos do Governo, nesta ocasião, fundamentam-se em actos praticados pela outra Câmara, e não tenho, por isso, outro remédio senEo referir-me ao que a Câmara dos Deputados fez.

Quando alguns, ou até muitos desconhecendo as disposições da lei defenden. o critério de que desde que em 30 de Abril não estivesse votada a discussão dos tabacos voltávamos imediatamente á liberdade, outros entendiam que se deviam encerrar as fábricas e ainda outros enten-

dia-ni que devia pagar-se ao operariado sem que ele trabalhasse.

Mas isto, além de não ser uma solução do problema, era uma cousa imoral, revestindo porventura o carácter de uma esmola, facto que os empregados altivamente não quiseram aceitar.

jíMas, Sr. Presidente, inibido o Governo de resolver o problema de harmonia com a vontade do Parlamento, como desejava, o que lhe cumpria nesta altura? Desaparecer, fugir, demitir se. Foi aquilo que aqui preconizou o Sr. Medeiros Franco.

ç; Todavia, Sr. Presidente, a demissão do Governo facilitaria, porventura, a solução do problema?

<_:_ com='com' que='que' de='de' sei.='sei.' voto='voto' governo='governo' dos='dos' se='se' outro='outro' portanto='portanto' maioria='maioria' não='não' contar='contar' seguisse='seguisse' a='a' seu='seu' e='e' lhe='lhe' qualquer='qualquer' o='o' p='p' câmara='câmara' deputados='deputados' deixaria='deixaria' da='da'>

Suponhamos que este Governo era expulso do seu lugar pelo Parlamento. Seguir-se-ia uma crise porventura demorada, e, em quanto ela não estivesse resolvida, ficaria a vida nacional absolutamente paralisada.

Argumenta-se.que o Governo fez ditadura, e que são dignos de censura todos os Governos que fazem ditadura, os quais devem ser expulsos do poder.

Sr. Presidente: há ditaduras que são absolutamente benéficas, quando um poder do Estado perturba a vida nacional.

Se o Governo tivesse feito ditadura era neste caso absolutamente justificada pelas circunstâncias que se apresentaram.

A maioria desta casa do Parlamento, pondo acima de tudo o respeito pela lei e pelos interesses nacionais, não pode acompanhar o Sr. Medeiros Franco na sua censura ao Governo, nem considerar os seus actos como ditatoriais.

O seu acto impunha-se a qualquer Governo que quisesse defender o património do Estado, o maior valor da riqueza nacional.

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valor desse excluvivo, e dando-lhe elementos para ele, no caso de querer voltar ao monopólio, saber a renda que deve exigir.

Disse o Sr. Medeiros Franco, que o Parlamento é que devia íazor isto. E fá-lo-ia a tempo se porventura se não desenrolassem os acontecimentos que são do nosso conhecimento, o que perturbaram a vida parlamentar portuguesa, impedindo o Parlamento de resolver esse problema.

O Governo apresentou esse problema ao Parlamento com bastante tempo para ser devidamente estudado.

Se o Parlamento nào tem competência parca resolver um problema desta ordem não pode existir.

A maioria desta Câmara, não tendo intuito algum de censurar esta Câmara, uma vez que o Sr. Medeiros Franco aqui levactou o incidente, não pode deixar do dizer ao Governo o que pensa acôrca dos seus actos; e foi para dizer estas simples palavras que em nome da maioria falei e em nome dela vou enviar para a Mesa a seguinte :

Moção

Pela lei de 8 de Novembro de 1906 foi concedida à Companhia dos Tabacos de Portugal a continuação do exclusivo do fabrico de tabaco, no continente do território português, pelo prazo de dezanove anos, que terminou em 30 de Abril de 1926.

Findo este prazo, e na conformidade do artigo 8.° da mesma lei, tanto os prédios e fábricas, como os utensílios, ma-quinismos e bemfeitorias, voltaram para a posse da Fazenda Nacional.

Considerando que, não tendo o Poder Legislativo até agora deliberado sobre o regime a adoptar sobre essa indústria, se impunha naturalmente ao Governo tomar as providências administrativas necessárias para que as fábricas não paralisassem a laboração, altamente prejudicial aos interesses do Tesouro, ao pessoal operário, que só podia ganhar trabalhando, e aos consumidores;

Considerando que, por isso, emquanto o Congresso da República não determinar o regime da exploração dos tabacos não pode negar-se ao Governo a faculdade, ou, antes, a obrigação de, como simples função administrativa, adoptar as medi-

das indispensáveis para evitar esses prejuízos;

Considerando .que essa administração provisória terá, além do exposto, a vantagem de o Estado poder reconhecer com precisão o valor do exclusivo, justamente considerado como um dos grandes valores do Estado:

O Senado entende que o Governo é obrigado, para bem da Nação, a conservar e gerir os valores em cuja posse precária ficou investido, e passa à ordem do dia.—Augusto Monteiro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Afonso de Lemos (apôs a leitura da moção pelo orador):— j Levou toda a noite a escrever a moção!

O Orador:—Apesar de ser mais velho afianço-lhe que não levo tanto tempo a escrever como S. Ex.a

Tinha que discutir textos legais e desejava fazê-lo com consciência, por isso fui estudá-los.

O Sr. Presidente:—Vai ler-se a moção.

Leu-se na Mesa.

O Sr. Júlio Dantas (sobre o modo de votar):—Sr. Presidente: felicito o outro lado da Câmara pelo explendido serviço que lhe prestou o ilustre Senador Sr. Medeiros Franco levantando aqui esta questão.

S. Ex.a com o brilho da sua palavra que é muito, com a sua autoridade do homem de leis que é muita também, quis ser extremamente cortês e gentil, e coii-seguiu-o.

Sr. Presidente : este lado da Câmara vota contra o requerimento do Sr. Pereira Gil, votará contra a admissão da moção do Sr. Augusto Monteiro, e vota desta forma porque entende inconstitucional que esta Câmara se pronuncie sobre um assunto,' antes de se ter pronunciado a outra casa do Parlamento. Só temos que nos pronunciar quando depois de resolvido na Câmara dos Deputados ele aqui chegar.

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Não é minha intenção, pelo alto respeito que devo ao primeiro magistrado da Nação, discutir aqui a sua nota oficiosa, e muito menos a sua pessoa, ou os seus actos. Devo, entretanto, lembrar que os termos dessa nota de modo algum nos obrigam a discutir a questão antes de ela aqui chegar.

Apoiados.

V. Ex.as leram-na. Não pode por isso haver sobre esta matéria equívocos.

P Senado deve pronunciar-se, quando íôr oportuno fazê-lo; quere dizer quando aqui chegar a questão.

Apoiados. -

Esta tem de ser a doutrina, para que possa haver harmonia no funcionamento das duas casas do Parlamento.

O Partido Nacionalista já marcou a sua posição duma forma suficientemente clara. Nós entendemos que realmente o Governo praticou um acto de ditadura, para que não estava habilitado com as autorizações indispensáveis. Essas autorizações apenas as podia dar o Parlamento.

Mas, com o espírito de justiça que nos anima, diremos que, se realmente S. Ex.a o Sr. Presidente do Ministério se tivesse habiUtado com essas autorizações, evidentemente, a solução adoptada era a qae mais convinha aos interesses da Nação, e de modo algum o Partido Nacionalista recusaria a S. Ex.a o seu voto para legalizar a situação 'criada de facto.

Também já a minoria nacionalista marcou na outra casa do Parlamento a sua atitude quanto à conveniência de se discutirem desde já os orçamentos, de modo a poderem-se regularizar as contas do Estado.

A nossa posição está marcada também no que respeita à questão dos tabacos. Já a definimos convenientemente. Renovaremos aqui a nossa atitude ao discutir-se a questão e quando tivermos regularmente de o fazer.

Reconhecemos, portanto, prematuro o discutir-se nesta altura o assunto nesta casa do Parlamento.

O orador não reviu.

O Sr. Afonso de Lemos:—Prematuro e inconveniente!

O Sr. D. Tomás de Vilhena: — Sr. Presidente: afinal, afigura-se-me que tudo

isto não está tam feio como parece; e não o está com referência ao Partido Democrático.

Tem-se andado por aí a falar em desavenças fortes, violentíssimas; e, no em-tanto, parece-me que isto vai entrando num belo caminho.

O bom filho à casa torna. A estas horas o Sr. Presidente do Ministério e a maioria democrática devem estar contentíssimos com o seu antigo correligionário o Sr. Medeiros Franco, porque S. Ex.a prestou um relevante serviço ao Governo.

Andava-se por aí a dizer, há uns poucos de dias, que possivelmente seria solicitada a intervenção do Senado nesta magna questão dos tabacos.; mas também se dizia que parecia haver-se desistido dessa intervenção.

Era tudo quanto há de mais extraordinário ! E, afinal de contas, quando menos se espera, é o representante da Esquerda Democrática, que tem sido, em grande parte, a autora dos maiores conflilos que se têm dado na outra Câmara, que vem aqui oferecer ao Governo o ensejo para ele dizer da sua justiça e até para ouvir elogios muito encomiásticos dos seus correligionários, atitude esta rematada por uma moção de confiança ao Governo, que certamente S. Ex.a vai aprovar.

Por consequência, entre democráticos da esquerda e da direita parece terem acabado todas as desavenças, todos os ódios, caminhando uns e outros de braço dado para a consolidação do Governo.

Deste lado não navegamos nas mesmas águas. É preciso considerar que o Senado não deve ser uma câmara essencialmente política,, Temos, é claro, as nossas opiniões política», mas não lhes damos um acentuado carácter.

Quando a iniciativa é daquela outra Câmara, nela não intervimos senão quando isso nos; pertença.

Não tomamos parte em qualquer discussão, senão daqueles assuntos que dentro do espírito constitucional devam aqui ser discutidos.

Com respeito à questão dos tabacos, a nossa atitude está definida há muito tempo, na nossa imprensa, e pelo grupo parlamentar da outra Câmara.

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Aquele lado entende quo é melhor a ré-fjie.

Bom é que assim seja, para que amanhã, ao vermo-nos na necessidade de tomar conta disto, possamos voltar ao monopólio que se fosse dado por V. Ex.as por vinte e cinco anos a uma companhia qualquer, estávamos bem arranjados, e com a régie está bem, no dia seguinte nós a dissolveríamos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

É admitida a moção do Sr. Aires Monteiro em prova e contraprova requerida pelo Sr. Júlio Dantas verificando-se que estavam sentados 31 Srs. Senadores e 16 de pé, mantendo-se, pois, a admissão.

O Sr. Vasco Marques: — Quando as nacionalidades atravessem .momentos críticos é muito fácil ser-se profeta. Eu, na previsão dos acontecimentos graves que t&m ocorrido, pronunciei nesta casa do Parlamento, na sessão de 15 de Dezembro, algumas palavras que constam do Diário das Sessões e que eu agora desejaria ler se não fatigasse a Câmara.

Ora quem pronunciou essas palavras não quere, nem pode, levantar aqui dentro conflitos, nem dar origem a scenas que dês-toariam absolutamente da gravidade do Senado e até das relações cordeais que mantêm todos os lados da Câmara.

Apoiados.

Por consequência, não era intenção da União Liberal Kepublicana — pois falo em nome desta— levantar aqui a questão dos tabacos, senão no momento próprio, depois de votada na outra Câmara. Mas, uma vez publicada a nota oficiosa da Presidência da República, que não tenho dúvida alguma em classificar de infeliz, muito embora tenha o mais alto respeito pelo Sr. Presidente da Eepública, e levantada ostensivamente a questão em face do requerimento da maioria para a generalização do debate, a União Liberal Republicana tem evidentemente de se pronunciar.

Qualquer outro gesto de defesa, por mais hábil .que seja, sempre que tenha a seu cargo uma causa má, não pode produzir milagres.

O meu amigo Sr. Augusto Monteiro, com o seu muito saber e vastos conhecimentos, não conseguiu, nem de leve, fazer a defesa do Governo, nem comprovar que

ele não exorbitara no exercício das suas funções.

Depois de citar leis ordinárias e de fazer várias considerações, o Sr. Augusto Monteiro negou que o Governo tivesse praticado, na questão dos tabacos, um. acto de ditadura. Mas, cousa singular, é o próprio Sr. Augusto Monteiro que veio declarar que o Governo, a tempo e a horas, tinha concretizado numa proposta de lei o seu modo de ver na questão dos tabacos, e que ainda à última hora, em face de aquela não ter sido votada, apresentara as bases para uni regime provisório.

£ [Se o Gov7êrno podia praticar os actos que tam combatidos têm sido, se o Governo podia prescindir da acção parlamen^ tar, apossando-se das fábricas "dos tabacos, pondo-as a funcionar sob a sua administração directa, recolhendo receitas e pagando despesas, para que apresentou o Governo primeiro a sua proposta de lei sobre os tabacos, e depois uma outra para o regime provisório ?!

A Câmara dos Deputados nem se pronunciou sobre o regime definitivo, nem chegou a votar o regime provisório.

Nestas circunstâncias, substituiu-se o Governo ao Parlamento, e tomou aquelas providências que constam do Diário do Governo. Primeiro um simples despacho de 30 de Abril e que só apareceu no Diário do Governo de 19 de Maio, depois a portaria n.° 4:628, de 20 de Maio corrente.

E, não obstante, o Sr. Dr. Augusto Monteiro, na defesa de uma causa má, disse em certa altura: «se o Governo fizesse ditadura ...»

O Governo fez e faz ditadura, afirmo-o eu e para comprcová-lo basta o facto, que já citei, de ter reconhecido, com as suas duas propostas de lei a absoluta necessidade da resolução parlamentar, e depois, prescindindo dela, tomar as deliberações que muito bem entendeu.

A nota infeliz da Presidência da República é que deu, pois, origem a que nesta casa do Parlamento se levantasse, fora de tempo, uma discussão sobre a questão dos tabacos.

«O Governo encontra-se em ditadura», afirmam as oposições; «o Governo não faz ditadura», diz a maioria.

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Diário das Sessões do Senado

Lembro-me de que, quando do Ministério Pimenta de Castro, dizia o Partido Democrático que—se estava em presença de uma fera ditadura, e alguém que tinha, então, altíssimas responsabilidades, classificava o acto do «ditadura do trazer por casa», oditadura comezinha e sem importância» .

E então, ao inverso do que hoje sucede, foi o ilustro republicano Sr. Dr. Bernar-dino Machado quem, com maior violência combateu essa ditadura, (Apoiados} com actos e palavras, vindo até, com um gesto muito nobre o alovantado, à porta do Parlamento, manifestar-se contra a ditadura.

O Sr. Afonso de Lemos (em aparte): — E foi até para a Mitra.

O Orador : —Entretanto, quem tinha as mais altas rcsponsabihdades continuava dizendo que «se tratava de uma ditadura comezinha e de trazer por casa», mas todos sabem até onde-esse acto levou o País o a conflagração que depois se deu para que fosse respeitada a Constituição da República!

Parece que, como consequência da quês-tilo dos tabacos, o Parlamento vai encerrar as suas portas dentro do poucos dias. Pensará o Governo que, naturalmente, depois de ter desaparecido o estorvo do Parlamento, a sua .vida correrá melhor. Pois eu farei neste momento uma fácil profecia:—Ameaçada de fechar esta válvula de segurança, chegará precisamente o período pior o mais grave para o Governo. Estou até absolutamente convencido de que, desta hora em diante, caminhamos para situações muito graves, porque, in-leiizmente, as lições do passaco em nada aproveitam, e tanto que cá estamos como em 1910, uns a classificarem estes actos do Governo do ditatoriais c outros a dizer que o não são, ou então que se trata de uma ditadura comezinha e de trazer por casa..

A primeira ditadura tovo por epílogo o 14 do Maio, esta terá aquilo que os fados quiserem . . . (Apoiados). E desde que nós entendemos o proclamamos que o Governo se encontra em ditadura, evidentemente que não podemos colaborar com ele.

Pelo respeito que devemos a V. Es.% Sr. Presidente, pelo respeito que devemos a'todos os colegas desta Câmara, pelo

respeito que devemos a nós próprios, não praticaremos nenhum desacato, mas o Governo para nós já não existe, o Uevéruo para nós morreu.

Nós não queremos relações com o Governo.

Vozes: — Muito bein, muito bem.

O Sr. Caldeira Queiroz : — Sr. Presidente: votei contra o requerimento pedindo a generalização do debate, apresentado pelo Sr. -Pereira Gil, votei contra a admissão da moção do Sr. Augusto Monteiro, e contudo, não sou contra o Governo, ncin a favor do Governo. Eu sou hoje o que tenho sido sempre, republicano e parlamentarista.

Entendo que vamos atacar gravemente o sistema parlamentarista, introduzindo no Senado a discussão da questão dos tabacos, visto que, nesta altura, a reputo absolutamente inconstitucional e inoportuna.

Também na mesma ordem do ideas, declaro a V. Ex.a que, sem desprimor para o Sr. Augusto Monteiro, nem para qualquer Sr. Senador, sairei desta sala na ocasião em que se proceda à votação da moção do Sr. Augusto Monteiro.

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Medeiros Franco (para explicações):— Sr. Presidente: há pouco o Sr. Augusto Monteiro, respondendo às considerações por mim produzidas sobre a declaração que apresentei, afirmou que eu me havia preocupado demais rebuscando legislação e querendo fundamentá-la em textos, para justificação de que o Governo entrou em franca ditadura e de que o Governo está fora da lei.

Não pretendi fazer nesta casa a discussão da ditadura, porque entendia há pouco, como entendo agora, que a vida do Senado não permite, nem pode permitir de forma alguma, que estejamos a apreciar nesta altura os actos que foram abjecto da minha declaração. •

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do acto ministerial em litígio. São precisamente estes os termos da nota oficiosa de S. Ex.a o Sr. Presidente da República.

O Senado, pela sua própria função e pelo direito consuetudinário constitucional, que alguma cousa é e alguma cousa representa na vida de um povo, o Senado, digo, não tem carácter político. < Ainda há pouco tempo, se bem me recordo, foi apreciada esta matéria nesta casa do Parlamento, e o Senado pronunciou-se no sentido de que a votação que se "fizesse não tinha, nem devia ter, carácter político.

Sentindo eu, como todos os outros Srs. Senadores que a este propósito falaram, que não podemos nem devemos apreciar a moção que o Sr. Augusto Monteiro enviou para a Mesa, eu tinha argumentos em barda, se necessários fossem, para demonstrar que o Governo entrou em ditadura, que o Governo está fora da lei. Se, porém, invoquei textos legais, foi ape-. nas como complemento da minha declara: cão, mas de antemão convencido de que não podíamos, nem devíamos, nesta altura fazer justificação do facto. ' O Sr. Augusto Monteiro parece que, com o espírito de deminuir ou amesqui-nhar a forma "como eu fiz a minha modesta mas sincera declaração, quis dar a impressão de que tanto a Esquerda Democrática como eu estávamos excessivamente preocupados com • a demonstração de um facto que, no meu espírito, de há muito existe : e é que o Governo se encontra em plena ditadura.

Se fosse necessário fazer essa demonstração, bastaria ouvir as considerações que . a propósito desse facto produziu o Sr. Augusto Monteiro, que foi quem mais clara e nitidamente fez a justificação da ditadura, isto é, considerou para todos os efeitos o Governo como sendo um Governo de ditadores.

Pretendi há pouco ser sereno, pretendi pôr fora e acima desta questão política a figura de S. Ex.a o Sr. Presidente da República.

Todavia, comecei por lamentar e considerar como infeliz a sua nota oficiosa. l Infeliz e sem precedentes!

De forma alguma com as minhas considerações, que foram objecto da minha declaração de posição dentro desta Câmara, pretendi ou pretendo atingir o

Sr. Presidente da República. Mas se votos, porventura, eu tivesse de fazer nesta hora, seriam para que S. Ex.a se servisse dos moios que a Constituição lho dá para resolver este conflito, com o qual o Senado nada tem, mas que S. Ex.a pode resolver de harmonia com a lei fundamental do País.

Foi ainda agora votada a admissão de uma moção apresentada pelo Sr. Augusto Monteiro. Essa moção traduz um pensamento perfeitamente inconstitucional.

A Esquerda Democrática rejeitou a sua admissão, a Esquerda Democrática fará como a minoria da União Liberal Republicana, abandonará a sala só porventura se insistir jia votação dessa moção, porque dessa insistência outro princípio não vem senão Cste: é que estamos envolvendo tudo e todos em actos inconstitucionais.

Apoiados.

Confio, mais unia vez, na dignidade, na honradez e no carácter do V. Ex a, Sr. Presidente, que tem sido realmente um modelo de cidadãos, batendo-se sempre pela liberdade, pela República e contra as ditaduras.

O nome de V. Ex.a, Sr. Presidente, está adstrito a essa obra que a Nação acarinha, o que é a obra do combate sem tréguas a todas as ditaduras. O nome de V. Ex.a, Sr. Presidente, está ligado ao nome do Sr. Presidente da República, que realmente tem um passado cheio de esforços e de lutas contra todas as ditaduras.

E se porventura o Sr. Presidente do Senado —que o não faz— fosse pôr à votação uma proposta que S. Ex.a será o primeiro a reconhecer ser inconstitucional, eu não colaboraria nesse acto.

Desejo apenas e mais uma vez declaro que, sem querer agravar de qu:.lquer forma as pessoas que fazem parte do Go-vôrno,. com as quais mantenho relações de verdadeira amizade, na sua quási totalidade, -— não posso nem a Constituição mo permite, que eu colabore com o Governo, porque de outro modo estaria acobertando com a modéstia do meu voto e a insignificância da minha acção, actos que só podem ser julgados e apreciados pelos-tribunais ordinários.

Tenho dito.

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ÍHário dai Sessões do Senado

desejo de denegrir a autoridade

O Sr. Alves Monteiro (para explicações}", — Sr. Presidente: pedi a palavra, quando o Sr. Medeiros Franco disse qne parecia ter visto nas minhas considerações o das suas palavras.

Ora, a verdade é que eu nu oca tive o intuito do denegrir ninguém e muito menos a pessoa do Sr. Medeiros Franco, por quem tenho a máxima consideração e da qual de todos nós ele é merecedor.

Apoiados.

Veio S. Ex.a fazer declarações em face de uma nota publicada pela Presidência da República, nota que a maioria desta Câmara entende que não deve ser discutida e que indiscutíveis são os actos daquela Presidência.

Não está também em discussão a questão dos tabacos, como quis deixar ver o Sr. Júlio Dantas ; não está em discussão esse problema, porque ainda o está na outra, Câmara.

As declarações do Sr. Medeiros Franco foram apenas resultantes da atitude por S. Ex.a tomada e da Esquerda Democrática, por virtude de actos praticados pelo Governo ; são esses actos que nós podemos apreciar e discutir.

Apoiados da maioria.

Nesta altura, a maioria n ao pode admitir que o Senado não seja una Câmara política.

O Senado é uma Câmara política, dá--Ihe a Constituição esse direito, simplesmente o papel de cada uma das Câmaras diverge um pouco ; emquanto, por exem-plo, a Câmara dos Deputados tem certas iniciativas, só o Senado pode confirmar a nomeação dos governadores das províncias ultramarinas.

As únicas excepções tiradas à igualdade das duas Câmaras são aquelas que expressamente estão determinadas na Constituição e isto não é um princípio de direito público português, mas mu adiai.

E as condições que podem obrigar as oposições a abandonar as snas cadeiras são os mesmas quando seja votada ao Governo uma moção de desconfiança.

Mas repito, Sr. Presidente, o que está em discussão não é a nota co Sr. Presidente da República, que a maioria se recusa a discutir ; não é o que se está passando na Câmara dos Deputados, nem tam pouco a questão dos tabacos, mas

são os actos do Governo pelos quais o Sr. Medeiros Franco justificou a sua declaração e é sobre esses que simplesmente incide a minha moção. O orador não reviu.

O Sr. Roberto Baptista: — Sr. Presidente : a minha situação especial no Senado da República, independente de qualquer grupo político, obriga-me a usar da palavra para definir a minha atitude.

O assunto em discussão surgiu em virtude das declarações que foram feitas hoje nesta casa do Parlamento pelo ilustre Senador Sr. Medeiros Franco, em nome da Esquerda Democrática.

O Sr. Alves Monteiro, muito habilmente, em nome da maioria, apnneitou o pretexto que lhe foi dado pelo Sr. Medeiros Franco para apresentar uma moção justificando os actos do Governo.

Sem quebra da muita consideração que devo ao ilustre Senador Sr. Medeiros Franco., desde já declaro a V. Ex.a que não voto essa moção, e que sairei da sala antes de ela ser posta à votação, porque julgo que, tratando-se de apreciar actos cometidos pelo Governo, cuja apreciação já foi iniciada na Câmara dos Deputados, não é este o momento oportuno para isso se fazer.

Apoiados.

Embora eu não deseje por emquanto definir a minha atitude sobre a questão dos tabacos, que tanto interessa a todos nós e interessa a Nação, no emtanto, desde já acentuo um facto: é que sou contra a régie, não por uma questão de princípios, mas simplesmente porque,.considerando os desastrosos .e perniciosos ensinamentos por nós colhidos com a administração dos Transportes Marítimos, Bairros Sociais, Exposição do. Rio de Janeiro e .outros casos (Não apoiados da esquerda e apoiados da direita), era preciso que eu esquecesse o que devo a mim próprio, para poder estar de acordo com a régie.

O Sr. Querubim Guimarães (aparte}-.— Nunca a República será capaz de punir devidamente qualquer dos seus grandes criminosos.

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apenas o seguinte: não me vou referir à nota oficiosa enviada aos jornais pela Presidência da República, porque o respeito que devo ao Sr. Presidente, corno o primeiro magistrado da Nação, e o respeito que devo a niim próprio, como parlanion-tar, me inibe de discutir essa nota oficiosa.

Por último, desejo apenas declarar o seguinte : que na situação difícil em que presentemente nos encontramos, considerando o tumultuar das paixões que em torno do nós se salientou, eu apenas desejava que todos aqueles que na Nação portuguesa tom qualquer situação de destaque, ou podem por qualquer forma influir na marcha goveruativa da Nação, empregassem todos es seus esforços para que houvesse, de facto, um justo equilíbrio entre todos os poderes do Estado, sem o qual não podo haver verdadeira democracia.

Apoiados da direita.

O orador não reviu.

O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente : entro neste debate no momento em que a Câmara se encontra ainda debaixo da impressão que lhe causou a palavra do Sr. Roberto Baptista.

S. Ex.a é uma pessoa sempre ouvida com o maior respeito, quer pela correcção com que sabe sempre revestir as suas palavras, quer pela alta consideração que merece à Câmara.

Encontra-se a Câmara, como eu disse, excitada e enervada com a palavra de S. Ex.a, sendo certo que, normalmente, é calma, absolutamente calma.

t.Qual foi o artifício de que S. Ex.a se serviu para excitar a Câmara por esta forma, a ponto de me colocar a mim em perigo de ver inutilizado tudo quanto eu disser ?

Foi: Transportes Marítimos ! Exposição do Rio de Janeiro!

O Sr. Carlos Costa: —Diga V. Ex.a também «e Bairros Sociais» para a scie ficar mais composta, mas ainda não completa.

- O Orador:—Não veja S. Ex.a, o Sr. Roberto Baptista, nestas minhas referências às suas palavras nada que demiuua no que quer quo seja o muito respeito e a muita

amizade que há bastante tempo tenho por S. Ex.a Mas é certo que foram estas palavras Transportes Marítimos. Exposição do Rio do Janeiro, Bairros Sociais, a que o Sr. Querubim Guimarães logo daquele lado da Câmara correu apressado a dizer: «jNunca a República castigará os seus grandes criminosos!»

Tudo isto concorreu para excitar a Câmara. Mas eu digo ao Sr. Roberto Baptista e ao Sr. Querubim Guimarães que é muito íácil excitar os portugueses com palavras como estas, assim como é muito fácil também acalmá-los.

O Sr. Roberto Baptista ao citar a nota oficiosa da Presidência da República disse quo a não analisava pelo muito respeito que tinha pelo ilustre Cbefe do Estado, e também pelo muito respeito que tinha por si próprio corno parlamentar.

Ora ainda que a Câmara não vá discutir, nem esteja resolvida a discutir a nota oficiosa da Presidência da República, entendo eu que, sem quebra nenhuma do muito respeito quo possamos ter por nós próprios, podemos referir-nos a essa nota, e V. Ex.!ls verão quo eu, sem a querer discutir, mas contrário a outros oradores que me precederam, olho para esta nota da Presidência da República com a máxima serenidade.

<_0ra que='que' a='a' conhecemos='conhecemos' é='é' bem.='bem.' muito='muito' oficiosa='oficiosa' senão='senão' o='o' p='p' desnecessário='desnecessário' diz='diz' ia.='ia.' ocioso='ocioso' todos='todos' pois='pois' república='república' presidência='presidência' da='da' nota='nota' lê='lê'>

Ora foi esta nota da Presidência da República que levou o Sr. Medeiros Franco a pronunciar-se nesta Câmara, segundo as suas próprias palavras.

Eu ouso pedir a V. Ex.as que vejam esta nota com a serenidade com que eu a estou vendo. & Então, para que este assunto, iniciado na Câmara dos Deputados, pudesse constituir indicação do Congresso da República, não era preciso que o Senado sobre ele se pronunciasse?

O Sr. Afonso de Lemos: — Mas na altura competente.

O Orador: —Ora, Sr. Presidente, estamos todos de acordo.

Risos.

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Diário das Sessões do Senado

posição do Rio de Janeiro, vão na frente das minhas palavras, porque o que acabam de manifestar era o que eu queria dizer também, e é o que se encontra na nota da Presidência da República. É que depois de o assunto ser tratado na Câmara dos Deputados tinha de vir a esta Câmara.

Apoiados.

O Sr,. Roberto Baptista: — j Isso não precisa dizer-se, porque já todos o sabemos!

O Orador:—Eu gosto muito de entrar em coros.

Na minha mocidade fui muito dado à música.

Gosto imenso de ouvir proclamar em. coro tudo que me proponho dizer a solo.

Estou a dizer o .mesmo que V. Ex.as e também o que a nota da Presidência da República diz: é que este assunto, começado a tratar na Câmara dos Deputados, tinha necessariamente de vir a ser apreciado no Senado, sem a sanção do qua! nunca valeria de nada. Quero dizer: qualquer deliberação acerca deste assunto, para "ter carácter legal, constitucional, devia começar na Câmara dos Deputados e ter o seu complemento aqui. Portanto, estamos todos de acordo; mas, apesar disso, a divergência de interpretação levou o Sr. Medeiros Franco a levantar aqai uma questão doutra ordem, que não é a constitucional; e levou o Sr. Augusto Monteiro a apresentar uma moção, que não, é tal uma moção de confiança.

É frequente nas assembleas políticas os políticos pronunciarem-se sobre documentos que muitas vezes não lêem, nem conhecem. Não digo que isto tenha sucedido agora, mas ó que . . .

O Sr. Afonso de Lemos: — j S. Ex.a teve vinte e quatro horas para pensadamente elaborar a moção! ...

O Orador: — S. Ex.a, o Sr. Lemos, que é uma pessoa que me conhece há largos anos, do tempo em que éramos correligionários, porque já o fomos . ..

O Sr. Afonso dê Lemos: nunca fui democrático! ..

Mas e a

O Orador:—Fomos ambos unionistas; mas, antes de sermos unionistas, tínhamos sido republicanos.

E é a essa época brilhante e de muita saudade para todos que eu me refiro agora.

Esse velho conhecimento que S. Ex.a tem de mim deve levá-lo a acreditar na minha palavra, embora seja palavra de político, porque os políticos estão habituados a desmerecer, por sua culpa, a própria palavra.

V. Ex.a, Sr. Presidente, e o Sr. secretário viram que eu fui, há pouco; à Mesa pedir para me deixarem ler a moção do Sr. Augusto Monteiro. EJa tinha ido para a secretaria a fim de ser copiada e só há um instante chegou aqui. Antes disso, garanto a V. Ex.a que não conhecia a moção do Sr. Augusto Monteiro.

O Sr. Afonso de Lemos:—Vi ontem aí, junto de S. Ex.% o Sr. Presidente do Ministério com toda a legislação sobre o assunto, como vi também ontem, no seu lugar, o Sr. Alves Monteiro igualmente com toda a legislação sobre o assunto.

Ouvindo hoje o Sr. Alves Monteiro ler uma moção que não podia ter sido feita hoje, de momento, isso permitiu-ine que concluísse e afirmasse, em aparte, que toda a maioria e o Governo haviam tido conhecimento do assunto.

O Orador: — S. Ex.a, Sr. professor de lógica, vê que se enganou e que nem sempre a lógica é infalível.

Embora eu ame de todo o coração a política no sentido que entendo que ela deve ser amada, detesto a política que leva a dividir os portugueses no momento em que mais precisam de estar unidos.

Se entro no debate é porque julgo dever fazê-lo por não estarem esclarecidos pontos que ó necessário que o fiquem bem.

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se trata de um Ull de indemnidade, e se efectivamente disso se tratasse procederíamos inconstitucionalmente.

Estamos, portanto, absolutamente de acordo, visto que eu penso, como o Sr. Afonso de Lemos, que o Senado não pode pronunciar-se sobre um biil de indemnidade antes de o fazer a Câmara dos Deputados.

Apenas faço uma constatação de factos.

O Sr. Afonso de Lemos:— Este assunto trazido para aqui, no momento em que ainda não está liquidado na Câmara dos Deputados, constitui um procedimento inconstitucional.

O Orador : — S. Ex.a tem de reconhecer que não foi a maioria que trouxe este assunto para aqui. Foi o Sr. Medeiros Franco, no uso do seu direito e no cumprimento de um dever, no pensamento de S. Ex.a

Queria S. Ex.a que, quando o Sr. Medeiros Franco começasse a falar, nós começássemos em grita: Está fora da ordem !.

S. Ex.a criticou e apreciou actos do Governo e ninguém lhe retirou a palavra, porque ninguém podia fazê-lo.

Foi necessário que alguém requeresse que, sobre o assunto, se abrisse uma inscrição especial, considerando o assunto de ordem, para que a discussão pudesse continuar. Foi deste lado da Câmara que se fez esse requerimento, porque se não se fizesse não faltaria quem dissesse que nós queríamos abafar a discussão. A Câmara .votou o requerimento, porque apenas lhe negou o voto a minoria nacionalista.

4,0 que viu a minoria na moção do Sr. Augusto Monteiro, se ele ainda a não tinha apresentado?

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo}: — Quando falei e pus a questão tinha já sido apresentada a moção.

O Orador:—

Quando a minoria nacionalista recusou o seu voto não havia ainda no Senado senão o discurso do Sr. Medeiros Franco.

O Sr. Júlio Dantas:—E o discurso do Sr. Alves Monteiro.

O Orador: — S. Ex.a pode-me fazer a alta fineza, e não veja nisto impertinência, de me dizer se sabe como termina a moção do Sr. Alves Monteiro?

Pausa.

O Orador: — Pelo seu silêncio, S. Ex.a mostra bem que o não sabe.

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo): — Conheço a moção de a ouvir ler, e só depois de a ter ouvido ler ó que pedi a palavra, e declarei que tínhamos negado o nosso voto ao requerimento, como também o negávamos à admissão da moção.

O Orador: — Aceito a declaração de S. Ex.a que, não é uma resposta directa e inteiramente satisfatória à minha pregunta e na qual não insisto.

O Sr. Júlio Dantas : — S. Ex.a desculpe-me mas não ouvi apreguníado S. Ex.a

O Orador: — A minha pregunta era se S. Ex.a conhecia os precisos termos finais, que são os fundamentais da moção do Sr. Alves Monteiro.

O Sr. Júlio Dantas : — Sim, senhor, visto que a ouvi ler na Mesa.

O Orador: — Eu posso também dizer a S.-Ex.a que conheço o que dizem os vários jornais, por os ouvir ler.

O Sr. Júlio Dantas (interrompendo): — Em geral também, quanto a minha inteligência mo permite, conheço os assuntos que trato, e S. Ex.a de certo, que é uma pessoa muito gentil e cortês não tem, com a sua pregunta a intenção de significar qne falei sobre um assunto que não conhecia.

O Orador: — Nunca poderia ter o pensamento de dirigir um ataque dessa ordem a S. Ex.a porque isso seria uma impertinência inconcebível.

Depois da minha declaração, pedindo a S. Ex.a que não visse impertinência na minha pregunta, que n£o vejo razão para S. Ex.a de qualquer forma poder pensar semelhante cousa.

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ler os documentos que julgar necessários para fundamentar as minhas considerações. E, Sr. Presidente, eu preciso referir-me aos precisos termos desta noção. Simplesmente o final dela conhecemo-lo todos.

Ora, se porventura eu tivesse necessidade de mandar uma moção para a Mesa resumindo a minha exposição diria exactamente isto.

O Sr. Afonso de Lemos (em aparte}: — Isto estava muito bem para ser apresentado na outra Câmara.

O Orador:—<É que='que' ou='ou' discutindo='discutindo' do='do' só.='só.' o='o' p='p' assunto='assunto' senado='senado' estamos='estamos' ordem='ordem' não='não' da='da'>

O Sr. Afonso de Lemos (em aparte):— Votou a maioria.

O Orador: — Calculo que S. Ex.1 com a sua atitude discordante não pode opor-se a que outros Srs. Senadores apresentem os seus pontos de vista.

Isto não representa crítica a nenhuma assemblea política.

Representa a convicção de que nesta Câmara posso apresentar os meus pontos de vista certo de que eles serão respeitados assim corno eu respeito a maneira de ver apresentada pelos meus colegas.

E agora, Sr. Presidente, entro verdadeiramente na exposição dos meus pontos de vista.

£0 que se diz aqui nesta moção, com a qual concordo inteiramente?

Diz-se que o Governo era obrigado a fazer o que fez. Não sei se é bom, se ó

mau.

Ora isso é facílimo de demonstrar e como disse que entrava no meu ponto de vista, tenho em poucas palavras de dizer

qual é.

Sr. Presidente: ao contrário dos que afirmam que sempre foram pela liberdade de indústria, por pouco que não dizem que são pela Liberdade de indústria desde que nasceram, eu digo que tendo nascido no meio de liberais, como já tenho dito, tendo pode dizer se bebido leite libera] e dedicação libfral, tendo ornam sido quási afobado em liberdades, não sou um liberal, sob o ponto de vista económico.

Com esta declaração não dou novidade nenhuma à Câmara, porque por uma série do pequenos discursos que aqui tenho feito, já devemos desconfiar que não sou liberal sob o ponto de vista económico, pelo contrário, eu digo que sempre fui pela régie, e era necessário quo me convencessem do contrário para eu sair desse ponto de vista. #*

Não vou agora discutir o assunto dos tabacos, mas entendo que a régie é o sistema mais defensável neste momento, e aquele em que nós podamos sair sem qualquer espécie de perigo para o Estado.

E até já apareceu esta nuance, é que não há ninguém que conheça o negócio dos tabacos senão o potentado que o teve durante tantos anos; só ele é que sabe como há-de explorar o Estado o pretenderia porventura que- se facilitasse campo para as suas manobras.

Esse potentado pncontrou terreno fácil para fazer a sua propaganda.

(jMas como, Sr. Presidente?

Xuma verdadeira miséria, provocando o ódio dos outros partidos ao Partido Republicano Português.

Sr." Presidente : lastimo que o ódio ao Partido Democrático fosse tam grande que chegasse ao ponto de se afastarem uns dos outros. Francamente, é preciso que o ódio seja grande, mas não entro nessa parte política, porque não me interessa nada.

Sr. Presidente: como disse há pouco, sou pela régie e até devo declarar que, sendo pela régie, houve um momento em que estive em discordância com o Gro-vèrno do meu Partido presidido pelo Sr. António Maria da Silva, quando em público disse que S. Ex.a não se tinha apresentado firmemente, sob o ponto de vista estabelecido, que era a régie.

Pregunta-se; porque é que eu disse que o Governo tinha obrigação de fazer o que fez?

Foi porque não tinha, leis senão para isso.

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O Sr. Afonso de Lemos: —

O Orador: — Ea apelo para V. Ex.a, Sr. Presidente, para a sua velha lealdade de republicano e de pessoa de inteira justiça. Se V. Ex.a acha que estou fora da ordem, retiro as minhas palavras.

O Sr. Presidente: — Se o tivesse entendido já teria feito as necessárias observações a S. Ex.a

O Orador: —O Sr. D. Tomás de Vi-Ihena, a quem presto as minhas inteiras homenagens de respeito e de consideração, e por quem tenho «ma velha amizade, disse que o Sr. Medeiros Franco tinha prestado um serviço à maioria. S. Ex.a atribuiu também as responsabilida-des deste debate ao Sr. Medeiros Franco. Nem o Sr. Medeiros Franco é pessoa que alije responsabilidades. S. Ex.a é pessoa suficientemente ponderada para não ter trazido uma questão que ele entendesse que podia perturbar a marcha constitucional do regime. S. Ex.a assim procedeu, por que entendeu que o devia fazer, e ainda que orientações políticas diferentes me afastem de S. Ex.a, eu continuo a ter por S. Ex.a uma alta e profunda consideração (Apoiados), e seria com muita saudade que eu veria sair desta Câmara o Sr. Medeiros Franco. Não serei eu quem darei motivos para tal.

Agora não se poder discutir uma afirmação de S. Ex.a! Uma conclusão duma moção que está na Mesa! Era uma violência insuportável.

Diz o Sr. Medeiros Franco que o Governo está fora da lei e que por isso o meu partido ó incompatível coin ele. Uma afirmação desta ordem exige uma resposta.

O Sr. Augusto Monteiro apresentou a sua moção, não diz que o Governo está fora ou dentro da lei, diz que o Governo tinha a obrigação do fazer aquilo que fez.

Mas diz o Sr. .Vasco Marques que o Governo, se tinha essa lei, ^porque é que trouxe outra iniciativa ao Parlamento? E este argumento parece colher. Nem S. Ex.a o produziria se não lhe reconhecesse certa força.

Ora onde eu tenho de fazer uma observação, é no seguinte:

O Governo, ao apresentar-se na Câma-

ra, não se apresentou com as ideas que eu entendia serem do seu partido, e na declaração ministerial bem claramente o exprimiu.

Que S.Ex.a, o Sr. Presidente do Ministério, não quis cingir-se ao ponto do vista do seu partido, porque tinha um ponto de vista como Governo, tinha o seu modo do ver pessoal que é característico, e não é por isso que desmereceu da confiança do seu partido, modo de ver do qual eu poderei discordar uma ou outra vez sem que isso quebre a minha amizade por S. Ex.a e o apoio que lhe devo. Até pelo conirário, S. Ex.a tem-me visto aqui algumas vezes, mais papista que o Papa, dizendo^a S. Ex.a que é preciso que vá para diante com os seus primeiros propósitos. Sabe perfeitamente S. Ex.a que divergimos uma vez ou outra e, neste ponto, apresentou-se S. Ex.a duma forma de que eu não gostei.

E se eu estivesse no lugar de S. Ex.3, eu que não tinha anunciado nos termos da lei vigente de 1891 ...

Leu.

Seguem-se várias considerações nas quais se estabelece a forma como hão-de funcionar essas tais fábricas que, nos termos da lei, possam ser constiuídas, para que o futuro dos operários fique assegurado.

O que não pode deixar de vigorar é a continuação do monopólio nas mãos de particulares, ou do Estado.

Apoiados.

Ora se o Governo, nem este nem o anterior, não fez a declaração de que optava pelo regime de liberdade é porque se reservaria o pensamento do continuar no sistema de monopólio do Estado, ou particular. E, como não era admissível que o Partido Republicano Português pensasse sequer em entregar novamente esse monopólio nas mãos de particulares, deduz-se logicamente que o que estava no pensamento do Governo era que usaria da lei para manter o monopólio do Estado, e foi porque o Sr. Presidente do Ministério se não manteve firme neste ponto que eu discordei de S. Ex.a

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Diário da* Sessões do Senado

Os monárquicos nem sempre legislaram bem neste caso especial; legislaram optimamente, embora sob o peso das circunstâncias de momento, mas legislaram com prudência e acerto.

E, então, disse o legislador que o Governo ao aproximar-se o fim da concessão, se entendesse que devia passar-se ao regime de liberdade, anunciaria em tempo competente que se ia passar a esse regime para que a iniciativa particular pudesse preparar-se para que ES fábricas começassem a funcionar em l de Maio de 1926, apresentando para isso os seus requerimentos.

Sabe S. Ex.a que muitas vezes nos aproximamos em nossas ideas, e eu já atribuí semelhante coincidência ao jacto de ambos termos posições simétricas nesta sala.

^Mas o que diz um dos parágrafos da condição 6.a?

Ora, se a lei por um lado, diz que não é o regime de liberdade que está em vigor, senão quando isso for anunciado, por outro lado o contrato diz que no caso do monopólio se fazem os avisos em tempo competente.

(Voltando-se para o Sr. Querubim Guimarães)

Se ele não for bom, peço aS.Ex.3 que o corrija.

Mas diz-se: o Governo tomará conta dos 800:000 quilogramas e também do tabaco em rama.

Para quê?

Para ser accionista, ou para entrar, por exemplo, para a The Match and Tobacco Timber Supply Company que estava preparada, preparadinha mesmo, para tomar conta do fabrico do tabaco? ' Isto da The Match and Tobacco Tim-ber Supply Company é uma cousa muito interessante, que se eu tiver ocasião, analisarei para explicar a razão por que se apresentam escritas com lucros insignificantes, apesar de se tratar de um grande potentado.

Qaere dizer, quando' se fizer a análise

das diferentes The Match Tobacco Timber

Supply Company, encontrar-se há a espli-

' cação do motivo por que a Companhia dos

Tabacos falsifica a sua escrita.

O Sr. Afonso de Lemos:—<íMas p='p' tabacos='tabacos' a='a' questão='questão' estamos='estamos' discutir='discutir' dos='dos' nós='nós'>

O Orador: — Não, senhor.

O Sr. Afonso de Lemos :— j É uma discussão preparatória para quando o assunto tiver de ser apreciado nesta Câmara!

O Orador: — S. Ex..a tem o direito de me não querer ouvir.

Eu, se um dia não quiser ouvir S. Ex.a, como tenho pela sua pessoa uma grande consideração, para a não interromper, faço qualquer cousa que me permita não ouvir o que S. Ex.a diz.

Agora o que S. Ex.a não pode é impedir que eu fale.

O Sr. Afonso de Lemos:—Tenho muito prazer em ouvir S. Ex.% mas na ocasião oportuna.

O Orador:— O juiz da oportunidade não é S. Ex.a, nem soa eu, é o Sr. Presidente. Do contrário, cairíamos na anarquia e eu não sou anarquista.

Ora a lei estabelece que, se não for amm* ciado o regime de liberdade, está de facto continuado o regime do monopólio e o Governo não o pode passar a novos concessionários dentro de trinta anos, mas terminado esse prazo, pode concedê-lo.

O Sr. Medeiros Franco (interrompendo}:— Nos termos da base 15.a o Governo anunciou, com larga antecedência, o regime de liberdade.

A lei não exige que seja o último Governo; o Ministério da presidência do Sr. José Domingues dos Santos apresentou ao -Parlamento uma proposta de lei anunciando o regime de liberdade.

O Orador : — S. Ex.a está a confundir iniciativas que o Governo tomou e que apresentou ao Parlamento com actos do Poder Executivo.

Eu não confunde a iniciativa de uin Governo que apresenta uma proposta de lei com um acto do .Governo, como Poder Executivo.

A lei autoriza o Governo a praticar actos ^independentes da acção parlamentar.

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Vasco Marques quis colocar o Governo dizendo que, se o Governo tinha lei, não precisava de apresentar nenhuma proposta de regime provisório ao Parlamento.

O Governo apresentou a proposta — e disso discordo eu— exactamente porque queria fazer questão aberta.

Era, portanto, o Parlamento que tinha de resolver o assunto revogando uma lei existente.

Existia uma lei que obrigava o Governo a tomar conta do monopólio do Estado.

O Governo para mostrar que fazia do assunto questão aberta, apresentou a proposta de lei ao Parlamento, para este resolver.

O Sr. Querubim Guimarães (em aparte) :— Sr. Herculano Galhardo : não estou neste momento disposto a usar da palavra para salvar ninguém, embora pessoalmente me fosse muito agradável salvar V. Ex.a

V. Ex.a tem feito todos os esforços para mostrar a constitucionalidade da moção mas ainda não o conseguiu.

O que certamente agradaria mais neste momento seria que a moção fosse retirada da Mesa.

O Orador:— Sr. Presidente : parece-me que o aparte do Sr. Querubim Guimarães não destruiu em cousa alguma a força legal da minha afirmação.

Existe o artigo 15.° da carta de lei de Março de 1891, que li.

Portanto, se o Governo não anunciou a tempo que se ia passar ao regime da liberdade, aceitando os requerimentos que lhe fossem apresentados para o estabelecimento de novas fábricas, que não poderiam começar a laborar-dentro do prazo da concessão, era porque continuava o regime do monopólio nas mãos do Estado.

Isto pelo lado da lei.

Pelo lado do contrato vemos que no caso de isso suceder, isto é, de continuar o monopólio, o Governo tomava conta dos tabacos em rama, evidentemente para continuar a aplicá-los, fazendo o monopólio do Estado.

Sobre isso não pode haver dúvidas.

Por isso digo que não se trata de um bill de indemnidade.

Trata-se apenas de saber se existia ou não lei em vigor, e se o Governo procedeu ou não em harmonia com essa lei.

Ora isto é constitucional, o o Senado pode íazê-lo.

Qualquer de nós pode num dado momento pronunciar-se sobre n legalidade ou ilegalidade de uma lei vigente.

Seria engraçado proibir o Senado de o fazer.

O Sr Medeiros Franco não acredita na existência desta lei.

Mas coino o Governo sabe que tem essa lei, cumpre-a; por isso a moção do Sr. Augusto Monteiro diz que o Governo era obrigado a fazer o que fez.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Afonso de Lemos (para explicações) : — Sr. Presidente: só duas palavras. Quando o Governo aqui se apresentou, o Sr. Herculano Galhardo disse ao Sr. Presidente do Ministério que não poderia oferecer-lhe uma almofada de sumaúma, mas sim lhe oferecia uma almofada de boa palha portuguesa.

O Sr. Herculano Galhardo: — Disse efectivamente, mas não quando o Governo se apresentou; foi noutra ocasião.

O Orador: — Ora hoje, como o Sr. Herculano Galhardo, representante da maio • ria, sabe que o Sr. Presidente do Ministério faz anos, resolveu oferecer-lhe, não a almofada de palha, mas a almofada de feno, isto é, a almofada mais suave possível. Felicito S. Ex.a o Sr. Presidente do Ministério, e estou convencido que S. Ex.a em troca desta atitude da maioria continuará a empregar todas as suas diligências para conseguir fazer triunfar a régie, que eu traduzo em bom português por «bolo rei».

Estou também convencido que o Sr. Presidente do Ministério, tendo depois de distribuir esse bolo rei por todo o Partido Democrático -que há por esse País fora, ficará apenas com um bocadinho para si, e esse bocadinho é a fava.

Risos.

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seja professor de lógica, mas porque não quero deixar os meus créditos por mãos alheias.

Disse eu que a moção do Sr. Alves Monteiro era a conclusão que naturalmente teria unia discussão sobre o assunto. Ora como nós aqui não discutimos o assunto cos tabacos, nem a acção do Governo sobre esse ponto, porque isso está afecto à Câmara dos Deputados, estamos portanto a tirar uma conclusão sem pormissas.

O orador não reviu.

O Sr. Ferraz Chaves t — Sr. Presidente: como não tenho porta-voz nesta casa do Parlamento, vejo-me forçado a fazer algumas considerações que são quâsi que uma declaração de voto.

Folgo em primeiro lugar por ver que por mais maligna que seja a doença precisa de ambiente para se desenvolver. Ora esta maligna doença de qne sofre a política portuguesa não encontrou, felizmente, no Senado o ambiente provocador. Deste modo mantivemos as tradições desta casa fazendo uma discussão que, embora apaixonada, correu com correcção e com delicadeza.

Apoiados.

Se uso da palavra é porque me vejo nesta contingência: tenho, pelo Regimento, de votar. Se voto contra a moção apresentada, isso pode interpretar-se como votando contra um acto do Governo que eu desaprovo. Mas se voto a favor, poderia entender-se que voto absolutamente toda g, atitude do Governo na questão dos tabacos,'e eu não desejo dar a conhecer ainda, neste momento, o que tenciono fazer quando a questão vier a esta Câmara. Sou dos poucos que têm acompanhado os argumentos de uns e outros para poder formar um juízo seguro e consciente-monte emitir a minha opinião. Infelizmente desnorteou-se um pouco dando lugar a que em vez de ouvir argumentos ouvi tacão, e em lugar de palavras ouvi pateadas.

Também sou absolutamente contrário a ditaduras, não apenas em teoria, e permitam-me V. Ex.as que eu recorde que já com armas na mão e arriscando um pouco a vida e um pouco a minha liberdade combati duas ditaduras.

Do Partido Democrático saí por uma

questão de princípios, quando entendi que ele patrocinava claramente uma ditadura, e não por qualquer questão com os meus correligionários, dos quais não recebi agravos.

Não aceito ditaduras, nem do Governo do Sr. António Maria da Silva, nem de nenhum Governo republicano, nem do nenhuma oposição contra uma maioria que, pelo regime que nos governa, é que tem de governar o País. Tanto ó ditadura um homem qua sai para fora das leis, como o querer sobrepor-se fazendo vencer o barulho contra a votação do maior número.

É o que terá de triunfar? Pois seja, mas que cada um defina até o fim a situação em qne se coloque.

Se amanhã um novo Governo for ocupar as cadeiras do Poder, resultando dessa situação, que se lhe possa dizer:

— Aí está o resultado da sua má administração e da sua incompetência.

Voto a moção que está na Mesa, tam somente significando que aprovo o acto do Governo "tomando conta das fábricas, acto praticado por virtude de ordem pública, do lei e de bom senso.

Estou convencido do que, fosse qual fosse o processo que o Governo adoptasse, o Governo do Sr. António Maria da Silva, ou outro qualquer, as oposições, aquelas ou estas, levantariam sempre uma grave questão, porque nós temos a triste sina de tnr sempre através da história a -questão dos tabacos como um dos maiores escolhos da nossa vida.

Declaro ainda que a votação da moção a que mo refiro não me acarreta também qualquer compromisso para a votação da questão cios tabacos, cue eu procurarei apreciar simplesmente a bem dos interesses do País, e longe dos desvairamentos que afectam todos os políticos portugueses, sejam eles quais forem.

Tenho dito.

Apoiados.

O orador não reviu.

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tuei .1 considerar S. Ex.a, e, através da minha vida política, ainda mais se vincou no meu espírito essa consideração, e até a minha amizade.

Não é, evidentemente, causa de inimizade, ou falta de consideração o ter um ponto de vista contrário.

Se a S. Ex.a não respondi imediata mente, do que lhe pedi desculpa, foi por se ter generalizado o debate e assim eu ter ensejo de a todos os ilustres Senadores responder de uma só vez, não estando a pedir a palavra constanteniente.

Referindo-se ao problema em questão, que no dizer de S. Ex.a é de tal importância, que dele pode —e deve realmente — advir o rejuvenescimento das nossas finanças e da nossa ecouomia, afirmou o ilustre Senador que ele tinha apaixonado a opinião pública.

E a verdade é que ainda não vi que a opinião pública se apaixonasse por forma a traduzir-se essa paixão por perturbações em qualquer parte do território português. Por muitas .que sejam as atoardas, sobre a análise deste problema, já têm decorrido alguns meses, e. felizmente, pelo menos até agora, estamos todos sossegados. Há, evidentemente, a paixão, a luta entre os partMos políticos; há o desejo do Poder, nada mais.

E sei perfeitamente que a palavra «ditador», aplicada à minha pessoa e aos meus ilustres colegas é usada simplesmente para efeitos políticos.

Há pouco, o ilustre Senador Sr. Medeiros Franco referiu-se à veneranda figura do Presidente desta casa do Parlamento, declarando que S. Ex.a nunca podia sor cúmplice de qualquer deliberação aqui tomada que fosse inconstitucional. Nessa mesma ordem de considerações falou o ilustre leader da maioria democrática do Senado; que não era só a veneranda figura do ilustre Presidente desta asseni-blea, que a mesma maioria respeitaria inteiramente a Constituição e a faria respeitar.

Creio que os meus actos no Governo e fora do Governo são pleno testemunho de que ninguém me pode atirar uma pedra. Já pretenderam atirar-ma muitas pessoas que defenderam ditadores, contra os quais me pus em rebelião; mas isso não deve ser trazido para esta Câmara, da qual não >teho a honra de fazer parte.

Chamarem-me ditador, nas condições em que o fazem, não me interessa.

Nem sequer responde a S. Ex.as o eco da sua própria voz. Quem tem procedido como eu, através de uma vida pública já larga, de responsabilidades de Governo ou de apoio a Governos, evidentemente não lhe interessa que lhe chamem essas cousas, porque está absolutamente convencido de que as pessoas que lho chamam não são ouvidas facilmente.

0 Governo apresentou o problema ao Parlamento por um supremo desejo que, afinal de contas, não foi considerado, nem respeitado — o de integrar todos os republicanos mima solução que não é de hoje, mas já de longa data.

Apresentou, repito — nem podia deixar de o fazer T-um projecto de lei que consubstanciava a doutrina do Partido Republicano Português.

Apareceram na Mesa da outra Câmara três projectos de regime definitivo-e outros três de regime provisório. O Governo trouxe à Câmara um de regime provisório porquê lho solicitaram.

Se o Parlamento está a dois meses de vista da Apresentação do problema pelo Governo e se não pronunciou até 30 de Abril sobre o assunto, não se pode dizer que houve deslealdade da minha parte, tanto mais que eu disse que chegado ao termo do contrato e não tendo determinação parlamentar tomaria as providencias que o caso requeria —porque o Governo não era uma esfinge, que ficava a olhar para as cousas como um boi para o palácio.

Disse isto claramente, veio mesmo publicado nos jornais; não se pode portanto acusar o Governo de falta de lealdade.

1 Pois apesar desta declaração tam expressa, tam leal e tam de harmonia coni as responsabilidades de um Governo, parece que muita gente ficou absorta quando tomamos as providências que não podíamos deixar de tomar!

Se nós não tivéssemos procedido assim, vergastavam-nos por isso.

Para o público o que interessa é que Ihe^dêm tabaco —e pelos mesmos preços.

E isto o que o público quere.

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ta gente dizia que preferia que lhe dessem tabaco em vez de pão.

O público vê que tem tabaco que não é mais caro, que se procede com honestidade, e portanto nele não têm ecor.do o que vem nas gazetas. Nestas tais termos se empregam com tanta frequência, que acabam per perder o seu significado.

Discutem-nos empregando insultos. Ora, sem provas de actos criminosos praticados, só demonstra que quem insulta quere ocultar actos próprios censuráveis.

Mas o Governo, no seu prognóstico conciliador, tem lançado várias pontes de passagem para uma discussão correcta, porquanto íazemos o possível para evitar perturbações na sociedade portuguesa.

Não tem c Governo culpa de que não tenham querido entrar numa discussão como devia ser feita.

E embora os ilustres jurisconsultos declarem que o Poder Executivo não podia decret-ar a liberdade de indústria, e embora todas as Faculdades tenham também essa opinião, não há ninguém que seja capaz de me fazer acreditar que não pertence exclusivamente ao Governo o direito de decretar essa liberdade.

Faço justiça ao Sr. Pestana Júnior, porque num problema desta ordem naturalmente S. Ex.a tinha os mesmos intuitos elevados ene animam este Governo.

Quanto às justas censuras do Sr. Her-culano GaDiardo, também disso rae acuso eu.

Mas porque o fiz?

Foi ainda no desejo de se não darem estes tristes espectáculos que temos presenciado.

E, Sr. Presidente, mais uma vez devo dizer a V. Ex.a que não praticamos ~im acto ditatorial.

Temos congregado os máximos esforços não só para unirmos todos os republicanos, mas também para prestígio das instituições parlamentares.

E ainda só permitem acusar-nos os próprios que praticam o mal.

E aiada há um homem que nos acusa de ditadores, e que quere a ditadura das minorias absolutamente inconfessável num regime democrático.

Se V. Ex.as querem ver as armas com que nos querem ferir vou ler uma passagem.

Leu.

Outra passagem de ouro vou ler a V. Ex.as como conclusão de uma tese.

Do homem que mais escreve hoje contra o Governo e que tudo quanto tem foi criado no tal partido de ditadores : o Sr. Alberto Xavier.

Tenho dito.

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Antes de ler a moção tenho também de dizer da minha justiça.

Tenho procurado dirigir sempre os trabalhos desta Câmara com a máxima imparcialidade.

Apoiados de todos os lados da Câmara.

Não sou membro de um partido; aqui sou apenas Presidente da Câmara.

Muitos apoiados.

Acoitei esta moção porque, à face da Constituição, parece-me que esta Câmara ó uma Câmara política. E tanto mais disto estou convencido, quanto é certo que, apesar do espírito brilhante do Sr. Medeiros Franco, S. Ex.a valeu-se do direito consuetudinário.

Em Janeiro de 1925, se não estou em erro, uma moção apresentada pelo Sr. Augusto de Vasconcelos fez cair um Ministério, que tinha maioria na Câmara dos Deputados.

Já vêem V. Ex.as que esta Câmara tem funcionado como Câmara política. E nesses termos é que ou aceitei a moção.

Lamento profundamente que colegas tam estimados tenham de tomar semelhante atitude.

S. Ex.LS com esse acto não prejudicam a Kepública, porque tem fundas raízes no coração do povo, mas dão argumentos aos que são contrários à existência do Parlamento.

Vá: ler-se a moção.

Lê-se na Mesa a moção do Sr. Augusto Monteiro.

Saem da sala as minorias nacionalista, monárquica e esquerda democrática, e os Srs. Roberto Baptista e Caldeira Queiroz.

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O Sr. Herculano Galhardo (sobre o modo de votar]: — Kequeiro que se laça votação nominal.

Consultada a Câmara, foi aprovado o requerimento. .

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à chamada.

Disseram aprovo os Srs. Senadores:

Álvaro António de Bulhão Pato. António da Costa Godinho do Amaral.

António Maria da Silva Barreto. António Xavier Correia Barreto. Artur Augusto da Costa. Artur Octávio do Rego Chagas. Augusto Casimiro Alves Monteiro. Augusto de Vera Cruz. Constantino José dos Santos. Domingos Frias de Sampaio e Melo. Elísio Pinto de Almeida e Castro. Francisco António de Paula. Francisco José Pereira. Francisco de Sales Ramos da Costa. Francisco Vicente Ramos.

Frederico António Ferreira de Simas. Herculano Jorge Galhardo. João Augusto de Freitas. João Carlos da Costa. João Manuel Pessanha Vaz das Neves.

Joaquim Correia de Almeida Leitão. Joaquim Manuel dos Santos Garcia. Joaquim Pereira Gil de Matos. José António da Costa Júnior. José Mendes dos Reis. José Nopomuceno Fernandes Brás. José Varela.

Júlio Augusto Ribeiro da Silva. Luís Augusto Simões de Almeida. Luís Inocêncio Ramos Pereira. Miguel do Espírito Santo Machado. Pedro Virgolino Ferraz Chaves. Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

O Sr. Presidente: — Aprovaram a moção 33 Srs. Senadores.

A próxima sessão é na sexta-feira, 28, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Lram 18 horas e 40 minutos.

O REDACTOR—Albano da Cunha.

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