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22 DE FEVEREIRO DE 1935 351

O Sr. Diniz da Fonseca:-Sr. Presidente: poucas palavras sobre o problema que neste momento está posto à Assemblea.
O Sr. Dr. Cunha Gonçalves propôs que entre os dois sistemas que o Sr. Dr. Mário de Figueiredo considera mais lógicos, e que são, pelo menos, aqueles que resolvem o problema, mais facilmente - de ratificação de todos os decretos ou de não ratificação de nenhum decreto -, se pusesse um outro problema : necessidade de ratificação dos decretos quando o Governo os publica estando aberta a Assemblea Nacional e desnecessidade de ratificar os decretos quando o Governo os publica estando encerrada a Assemblea.
Não posso deixar de dizer que há na proposta do Sr. Dr. Cunha Gonçalves alguma cousa também de lógico, de natural e de muito aceitável. Pelo menos, reflectindo na proposta que S. Ex.ª mandou para a Mesa, não pude deixar de verificar esta razão, e por isso a votarei.
De facto, se os decretos são publicados pelo Governo por urgência e necessidade publicas, porque só nesta hipótese ele os poderá publicar à sombra da letra constitucional, é natural, é certo mesmo que eles terão, na maior parte dos casos, um efeito de carácter transitivo, e, por conseguinte, a ratificação ou não ratificação que a Assemblea lhes desse, nove meses depois, era uma pura inutilidade, que viria ainda complicar os trabalhos desta Assemblea, porque, devendo ser apresentados todos nas primeiras cinco sessões, podiam ser mais de duzentos os projectos de lei que a Assemblea tinha de conhecer e apreciar, muitos deles, senão todos, já sem proveito ou necessidade.
Mas partamos da hipótese de que esses decretos, sendo de urgência e necessidade públicas, não têm efeito transitivo. Se eles foram publicados pelo Governo, porque reconheceu que eram de necessidade pública, vejam V. Ex.ªs a situação em que colocamos as leis, cujo primeiro efeito, ou, por outra, cuja primeira necessidade, para que elas tenham o efeito que devem ter num País em que toda a gente supõe que as leis se fazem para não se cumprirem, é a coacção suficiente para o seu absoluto cumprimento. Esse efeito psicológico de uma lei sobre os cidadãos perde-se completamente no dia em que o País souber que o Governo publica as leis sómente com vigência até à próxima abertura da Assemblea ; e, assim, a urgência e necessidade públicas que o Governo tivera ao publicar essas leis ficam manifestamente prejudicadas.
Mas há mais - e esta é para mim a razão decisiva que me inclina para a proposta do Sr. Dr. Cunha Gonçalves: é que o texto constitucional, que era lógico na primitiva urdidura constitucional, perdeu hoje muito do seu valor.
Como V. Ex.ªs sabem, nós aprovámos já nesta Assemblea um texto de modificação da Constituição pelo qual o Governo pode - e poderemos dizer deve - ouvir a Câmara Corporativa quando publicar os seus decretos-leis. De maneira que nós estamos neste momento numa posição inteiramente diferente da que estávamos há poucos dias.
Não podemos dizer que o País não foi ouvido, não podemos já dizer, como quando, por exemplo, aqui apreciámos a proposta de ratificação dos decretos sobre os vinhos, que deviam ser ouvidos os técnicos, porque já o foram.
De maneira que, quando o Governo publica um decreto estando a Assemblea encerrada, ouve o País através dos técnicos competentes, a fim de estes lhe darem a sua opinião, tendo em conta os interesses fundamentais ...

O Sr. Antunes Guimarãis (interrompendo): - Em caso de urgência não há tempo para consultar a Câmara Corporativa. Há assuntos que não podem esperar nem um dia. Há diplomas que têm de ser imediatamente publicados.

O Orador: - Muito bem. Pois se não há tempo para consultar a Câmara Corporativa, que o Governo pode convocar imediatamente, dentro de vinte e quatro ou quarenta e oito horas, (g com o querem V. Ex.ªs que uma proposta dessas esteja em suspenso até que a Assemblea Nacional reabra?...

O Sr. Mário de Figueiredo (interrompendo): - E que realmente V. Ex.ª está a raciocinar de uma maneira que não corresponde ao estado de facto, e, portanto, as conclusões que V. Ex.ª tira são lógicas; mas, como lógicas não quere dizer verdadeiras, o certo é que elas não são efectivamente verdadeiras.
A afirmação da necessidade de suspender a execução de um decreto pelo facto de ficar dependente da sua ratificação definitiva não corresponde à verdade, porque essa execução não está, com efeito, na dependência da ratificação.

O Orador: - V. Ex.ª é que está a argumentar desprezando o valor de um argumento que pus à consideração da Assemblea, qual é o valor psicológico que é indispensável atribuir à lei...
V. Ex.ªs têm atrás de si uma legislação publicada em Ditadura, que teve a sua eficácia e o seu valor precisamente porque não necessitou de ratificação.
E se daqui para o futuro todos os decretos que forem publicados necessitarem de ser ratificados, o País duvidará da sua eficácia e ido seu valor.

O Sr. Angelo César: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Sim, senhor.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ªs não podem interromper o orador. Desta forma não sei dirigir os trabalhos da Assemblea.

O Sr. Angelo César: - Peço perdão a V. Ex.ª, mas o orador deu-me licença para o interromper.
Lembro, pois, a S. Ex.ª que a mobilização de interesses só pode fazer-se através de interesses.

O Orador: - V. Ex.ª está enganado. E, se V. Ex.ªs procurassem nos bastidores da política deste País, V. Ex.ªs veriam o que eu tive ocasião de verificar durante sete anos.

O Sr. Carlos Borges (interrompendo): - Mas isso não se pode dar agora.

O Orador: - Eu acredito que todos os que estão nesta Assemblea são pessoas honestas e absolutamente incapazes de se deixaram subornar por interesses, mas nós estamos aqui ,a fazer um trabalho de Estatuto Constitucional, não só para nós como para quantos possam no futuro vir a sentar-se nestas cadeiras. E, apesar do respeito que eu tenho por todos os meus concidadãos ...

O Sr. Henrique Cabrita (interrompendo): - O Estado Novo é definitivo em Portugal (Muitos apoiados).

O Orador:- O Estado é onovo nas suas fórmulas e nas suas intenções, mas há ainda dentro dele muitas cousas que são velhas.
Tenho dito.