O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

16 DE MARÇO DE 1974 851

O Orador: - Nunca é de mais repeti-lo e manifestar-lhe a nossa gratidão

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Castro Salazar: - Sr. Presidente, Srs Deputados. A doença do sono foi no século passado e no primeiro quartel do actual o flagelo que mais duramente atingiu as populações da África tropical e a responsável pelo despovoamento de extensas regiões e decadência de muitas outras, até então florescentes e prósperas
A tripanossomíase humana, vulgarmente conhecida por doença do sono, fez o seu aparecimento em África nos fins do século XVIII, sendo em 1803 assinalada pela primeira vez por Winterboton entre os escravos oriundos de Benin Em 1840 Clarke detectou a existência da doença na Costa do Ouro e na Serra Leoa, e em 1864 Kral e Bellay observaram-na entre os indígenas do Congo
Supõe-se que só a partir de 1871 a afecção atingiu a província de Angola, tendo-se registado os primeiros casos nas margens do Cuanza, na região de Muxima e Quissama, foco inicial donde irradiou para outras regiões de Angola
Na ilha do Príncipe a tripanossomíase fez o seu aparecimento em 1895, calculando-se que a mosca tsé-tsé, seu vector biológico, se tivesse introduzido na ilha trinta anos antes, proveniente da costa do Gabão, e por esse motivo é conhecida entre os seus habitantes como «mosca do Gabão» Foi contudo a partir de 1877, a seguir à chegada de serviçais oriundos da região de Cazengo e das margens do Cuanza, que a doença do sono começou a manifestar-se na ilha de forma epidémica, sendo já assustadora em 1885 a mortalidade por ela causada entre os serviçais das propriedades agrícolas, convertendo-se a breve prazo em autêntico flagelo para todos os habitantes da pequena ilha
A população nativa, que em 1885 era constituída por 3000 pessoas, foi duramente atingida pela doença, ficando reduzida a 800 habitantes em 1900 e não contando em 1907 mais do que 350, pelo que se chegou a admitir a hipótese de um abandono total da ilha
Entretanto, várias missões médicas se deslocaram ao Príncipe a fim de estudar e combater a doença Saliento a primeira dessas missões, constituída em 1901, na qual participaram, entre outros, dois eminentes médicos, os Drs Aníbal Bettencourt e Ayres Kopke, a qual desenvolveu obra meritória tanto nesta ilha como em Angola, onde se deslocou também As investigações que os seus cientistas efectuaram no campo da etiopatogenia da doença do sono, muito embora não culminassem com a descoberta do agente infeccioso - este viria a ser descoberto um ano mais tarde por Castellani no sangue e líquido cefalo-raquidiano de indivíduos portadores da moléstia -, revestiram-se contudo de inegável valor científico

O Sr. Cancella de Abreu: - Muito bem!

O Orador: - Foi, no entanto, para me referir, em breves palavras, à última missão enviada ao Príncipe para combater o terrível flagelo que tantas vítimas causou que eu pedi a palavra. Chefiada pelo Dr. Bruto da Costa, actuou no Príncipe entre 1911 e 1914 e dela fizeram parte, além deste ilustre médico, os Drs Correia dos Santos, Firmino Santana e Araújo Álvares A missão realizou uma notável, difícil e muitas vezes incompreendida campanha, cujo êxito foi absoluto, não só porque conseguiu debelar uma doença que por pouco não conduziu ao extermínio total da população, como levou à erradicação do insecto vector da doença - a mosca tsé-tsé ou glossina -, eliminando-se o perigo latente de futuras epidemias da terrível afecção Pela primeira vez no Mundo se conseguiu eliminar uma população glossínica no seu próprio habitat, facto verdadeiramente notável que muito prestigiou os nossos serviços médico-sanitários e honrou o País. Tal acontecimento teve lugar justamente há sessenta anos, e eu não queria deixar de o lembrar perante VV. Ex.ªs e, ao mesmo tempo, prestar justa homenagem a quem, com invulgar inteligência, saber e determinação, tornou possível o perfeito êxito da campanha - o médico dos serviços de saúde do ultramar Dr Bruto da Costa

O Sr Gardette Correia: - Muito bem!

O Orador: - Há dias, na Academia das Ciências, o Prof Fraga de Azevedo, em oportuna comunicação, louvou a actividade enérgica e modelar do Dr Bruto da Costa e seus colaboradores, que levou com a maior originalidade a uma das mais brilhantes campanhas sanitárias em África, realizada por Portugal no campo da medicina tropical Também em livro recentemente publicado, Man Against Tse Tse - Strugle for África, o seu autor, John J McKelvey Jr, presta homenagem ao esforço desenvolvido pelos cientistas portugueses no estudo e combate às tripanossomíases, pondo em realce o trabalho levado a cabo pelo Dr. Bruto da Costa na eliminação da doença do sono e erradicação das glossinas na ilha do Príncipe

O Sr Cancella de Abreu: - V Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com muito gosto.

O Sr Cancella de Abreu: - Associo-me plenamente à homenagem que V. Ex.ª está prestando aos cientistas nacionais que deram um contributo tão válido para o combate à doença do sono. Essa homenagem é não só devida por nós, nacionais, mas teve também uma repercussão internacional, que não é demasiado aqui referir neste momento

O interruptor não reviu

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Cancella de Abreu, pela sua achega, que veio, de certa maneira, valorizar esta minha comunicação
A propósito, seja-me permitido dizer que o autor se refere larga e elogiosamente à segunda campanha de erradicação da mosca do sono na mesma ilha - reintroduzida muito provavelmente a partir da Guiné Equatorial, quarenta anos após ter sido capturada a última glossina no Príncipe, em 1914 -, realizada pela Missão de Combate às Glossinas da Ilha do Príncipe no curto espaço de dois anos (1956-1958) e utilizando métodos que não coincidiram com os da campanha anterior

Resultados do mesmo Diário
Página 0847:
da eliminação da doença do sono e erradicação das glossinas na ilha do Príncipe Ordem do dia. - Iniciou
Pág.Página 847
Página 0852:
referências que vem fazendo acerca da erradicação da doença do sono na ilha do Príncipe. No que diz
Pág.Página 852