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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIADO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

QUINTA-FEIRA, 17 DE JULHO DE 1975 * NÚMERO 18

SESSÃO N.º 17, EM 16 DE JULHO

Presidente: Exmo. Sr. Vasco da Gama Fernandes

António Arnaut
Secretários: Exmos. Srs. Carlos Alberto Coelho de Sousa
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente leu de novo a alínea f) do artigo 20.º do Regimento da Assembleia Constituinte, que respeita à ordem e disciplina na Sala.
Foram, apresentadas rectificações ao n.º16 do Diário da Assembleia Constituinte.
Deu-se conta do expediente.
Foi lido na Mesa um requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Moura Guedes (PPD), tendo os Srs. Deputados Manuel Monteiro (PS) e Coelho dos Santos (PPD) usado da palavra igualmente para apresentar requerimentos.
O Sr. Deputado António Arnaut (PS) prestou esclarecimentos à Assembleia acerca do sentido da sua intervenção ultimamente proferida sobre a situação política actual, designadamente acerca de certa frustração das populações em relação ao processo revolucionário e às limitações das liberdades fundamentais do cidadão e do arguido.
O Sr. Aquilino Ribeiro (PS) usou da palavra para emitir um voto de protesto face à situação extremamente preocupaste em que se encontra encarcerado no Chile o grande antifascista Luís Corvalan e ainda às bárbaras condições a que o Governo do Chile submete todos os demais presos políticos. Este voto foi aprovado pela Assembleia, tendo usado da palavra para uma declaração de voto o Sr. Deputado Octávio Paro (PCP).

Ordem do dia - Prosseguiu o debate na generalidade dos projectos de Constituição apresentados pelos partidos. Usaram da palavra os Srs. Deputados Casto Andrade (PPD), José Luís Nunes (PS), Costa Andrade (PPD), Amândio de Azevedo (PPD), Vital Moreira (PCP), Coelho dos Santos (PPD), Basílio Horta (CDS), Américo Viveiros (PPD), Lopes Cardoso (PS), Jaime Gama (PS), Amaro da Costa (CDS) e Carlos Brito (PCP).
O Sr. Presidente interrompeu a sessão às 17 horas e 40 minutos. reabrindo-a às 18 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente informou ter chegado à Mesa um oficio do Sr. Presidente da Comissão Nacional Instaladora da Assembleia Constituinte comunicando que o Governo estabeleceu, através do Decreto-Lei n.º 370175, de 16 de Junho, contra a
opinião da Comissão, diversas medidas que contrariam os interesse dos trabalhadores dos serviços encarregados da elaborarão do Diário, nomeadamente no que respeita ao não pagamento das horas extraordinárias a que são obrigados, pelo que estes dariam por findos os seus trabalhos logo que fosse cumprido o seu horário normal. Nestas circunstâncias, o Sr. Presidente informou a Assembleia de que não poderiam prosseguir os trabalhos a partir das 18 horas e 30 minutos.
Sobre este assunto pronunciaram-se os Srs. Deputados Lopes Cardoso (PS) e Mota Pinto (PPD), que manifestaram a sua solidariedade com os trabalhadores da Assembleia Constituinte, temia o primeiro exprimido o agradecimento do Grupo Parlamentar do PS pela forma dedicada como aqueles têm prestado a sua colaboração aos trabalhos e envolvendo nessa homenagem a Comissão Nacional Instaladora da Assembleia Constituinte. A propósito, pronunciaram-se ainda sobre a situação criada aos Srs. Deputados pelo facto de ainda não ter sido publicado o diploma referente aos seus subsídios.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

ADIM - MACAU

Diamantino de Oliveira Ferreira.

CDS

António Francisco de Almeida.
António Pais Pereira.
António Pedreira de Castro Norton de Matos.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Domingos José Barreto Cerqueira.

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400 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 18

Emílio Leitão Paulo.
Francisco Luís de Sá Malheiro.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.
Manuel José Gonçalves Soares.
Manuel Raimundo Ferreira dos Santos Pires de Morais.
Maria José Paulo Sampaio.

MDP/CDE

Álvaro Ribeiro Monteiro.
José Manuel Marques do Carmo Mendes Tengarrinha.
Luís Manuel Alves de Campos Catarino.
Manuel Domingos de Sousa Pereira.
Orlando José de Campos Marques Pinto.

PCP

Adriano Lopes da Fonseca.
António Branco Marcos dos Santos.
António Joaquim Gervásio.
António Malaquias Abalada.
Carlos Alfredo de Brito.
Eugénio de Jesus Domingues.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando dos Santos Pais.
Francisco Miguel Duarte.
Georgette de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Hilário Manuel Marcelino Teixeira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Honrado.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Marques Figueiredo.
José Pedro Correia Soares.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Vital Martins Moreira.

PPD

Abel Augusto de Almeida Carneiro.
Abílio de Freitas Lourenço.
Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Alfredo António de Sousa.
Alfredo Joaquim da Silva Morgado.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Américo Natalino Pereira de Viveiros.
Antídio das Neves Costa.
António Joaquim da Silva Amado Leite de Castro.
António Júlio Correia Teixeira da Silva.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Maria Lopes Ruano.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Armando António Correia.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Artur Morgado Ferreira dos Santos Silva.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Carlos Alberto Branco de Seiça Neves.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Carlos Alberto da Mota Pinto.
Carlos Francisco Cerejeira Pereira Bacelar.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Eduardo José Vieira.
Eleutério Manuel Alves.
Emanuel Nascimento dos Santos Rodrigues.
Emídio Guerreiro.
Fernando Adriano Pinto.
Fernando Alberto Matos Ribeiro da Silva.
Fernando Barbosa Gonçalves.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Monteiro do Amaral.
João António Martelo de Oliveira.
João Baptista Machado.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Coelho dos Santos.
Joaquim da Silva Lourenço.
Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda.
José António Camacho.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José António Valério do Couto.
José Augusto Seabra.
José Bento Gonçalves.
José Carlos Rodrigues.
José Casimiro Crespo dos Santos Cobra.
José Ferreira Júnior.
José Francisco Lopes.
José Gonçalves Sapinho.
José Manuel Afonso Gomes de Almeida.
José Manuel Burnay.
José Manuel da Costa Bettencourt.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Manuel Coelho Moreira.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Maria Augusta da Silva Simões.
Maria Élia Mendes Brito Câmara.
Maria Helena da Costa Salema Roseta.
Mário Campos Pinto.
Mário José Pimentel Saraiva Salvado.
Miguel Florentino Guedes de Macedo.
Nívea Adelaide Pereira e Cruz.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Nuno Guimarães Taveira da Gama.
Olívio da Silva França.
Orlandino de Abreu Teixeira Varejão.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Sebastião Dias Marques.
Victor Manuel Freire Boga.

PS

Adelino Augusto Miranda de Andrade.
Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alcides Strecht Monteiro.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Álvaro Neto Órfão.
Amarino Peralta Sabino.
Amílcar de Pincho.
António Alberto Correia Mota Prego Faria.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Duarte Arnaut.

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17 DE JULHO DE 1975

António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António José Gomes Teles Grilo.
António José Sanches Esteves.
António José d.e Sousa Pereira.
António Mário Diogo Teles.
António Pereira Rodrigues.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando Assunção Soares.
Aquilino Ribeiro Machado.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Alberto Leitão Marques.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Domingos do Carmo Pires Pereira.
Emídio Pedro Águedo Serrano.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Faustino Correia.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Eurico Telmo de Campos.
Fernando Alves Tomé dos Santos.
Florival da Silva Nobre.
Francisco Carlos Ferreira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Francisco Xavier Sampaio Tinoco de Faria.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Isaías Caetano Nora.
Jaime José Matos da Gama.
Jerónimo Silva Pereira.
João Alfredo Félix Vieira Lima
João Joaquim Gomes.
João Pedro Miller de Lemos Guerra.
João do Rosário Barrento Henriques.
Joaquim Antero Romero Magalhães.
Joaquim Laranjeira Pendrelico.
Jorge Henrique das Dores Ramos.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
José Alfredo Pimenta Sousa Monteiro.
José Fernando Silva Lopes.
José Luís de Amaral Nunes.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes,
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio Pereira dos Reis.
Ladislau Teles Botas.
Laura da Conceição Barraché Cardoso.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Luís Manuel Cidade Pereira de Moura.
Luís Maria Kalidás Costa Barreto.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.
Luís da Silva Lopes Roseira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel de Brito de Figueiredo Canijo.
Manuel Ferreira Monteiro.
Manuel Ferreira dos Santos Pato.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel João Vieira.
Manuel Joaquim de Paiva Pereira Pires.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Pereira Dias.
Manuel de Sousa Ramos.
Maria da Assunção Viegas Vitorino.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Fernanda Salgueiro Seita Paulo.
Maria Helena Carvalho dos Santos Oliveira Lopes.
Maria Teresa do Vale de Matos Madeira Vidigal.
Mário António da Morta Mesquita.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário de Castro Pina Correia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Pedro Manuel Natal da Luz.
Raquel Júdice de Oliveira Howell Franco.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria Antunes Pereira Rainho.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui Manuel Mendonça Cordeiro.
Rui Manuel Polónio de Sampaio.
Rui Maria Malheiro de Távora de Castro Feijó.
Sophia de Mello Breyner Andresen de Sousa Tavares.
Vasco da Gama Fernandes.
Vítor Manuel Brás.
Vitorino Vieira Dias.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 216 Srs. Deputados, pelo que temos quórum, e declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção das pessoas que se encontram nas galerias para a disposição da alínea f) do artigo 20.º do nosso Regimento, disposição que já foi lida mais do que uma vez, mas que nunca é de mais repetir.

1. Compete ao Presidente da Assembleia Constituinte:
.........................
f) Manter a ordem e a disciplina, bem como a segurança da Assembleia, podendo para isso requisitar e usar os meios necessários, tomando as medidas que entender convenientes, incluindo a expulsão da Sala, em caso de desrespeito à dignidade da Assembleia Constituinte ou perturbação ao bom andamento dos trabalhos;

Espero que o público, que acaba de ouvir ler esta disposição, compreenda que se torna indispensável que os trabalhos da Assembleia decorram com toda a dignidade e que não sejam perturbados por qualquer forma.
Compreendo também a dificuldade que tem a presidência de discernir e distinguir por vezes os infractores dos que são inocentes.
Procurarei, na medida do possível - do que humanamente me for possível - fazer essa distinção; no entanto, quero afirmar que, depois da actual advertência, serei extremamente rigoroso no cumprimento desta alínea f).

Pausa.

Segue-se a leitura de rectificações ao n.º 16 do Diário da Assembleia Constituinte.

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402 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º18

Foram lidas. São as seguintes:
Na p. 354, no início da minha intervenção, deve ler-se: «dado que foi aqui votada por maioria a decisão de que a discussão dos projectos se fazia em conjunto, eu queria perguntar à Deputada do Partido Comunista, que está no uso da palavra, se ela está a aplicar neste momento, não propriamente a decisão que foi tomada aqui por maioria, mas a proposta feita por esse Partido, dado que ela se refere apenas ao projecto do Movimento Democrático Português f...]».
Na p. 355 deve ler-se: «... O problema que foi posto não foi de legitimidade ou não do uso da palavra, porque eu acho que a Sr.a Deputada Alda Nogueira tem esse direito,- como eu afirmei. Eu apenas desejava, a título de esclarecimento, saber se, com louvável coerência, o Partido Comunista entendia discutir os projectos um a um ou se entendia aceitar democraticamente uma decisão que foi tomada aqui, oposta à do Partido Comunista, de se discutirem os projectos comparativamente.»
José Augusto Seabra (PPD).

Rectificação ao Diário da Assembleia Constituinte, n.º 16:
P. 352, col. 2.ª, l. 44, onde se lê: «período de antes da ordem do dia», deve ler-se: «período da ordem do dia».
António Reis (PS).

O Sr. Presidente: - Há alguma objecção a estes pedidos de rectificação?
Pausa.

Consideram-se aprovados.

O Sr. Cunha Leal: - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça o favor.

O Sr. Cunha Leal (PPD): - Eu pedi a palavra para fazer uma rectificação. No sumário, na parte relativa a antes da ordem do dia, no último parágrafo, lê-se o seguinte: «O Sr. Deputado Cunha Leal (CDS) refutou acusações que foram feitas ao CDS pelo Deputado da UDP e criticou a actuação do Partido Comunista Português.» Deve ler-se: «O Sr. Deputado Cunha Leal (PPD) refutou acusações que foram feitas a vários partidos pelo Deputado da UDP e criticou a actuação do PCP.»

O Sr. Presidente: - Pois, Sr. Deputado, esta rectificação, como acaba de ser informado pelo Secretariado, já está feita.

Expediente

O Sr. Secretário: - Recebeu-se do Sindicato de Seguros de Lisboa uma moção, aprovada em 7 do corrente mês em assembleia geral do Sindicato dos Trabalhadores de Seguros do Sul, protestando e repudiando energicamente as ameaças feitas pelo secretário-geral do Partido Socialista «de que estamos dispostos a paralisar o País».
Receberam-se 19 telegramas, apoiando a Assembleia Constituinte e o Secretariado Nacional do Partido Socialista, de núcleos do PS de Santo Ildefonso, de Serralves (Lordelo), da Areosa, Pasteleira do Sul, Caminha, Avintes, Leça da Palmeira, Trofa, Juventude Socialista de Lordelo, trabalhadores da Sundlete (Porto), enfermeiros da refinaria da Sacor, (Porto) e individuais.
Uma carta do Sr. António Manuel da Rocha, de Vila da Feira, testemunhando o seu apoio e a sua esperança em que a Assembleia possa desempenhar, cabal e livremente, as funções para que foi investida por voto secreto e livre do povo português.
Uma carta, remetida pelo Gabinete da Presidência da República, de Maria Helena Vilarinho, endereçada à Presidência da República, manifestando interesse em que a Assembleia Constituinte salvaguarde a democracia pluralista, assegure as liberdades fundamentais do homem, etc.
Uma carta de Faro, com várias assinaturas de um grupo de trabalhadores da Farauto, Lda, de Faro, manifestando «o nosso mais veemente repúdio contra a atitude de certas individualidades que ostensivamente procuram por gestos e palavras minimizar e ilegalizar o funcionamento da Assembleia Constituinte como órgão constitucional, que, na verdade, é composta por Deputados eleitos democraticamente pelo povo».
Foi recebido um bilhete-postal do Porto, do Sr. Canto Lacerda, militante do PPD, que dá o seu voto de confiança à Assembleia Constituinte, legitima representante da vontade popular. Foi também recebido um telegrama de Odemira, do núcleo do PPD desta vila, exprimindo o apoio à Assembleia Constituinte.
Do Gabinete da Presidência da República foi recebida uma carta de um grupo de católicos de Guimarães que «fazem votos para que o Santo Nome de Deus volte de novo a figurar na Constituição e que todos em unanimidade optem a favor dessa mesma causa, que é a causa de todos nós».

Risos.

Foi recebida uma carta de Miranda do Corvo, de Zulmiro José Moura de Figueiredo, em que diz que «foi demitido de zelador municipal», que foi um lutador antifascista, tendo sofrido prisões, a última de dois anos e meio, e sete anos de residência fixa; que requereu o reembolso de determinada quantia de que foi extorquido e que, até hoje, nada recebeu.
De Faro, do Sr. Orlando da Silva, que refere: «segundo li em determinado órgão de informação, os Deputados encontraram-se na Assembleia Constituinte apenas para encher a pança» (sic).
Risos.

Refere a seguir: «permito-me solicitar a V. EX.ª, Sr. Presidente, como partícula deste povo, me seja dado saber, não directa e pessoalmente, mas através dos trabalhos da Assembleia Constituinte, quais as retribuições atribuídas aos Srs. Deputados».

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Finalmente, um telegrama, enviado pela totalidade de militares da Comissão de Extinção da ex-PIDE/DGS e LP, Delegação de Coimbra, que vou ler:

Foi lido. É o seguinte:

Motivo não autorização dia 30 de Junho de 1975 visita advogado António Arnaut ao então detido Cadeia Penitenciária Coimbra padre Adriano Santo colaborador confesso ex-PIDE/ DGS deve-se apenas facto proibição total contactos com exterior por parte de agentes e informadores daquela polícia fascista após fuga Alcoentre dia anterior por outro lado desconhecemos se padre Adriano Santo terá constituído advogado António Arnaut virtude de não constar processo deste colaborador ex-PIDE/DGS respectiva procuração totalidade militares delegação Coimbra, Serviço Coordenação Extinção PIDE/DGS e LP solidariza-se justa posição tomada 30 de Junho de 1975 chefe delegação e repudia falsificação factos acima referidos e seu aproveitamento reaccionário ataques MFA e processo revolucionário totalidade de militares Delegação de Coimbra Serviço Coordenação Extinção PIDE/DGS e LP.

Totalidade de Militares Comissão Extinção da ex-PIDE/DGS e LP Delegação de Coimbra.

O Sr. Presidente: - Vai ser lido um requerimento que foi apresentado pelo Sr. Deputado Moura Guedes (PPD).

Foi lido. É o seguinte:

A fim de me habilitar a intervir na elaboração da Constituição, na parte respeitante à organização económica e social, requeiro me sejam fornecidos, pelos departamentos governamentais competentes, os seguintes elementos:

1.º Quais os contingentes de vinho e aguardentes vínicas exportados durante o corrente ano agrícola, com indicação discriminada das quantidades exportadas, preços praticados e países destinatários dessas exportações;
2.º Quais os contratos de exportação já celebrados à presente data e cujo cumprimento se destine a ser efectivado no decurso do próximo ano agrícola, com indicação dos respectivos países importadores, contingentes adquiridos e preços ajustados;
3.º Quais as medidas concretas que as entidades governamentais competentes pretendem pôr em prática, a curto prazo, para promover o rápido escoamento dos vinhos ainda em armazém, no produtor, bem como do produto da próxima colheita;
4.º Qual a orientação governamental no que concerne à formulação e concretização de uma política de preços de garantia para o vinho produzido pelos pequeno e médios empresários agrícolas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Manuel Monteiro para um requerimento.

O Sr. Manuel Monteiro (PS): - Nos termos do n.º 7, artigo 6.º, do Regimento, e para melhor debate da matéria da Constituição referente ao título «Da. organização económica», requeiro do Sr. Ministro do Comércio Externo e Turismo a seguinte informação:

Se a nível governamental se encontram traçadas algumas linhas fundamentais que enformem uma política de turismo, quer a nível nacional, quer regional, e mais detalhadamente no que respeita à zona do Algarve.

Do Sr. Ministro da Economia e Pescas e da Direcção-Geral de Portos:

Considerando o desenvolvimento do sector das pescas, e sendo Sagres uma tão rica zona de pesca e tão prometedora zona turística;
Considerando as condições em que ficaram os pescadores no dia 27 de Fevereiro deste ano, quando um grande temporal assolou esta vila piscatória, destruindo parte da sua frota pesqueira, lançando quase uma centena de pescadores no desemprego e causando mais de um milhar de contos de prejuízo;
Considerando os grandes anseios da população, que já os expressaram ao Sr. Ministro da Economia e Pescas e à Direcção-Geral de Portos, conforme a correspondência já enviada, requeiro me seja informado:

Se no planeamento de construções de portos foi considerada a legítima aspiração do povo de Sagres com a construção de um porto de abrigo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Coelho dos Santos.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - Ao abrigo das disposições legais vigentes, requeiro, com vista ao tratamento da matéria de «Segurança social» a integrar na Constituição, que, pelas entidades competentes, me sejam fornecidos elementos respeitantes à perda de pensões de reforma - a cargo da Caixa Geral de Aposentações - em função da arbitrária disposição contida no artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 16 669, de 27 de Março de 1929, e, designadamente:

1. Quantos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações se encontram privados das suas pensões, separando-se em conjuntos:
a) Por condenação nos tribunais plenários;
b) Por condenação nos tribunais comuns.

2. Medidas ou estudos - efectuados ou a efectuar - com o objectivo de se proceder à revogação do referido diploma.

Lisboa e Sala das Sessões da Assembleia Constituinte, 16 de Julho de 1975.

Pausa.

Sr. Presidente: Eu pedia um minuto para uma declaração separada do requerimento, se pudesse ser.

O Sr. Presidente: - Com certeza.

O Orador. - Como o requerimento não me permite, na sua formalização, equacionar os considerandos necessários para uma perfeita percepção do

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problema para quem não tenha presente a invocada disposição legal, eu pretendo esclarecer o seguinte: encontram-se, ao abrigo deste decreto-lei diploma promulgado em 1929 -, muitos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações privados do direito inalienável às suas pensões. Esta disposição legal abrangia não apenas os delitos políticos, porque interessava encapotar essa privação das pensões, abrangendo também alguns condenados por delitos comuns.
Eu prometo, na primeira oportunidade, desenvolver este assunto como me parece que ele deve ser tratado, porque afecta muitíssimas famílias que se vêem privadas do direito às pensões para as quais os trabalhadores descontam.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Estão inscritos para o período de antes da ordem do dia os Srs. Deputados António Arnaut e Aquilino Ribeiro.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - Srs. Deputados: o telegrama que eu vos li há pouco impõe-me, bem contra a minha vontade, dar um esclarecimento a esta Assembleia, e não só. Este telegrama, dimanado, conforme vos disse, dos militares que prestam serviço na Comissão de Extinção das ex-PIDE/DGS e LP em Coimbra, juntamente com um comunicado que foi amplamente divulgado pelos órgãos de informação escrita e falada, constitui uma grosseira deturpação da verdade dos factos e visa confundir a opinião pública, personalizando a minha intervenção, que, como todos sabem e podem verificar através da leitura do Diário da Assembleia Constituinte e do número especial do Portugal Socialista onde ela vem publicada, não teve nada de pessoal. A minha intervenção nesta Assembleia, que provocou até tomadas de posição que a mim se me afiguram precipitadas, visou essencialmente defender os princípios da verdade, da dignidade humana, das liberdades e dos direitos fundamentais do homem, do cidadão e do arguido. Direitos esses que, como eu disse, sempre defendi, em momentos bem mais difíceis do que este, e que sempre defendi com camaradas de todos os matizes políticos, porque nessa altura a luta que nós travávamos era a mesma, era a luta pela libertação da nossa Pátria oprimida pela fera fascista, era a luta pela restituição ao povo português das liberdades e garantias individuais que sempre nos foram negadas. E eu até, há muitos anos já, estive internado pela PIDE, exactamente por defender essas liberdades.
A minha intervenção aqui foi exigida pelo meu passado de luta antifascista, pela minha militância de sempre no Partido Socialista, cujos princípios de defesa da dignidade e das liberdades do homem são bem claros. Querer agora personalizar esta minha intervenção, chamando à colação um cidadão que se diz acusado de ligações com a PIDE/DGS é deturpar grosseiramente, como disse, essa minha intervenção, é usar uma táctica para minimizar a minha intervenção. Toda ela foi feita em nome dos princípios e não em nome de casos pessoais. Diz-se neste telegrama que a autorização para visitar o sacerdote em causa foi recusada porque, vou citar, «estavam proibidos contactos exteriores com agentes ou informadores daquela polícia, em virtude de no dia anterior terem fugido de Alcoentre os pides. Se essa explicação me tivesse sido dada, não teria havido o incidente que eu aqui relatei, passado com o Sr. Comandante desta delegação, o capitão Pereira da Costa, que, antes de saber quem é que eu pretendia visitar, me recusou essa autorização. E quero dizer a todos que no dia 30 de Junho, em que eu pedi essa autorização para visitar um conterrâneo meu que tinha direito a ser assistido por um advogado, eu ignorava completa mente a acusação que sobre ele impendia, visto que do mandato de captura constava apenas que ele pertencia a uma associação de malfeitores. Só dois ou três dias depois é que foi divulgada na imprensa uma carta infeliz desse sacerdote, escrita há cerca de dezanove anos, e dirigida à PIDE de Coimbra. Mas há muitas outras pessoas que hoje se dizem revolucionárias e que teriam talvez atitudes criticáveis. Se fôssemos a fazer essa indagação, muitos revolucionários de pacotilha, muitos revolucionários do 26 de Abril, certamente também seriam objecto de algumas críticas. Mas não é isso que está em causa. Eu não curo de saber as ligações que ele tinha com a PIDE/DGS, apenas quero afirmar que, no momento em que eu procurei visitar este detido, eu ignorava completamente essas ligações e, se tivesse conhecimento delas, abster-me-ia de o visitar, porque eu nunca darei o meu patrocínio a alguém que tenha colaborado, de perto ou de longe, com os torcionários da PIDE, que também a mim me perseguiram.

Aplausos.

Mas, como eu vos disse naquela intervenção, não era este o caso que estava em apreço ou não, era apenas este o caso. Foi de muitos outros, em que igualmente me foi negada a autorização para visitar os meus constituintes, alguns deles em militância antifascista muito antes do 25 de Abril, alguns deles que passaram pelas cadeias da PIDE, alguns deles que fizeram parte, como eu, da CDE em Coimbra, em 1969, e que foram militantes que se distinguiram pela sua coragem, pela sua lucidez è pela sua intransigência em defesa dos valores da liberdade, que eu aqui vim defender, também, naquela minha intervenção. Por isso, não está certo e chega a ser ofensivo, não para um Deputado do Partido Socialista, nem sequer para o advogado António Arnaut, mas para os valores éticos e morais que nós, socialistas e democratas, sempre defendemos.
Não está aqui em causa o problema de A, B ou C, o que está em causa é o da defesa dos direitos e liberdades do cidadão e do arguido. Foi esse o sentido da minha intervenção e qualquer pessoa medianamente inteligente, até um capitão do Exército, o podia compreender.

(O orador não reviu.)

Risos.

Aplausos.

Este discurso foi proferido na tribuna dos oradores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado, Aquilino Ribeiro.

O Sr. Aquilino Ribeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao abrigo da alínea e) do artigo 42.º do Regimento da Assembleia Constituinte, proponho, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que, respondendo ao apelo da Central Cubana de

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Trabalhadores, seja emitido o seguinte voto de protesto a enviar à Embaixada da República do Chile:
Esta Assembleia Constituinte, face à situação extremamente preocupante em que se encontra encarcerado grande antifascista Luís Corvalan e, ainda, às bárbaras condições a que o Governo do Chile submete todos os demais presos políticos - ciente de que todas as violações aos direitos do Homem, onde quer que sejam perpetradas, atingem, por igual, todos os cidadãos do Mundo, para os quais a liberdade e justiça não são conceitos vazios, emite o seu veemente protesto contra a manutenção deste estado de coisas, gravemente lesivo da consciência internacional, unanimemente empenhada na libertação imediata daqueles cujo único crime residiu, em desejarem uma sociedade mais justa para a sua pátria.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - A despeito das palmas, não posso deixar de cumprir esta formalidade de perguntar à Assembleia se tem alguma objecção que deva ser manifestada, levantando-se as pessoas que discordarem do voto que acaba de ser apresentado pelo Sr. Deputado Aquilino Ribeiro.

Pausa.

Está aprovado.

O Sr. Octávio Pato (PCP): - Sr. Presidente: Peço o favor de repetir as afirmações que acabam de fazer, pois não compreendi perfeitamente nem completamente.

O Sr. Presidente: - Não percebi.

O Sr. Octávio Pato: - Eu sei que houve aqui uma moção que não foi nem sequer admitida nem posta à votação. Portanto, desejaria que me esclarecesse sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - Vou esclarecer.
Não se trata de uma moção, foi simplesmente a emissão de um voto de protesto, ao abrigo da alínea e) do artigo 42.º, e compete ao Presidente admiti-lo ou não. Foi efectivamente admitida e foi votada.
Quer mais algum esclarecimento, Sr. Deputado?

O Sr. Octávio Pato (PCP): - Tenho a impressão de que não foi votada, porque, por exemplo, os Deputados do PC aqui presentes não votaram essa moção. Portanto, não vi nada que nos dissesse: quem está de acordo levante-se, quem não está de acordo, sente-se, etc. ..

O Sr. Presidente: - Suponho que a Assembleia se deve recordar que eu disse: quem tem alguma objecção a fazer, tenha a bondade de se levantar. Como os Srs. Deputados comunistas ficaram sentados, eu considerei aprovado por unanimidade.

O Sr. Octávio Pato: - Então, nesse caso, peço desculpa. Por isso precisamente é que eu pedi que o Sr. Presidente repetisse. Em todo o caso, eu peço que seja novamente posta à votação.

O Sr. Presidente: - Vamos então repetir.

Risos e aplausos.

Posto à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Suponho que foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Octávio Pato: - Não! Há o problema da abstenção, Sr. Presidente.
Submetido de novo à votação, foi aprovado, com 23 abstenções.

O Sr. Octávio Pato: - Peço a palavra., Sr. Presidente, para uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Pato: - Eu desejava esclarecer as razões da nossa votação, que, aliás, são coerentes, como muitas outras do mesmo género. Nós temos afirmado e voltamos a reafirmar que, na nossa opinião, esta Assembleia Constituinte não tem poderes, ou não deve ter poderes, para moções deste género. Devo dizer, todavia, que nós, comunistas, temos lutado, de formas muito variadas, pela libertação do secretário-geral do Partido Comunista Chileno, Luís Corvalan. Basta ler, por exemplo, o jornal Avante! para se saber quanto nós temos pugnado pela libertação desse grande resistente de toda a América Latina. Aliás, a demonstrar quanto o PCP está na disposição de continuar a lutar pela sua libertação e pela libertação de todos os antifascistas chilenos que se encontram presos, ainda este mês nós iremos promover, juntamente com outras organizações democráticas e antifascistas, um comício de solidariedade com o povo do Chile.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Arnaut acaba de me pedir a palavra, que eu vou conceder rapidamente, para uma pequena rectificação, em conformidade com a intervenção que teve há pouco.

O Sr. António Arnaut: - Peço desculpa de vos importunar por mais um minuto e de abusar da vossa paciência, mas constou-me que a última frase da minha intervenção teria sido mal interpretada, quando eu disse que o essencial daquela minha intervenção anterior poderia ser compreendida por toda a gente, até por um capitão do Exército. Todos compreendem que estas expressões, ditas de improviso, não correspondem muitas vezes ao pensamento de quem as propõe. No sentido de esclarecer o meu pensamento, que vejo, aliás, foi compreendido pelos Deputados do MDP, quero deixar bem claro que isso não significa desprezo nem pela pessoa em causa a que eu me referia concretamente, nem sequer pelos oficiais do Exército, pelos quais eu tenho muito respeito. E devo dizer que pertenci ao Exército, que me integrei no seu espírito verdadeiramente revolucionário e democrático, e até vos quero dizer que aqui há muitos anos, quando eu fui aspirante miliciano, fiz uma intervenção, no quartel onde prestava serviço, que me valeu uma admoestação, visto eu ter dito que o Exército só cumpriria as suas obrigações se assumisse as suas responsabilidades históricas e interpretasse a vontade popular. Ora, o meu pensamento continua a ser o mesmo e eu quero aqui dizer publicamente que não tenho qualquer animosidade relativamente

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a qualquer oficial do Exército. Pelo contrário, espero deles que assumam as suas obrigações, respeitando a vontade popular e que libertem o nosso país, conforme prometeram. Nesse patriótico objectivo, têm toda a minha solidariedade de combatente cidadão.

(O orador não reviu.)

Esta intervenção foi proferida na tribuna dos oradores.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados:
1. O PPD - já aqui o dissemos - dá o seu apoio ao projecto de sistematização da Constituição há dias apresentado pela comissão competente. E ao fazê-lo - não obstante estas divergências em relação ao arquétipo que a pureza das nossas convicções nos ditaria - renunciámos a uma defesa obstinada do que seria o nosso projecto, já aqui apresentado, comentado e, felizmente, alvejado por profusas críticas, assentes umas na leitura superficial do nosso projecto, pretendendo outras ver defeito no que não passa de feitio. Sendo assim, as considerações que passo a expor têm como pano de fundo a geral concordância com a sistemática da comissão e assumem, consequentemente, o carácter de réplica face a críticas ou linhas de sistematização divergentes aqui aventadas e defendidas com louvável empenho.
Fê-lo, nomeadamente, o MDP/CDE, aquando da apresentação e defesa do seu projecto de Constituição. Projecto que os seus autores - pondo de momento entre parêntesis a tecitura ideológica que pretende espelhar e um certo enlevo natural, atenta a fraternidade criadora - qualificaram como claro, simples e ordenado. Atributos que não devem ter estado ausentes do horizonte do Grupo de Deputados do PCP, que saudou o projecto com confessado entusiasmo.
2. Não podemos encarar com tal entusiasmo o projecto de Constituição do MDP/CDE nem a sistematização que lhe é imanente. Pois, se Platão é amigo, a verdade é-o mais. E esta impõe-nos que manifestemos a nossa discordância do projecto em causa e das considerações avançadas na sua apresentação.
Considerações que partiram de um símile avançado dos fenómenos do mundo da biologia: assim como os organismos vivos rejeitam os corpos estranhos, assim o povo português rejeitará uma Constituição estranha. É sem qualquer resistência que fazemos nossa a ideia e o efeito que o MDP/CDE pretende caucionar com tal imagem: estamos mesmo convencidos de que há muito o povo começou a rejeitar inequivocamente certas perspectivas de Constituição, por lhe soarem a estranho. Mas é já com vincado cepticismo que encaramos as razões que levaram a chamar as «Bases económicas e sociais» para a frente dos «Direitos, liberdades e garantias dos cidadãos». Aceita-se que a plena realização do projecto de existência de cada homem só é possível num espaço livre de todas as formas velhas ou novas de exploração. Premissa que se impõe a todo o que se reclame de socialista.
E crê-se, por outro lado, que uma vez realizado o socialismo - socialismo que para o MDP não é sensivelmente divergente de modelos já historicamente alcançados - se atingirá, como diz o preâmbulo, um «futuro radioso», de que estarão ausentes todas as formas de exploração, alienação e opressão. É este optimismo radicado numa escatologia que legitima todos os meios que nos recusamos a professar. Pois se a opressão é co-natural a toda a forma de capitalismo, se foi este que gerou e continua a gerar formas sempre novas e, mais agressivas de imolação dos direitos do homem, há que ter presente que os modelos historicamente dados de socialismo não estão infelizmente limpos de tais estigmas. Atesta-o o XX Congresso, a morte inglória e traída de tantos revolucionários de 1917 e a ironia, tão trágica como imprevista, de tantos combatentes socialistas que os caprichos dos meados deste século fizeram alternativamente habitantes dos campos de concentração nazi-fascistas e dos campos dum socialismo a que se chamou concentracionário. Maquiavel renasceu no nosso século vestido quer de romantismo nacionalista anacrónico, quer de demiurgo totalitário pretensamente dono da dialéctica e da razão universal. E das suas sentenças não restou nunca outro apelo que não para o oráculo da História que capricha em sentenciar a reabilitação quando é já pó a boca do reclamante.
Ora, se é assim, se todo o socialismo para ser autenticamente libertador tem de ter um lastro ético, sob pena de degenerescência, tal lastro, tal limitação, ditado pelo respeito amplo mas concreto e real do homem, mais se impõe na fase de um país a caminhar ainda no deserto, certos de que o pluralismo do processo há-de levar muita gente a adorar deuses próprios ou bezerros alheios. É o preço de uma revolução que se quer original: cada um terá o direito de rezar os seus credos, viver a sua constelação de valores, sonhar os seus sonhos, desde que respeite as normas da convivência de um povo em marcha para o socialismo que lhe deve assegurar raias claras, seguras e justificadas no sacrifício que o «eu» deve necessariamente ao «outro» colectivo. Sá assim a esperança não será angústia, o sonho não será pesadelo, o terror, mesmo apodado de progressista, desaparecerá, e o Estado não se converterá no macaco da fábula que sufoca o homem à custa de tanto lhe querer.

3. O mesmo é dizer que uma constituição que se empenha não só em assegurar o trânsito para o socialismo, mas também e antes a contribuir para sepultar definitiva e irreversivelmente todos os vestígios da mundovisão e da convivência fascista, deve recortar, nítidos e seguros, os direitos do homem.
Tema que suscita logo a questão da sua inserção nó sistema da Constituição,. problema que o projecto do MDP resolve inadequadamente, se não mesmo à custa de contradições. Na verdade, esquecendo as premissas confessadas, segundo as quais só será possível a liberdade e, a democracia na sociedade socialista a conquistar, o MDP encara no seu preâmbulo as liberdades como já existentes, porque ganhas em 25 de Abril, às quais aliás reconhece um papel privilegiado nos passos já avançados no caminho do socialismo. De resto, o artigo 1.º encara Portugal como uma república democrática com a missão de instaurar o socialismo. Com o que o MDP aceita a possibilidade da democracia, ou pelo menos de uma convivên-

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cia democrática cronologicamente anterior ao socialismo, porque tarefa a cumprir.
Implícita mas irrecusável a crença de que é possível e imperioso que o avanço para o socialismo - forma suprema de vivência democrática, é certo se deve riscar à luz dos valores democráticos, à luz do respeito da inviolabilidade do homem, ser inescapavelmente chamado à existência com outro. Com o que se poderiam desfazer as resistências de colocar à frente o mundo da pessoa, sistematização que prestaria homenagem à correcta axiologia que encara o socialismo como o melhor meio - mas sempre um meio - que há-de permitir ao homem a realização do seu projecto de existência à margem de toda a alienação.
4. De boamente terminaríamos aqui as nossas divergências em relação ao projecto do MDP, se a tutela constitucional dos direitos do homem para que aponta fosse, se bem que deslocada, completa, justa e eficaz. Tal não se verifica.
Falta desde logo a ideia inequívoca de que os preceitos constitucionais nesta matéria são autênticas normas directamente desencadeadoras de efeitos prático-jurídicos. Pelo contrário, a regulamentação não se eleva acima de meras intenções programáticas mais ou menos platónicas, mais ou menos propagandísticas.
A própria extensão que se lhe confere é ilusória: trinta e quatro longos artigos, cujo conteúdo útil, na perspectiva da rubrica que os encima, «Direitos, liberdades e garantias dos cidadãos», é extremamente escasso. São preceitos que, na maior parte, amalgamam sugestões meramente morais, enunciações de deveres do cidadão, sugestão de linhas de política económico-social do Estado, que a coerência recomendaria que fossem promovidas ao título anterior, «Bases económicas e sociais». Tudo isto a par de frequentes repetições.
Numa maior aproximação: o artigo 19.º, preceito chave, dá um mau tom, porquanto não ultrapassa o domínio do vago, dado que não é sua intenção apontar para linhas claramente demarcadoras de esferas de lícito e de protecção; deslocado o artigo 21.º, que regula a aquisição da nacionalidade portuguesa; a generosidade do-22.º, que reconhece à mulher igualdade de direitos, é gratuita; o 24.º repete o Código Civil, ao definir o casamento; é vazio, se bem que sonoro, o 25.º, ao apontar o valor moral da maternidade. Os longos artigos que vão do 26.º ao 39.º, de útil, na perspectiva em causa, apenas a indicação de alguns actos fundamentais. De respeitar como qualquer outra - mas não a impor constitucionalmente - é a teoria estética enunciada no artigo 36.º, n.º 1. O artigo 49.º, que pretende assegurar de uma forma ampla a protecção da intimidade privada, enferma de grave limitação a alguns aspectos parcelares.
5) Original é também o menos que se pode dizer ao tratamento que o MDP reserva aos direitos, liberdades e garantias que afloram em sede de repressão penal. Originalidade que consiste em privar a enunciação dos direitos fundamentais do homem do seu núcleo essencial, tanto à luz da história como da axiologia jurídico-política, para os encaixar num outro título encimado pela epígrafe «Legalidade e justiça democrática».
Foi, efectivamente, nesta problemática penal que pela primeira vez se ganhou consciência de que na dialéctica pessoa-poderes públicos estes devem suportar limites intransponíveis impostos pela intangibilidade de uma esfera pessoal, maior ou menor, consoante a sensibilidade dos tempos, mas sempre intocável. Consciência que emerge clara em 1315, ao ganhar contornos o primeiro sistema constitucional da nossa civilização. E foram preocupações desta índole que estiveram no cerne de algumas das mais profundas transformações sociais, políticas ou culturais da Europa. Pense-se no Iluminismo, de cujos vultos merece uma referência especial Beccaria; pense-se na Revolução Francesa, que, ao incluir na sua declaração de direitos as garantias penais, inaugurou toda uma tradição de declarações e convenções internacionais. E para dar sombras a este rápido bosquejo pense-se no intencional desprezo destas garantias sempre que formas de estado policiais e totalitárias estendem a teia dos seus processos inquisitoriais.
De modo que a ideia e alegoria do filósofo alemão mantém plena actualidade: assim como as oscilações do casco de um, barco se transmitem ampliadas aos mastros, assim também as concepções políticas se transmitem ampliadas no direito e processo penal. Estes são bem dois índices a privilegiar na radiografia do estatuto democrático ou fascista de uma concreta forma de Estado.
Mais. Foi através do processo criminal que na longa noite fascista um grupo felizmente numeroso de advogados veiculou uma das linhas mais contundentes de oposição ao regime. Homens de coragem, guardiões intrépidos do direito, bem merecem a homenagem singela deste momento, homenagem que vale também como repúdio da ideia já aqui posta a peregrinar e segundo a qual a denúncia de prisões ilegais não tem ligação relevante com a Constituição.
E foi ainda esta matéria - tenha-o presente quem pretender cumprir o Programa do MFA - uma das preocupações mais prementes dos homens do 25 de Abril ao inscreverem no seu Programa a dignificação do processo penal em todas as suas fases.
Estas são algumas das razões que nos levam a recusar o nosso aval à sistematização do MDP, com a sua cisão artificial e arbitrária, que priva os direitos do homem do seu núcleo, do seu embrião historicamente mais fecundo.
6 - Também, aqui, porém, caberiam as divergências de sistematização facilmente transponíveis. Já o mesmo não acontece na regulamentação substancial que em muitos casos nos suscita divergências invencíveis e nalguns mesmo um repúdio frontal. É o que veremos de seguida:
a) Pelo que se refere ao direito penal, temos dificuldades em compreender certos silêncios: nada se diz quanto à pena de morte, às penas perpétuas ou limitadas, à irrectroactividade da lei penal comum. É chocante a ausência completa de normas - e preocupações - constitucionais sobre as medidas de segurança, instrumento tão gravoso para a liberdade da pessoa, tão caro aos agentes do fascismo e tão carregadas de ódio pelo povo português. Silêncio que, conjugado com o teor do artigo 117.º, que analisaremos de seguida, aponta para o mais completo abandono do homem às boas ou más digestões de um qualquer juiz, um qualquer polícia, um qualquer carrasco, um qualquer autoproclamado dono da Revolução e do povo. E as razões mais arbitrárias tornarão possíveis revoltantes internamentos psiquiátricos: uso de barba, apreciação reflectida, mas insuficiência de espírito crí-

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tico, nenhum sintoma bem definido, mas fraqueza na esfera das emoções e ausência de espírito crítico em relação a si próprio, o facto de as últimas obras literárias serem mais fracas que as primeiras, eis algumas das razões que, segundo Mevdev, justificam o internamento psiquiátrico.
Nem só por isto rejeitamos um artigo como o 117º Ele pretende incorporar uma teoria dos fins das penas. Temos dúvidas sérias sobre a legitimidade da rede certa para se tratar o fim. Do que, porém, não temos dúvidas é de acusar como retrógradas as concepções que norteiam o MDP, porquanto limitam o seu horizonte às coordenadas da prevenção e repressão: velha uma como a Lei de Talião (olho por olho, dente por dente), velha outra como positivismo mecanicista dos fins do século passado. O projecto ignora a ideia mais consentânea com o estado das ciências criminológicas, a que melhor se insere na trajectória do pensamento penal português e a única em que pode louvar-se um legislador constitucional que se quer inspirado pelos valores do socialismo: a ideia da reeducação e reintegração social do delinquente.
Por outro lado, aceitamos generosamente uma certa ausência de imaginação na busca das expressões adequadas: mas não podemos aceitar que a Constituição a fazer tenha necessidade de plagiar expressões da Constituição fascista de 1933, como o sugere o artigo 117.º do MDP ao incorporar «para prevenção e repressão ...«fórmula da Constituição de Salazar.
Por último, extremamente grave é todo o teor do artigo 117.º não estabelecendo qualquer limite, todos os «meios» são legítimos. Ideia que, ao lado da pena de morte, das penas perpétuas e ilimitadas, das medidas de segurança, tornará possível o direito penal mais totalitário, alimentado de insegurança e terror. Será possível, como diz o romancista de O Zero e o Infinito, mandar executar como sabotador um agrónomo e trinta colaboradores por defenderem o uso do adubo artifical de nitrato, de preferência ao carbonato de potássio, quando o n.º 1 do estudo se inclinava para este último. O menos que se pode dizer é que um preceito deste teor é mais opressivo que os correspondentes da Constituição de 1933.
b) Não andam longe destes os reparos que o projecto do MDP nos suscita quanto ao processo penal. Dado que o tempo me vai faltando, apenas uma indicação tópica.
É quase total o esquecimento a que o projecto do MDP vota o programa do MFA, que, todos o sabemos, impõe a dignificação do processo penal em todas as suas fases. Apenas umas normas desconexas sobre a presunção de inocência do arguido, conquista da Revolução Francesa (merecendo-nos, porém, o artigo em causa, o 118.º, a censura de apenas conceder tal garantia após a acusação, negando-a, assim, quando ela mais se faz sentir, isto é, na instrução), a revisão das sentenças, a prisão preventiva. Deficiente é manifestamente a atenção dada à publicidade dos tribunais (96.º), apenas limitada em nome de certos valores e interesses, esquecendo o fundamental valor que pode impor limitações, isto é, a independência e imparcialidade dos tribunais, que muitas vezes pode ser posta em causa pela pressão das mass media, interessadas num trial by newspaper, um julgamento pelos jornais, a barrar o lugar de um autêntico julgamento pelos órgãos soberanos que são os tribunais; deficiente, ou, pelo menos, equívoco e, por isso, perigoso, é igualmente o artigo 124.º, que se refere ao defensor.
Para além disto é flagrante no projecto do MDP o mais completo silêncio sobre os problemas que o processo penal levanta hoje a um legislador constitucional. Problemas que consistem sobretudo numa superação definitiva dos modelos inquisitório-policiais em todas as suas formas, manifestações e resíduos tão caros aos poderes públicos ávidos de evidência e propensos ao esquecimento dos direitos do Homem. Superação que supõe a adopção de estruturas autenticamente acusatórias do poderio, a garantia do pleno contraditório do julgamento, a submissão de todas as formas de instrução a juizes, a proibição de provas extorquidas pela tortura, ou adquiridas à custa de abusivas lesões da integridade física ou moral do arguido, ou de grosseiras intromissões nas esferas da intimidade ou segredo. A dignificação do processo penal só será, em suma, viável quando do seu horizonte estiver definitivamente ausente a ameaça de 1984. Mas trata-se de questões para que o MDP não revela qualquer sensibilidade.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Guardamos para a discussão dos capítulos ou . títulos da Constituição outros reparos que este projecto nos merece. Reparos ditados uns por erros de carácter técnico-jurídico ainda não nos parece que a vocação de revolucionários os possa justificar (pense-se no artigo 1.11.que condiciona a validade das leis ...

O Sr. Presidente: - Dispõe de um minuto, Sr. Deputado.

O Orador: - ... a sua publicação no Diário do Governo, quando o mais que tal publicação pode condicionar é a sua vigência e eficácia, categorias naturalmente diferentes da validade), ditadas outros por divergências ideológicas. Está neste caso a censura que movemos ao artigo 5.º, que pressupõe a existência de provas mais progressivas, quando o que um grupo que se reclama da dialéctica pode pressupor é a existência de regimes ou formas de estado não progressivas: as provas, essas por força da sua dinâmica dialéctica caminham rumo ao progresso. Podem alguns ser oprimidos por regimes totalitários: mais uma razão para merecerem o nosso carinho, a nossa solidariedade fraternal. Mas o tempo de discussões sobre estas partes não me faltará. E para lá nos reservamos.
De momento parece-nos que as críticas movidas ao projecto de sistematização da comissão em nome do projecto do MDP não têm força de convencimento capaz de impor ao projecto da comissão alterações de tomo. Esta a nossa conclusão. E chamo a atenção para quanto do Universo chauvinista e fascista pode entrar pela janelas da sistemática do projecto do MDP. A invocação de fundamentações revolucionárias não basta para cobrir afloramentos claramente anti-revolucionários, porque claramente antinómicos do Programa do MFA.
Isto para quem entenda, como nós entendemos, Vavulik que só é revolucionária a ambição de fazer de cada homem um cidadão de corpo inteiro.

(O orador não reviu.) .

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes. Se quiser vir à tribuna, por favor. Aliás, qualquer Sr. Deputado que assim o desejar escusa de ser convidado.

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O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discute-se, neste momento, na generalidade os projectos constitucionais sujeitos à apreciação desta Assembleia. A importância fundamental desta discussão é certamente a de que poderemos analisar, dissecar os pressupostos ideológicos na base dos quais esses projectos foram elaborados, o que visam e o que pretendem efectivamente prosseguir. Um ponto, antes de mais nada, será o de recordar brevemente o nosso conceito de constituição como diploma legislativo que determina a organização fundamental do Estado e o modo e os critérios de formação do direito considerados no seu conjunto. Importa também dizer, como militante de um partido marxista que o Estado é sempre uma organização de defesa dos interesses das classes no poder. Assim, só a análise concertada da situação portuguesa permitirá traduzir em termos constitucionais a nossa concreta e complexa validade. É à luz deste critério - Constituição que traduza (ou não) a realidade do País - que podemos dizer estar perante uma Constituição ou um projecto de Constituição revolucionária ou reaccionária. O critério de um e de outro é traduzir correctamente em normas jurídicas a realidade concreta do Pais e o processo que atravessamos. O contrário é mistificá-lo e não traduzi-lo. E se, como diz o povo, «não é por muito madrugar que amanhece mais cedo», também não é por muito falar em «classe operária», em «massas populares», etc., que se consegue fazer a revolução.
A mera explanação de uma linguagem pura e simplesmente ritualista contrapomos a análise crítica da realidade.
A análise da realidade portuguesa conduz-nos ao seguinte: trata-se de uma sociedade em transição para o socialismo, socialismo esse que é o do problema económico que vá pôr fim à exploração do homem pelo homem e estabelecer na liberdade e igualdade uma sociedade sem classes. Importa dizer quais são as forças sociais que apoiam essa transformação, neste momento, do nosso país. Assim, teremos a classe operária e os trabalhadores rurais, os pequenos e médios proprietários rurais, os pequenos e médios comerciantes e industriais, as classes médias oriundas do sector terciário e do funcionamento público, os intelectuais revolucionários e, como garante e impulsionador do processo, o Movimento das Forças Armadas.
Constituem estas classes a esmagadora maioria do País contraposta aos grupos latifundiários e monopolistas. Importa fazer a sua integração num poderoso «bloco histórico», arrastando-as e conquistando-as para um apoio activo ao processo revolucionário.
Para a formação desse bloco torna-se necessário a definição dos direitos individuais e das liberdades democráticas; a formação de um Estado pluralista, onde seja dado o forte lugar aos partidos políticos; a simbiose da democracia de Estado, assim entendida, e da democracia de base; as organizações de base (comissões de trabalhadores e de moradores) reconhecidas como organizações do Estado no seu lugar próprio e com competência própria.
As organizações de base, comissões de trabalhadores e comissões de moradores deverão ser reconhecidas, na Constituição, como organizações de Estado, mas no seu lugar próprio e com competência própria.
A prática de uma política económica planificada, de raiz vincadamente antimonopolista, a efectivação de uma clara e efectiva reforma agrária, feita na base da participação dos trabalhadores e da expropriação dos grandes latifúndios, é também uma das condições essenciais para a sedimentação e para a formação deste bloco histórico.
Importa ainda consagrar as autênticas conquistas revolucionárias do povo português. E essa conquista não se resume em reconhecer as nacionalizações feitas, resume-se em reconhecer decisivamente que o conceito de propriedade, como direito absoluto, foi para sempre definitivamente posto em causa em Portugal.
Importa também definir uma política de independência nacional que nos coloque como senhores do nosso próprio destino e do nosso próprio país, alheio às confluências imperialistas do Leste e do Oeste.
Porque se torna necessário, para formação deste «bloco histórico», concretizar estes princípios? Em primeiro lugar, importa dizer que as liberdades democráticas não são reaccionárias; as liberdades democráticas foram a bandeira revolucionária da burguesia nascente. E hoje são abandonadas e postas em causa pelas classes possidentes, importando, mais do que nunca, defendê-las, mobilizando, se necessário, as massas populares para tanto.
E a luta que, neste momento, se trava no Chile é a luta que, neste momento, se trava no Uruguai pela conquista da democracia, para, a partir dela, traçar caminho para a necessária marcha para o socialismo. Só a existência de partidos políticos, dispondo dos necessários meios de informação, permitirá a integração dos diferentes ,estratos, grupos e classes sociais da nossa revolução.
Pode também existir, nesta liberdade que desejamos que seja para todos, ou pode também perder-se, uma posição que assume os limites da legalidade constitucional e que, através da nossa existência, permitirá até uma saída possível constitucional para o grupo minoritário dos descontentes e dos opositores.
Em Portugal, onde a palavra ditadura assume um sentido muito próprio e muito claro, atentar contra a democracia do Estado é, afinal, atentar contra o bloco histórico onde se funda e cria a revolução. A esta luz se compreende só ter possibilidades de vitória uma revolução fundada no consenso livremente expresso pela maioria.
É essa, aliás, a característica das revoluções vitoriosas do nosso tempo presente, que rebentaram e triunfaram há pouco tempo no Camboja e no Vietname do Sul. Mas aqui reside também o fundamento das revoluções derrotadas, que foram esmagadas em sangue na Indonésia, no Sudão e, ao provocar uma revolta das classes médias aproveitadas pelo imperialismo, também no Chile.
A afloração de um só Estado importa o reconhecimento e integração na estrutura constitucional das organizações de base popular. A criação de estruturas de base, paralelas, poderia provocar a formação de um Estado paralelo com os consequentes choques e desagregações. A uma autêntica integração das estruturas de base na organização estatal importa, enfim, definir a sua competência e os seus limites da acção e o seu processo de formação. É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há casos aberrantes de pessoas que

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não compreendem a vontade do povo e que é muito singular como esta que vou ler:
Exmo. Senhor:
Havendo necessidade de formar comissão de moradores, a nível de freguesia, o júri constituído para esse fim resolveu nomear V. S. por encontrar qualidades capazes na sua pessoa.
Ora, nó s desejamos comissões de moradores eleitas livremente em sufrágio directo e secreto, e não em qualquer júri que ninguém sabe ou conhece a sua competência, e que como nos bons tempos do antigo cooperativismo fascista vai escolher os cidadãos de 1.ª classe e os cidadãos de 2.ª classe.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Uma política de socialização dos meios de produção de vincado cariz antimonopolista não se esgota necessariamente nas nacionalizações, importa defender o princípio da autogestão e a sua aplicação gradual sempre que seja possível e necessário como forma de combate à burocracia estatal, ao capitalismo de estado e como forma de participação dos trabalhadores. Não existe autogestão nos países capitalistas e é um fantasma muitas vezes dizer-se que a autogestão conduz necessariamente ao capitalismo. A autogestão existe nos países socialistas que como a Jugoslávia trilham neste momento o caminho que os há-de levar ao socialismo em liberdade. Nós sentimo-nos identificados, e aprendemos muito com a experiência histórica desses países e não só com a Jugoslávia, mas também com a Argélia e, sobretudo, com a Primavera de Praga sobre a direcção do secretário-geral do Partido Comunista Alexandre Dubcek.
A reforma agrária, entendida como a transferência da posse superior da terra, torna também a imperiosa adopção de medidas idênticas na parte aplicável.
A consagração das autênticas conquistas do povo importa a instauração de uma autêntica legalidade revolucionária que permita não só punir os pides, não só punir os criminosos fascistas, mas, simultaneamente, definir a competência, a liberdade e a actuação do povo português, dos democratas portugueses. Não basta a instauração, urge o cumprimento das leis, é importante, é essencial à defesa da Revolução, que nunca o povo português possa - pôr os problemas nacionais como punha o fascismo em termos somente de ordem e de desordem.
Nós no nosso projecto constitucional temos uma posição clara acerca desse problema: retirando aos criminosos fascistas a possibilidade de usarem da providência de habeas corpus e permitindo o afastamento da aplicação do princípio da não retroactividade na lei penal. Isso consta dos artigos 12.º e 130.º
Importa, enfim, definir uma política de independência nacional, uma política externa independente com reflexo na política económica.
Sabemos que, neste momento, temos de cumprir, e compreenderem-se, conforme consta do Programa do MFA, as nossas alianças tradicionais. Simplesmente o cumprimento destas alianças tradicionais e o que decorrer no futuro de tratados e convenções livremente celebradas não obrigará nem imporá, nem aceitaremos de forma alguma a nossa subordinação a organização de carácter supranacional.
Importa ainda, porque nenhum povo é livre oprimindo outros povos, levar - como tem sido feito com particular relevo para o Movimento das Forças Armadas e para todos aqueles que, como Mário Soares, passaram pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e pelo Governo Provisório - até ao fim a política de descolonização.
Agora, feitos estes princípios, ou melhor, enunciados estes princípios, afigura-se necessário fazer uma breve apreciação de ponto no que se refere às Constituições do CDS, do PPD e do PCP.
Começa o Partido do Centro Democrático Social por pôr em causa o conceito do partido político, quando numa das disposições do seu projecto põe em causa a disciplina partidária.
Sem pretender entrar em polémicas estéreis, nós compreendemos perfeitamente que se ponha em causa a disciplina partidária, porque só a disciplina partidária, só a formação de um partido consegue transformar ás miríades de opiniões e de vozes discordantes numa vontade. firme e consciente, e diremos também que a história nos ensinou que a disciplina partidária é própria dos partidos da esquerda, enquanto a indisciplina partidária é própria da direita.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas não só. Nos critérios definidos no seu projecto fala-nos de socialismo português, mas de forma nenhuma não abre caminho ao socialismo. Pois que socialismo é este em que se defende uma economia social de mercado que nada tem a ver com o mais utópico dos teóricos socialistas, mas talvez com Niltam Friedman ou, na melhor das hipóteses, com John Kenneth Galbraith, que está mais próxima da nova sociedade do presidente Kennedy e de Lyndon Johnson do que com os mais tímidos projectos socialistas sociais-democráticos dessa Europa, e não só!
Propõe também a defesa de iniciativa privada. Pois que socialismo é este, em que como fontes programáticas se impõe e se defende a iniciativa privada como absoluto?
Propõe também o acesso dos trabalhadores à propriedade (artigo 33.º) Pois, em que sociedade classista estamos nós, em que os trabalhadores podem aceder a classes sociais?!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Propõe também a socialização dos meios de produção. Simplesmente de uma forma tão descritiva, de uma forma tão enunciativa que nós nos limitamos a perguntar: na base destes critérios mencionados o que é que teria sido nacionalizado até ao momento? Talvez só as empresas deficitárias!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E depois propõe também o projecto o regresso a um sistema capitalista avançado impossível em Portugal. Por quanto? As nacionalizações efectivas e a política antimonopolista dos Governos Provisórios quase destruíram o capitalismo em Portugal.
A anulação e, se possível, a modificação do seu peso na economia nacional só seria possível mediante um aparelho de Estado que contivesse as reivindicações laborais - condição sine qua non para motivar qualquer possível investidor e fará

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também chegar, num breve prazo, à violência e ao fascismo.
A restrição do direito à greve pela imposição da arbitragem: cabe aos trabalhadores, na nossa maneira de ver, definir as suas formas concretas de luta - eles é que têm de dizer se vão à arbitragem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, enfim, não há nenhuma disposição a proibir o lock out.
A concepção de Estado acima das classes, como possível medianeiro nos conflitos de trabalho, é também, no projecto do CDS, um perigoso resíduo de corporativismo ou neocorporativismo ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem cinco minutos.

O Orador: - Enfim, reconhece-se a existência e a necessidade da clínica livre, formando uma medicina para ricos e outra para pobres, sendo certo que hoje em dia a clínica livre está completamente ultrapassada, dada a complexidade dos aparelhos necessários para o diagnóstico.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos poderes do Estado, não se prevê uma iniciativa legislativa popular; não se faz nenhuma referência às estruturas de base e à reforma agrária; não se reconhece a irreversibilidade das conquistas autênticas obtidas pelo povo; não se fala na legalidade revolucionária e o nosso comentário é este: que socialismo português é este que põem à nossa apreciação?
Falamos também no projecto do Partido Popular Democrático. Fala-se em «socialismo personalista» e «via social-democrática». Sobre isto algum dos meus camaradas dirá mais alguma coisa; no entanto, fala-se em povo como o conjunto dos cidadãos residentes no território nacional, esquecendo que, efectivamente, os capitalistas e os latifundiários não fazem parte do povo. Aceitam-se restrições à soberania portuguesa na base da sua participação voluntária em organizações supranacionais, violando-se, assim, o princípio da independência nacional. Admite-se a concessão de asilo a pessoas perseguidas por motivos políticos, sem especificar que só aqueles que foram perseguidos em virtude da sua fidelidade à democracia podem ter asilo em Portugal, e que isto nunca mais voltará a ser terra para um Fulgêncio Baptista pedir asilo político.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Defendem-se as escolas privadas. Não se proíbe o lock out.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Impõe-se a co-gestão ou defende-se a congestão. Defende-se o direito à justa indemnização nas nacionalizações, quando a nacionalização resulta do conceito marxista de exploração e quando os capitalistas já estão «justamente» indemnizados pelos lucros que obtiveram ao fim de anos e anos de exploração dos trabalhadores.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Pretende-se promover a iniciativa e a concorrência entre as empresas e promover a democratização do capital, que é a mesma coisa que promover o acesso dos trabalhadores à propriedade, liberdade de iniciativa económica, reforma agrária, onde são nacionalizados só os latifúndios, especialmente os mal aproveitados. Depois, a indefinição de empresa, que visa satisfazer certos consumidores e obter receitas que permitam uma justa relação de factores progressivos, portanto do capital e, particularmente, do trabalho ou da unidade revolucionária em relação aos pides, que, embora se admita efectivamente a existência de limitações no plano eleitoral, não se põe em causa o estatuto desses criminosos. E há pouco o Sr. Deputado que me antecedeu no uso da palavra censurava o facto de não se afirmar a não retroactividade das leis penais comuns.

O Sr. Costa Andrade (PPD): - Comuns?

O Orador: - Os pides não têm direito ao uso desse princípio.

O Sr. Costa Andrade: - Isso não é direito penal comum.

O Orador: - Nós, socialistas, não ouviremos as «sereias» da social-democracia, e quando se afirma que não temos uma linha bem definida, isso é sinal de vista curta ou miopia grossa. Esta afirmação, que consta da declaração feita hoje pelo Sr. Deputado Emídio Guerreiro, não pode deixar de nos provocar um sorriso nos lábios, porque a presunção e a auto-suficiência convidam necessariamente à severidade. E não é do partido, que nas ilhas adjacentes e em certas zonas do Norte do País é autenticamente um baluarte de uma frente reaccionária, que socialistas portugueses receberão qualquer crítica:

Apupos e aplausos.

Acusamos os sociais-democratas de serem os gestores do capitalismo e é tanto mais curioso como
Partido Popular Democrático nem sequer procura ser gestor do capitalismo, mas seu leal construtor em Portugal. Toda a linha política do Partido Popular Democrático se pode resumir em duas palavras: projecto de Constituição liberal democrática, seguramente, mas também burguesa, de compromisso entre as direitas das esquerdas e as esquerdas das direitas. Estas declarações têm um ponto essencial: é que é necessário criticar o nosso pensamento ...

O Sr. Presidente: - Tem um minuto.

O Orador: - ... porque alguma coisa está podre no nosso país, desde a direita à esquerda, todas as pessoas se dizem necessariamente socialistas. Importa, necessariamente, que definamos as nossas opções e as afirmemos corajosamente e que não façamos contrabando ideológico.

O Sr. Presidente: - Efectivamente, está sobre a hora, mas tem ainda a faculdade, como sabe, de um prolongamento de dez minutos. Peço a sua atenção, por uma questão de disciplina, para evitarmos o prolongamento da hora considerada no Regimento.

O Orador: - Sr. Presidente ...

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O Sr. Presidente: - O tempo do Sr. Deputado acabou. Não posso conceder mais tempo.

O Orador: - O seu antecessor foi bastante liberal no uso dessa faculdade.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Peço a palavra para invocar o Regimento. Suponho que, a falar-se em limite de tempo para o Deputado no uso da palavra, se pensa em vinte minutos. Acontece, porém, que o camarada que está a falar é um dos autores do projecto de Constituição do PS, pelo que pode falar durante trinta minutos, nos termos do n.º 2 do artigo 60.º do nosso Regimento.

O Sr. Presidente: - O orador não estava a ser considerado nessa base, uma vez que a Mesa, embora tenha muitas qualidades, há uma que não tem, que é não poder adivinhar quais são as pessoas autoras dos projectos e as que o não são. Mas, com a declaração que acaba de ser feita, eu entendo, se é que a minha opinião pessoal poderá ter algum interesse, que se torna indispensável, no momento da intervenção, que o Deputado em causa afirme que é ele o autor do projecto.
Se aparecerem quatro ou cinco autores do projecto, eu não ... não sei como vou dar a palavra meia hora para as cinco ou seis pessoas.

O Orador: - Se a minha intervenção ainda não terminou, eu digo que sou um dos autores do projecto. O projecto do PCP começa com um problema que para nós não tem sentido, que é conceber ou pôr o problema de uma constituição que ponha fim à revolução ou seja instrumento da revolução.
É evidente que uma constituição só é válida, ou só tem possibilidades de funcionar, se for instrumento da revolução, porque se quiser pôr fim à revolução acontece-lhe o mesmo que aconteceu à Constituição de 1933.
Agora é necessário considerar algumas observações. No artigo 5.º, fala-se no exercício directo do Poder pelo povo. Não se compreende o que é o exercício directo do Poder pelo povo, dado o carácter exaustivo da enumeração aí feita. Não se regulamentam devidamente certos direitos e garantias, nomeadamente os casos de prisão sem culpa formada. Isso é muito importante, porque na Constituição de 1933 também se remetia para a lei posterior. Não se reconhece a existência de uma iniciativa legislativa popular. No entanto, deve a Câmara ter em conta os resultados do debate público. O que é que isto quer dizer? Estaremos nós vinculados aos resultados do debate público? Existe uma vontade pública que vá além desta Câmara? Parece-nos perigosa a admissão desta expressão e a admissão destes princípios. Depois, diz que compete ao Estado criar as condições materiais, sociais, políticas e jurídicas de autodeterminação consciente da vontade popular.
Ora, afirma-se a seguir:
Que a fim de garantir a expressão eleitoral da vontade revolucionária que exerce o povo, o Estado tome as medidas necessárias, em cooperação com as organizações populares, para que os processos eleitorais se integrem perfeitamente no processo revolucionário.

Merece-nos a mais severa crítica esta disposição, porque parece que é possível ensinar democracia ao povo, quando é certo que a democracia só pode efectivamente funcionar através do seu exercício. Depois disto:
Que os Deputados e outros representantes não eleitos não podem desenvolver acção política em contradição com as promessas e compromissos políticos constantes do seu programa eleitoral.
Quem é que julga se um Deputado se afastou do seu programa eleitoral?
Pois bem, só o seu eleitorado, que nas eleições próximas lhe poderá negar a recondução. Mais ninguém!
Além disto, abre caminho a um julgamento por via administrativa. Depois, admite um princípio extremamente perigoso também, que é a possibilidade de poderem apresentar candidaturas partidos políticos ou outras organizações político-sociais, associações cívicas e movimentos unitários, isoladamente ou em coligação. Ora, nós consideramos que só os partidos políticos, na medida em que podem pôr ao eleitorado opções ideológicas concretas, é que podem efectivamente apresentar programas de candidaturas e submeterem-se à votação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas muitas mais reservas teríamos a fazer ao projecto do PCP. Enunciámos alguns dos princípios, e muitas dessas reservas decorrem daquilo que dissemos na parte inicial, simplesmente na discussão na especialidade não deixaremos de levantar a nossa voz e de expor a nossa opinião. Um último elemento, e é com esse que iremos terminar, referia-se à necessidade da aliança do povo com o MFA. Nós queremos dizer que essa aliança é tanto mais necessária quanto é certo que forças minoritárias e forças contra-revolucionárias muitas vezes põem em perigo essa aliança, quer pela violência das suas palavras, quer pelo seu sectarismo. Importa dizer claramente que é necessária a aliança com o MFA e que esta aliança está definida claramente no pacto celebrado com os partidos políticos. Importa dizer também, recordando as palavras de Albert Camus, que os quarenta e cinco anos de fascismo ensinaram-nos que o espírito pouco pode contra a espada, mas ensinaram-nos também, na prática, a Revolução do 25 de Abril, que o espírito unido à espada é o eterno vencedor da espada desembainhada por si só.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que terminamos dizendo que esta Constituição seja a forma concreta da união do espírito à espada, para que todos aqueles que querem desembainhar a espada por si só ou fazer a apologia da violência pela violência caiam debaixo da oposição unânime do povo português, unido às suas forças armadas. Tenho dito.
Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente:- Antes do prosseguimento da sessão ...

O Sr. Amândio de Azevedo (PPD): - Sr. Presidente, pedia a palavra para um esclarecimento ao orador.

O Sr. Presidente: - ... agora estou eu no uso da palavra e depois, na altura própria, será concedida

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com certeza. Quero chamar a atenção dos Srs. Deputados para o dispositivo expresso no n.º 2 do artigo 60.º:

No período da ordem do dia, durante a discussão na generalidade, o tempo de uso da palavra de cada Deputado não poderá exceder vinte minutos da primeira vez e dez da segunda, mas o autor ou um dos autores do projecto ou proposta podem usar da palavra por trinta minutos da primeira vez.

A minha interpretação é de que só um autor ou um dos autores poderá usar dessa faculdade. Peço, portanto, aos Srs. Deputados, no momento em que se apresentarem para usar da palavra, que indiquem á Mesa a qualidade em que o fazem. Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo: - Desejo fazer um pedido de esclarecimento ao orador. Pareceu-me perceber, e gostaria que o orador me confirmasse, que as populações do Norte do País que apoiaram o PPD serão constituídas por contra-revolucionários ou reaccionários, já não sei bom. É isto exacto, Sr. Dr. José Luís Nunes?

O Sr. José Luís Nunes: - Em certas zonas do Norte do País e nas ilhas o Partido Popular Democrático constituía ele próprio uma frente contra-revolucionária. Não devemos de forma nenhuma diluir as nossas culpas próprias nas populações.

O Sr. - Amândio de Azevedo: - Desculpe, que eu não percebi bem. Peço um esclarecimento concreto.
Concorda que pessoas que habitam no Norte do País são tão democratas como aquelas que habitam no Sul e sofreram tanto ou mais os - horrores do fascismo do que os outros portugueses ou, pelo contrário, alinha na onda de muitas pessoas que pretendem distinguir o nosso país em duas zonas: a dos progressistas do Alentejo e a dos reaccionários do Norte?

Aplausos.

O Sr. José Luís Nunes: - Bom, aquilo que eu digo não é nada disso que o Sr. Amândio de Azevedo está a dizer, aquilo que eu digo é o seguinte: é que em certas zonas do Norte do País e que nas ilhas

Aplausos e apupos.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia. Parece-me que não será a melhor forma de discutir os problemas entrando em choque de opiniões. O Sr. Deputado José Luís Nunes faça o favor de terminar, o mais rapidamente possível, a sua intervenção.

O Sr. José Luís Nunes: - Quando a Assembleia estiver serena e quando os Deputados que me fazem a pergunta não me interromperem, eu respondo. Por tanto, dizia eu, certas zonas do Norte do País. Perguntam-me quais zonas? Evidentemente que não possa estar aqui a pegar num mapa e a dizer que é na zona tal ou tal...

Risos.

... mas posso dizer concretamente que nos Açores, conforme o meu camarada Jaime Gama pode esclarecer aqui, porque os Açores sempre é mais pequeno, foram feitas procissões contra a campanha do Partido Socialista e houve lá confrontos físicos.

Portanto, é esta a afirmação que eu faço. Não é o povo português do Norte que é reaccionário ou contra-reaccionário.

Uma voz: - Eu sou do Norte ...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Não será a melhor forma de intervir, começar a falar sem ser dada a palavra, e o facto de a pedia não quer dizer que eu a conceda.
Eu já sei que se pode pedir a palavra para um esclarecimento, mas a Mesa, ou, pelo menos, eu, não me disponho a consentir que se transforme um pedido de esclarecimento em novas intervenções. Pela última vez, Sr. Deputado José Luís Nunes, faça o favor de esclarecer o mais rapidamente que puder.

O Sr. José Luís Nunes: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu ia dizer o seguinte: não é o povo do Norte que é reaccionário, são muitas vezes certos caciques que são efectivamente reaccionários.

Aplausos e apupos.

O Sr. Amândio de Azevedo: - Sr. Presidente: Em homenagem ao intuito de possibilitar os trabalhos ...

O Sr. Presidente: - Em homenagem à disciplina do Regimento, peço o favor a V. Ex.ª de começai a falar depois de eu lhe conceder a palavra. V. Ex.ª pediu a palavra para quê?

O Sr. Amândio de Azevedo: - Pedi um esclarecimento porque não me sinto esclarecido e estava na continuidade de usar da minha palavra precisamente por ter pedido um esclarecimento. Se V. Ex.ª entende que eu tenho de pedir novamente, eu reformulo formalmente esse pedido. E se me conceder, muito bem, se não conceder, eu sento-me porque sou disciplinado.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a palavra para um esclarecimento ao Sr. Deputado José Luís Nunes?

O Sr. Amândio de Azevedo: - Exacto.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Amândio de Azevedo: - Era só para dizer isto: é que, afinal de contas, há coisas que não podem ser esclarecidas, e melhor fora não terem sido ditas.

Murmúrios na Assembleia.

O Sr. Amândio de Azevedo: - Sr. Presidente, Sr. Presidente ...

O Sr. Presidente: - Atenção, Srs. Deputados ...

O Sr. Amândio de Azevedo: - Sr. Presidente ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: V. Ex.ª desculpará que lhe diga que não se esclareceu coisa nenhuma, e se eu soubesse que a sua intervenção ia ser essa a sua palavra de pedido de esclarecimento não lhe havia sido concedida. Temos ainda um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Mota Pinto.

O Sr. Mota Pinto: - Prescindo, Sr. Presidente.

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414 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 18

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Era para pedir ao Sr. Deputado José Luís Nunes, cuja intervenção apreciei e cuja sobriedade admirei, dois esclarecimentos, porque me parece que um deles derivou de uma leitura do nosso projecto a partir do Diário da Assembleia que não estava correcto e, portanto, temo que não tenha lido depois a correcção. Queria perguntar se é certo ele ter afirmado que nós não reconhecíamos a iniciativa legislativa popular. É exacto?

O Sr. José Luís Nunes: - Exacto.

O Sr. Vital Moreira: - Isso não é certo, porque no artigo 103.º, isso está efectivamente contido, onde se diz: «A iniciativa legislativa poderá pertencer também às organizações populares», referidas no artigo 61.º, onde está uma indicação de toda uma série de organizações populares.

O Sr. José Luís Nunes: - Posso responder? Agradeço ao Srs. Deputado a sua afirmação, porque, efectivamente, segui o vosso projecto pelo Diário da Assembleia e não encontrei essa disposição.

O Sr. Vital Moreira: - Pois acreditei que era exactamente por esse motivo e não queria deixar de esclarecer.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um pedido de esclarecimento o Sr. Deputado ...

O Sr. Vital Moreira: - Em segundo lugar ... eu disse dois esclarecimentos, Sr. Presidente. Eu só pedi ainda um. Tenho outro esclarecimento, que é o seguinte: era se as apreciações que o Sr. Deputado José Luís Nunes fez a propósito de um artigo do nosso projecto, que se referia aos processos eleitorais, valem também para a seguinte parte do Programa de Acção Política do Conselho da Revolução, que passo a ler; são duas linhas:
É necessário, entretanto, que os processos eleitorais que se desenvolverão durante o período de transição se integrem conscientemente dentro do processo revolucionário, não se admitindo que lhe venham a constituir um obstáculo.

Está aqui, portanto, uma citação do Programa de Acção Política, e o artigo a que o Sr. Deputado José Luís Nunes se referiu transcreve praticamente esta passagem.

O Sr. José Luís Nunes: - Não transcreve praticamente, Sr. Deputado. Eu não ponho em causa esse ponto do Conselho da Revolução, o que eu ponho em causa é que isso seja uma função do Estado com todos os abusos que isso pode dar. Isso é uma função que deve caber aos partidos políticos. Não ao aparelho coercivo que é o Estado, necessariamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente: Gostaria de pedir ao Sr. Deputado José Luís Nunes, cuja intervenção pessoalmente muito apreciei, e a quem muito respeito, três esclarecimentos.
O primeiro diz respeito a quando afirma que o nosso projecto de Constituição contém a defesa absoluta da iniciativa privada. Gostaria de saber se o Sr. Deputado teve em conta o que se dispõe na parte final do artigo 36.º da nossa Constituição e também o que se contém nas alíneas c) e f) do artigo 39.º dessa mesma Constituição. Ou, melhor, se realmente as nacionalizações, que obrigatoriamente devem ser feitas ao abrigo dessas alíneas c) e/) do artigo 39.º, serão sempre para o Estado, apenas a socialização dos prejuízos.
A segunda questão, se V. Ex.ª me permitisse, eu podia pô-la depois ao Sr. Deputado ... talvez facilitasse ...

O Sr. Presidente: - Com certeza ...

O Sr. José Luís Nunes: - Em primeiro lugar, efectivamente, o projecto do CDS prevê a possibilidade de algumas nacionalizações. No entanto, a forma como o faz e a defesa da propriedade como princípio merecem, creio eu, as expressões de que me servi na tribuna.
Mas há um ponto muito importante no projecto do CDS a que eu não me referi, mas a que me hei-de referir na discussão da especialidade, e que é o seguinte: é que no vosso projecto vem escrito um artigo, ou uma parte da Constituição de 33, que diz que os Srs. Deputados não podem fazer projectos que permitam ou imponham diminuição de receitas ou aumento de despesas. Ora, conjugado este preceito com o preceito das nacionalizações, nós verificamos que praticamente ou dificilmente nenhuma nacionalização poderia ser, de futuro, efectivada. Esta é a primeira pergunta que eu faço.

O Sr. Basílio Horta: - Sr. Presidente: Eu não possa responder ao Sr. Deputado; na altura em que na especialidade o Sr. Deputado repetir essa crítica, será respondido.

O Sr. Presidente: - Com certeza, será esse o momento oportuno.

O Sr. Basílio Horta: - A segunda questão que eu gostaria de lhe pôr era a indicação, se bem compreendi as suas afirmações, de que do nosso projecto resultam contenções nas reivindicações laborais. Gostaria de saber onde é que expressamente se prevê que o progresso económico neste país se faça à custa dos sacrifícios desnecessários impostos às massas trabalhadoras.

O Sr. José Luís Nunes: - Em primeiro lugar eu tenho de falar como marxista e, portanto, todos nós sabemos que o processo de desenvolvimento capitalista ...

... eu vejo que há pessoas que se riem quando se fala em marxismo, mas, enfim, o problema não é meu, é delas!

Risos.

Eu quero dizer só o seguinte: é que, necessariamente, todo e qualquer processo de desenvolvimento capitalista se faz à custa das camadas trabalhadoras, e, na base disso, não há capitalismo bom trem capitalismo mau, há capitalismo mais explorador ou menos explorador.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - O segundo ponto que eu gostava de focar é que no vosso projecto não só o CDS não toma uma posição a favor da proibição do lock out, mas também impõe duas coisas que se me afiguram graves: em primeiro lugar, a passagem, necessariamente, por um período de arbitragem; em segundo lugar, o que se me afigura também grave é a possibilidade de o Estado aparecer como medianeiro. Ora, nós sabemos que, numa sociedade de transição, o Estado representa sempre interesses de classe e que a ideia de um Estado independente ou de um Estado cesarista acima das classes acontece rarissimamente na história.
Por exemplo, o único caso histórico que eu vi citado, é citado por Lenine no Estado e a Revolução, quando admite, efectivamente, que o primeiro Governo de Kerensky foi um Governo que esteve acima das classes, num período muito curto.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta: - Efectivamente, o Sr. Deputado antecipou-se um pouco ao pedido de esclarecimento que eu lhe ia pedir, que se relaciona com aquilo que acaba de dizer. O terceiro pedido de esclarecimento era o seguinte: O Sr. Deputado conhece alguma resolução da Europa Oriental ou Ocidental que não preveja nos conflitos colectivos de trabalho as fases de mediação e arbitragem?

O Sr. José Luís Nunes: - Não conheço todas as legislações da Europa Ocidental ou Oriental. O que eu conheço é o seguinte: na Europa Oriental ou na Europa socialista, quaisquer que sejam as críticas que temos que lhe fazer, e aqui eu faço na base da existência de um capitalismo de Estado, burocracia estatal, etc., os conflitos de trabalho são totalmente diferentes dos conflitos de trabalho na Europa Ocidental. Podíamos agora entrar por aqui dentro, mas não vale a pena.
Na Europa Ocidental, o que é que se passa?
É que há duas formas de conflito ou de conciliação: há a forma de conciliação nos acordos individuais de trabalho de carácter jurisdicional, que é feito perante o tribunal, perante a comissão de conciliação ou perante o juiz, e uma fase da conciliação dentro do processo da luta de classes. E aqui é que eu me oponho: é a fase de conciliação - com carácter obrigatório os trabalhadores podem usar essa arma de luta no processo de luta de classes. Aí é que o ponto reside.

O Sr. Basílio Horta: - Sr. Presidente, muito obrigado.
Em relação a esta última parte, vejo, com grande agrado, que o Sr. Deputado, afinal, reconhece frontalmente as duas fases.

O Sr. Presidente: - Pediu a palavra um Sr. Deputado pelos Açores; peço desculpa de não saber o seu nome, agradeço-lhe muito que me indicasse.

O Sr. Américo Viveiros (PPD): - Ora bem, eu não ponho eu causa, de maneira nenhuma, a ignorância do Sr. Deputado em relação aos Açores, onde, aliás, e à semelhança do que aconteceu noutras zonas do País, o PS se apresentou como um partido social-democrata, mas considerando ...
Burburinho.

Vozes - Não é pedido de esclarecimento!

O Sr. Presidente: - Peço a atenção do Sr. Deputado de que, se é um pedido de esclarecimento, o pode formular.

O Orador: - Sr. Presidente: Devo informar de que estava a fazer um pedido de esclarecimento ...

Burburinho.

Vozes: - Isso não é um pedido de esclarecimento!

O Orador: - Portanto, considerando que o Sr. Deputado ofendeu ...
Manifestações diversas na Sala.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia.

O Orador: - ... o povo dos Açores, solicito que informe esta Assembleia

O Sr. Presidente: - Assim está bem.

O Orador: - ... dos sítios e datas em que se realizaram as procissões que aqui foram referidas, e que são absolutamente falsas.

O Sr. Jaime Gama: - Dá-me licença, Sr. Presidente?

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia: continuo a respeitar a ordem das inscrições.

O Sr. Deputado Jaime Gama se, porventura, entender que deve pedir a palavra para um esclarecimento, será inscrito na sua ordem.

Pausa.

O Regimento prevê a troca. Se o Deputado José Luís Nunes assim o entender, então tem a palavra o Deputado Jaime Gama.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Delego no meu camarada Jaime Gama, que foi ele quem me informou do que lá se passou ...

O Sr.- Presidente: - Está certo, já percebi.

O Sr. Deputado Jaime Gama, a pedido e com o consentimento do Sr. Deputado José Luís Nunes, pode prestar o esclarecimento.

O Sr. Jaime Gama: - Bom. Eu, em primeiro lugar, queria realçar o facto de que o Sr. Deputado Américo Natalino Viveiros não detém, efectivamente, a representatividade da população dos Açores para falar em seu nome. Em segundo lugar, queria referir que o Partido Socialista nos Açores não se apresentou como um partido social-democrata e nunca recorreu, para difundir os seus pontos de vista, a campanhas que vão desde o recrutamento de catequistas até intervenções na rádio a dizer ...

Uma voz: - É falso!

O Sr. Jaime Gama: - Não é falso, não senhor!

Uma voz: - É falso!

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O Sr. Jaime Gama: - Não é falso, não senhor! Não é falso, não senhor!

Burburinho na Assembleia.

Não recorreu às estruturas da Acção Nacional Popular para angariar qualquer espécie de votos ...

Uma voz: - É falso!

O Sr. Jaime Gama: - Não é falso, não senhor!

Uma voz: - É falso, sim senhor!

Burburinho na Assembleia.

O Sr. Jaime Gama: - E devo, de resto, esclarecer ...

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção do Sr. Deputado Jaime Gama para que ...

O Sr. Américo Viveiros: - Fiz um pedido de esclarecimento e ...

O Sr. Jaime Gama: - ... e devo também esclarecer os Srs. Deputados que ...

Manifestações nas galerias.

O Sr. Presidente: - Um momento só! Fica advertido o senhor que acaba de falar da galeria que à segunda vez que isso aconteça terei de imediatamente proceder!

Burburinho na Assembleia. Manifestações nas galerias.

O Sr. Américo Viveiros: - Sr. Presidente, eu pedi que fosse esclarecido ...

O Sr. Presidente: - Vamos a ver, vamos lá ver se nos entendemos! O Sr. Deputado Jaime Gama, por consentimento e com a concordância do seu colega José Luís Nunes, pretendia prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado que acabou de falar.
Eu peço o favor de se cingir a esse ponto: esclarecer o Sr. Deputado, atendendo ao pedido de esclarecimento formulado por ele ao Sr. Deputado José Luís Nunes. Os comentários marginais, salvo o devido respeito, custe o que custar, não são compatíveis com o esclarecimento.

O Sr. Jaime Gama: - Devo, também, esclarecer os Srs. Deputados que, neste momento, nos Açores, há um problema muito mais grave do que aquele que aqui nós ...

O Sr. Américo Viveiros: - Volto a pedir à Mesa ...

O Sr. Presidente: - Não pode ser! Não pode ser!

O Sr. Jaime Gama: - Sr. Presidente: O Sr. Deputado não pode interromper-me sem minha licença!

O Sr. Presidente: - Escusam de ...

Burburinho na Assembleia.

Pausa.

O Sr. Deputado tem de ser disciplinado, como a Mesa pretende ser.

Uma voz: - Absolutamente de acordo!

O Sr. Presidente: - Estou atento, e se, porventura, não cumprir com as regras com que devo cumprir, ir-me-ei embora.
Peço licença porá pedir aos Srs. Deputados aquilo que, aliás, é desnecessário pedir-lhes: a sua inteligência e o seu bom senso. Vamos a ver se nos entendemos. O Sr. Deputado Jaime Gama está no uso da palavra para responder a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado dos Açores. Peço o favor de se cingir a isso, porque tem muitas outras ocasiões no período de antes da ordem do dia e dentro da ordem do dia de se pronunciar sobre os problemas específicos dos assuntos apresentados.

O Sr. Jaime Gama: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A concluir e muito resumidamente queria dizer-vos o seguinte: que neste momento, nos Açores, a questão importante não é resumível às questões secundárias que nós estamos aqui a discutir. A questão importante é a questão do separatismo e a questão da unidade nacional.

Aplausos.

O Sr. Américo Viveiros: - Sr. Presidente: Volto a frisar que o Deputado Jaime Gama continua a não cumprir o Regimento. Peço-lhe o favor e apelo à sua inteligência e ao seu bom senso e à sua situação na Mesa para que seja respondido ao pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado entende que deve fazer comentários fá-los-á no momento oportuno, sob pena de me ver obrigado, constrangidamente, a recusar-lhe a palavra.

O Sr. Jaime Gama: - Sr. Presidente: Aceito as suas críticas à minha intervenção e vou concluir. Parece-me que neste momento o que há a fazer da parte das forças políticas democráticas é dar uma resposta concreta ao problema gravíssimo; o Partido Socialista já deu a sua, e desejaria que os outros partidos a dessem também.

Aplausos e apupos.

O Sr. Américo Viveiros: - Se o Sr. Presidente me dá licença, era só para dizer que não me considero esclarecido quanto à minha pergunta.

O Sr. Presidente: - Tenho pena que isso tenha acontecido, mas a culpa não é minha.
Tem a palavra para um pedido de esclarecimento o Sr. Deputado Coelho dos Santos.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - O Sr. Deputado José Luís Nunes, que se apresentou como marxista, afirmou que havia uma disciplina partidária nos partidos de esquerda.
A primeira questão que quero pôr e sem classificar o partido a que pertence o ilustre Deputado é esta: se o Partido Socialista tem dito centenas ou milhares de vezes pela voz dos' seus mais altos responsáveis que a única forma de eleger é por sufrágio directo e universal, que isto é a única forma de democracia, a primeira questão que ponho é esta: o Sr. Deputado entende que há votos reaccionários e revolucionários? Esta é a primeira questão, se isto é ou não é indisciplina partidária.

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Segundo ponto: o Sr. Deputado José Luís Nunes restringiu o conceito de povo a uma interpretação subjectiva e pessoal. Suponho que ele queria dizer que o povo são os trabalhadores.
A segunda pergunta que faço é se ele me considera a mim como trabalhador - povo - e a ele próprio fora do povo.
A terceira questão: o Sr. Deputado José Luís Nunes quando fez a crítica ao projecto do PPD pôs em equação o xadrez político, sem definir qual era exactamente a posição do PPD.
Pois eu, que tenho visto muitos monárquicos-fascistas considerarem-se revolucionários de esquerda, pergunto ao. Sr. Deputado José Luís Nunes se me. considera a mim, com vinte e quatro anos de trabalhador e dez de sindicalismo, de peito às balas da direita ou da esquerda, mais à direita ou mais à esquerda que o Sr. Deputado.

Burburinho.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes quer responder?

O Sr. José Luís Nunes: - Quanto àquilo que penso, se o Sr. Deputado Coelho dos Santos é da direita ou da esquerda, não interessa à Assembleia o que eu possa pensar, porque não tenho o prazer ou o desprazer de o conhecer, mas simplesmente me interessa o que pensam os trabalhadores do seu sindicato, que nunca mais o elegeram há onze anos.

Risos.

Em segundo lugar, quanto ao conceito de povo, se me considero ou não incluído no povo, e se o Sr. Deputado Coelho dos Santos faz parte ou não do povo, pois muito bem, também não é uma questão que me permita responder, porque a história responderá acerca desse assunto, conforme-o nosso comportamento, a nossa enraização no processo histórico, conforme as nossas atitudes forem revolucionárias ou contra-revolucionárias.
Não sei o que é que há mais ...

Risos.

Ah! Quanto a um ponto aqui que é fundamental, quanto ao xadrez político onde se coloca o PPD, isso é uma coisa que compete aos próprios militantes do PPD definir, e como é público e notório não sou militante do PPD nem ambiciono vir a sê-lo.

Risos.

O Sr. Coelho dos Santos: - Só mais um minuto, Sr. Presidente, se me quisesse fazer o favor.

O Orador: - Ainda não acabei. E agora quero dizer que não respondo a mais nenhuma das perguntas que o Sr. Deputado Coelho dos Santos faça, porque a forma insolente como se referiu a mim no início, dizendo «o Deputado do PCP não sei quantos ...», não justifica da minha parte qualquer espécie de consideração.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um pedido de esclarecimento o Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Prescindo.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - Sr. Presidente: Sobre este pedido queria ainda dizer o seguinte: quanto aos votos, não foi respondido se são reaccionários ou revolucionários. Quanto ao outro aspecto, lamento que o Sr. Deputado José Luís Nunes desta vez não tenha feito o que fez há pouco, passar a palavra a um colega, porque está aqui o presidente da mesa do Sindicato dos Bancários, de que eu faço parte, e tivesse tido a veleidade de dizer aquilo que disse.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa para um pedido de esclarecimento.

O Sr. José Luís Nunes: - Sr. Presidente ...

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Nunes, chamo a atenção de V. Ex.ª que disse há pouco que não queria responder mais ao Sr. Deputado Coelho dos Santos.

Risos.

O Sr. José Luís Nunes: - Não! Eu quando disse há pouco que não queria responder mais, referia-me a perguntas posteriormente feitas. Efectivamente ele tem razão e não há motivos para que, tendo respondido a duas, não responda também a três, porque, como diz o povo, « não há duas sem três».

Risos.

Ora, quanto à história de saber se há povo reaccionário ou se há votos reaccionários, ou votos contra-revolucionários, pois os votos é o povo que os dá, não são um papel, portanto o papel nunca é reaccionário; evidentemente que há votos reaccionários e há votos contra-revolucionários, conforme as classes sociais das pessoas que votam.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um pedido de esclarecimento o Deputado Amaro da Costa.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Prescindo.

O Sr. Presidente: - Vamos continuar com a nossa ordem de trabalhos e para isso concedo a palavra ao Deputado Carlos Brito. Se quiser usar da tribuna, tenha a bondade.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente ...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado desculpe esta interrupção, mas vai falar como o autor ou como um dos autores desse projecto?

O Sr. Carlos Brito: - Como um dos autores do projecto.

O Sr. Presidente: - Então peço desculpa ao Sr. Deputado Carlos Brito, mas o Sr. Deputado Vital Moreira falou ontem, como um dos autores do projecto. Entendo, pode ser que esteja a entender mal, que não é possível repetir-se a meia hora para outros Deputados nas mesmas condições. Portanto, concedo-lhe a palavra por vinte minutos.

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O Sr. Vital Moreira (PCP): - O Sr. Presidente dá-me licença, uma vez que se referiu a mim?

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira: - Não é certo que eu tenha utilizado a palavra como autor. O que é certo é que quando estava a falar, perante a interpelação de um Deputado do PPD de que eu estava a utilizar pela segunda vez a palavra e, portanto, não poderia utilizá-la por vinte minutos, como estava a caminho disso, eu disse que estava a utilizar pela primeira vez e, portanto, tinha direito a vinte minutos. É por isso que se cumpriu.

O Sr. Presidente: - Portanto, não foi como autor do projecto.

O Sr. Vital Moreira: - Convido o Sr. Presidente a confirmar isto na acta da sessão de ontem.

O Sr. Presidente: - Recordo-me perfeitamente que foi isso.
Tem a palavra o Sr. Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já foram apresentados por outros Deputados do PCP os grandes pressupostos e os traços gerais que distinguem o nosso projecto de Constituição e lhe dão a sua fisionomia própria, democrática e revolucionária, e explanados os seus títulos II e IV, respeitantes, respectivamente, à «Organização económica» e à «Estrutura e organização do Estado».
A presente intervenção tem por objectivo expor nesta Assembleia e para o povo e as forças revolucionárias os princípios fundamentais que - contidos no título I - orientam e caracterizam o projecto de Constituição que o PCP propõe para a actual etapa da revolução, a revolução democrática e nacional, a etapa de transição para o socialismo, assim como os direitos, liberdades, garantias e deveres fundamentais que decorrem desses princípios e estão contidos no título II.
Pensamos que tem interesse, porém, começar por quatro notas sobre a própria concepção e elaboração do nosso projecto de Constituição.
1ª nota: Este é o projecto de Constituição apresentado pelo PCP, partido da classe operária e partido marxista-leninista.
É, portanto, um projecto de Constituição concebido e elaborado segundo o método marxista. Seja dito a este respeito que já um ex-revolucionário tristemente famoso, e que ficou conhecido na história como o renegado Kautsky, pretendeu desnaturar o marxismo, separando da sua visão do mundo o método e privando este do seu núcleo revolucionário - o materialismo dialéctico.
O PCP baseia a sua actividade no marxismo-leninismo que compreende o materialismo dialéctico, o materialismo histórico, a economia política marxista e a teoria do socialismo científico. Trata-se de uma concepção coerente do mundo e da vida que - no dizer expressivo de Lenine - alia à plena lucidez científica na análise da situação objectiva e da evolução objectiva o reconhecimento categórico da energia, dá criação e da iniciativa revolucionária das massas, das classes revolucionárias e dos partidos, forças e dirigentes a elas ligados.
2.ª nota: Precisamente por isso, porque, inspirado e elaborado segundo, os princípios e as normas do marxismo, o projecto de Constituição apresentado pelo PCP não é um projecto sectário, não é um projecto de Constituição de um governo comunista e de um Estado socialista.
Ao elaborar o seu projecto de Constituição o PCP não esqueceu as experiências revolucionárias dos outros povos e as leis gerais das revoluções, partiu do seu próprio Programa - cujas linhas e previsões essenciais a vida tem confirmado de forma mais que evidente - e teve em conta rigorosamente:

As condições objectivas actuais da sociedade portuguesa;
Todas as forças, internas e externas, em presença e a evolução das alianças de forças sociais e de forças políticas;
A natureza, especificidade e originalidade do processo revolucionário português, da sua actual etapa, do poder político.

O PCP, ao apresentar o seu projecto de Constituição, propõe-no fraternalmente ao exame e à consideração de todas as forças revolucionárias - e de todos os democratas revolucionários, encontrem-se eles em que quadrante político se encontrarem - como base de uma Constituição para todo o povo português, para a nossa pátria, na etapa actual da revolução.
Apresentamos um projecto de Constituição plenamente exequível, realizável e aplicável por um Governo de coligação e um Estado democráticos e revolucionários, no período de transição para o socialismo.
3ª nota: Do que acaba de ser dito, resulta que o projecto de Constituição apresentado pelo PCP parte do movimento social real hoje no nosso país, parte da realidade: só a realidade, mais nada senão a realidade, toda a realidade encontrando no seio desta as leis, fontes e forças profundas do seu movimento e transformação revolucionários.
O nosso projecto de Constituição não é, portanto, nem um texto professoral tirado de sebentas e compêndios, nem um conjunto de formulações habilidosas e manhosas de advogados que defendem uma causa equívoca. Não é nenhum espécime do «socialismo jurídico», do socialismo de toga, quintessência da concepção burguesa, capitalista, do mundo e da vida que tentaria em vão impor ou opor artificialmente à realidade revolucionária do nosso país, na transição para o socialismo, um «colete de forças» ou um «travão» constitucionais.
Formulado com rigor jurídico e político e de princípios bem definidos, o nosso projecto de Constituição procura - parafraseando uma expressão recente - constitucionalizar a prática revolucionária, a prática unitária das massas populares e das forças revolucionárias, na luta contra os monopólios e latifundiários e na construção de um Portugal democrático, no qual se abra caminho ao futuro socialista. Esta preocupação é patente até na redacção do projecto, que não transpõe mecanicamente a nossa terminologia (facto que o Sr. Deputado da UDP aparentemente não conseguiu compreender), pois nem sequer se trata, nesta etapa, da Constituição do Estado da classe operária. Empregamos conceitos e linguagem que não são estreitamente partidários nem sectários, mas antes reflectem e se adaptam à aliança entre o povo e as forças

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armadas. Recorremos a fontes constitucionais que não são só os nossos documentos, mas os textos de outras forças revolucionárias.
4.ª nota: Eis porque, com objectividade, encaramos o nosso projecto como base e contribuição fundamental para a Constituição que, efectivamente, poderá vir a ser aprovada, promulgada e aplicada no nosso país, neste período histórico.
O PCP apresenta o seu projecto de Constituição com toda a seriedade e sentido das responsabilidades que caracterizam o seu trabalho político.
Não se trata para nós de um exercício de estilo ou somente de propaganda política.
Contrariamente a ridículos boatos alarmistas que por aí correm, levamos bem a sério esta Assembleia Constituinte, dentro dos limites estritos da competência que lhe está fixada, ou seja: redigir uma Constituição cujo conteúdo político, económico e social foi, tem sido e continuará a ser em grande parte definido antes, fora e depois dos trabalhos desta Assembleia.
O PCP tem feito e continuará a fazer o que dele depende para que esta Assembleia - apesar da «santa aliança», que aqui se tem desenhado algumas vezes e da forma negativa e preocupante como têm decorrido muitas sessões e em particular os períodos de antes da ordem do dia - não venha a falhar na sua missão e no seu dever perante a Revolução e povo (cujo veredicto seria então implacável).
Ao apresentarmos o nosso projecto de Constituição, procurámos também dar uma contribuição construtiva e relevante para uma viragem a tempo - em sentido positivo - na orientação e nos trabalhos desta Assembleia. Chamamos para isto a atenção dos Srs. Deputados.
Lutaremos pelo nosso projecto de Constituição no seio do povo, perante as forças revolucionárias, nas sessões plenárias desta Assembleia - apesar dos limites postos aos debates por partidos pouco interessados em clarificar as suas posições políticas reais - e no trabalho das comissões. Por mais incompreensível que isso pareça a certos eleitoralistas - iludidos por uma aritmética política completamente errada - consideramos que o projecto de Constituição do PCP pode vir a ser, no seu conteúdo e formulações essenciais, base da elaboração da próxima Constituição da República Portuguesa. Seria, aliás, um bom sintoma, de vários pontos de vista. Dizemo-lo com realismo revolucionário. Temos em conta, por um lado, a correlação de forças e a sua evolução profunda.
Os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 8.º constituem o cerne do projecto constitucional do PCP. Neles apresentamos uma rigorosa definição político-material do Estado, nisto se distinguindo o nosso projecto da maior parte dos projectos apresentados, que definem o Estado meramente em termos jurídico-formais. Compreende-se porquê. Atrás já avançámos algumas das razões, mas não será de mais insistir aqui, e de novo, na ideia importante de que a posição face ao Estado permite distinguir os materialistas dos idealistas, os marxistas-leninistas dos sociais-democratas, os verdadeiros revolucionários dos políticos burgueses liberais.
E há muitas maneiras de se ser idealista, social-democrata, político liberal burguês.
Que dizer de um projecto constitucional que - pretendendo-se o mais revolucionário de todos - omite precisamente a questão do Estado na actual etapa da Revolução, como acontece com o projecto da UDP?!
Começamos no artigo 1.º por definir o Estado como democrático e revolucionário, enquanto os outros projectos se limitam a defini-lo como democrático. Queremos, assim, sublinhar a especificidade do nosso Estado, que o distingue de outros Estados democráticos. Não há democracia pura, que seria o fim do Estado e, portanto, o fim da democracia como forma de Estado. Tem o nosso Estado por objectivo eliminar o poder dos monopólios e latifundiários e abrir caminho à transição para o socialismo. Logo, não é um qualquer Estado democrático burguês, como os do mundo ocidental, nos quais o domínio dos monopólios e do imperialismo coexiste com as liberdades democráticas (cada vez mais escassas e mais frágeis). É um Estado que opera através de órgãos revolucionários, saídos do processo revolucionário, assentes na legitimidade revolucionária.
De resto, o artigo 1.º indica que o objectivo do Estado democrático revolucionário será realizado num «curto prazo histórico» - o que também demarca o nosso projecto de outros, onde a formulação da transição para o socialismo é de tal modo sinuosa e limitativa que dá a ideia de que nunca mais lá se chega.
Note-se que também não dizemos que o nosso Estado é socialista, pela razão óbvia de que isso não corresponde à verdade na etapa actual e seria perigosamente ilusório (embora outros anteprojectos publicados o tenham pretendido). O socialismo, definido no preâmbulo como o sistema social baseado na colectivização dos meios de produção e sem classes antagónicas, que abolirá, para sempre, da pátria portuguesa a exploração do homem pelo homem, instaurará um tipo superior de democracia - conclui o artigo 3.º
O regime político, económico e social actual - diz ainda o artigo 3.º - caracteriza-se pela garantia e exercício das mais amplas liberdades democráticas e pela realização revolucionária - não de tal modo progressiva ou gradual, como sugerem outros projectos, que não chegaria a lado nenhum - de profundas transformações económicas e - sociais de transição para o socialismo.
Consideramos que a definição do Estado como democrático revolucionário, e do seu objectivo de transição para o socialismo a realizar num curto prazo histórico, é não só a mais justa e adequada, mas atingirá e ganhará a compreensão e apoio das massas populares.
A base social deste Estado, diz o artigo 4.º, encontra-se na unidade e aliança da classe operária, de todos os trabalhadores, dos pequenos e médios agricultores e de outras camadas sociais interessadas no avanço do processo revolucionário.
A unidade social e política do proletariado e a sua aliança com o campesinato e outras camadas sociais antimonopolistas foram e são tão amplas, sob o fascismo e após o seu derrubamento, que se exprimiram no nosso país da forma realmente original referida no artigo 4.º: a aliança entre o povo e as forças armadas, pela qual o principal instrumento armado da dominação dos monopólios se virou contra ela.
Correntes políticas que já não foram capazes de se organizar revolucionariamente na luta antifascista clandestina deveriam tirar lições da capacidade do povo português em criar novas formas de unidade

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revolucionária, lado a lado com os partidos verdadeiramente empenhados na Revolução. No artigo 5.º, e aliás em todo o projecto de Constituição, é dado precisamente grande relevo constitucional à aliança entre o movimento popular de massas e o Movimento das Forças Armadas como base política do regime democrático, motor do processo revolucionário, assegurando o seu desenvolvimento pacífico e garantindo a vitória final.
Põe o mesmo artigo a questão fundamental do Estado, que é a da detenção e do exercício do poder político.
Um Estado democrático é aquele em que o poder pertence ao povo e por ele é exercido. E quando dizemos povo, não estamos a pensar num conceito abstracto, como conjunto de todos os cidadãos, mas sim nas classes populares. Quer dizer: o poder democrático, o poder do povo, exclui necessariamente o poder dos monopólios e dos latifúndios. Por isso, no nosso projecto declaramos expressamente ilegítimo e abolido o poder dos monopólios e dos latifúndios. E a ilegitimidade do seu poder político requer e exige a liquidação do seu poder de facto, expressa nos artigos 13.º e 16.º sobre a nacionalização dos monopólios e a expropriação dos latifúndios (que poderá ser sem indemnização). Mas nós estamos numa revolução. E isso tem importantes consequências, especialmente no que respeita ao modo do exercício do poder político. Por um lado, o poder é exercido pelo povo, quer directamente, quer indirectamente, não só através de órgãos representativos, mas também e especialmente através de organizações populares e de órgãos revolucionários específicos. Por outro lado, o carácter revolucionário e plenamente democrático do Estado implica necessariamente o princípio da unidade do poder. Este é um princípio de fundamental importância, primeiro enunciado pelas forças de vanguarda da Revolução Francesa e característico das principais revoluções sociais contemporâneas, e tem particulares consequências no plano da estrutura dos órgãos do Estado. O princípio da unidade do poder exige, nomeadamente, a abolição ou neutralização do princípio liberal burguês da separação dos poderes, uma consideração particular do princípio da autonomia local e regional, e, finalmente, a consagração constitucional das organizações populares como factor de reforço da unidade popular, base da unidade do poder do Estado.
Note-se, a propósito das organizações populares, que contrariamente ao que diz um hebdomadário o projecto do PCP desenvolve esta matéria em quatro importantes disposições [artigos 5.º, 1), 61.º, 62.º, 2), e 98.º], além de referir as organizações populares em mais de duas dezenas de outros artigos, que lhes conferem poderes como o de iniciativa legislativa (artigo 103.º), o direito de «acção popular» contra os órgãos do Estado (artigo 116.º), etc. O projecto do PCP é mesmo actualmente o único capaz de, sem qualquer adaptação, integrar a organização do poder popular prevista no documento guia aprovado na última assembleia do MFA, pois é o único que em sede dos órgãos de soberania, no artigo 62.º, 2), diz expressamente que «serão reconhecidas a intervenção e representação políticas das organizações populares [...] em função do seu desenvolvimento autónomo e específico».
Da natureza e base social e política do Estado democrático decorrem as suas funções e tarefas políticas, indicadas com precisão no artigo 7.º Faremos aqui uma referência especial à consolidação e extensão das liberdades democráticas, dos direitos e liberdades fundamentais.
O projecto do PCP é, dos projectos apresentados, um dos que maior atenção dedica a esse tema, desenvolvido com originalidade e adequação ao processo revolucionário no título III. Importa chamar a atenção para os traços fundamentais deste importante título: em primeiro lugar a amplitude das liberdades e direitos reconhecidos, desde os direitos pessoais até aos direitos estritamente políticos, passando pelos direitos económicos, sociais e cívicos; em segundo lugar, a consagração das garantias desses direitos e liberdades, desde a afirmação do carácter excepcional das limitações aos direitos fundamentais, passando pelas garantias de direito criminal e do processo penal, até à consagração dos direitos de reclamação, resistência, recurso judicial e indemnização; em terceiro lugar, a consagração dos deveres de todos, incluindo o de defender o Estado democrático revolucionário; em quarto lugar, a afirmação do princípio de que as liberdades não podem ser utilizadas contra a liberdade, contra o regime democrático revolucionário; finalmente, o estabelecimento de firmes garantias económicas, sociais e políticas que, mediante as necessárias medidas revolucionárias, transformem as liberdades cívicas e políticas e os direitos económicos e sociais numa realidade para os trabalhadores e para todo o povo. Este é um traço fundamental de uma revolução que visa garantir as liberdades para a grande maioria do povo privado delas pelo fascismo e pelo capitalismo - e não apenas para as classes e camadas sociais minoritárias até agora privilegiadas.
Não vamos comentar agora os artigos 6.º e 8.º, sobre a base económica e as funções e tarefas económicas e sociais do Estado, já ontem tratados por camaradas nossos e que pela importância do seu conteúdo e a precisão das suas formulações - merecerão posteriormente explanação mais ampla, na discussão na generalidade dos vários títulos. Assinalaremos aqui o respeito pelos pequenos produtores independentes e as pequenas e médias empresas, e sublinharemos o papel dominante do sector nacionalizado, sem o qual não haverá verdadeiro arranque da economia nacional, nem serão vencidos definitivamente - com a participação determinante dos trabalhadores no controle e na batalha da produção - os monopólios e o grande capital. Note-se que o sector nacionalizado é definido como propriedade do Estado democrático revolucionário - de um Estado ao serviço do povo -, desenvolvendo-se, por isso, com o sector cooperativo, em propriedade colectiva dos meios de produção. - Curiosamente, aqueles que, invocando a este propósito deslocadamente o pretexto do capitalismo de Estado, lutam na prática contra as nacionalizações - se as fizessem fracassar conduziriam objectivamente, então sim, ao ressurgimento do capitalismo de Estado e até do capitalismo monopolista de Estado (e com ele da revanche fascista).
Terminam os princípios fundamentais, contidos no título I, com três extensos e significativos artigos sobre as relações internacionais e a política externa do novo Portugal democrático. Nenhum outro projecto constitucional trata esta matéria tão desenvolvidamente.
Não é por acaso que o fazemos. Tivemos em conta a importância e a necessidade - para um povo que

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acaba de sair do fascismo, da guerra colonial, do isolamento internacional e da dependência em relação ao estrangeiro - de afirmar de certo modo solenemente, irrevogavelmente, uma política de paz e amizade com todos os povos; cooperação com todos os Estados e em particular com os Estados progressistas de que Portugal esteve isolado; relações de fraternal amizade com os novos Estados independentes do colonialismo português; libertação progressiva de dominações externas e intransigente independência nacional.
Trata-se, aliás, de objectivos centrais do MFA, partilhados por todos os patriotas portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: ao apresentar o seu projecto de Constituição, procurou o PCP dar uma contribuição efectivamente construtiva e significativa à única, mas importante, tarefa desta Assembleia: elaborar e aprovar uma Constituição que, respeitando a plataforma de acordo constitucional, sirva o processo revolucionário e o povo português, no seu avanço irreversível para o socialismo.
Manifestamos mais uma vez a nossa firme disposição de agir, nesta Assembleia e fora dela, com este objectivo e de cooperar com todos os que - nesta Assembleia e fora dela - connosco queiram cooperar para a realização dessa e de outras tarefas revolucionárias e patrióticas.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Vamos fazer um intervalo. A sessão está suspensa.

Eram 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Lopes Cardoso: - Uma vez que o Sr. Presidente manifestou o desejo de ouvir a opinião da Assembleia sobre o problema que acaba de lhe ser colocado, eu gostaria de, em nome do Grupo Parlamentar do PS, fazer uma breve declaração. Essa declaração é para antes do mais manifestar a solidariedade dos Deputados do PS para com os trabalhadores desta Assembleia Constituinte.

Aplausos.

Queríamos manifestar a nossa homenagem e exprimir o nosso agradecimento pela forma dedicada como até esta data têm prestado a sua colaboração aos nossos trabalhos e queria envolver nesta homenagem também a Comissão Instaladora da Assembleia Constituinte, à qual muito deve esta Assembleia para o seu funcionamento. E queria ainda acrescentar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que a situação criada aos trabalhadores desta Assembleia, se a ela associarmos a situação que foi já criada e denunciada aqui ontem pelo meu camarada Pendrelico aos Deputados aqui presentes em contravenção. expressa de uma lei promulgada pelo próprio Governo Provisório, que dizia que a situação dos Srs. Deputados deveria ter sido definida na altura em que fosse fixada a data das eleições, nos leva a deixar esta interrogação: trata-se de desleixo? Trata-se de incúria ou de intenção deliberada de prejudicar ou de impedir os trabalhos desta Assembleia Constituinte?

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Mais algum Sr. Deputado deseja falar?
Encerrarei a sessão às 18 horas e 30 minutos.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Pinto.

O Sr. Mota Pinto: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o grupo parlamentar do PPD quer salientar que reconhece as bem fundadas reivindicações feitas pelo pessoal que presta serviço nesta Assembleia e dá razão às suas pretensões atento à exposição que delas me foram feitas.

O Sr. Presidente: - Agradecia que tomassem os vossos lugares para podermos reabrir a sessão.

Eram 18 horas e 10 minutos.

Pausa.

Peço a atenção dá Assembleia. Acaba de chegar à Mesa uma cópia de uma representação enviada ao Sr. Presidente da Assembleia Constituinte assinada pela Comissão Nacional Instaladora, que diz o seguinte:

Dado que o Governo, através do Decreto-Lei n.º 370/75, de 16 de Julho, estipulou, contra. a opinião da Comissão Instaladora, que não haveria lugar ao pagamento de quaisquer remunerações por horas extraordinárias ao pessoal do Secretariado da Assembleia Constituinte e ainda que ao pessoal eventual encarregado dos serviços da execução do Diário seria atribuída remuneração horária equivalente à de técnicos auxiliares de relações públicas de informação - letra L -, o que corresponde a cerca de 36$ horários, esta Comissão foi informada pelo trabalhadores da Assembleia abrangidos pelo decreto-lei em causa que:
a) O pessoal do quadro não realizará horas extraordinárias terminado o seu serviço de hoje às 18 horas e 30 minutos;
b) O pessoal eventual com o qual havia sido tomado o compromisso verbal do pagamento horário de 40$ aos dactilógrafos e 100$ aos leitores e outros tarefeiros, não aceitando a remuneração prevista no decreto-lei, cessará as suas funções a partir de hoje, às 18 horas.

Esta Comissão Instaladora está a desenvolver todos os esforços no sentido de ser promovida a alteração do citado decreto-lei por forma a permitir o regular funcionamento da Assembleia, pelo que pedimos ao Sr. Presidente e aos Srs. Deputados a máxima compreensão para as dificuldades presentes que desejamos ver rapidamente resolvidas.

Pausa.

Temos, portanto, uma facto novo, para o qual eu chamo a atenção da Assembleia e sobre o qual eu gostaria de a ouvir. Efectivamente, dado que o pessoal do quadro entende terminar os seus trabalhos às 18 horas e 30 minutos, nós temos, quando muito, mais um quarto de hora de trabalho. Às 18 horas e 30 minutos, entendo eu, estamos materialmente incapacita-

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dos de prosseguir a nossa sessão. Se pudermos aproveitar o quarto de hora, aproveitá-lo-emos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
E não podemos deixar de relacionar este facto com a situação verdadeiramente escandalosa de impasse em que se encontra o problema de subsídio dos Deputados e o problema das ajudas de custo necessárias para cobrir a sua deslocação para Lisboa. Os Srs. Deputados encontram-se numa situação deveras penosa, não só porque não têm possibilidade de obter os seus vencimentos normais nos seus locais normais de trabalho, como ainda viram acrescidas as suas despesas de uma forma bastante significativa com a sua deslocação para Lisboa.
Toda esta despreocupação com um certo número de condições materiais, condições económicas necessárias ao funcionamento desta Assembleia é para nós extremamente obscura e extremamente ambígua e queremos lavrar veementemente o nosso protesto com a situação que se regista num caso e noutro.
Aplausos.

O Sr. Presidente: - Está inscrito o Sr. Deputado Marques Pinto.
Pergunto ao Sr. Deputado se quer aproveitar os dez minutos que restam e continuar amanhã os outros vinte minutos?
O Sr. Marques Pinto (MDP): - Sr. Presidente: O tempo que me resta não é suficiente para me poder debruçar sobre o problema que pretendia versar no dia de hoje, portanto, prescindo da palavra para usar dela amanhã.
O Sr. Presidente: - Portanto, amanhã às 15 horas reabriremos os nossos trabalhos com a discussão da ordem do dia e estão inscritos os Srs. Deputados Marques Pinto, Luís Catarino, Sousa Pereira, Carlos Laje, Manuel Moura, Lopes Cardoso, Basílio Horta, Álvaro Monteiro e Francisco Miguel.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

CDS

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Victor António Augusto Nunes Sá Machado.

PCP

José Pinheiro Lopes de Almeida.

PPD

José Angelo Ferreira Correia.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.

PS

Fernando José Capêlo Mendes.
Mário de Deus Branco.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

CDS

Carlos Galvão de Melo.
Manuel Januário Soares Ferreira-Rosa.

PCP

Américo Lázaro Leal.
Angelo Matos Mendes Veloso.
António Dias Lourenço da Silva.
Dinis Fernandes Miranda.
Hipólito Fialho dos Santos.
Jaime dos Santos Serra.
José Alves Tavares Magro.
José Carlos.
Maria Alda Nogueira.

PPD

António Cândido Jácome de Castro Varela.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Germano da Silva Domingos.
José Manuel Nogueira Ramos.
Luís Fernando Argel de Melo e Silva Biscaia.
Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa.
Miguel Luís Kolback da Veiga.

PS
Afonso do Carmo.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
Artur Cortez Pereira dos Santos.
Henrique Teixeira Queiroz de Barros.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Vasco Francisco do Rosário Moniz.

UDP

Américo dos Reis Duarte.

O REDACTOR, José Alberto Pires.

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