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2930 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 90

O Sr. António Macedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está dito o essencial acerca da matéria em debate e é de justiça reconhecer que várias intervenções foram, sem favor, de nível invulgar, notáveis ou brilhantes, convincentes umas, convidativas à reflexão outras.
Mas há sempre aspectos novos ou que mais impressionam o comum das pessoas e que podem representar achegas ou contributos de valia para o exame clarificador dos problemas.
E às vezes até sucede que as tomadas de posição marginais ou de segundo plano são aquelas que transmitem luz mais viva ou penetrante para a análise das questões em apreço.
É por isso que me dispus a subir a esta tribuna e me proponho alinhar umas tantas considerações à volta da «Organização do poder político», face à Plataforma de Acordo Constitucional com os partidos políticos.
Já nesta Assembleia foi salientado que o pacto MFA-partidos correspondeu às exigências, ou melhor, às ambições de um grupo de pressão político-militar, inspirado por concepções apregoadas como de vanguardismo revolucionário e que, afinal, visavam a conquista ou a manutenção do Poder, por meios não democráticos ou alheias às regras do jogo democrático.
O pacto foi uma florescência do «gonçalvismo» pujante e triunfalista, fonte de aventura que, meses depois, veio a degenerar em confrontação armada,
propiciatória da guerra civil.
O pacto foi, sem dúvida, o modo de perpetuar esse «gonçalvismo», manipulado por determinadas correntes políticas minoritárias que sabiam não poder contar com as simpatias, as preferências ou os votos da maioria do eleitorado.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o pacto antecedeu as eleições e funcionou até como ponto de partida ou condição sine qua non para a sua efectivação no prazo anunciado.
Por isso foram essas correntes minoritárias que mais entusiastas e aguerridas se manifestaram na aceitação e assinatura da Plataforma de Acordo Constitucional, desenvolvendo intensa actividade, através dos seus instrumentos de difusão e propaganda (e muitos e diversos eram então), para simular um coro de aplausos e louvores aos objectivos e princípios fundamentais do pacto partidos-MFA.
Até a este hemiciclo se trouxeram, vezes sem conta, as exaltações e as subserviências desses grupos políticos e correntes minoritárias, rendidas ao culto de poderio representado pelos órgãos de Soberania sui generis, instituídos por elementos ou forças de inspiração ou mandato não popular, posto que de dita dinâmica revolucionária.
Sucedeu até que de uma bancada deste hemiciclo chegou a ser gritado, com ênfase, que esta Assembleia Constituinte não podia arrogar-se o privilégio de órgãos de Soberania, pois que só os militares que fizeram o 25 de Abril é que, por assim dizer, constituíam a fonte de direito divino ou de poder absoluto ...

Deputados eleitos pelo povo ficavam de cócoras perante o toque de sentido ou as vozes de comando dos estados-maiores dos exércitos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E diziam-se progressistas e de esquerda os que deste modo outorgavam o domínio político a uma classe privilegiada em detrimento do poder democrático dos trabalhadores - base e alicerce de uma sociedade a caminho do socialismo.

O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Presidente da República, o Conselho da Revolução, a Assembleia do MFA, órgãos exercidos ou compostos exclusivamente por militares, esses é que seriam as cúpulas, as linhas de força, as traves mestras de soberania, ainda que não coincidentes com os rumos apontados pelo voto popular, através das urnas e do sufrágio universal.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: As roupagens com que se vestiu a Plataforma de Acordo Constitucional deixaram a descoberto propósitos inconfessados.
Os disfarces políticos foram o «motor de arranque», o «avanço do processo», a preservação da «carga revolucionária», a garantia das conquistas alcançadas ...
Mas o que se pretendeu foi pura e simplesmente impor a limitação de competência da Assembleia Constituinte, na eventualidade de as eleições não serem favoráveis - como se receava - a certos grupos empenhados no assalto ao Poder.
Foram esses receios que levaram a aludir, no pacto, por um lado, às «lutas partidárias estéreis e desagregadoras» e, por outro lado, aos «partidos políticos que defendem os mais legítimos interesses do povo português».
Ora, após o resultado das eleições e a manifestação inequívoca do eleitorado, ficou assinalada a via democrática e socialista como meta a atingir, na paz e em liberdade.
Tornava-se, pois, desnecessária a tutela prevenida na Plataforma de Acordo Constitucional. O povo português soubera optar e decidir dos seus destinos, com consciência e dignidade, por muito que isso tivesse causado engulhos a uns extravagantes cabotinos ou sisudos fantasistas trajados de sociólogos.
Portanto, em respeito e homenagem ao povo português, o MFA deveria ter anulado essa Plataforma de Acordo, se outros fins claros e expressos se não continham no seu plano de intervencionismo na política e na governação do País.
O povo português bem merecera a sua emancipação. Partidos responsáveis qualificaram-se autênticos mandatários da vontade popular, sem escamoteações ou manobras sujas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também agora são partidos minoritários que mais se opõem à revogação mesmo parcial do pacto, alarmados com a perspectiva de ser retirada ao MFA a «predominância política», com que se deleitaram no consulado «gonçalvista». E isto porque admitem ser mais fácil captar adeptos ou influenciar posições nas forças armadas - como terreno mais receptivo ao seu aventureirismo - do que penetrar nas camadas da população sempre coisas das suas prerrogativas de independência e de cidadania.