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3098 DIARIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 96

cimento da força, do caso julgado -, prevendo-se mesmo a aplicação de sanções aos responsáveis pela sua inexecução (artigo 5.º).

4. O texto contém, todavia, algumas imperfeições e lacunas que poderão ser supridas, evitando-se, com certa facilidade, dúvidas e tentações de desvios por parte do futuro legislador ordinário.
Indicarei as seguintes:

a) A ausência da expressão «poder judicial», ao contrário do que acontece no Programa do Movimento das Forças Armadas e nas Constituições portuguesas; excepto a de 1933, sabendo-se que essa expressão reforça a ideia de independência dos tribunais em face dos demais órgãos ou poderes do Estado;
b) A subtil diferenciação entre tribunais «com competência específica» e «tribunais especializados para o julgamento de matérias determinadas» (artigo 6.º, n.º 2), sendo cento que a Constituição deveria indicar quais, para impedir uma nova dispersão de tribunais, ainda quando todos judiciais;
c) A formulação do n.º 3 do artigo 6.º, proibindo a criação, e não já a existência pura e simples de tribunais com competência exclusiva, e não já específica, para o julgamento de quaisquer categorias de crimes - formulação essa idêntica à do artigo 117.º da Constituição de 1933 e que marca um evidente retrocesso relativamente ao atrás citado artigo 18.º da Lei n.º 3/74;
d) A separação estabelecida entre o instituto do júri e as outras formas de participação popular na administração da justiça (artigos 10.º e 11.º);
e) A imprecisa definição da jurisdição dos tribunais militares e a atribuição aos mesmos da competência para o julgamento de acções (armadas) contra a segurança do Estado (artigo 12.º);
f) A adopção do termo «Conselho Superior da Magistratura», em vez de «Conselho Superior Judiciário» (artigo 16.º), até porque o Ministério Público também constitui uma magistratura;
g) A não definição de critérios a que deva submeter-se o legislador ordinário, quando abra excepções à irresponsabilidade dos juízes (artigo 17.º, n.º 2);
h) A admissibilidade de nomeação dos juízes para comissões de serviço (artigo 18.º, n.º 2);
i) A falta de qualquer alusão à assistência judiciária, sendo cento que o antigo 8.º, n.º 1, do título sobre direitos fundamentais, só indirectamente a pode abranger.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para nós, o Estado de Direito não apenas há-de existir correspondente à sociedade democrática e socialista; ele envolve valores próprios e impõe-se, desde já, como requisito imprescindível e prova clara do rumo certo por que enveredamos, na eliminação de todas as formas de coacção, de alienação e de exploração do homem. O socialismo não se pode constituir seara democracia política nem Estado de Direito, e não há Estado de Direito sem instituições judiciárias guardiãs da legalidade formal e material e dos direitos fundamentais dos cidadãos contra os abusos do poder.

O Sr. Pedro Roseta (PPD): - Muito bem!

O Orador: - Quando ainda domina em tantos espíritos a mentalidade fascista da violência e do facto consumado, quando para alguns a alternativa parece consistir em anarquia ou repressão, quando tantos cidadãos foram e ainda estão presos sem culpa formada, quando muitos anais ficaram privados, por motivos políticos ou de perseguição pessoal, do seu emprego, da sua carreira e dos seus direitos adquiridos, quando ainda não desapareceu toda a insegurança - quando isto se verifica, há que apelar para a autoridade moral dos tribunais como reduto principal de protecção da dignidade da pessoa humana.
Quando a maior parte das leis em vigor traz a marca da ditadura fascista, quando a desigualdade económica, falta de cultura e a natureza de certas relações sociais impedem a litigância ou a utilização de meios jurídicos adequados para a realização de legítimos interesses, quando os trabalhadores sentem ainda os tribunais como corpos estranhos e os juízes como elementos de classe antagónicos - quando isto se verifica, compreende-se o alcance das normas constitucionais e legislativas que devem regular a organização e o funcionamento dos tribunais e o recrutamento e o estatuto dos juízes.
A aplicação da Constituição vai seguramente exigir forte consciência cívica a todos os portugueses, efectiva participação popular, coerência dos políticos que se dizem democratas e socialistas, pronta acção legiferenta e fiscalizadora do Parlamento, renovação dos serviços da administração directa e indirecta do Estado. Mas vai exigir igualmente, todo o saber e toda a sensibilidade jurídica dos juízes: que sejam fiéis aos mais elevados valores de solidariedade humana, atentos às condições sociais e económicas dos casos a decidir, empenhados em verter as novas leis na vida e em reinterpretar as antigas sem face das normas constitucionais, capazes de fazer verdadeira elaboração jurisprudencial do direito e não mera exegese legislativa.
Os juízes portugueses, todos quantos participam na administração, da justiça e, em geral, todos os cidadãos esperam da Assembleia Constituinte que confira ao poder judicial a sua autêntica dimensão para que possa realizar a justiça e para que, também ele, possa contribuir para a tarefa de transformação da sociedade portuguesa numa sociedade mais livre, mais igualitária e mais pacífica.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Interrompida a sessão até às 18 horas.
Eram 17 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 5 minutos.