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3100 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 96

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O problema da constitucionalidade das leis, da garantia da conformidade das leis com a Constituição, não é simples problema para juristas, é também problema para políticos. E não se trata de aqui se defender qualquer juridismo, trata-se de não defender qualquer legalismo puramente formal. Trata-se de defender as condições objectivas, através das quais há-de ser possível a construção da sociedade...

O Sr. Presidente: - Falta um minuto, Sr. Deputado.

O Orador: - ...melhor que queremos realizar no nosso país. Trata-se de, através de instituições, como esta que preconizo, preservar os direitos fundamentais dos cidadãos e aquela legalidade, sem a qual não pode haver Estado de direito, não pode haver democracia política, não pode haver o socialismo de face humana que queremos que venha a haver no nosso país.

Aplausos.

Vozes: - Muito bem:

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Afonso Dias, tenha a bondade.

O Sr. Afonso Dias (UDP): - É a primeira vez que faço um intervenção nesta Assembleia sobre a matéria da Constituição.
É a primeira vez, e não será, está visto, a última, que digo nesta Assembleia que os projectos apresentados pela comissão são o mais completo conjunto de instruções sobre como tentar fazer o movimento popular e a roda da história andarem para trás.
Mais ainda: esses projectos são reaccionários.

Burburinho.

Já há muito tempo que a UDP o denuncia.
Os Srs. Deputados presentes na comissão esforçaram-se, e conseguiram fazer um texto que tem a principal característica de remeter toda a decisão de justiça para fora das mãos do povo.
Ao abordarem esta questão da justiça os Srs. Deputados esquecem-se do fundamental: a justiça não é para todos a mesma coisa.
Há uma justiça que teme o povo e a luz do dia, prefere as salas fechadas e pequenas. Essa é a «justiça» dos opressores. A outra defende e não teme o povo faz-se aos seus olhos e onde ele está. Essa é a justiça popular.
Há uma «justiça» que teme a discussão e outro argumento não tem que a repressão bruta e cega. Essa é a «justiça» dos opressores.
Há uma «justiça» que precisa de vestes pomposas, fala latim e rege-se por códigos fascistas. Essa é a justiça dos exploradores.
A outra justiça veste-se como o povo, fala a sua linguagem e tem a vontade do povo erigida em lei.
O que este articulado da comissão defende é a «justiça» dos opressores e exploradores.
O articulado fala ao de leve e de passagem na participação popular, mas não diz quando nem porquê.
Antes fala em termos hipotéticos de que a lei poderá criar juízes populares.
De resto tudo se baseia na justiça burguesa, todo o articulado está feito em função dela.
O texto diz que os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei.
Neste momento, a independência dos tribunais é a das leis fascistas em vigor, e essa já o povo sabe qual é.
É a independência que está do lado dos senhorios especuladores, que destroem casas para evitar que os trabalhadores sem casa lá posam viver.
É a «independência» que está do lado da «Reforma Agrária» que discretamente proíbe as ocupações das terras dos latifundiários fascistas, que destrói todo o processo democrático da Reforma Agrária feita pelos próprios camponeses e assalariados rurais e a atira, para os corredores dos Ministérios, ao mesmo tempo que deixa sem solução os gravíssimos problemas dos pequenos e médios agricultores.
É a «independência» da lei que acusa de assassínio um trabalhador que se defende das agressões do patrão.
É a «independência» de uma lei feita pelos exploradores e opressores para ser utilizada contra os explorados e oprimidos.
No futuro, será a «independência» das leis feitas por Governos que resolvem os problemas à bomba, que atacam o povo à metralhadora, que aumentam os preços, que não reconhecem a legalidade às comissões de moradores, que se viram contra os explorados e oprimidos.
Será a «independência» dos juízes que passaram anos a meter tratados na cabeça e que no fim ficaram com muita oratória, mas longe e bem longe do povo trabalhador. Esta Assembleia, tão cheia de ilustres advogados, é bem a prova do que dizemos.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Obrigado.

O Orador: - A visão desses senhores limita-se às quatro paredes de uma sala escura, às entrelinhas dos tratados. A sua capacidade é a dos aldrabões bem-falantes.
A Comissão não indicou, até porque isso não lhe interessava, que o julgamento de todos os implicados no regime fascista, nos golpes e acções fascistas será realizado em tribunais com ampla participação popular.
A Comissão não indica que os fascistas, reaccionários e todos os inimigos do povo sejam julgados em tribunais revolucionários, no decurso de um processo público em que lhes sejam asseguradas todas as possibilidades de defesa.
E que fique bem claro que, tribunais revolucionários não são tribunais militares ou civis especiais, mas sim tribunais onde haja uma ampla participação popular em todas as fases do processo.
No fundo, todo o articulado da Comissão serve para mostrar uma coisa: o que os exploradores defendem são as suas posições privilegiadas de classe dominante; o que eles acusam é o povo trabalhador por não trabalhar mais e por se unir em defesa dos seus interesses; o que eles temem é que o povo faça justiça nos seus locais de trabalho, nos seus bairros, nos seus quartéis, nas sua fábricas.