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19 DE DEZEMBRO DE 1975 3175

O Sr. Presidente: - Ah, já chegou?

Então está em discussão.

Tem V. Ex.ª a palavra, Ser. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Queria dizer duas cosas, ou antes, quem dizer uma coisa e dizer porque é que não dizia outra.

Risos.

Uma das casas era que eu tive o cuidado de pedir aos serviços lie apoio que distribuíssem cópias desta proposta que está na Mesa pelos partidos. Suponho que o fizeram e qualquer desajustamento é que deu isto.
Eu queria dizer agora que não dizia nada relativamente à proposta do artigo 11.º, porque antecipadamente e talvez desprevenidamente eu tenha adiantado as considerações que coubessem a esta proposta.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Estou de acordo.
Vamos então ao Sr. Deputado José . Luís Nunes, creio que V. Ex.ª pediu a palavra, e depois o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta da Comissão diz que a liei poderá criar os juízes populares. A proposta do MDP/CDE diz que sezão criados juizes populares. São propostas diferentes.
Há um autor, que eu gosto de vez em quando de citar, George Lukács, que, no prefácio do seu livro Existencialismo ou Marxismo, fala na fetichização das; palavras.

O Sr. Herculano de Carvalho (PCP):- Só citas Lukács nas suas partes que te convêm.

O Orador: - Está aqui assim alguém a dizer que eu só cito esse autor quando me convém. Evidentemente que, de certas bancadas, eu também não espero que citem o Cardeal Cerejeira ...

Risos.

Dizia eu, portanto, que George Lukács fala em fetichização das palavras e temos um caso de fetichização das palavras, que é a expressão «justiça popular», o que quer dizer, como fala o povo, «quem não quer ser lobo, não lhe veste a pele». Quem entende que é necessário introduzir elementos populares na máquina da administração da justiça por uma forma orgânica, e efectiva, pois, muito bem, tem - nas formulações concretas discutiremos - o meu apoio e a meu aplauso.
Mas isso não é o que historicamente se chama justiça popular. A expressão «justiça popular» tem três conotações essenciais. Em primeiro lugar, aparece focada, pelos tratadistas, quando as tropas relâmpago da Revolução Francesa, o exército francês partiu para combater as pessoas que amavam a sua fronteira, e, antes de partir, massacrou ou matou todos os inimigos de classe que se encontravam nas prisões, dizendo que a rectaguarda não ficava segura e que ela podia tomar o poder, e os tratadistas vieram depois dizer que este acto tinha sido um acto de justiça popular. Talvez seja, talvez não seja. Não interessa. O que interessa é que nenhum tratadista tentou erigir este acto inorganizado e espontâneo, moralmente valorizável de uma maneira ou de outra - não estamos aqui para discutir história - em sistema normal de prestação de justiça. E quando, por exemplo, se fala em justiça popular em Portugal (e a UDP é useira e vezeira em ler ou copiar nesta Assembleia ou fora dela referências históricas ao que se passa aqui ou noutros países), do que é que se está a falar? Está-se a falar numa estruturação e numa organização da justiça neste país que passasse pelas grandes assembleias e em que o povo pudesse espontaneamente formar a sua vontade. Ora, é evidente que isto não é justiça popular, isto é aquilo que eu disse no outro dia, é a lei de Lynch, etc.
E o que é curioso é que, no desvario a que nós chegámos e que esperamos não continue neste país, um vulgar assassino, ou trabalhador, José Diogo, que matou um agrário, pura e simplesmente é elevado à categoria de herói nacional. E não se diga que o assassino agiu em legítima defesa e que o agrário é pura e simplesmente um bandido - não sei se é ou não! Só um tribunal devidamente formado, no qual devem entrar, sim senhor, esses elementos do júri que agora defendemos, na sua independência e na sua integridade, é que pode dizer se é uma coisa ou outra.
Têm acontecido casos em que publicamente se vai para os tribunais vexar a magistratura, vexar os advogados, impedir execuções da sentença.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Porquê? Quem é que não tem coragem para dizer que isto é errado, que isto é criminoso? E quem é o democrata, verdadeiramente democrata - porque também há os democratas a quem alguém chamava «os democratas de aviários» -, que não tem coragem para pedir que estes actos sejam severamente reprimidos pela força pública e pela cadeia, nos termos da lei? Quem é?

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E não se diga que isto é uma posição típica da direita, ou da esquerda. Nós sempre defendemos que estas questões devem ser resolvidas com determinados princípios. Isto é tão condenável como são condenáveis, por exemplo, aquelas notícias que vinham outro dia no jornal referentes ao julgamento de um Deputado neofascista italiano, que foi condenado a cinco anos de cadeia, e em que as massas populares lá do partido dele, pura e simplesmente, o tentaram raptar em pleno tribunal. Isto continua a ser, seja quem for, absolutamente condenável.
Dito de outra forma, os factos são diferentes, mas nós só seremos democratas se em face de factos diferentes permanecermos iguais.

Vozes: - Muito bem!