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13 DE JULHO DE 1977 4525

O Orador: - Mas aí está a Constituição a redimir velhos pecados da sociedade portuguesa e, dentro em breve, a nova legislação civil, uma e outra a repor a justiça devida aos filhos nascidos fora do casamento.
Muitas outras e renovadoras ideias são propostas no âmbito dos direitos de família: a maioridade aos 18 anos, por exemplo, fazendo esquecer a capacidade eleitoral já reconhecida, à capacidade de regência da própria pessoa e bens ao ser atingida aquela idade; uma deferente regulação do poder paternal, com a nota saliente da moderação dos excessos de paternalismo tradicional, através da audiência dos filhos, de acordo com a sua maturidade; a reestruturação do instituto da adopção, etc., etc.
Tudo o que venho enumerando dir-se-á representar a vontade do povo, porque soberanamente os seus representantes assim o legislaram ou vão legislar.
Seria, porém, irrealismo afirmar que toda a sociedade portuguesa vai acertar, de imediato, as inovações propostas, sem uma dúvida, um receio ou um gesto de resistência.
A família, cada família, tem a sua vontade e a sua verdade própria, por vezes diversa da verdade e da vontade do todo politicamente organizado em que se acha inserida. Na família, em cada família, há raízes fundas. Há um tronco comum. No seu seio, a atmosfera exterior penetra e aumenta. Mas é muito sensível à «mudança das estações»...

Fernando Pessoa, em três versos, sintetiza tudo quanto neste momento queríamos dizer:

«Como a família é verdade!»
Nela,
«Um sentimento conserva
Os sentimentos passados!»

O equilíbrio entre esse sentimento familiar do passado, as ideias do presente e a sua projecção no futuro é, afinal a tarefa difícil e o desafio que se põe, a nosso ver, ao legislador empenhado em desenhar nas matrizes jurídicas o pensamento renovado e renovador do guião da sociedade portuguesa: a Constituição da República.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Feitas estas ligeiras considerações de carácter geral, vou agora deter-me em alguns pontos particulares da proposta governamental que respeita à adaptação do Código Civil à Constituição em matéria de direitos, liberdades e garantias e matérias conexas, cujo conteúdo será, naturalmente, o adoptado no decreto-lei para que é pedida autorização.
Um aspecto do regime vigente em matéria de casamento que merece uma ligeira alteração na proposta é a fixação da idade núbil, elevada, no caso da mulher, de 14 para 16 anos.
Na exposição de motivos diz-se que, para além da aplicação do princípio da igualdade formal entre os sexos, importa vedar o casamento a quem não atingiu ainda a maturidade psíquica exigida para um acto de tal gravidade.
Se esta última razão sobreleva a anterior, naquela exposição de motivos a observação que haverá a fazer é a de que não houve a coragem suficiente para encarar de frente o problema, o que conduziria a elevar a idade núbil não só quanto à mulher, mas sim também quanto ao homem, embora, naturalmente, igualando uma e outra.
Não é que acreditemos muito na influência exercida petos critérios legais quanto à idade de casar.
Embora escasseiem neste domínio, como em tantos outros da vida nacional, os elementos estatísticos, a observação e um pouco dê experiência própria dizem-nos que a idade media de casar se situa nos 22 anos para a mulher e 25 anos para o homem. Este é o resultado obtido por quem possui dados exactos e em relação a mais de 100 anos, relativamente aos casamentos celebrados num concelho rural do interior.
A Guerra de 1914-1918; o período epidémico da pneumónica; as guerras nas colónias; o extraio social e económico onde os nubentes se inserem; o grau de cultura dos mesmos nubentes, esses são, entre muitos factores de ordem sócio-económica e cultural, os verdadeiros determinantes da idade de casar. Mais do que o amor! Mais do que o sexo!
A cobertura legal que, pelo casamento, se pretende dar aos casos de relações sexuais precoces merece algum aplauso mas, no nosso critério, não tanto que sobreleve o princípio já enunciado de que deve vedar-se o casamento a quem não atingiu a maturidade psíquica exigida para um acto de tão transcendente importância pessoal e social - e de certo não a terão atingido ainda os jovens de 16 anos de idade.
Dir-se-á que, cuidadosamente, se regressa, na economia da proposta, a uma maior valorização do consentimento dos pais para o casamento dos filhos menores, constituindo a falta desse consentimento um impedimento impediente o que, de algum modo, desvalorizará a crítica feita à não elevação da idade núbil.
Mas aqui houve, a meu ver, um retrocesso.
Nos termos da lei vigente, os filhos menores têm a obrigação legal de comunicar aos pais a sua vontade de contrair casamento. Os pais podem opor-se e, fazendo-o, será o tribunal a derimir o conflito. Mas, estando de acordo, não carecem em absoluto de formalizar em documento próprio o respectivo consentimento.
A experiência ensinou-me, na profissão que exerço, que uma tal regulamentação, não tendo inconvenientes, tem um enorme alcance prático, quanto à economia de tempo na preparação dos processos de casamento e sua simplificação, sendo muito visíveis essas vantagens nos processos relativos a nubentes menores com os pais ausentes; e tantos são, no estrangeiro.
Um segundo comentário vai recair sobre o chamado casamento por procuração.
O casamento por procuração é largamente praticado em Portugal.
Espalhada como se encontra a nossa população pelas sete partidas do Mundo e sendo a ausência dos nubentes, como se sabe, a principal, embora não a única situação que legitima ou justifica o instituto do casamento por procuração, a consagração legal deste instituto adequa-se, assim, e procura corresponder a exigências reais da vida dos portugueses.