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I Série - Número 18
Sexta-feira, 9 de Dezembro de 1977
DIÁRIO
Da Assembleia da República
I LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1977-1978)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 7 DE DEZEMBRO DE 1977
Presidente: Exmo. Sr. António Duarte Arnaut
Secretários: Exmos. Srs. Alberto Augusto Martins da Silva Andrade
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Mala Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.
Prosseguiu e concluiu-se o debate sobre a moção de confiança apresentada pelo Governo.
Intervieram no debate os Srs. Ministros das Obras Públicas (Almeida Pina, da Habitação, Urbanismo e Construção (Eduardo Pereira) das Finanças (Medina Carreira) e do Plano e Coordenação Económica (Sousa Comes) e os Srs. Deputados Carlos Lage (PS), Lopes Cardoso (Indep.), Acácio Barreiros (UDP) - este por duas vezes -, Sérvulo Correia (PSD), Jaime Gama (PS), Aires Rodrigues (Indep.), Amaro da Costa (CDS), Carlos Brito (PCP), António Guterres (PS), Carmelinda Pereira (Indep.), Freitas do Amaral (CDS), Salgado Zenha (PS) e Sousa Franco (PSD).
Alguns dos oradores responderam ainda a pedidos de esclarecimento ou protestos formulados pelos Srs. Ministros dos Assuntos Sociais (Armando Bacelar), sem Pasta (Jorge Campinos) e do Comércio e Turismo (Mota Pinto) e pelos Srs. Deputados Helena Roseta (PSD), Furtado Fernandes (PSD), Cunha Leal (PSD), José Leilão (PS), Carlos Lage (PS), Sérvulo Correia (PSD), Severiano Falcão (PCP), Nuno Abecasis (CDS), Manuel Proença (PS), José Luís Nunes (PS), Jorge Leite (PCP), José Jara (PCP), Moura Guedes (PSD), Rui Pena (CDS), Amaro da Costa (CDS), Ângelo Correia (PSD), Veiga de Oliveira (PCP), Zita Seabra (PCP), Carlos Carvalhas (PCP) e Ribeiro e Castro (CDS).
O debate foi encerrado com a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares), que no fim respondeu a protestos dos Srs. Deputadas Amaro da Costa (CDS) e Sousa Franco.
Submetida à votação, a moção de confiança foi rejeitada. Seguindo-se declarações de voto formuladas pelos Srs. Deputados Joaquim Gomes (PCP), Acácio Barreiros (UDP), Basílio Horta (CDS), Magalhães Mota (PSD)e Saldado Zenha (PS).
Durante a sessão foi lido, pelo Sr Deputada Pinto da Cruz (CDS), o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição do Sr. Deputado Manuel Moura (PS).
A sessão foi encerrada às 6 horas e 10 minutos do dia seguinte.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 10 horas e 10 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho Martins do Vale.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
António Barros dos Santos.
António Cândido Macedo.
António Duarte Arnaut.
António Jorge Moreira Portugal.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Dieter Dellinger.
Enrico Manual das Neves Henriques Mendes.
Fernando Gomes Vasco.
Fernando Jaime Pereira de Almeida,
Fernando Reis Luís.
Florêncio Joaquim Quintas Matias.
Francisco António Marcos Barracosa.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
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Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Francisco Soares Mesquita Machado.
Herculano Rodrigues Pires.
Jerónimo da Silva Pereira.
João da Silva.
Joaquim José Catanho de Menezes.
José Carlos Rodrigues Pimenta.
José Gomes Fernandes.
José Maximiano de Albuquerque de Almeida Leitão.
Ludovina dais Dores Rosado.
Manuel Augusto de Jesus Lima.
M amuei do Carmo Mendes.
Manuel João Cristão.
Manuel Joaquim Paiva Pereira Pires.
Manuel Lencastre Menezes de Sousa Figueiredo.
Manuel Pereira Dias.
Maria Alzira Costa de Castro Cardoso Limos.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Margarida Ramos de Carvalho.
Mário Manuel Cal Brandão.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Teimo Ferreira Neto.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Partido Social Democrático (PSD)
Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Álvaro Barroso Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amantino Marques Pereira de Lemos.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Américo de Sequeira.
António Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António José dos Santos Moreira da Silva.
António Manuel Barata Portugal.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
Armando António Correia.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando Adriano Pinto.
Fernando José Sequeira Roriz.
Francisco Barbosa da Costa.
Francisco Braga Barroso.
Gabriel Ribeiro da Frada.
João Afonso Gonçalves.
João António Martelo de Oliveira.
João Lucílio Caceia Leitão.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.
José Adriano Gago Vitorino.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Júlio Maria Alves da Silva.
Luís Fernando Cardoso Nandim de Carvalho.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Manuel Henrique Pires Fontoura.
Manuel Valentim Pereira Vilar.
Maria Élia Brito Câmara.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Nuno Gil Pires.
Olívio da Silva França.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Centro Democrático Social (CDS)
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Ângelo Alberto Ribas da Silva Vieira.
António Simões Costa.
Carlos Martins Robalo.
Emílio Leitão Paulo.
João Carlos Filomeno Malhó da Fonseca.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José Magalhães Ferreira Pulido de Almeida.
Viária José Paulo Sampaio.
Rui Fausto Fernandes Marrana.
Vítor Afonso Pinto da Cruz.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Matos Zuzarte.
António Marques Pedrosa.
Cândido de Matos Gago.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Augusto Pinhão Correia.
Carlos Hahnemann Saavedra de Aboim Inglês.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim S. Rocha Felgueiras.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Gomes.
Manuel Gonçalves.
Manuel Pereira Franco.
Manuel do Rosário Moita.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Nicolau de Assunção Madeira Dias Ferreira.
Raul Luís Rodrigues.
Severiano Pedro Falcão.
Victor Henrique Louro de Sá.
Independentes
José Justiniano Taboada Brás Pinto.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.
O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 138 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 30 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados. Srs. Membros do Governo, a Mesa aguarda inscrições. Como sabem, temos cerca de nove horas de trabalho na reunião de hoje, tantas quantas as necessárias para se produzirem as intervenções? programadas, caso o Governo e os partidos políticos esgotem o tempo que lhes foi atribuído. Pediria aos Srs. Deputados e ao Governo que fizessem um esforço de síntese nas vossa?, intervenções. Igualmente pediria que se dispensassem de protestos, a não ser que eles se tornem absolutamente necessários.
Como disse, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, não remos inscrições. Há um artigo no Regimento que diz que o debate terminará quando não houver mais inscrições. Espero que o debate não termine neste momento.
Risos.
Faria um apelo, sobretudo dirigido aos presidentes dos grupos parlamentares, no sentido de informarem a Mesa se têm mais algumas intervenções a produzir. Também faria o mesmo apelo ao Governo, visto não me parecer curial que o Plenário esteja em funcionamento sem funcionar.
Pausa.
O Sr. Primeiro-Ministro pede a palavra. Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares): - Bem. evidentemente que o Governo está preparado para fazer algumas declarações finais, mas. como foram anunciadas ainda intervenções de fundo, nomeadamente pelo Sr. Prof. Freitas do Amaral que disse que a crítica de fundo de natureza económica do seu partido seria apresentada pelo Sr. Deputado Amaro da Costa, e se prevêem outras intervenções de fundo de outros dirigentes dos partidos de oposição, é natural que nesta matéria o Governo seja o último a falar.
O Sr. Presidente: - Como o Sr. Primeiro-Ministro bem sabe, o Governo tem a possibilidade de fazer uma declaração final. Entretanto pode participar no debate, não se tornando absolutamente necessário que seja o último a participar nele.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Como o Sr. Primeiro-Ministro fez referência à referência do Sr. Deputado Freitas do Amaral, eu refiro ao Sr. Primeiro-Ministro que efectivamente o CDS é um partido que tem ainda 46 minutos para se pronunciar, o Governo tem 147 minutos e 30 segundos, o PS tem 94 minutos e 30 segundos, o PSD tem 61 minutos e 30 segundos, o PCP tem 71 minutos e 30 segundos e a UDP tem 35 minutos, o que quer dizer, em termos de grupos parlamentares, que o CDS é aquele a que resta menor tempo. Portanto não me parece que se justifique que. ele seja referido em primeiro lugar. Efectivamente, nós faremos a intervenção de fundo, mas acontece uma circunstância nacional: é que efectivamente nós, de maneira geral, chegamos sempre atrasados e o atraso' é gerai nesta Assembleia, no que se refere aos intervenientes, quer do Governo quer do PS, do PCP, do PSD e do CDS. Além disso, penso que não há ordem nenhuma especial para que seja o CDS a iniciar as declarações de fundo, podendo não ser o próprio Governo a dar-lhes início.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, o apelo que a Mesa faria é que se inscrevessem, porque caso contrário, teremos de suspender a sessão, o que tornará ainda mais escasso o tempo disponível.
O Sr. Ministro Jorge Campinos pede a palavra para fazer uma sugestão?
Pausa.
O Sr. Ministro sem Pasta (Jorge Campinos): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, nós faremos a seguinte proposta: falará, da parte do Governo, o Sr. Ministro das Obras Públicas, para facilitar os trabalhos desta Assembleia.
O Sr. Presidente: - Ia fazer a sugestão, caso não houvesse oradores, de suspendermos os nossos trabalhos e reunirmos os presidentes dos grupos parlamentares com a presença de um elemento do Governo para assentarmos num calendário. Contudo tal não é já necessário.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas.
O Sr. Ministro das Obras Públicas (Almeida Pina): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi ontem uma referência ao estado de execução em que se encontra o Plano do Governo e, na parte que diz respeito ao Ministério das Obras Públicas, tenho muito prazer em dar umas ligeiras indicações quanto ao estado em que o mesmo se encontra. Nós pensamos, dentro da óptica em que programámos e temos procurado realizar, que estamos a cumprir o programa. Ele só não se encontra acabado porque foi programado para quatro anos. De qualquer forma, eu poderia dar umas indicações sintéticas da sua posição. Terei todo o prazer, inclusivamente, em distribuir posteriormente os elementos que julgarem convenientes para um análise mais detalhada.
Assim, eu poderia começar pelo sector das construções escolares, em que, como dissemos no Programa do Governo, consideramos muito carência das as diversas regiões do País. Propusemos a construção, no período de quatro anos, de 4000 falas de aula. Posso informar que temos neste momento já concluídas cerca de 600. Estão em curso para o ensino primário 2600: para o ensino preparatório 30 edifícios, o que corresponde a cerca de 900 salas; para o ensino secundário 34 edifícios, o que corresponde a cerca de 1000 salas. Poderíamos portanto, de uma forma global, dizer que temos em curso as 4000 salas de aula programadas. Pensamos, pois, que no período dos quatro anos não foi optimista a nossa previsão, podendo até vir a ser ultrapassada.
Em relação às construções hospitalares, nós previmos diversas actuações em muitos estabelecimentos hospitalares que constam nominalmente do Programa
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do Governo e posso informar que ate este momento estão já concluídas ou em fase adiantada as acções relativas aos Hospitais de Faro. Chaves, Viana do Castelo e Castelo Branco, as quais, totalizam cerca de 1 milhão de contos. Estão já adiantadas acções no Hospital de S. José, no aspecto de se terem iniciado as obras, não no aspecto de as mesmas estarem a ser concluídas. porque, como sabemos, são obras para cinco ou seis anos. Irmos lançar de imediato, no inicio do próximo ano. obras nos Hospital, de Abrantes, Barreiro, Horta e Santarém. de acordo com o que consta do nosso programa. Entretanto foi já estabelecido o programa para o arranque do novo hospital de Coimbra, para o que foi construído um gabinete para coordenar todas as acções. Estão também muitas outras obras já iniciadas, designadamente de melhoria, em varies hospitais, cerca de uma dezena. Seria maçador passar a ter de as designar agora, uma por uma.
Está programada, para o inicio do 1.° trimestre do próximo ano, a adjudicação de 25 centres de saude. Aqui nos pensamos que nos atrasamos cerca de dois meses.
Em relação à modernização das instalações dos edifícios publicos, começamos por fazer uma coordenação global e estamos a procurar fazer uma racionalização da ocupação dos espaços que temos, tendo-se feito diversas acções nesse campo. São alguns milhares as instalações ocupadas e seria naturalmente maçador nomeá-las na totalidade.
Em relação á rede viária, que no nosso programa consta de virias vias nominalmente descritas -eu diria muito sumariamente- no eixo fundamental Braga-Setúbal, concluíram-se já as acções nas variantes de Leiria e da Ota e estão em conclusão os estuados. para a variante do Alto da Serra e trabalhos, na estrada n.° 1, na Batalha. O programa das auto-estradas está a ser cumprido de acordo com o Programa do Governo. Abrir-se-ão, durante o final do próximo 1.° semestre de 1978. o troço até Palmela e, posteriormente, o de Aveiras de Cima. Concluir-
-se-ão os outros, dentro dos prazos programados, cujos projectos estão em fase de conclusão.
Foi lançada, segundo o previsto, a obra da ponte da Figueira da Foz, com uma adjudicação de cerca de 800 000 contos. Esta em fase adiantada o estudo prévio da ligação Aveiro-Vilar Formoso. Pensamos que no final do próximo ano poderão ter inicio estas obras. No eixo de Coimbra-Vilar Formoso, passando por Viseu, estão já em curso obras no valor de 500 000 contos e mais obras, também no valor de 500 000 contos, serão executadas no próximo ano.
Estão também em execução, de acordo com o programa, as obras nos restantes eixos e em estudo já adiantado, no eixo Porto-Bragança, a passagem do Marão, que pretendemos por em execução no próximo ano. Foi realizado, como é do conhecimento desta Camara, porque esta Assembleia autorizou, o plano de emergência de reparação de estradas, em que se investiram cerca de 500 000 contos. O plano, pode dizer-se, foi concluído e beneficiou cerca de 40% da rede nacional. Pensamos que devera ser programado um novo plano financeiro para o próximo ano, uma vez que o plano técnico já o temos em condução e aqui não entraria um piano de emergência, mas sim um plano normal, sendo eventualmente necessario fazer um plano de emergência do mesmo tipo para a reparação das estradas municipais que após o presente Inverno ficarão bastante danificadas.
No âmbito da rede municipal, foi dado apoio as autarquias para a realização do plano aprovado pela Assembleia da Republica. Temos totalmente programadas todas as acções para os anos de 1975, 1979 e 1980, para pôr em execução em tempo oportuno. Poderei dar aos Srs. Deputados cópias destes planos, se julgarem de algum interesse.
Em relação aos problemas relativos à Secretaria de Estado dos Recursos Hídricos e Saneamento Básico, também muito rapidamente poderia informar que consideramos o plano em fase de cumprimento. Poderia, por exemplo, informar que o plano de rega do Vale do Vouga se encontra em fase adiantada de estudo, prevendo-se o inicio de algumas obras em 1978. Quanto ao plano de rega do Alentejo, encontram-se em fase de execução diversos projectos simultâneos. Assim, estão em fase de construção as barragens do Alvito, de Monte Novo e da Vigia e os canais de rega de Odivelas e as redes de aspersão da Vigia. Encontram-se com os projectos praticamente prontos, entre outras, as barragens do Minuto e do Crato e em fase avançada de estudo a de Marvão. Estas obras terão inicio no 2.º semestre do próximo ano. Encontra-se também em fase preliminar de execução a barragem do Alqueva, estando em curso as obras de acessos, galeria de desvio e respectivas ensecadeiras, ponte de serviço, etc. Encontra-se, em fase de estudo todo o sistema de rega.
No Nordeste transmontano encontra-se em fase de conclusão todo o sistema de rega do Vale de Vilariça. Está em concurso a barragem do Azibo e em estudo avançado toda a rede de rega de Macedo de Cavaleiros. Esta rede será lançada no próximo ano. Estão em estudo mais oito empreendimentos de pequenos aproveitamentos hidroagrícolas em Trás-os-Montes.
Na Cova da Beira encontram-se concluídos os projectos das barragens da Capinha e Meimoa, devendo ser postos a concurso no 1.º trimestre do próximo ano. Estava no nosso programa previsto o lançamento destas obras no ultimo trimestre de 1977, mas aqui verifica-se um atraso devido as dificuldades na obtenção dos financiamentos. Contudo este atraso será recuperado. Foram já postos a concurso os trabalhos dos acessos as barragens da Capinha e Meimoa. Está em estudo avançado toda a rede de rega desta zona, podendo-se iniciar no principio de 1979 a sua construção.
Encontram-se em fase de conclusão os aproveitamentos hidroagrícolas do Barlavento e Sotavento algarvios, prevendo-se o lançamento do primeiro concurso no inicio do próximo ano. Encontram-se em estudo o aproveitamento do vale do Tejo, do vale do Lima, várzea de Loures, etc. Os projectos do primeiro bloco do vale do Tejo estão praticamente concluídos, podendo iniciar-se a sua execução em 1978.
Em ligação com o Ministerio da Indústria e Tecnologia já se fez o lançamento das barragens do
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Alqueva e Crestuma da Aguieira e da Raiva, estando estes trabalhos a recuperar do atraso. Ainda em ligação com n MIT já se lançou o concurso da barragem de Fronhas, como complemento da barragem cia Aguieira. Estão em conclusão os estudos das barragens da Rocha da Galé e do Lindoso.
Têm-se mantido os contactos internacionais e tem-se participado em numerosas reuniões de carácter técnico internacionais com a apresentação de problemas no âmbito dos serviços.
Estão em execução es estudos previstos no plano relativamente aos problemas hidrogeológiccs do Algarve e da península de Setúbal. Prevê-se que no final do próximo ano os trabalhos estejam concluídos. Estes trabalhos estão a ser comparticipados pela instituição financeira do PNUD.
Está em fase preliminar de lançamento o Plano Nacional dos Recursos Hídricos. Quanto ao saneamento básico, tem-se dado apoio técnico aos, sistemas regionais de abastecimento de água e recolha de escotes, a cargo das autarquias locais. Tem-se procedido à elaboração de numerosos projectos de ordem regional, alguns dos quais se encontram em conclusão, prevendo-se o início da sua execução em 1978, nomeadamente os do Marachão, Fagilde, Ranhados e outros. Criou-se uma estrutura descentralizada para apoio das autarquias colocando nas fedes dos distritos núcleos de saneamento básico que têm feito o apoio técnico local. Elaborou-se um projecto da proposta de lei de saneamento básico que será oportunamente apresentada a esta Assembleia. Fez-se uma análise do sector com a colaboração da Organização Mundial de Saúde. Obteve-se apoio para este sector das Nações Unidas e da Organização Mundial de Saúde. É esta a situação do nosso plano neste momento.
Eu peço desculpa por ter sido tão rápido, mas farei distribuir aos Srs. Deputados uma cópia desta resenha que acabei de fazer, que, na nossa óptica, dá cumprimento cabal à nossa proposta que, embora em alguns sectores tenha sido considerada optimista, nós pensamos que está cumprida, pensamos agora que até foi optimista e que poderíamos ir mais longe na concretização da conclusão das necessidades primárias das populações do nosso país.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há inscrições para pedidos de esclarecimento. Como disse de inicio, o tempo é escasso e se prolongarmos o intervalo entre as várias intervenções iremos arrastando os nossos trabalhos. Creio que se encontram na sala muitos oradores que vão intervir e far-lhes-ia o apelo para que se inscrevessem.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos por dez minutos e peço aos Srs. Presidentes dos grupos parlamentaras e a um representante do Governo o obséquio de comparecerem no Gabinete da Presidência, a fim de assentarmos no modus jaciendi, para que estes intervalos não se pois creio não corresponderem à importância do debate em curso.
Está interrompida a sessão por dez minutos.
Eram 10 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 11 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, como sabem, a sessão foi suspensa por não haver na altura qualquer orador inscrito. Comunicaram-me entretanto que a Radiodifusão Portuguesa informou que a sessão havia sido suspensa por não haver qualquer orador do CDS inscrito. Trata-se de uma inexactidão que urge corrigir e que fica desta forma corrigida.
Na reunião a que agora se procedeu ordenaram-se as inscrições para esta manhã. Como tal, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lage. Em seguida usará da palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PS testemunha a sua vontade de que a sessão prossiga ao inscrever um orador que não estava previsto que falasse e que, fundamentalmente, falará a partir de algumas notas tiradas de momento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a recusa inequívoca e fera do PS em se vergar às exigências das forças de direita reveste-se do mais profundo significado. Esta grande recusa faz tremer essas forças e converter-se-á num escândalo para os interesses da burguesia exploradora e vai gerar uma onda de histerismo anti-socialista nos arraias da extrema-direita.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Insurgimo-nos contra as análises superficiais que vêem nesta decisão apenas o nosso sentido de sobrevivência ou que mistificarão ecrã recusa com discussões casuísticas sobre o nosso comportamento governamental ou que descarregam os seus despeitos, as suas recriminações e as suas acusações como se este acto fosse sinal de fraqueza. No entanto este acto é sinal de coerência, fidelidade e coragem. Mostra que o grande partido de esquerda que somos não transige nem renega a sua vocação essencial de lutar pelos, interesses das classes trabalhadoras e de construir um projecto de socialismo em liberdade ao qual o povo português tem dado repetidamente o seu apoio.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mostra que nos mantemos fiéis ao espirito da revolução portuguesa que subverteu radicalmente as estruturas retrógradas e exploradoras da sociedade - portuguesa e que no seu sopro revolucionário parecia- ter varrido a direita tradicional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, é estranho e dúplice o critério dos partidos à nossa direita que fazem
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advertências e ameaças com o papão da «maioria de esquerda» e que não têm o pudor de disfarçar a sua profunda concordância táctica, da tendência unificante a longo prazo. Sublinhe-se a solidariedade entre eles manifestada e a sua vontade, em especial do PPD, de provocar a nossa clivagem com os trabalhadores português, como passo fundamental na estratégia de recuperação capitalista e no poder da antiga classe dominante. Esta técnica do «salame» que nos pretendem aplicar leria como natural desenlace a recusa posterior em se sentarem à mesa connosco, não por não sermos democratas, ou então por sermos maus democratas e marxistas. Não pensem que somos ingénuos ou suicidas. Como força de esquerda, não estamos dispostos a perder o controlo estratégico da situação política que levou tantas dezenas de anos a conquistar ao povo português.
O PCP, que nos acusa com a tríade de chavões habituais, de recuperação latifundista, monopolista e imperialista, pode estar certo de que esta calamidade só não acontecerá enquanto nos mantivermos no Governo, não se vislumbrando que outra fórmula governamental possa dar mais garantias.
Sr. Presidente. Srs. Deputados, não éramos em período de estimular ou acelerar a luta de classes. Só aos sectores, da extrema-direita e da extrema-esquerda interessaria esta táctica. Há um determinado momento em que todas as classes estão de acordo em fazer uma pausa e desenvolver a luta política por meios que não ponham em causa a sua sobrevivência mútua.
A extrema-direita está alarmantemente activa neste pais. É deplorável que alguns dêem por vezes ensejo ao reacender da acção desses meios que viam incendiar a sociedade portuguesa, como é patente nas suas mais recentes exibições: manifestações de rua caracterizadas pela cenografia da violência, de saudações fascistas e de protestos à bomba: órgãos de informação donde jorram insultos e calúnias a cidadãos exemplares, como tem acontecido a tantos socialistas e democratas, vilmente caluniados.
Estes sinais prenunciadores do renascer das forças fascistas têm de nos merecer o mais enérgico combate, formulando não só uma condenação moral como aplicando também todos os meios repressivos necessários à defesa da legalidade e do quadro institucional criado pela Consumição. Todos os democratas e antifascistas têm d; se empenhar no combate ideológico e na pedagogia social necessários para impedir a poluição e deterioração do clima morai e cultural do País.
Sr. Presidente. Srs. Deputados, a propósito das posições, dos partidos que nesta Assembleia nos atacam, põe-se a questão de saber qual o modelo alternativo, económico e social, que eles propõem face ao nosso próprio modelo. Não basta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, acusar, denunciar com demagogias e promessas que se revestem mais de cunho eleitoral, e não basta virem atacar-nos quando as principais consequências negativas que se verificam na economia da sociedade portuguesa são resultantes de desequilíbrios estruturais de um capitalismo decadente e retrógrado que gorou o atraso económico, industrial e social do nosso pais, atraso de que os democratas à progressistas não são responsáveis,
nem as classes sociais e os grupos políticos estão ligados à classe ou classes dominantes tradicionais. E preciso ler em atenção, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não se consegue modificar substancialmente as estruturas sociais e económicas atrasadas apenas, embora isso seja fundamental, com alterações profundas nas relações de produção e nas relações sociais. Há determinado atraso e debilidade no desenvolvimento das forças produtivas que não são substituíveis ou corrigíveis de um momento para o outro. E esse atraso das forças produtivas que se reflecte na acção governamental e nas dificuldades que a gestão económica do PS encontra no momento. Sem esse desenvolvimento das forças produtivas é inteiramente infantil, demagógico e voluntarista vir acusar as pretensas debilidades ou carências de uma acção governamental. Mas, importa sublinhar aqui o seguinte: qual a alternativa que os partidos à nossa direita, ou quem se pretende à nossa esquerda, apresentam? Que modelo económico e social ou que modelo de desenvolvimento nos prometem? Pelas parências Sr. Presidente e Srs. Deputados e pelas reclamações e reivindicações verificadas em documentos apresentados por organizações patronais e políticas, esse modelo económico e social implicaria uma profunda repressão económica, acompanhada por uma repressão política. E implicaria também que a Lei da Greve fosse modificada, implicaria que a Lei, dos Despedimentos fosse modificada, implicaria que a Lei das Comissões de Trabalhadores fosse modificada e implicaria igualmente que o figurino económico e social do nosso pais fosse modificado. E isso não se faz sem repressão política, isso não se faz sem subverter e criar um clima de intranquilidade na sociedade portuguesa.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - E, aliás, pergunta-se também: porquê reivindicar a modificação das Leis da Greve ou dos Despedimentos ou a alteração da configuração desse sistema económico?
Afinal, neste país há uma onda colossal de despedimentos que é preciso combater por meios políticos e administrativos. Porquê pretender que haja mais facilidade nos despedimentos?
As greves no nosso país, como já foi dito, são relativamente tímidas e, como disse o nosso Primeiro-Ministro, as classes trabalhadoras têm tido um alto sentido de responsabilidade. Porquê querer modificar a Ler da Greve? Porquê querer modificar a Lei das Comissões de Trabalhadores ou torná-la completamente inócua quando se verifica que as comissões de trabalhadores estão a dar provas de responsabilidade e quando se verifica que há um boicote a sua criação ou ao seu desenvolvimento nas empresas em que cias não existem ou em que ainda não tiveram possibilidade de se implantar? Esta táctica, esta estratégia, visa fundamentalmente demolir politicamente, demolir ideologicamente, as estruturas que a esquerda e os trabalhadores portugueses foram criando. É isso seria o primeiro e fundamental passo para uma retomada plena do Poder pelas forças que representam, em Portugal, a burguesia e o capital.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - É isso que o Partido Socializa, nesta grande recusa, não aceita e essa compreensão que os trabalhadores portugueses já tiveram e que os trabalhadores, como aos portugueses conscientes e lúcidos, não passa despercebido. É fundamental, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se consiga, no nosso pais, uma unidade de acção das classes trabalhadoras. Essa unidade de acção é fundamental para a defesa dos seus interesses, para os trabalhadores a oporem a que essas comunistas sejam diluídas e para se oporem ao advento do novo regime autoritário e repressivo, dessa a grande tarefa dos trabalhadores portugueses.
Nós, como partido representante dessas forcas. como partido fundamentalmente de trabalhadores, estamos conscientes de que este momento histórico implica essa profunda reflexão das classes trabalhadoras e esse assumir do seu destino num contexto que é difícil, mas no qual ainda têm a hegemonia e o controlo, que não podem perder.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, acusam-nos de forma singular...
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - De forma plural!
O Orador: - ... os nossos interlocutores.
O Sr. Deputado presidente do CDS, Diogo Freitas do Amaral, na sua intervenção de ontem, se, por um lado - cito de memória -, achava conveniente alargar às forças políticas mais amplas a responsabilidade pela resolução dos problemas da sociedade portuguesa e repudiava Qualquer tentativa, segundo disse, de marginalizar o PSD. por outro lado aceita, encoraja ou deseja que seja marginalizada uma outra força que é também necessária, neste contexto, para resolver a criar que atravessamos e para ultrapassar o grave problema económico, social e financeiro que o nosso país vive.
Por outro lado, também achava que podia levantar alguns problemas a pretensa possibilidade de criação de uma maioria de esquerda. Seria assim correcto, e conveniente, que para não haver nem um perigo nem outro, iodas as forças políticas do nosso país entendessem que uma plataforma ampla, de salvação nacional, em que todos participassem pondo de parte as suas ambições peculiares, pondo de parte as suas irritações mútuas, servisse para resolver os grandes problemas do nosso pais.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, faço aqui algumas reflexões e alguns comentários relativamente a este momento que o País atravessa.
O Partido Socialista vai sair deste debate mais forte, mais decidido e mais consciente do seu papel histórico.
As classes trabalhadoras compreenderão que foi isso mesmo que aqui aconteceu. O Partido Socialista define-se e manifesta inteiramente o seu perfil ideológico e a sua profunda ligação com as classes trabalhadoras e o seu destino.
Aplausos da PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta, creio que para pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD):- Não, Sr. Presidente, é para um protesto.
Risos do PS.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Vou resumir as minhas considerações.
O Sr. Deputado Carlos Lage acaba de produzir aqui uma porção de afirmações com as quais eu estou, evidentemente, em manifesto desacordo. Aliás, afirmações de um marxismo relativamente primitivo e, indigente...
Risos.
... mas não me compete, neste momento, fazer a exegese das afirmações que o Sr. Deputado aqui fez. Vou apenas protestar em relação ao processo de intenções que aqui foi feito e que não corresponde, efectivamente, à realidade.
Em primeiro lugar, vou protestar em relação à afirmação que o Sr. Deputado fez de que há um avanço das forças de direita, que se manifesta, por exemplo, através de manifestações de rua e, dos actos de violência que nelas se verificaram.
Manifestações de desagrado do PS.
É, evidente que o Sr. Deputado Carlos Lage só cita as manifestações de rua que foram promovidas pela Vera Lagoa e não cita as manifestações de rua que foram promovidas pela Intersindical.
Manifestações de desagrado do PS e PCP.
É evidente também que nas manifestações de rua da Intersindical não houve bombas, mas que nas outras houve.
Eu pergunto: foram as forças que apoiaram a manifestação de rua promovida pela Vera Lagoa que foram lá pôr as bombas? Oh Sr. Deputado, isso é perfeitamente absurdo!
Protestos do PS e PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço a vossa atenção e a vossa reflexão. Estamos num debate importante de uma moção de confiança. A Sr.ª Deputada está a fazer um protesto, está naturalmente a expor os seus pontos de vista e tem o direito de ser ouvida.
Tenha a bondade de continuar, Sr.ª Deputada.
A Oradora: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, é sabido que estas manifestações de rua nem sequer tiveram o apoio do PSD.
Manifestações de desagrado do PS e PCP.
No entanto, o que nós defendemos é que todos os cidadãos têm o direito de se manifestar, livremente, quando essas manifestações são autorizadas e quando a tranquilidade é garantida pelo Sr. Presi-
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dente da República. E é por isso que protesto contra as afirmações que o Sr. Deputado acaba de fazer.
Manifestações de desagrado do PS:
Em segundo lugar, queria protestar quanto à afirmação, que o Sr. Deputado fez, de que a causa da situação difícil em que nos encontramos e o atraso das forças produtivas e de que o Governo não e culpado dessa situação, como nós temos dito.
Sr. Deputado, aí esta mais uma afirmação em consistência. Se há atraso nas forças produtivas, isso deve-se, principalmente e fundamentalmente, à acção governativa, que efectivamente não tem dado a confiança necessária para que o investimento se verifique neste país e para que as forças produtivas possam efectivamente trabalhar e produzir como é necessário.
Aplausos do PSD e manifestações de desagrado do PS.
Protesto ainda em relação à Questão levantada pelo Sr. Deputado dos modelos alternativos, tendo sugerido que. outra política levaria necessariamente à repressão económica e à repressão política. O Sr. Deputado tem efectivamente pouca imaginação! O que se passa no nosso país é que a nossa sociedade não está a funcionar porque uma sociedade funciona ou baseada na coacção ou baseada na confiança. Coacção já não há e confiança ainda não há, e a sociedade não pode funcionar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora:- Podemos, efectivamente, instaurar um clima de confiança sem ter um clima de repressão. Sr. Deputado. São coisas completamente diferentes. O que se passa, neste momento, é que não há confiança.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O 'Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr.ª Deputada, pois está a esgotar o seu tempo.
A Oradora: - Finalmente, um último ponto. O Sr. Deputado disse que era necessária unidade de acção das classes trabalhadoras. Eu tenho consciência de que, efectivamente, os trabalhadores deste país têm um papel, declivo a desempenhar no desenvolvimento da nossa situação económica e; na salvaguarda da nossa democracia. Quero apenas registar a contradição entre isso que o Sr. Deputado afirmou e uma afirmação de ontem do Sr. Primeiro-Ministro, dizendo que o Partido Socialista era um partido interclassista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Lage (PS): - É para contraprotestar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputada.
O Sr. Carlos Lage (PSD) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Helena Roseta não contraprotestou, mas manifestou opiniões. E afirmou que estávamos manifestamente em desacordo. Nós estamos, evidentemente em desacordo. Quanto ao marxismo indigente de que me acusou, dá-me a impressão de que a Sr.ª Deputada Helena Roseta e o seu marido devem ser marxistas muito preparados e especializados. ...
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Não somos marxistas.
O Sr. Braga Barroso (PSD): - Nem só os marxistas aprendem Marx.
O Orador: - ... porque constantemente, nesta Assembleia, pretendem dar lições ás marxismo àqueles que não pretendem dar lições de marxismo a ninguém, nem tão-pouco pretendem ser os marxistas integras a que a Sr.ª Deputada agora vem fazer críticas.
No entanto, Sr.ª Deputada Helena Roseta, é curioso que o seu partido considerasse numa determinada fase, ou que esteja no réu programa, que não repudiava determinadas análises do marxismo. E é também curiosíssimo que o PPD e a Sr.ª Deputada Helena Roseta venham agora arvorar-se em críticos doutrinários do marxismo e em antimarxistas primários.
Quanto às manifestações de rua, eu não afirmei que essas manifestações eram fascistas. O que afirme; é que existem manifestações de fascismo nessas, passe o pleonasmo, manifestações de rua. Ou seja, que a cenografia da vidência, que a encenação de tipo fascinas; verifica em grupos organizados, comandados e armados que actuam no seio dessas manifestações. E custa-me a crer que a Sr.ª Deputada Helena Roseta não considere isso alarmante e não assinale esse perigo. Então direita que os democratas portugueses, entre os quais incluo a Sr.ª Deputada Helena Roseta, começam a desarmar, moral e politicamente.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao atraso nas forças produtivas, de que diz haver responsabilidade por parte do Partido Socialista, isso é o que -já agora que estamos no capítulo das negações- se chama uma afirmação, digamos assim, a-histórica, isto para não dizer anti-histórica, porque, como é evidente, as forças produtivas no nosso país desenvolvem-se ao longo de dezenas e centenas ide anos e têm a sua notória. Ora a sua história é um pouco equivalente à história do desenvolvimento do capitalismo português que, por debilidade e deficiência da burguesia portuguesa ou seja, da burguesia industrialista, porque a burguesia comerciante foi sempre bastante opulenta e gozou sempre de privilégios, de facto nunca chegou a ter grande desenvolvimento. O capitalismo português não foi capaz de industrializar o País e se na sua última fase. na década de 70, por acção de alguns grupos económicos e financeiros, por arrastamento europeu e por razões de outra ordem que não vaie a pena estar aqui a analisar, se começou a desenvolver uma determinada estrutura industrial, esta era ainda
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limitadíssima e as contradições do regime impediram que essa mesma estrutura industrial se desenvolvesse.
O Sr. Presidente: - ... Queira concluir, Sr. Deputado, porque já esgotou o seu tempo.
O Orador: - Tem razão, Sr. Presidente, peço desculpa.
Foi essa mesma estrutura industrial que com o 25 de Abril os trabalhadores portugueses e as forças políticas que se representam encontraram. As dissimetrias do desenvolvimento regional são manifestas, os desequilíbrios estruturais são também manifestos, a deficiência de produtividade é também evidente, competindo às forças políticas progressivas desenvolver, sem dúvida nenhuma, essas forças produtivas, através do investimento, através da iniciativa das próprias classes trabalhadoras, de através de todas as formas de iniciativa autogestionária e também, claro está, através da própria 'iniciativa privada.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a partir de agora o seu tempo ser-lhe-á descontado.
O Orador: - Então Sr. Presidente, eu termino rapidamente.
É assim, Sr.ª Deputada Helena Roseta, que compete às forças políticas progressistas desenvolver essas forças produtivas. Mas não de maneia selvagem, sendo asse desenvolvimento capitalizado e feito por uma classe social exploradora, mas sem sob controlo das próprias classes trabalhadoras portuguesas, diminuindo os efeitos destruidores que possam ter sobre as relações de trabalho e aprofundado constantemente o bem-estar, o controlo e a intervenção das classes trabalhadoras.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Tem-se visto!
O Orador: - Quanto à unidade de acção das classes trabalhadoras, Sr.ª Deputada Helena Roseta, ela é fundamental e não se pode confundir com a unidade de acção dos partidos políticos que até reclamam das classes trabalhadoras. Não vamos aqui, porque não temos tempo, dilucidar estes dois conceitos, mas para a prática política interessa separá-los, e não confundi-los.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Helena Roseta pediu novamente a palavra, mas antes da colega está inscrito o Sr. Deputado Furtado Fernandes.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Sr. Presidente, eu pretendia dar explicações a o meu camarada desejava fazer um protesto.
O Sr. Presidente: - Então V. Ex.ª pode dar explicações, visito que está na sequência da intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage. O nosso colega Furtado Fernandes fará o favor de esperar* um pouco.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Sr. Presidente: quero muito rapidamente dar uma explicação muito simples, apenas para que não fique aqui confusa a nossa porção em relação a um ponto que o Sr. Deputado Carlos Lage acaba de frisar.
O PSD não é um partido marxista, eu não sou marxista. O nosso programa efectivamente reconhece a utilidade de algumas análises marxistas, somos estudiosos do marxismo...
Risos do PS.
O Orador: - ... mas não fazemos, nem nunca faremos, profusão de fé no marxismo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Furtado Fernandes.
O Sr. Furtado Fernandes (PSD): -Sr. Presidente e Srs. Deputados, é efectivamente para acumular um protesto que pedi a palavra, protesto relativo às palavras proferidas pelo Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Deputado acusou o Partido Social-Democrata de tentar operar uma clivagem entre o Partido Socialista e os trabalhadores. Devo dizer, em primeiro lugar, que essa clivagem que efectivamente se está operando se deve à política que tem sido seguida pelo Partido Socialista em matérias importantes do domínio económico e do domínio social.
O Sr. Magalhães Mota (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Desde logo o problema do emprego, como já foi destacado numa intervenção do nosso presidente Sousa Franco.
Risos do PS.
Sabemos do elevado número de desempregados e sabemos que o Governo não tem tido uma política de recursos humanos. Sabemos que não se têm feito cursos da reconversão proifíssionia1!, de modo a ajustar à oferta a. procura no m-srcado do trabalho. Sabemos também que não s: têm 'ViCens^cadò devidamente os cursos de reciclagem e aperfeiçoamento profi&-
Dos pedildoB dirigidos à Secretaria de Estado da População e do Emprego apenas 10% foram satisfeitos. Aqufo que o Govomo^prometeu no Plano para 1977, 'nomeadamente no que se refere à obrigatoriedade de ''inscrições nos serviços da Direcção de Emprego, quer de candidatos
Vozes do PSD: - Mutilo bem!
O Orador: - Falou muito o Sr. Deputado Carlos Lage de progre sïrismo e dtss-e- que o Partido Soccaáista é efocwvamcn^ um 'partido de squerda, um partido
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progressista. Tenho a dizer ao Sr. Deputado Carlos Lage q>ue a esquerda e o progressismo vêem-se sobretudo das acções concretas do Governo, e não na verborreia avulsa deste ou daquele que deles se reclame.
Aplausos do PSD.
O Sr Agostinho do Vale (PS): - Parece que estás num comício!
O Orador: - Quero também dizer-lhe em relação ao problema da greve e dos despedimentos, que o Partido Social Democrata tem efectivamente discordâncias em relação a esses dois diplomam. Já as dissemos aqui nesta Assembleia, na altura própria.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir, porque já esgotou o seu tempo.
O Orador: - Concluirei rapidamente. Sr. Presidente.
Em relação à greve, as alterações que propomos tem a ver com aquilo que se pratica em muitos países democráticos. E em relação aos despedimentos naturalmente que nós não somos adeptos dos despedimentos maciços.
Vozes do PS: -Ah!...
O Orador - Exactamente aquilo que propusemos aquando da discussão da lei dos despedimentos foi um processo disciplinar que efectivamente salvaguardasse os interesses e os direitos dos trabalhadores, coisa que o Partido Socialista não fez, como deveria, dada a sua alegada situação de partido progressista e de esquerda.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Lage (PS): - É para um contraprotesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Queira fazê-lo, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): -O Sr. Deputado Furtado Fernandes pronunciou-se fundamentalmente sobre uma política de emprego e afirmou que o Partido Socialista e o seu Governo não têm tido uma política de emprego.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - O Governo tem empregado os socialistas.
O Orador: - Evidentemente que essa afirmação é perfeitamente demagógica e falsa, O Governo irá responder a esse ponto.
Mas quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que a vossa política de trabalho e de emprego, pelo menos pelas afirmações aqui feitas ontem peto Sr. Deputado Sousa Franco, é quase milagrosa. Vocês conseguiam, com manipulações que ainda não explicaram como se processam no concreto, criar dezenas, milhares, centenas de milhares de empregos. Mais ainda, conseguem reciclar os trabalhadores fazer uma formação profissional acelerada, dar-lhes bem-estar e alegria no trabalho...
Risos.
...e todo um outro tipo de soluções miraculosas.
O Sr. Magalhães Mota (PS): - O Sr. Deputado deve estar com febre!
O Orador: - Do que nós estamos certos é que os trabalhadores portugueses, infelizmente, não vão poder beneficiar disso, porque o PPD não vai ter oportunidade de aplicar essa política de emprego. Mas, evidentemente, os trabalhadores também não vão ficar muito contrariados com isso, até porque as receitas que o Sr. Deputado Furtado Fernandes lhes promete relativamente à greve e aos despedimentos são deles já conhecidas. Não vamos agora fazer aqui a síntese de uma grande polémica, mas ficou patente, nas posições manifestadas pão PPD na discussão das Leis da Greve e dos Despedimentos - toda a gente, aliás, o compreendeu -, que por detrás das palavras ambíguas, par detrás das grandes afirmações, do constante reiterar do seu interesse e do seu amor aos trabalhadores e do seu apego aos seus interesses esteve sempre a vontade de deixar a lei nas portas e as avenidas para que a greve fosse dificultada e para que os trabalhadores pudessem ser despedidos com mais facilidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Leal.
O Sr. Cunha Leal (PSD): - É para um protesto.
Risos do PS.
O Sr. Presidente:- Peço a vossa atenção, Srs. Deputados. Tenha a bondade de prosseguir, Sr. Deputado Cunha Leal.
O Orador: - Quando nesta Casa se ouve acusar outros de serem incorrectos nos véus procedimentos e quando alguém pretende usar de um seu direito regimental e ouve risadas, parece que isso basta para deitar por terra toda essa aparência de verniz com que se tenta encobrir determinados procedimentos.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Disse o Sr. Deputado Carlos Lage que se insultava desta bancada as gentes do Partido Socialista. Ora ainda me ferem os ouvidos os insultos provindos dessa bancada, precisamente da boca do Sr Deputado Carlos Lage, insultos impróprios do clima de pacificação em que todos pretendíamos ver decorrer os trabalhos desta Assembleia.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador - Mas não é só proferindo impropérios que se pratica o insulto, Insulta-se também quando se deturpam afirmações por outros produzidas. Assim, insultou-se o Sr. Presidente deste partido quando lhe imputaram afirmações por ele não feitas,
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insultou-se este próprio partido quando se proeurou desvirtuar as suas intervenções, canalizando as controvérsias para determinadas pessoas ou para determinados factos.
Era, para repor a verdade sobre os comportamentos que eu pedi a palavra, deixando efectivamente que o Partido Socialista se possa continuar a vangloriar de ser um partido de esquerda quando ele próprio, pela boca do seu secretário-geral, declarou aqui que não se aliava nem com os partidos à sua direita nem com os partidos à sua esquerda, para não fazer maiorias de esquerda ou de direita, o que significa que o Partido Socialista continua na posição de uma entidade amorfa que toma a cor dos larios para onde possa pender.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Risos e protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, é para um rápido contraprotesto, porque nós não queremos desviar o sentido deste debate...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Tem-se visto! Que lata!
O Orador - ... sendo necessário repô-lo no devido caminho.
Risos do PSD.
O Sr. Deputado Cunha Leal diz que foram proferidos insultos contra o seu partido. Eu não fiz qualquer insulto ao PPD/PSD, e não o fiz porque o não pretendo, embora às vezes possa ser mais débil ou errado na análise - cada qual tem de admitir as suas debilidades - e possa muitas vezes não fazer as análises criticas, mas adequadas ou aquelas que agradariam ao PPD/PSD.
Ora é bom, não confundir debate de ideias com insultos. Também é preciso dizer que, quando um homem público é truculento, quando um homem público se expõe às criticas porque faz criticas constantes e contraditoras, esse homem público não pode querer ficar imune ou furtar-se ás criticas. Quem anda à chuva, diz o povo, molha-se. É isso que tem acontecido com o presidente do PPD/PSD, de que fala o Sr. Deputado Cunha Leal, e nós, os socialistas, estamos a pensar na mesma pessoa em que o Sr. Deputado Cunha Leal está a pensar, embora ele não seja, pelos vistos, o presidente efectivo do PPD/PSD.
Quanto ao vangloriarmo-nos de ser um parado de esquerda, não é vanglória nenhuma, Sr. Deputado Cunha Leal é uma constatação, é uma realidade e é também um empenho e um compromisso. Que o Sr. Deputado Cunha Leal, possa ter possivelmente algum ressentimento quanto a isso, o problema não é nosso. Nós sempre nos manifestamos e apresentámos como partido de esquerda e das classes trabalhadoras.
Dizer também que o Sr. Primeiro-Ministro contradisse ao afirmar que não acenávamos maiorias de esquerda ou de direita é confundir realidades sociológicas com aritméticas políticas...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... e já temos aqui falado bastante em aritmética e em política.
Quem não sabe distinguir estes dois campos, não vou dizer que tem de ir para a escola, mas pelo menos tem de ter mais atenção àquilo que diz.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Não é fácil, no escasso tempo de que dispomos, buscar resposta para as múltiplas interrogações que o discurso do Sr. Primeiro-Ministro levanta, analisá-lo com o cuidado de que, sem dúvida, é merecedor, nem, sobretudo, traçar o que, em nosso entender, é o balanço de dezasseis meses de actividade do Governo. Balanço tanto mais importante, quanto é certo que é à luz deve que, necessariamente, se terão que definir as posições em face da moção de confiança submetida a esta Assembleia.
Daí que a nossa intervenção venha a pecar pela omissão de muitos aspectos essenciais e pela forçosa simplificação de alguns outros. É um risco que deliberadamente assumimos ao aceitarmos intervir nas condições em que o fazemos, para que, ao menos, se torne possível apontar algumas das razões que determinam o que será a nossa atitude. E digo a nossa atitude - não a minha porque falo aqui>i não apenas em meu nome pessoal, - mas também em nome dos meus camaradas Deputados Brás Pinto e Vital Rodrigues.
Quando o Sr. Primeiro-Ministro se dirige à Assembleia solicitando a sua confiança, para, do mesmo passo, deixar claro que se acaso vier a merecê-la o Governo será profundamente reestruturado, seria legitimo perguntar - como já aqui foi feito - a que governo vai a Assembleia conceder ou recusar essa confiança. Àquele que temos neste momento perante nós ou àquele outro, que ignoramos qual venha a ser?
Seria legítimo perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro se ao pôr a questão nesses termos não estará a pedir que a Assembleia se pronuncie sobre um governo que ele próprio, de antemão condenou.
Seriam legítimas e importantes essas interrogações se o Sr. Primeiro-Ministro não tivesse acrescentado, por forma expressa e inequívoca, que a reestruturação governamental que anuncia, não poderá ser interpretada, como sinal de qualquer mudança política, até agora prosseguida e que, bem, ao contrário, seja qual for, a sua composição, se o Governo merecer a confiança da Assembleia, não mudará de política.
Eis o que traça de forma precisa os contornos do problema com que nos confrontamos e reduz a questão da restruturação governamental às dimensões de
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uma informação que se regista, mas nada adianta quanto a verdadeira natureza da questão que nos é colocada. Questão clara e precisa. Questão cuja resposta há-de assentar no juízo que nos merecem não os homens que constituem o Governo, não a fórmula de que este se reveste, mas a política que esses homens a coberto dessa fórmula, têm conduzido.
Teve razão o Sr. Primeiro-Ministro quando afirmou que não é exacto dizer-se que, com a moção de confiança, o Governo está a pedir um cheque em branco. E teve razão porque ele próprio preencheu o cheque - para guardarmos a imagem que utilizou - ao declarar: «Não mudaremos de política seja qual for o resultado da votação da moção de confiança.»
Não se trata, por isso, para a Assembleia de passar qualquer cheque em branco ao Governo, mas de avalizar ou não o que tem sido a sua política, aceitando ou não que o Governo, forte da confiança da Assembleia, prossiga essa política. Não se trata de um cheque em branco, nem sei trata, tão-pouco, de uma «aposta no futuro», ao contrário do que afirmou o Sr. Primeiro-Ministro. Colocada a questão da forma como ele a colocou, trata-se ide avalizar o que até agora foi feito, como ponto de partida para que no futuro se repita o que foi o passado próximo.
E avalizar a política do Governo significa o quê? Avalizar a fórmula minoritária de Governo? Avalizar o princípio das negociações com o FMI? Não. Ou melhor, não só isso. Muito mais do que isso avalizar o que tem sido a sua política global, aceitar que nem se possa encontrar a solução da crise, admitir que essa política saía reforçada pelo voto da Assembleia.
O que fundamentalmente está em causa no pedido de confiança formulado a esta Câmara são os resultados de uma dada política e de uma dada prática quotidiana do Governo que, aliás, o Sr. Primeiro-Ministro solenemente afirmou não ter intenção de alterar. Prática e política que, em nosso entender, se revelaram incapazes de fazer frente aos problemas com que o País se debate, problemas que se em grande parte foram criados pelo Governo, o Governo não soube enfrentar e, pela sua acção, agravou. Problemas que se traduzem hoje, concretamente, na deterioração das condições de vida e de trabalho dos Portugueses, na alta do custo de vida, no aumento dos índices d» desemprego, nas dificuldades com que se debatem os pequenos e médios empresários, confrontados com a retracção do mercado interno resultante do baixo poder de compra dos trabalhadores e dos acréscimos das taxas de juro.
Isto, para citarmos apenas, e por memória, alguns aspectos, já que para mais nos não sobeja o tempo.
Prática e política que têm conduzido não à consolidação do que foram conquistas fundamentais dos trabalhadores após o 25 de Abril, mas à sua sistemática e quase permanente contestação e frequentes vezes à sua destruição pura e simples. Prática e política que vêm permitido o avanço crescente das forças de direita e, em particular, das forças neofascistas, avanço a que o Governo só nas palavras & episodicamente se tem procurado opor.
Prática e política que mergulham as suas raízes não na fórmula governamental, não no programa de governo - hoje esquecido - mas na inexistência de um projecto político global e coerente, na ausência de opções claras no carácter ambíguo que tem revestido a acção do Governo.
Inexistência de projecto político global, ambiguidade de actuação, de que são, justamente, reflexo as maiorias flutuantes e contraditórias que ao longo de dezasseis meses se foram fazendo e desfazendo nesta Assembleia e que terão que ser entendidas não como uma virtude da prática governamental, mas como o resultado da natureza equívoca dessa prática, da ausência das «ideias claras» e da «vontade política determinada» a que o Sr. Primeiro-Ministro fez referência como condição necessária para vencer a crise.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Daí, aliás, que o único diploma que correspondia a um projecto político global -o Plano a Médio Prazo - não tenha chegado sequer a ser discutido e faça hoje parte de material de arquivo destinado talvez aos historiadores.
Daí que esta Assembleia seja chamada, pela segunda vez, a votar um plano anual sem que, ao menos, se haja definido o quadro de médio prazo em que se deverá inserir. Daí, ainda, que o problema das negociações cem o FMI seja colocado fim que saibamos quais as grandes opções que as devem orientar. Isto quando o problema não é - em nosso entender- o de a aceitar ou não o principio das negociações - que pela nossa parte não recusamos -, mas exactamente o de se saber em que projecto global o Governo as inscreve o de saber-se de que modo elas, e os resultados que delas resultarem, se podem compatibilizar com o processo de transição para a democracia socialista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se a acção desenvolvida pelo Governo não pode merecer o nosso acordo, se não apoiamos a sua política, acreditamos que existe para ela uma alternativa, como acreditamos que existe uma saída para a crise.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Essa saída passa obrigatoriamente por uma nova política e por uma nova prática governamental que possam conquistar, dentro e fora desta Assembleia, os apoios indispensáveis à sua viabilização. Por uma nova política e uma nova prática que tenham no projecto constitucional as suas balizas fundamentais.
O problema que hoje se coloca não é o de uma fórmula governamental alternativa, mas de uma política alternativa de governo. É essa política alternativa que urge definir, buscando-se em seguida a fórmula governamental susceptível de a lavar à prática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se vamos votar contra a moção de confiança, é porque pensamos que se não podem adiar por mais tempo as opções fundamentais. É porque pensamos que quanto mais tarde essas opções forem feitas, mais difícil será levá-las à prática.
O Sr. Primeiro-Ministro declarou recentemente que urge opor uma barreira -intransponível à ofensiva da direita. Opor essa barreira é inseparável de governar consolidando e aprofundando o projecto constitucional.
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Não é possível escamotear por mais tempo que a viabilização e a consolidação da democracia em Portugal passam pela progressiva construção, com etapas e, porventura, até com recuos no tempo, do poder democrático dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não ignoramos o pouco peso aritmético dos nossos votos. Sabermos que não serão determinantes no resultado final deste debate. Mas nem por isso nos sentimos mais livres para assumir uma atitude, menos responsáveis ou menos responsabilizados por ela. Acreditamos que a importância do nosso voto transcenderá o seu valor aritmético, e assumimo-lo em consciência e com consciência do seu significado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado, José Leitão.
O Sr. José Leitão (PS): -Sr. Presidente, gostaria de saber, em primeiro lugar, se o Sr. Deputado Lopes Cardoso tem a possibilidade de responder a um pedido de esclarecimento. Caso não tenha essa possibilidade, formularei um protesto.
O Sr. Presidente: - Se for um pedido de esclarecimento bastante curto, o Sr. Deputado Lopes Cardoso poderá responder, se assim o entender.
O Sr. José Leitão (PS): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso justifica o seu voto contra a moção de confiança dizendo que este Governo e esta política não servem os interesses dos trabalhadores. O Sr. Deputado continua a pensar que seria preferível um Governo com franjas do PSD, como recentemente defendeu no «Expresso», e que este governo serviria melhor os interesses dos trabalhadores?
Outra questão muito curta: o Sr. Deputado vota contra apenas porque sente que não tem espaço político, uma vez que o PS se mantém fiel às decisões do seu II Congresso e assim não alterou a sua fórmula de Governo?
O Sr. Presidente: - Queira responder, Sr. Deputado Lopes Cardoso. Apenas lhe peço que seja breve.
O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Deputado, como vive ocasião da expor na tribuna, a fórmula de governo é um problema de segunda ordem. O que importa definir é qual a política alternativa a este Governo, qual a política que deve ser prosseguida no nosso país. É impossível decidir e escolher quem vai levar a cabo uma política que não se sabe previamente qual é. O problema que se me põe neste momento é não a procura de uma fórmula alternativa do Governo, mas uma alternativa à política do Governo. Esse é o problema sobre o qual temos que nos pronunciar. O resto irá continuar a pensar que a política se faz nos corredoras, que a política é um jogo de nomes, um xadrez em que as peças se Limitam a ser os homens políticos e de que os problemas reais estão afastados.
Quanto ao espaço político, sinto-me perfeitamente à vontade naquilo que é o meu espaço político. Quanto ao que é a fidelidade do Partido Socialista, ao seu programa e às decisões dos seus congressos, o Sr. Deputado sabe exactamente qual é a minha posição. Penso que não é este o momento mais oportuno para 'travarmos um debate que nos iria desviar daquilo que deve ser a nossa preocupação nesta sessão da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo: Estamos próximo das 12 horas e 30 minutos, pelo menos pelo relógio regimental. Sugeria pois que fizéssemos agora o intervalo, a fim de recomeçarmos os trabalhos não às 15 horas e 30 minutos, como estava anteriormente previsto, mas às 15 horas. Não havendo objecções, assim se fará.
Pausa.
A sessão está suspensa até às 15 horas.
Eram 12 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente (Vasco da Gama Fernandes): - Está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinto da Cruz, para fazer a leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Pinto da Cruz (CDS):
Comissão de Regimento e Mandatos Relatório e parecer
Em reunião realizada no dia 7 da Dezembro de 1977, pelas 14 horas e 45 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de Deputados:.
1 - Solicitada pelo Partido Socialista:
- Luís Manuel Cidade Pereira de Moura (círculo eleitoral de Portalegre), por João José de Carvalho Taveira Pinto.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha verificou-se que o substituto indicado é real e actualmente o primeiro candidato eleito ainda não solicitado na ordem de precedência da lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo referido partido no respectivo circulo eleitoral.
3 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, ama vez que se encontram verificados os requisitos legais.
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Presidente. Álvaro Monteiro (PS) - Vice-Presidente, Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (PSD) - Secretários: Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António Cândido Miranda Macedo (PS)- - Herculano Rodrigues Pires (PS) - Cristóvão Guerreiro Nobre (PSD) - Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo (PSD) - Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Acácio Manuel de Frias Barreiros (UDP).
O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção.
O Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção (Eduardo Pereira):- Sr. Presidente. Srs. Deputados: Disse o Sr. Primeiro-Ministro, quando colocou nesta Assembleia o debate sobre política geral do País e, seguidamente, a questão de confiança, que:
A diferença fundamental entre uma moção de censura e uma moção de confiança é que a primeira contempla o passado - a que pretende pôr termo - enquanto que a moção de confiança representa uma aposta sobre o futuro. A razão pela qual o Governo utilizou o mecanismo da moção de confiança e, voluntariamente, se submete ao veredicto da Assembleia, tem a ver com isso.
A ideia não surgiu, apenas, para facilitar a tarefa dos partidos da oposição - incapazes de derrubar o Governo através do mecanismo das moções de censura - ou por simples fair play democrático. Representa um desafio em relação ao futuro, dirigido a esta Assembleia.
Na verdade, há dezasseis meses que o I Governo Constitucional vem a disputar esse desafio. Por mim, penso que estamos apenas no intervalo. O jogo vai continuar e penso também que a segunda parte vai ser tão ou mais renhida do que a primeira, mas penso que ainda que um governo socialista com independentes, orientado por Mário Soares, constitui, ainda, a equipa capaz de modificar a fisionomia da partida jogada e alterar, substancialmente, na segunda pane o resultado que um ambiente hostil, criado depois de um jogo jogado no campo do adversário, não foi totalmente conseguido até agora.
Para tanto, muito ajudaria que a «assistência» - que devia ter torcido adequadamente em vez de assobiar e apupar constantemente - se compenetre que tem de incitar e apoiar a equipa, porque não se trata, Srs. Deputados, de um jogo qualquer, de clube contra clube, mas de um jogo no qual se defendem os grandes interesses do povo português.
Orientando um departamento que se ocupa de áreas tão sensíveis e quentes como as da habitação, do urbanismo e da construção civil, não me quis furtar, por isso mesmo, ao julgamento deste Plenário, até porque, como disse o Sr. Deputado Sousa Franco:
Ao povo português, dia a dia mais aflito, em condições de incerteza psicológica, insegurança de vida e crescentes dificuldades materiais, devemos dizer aqui uma palavra de responsabilidade e esperança.
No entanto, o que não lhe podemos, nem devemos dizer, é que é possível, simultaneamente, importar menos, exportar mais, manter a expansão da economia, diminuir-se o défice da balança de transacções correntes, poupar-se as nossas, reservas de ouro e rejeitar-se os empréstimos avalizados pelo Fundo Monetário Internacional.
Como esta tem sido a tónica das achegas que têm vindo das várias bancadas da oposição e como, por formação, sou mais dado ao pragmatismo da análise das situações e à procura de soluções concretas para as dinamizar e desenvolver, passo a citar o que tem sido possível realizar pelo departamento que oriento.
Assim, passaria a referir alguns indicadores simples que o povo - que a todos nos escuna - possa compreender.
Arrancámos a nossa actuação governativa sem ordenamento físico do território, sem uma política de solos, sem projectos, com um défice habitacional de cerca de 600000 fogos, a braços com um furto de construções clandestinas, com uma máquina técnico-administrativa bastante emperrada e com uma estrutura empresarial completamente destroçada e pulverizada nas suas 25 000 empresas, das quais 92 % possuem, menos de vinte trabalhadores.
Este sector sofreu uma recessão a partir da segunda metade de 1973, que atinge o seu auge no início de 1976. No entanto, o valor bruto de produção que em 1973 era de 31,5 milhões de contos, em 1974 de 42,5, em 1975 de 40, em 1976 de 43, será. em 1977 de 60 milhões de contos e apostamos em atingir, em 1978, 80 milhões de contos.
No que se refere ao emprego no sector, verificou-se uma evolução semelhante à do valor bruto de produção.
Assim, em 1973 o sector ocupava, de forma directa, 239 000 trabalhadores, em 1975, 214 000, em 1977, 230 000, em 1978 espera-se que atinja 245 000 trabalhadores.
Uma outra variável que é importante realçar é a da conclusão de fogos. Este indicador, que apresenta valores da ordem dos 41 000-42000 fogos concluídos em 1973-1974, regista uma quebra em 1975-1976, situando-se em 31 000-32 000 fogos.
O nível de conclusão em 1977-1978 será da ordem dos 45 000-50 000 fogos, valor calculado com base nos fogos iniciados na segunda metade de 1976 e 1.º trimestre de 1977 pelos sectores público e privado.
Sendo preocupação do Governo o investimento em habitação social, ele próprio lançou um vasto programa, que pode ser traduzido nos seguintes números:
Em 1973 investiram-se 264 000 contos; Em 1974 investiram-se 300000 contos; Em 1975 investiram-se 1,9 milhões de contos; Em 1976 investiram-se 3,9 milhões de contos; Em 1977 investiram-se 8 milhões de contos, com o aumento de 106% sobre o ano anterior.
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Uma nova política de credito à habitação foi lançada com invulgar sucesso, apesar do que tem sido afirmado quando se fazem julgamentos sobre a nossa competência ou incompetência.
Os institutos de crédito deferiram em anos anteriores:
10 337 pedidos em 1973;
11 106 pedidos em 1974:
14 670 pedidos em 1975.
O número de pedidos, deferidos de Julho de 1976 a Julho de 1977 atingiu os 25 000, no valor de 11 milhões de contos, dos quais cerca de metade usufruindo as vantagens de crédito bonificado.
Idênticos resultados foram obtidos no lançamento dos equipamentos sociais, regionais e urbanos.
De 114 000 contos investidos em 1973, passando por 505000 em 1974 e 938 000 em 1975, atingiram-se em 1976 1,1 milhões e em 1977 2,2 milhões de corutos.
No que se refere à política de solos, área em que os investimentos até 1976 não têm qualquer expressão que mereça referência, pode-se afirmar, com base nas aquisições feitas até ao final do 3.º trimestre, que até esta data se contava já com a aquisição de 1600 ha e se pensa atingir, seguramente, cerca de 2000 ha até ao fim do ano, o que permite a construção de 120 000 fogos por ano.
Em importância relativa, a pane destinada à constituição de reservas para habitações sociais constituía cerca de 62 % deste total, destinando-se às cooperativas de habitação 33 %.
Empreenderam-se 120 acções de cartografia, 75 de planeamento gerai de urbanização e 120 de planeamento de pormenor.
No que se refere ao planeamento territorial estão em curso os de:
Viana do Castelo - Caminha - Vila Nova de Cerveira.
Coimbra - Figueira da Foz.
Tomar - Torres Novas - Abrantes.
Aveiro - Ria.
Lançaram-se, por outro lado, em 1977, 3 500 novas obras de infra-estruturas urbanas, arruamentos, equipamentos e edifícios de utilização social.
Várias acções foram desencadeadas no sentido de recuperar extensas áreas clandestinas cuja enumeração se tornaria morosa e enfadonha. Destaco, contudo, na faixa litoral: Paleirão, S. Pedro de Muel, Arrábida, ilha de Tavira, Costa Nova, lagoa de Albufeira e Alcobaça.
Na região de Lisboa encontram-se em marcha acções de recuperação de grandes zonas, especialmente nos concelhos de Lisboa, Oeiras, Loures e Sintra ao norte, com relevo para a acção na Brandoa/Falagueira e Barreiro, Seixal, Montijo, Palmeia, Sesimbra e Setúbal ao sul, com relevo para a acção na Quinta do Conde.
Na região do Porto destacam-se as acções iniciadas em colaboração com as Câmaras do Porto, Vila Nova do Gaia, Matosinhos o Gondomar.
Ora, toda esta acção contraria muito do que tem vindo a ser afirmado pela imprensa da oposição e pelos partidos fora e dentro deste hemiciclo. E contraria na medida em que no sector da construção civil tem havido investimento privado, praticamente já não há desemprego e a regionalização dos investimentos tem sido real.
Em 1973, os investimentos públicos, 42% foram investidos e dirigidos para o distrito de Lisboa, 14% para o do Porto e 11 % para o de Setúbal, sendo apenas 33 % distribuídos por todos os restantes distritos, cabendo, por exemplo, 0,7 % a Bragança, 0.8 % a Castelo Branco, 0,8 % a Portalegre e 0,8 % à Guarda.
Em 1977, Lisboa recebeu apenas 25 %, o Porto e Setúbal mantiveram a sua percentagem, mas Bragança obteve 2,4%, Castelo Branco 2,1%, Portalegre 3 % e Guarda 1,4%. Em resumo, os investimentos públicos de Lisboa foram reduzidos para metade, na Guarda duplicaram, em Bragança e Castelo Branco triplicaram e em Portalegre quadruplicaram.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nem sempre as análises feitas pelos partidos da oposição são correctas.
No que se refere ao meu departamento, peço desculpa por me repetir, o investimento não tem faltado. O desemprego quase desapareceu (embora exista elevado subemprego e baixa produtividade), o diálogo tem sido constante e, se da minha parte não o tem sido sempre correctamente levado com os Srs. Deputados ou com os seus partidos, tem-no sido com as populações e com os seus eleitos autárquicos, quaisquer que sejam as suas opções políticas e partidárias. O que se tem feito, tem-no sido em completo consenso, a partir das escolhas políticas que têm sido apresentadas pelas próprias autarquias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Termino como comecei. A moção de confiança representa uma aposta no futuro.
Ao longo destes dezasseis meses, o trabalho realizado permite alimentar justas esperanças no futuro e não é certo que mereça, por parte dos partidos da oposição, o tipo de crítica a que o Governo tem sido submetido.
Criticar é fácil, apresentar alternativas tem-se mostrado, até agora, mais difícil, fazer melhor será possível; mas estarão os partidos da oposição preparados e encontrarão da parte da maioria das populações mais carenciadas desse país aceitação para outro tipo de política, nesta área como em outras áreas da vida nacional?
Em caso negativo o que pensa alterar? À preparação dos partidos para uma prática de verdadeira política social neste sector ou os hábitos e as dinâmicas já enraizados nas populações portuguesas?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Não se importa de me informar para que efeito, Sr.ª Deputada?
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A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - O Sr. Ministro acabou de afirmar que o Governo socialista com independentes era uma equipa capaz de fazer frente aos problemas do Pais, em particular, no sector da habitação. Esta afirmação não está provada e daí a razão do meu protesto.
O Sr. Ministro apelou para a necessidade de uma analise pragmática. Pois vamos fazê-la. Mais importante do que a explanação dos números que o Sr. Ministro fez seria uma comparação entre esses números e aqueles que no Programa do Governo, em 1976, nos foram aqui apresentados. Da diferença entre; os dois quantitativos ê que podemos apurar se esta equipa tem sido ou não capaz de realizar aquilo que prometeu. Vou citar alguns números: em primeiro lugar, em relação à produção de fogos, foi prometido no Programa do Governo um lançamento de 60000 fogos por ano. Segundo as previsões a que tive acesso, em 1976 foi possível concluir cerca de 35 750 fogos, o que representa 55 % do lançamento inicial previsto e em 1977-1978 acaba o Sr. Ministro de dizer que se prevê qualquer coisa como 45 000 ou 50 000 fogos. Esta previsão evidentemente que pode ser demasiado optimista porque o Sr. Ministro sabe tão bem como eu que dada a circunstância actual de carência de materiais, as obras estão sistematicamente atrasadas e as. previsões de conclusão não se verificam. Este número, portanto, não foi atingido e não se tem conseguido o número de fogos anual que inicialmente estava previsto; num segundo ponto -os desalojados - foi prevista a conclusão de 6950 fogos pré-fabricados em 1977, que deviam estar prontos e habitados por esta data. Sucede que neste momento, em que estamos a terminar 1977, não há um único dos fogos pré-fabricados feitos para desalojados que esteja habitado, e era um programa de urgência. Onde está a urgência?
Quanto ao problema das rendas de casa foi prometida como medida urgente...
O Sr. Raul Rego (PS): - Isto não é um protesto!
Protestos do PSD e contraprotestos do PS.
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados estão a fazer tanto barulho que não estou a perceber nada.
O Sr. Raul Rego (PS):- Isto não é um protesto!
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, com certeza que esse tempo não será contado.
A Oradora: - Certo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados talvez haja outras maneiras de chamar a atenção da Mesa sem ser a de bater nas carteiras e gritar muito. Além disso, felizmente, tenho muito bons ouvidos.
Vozes do PSD e CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente:- Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe com todo o respeito, que isto não é forma de protestar, é forma de intervir numa alegação de fundo. A Sr.ª Deputada pode usar do direito que tem de intervir, direito esse que ninguém lhe pode negar, mas parece-me que o contexto da sua intervenção está muitíssimo longe dos hábitos e do próprio âmbito dos protestos.
A Oradora: - Sr. Presidente, peco-lhe desculpa, mas pedi a palavra para fazer um protesto. Comecei por protestar contra uma afirmação do Sr. Ministro. Se não provar aquilo que disse sou demagógica. Sr. Presidente.
O Sr. Raul Rego (PS): - Isto não é um protesto, Sr. Presidente.
A Oradora: - Estou a provar aquilo que disse. Se não me deixam fazê-lo, não posso...
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada pediu a palavra para um protesto e eu concedi-lha...
A Oradora: - Então, se me dá licença, prossigo.
O Sr. Presidente: - Começou por protestar muitíssimo bem e passou, depois, a fazer uma intervenção principal.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Sr Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada chega perfeitamente para mim e não precisa da ajuda do Sr. Deputado Sérvulo Correia.
Risos.
A Sr.ª Deputada chega muitíssimo bem para mim...
A Oradora: - Sr. Presidente, estava a fundamentar tecnicamente o meu protesto...
O Sr. Presidente: - Chega para mim e sobeja.
Risos.
O Sr. Olívio França (PSD): - Isso é dor de calo!
Vamos ver se nos entendemos, Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: - Não percebo!
Protestos do PS.
A Oradora: - Sr. Presidente, tenho um limite de tempo para fazer o protesto e estão-me a interromper.
A Oradora: - Julgo, pois, que me assiste o direito de fundamentar tecnicamente o meu protesto e vou prosseguir.
Em relação às rendas de casa...
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada desculpará, mas não vai prosseguir.
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A Oradora: - Sr. Presidente, se me permite, vou prosseguir.
O Sr. Presidente: - Nesses termos não vai prosseguir.
A Oradora: - Sr. Presidente, vou concluir o meu protesto.
O Sr. Presidente: - Peço à Sr.ª Deputada a sua reconsideração. Aliás, estou habituado a ela. Peço-lhe o favor de se cingir simplesmente à matéria do seu protesto.
A Oradora: - Exacto.
O Sr. Presidente: - Se assim não fosse, abrir-se-ia aqui um precedente extraordinário. Um Ministro usava da palavra, fazia uma certa e determinada afirmação, um Deputado pedia a palavra para um protesto e remetia completamente as alegações do Ministro. Isto não é protestar.
Tenho muita confiança no bom senso e na inteligência da Sr.ª Deputada.
A Oradora: - O juízo de saber se estou ou não a protestar, julgo que é meu! Eu é que pedi a palavra para protestar e estou a fazê-lo.
Aplausos do PSD.
O Sr. António Macedo (PS): - Essa é boa!
O Sr. Presidente: - E claro que V. Ex.ª tom todos os poderes menos o de me demitir. Não consegue demitir-me.
A Oradora: - Ó!, Sr. Presidente...
O Sr. Presidente: - Não consegue demitir-me. Por outras vias ou canais poderá demitir-me, mas por este meio não. A Sr.ª Deputada fará o favor de resumir o seu protesto, que a Assembleia vai ouvir com toda a atenção, como aliás merece, mas não continue nessa história dos números e de rebater aquilo que disse o Sr. Ministro, porque efectivamente isso não é um protesto.
A Oradora: - Sr. Presidente, peço desculpa, a minha afirmação não era dirigida a si, mas sim à bancada do Partido Socialista. Julgo que nesta Casa os protestos não podem ser apenas feitos quando são identificados com insultos ou ataques pessoais. Podemos protestar com números.
Vozes do PSD e CDS: - Muito bem!
A Oradora: - Ou não podemos protestar com números?
Protestos do PS.
Uma voz do PS: - Se quer fazer uma intervenção, faça, protestar com números é que não!
O Sr. Presidente:- A Sr.ª Deputada Helena Roseta sabe perfeitamente que eu, se tivesse ouvido qualquer insulto pessoal, teria sido o primeiro a intervir, mas não ouvi.
Se a Sr.ª Deputada entende, segundo o seu conceito, que efectivamente pode prosseguir e fazer uma alegação de fundo, aproveitando a hipótese do protesto, quero dizer-lhe que não estou de acordo. E, como não estou de acordo, tenho meios regimentais daí para obstar a que isso aconteça. Espero que isso não vinha a acontecer. A Sr.ª Deputada prosseguirá até eu intervir definitivamente.
A Oradora: - Retomo a ideia de que efectivamente não concordo com a afirmação do Sr. Ministro ao dizer que a sua equipa é capaz de resolver os problemas. É uma equipa que prometeu que ia rever a lei das rendas e não o fez e entretanto as rendas aumentaram. Se considerarmos a base 100 em 1970, em 1976 os valores variariam entre 192 e 410 no continente. Em relação, por exemplo, aos contratos de desenvolvimento foi prometido um lançamento de 15 000 fogos no Programa do Governo e está previa para este ano a conclusão de 4 950, o que é um terço do prometido. Em relação às cooperativas, foi prometido um lançamento de 5 000 fogos por ano do Programa do Governo e está prevista a conclusão de 312 fogos este ano. Em relação ao crédito, o Sr. Ministro acabou de dizer que o número de pedidos tinha aumentado, mas não explicou que esse número de pedidos não representa efectivamente uma realização dos desejos da população. Já aqui fiz uma intervenção de fundo sobre essa matéria em que demonstrei que as pessoas foram pedir crédito Bonificado e lhes foi concedido crédito não bonificado. Em relação aos clandestinos, o Sr. Ministro citou uma série de acções feitas em relação a bairros clandestinos e muitas delas foram começadas muito antes do 25 de Abril. Finalmente, termino o meu protesto...
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, já passaram os três minutos do protesto. Suponho que a Sr.ª Deputada está tão interessada como eu em cumprir o Regimento, para o que lhe chamo a atenção, visto já terem passado os três minutos do protesto.
O Sr. António Macedo (PS): - E isto é que quer ser governo, isto! ...
O Sr. Presidente: - Se a Sr.ª Deputada quer fazer uma intervenção, posso conceder-lhe...
O Sr. António Macedo (PS): -Isto é que quer ser governo! ...
A Oradora: - Termino o meu protesto...
O Sr. Presidente:- A Sr.ª Deputada dá-me licença?
A Oradora: - Deixe-me terminar, Sr. Presidente.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Eu vou deixar terminar mas o que lhe quero dizer é que já passaram os três minutos.
Vozes do PS: - Não deve deixar...
Protestos do PSD.
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A Oradora: - O Sr Ministro disse aqui que em vez de assobiarmos e apuparmos a sua equipa devíamos apoiá-la.
O Sr. Presidente: - Estamos a descontar no tempo, Sr.ª Deputada.
A Oradora: - Sr. Ministro, não podemos apoiar uma equipa que não cumpriu o prometido. Lamentamos que, em vez de ouvirem aquilo que temos a dizer, nos assobiem e aos apupem, a nos que não somos a equipa do Governo.
Aplausos do PSD e do CDS.
Protestos do PS.
O Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção (Eduardo Pereira): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Parece que terei de dar a palavra ao Sr. Ministro ia que se tratou de um protesto, um bocado original mas de certo modo um protesto. Peço ao Sr. Ministro que se integre dentro do objectivo do nosso Regimento. O contraprotesto que irá fazer será aquele em que está a pensar e eu também.
O Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção:- Quero contraprotestar porque a Sr.ª Deputada Helena Roseta citou números sem base nenhuma. Aliás, gostava que me indicasse onde os obteve.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Estão aqui neste relatório.
O Orador. - Em 1977, estão em curso 40 000 fogos só no Fundo de Fomento ca Habitação, e foram encomendadas 12 346 casas pré-fabricadas, estando em fim de montagem 7 222.
O Sr. Braça Barroso (PSD): - Onde? Onde?
Vozes do PS: - Provocadores!
O Orador: - Prometo não gritar tanto como a Sr.ª Deputada. Sobre a lei das rendas não é fácil, na verdade, optar por aumento de rendas numa óptica única de protecção dos senhorios sem ter em atenção os direitos e as economias dos inquilinos.
Aplausos do PS.
Quanto ao crédito bonificado, os 12 000 de media que não eram bonificados nos anos anteriores, são menos 500 fogos do que os bonificados este ano - 12 500 bonificados-, 25 000 no total.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Tinha pedido a palavra a propósito do «protesto» que a Sr.ª Deputada. Helena Roseta estava a formular. Não nos foi dada a palavra então, mas não queremos deixar de acentuar que o protesto no que se pode definir nos seguintes termos: protesta-se quando um Deputado é ofendido...
Protestos do PSD e do CDS.
Ainda não cheguei ao fim, Srs. Deputados; não as agitem, porque ainda não cheguei ao fim.
Como ia a dizer, protesta-se quando o Deputado é ofendido ou quando as suas posições ou palavras são deturpadas; protesta-se quando um partido é acusado e as suas posições ou pontos de vista, não são também respeitados; protesta-se quando um partido sente que através das posições de critica a este partido tenha havido qualquer distorção ou incorrecção.
Dá-se, porém, o caso de o PPD não ver sido praticamente referido nas palavras do Sr. Ministro. Não houve qualquer critica, ataque ou alusão, às posições aos. Principios defendidos pelo PPD. Assim, não se compreende por que e que a Sr.ª Deputada Helena Roseta protestou. Usou pura e simplesmente um subterfúgio para não utilizar o tempo que lhe foi proporcionado, como aos restantes partidos, na discussão e na metodologia que encontraram em comum.
Trata-se, pois de uma forma que é apenas habilidosa, mas que se reveste de aspectos muito condenáveis e criticáveis de prejudicar no tempo os outros partidos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, também queremos acentuar que talvez seja esta uma forma de prejudicar o andamento dos trabalhos e de travar a discussão correcta, necessária e útil. E contra isto protestamos também. Assem, era de propor ao Sr. Presidente que repusesse o espirito que presidiu à organização destes trabalhos e o significado do protesto e das perguntas, e que o tempo que a Sr.ª Deputada Helena Roseta utilizou, simulando protestar, quando na realidade, estava a fazer uma intervenção, seja descontado no tempo do seu partido.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Assim já aconteceu efectivamente. Passados os três minutos atribuídos no Regimento para o protesto, todo o restante tempo utilizado foi já descontado no tempo do PSD.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Dá-me licença. Sr. Presidente?
O Orador: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sérvulo Correia. Não se importa de me informar para que efeito?
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente,
O Sr. Presidente: - Faça favor.
Uma voz do PS: - Para quê?!
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - É para aquilo que eu entender e o Sr. Deputado não tem nada com
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isso. Se há alguém que tem a ver com isso esse alguém é a Mesa.
Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.
Sr. Presidente, que me recorde, é a primeira vez transcorrida já uma inteira sessão legislativa e iniciada uma segunda com várias sessões de trabalho já passadas, que aqui, nesta Câmara, se levantou o problema de se definir, interpretando restritivamente, a norma regimental respeitante a processos. tentando impedir que Deputados usem do seu direito de palavra, qualificando ou não o seu tipo de intervenção como de protesto.
Esta matéria é, porventura, uma matéria processualmente difícil, mas a verdade é que a pratica desta Câmara tem sido sempre uma prática flexível, no que apenas demonstra respeito pela Constituição, que estabelece entre os direitos fundamentais o direito de palavra, o direito de expressão do pensamento e que determina que esses direitos não poderão ser restringidos por normas de outro tipo.
Desejo perguntar ao Sr. Presidente com base -m que critérios é que vai definir a partir de agora o que é protesto e o que não é protesto e se efectivamente, o Sr. Presidente aceita o ponto de vista que acaba de ser exprimido pela bancada do PS, onde se faz uma manifesta confusão entre fazer um protesto e dar explicações -duas figuras que o Regimento prevê diferentemente-, e, finalmente, se a Mesa, seguindo também o ponto de vista que acaba de ser expresso pelo Sr. Deputado Carlos Lage, entende que só é protesto aquilo que ror uma maneira de expressão sentimental, carregada de emoção, personalizada, e não uma objecção fundamentada em números da qual decorre que um orador que procedeu aquele que protesta fez afirmações que o protestante entende que não correspondem a realidade ou que omitem partes importantes sem as quais a realidade não é fielmente expressa. Desejaria saber em que medida é que a Mesa vai considerar que este tipo de protesto, que é, no fundo, aquele que mais interessa a um debate lúcido, construtivo, fundamentado com resultados concretos, contribuindo efectivamente para um esclarecimento da verdade, que é, no fundo, o protesto que mais interessa, e que não é um verdadeiro protesto.
Finalmente, desejo também saber como é que a Mesa considerou a intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage e se, considerando-a um protesto, vai também aplicar o critério de contabilizar o tempo que ultrapassa os três minutos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Podemos começar pela última parte. Efectivamente, a intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage pareceu-me um protesto e o excedente dos três minutos se porventura existe, será contado no tempo do PS.
Quanto ao conceito que se possa ter de protesto, quero dizer que não tenho culpa nenhuma neste Regimento. Não fui eu que o fiz. Suponho até que o Sr. Deputado Sérvulo Correia foi um dos colaboradores da sua feitura. Podia ter tido um bocadinho mais de cuidado nessa altura em definir melhor o que seria o protesto e o contraprotesto... O artigo 96.º do Regimento diz simplesmente isto:
O Deputado que pedir a palavra para reclamações, recursos ou protestos, limitar-se-á a indicar sucintamente o seu objecto e fundamento.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Foi o que eu fiz!
O Sr. Presidente: - Não sei como é que se pode aqui enxertar uma delegação de fundo. Não percebo.
E claro que também catou de acordo com o Sr. Deputado Sérvulo Correia em que é muito difícil, por vezes -até a prática até aqui o tem sido, e talvez eu tenha sido culpado dela-, a impedirmos, a propósito do protesto, que se façam alegações mais extensas.
Peço, portanto, à Assembleia e aos Srs. Deputados que se lembrem do que se encontra escrito no antigo 96.º e que se limitem, segundo a expressão do artigo, a indicar sucintamente o seu objecto e fundamento. Se assim acontecer, e com boa vontade de todos, tenho a impressão de que vamos respeitar esse artigo.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Previdente.
O Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage. Não se imporia de me informar para que efeito?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não queremos de forma nenhuma perturbar o andamento desta sessão. Sendo assim, apenas queria dar uma explicação à Câmara muito rápida a propósito das palavras pronunciadas pelo Sr. Deputado Sérvulo Correia quando afirmou que se pretende violar assim o direito de palavra dos Deputados. Ora, na verdade, na conferência dos presidentes dos grupos parlamentares todos os partidos assumiram uma autodisciplina, consistindo esta em cada grupo parlamentar ter um tempo limitado e a entre si concertarem qual o tempo que os respectivos Deputados podiam utilizar. Sendo assim, não se compreende que o Sr. Deputado Sérvulo Correia venha falar de violação do direito à palavra dos Deputados.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sérvulo Correia.
O Sr. Serroto Correia (PSD): - Sr. Presidente, brevissimamente, apenas para dizer que nos termos processuais combinados na conferência a que se reporta o Sr. Deputado Carlos Lage foram previstos protestos. Como o Sr. Presidente acaba de lembrar, o protesto compõe-se de um objecto e de fundamentos sucintos e continuamos a acreditar que
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a maneira mais racional de fundamentar certas afirmações é a de apresentar números.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Severiano Falcão, para pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção.
O Sr. Severiano Falcão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também agradecia que o Sr. Ministro se dispusesse a responder-me a uma ou duas perguntas Essas perguntas vão inserir-se na linha de que já tem sido os reparos e as criticas do meu partido em relação a toda a política do Governo, mas particularmente no que se refere as desintervenções. O que isso tem constituído de prejuízo para a economia e para o direito ao trabalho dos trabalhadores. Mas também do Ministério da Habitação não fugiu nem foge á regra de atentar também dessa forma contra o direito ao trabalho dos trabalhadores.
Refiro-me muito concretamente a uma empresa desintervencionada por proposta do Ministério da Habitação, desintervenção que, obviamente, tinha de ser feita pelo Governo, que e a Empresa de Construções Joaquim Francisco dos Santos. A verdade é que esta desintervenção não se deu sem que, previamente e com todas as exigências, o Ministério não tivesse exigido aos trabalhadores um referendo para saber se eles concordariam com o regresso ou não da entidade patronal. Nesse referendo estava também a proibição expressa peio Ministério de os trabalhadores de nacionalidade cabo-verdiana terem sido impedidos de votar nesse referendo.
Independentemente destes pequenos pormenores, a verdade e que o» trabalhadores se pronunciaram por esmagadora maioria pela não restituição da empresa à entidade patronal, mas a desintervenção deu-se, a deu-se contra a vontade dos trabalhadores, com o apoio das forças da Guarda Nacional Republicana, e, tal como os trabalhadores tinham chamado a atenção do Governo, em particular para o seu Ministro da Habitação. Urbanismo e Construção, era de admitir o revanchismo da entidade patronal, a sua perseguição aos trabalhadores e, sem dúvida, o que terá de admitir dentro em pouco, a inviabilidade da própria empresa. Inviabilidade porquanto a entidade patronal já começou a despedir e fazer processos, a despedir os engenheiros mais qualificados da empresa, os técnicos mais qualificados dos serviços administrativos.
Sem dúvida que o Sr. Ministro irá remeter-me pura a Lei dos Despedimentos e sem dúvida me dirá que isso e assunto dos tribunais, mas o que o Sr. Ministro não pode, de facto, fazer e com que não se chame a vossa atenção para as consequências de tudo aquilo para que os trabalhadores, desde há longa data. vinham chamando a atenção.
A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP}: - Muito bem!
O Orador: - Mas com remissão para a Lei dos Despedimentos ou não, há um facto.
Deste modo, é de perguntar ao Governo, neste caso ao Sr. Ministro da Habitação, até onde pode ir a sua vontade no sentido de atender o pedido directo que lhe foi feito peia comissão de trabalhadores dessa empresa no sentido de ao abrigo de uma resolução do Conselho de Ministros, poderem ser enviados para essa empresa representantes do Governo para não se permitir que estas arbitrariedades, estas perseguições fascizantes, continuem.
A minha pergunta resume-se a isto Sr. Ministro: se o Sr. Ministro tem alguma resposta a dar aos trabalhadores da empresa, no sentido de que para aquela empresa seja enviado um representante do Governo para pôr cobro às perseguições de tipo fascina que dentro daquela empresa se estão a levar a cabo, com prejuízo para o ganha-pão dos trabalhadores que lá estão e particularmente para os mais qualificados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecassis, também para pedir esclarecimentos.
O Sr. Ministro da Habitação, Construção e Urbanismo responderá no fim a todos os pedidos de esclarecimento.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Ministro, são breves as perguntas que lhe quero fazer.
Aceitando como bons os números que V. Ex.ª acaba de dar, verifica-se que talvez dentro de vinte anos tenhamos conseguido cobrir o actual défice de 600 000 fogos, mas não sei quando teremos conseguido apanhar a bola...
Uma outra questão que lhe queria pôr era a seguinte: qual a política de expansão do sector da construção que se pode considerar que resulta dos números que acabou de indicar, particularmente em relação aos trabalhadores ocupados no referido sector?
Gostaria também de saber qual foi o esforço de compatibilização que o Governo tentou entre uma política industrial de produção de materiais de construção e a necessidade de incrementar o ritmo de construção, sabendo-se que daí têm resultado seríssimas dificuldades não só para o cumprimento do planos como também para a viabilização de empresas.
Queria ainda perguntar-lhe qual foi o esforço feito pelo Ministério da Habitação. Construção e Urbanismo para a introdução de novos processos de construção e para a incentivação da produtividade deste sector, elementos que são, sem dúvida, fundamentais para conseguirmos vencer a crise.
Para além disso, gostaria de perguntar, se tudo está tão bem, como é que se explica que seja tão elevado o número de empresas de construção - e refiro em especial as pequenas empresas de construção-, que estão praticamente em estado de falência, muitas vezes causado pelo atraso de pagamentos por parte do Estado ou peto não pagamento por empresas indirectamente nacionalizadas.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção: - Responderei telegraficamente, Sr. Presidente.
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Acerca do problema das desintervenções. o que posso dizer ao Sr. Deputado Severiano Falcão é que o Governo e o Ministério a que pertenço, com o mesmo vigor com que procederam à desintervenção em cumprimento da lei procederão contra o revanchismo, se ele na verdade se verificar.
Em relação ás questões postas pelo Sr. Deputado Nuno Abecassis, devo dizer-lhe que, em conversa havida ultimamente com o Sr. Embaixador da República Democrática Alemã, fui informado de que para 1990 pensam ter realizado o seu programa de habitação, e começaram-no imediatamente a seguir á Segunda Guerra Mundial.
Quanto ao problema de novos processos de construção, eles têm que se compatibilizar com a necessidade de aplicação de mão-de-obra neste momento, o que será programa para o futuro ano.
Não está tudo bem nas pequenas empresas, mas uma das coisas que não esta bem é haver um capital que para pouco mais dá do que para um mês de trabalho, visto que são capitais muito baixos e, sobretudo, daí resultam as grandes dificuldades existentes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barrentos para uma intervenção.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A moção de confiança apresentada a esta Assembleia pelo Governo do Dr. Mário Soares é um dos sintomas mais evidentes da profunda crise política que o nosso país tem vindo a atravessar.
Confrontado com uma profunda crise económica. que dezoito meses de Governo agravaram; confrontado com uma ofensiva das forcas reaccionárias e fascistas, em particular, nesta Assembleia, do PSD e do CDS...
O Sr. Cunha Simões (CDS):- Reaccionário e mentecapto é o Sr. Deputado!
O Orador - ...que já não lhe dão apoio parlamentar sem compartilharem do Poder; confrontado com um movimento popular que tem vindo a resistir e a opor-se claramente à sua política de pacotes e de ataques ás conquistas de Abril; vendo a sua própria base de apoio reduzir-se assustadoramente - o Governo sentiu-se incapaz de arcar sozinho com as responsabilidades de tomar um conjunto de medidas reaccionárias ditadas pelo Fundo Monetário Internacional e pela continuação da sua política anti-popular.
Aqui, é preciso dizer com clareza que o que os divide não é aceitar ou não ò empréstimo do Fundo Monetário internacional, porque nisso estão todos de acordo. O que os divide são as bases onde vão buscar a força para impor ao movimento popular essa política reaccionária que, o Fundo Monetário Internacional exige. E não foram outras, senão estas as razões que levaram o Governo a apresentar o memorando è a moção de confiança.
O que está em causa nas querelas actuais a que o País tem vindo a assistir entre as forcas políticas reaccionárias e antipopulares são as formas e os meios de:
1.º Impor aos trabalhadores portugueses o pacote 3, com um novo grande salto nos preços, nos impostos e nos despedimentos;
2.º Levar para a frente a lei anti-Reforma Agrária do Ministro Barreto e dar golpes mais profundos, através da repressão, na Reforma Agrária;
3.º Pôr as pé um movimento sindical fantoche que dê cobertura a uma ofensiva geral contra as liberdades sindicais e o movimento reivindicativo das massas trabalhadoras - e para isso lançaram a Carta Aberta:
4.º Tomar novas medidas para liquidar o sector nacionalizado, f particularmente a banca e a indústria, reclamados pelos monopolistas; finalmente, rasgar as liberdades escritas na Constituição e instituir um regime opressor e reaccionário, para o que já vão à frente Sá Carneiro e Pires Veloso.
Estas são as razões de fundo que levaram aos desentendimentos entre o Governo. PSD e CDS, provocando o actual voto de confiança.
Todavia, seria cegueira não ver que por detrás da presente crise política que o nosso pais atravessa esta a intervenção brutal do imperialismo norte-americano na política nacional, através das exigências, do FMI.
As objecções levantadas pelos partidos oposicionistas, sobretudo pelo PSD, às condições em que o empréstimo e negociado fazem parte do habituai jogo hipócrita de procurar capitalizar em seu proveito o descontentamento popular e agravar a situação do Governo. Tais objecções nada têm a ver com a defesa dos interesses das massas populares do nosso país, e isso e claro para toda a gente.
Alega-se que «o País consome mais do que o que produz». A UDP diz claramente a todo o povo português: se o País consome mais do que o que produz, a responsabilidade por isso não cabe aos trabalhadores! Os operários, os assalariados rurais, os pequenos e médios agricultores, as massas trabalhadoras, continuam a consumir menos, e caca vez menos, do que aquilo que produzem.
A origem da crise económica e financeira está naqueles que mais consomem, precisamente os que nada produzem, os capitalistas, os especuladores, os burocratas e tecnocratas parasitas que arruinam o sector de Estado, devoram as verbas do Orçamento, forçam as importações ruinosas para o Pais, traficam com divisas e, a troco de chorudas comissões, facilitam toda a espécie de negócios aos imperialistas norte-americanos e alemães. Instalados numa vida de fartura igual à que tinham no tempo do fascismo, graças ao 25 de Novembro e à política do Governo do Dr. Mário Soares, exigem agora novos privilégios.
Para essa burguesia parasita e reaccionária, o «grande empréstimo» representa uma autêntica chuva de ouro sob a forma de indemnizações, financiamentos, subsídios, créditos. Para as massas trabalhadoras ficará o pagamento da conta: trabalhar ainda mais para pagar o empréstimo e os juros, através da carestia de vida galopante, de novos impostos, do desemprego e de privações de toda a espécie.
Perante o povo português, é preciso que fique bem claro que a raíz da actual crise financeira está
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na política de recuperação capitalista e latifundiária posta em prática nos últimos dois anos, isto é, após o 25 de Novembro.
O Governo pede o voto de confiança desta Assembleia. Baseia-se para isso na política seguida durante estes 18 meses e na sua continuação. E o que vem afinal a ser esta política? Não é nada mais nada menos do que a política dos pacotes e mais pacotes.
Assim, vemos que o que o Governo nos tem oferecido e continua a oferecer:
Em primeiro lugar, o pacote 3, com aumentos já no princípio do ano que vem dos preços dos produtos alimentares, dos transportes, acabando com os subsídios dos bens alimentares;
Em segundo lugar, uma inflação que o Governo prevê ser da ordem dos 20 % a 23% e que, na realidade, se pode prever que será largamente ultrapassada tal como sucedeu este ano em que a inflação ultrapassou muito as previsões do Governo;
Em terceiro lugar, e simultaneamente a este aumento do custo de vida, o Governo propõe medidas para que os salários não subam além dos 15 %, o que se traduziria num agravamento bastante maior das condições de vida do povo português em relação a este ano, na continuação da política das portarias, no congelamento dos CCT, muitos deles há mais de três meses nas gavetas dos ministérios:
Em quarto lugar, a elaboração de uma nova lei dos despedimentos que revogue a anterior e que liberalize os despedimentos, deixando-os &o critério dos patrões, ao mesmo tempo que o Governo pretende ama maior disciplina nas relações de trabalho, uma intensificação dos ritmos de trabalho, o que no fim de contas e fazer a política das forças mais reaccionárias do País, satisfazendo as exigências do PSD, do CDS o da CIP.
Estas quatro medidas são, no fim de contas, o conteúdo do Pacto Social que o Governo propõe ás forcas políticas e sociais. Mas isto não é tudo o que o Governo tem para nos oferecer.
Vemos ainda que o Orçamento Geral do Estádio para 1978, já apresentado pelo Governo a esta Assembleia, mostra á evidência os resultados desastrosos que a política de recuperação capitalista e de subordinação às exigências do FMI traz para o povo português.
Exige o FMI uma redução do défice orçamentai para menos de 2/3 do valor actual. Assim, o Governo propõe que a verba destinada à habitação desça de 7 milhões de contos, a construção de estradas e a electrificação tenha um decréscimo da 5 milhões de contos, a educação de 2 milhões de contos, tal como a saúde e a segurança social. Pergunta-se: quem sofrerá com estas medicas? Acaso serão os capitalistas?
Ao mesmo tampo, propõe-se que as despesas militares aumentem de 1,6 milhões de comos, atingindo os 22 milhões de contos, quer dizer cerca do dobro da verba destinada ao Ministério da Agricultura e Pescas. Como é evidente, estes aumentos não se destinam ao aumento dos efectivos do exercito - pois o número de soldados tem diminuído -, mas sim a pagar as despesas da participação do nosso país na NATO, aumentando a submissão do nosso país ao imperialismo e, alienando a nossa independência nacional.
Particularmente significativo é o aumento das despesas do Ministério das Finanças, que passam de 31 para 70 milhões de contos, aumento esse que se destina em grande parte a pagar juros e amortizações e, sobretudo, as indemnizações aos grandes monopolistas. Esse dinheiro ir-se-á buscar à bolsa dos trabalhadores, através do aumento de impostos, aumento esse que corresponderá a cerca de mais de 1100$00 que cada trabalhador vai pagar no próximo ano.
A liberalização das importações e a contracção económica impostas pelo FMI, levarão ao agravamento ainda maior da crise, provocando a falência de fábricas e aumentando ainda mais os despedimentos e o desemprego.
Por fim, e ao mesmo tempo que este Governo tem vindo a abrir as portas à direito e ao fascismo, concedendo-lhes as mais amplas liberdades, vimos a sua capacidade para fazer leis antipopulares destinadas a liquidar as conquistas de Abril. Foi a lei anti-Reforma Agrária do Ministro Barreto, a lei do Arrendamento Rural do PSD (ou lei dos senhorios), a lei das indemnizações, a lei da delimitação do
sector púbico e do sector privado, a lei das comissões de trabalhadores e do direito à greve, etc., leis que, de resto, tão bem conhecidas dos trabalhadores.
Não é pois por acaso que nós assistimos ontem aqui, nesta Assembleia, a uma intervenção de Sousa Franco, do PSD, a exigir que a lei Barreto, a lei das Indemnizações e todas as leis votadas em conjunto com o PS sejam imediatamente aplicadas. Afinal, sempre é verdade que o Governo PS tem vindo a fazer a cama à direita e ao fascismo.
Sr. Presidiem te, Srs. Deputarias: A UDP está consciente da gravidade da situação que o nosso país atravessa e dos perigos que o 25 de Abril enfrenta. As forças reaccionárias e fascistas vêm lançando uma ofensa que não é só política, mas também social económica e militar. Com efeito, as manobras e o aproveitamento que as forças reaccionárias fazem em volta de militares reaccionárias e fascistas, as manifestações declaradamente fascistas que convocam, o reforço das suas posições no aparelho de Estado, o seu regresso às empresas intervencionadas, o papel preponderante que os monopólios exigem e começam cada mais a desempenhar na economia nacional, a recuperação latifundiária, o ataque desenfreado a todas as conquistas de Abril, são o testemunho mais claro disso. O movimento popular está assim colocado perante uma situação grave que tem de enfrentar.
Toda a atitude da pane das forças de esquerda, da parte dos trabalhadores e do povo que leve à respectiva sobre a evolução dos acontecimentos, paralisando a força de actuação do movimento popular e arredando-o da acção política deixará o campo livre para que a direita e o imperialismo prossigam sem obstáculo a sua caminhada reaccionária.
As grandes manifestações populares que se têm realizado pelo País, com destaque para as jornadas dos das 18 e 19 de Novembro no Porto e em Lisboa, provam que o movimento popular não está parado e que sobretudo tem potencialidades para pôr um travão à avançada reaccionária. Simultaneamente, elas comprovaram a oposição dos trabalhadores às medidas
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reaccionárias do Governo e a sua política de serviço à direita e que qualquer solução para o nosso país tem obrigatoriamente de contar com o movimento popular e a sua força.
Consciente da gravidade da situação que o País atravessa, consciente da bondade dos portugueses e do povo português de defender as conquistas de Abril, a UDP, lança uma proposta a todos os trabalhadores do País, à classe operária aos assalariados rurais, aos caseiros e rendeiros, aos pequenos e médios agricultores, a todo o povo português a todas as pessoas progressistas e a todas as forças políticas de esquerda, unamo-nos numa plataforma para grandes acções conjuntas contra a ofensiva da direita, contra a política reaccionária do actual Governo, em defesa das conquistas de Abril, a caminho de um governo do 25 de Abril do povo!
Sem quaisquer discriminações de ordem partidária ou religiosa, perante a gravidade da situação nacional, a UDP propõe aos operários e trabalhador?? comunistas, socialistas, católicos e antifascistas que ergamos conjuntamente, numa ampla unidade, um grande movimento de massas em torno dos seguintes quatro objectivos:
1. Defesa da liberdade e da Constituição: libertação imediata de todos os antifascistas presos: proibição de actividades fascistas e da imprensa fascista e dissolução do MIRN: prisão, de iodos os conspiradores reaccionários, pides e bombistas; repressão sobre as actividade separatistas:
2. Defesa de bem-estar da alasse operaria e dos trabalhadores; não á política dos pacotes: congelamento dos preços dos bens essenciais: saída dos CCT e aumento de salários com redução do leque salarial: não à devolução das empresas intervencionadas; revogação da lei de delimitação do sector publico e privado; proibição dos despedimentos;
3. Defesa da Reforma Agrária e dos direitos dos rendeiros, caseiros, pequenos e médios agricultores; não à aplicação da lei Barreto e luta pela sua revogação, bem como das leis do arrendamento rural e da colónia na Madeira;
4. Defesa da independência nacional: não ao FMI e aos empréstimos; combate à submissão de Portugal à NATO.
A UDP está convicta de que é, mais do que nunca, necessária uma jornada nacional de acção de todos os trabalhadores portugueses, aprovada por todos os sindicatos e pelos trabalhadores portugueses, que ainda não foi levada à prática, que sirva de travão à avançada reaccionária e fascista.
A UDP coloca nas mãos dos trabalhadores e das forças políticas antifascistas e de esquerda esta proposta de acção unitária contra o assalto da direita e em defesa das conquistas de Abril.
A UDP continuará empenhada na unidade popular por uma saída de esquerda. E a razão da nossa confiança, da certeza da nossa, vitória, reside no facto de que as lutamos manifestações populares mostraram que, apesar de ultimamente o próprio Dr. Álvaro Cunhal ter deixado di falar num governo de esquerda, os trabalhadores vieram para a rua, com confiança e determinação, lutar por uma saída a um governo de esquente...
Risos do PCP.
...mostram que, apesar de ultimamente o Dr. Álvaro Cunhal já querer ia actuação do FMI no nosso país, os trabalhadores vieram para a rua dizer que não querem essa actuação.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Foste tu que os convocaste, não?
O Orador: - E mais: estamos confiantes porque essas manifestações os trabalhadores vieram para a rua dizer que hão querem a aplicação da lei Barreto e não, como pretendia o Dr. Álvaro Cunhal, dizer que são a favor de uma aplicação razoável dessa lei.
Risos do PCP.
Que se diga, pois, claramente que os trabalhadores não querem a aplicação razoável da lei Barreto porque são contra a fome, a miséria e os despedimentos «razoáveis». Os Srs. Deputados poderão discutir aqui questões como a fome, o desemprego e a miséria razoáveis, mas aqueles que se encontram nessas situações é que seguramente, não acharão nada razoáveis essas discussões.
Finalmente, a determinação dos trabalhadores em lutar por um governo de esquerda e em travar a actual ofensiva reaccionária é que nos permite dizer hoje que o PSD e o CDS não podem nem conseguem entrar para o Governo.
Risos do CDS e do PSD.
É preciso que criemos as condições para que não só o PSD e o CDS não entrem para o Governo, mas para que, finalmente, os trabalhadores, e o 25 de Abri entrem para o Governo e possamos, enfim, chegar à vitória a caminho do socialismo.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A UDP e o gato de Barcelos!
Risos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manual Proença para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Manuel Proença (PS): - Sr. Presidente, eu queria apenas fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Acácio Barreiros.
A UDP, tanto quanto sei, declarou na sua resposta ao memorando do Governo que votaria contra a moção de confiança por este apresentada, apesar de reconhecer que se o Governo cair o governo que vier a formar-se será pior do que o actual Se assim for eu queria, perguntar ao Sr. Deputado se esta atitude corresponde à irresponsabilidade da UDP perante as pessoas que lhe confiaram o voto, se corresponde á critica de que os partidos da burguesia se servem para criticar os partidos ditos revolucionários -a que chamam «a política da terra queimada» ou à política do «quanto pior melhor» -, ou, ainda, se «irá apenas uma poeira de demagogia com vista à preparação de uma táctica eleitoralista.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Acácio Barreiros pode responder, se assim o entender.
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O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Fá-lo-ei muito rapidamente, Sr. Presidente.
A UDP; na resposta do memorando do Governo, não disse que se ele caísse vinha um governo pior. Aliás se o tivesse feito, praticara uma política criminosa. O que a UDP disse foi que é sempre falsa as chantagem com que o Dr. Mário Soares tem tentado travar, as lutas populares, porque se este Governo cair quem é que o substituirá será a direita...
Risos do PCP.
..., porque se vê que quando o PS está no Governo a direita vai aumentando a sua força. E mais se os trabalhadores não travam este Governo e não o deitam abaixo, então, sim é que a direita toma o Poder.
E hoje, quando nós podemos dizer aqui que o PSD e o CDS não têm força para ir para o Governo, não agradecemos o facto ao Dr. Mário Soares, agradecemos, sim, as grandes manifestações populares convocadas contra a opinião do Dr. Mário Soares, contra o seu Governo e sem o apoio da direcção do Partido Socialista, mas felizmente com a participação da esmagadora maioria dos militantes socialistas.
Risos do PS.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - A UDP não tem militante!...
O Sr. Presidente: - Algum dos Srs. Ministros deseja usar da palavra?
Pausa.
Faça favor. Sr. Ministro Jorge Campinos.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Sr. Presidente, creio que o Governo já inscreveu vários Ministros e nós gostaríamos de ouvir agora um pouco os Deputados da oposição, para que, na medida do possível, houvesse diálogo.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro. Mas a verdade é que tenho de dar a palavra a alguém...
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Orador: - Faca favor, Sr. Deputado Sérvulo Correia.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tinha acabado de usar da palavra um Sr. Deputado, e penso que, pelo menos por enquanto, o Sr. Deputado Acácio Barreiros não é membro do Governo.
Risos.
No entanto, nós não fazemos questão em colaborar na prossecução destes trabalhos, intervindo desde já e não fazendo um entremeado com o Governo, como poderia muito bem acontecer.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na sessão de 5 de Agosto de 1976, quando aqui se debatia o Programa do Governo, o Partido Social-Democrata vincou a sua independência política e programática face ao Executivo minoritário, ao mesmo tempo que definiu uma base de rendimento virtual, circunscrita ao que contribuísse iria resolver a crise e consolidar a democracia, caso o Governo para tanto se revelasse apto.
A dúvida de que esta aptidão se visse a manifestar transparecia, no entanto, já nas palavras de Barbosa de Melo, preocupado com o tipo de solução governativa que merecera as preferências do Partido Socialista:
O Partido Socialista decerto considerou que um governo homogéneo, empenhado na realização do programa socialista, possuiria as virtudes necessárias nesta hora. Por nossa parte entendemos que está longe de ser a solução melhor. Um Governo obrigado a seguir ao sabor dos apoios espontâneos de maiorias de ocasião, formadas e logo desfeitas, em torno de medidas pontuais, correrá sempre o risco de flutuações na sua orientação e descontinuidades na sua acção.
Destas palavras, aqui- proferidas em 5 de Agosto de 1976, não deve dizer que foram proféticas. A profecia traduz uma intuição sobre o sentido de acontecimentos imprevisíveis. Ora Barbosa de Melo, ou melhor, o PSD pela sua voz, não adivinhou, apenas se limitou a fazer uma análise cuja correcção o tempo transcorrido demonstra.
O Sr. Sousa Franco (PSD): - Muito bem!
O Orador - «Flutuações de orientação e descontinuidade na acção», eis uma síntese lapidar da imagem que de si daria o Governo, que então solicitava a investidura, que na dúvida obteve e agora impetra uma confiança que as certezas cumuladas pela experiência não permitem.
A posição que o PSD assume neste debate não pode surpreender seja quem for: ela não é fruto de qualquer súbita reviravolta, mas «sim de uma linha consequente, traçada antes das eleições legislativas e afirmada aqui em todos os debates, em que, por uma forma ou por outra, esteve em causa uma avaliação global do mérito do Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - No debate sobre o programa do Governo, reivindicámos o direito de criticar, serena mas severamente, a sua política e a execução que dela fosse feita. Salientámos que, nas intervenções dos membros do Governo algumas contradições haviam aflorado e expressámos o receio de que elas se confirmassem, comprometendo uma unidade de pensamento sem a qual seria impensável a eficácia de acção. Também sublinhámos desde logo um vicio que mas tarde irromperia com maior virulência noutros pontos sai lentes do percurso governativo: a contusão entre desejos e possibilidades, entre necessidades e prioridades e, em consequência, a falta de uma estratégia clara para sair da crise.
O Sr. Sousa Franco (PSD): - Muito bem!
O Orador. - Finalmente, deixámos bem claro que A nossa posição perante o Governo iria depender no
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essencial daquilo que este fosse capaz de fazer para debelar a crise. Como então declarou Sá Carneiro.
O futuro do Governo dependerá sobretudo da sua capacidade de governação; e, por certo também da nossa exigência crítica, mas sobretudo da sua eficaz capacidade de governar.
Vozes do PSD: - Mu«o bem!
O Orador: - Retomados, depois de férias, os trabalhos desta Assembleia, foi o PSD obrigado a constatar que a evolução dos acontecimentos não correspondia à sua expectativa benevolente.
Entre Abri e Agosto tivera o Partido Socialista tempo de sobra para organizar o seu Governo, fazer estudar pelos membros indigitados os dossiers mais significativos e preparar uma actuação conjugada e profunda nas primeiras semanas de exercício, que desse à opinião pública a imagem de um executivo senhor dos problemas, coeso, dinâmico e disposto a perder tempo.
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - Não foi capaz.
O Orador: - Em vez disso, as semanas sucederam-se às semanas, sem que nada se produzisse. Os Ministro e Secretários de Estado diziam a quem os queria ouvir que estavam ainda a meter-se dentro dos problemas e, perante a premência de uma situar cão difícil, as medidas desgarradas, casuísticas, hesitantes, quando não contraditórias, começaram a desenhar-se como perfil funcional deste Governo, muito mais talhado para governo de gestão e de «apagar fogos» do que para as vias de grande fôlego, sem as quais não se abriria caminho para a saída da crise.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Também não foi feliz a linha de conduta inicialmente escolhida pelo Governo face à Assembleia da República. Desprovido de apoio parlamentar estável, o Governo deveria ter optado por uma linha de discussão franca e de abertura as teses da oposição que não fossem totalmente inconciliáveis com a sua própria política. Nas sínteses assim obtidas poderia o Governo ter posto a base da sua sobrevivência e da sua credibilidade perante uma opinião pública maioritariamente oposicionista.
Preferiu, porém, o Governo apresentar uma falsa imagem de força, escolhendo o pretexto da legislação de emergência sobre as autarquias locais para, com o apoio do PC fazer passar diplomas com soluções incorrectas a que pretendiam obviar propostas de alteração do PSD, sistemática e absurdamente derrotadas. Não foi preciso muito tempo para que a prática demonstrasse que se havia perdido uma boa oportunidade de fazer diplomas melhores. E, decorridos alguns meses, seria precisamente sobre esta matéria que o Governo sofreria uma primeira derrota estrondosa, pela votação conjugada CDS, PSD, PCP, vendo assim materializada a aproximação do fim da sua estratégia de apoios alternados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - No debate sobre o Orçamento e Plano para 1977, o PSD adoptava já uma posição de frontal desconfiança face à inexistência de uma política económica do Governo e as condições assim criadas para um agravamento cumulativo da crise. Voto de desconfiança foi por certo a nossa votação contrária a um Plano que o próprio Governo se encarregaria da desautorizar por seu turno com o «1.º pacote» de medidas económicas, logo em Fevereiro de 1977.
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - Muito bem!
O Orador - Preparava-se o Governo para fazer passar estas importantes providências fora do âmbito da Assembleia - excepto quanto às que constitucionalmente deviam ser objecto de proposta de Lei. A natureza minoritária do Executivo leva-o a encarar o Parlamento como um adversário ou um estorvo a ladear sempre que possível. Daí advém a frequente invasão da competência reservada da Assembleia por decretásseis organicamente inconstitucionais, cuja ratificação houve que pedir, mesmo com o inconveniente de protelar outros trabalhos urgentes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Foi também a preocupação de defender o papel da Assembleia, como foro de debate dos grandes problemas nacionais e de lugar obrigatório de explicação por parte do Governo das linhas da sua política, que levou o PSD a interpelá-lo sobre o «1.º pacote». No debate a que deu lugar essa iniciativa dos sociais-democratas manifestou-se de novo a disponibilidade do PSD para apoiar o Governo naquilo em que o recomendasse o interesse nacional. Mas os sociais-democratas refutaram mais uma vez a pretensão do Partido Socialista de se considerar isoladamente uma alternativa, não obstante o apoio minoritário do eleitorado. Os nossos Deputados sublinharam então a extrema gravidade da situação económica e financeira e a falta de esclarecimento por parte do Governo sobre pontos fundamentais da sua política, nomeadamente os meios de financiamento do défice cambial.
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Ao longo desta I Sessão Legislativa, foram os sociais-democratas desenvolvendo e concretizando o principio da maioria democrática estável, com o mais adequado a esta fase histórica de consolidação da democracia portuguesa. Repelidas pelo PS as propostas de conversações subsequentes ao discurso de 25 de Abril, e repetidas em termos desabrados, que revelaram uma sensação de acossamento surpreendente da parte de um governo até então tratado pelas oposições com uma contemplação sem paralelo na Europa Ocidental, PS e PSD reaproximar-se-iam a propósito da discussão das Leis da Reforma Agrária e do Arrendamento Rural. Foi então celebrado um acordo de consultas mútuas. semelhante ao existente entre PSD e CDS, mas, no mesmo texto em que aquele era tornado público, os sociais-democratas reafirmavam a sua posição de nenhum aval à política do Governo. Esta importante ressalva não decorria de puras imposições tácticas
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Foram a crescente evidência da incapacidade governamental perante o agravamento da crise e a consciência da erosão que a interna estava a trazer às instituições democráticas, incluindo os próprios partidos na oposição, que forçaram a revisão da fórmula governativa e á preparação de uma política maioritária destinada a mobilizar o povo português contra a crise e a favor da reconstrução da economia nacional e da melhorias programada dos seus quadros de vida.
Ao longo do mandato do Governo que ora se submete ao veredicto Já Câmara tem s do constante a posição do PSD no que toca à falta de uma política social assente em princípios claros e levada a cabo com coerência e eficácia.
Eu próprio, usando da palavra no debate sobre o programa do Governo, chamei a atenção pura o facto de ele não obedecer, na parte social, a um sentido de conjunto, nem encarar os instrumentos da política social como factores de evolução da estrutura da sociedade portuguesa.
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - Muito bem!
O Orador - Afirmei então que a política preconizada pelo Governo em matéria de segurança social e de saúde não era dinâmica nem evolutiva. Disse que tal política seria apenas uma política de gestão, que aceitava no essencial as estruturas existentes. Observei que não se parecia da determinação do mínimo de subsistência, factor sem o qual não é viável uma verdadeira segurança social. Lamentei a ausência de uma perspectiva humanizadora da sociedade, demonstrável pela falta de definição de políticas da família e da infância. Acentuei a omissão das bases de uma política de rendimentos. Reprovei a passividade perante a discriminação contra estratos mais desprotegidos, como os rurais e, de um modo geral, toda a população idosa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador. - No debate travado em Dezembro de 1976 «sobre o Orçamento e o Plano para 1977, eram estes textos, com os seus números, ou melhor, com a falta de números essenciais, a prova provada da ausência de claras ideias de fundo por parte do Governo sobre a distribuição de rendimentos e a garantia de satisfação das necessidades básicas do povo português.
Esses documentos apresentados à Assembleia - com as anexas linhas fundamentais do orçamento da Previdência - constituíam, além do mais lamentável exemplo de tecnocratismo negador da democracia.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Em vez de anunciar com clareza aos representantes dos povos os aspectos em que a política social se repercute directamente na vida das pessoas, o Governo remeteu-se naqueles textos para as generalidades e os números globais. Por definir ficaram dados simples e fundamentais para tantos, como o montante das pensões de reforma e as taxas da sua actualização, os níveis dos abonos de família e das suas prestações complementares. Nada se adiantava. Quanto ás intenções do Governo sem matéria de nivelamento progressivo dos regimes dos rurais com o regime geral de Previdência. Não se explicitavam fórmulas e prazos para o inicio da protecção de idosos e inválidos destituídos de meios de subsistência. Não se esclarecia a população dependente de prestações sociais os cálculos de contabilidade nacional que justificavam as escassas verbas que lhes eram atribuídas. Não se indicavam escala de prioridades não se programavam faseamentos, não se estabeleciam normas mínimas de prestações. E, como então logo observei, não se notava um esforço racionalizado de compensar a crise económica por um acréscimo de prestações sociais aos mais vulneráveis.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - À inevitável argumentação baseada nas dificuldades orçamentais .respondeu o PSD, pela minha voz, que era necessário começar por definir critérios mínimos de protecção impostos pela salvaguarda da dignidade humana. Em seguida se veria que outras despesas tarjam de ser cortadas e em que margem se justificaria até um alargamento do défice orçamental.
Mas, obcecado por uma política defensiva de segredo, sobre tudo o que poderia ficar em silêncio e de resposta casuística aos protestos mais virulentos, que não necessariamente os mais justificados, o Governo não atendeu à critica construtiva dos sociais-democratas.
Isso tornou-se bem claro no debate da interpelação do PSD ao Governo sobre o «1.º pacote» de medidas económicas e financeiras. Desta tribuna defendi então o princípio de que medidas de austeridade no plano económico teriam de ser contrabalançadas por medidas sociais que impedissem o agravamento relativo da situação dos mais desfavorecidos e bloqueassem a evolução a caminho de uma sociedade sem distinção de classes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para frisar o carácter necessário ao paralelismo entre as medidas económicas introduzidas pelo Governo e as medidas sociais de compensação exigidas pelos sociais-democratas, ousei mesmo lançar a fórmula de um «pacote de medidas sociais».
Pela minha voz, os sociais-democratas não se limitaram à defesa do princípio. Ultrapassando em muito os seus deveres de partido da oposição e desmentindo mais uma vez a frequente acusação de não terem alternativas a propor, enunciaram nessa oportunidade um minucioso elenco de providenciai concretas nos campos da segurança social, da saúde, do emprego, do trabalho e do apoio social e cultural aos emigrantes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador. - Volvidos nove meses, somos forçados a constatar que quase tudo foi em vão. Temos cons-
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ciência do que é duro dizer aqui que o Governo do Partido Socialista não tem uma política social.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Apercebermo-nos de quão chocante será para a população portuguesa aperceber-se desse facto. Não usamos como método a luta as mentiras ou as meias verdades. Cremos que a salvação da democracia e o futuro do País em paz e em progresso assentam no entendimento e não no cavar da ressentimentos, entre as forças democráticas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas nada disto deve impedir, antes pressupõe, que as realidades sejam encaradas da frente e as verdades ditas, sobretudo em momentos decisivos como este.
Vozes do PSD: - Muito bom!
O Orador: - No memorando do Sr. Primeiro-Ministro, reconhece-se que as confrontações políticas estéreis deveriam ser suplantadas por uma fase construtiva da vida nacional, em que acima de tudo, se equacionassem os problemas concretos que afligem os Portugueses, sem o que a democracia estará condenada, a prazo mais ou menos curto.
Estamos de inteiro acordo. Mias no domínio da política social, como noutros, a experiência já demonstrou que isso não é possível com um governo minoritário.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não estão em causa problemas de legalidade constitucional, que, portanto, é ocioso contestar. Trata-se, sim, de reconhecer que só uma política linear, uma política não flutuante ao sabor de pontos de apoio alternativos e opostos, poderá apontar com clareza para metas bem definidas.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Só uma política pensada para um período de vários anos poderá ser eficaz sobre uma sociedade em crise. Só uma política que possa ser efectuada sem desfalecimentos nem reviravoltas se não perdera pelo caminho. Só, uma política aceite pela grande maioria do povo português se não desagregará contra a resistência e o cepticismo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só uma política delineada por uma maioria « executada por um Governo confiante, constituído com uma missão histórica, coeso e disciplinado, poderá ter um impacte actuante sobre o devir da nossa sociedade ao Longo dos próximas anos.
Aplausos do PSD.
A conclusão de que o Governo não tem uma política social é dura, - mas não mais dura que a própria realidade. Não a move o desígnio ao ataque pessoal
e da ignorância deliberada de pormenores positivos. Sem esquecer responsabilidades individualizáveis ou algumas iniciativas fecundas, move-nos o exame do conjunto. E esse aponta sobretudo para os defeitos inconstitucionais de base, para cujas previsíveis consequências sempre alertámos as outras forcas políticas e o País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É consequência quase inevitável .da fraqueza dos governos o confinamento destes às rotineiras tarefas de gestão, com prejuízo da definição das estratégias de fundo e do arranque para a sua execução.
Não admira, pois, que o actual Governo não tenha conseguido definir uma política social global.
São fruto disso as sobreposições orgânicas e funcionais e o seu reverso, isto é, a falta de estruturas para levar a cabo tarefas indispensáveis. É consequência disso a ausência de uma visão clara quanto aos critérios de repartição do rendimento nacional. É consequência disso a multiplicidade de regimes paralelos de protecção social e a disparidade de prestações dirigidas a situações humanas similares, com a patente carga de injustiça que implicam. É consequência disso, enfim, o carácter residual das medidas dispersas de política social frente à política económica, que tem permitido uma crescente desproporção entre as necessidades sociais a satisfazer e os meios financeiros de resposta.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - As sobreposições de estruturas em dados planos e a ausência de estruturas noutros é um facto que o Governo não pode negar, que já poderia ter sido objecto de solução que só demonstra que este Gabinete não tem a homogeneidade e a coesão que reivindica perante a sua natureza mono-partidária.
Vozes do PSD: - Muito tem!
O Orador: - Quem sofre os efeitos são os cidadãos, nuns casos desprotegidos, noutros mal protegidos, noutros ainda sujeitos a regimes cuja diversidade só a ausência de uma visão de conjunto, o comodismo rotineiro e a defesa de caducos feudos burocráticos explicam.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como explicar de outro modo que a previdência social e a assistência, social, dependentes de um mesmo Ministro e de um mesmo Secretário de Estado, continuem totalmente desarticuladas, tanto orgânica como funcionalmente?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como compreender que os rurais, para além da discriminação de que são vítimas em matéria de protecção previdencial, continuem ainda integrados em dois regimes diferentes - o dos fundos
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e o do abono de família- geridos por entidades distintas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como aceitar que o pretenso sector único da primeira e segunda infâncias mais não seja do que a justaposição de duas estruturas, que se mantêm com todos os seus particularismos - IFAS e IOS-, complicando, burocratizando, lançando a confusão e desmotivando os trabalhadores dos serviços?
Vozes do PSD: - Muito bem!
a Orador: - Como compreender que, dispondo já o MEIC de duas divisões de ensino especial, continuem no Serviço de Protecção à Infância e Juventude, dependente do MAS, os escassos estabelecimentos oficiais para a educação de crianças deficientes? Um decreto-lei de Agosto cria no MEIC o Secretariado do Ensino Especial. E logo um despacho do Secretário de Estado da Segurança Social suspende a passagem dos referidos estabelecimentos de um Ministério para o outro, sem fixar qualquer prazo transitório.
É assim que o Governo garante a extensão do ensino especai à população infantil e jovem deficiente?
O Sr. Magalhães Mota (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Apenas para citar um exemplo - porque o tempo não permite examinar a infinidade de casos possíveis-, como explica o Governo a total ausência de programas integrados de responsabilidade interdepartamental para os problemas da terceira idade?
Se o Governo é homogéneo, o que impediu que as Secretarias de Estado da Segurança Social e da Saúde: 0 Ministério da Habitação, o dos Transportes, o do Trabalho, o da Educação e a Secretaria de Estado da Cultura tivessem conjugado os seus esforços para um programa que abarcasse unidades gerónticas e geronto-psiquiátricas, consultas especializadas desta modalidade, iniciativas de integração social de idosos nos planos de urbanização, suficiente concessão de facilidades nos transportes colectivos em geral, esquemas de preparação dos activos para a reforma, organização de actividades culturais, de ensino e recreativas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A homogeneidade dos governos exulta da clara definição de um programa- e de hierarquias e competências, de regras de funcionamento e da compatibilidade pessoal dos seus membros e não da cor mono-partidária, como a experiência deixa á vista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - A ausência de uma visão clara explica flutuações de orientação e descontinuidades na acção explica a incapacidade para pôr em marcha programas integrados e interdepartamentais, explica que nu plano social se não tenha passado da gestão de uma máquina enferrujada, a cair de podre para todos os lados.
Aplausos do PSD.
Como define o Governo a sua política de infância? Será materialização de uma política progressiva de infância o alargamento do ensino primário a crianças com 5 anos, em vez de se lhes assegurar a educação pré-escolar?
O Sr. Magalhães Mota (PSD): - Muito bem!
O Orador - O Governo não pode definir a sua política de infância, pela simples razão de que a não tem...
E como caracteriza o Governo a sua política de família?
Neste momento de crise aguda, quais as medidas para adoçar a situação das famílias mais vulneráveis por disporem de menos rendimentos ou terem um maior número de filhos?
A verdade é que o Governo não tem uma política de família, nem estrutural, nem conjuntural...
Vozes do PSD: - Apoiado!
O Orador: - Além da constituição pródiga de comissões, que política de conjunto para a reabilitação de deficientes ou de marginalizados sociais?
Estão as nossas estruturas constituídas para a luta contra a droga obter resultados visíveis? E que se tem feito em relação a centenas de milhares de alcoólicos?
E em matéria de política de emprego, que fez o Governo além de superintender no ronceiro e passivo funcionamento dos serviços? Como explicar a inexistência de um plano global de formação profissional? Como tem o Governo correspondido à preocupação de tantos e tantos milhares de pais quanto ao futuro dos filhos que não arranjam colocação ou não conseguem continuar os estudos?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por que não proeurou até aqui o Governo racionalizar globalmente o problema e equacionar saídas que permitam aos interessados saber com o que contam para o dia de amanhã, ainda que essas saídas não fossem tão róseas como subjectivamente desejavam?
E como se percebe que há vários meses não haja Secretário de Estado da Saúde? Vão bem as coisas por esse sector da governação?
Pode-o Governo explicar para que serviram as ADSS, para além de fontes de emprego de militantes socialistas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador - Que meios pôs o Governo ao seu serviço? Em relação às pessoas que já levantaram
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canas sanitárias dos seus distritos, como admitir que os departamentos referenciados continuem a depender dos órgãos centrais sitos em Lisboa?
Por que razão continuam por preencher os quadros de especialistas dos hospitais distritais?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por que não se mexeu a seno no problema do incrível funcionamento dos bancos hospitalares?
Por que se não intentou até agora definir à luz das novas realidades e em colaboração cem a Ordem dos Médicos as regras do exercício privado da Medicina e da sua articulação com os serviços públicos da saúde?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por que se não prepararam documentos de base sobre a reformulação das carreiras médicas, paramédicas e de enfermagem, em vez de se ir publicando diplomas sobre problemas de pormenor?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, regressando aos problemas do enquadramento financeiro e das suas consequências ao nível das prestações, como compreender que este Governo socialista continue a estafada política assente numa visão contributiva da origem de recursos e na ignorância das responsabilidades sociais só concretizáveis através do financiamento pelo Orçamento Geral do Estado?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Como se justiça o Governo perante as dezenas de milhares de cidadãos inscritos, para a pensão social e que continuam a aguardar esse beneficio?
O Sr. Magalhães Mota (PSD): -Muito bem!
O Orador: - Como se justifica o Governo perante centenas d« milhares de pensionistas rurais a quem as pensões foram pagas com atrasos de muitos meses?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Que dizer das atitudes do Governo perante as farmácias suas credoras, a quem compensa da mora do pagamento com ameaças e outras atitudes irresponsáveis?
E, dispondo o Governo de uma estrutura de animação cultural rural e de acção social à escala de todo o País - as Casas do Povo -, como admitir quê não tenha ainda conseguido estabelecer as linhas do seu futuro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E justificarão os problemas financeiros que se não apreciasse a situação dos acidentados de trabalho, dentro da escassez de recursos, em termos de justiça relativa com os restantes beneficiários de prestações sociais?
Poderíamos continuar quase interminavelmente. Mas o que dissemos é já bastante para fundamentar uma conclusão.
O País carece de uma política social que racionalize e clarifique a distribuição de rendimentos e a satisfação de necessidades básicas de todos os cidadãos.
Este Governo não foi capaz de o fazer.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Temos de o substituir por outro Governo com fôlego, apoio social e espírito ofensivo que só uma base maioritária facultará: por um Governo que possa levar a cabo a política social progressista, que não esteve ao alcance deste.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes para pedir esclarecimentos.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Sérvulo Correia, vou utilizar uma frase que e costume usar muitas vezes e que se resume assim: «Deixe-mos os antepastos e vamos ao prato de resistência.» E o prato de resistência são as perguntas que o Sr. Deputado aflorou na sua exposição.
Protestos do PSD.
É evidente que, quanto à situação das viúvas e a todos os problemas que apontou, todos estamos de acordo em que a situação deve ser melhorada, mas não é isso que estamos a discutir. O que estamos a discutir é o seguinte: em primeiro lugar, o Sr. Deputado disse que só uma política pensada para um período de vários anos é que poderia resolver os problemas do nosso pais. É curioso que nós estamos absolutamente de acordo com isso, mas pomos-lhe uma questão: como é que o Sr. Deputado concilia essa afirmação com a animação, feita por um membro proeminente do seu partido, de que se deveria ir desde já pensando na revisão da estrutura que permite definir essa política e que é a Constituição da República? que estabilidade é que pode haver quando se fala em rever a Constituição da República?
Protestos do PSD.
A segunda questão que eu lhe queria pôr refere-se a um ponto pouco importante na sua exposição. O Sr. Deputado diz que há vários meses que não há Secretário de Estado da Saúde e eu pergunto se é ou não verdade que membros do seu partido - não sei se também o Sr. Deputado - censuraram já este Governo por ter Secretários de Estado a mais, tal como já disseram que se subissem ao Poder requereriam maior operacionalidade?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Em terceiro lugar, o Sr. Deputado disse que o País carece de uma política social, mas acaba por propor não a discussão de uma política
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social, a que o Governo está aberto, mas sim uma entrada no Governo.
A Sr.ª Emília de Melo (PS): - Muito bem!
O Orador:- E a pergunta resume-se nesta questão precisa o País de uma política social bem defenida ou precisa o País do Partido Social-Democrata no Governo?
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Das duas coisas. Sr. Deputado. E sem uma não haverá outra.
Uma voz do CDS: - E não só!
O Orador: - Tem outro ponto que é fundamental focar. E o seguinte: falou o Sr. Deputado no facto de o Governo olhar a Assembleia da República como um inimigo. Só para dar um exemplo...
O Sr. Braga Barroso (PSD): - Só?...
O Orador: - .... lembrarei que houve um ou vários casos em que membros do Governo, que nunca se recusaram a vir a esta Assembleia, tiveram de ca vir, pelo menos num dos casos, três quatro vezes, até que puderam ser ouvidos. Gostaria, pois, que o Sr. Deputado me apontasse um único caso em que o Governo, solicitado a vir a esta Assembleia, não lhe tivesse dado o melhor da sua presença e o melhor do seu apoio, e que me dissesse também se essa sua afirmação e coaduna com o facto de o Governo ter destacado um aos seus membros para acompanhar a reunião constante e atenta dos presidentes dos grupos parlamentares.
A última pergunta é referente a esta questão concreta: depois de tudo o que o Sr. Deputado disse, eu gostava de sabor se dado que o Partido Socialista declarou que não formaria o governo que o Sr. Deputado deseja que seja formado, está ou não o seu partido disposto a governar e a aplicar ao País esse programa coerente...
Risos do PS.
...que o Sr. Deputado considera necessário.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Sérvulo Correia deseja responder já ou aguarda os restantes pedidos de esclarecimento?
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Aguardo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage, também para pedidos de esclarecimento.
O Sr. Carlos Lage (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Sérvulo Correia acaba por nos proporcionar um catalogo de desgraças e de calamidades do nosso país com um cunho relativamente académico.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A questão que se põe é esta: qual a alternativa política que o PPD/PSD - dada a nossa posição de não formarmos um governo com outros partidas e dada a sua recusa em aceitar o PCP em qualquer plataforma - vai adoptar: considerará que com o CDS que conseguirá debelar esses males, ou está pura e simplesmente a fazer pregação social?
Outra questão. Sr. Presidente e Srs. Deputados. relaciona-se com as afirmações de que não tivemos uma política económica e financeira coerente e que essa política do 1.º pacote foi incompatível com o Plano. Nessa altura, o Sr. Deputado - que era então presidente em exercício, visível, do PPD - Sá Carneiro disse que não tinham uma alternativa nem tinham que a apresentar. Entretanto, não conhecemos qualquer documento do PPD/PSD, qualquer estudo ou qualquer projecto que nos apresente essa alternativa e esse modelo de política financeira. Aliás, na resposta que nos deram eles procuram compatibilizar uma maravilha e um conjunto de promessas entusiásticas, desde a solução do problema do desemprego ao expansionismo e desenvolvimento acelerado da produção, com um motor da iniciativa privada a impulsioná-lo privilegiadamente. Até à solução do problema de balança de pagamentos, apresentam-nos este conjunto, que é incompatível, como já se disse, de maravilhas a operar.
Como é que o PPD/PSD vai resolver esses problemas e qual o documento mais profundo ou a alternativa mais estruturada que apresentaram nesse sentido?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Leite, ainda para fazer pedidos de esclarecimento.
O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Sr. Deputado Sérvulo Correia: Tal como ontem aconteceu em relação à intervenção do seu colega de bancada. Deputado Sousa Franco, ouvi com atenção a sua intervenção e, particularmente aceito que numa e noutra se referia a política de ordem social.
Disse a certa altura o Sr. Deputado que era necessário tomar um conjunto de medidas que promovessem a salvaguarda mínima da dignidade humana. Naturalmente que estamos de acordo com isso. mas o que não basta - entendemos nós - é apenas afirmá-lo. Aliás, quando começou a dizer isso comecei a lembrar-me de todas as leis aprovadas aqui pelo PPD relativamente a direitos dos trabalhadores, e devo dizer o seguinte: o PSD não só aprovou essas íeis como exigia ainda mais. Só para recordar me referirei à lei dos despedimentos, à lei da greve - a lei da greve não aprovada por eles porque não continha a repressão suficiente que eles mesmos propunham -, a lei das comissões de trabalhadores, etc.
Mais ainda: esperei, com uma certa paciência, que da parte do Sr. Deputado Sousa Franco ou da parte do Sr. Deputado Sérvulo Correia se indicasse ou fizesse qualquer preferência à estratégia que a Constituição definiu para o combate, para a efectivação dos direitos de ordem económica, social e cultural. Ao contrário, vi definida toda uma estratégia capitalista relativamente a esse problema - estratégia que, como sabe, não tem resolvido este problema em
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parte nenhuma do mundo. Aliás, as previsões relativas, por exemplo, a desemprego, e devo recordar-lhe que dificilmente se poderá falar em salvaguarda da dignidade humana sem garantir o direito fundamental ao trabalho...
Aplausos do PCP.
...são de aumento de desemprego nesses países. E a minha pergunta é esta: se é sistemático silêncio sobre a estratégia definida na Constituição de ataque u esses problemas significa que o PSD esta contra esse conjunto de propostas da Constituição relativamente a. estes problemas, ou se, ao contrário, as defende. Nesse caso, gostaria que me dissesse porque é que, de facto, continua a manter um sistemático silêncio relativamente a essa estratégia.
E termino, lembrando apenas que aquilo que a Constituição aponta como garantia efectiva dos direitos económicos» sociais e culturais são a apropria cão colectiva dos principais meios de produção, a planificação económica, a democratização das instituições.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Jara, também para pedidos de esclarecimento
O Sr. José Jara (PCP): - O Sr. Deputado Sérvulo Correia fez várias afirmações que considero de sabor claramente eleitoralista, nomeadamente no que concerne á saúde e segurança social. Apenas para lembrar as circunstâncias em que são produzidas essas declarações, queria perguntar ao Sr. Deputado o que e que o PPD fez no domínio da saúde e da segurança social na sua longa permanência - embora provisória - no Ministério dos Assuntos Sociais?
Aplausos do PCP e do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Armando Bacelar para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Armando Bacelar): - Sr. Deputado Sérvulo Correia, uma das perguntas que ia precisamente fazer era a que acaba de ser feita, e por isso desisto de a fazer.
O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - Coincidência.
O Orador: - Fez o Sr. Deputado Sérvulo Correia uma intervenção quase de última hora, mas que é, efectivamente, uma intervenção de fundo. Intervenção essa que para ter resposta - passando todo o sector da politica social, passando todo o sector da segurança social e alguma coisa da saúde - erigiria um tempo de que nós não dispomos.
Mesmo assim, queria fazer-lhe umas rápidas perguntas. A primeira é como financiaria o partido Social-Democrático...
A Sr.ª Maria Emília de Meto (PS): - O PPD!
O Sr. Fernando Costa (PSD): - Que linda!
O Orador: - ...se fosse Governo, as vastas pretensões que apresento e que constituem um enunciado extremamente aliciante que todos nós podemos fazer - uma listagem que, aliás, sempre apontei nas intervenções que aqui tivemos, quer a proposto do Programa, quer na interpelação ao Governo, como mera demagogia nas condições actuais do nosso país. Gostaria, pois de saber como financiaria o PPD estas realizações que parecem mais pretender distribuir aquilo que muitas vezes não existe? Porque para distribuir é preciso ter.
Em segundo lugar, queria perguntar ao Sr. Deputado se, e quanto a unificação, não sabe que foi unificado o abono de família e prestações complementares entre a função pública e os pagamentos da Previdência? Se não sabe que no que respeita aos rurais, exis um regime geral - havia dois regimes especiais que foram unificados - e que, actualmente, está em fase adiantada a unificação do regime dos rurais, e que, publicamente, foi feita uma consulta as respectivas associações e organizações de interesses.
Queria perguntar se também não sabe que a pensão social está em pleno, pagamento e que está a ser paga a mais de cinquenta e cinco mil beneficiários - mais do que duplicando-se o número daqueles que a recebiam.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Queria perguntar também se não é do seu conhecimento que foi já aprovado o decreto que faz a reestruturação da segurança social em termos unificados, e que esse decreto prevê, precisamente, a unificação entre as estruturas da assistência e as estruturas da Previdência; e que o sector único está a funcionar nomeadamente com direcção única, sob a égide da Secretaria de Estado da Segurança Socai, e funciona de uma forma integrada através de uma duplicidade de estruturas.
Queria fazer estas perguntas ao Sr. Deputado, além das que já foram feiras.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Jorge Campinos também para pedidos de esclarecimento.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Gostaria de formular dois pedidos de esclarecimento muito rápidos ao Sr. Deputado Sérvulo Correia.
O carácter eleitoral da sua intervenção não escapou a nenhum dos presentes, e já lhe foi perguntado como é que financiaria este programa. Eu, mais precisamente, pergunto se as competências do PSD já avaliaram o custo exacto de todas essas medidas? Em caso afirmativo, que o digam nesta Assembleia para nós podermos fazer os nossos próprios cálculos.
Em segundo lugar, disse o Sr. Deputado Sérvulo Correia que este gabinete não tem mostrado homogeneidade e coesão e que existe até incompatibilidade entre os seus membros. Pergunto se isso é verdade, se não considera ser da nossa parte - Partido Socialista e Governo - uma medida de prudência não acrescentar a essa falta de homogeneidade e de coesão a falta de homogeneidade e de
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que é manifesta no seio de certos partidos políticos.
Risos do PSD e do CDS.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Sérvulo Correia.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Devo, em primeiro lugar, observar que o meu partido tem apenas 33 minutos para o resto das suas intervenções. Tem muitas coisas importantes a dizer, e portanto, não posso responder pergunta a pergunta aquelas que me foram formuladas, a menos que o Partido Socialista ou o Governo me queiram dar algum do vosso próprio tempo. Então terei muito prazer em responder uma a uma a todas as perguntas.
Vozes do PS: - Não, não damos!
O Orador:- Então, se não dão, tenho de compreender que tenho de ser bastante ligeiro, mas se querem que o não seja façam favor de me dar tempo a responder. É um dilema, para nós Srs. Deputados e para os Srs. Membros do Governo e não para mim.
Respondendo, primeiramente, ao Sr. Ministro Jorge Campinos, direi que não disse que havia incompatibilidades no actual Governo - não me debrucei sobre esse aspecto. O que disse é que um futuro Governo entre outros requisitos que referi, sinceramente deveria ter também o da compatibilidade pessoal das pessoas que o formassem. Devo também lembrar ao Sr. Ministro Jorge Campinos que nós nunca temos interferido nos problemas internos do Partido Socialista, que, como sabe, tem tido vários e, a meu ver, bastante diferentes dos nossos em matéria de gravidade.
Quanto ao caracter eleitoral das minhas afirmações - vincado por várias bancadas-, referirei apenas que são as mesmas afirmações que fiz aqui no debate do Programa do Governo, em Agosto de 1976; no debate do Orçamento e Plano, em Dezembro de 1976: no debate sobre o pacote de medidas económicas, em Março de 1977. Portanto, são posições nossas constantes, e não apenas posições tomadas na eventual eminência de eleições, que pelos vistos, os Srs. Ministros e os Srs. Deputados conhecem melhor do que eu.
O Sr. Magalhães Mota(PSD): - E temem!
O Orador: - Sr. Deputado, José Luís Nunes, quanto á revisão da Constituição, se não envio a minha troca de impressões com o Sr. Deputado Salgado Zenha, pergunte-lhe a ele e que eu disse nessa altura. Quanto ao Secretário de Estado da Saúde, nós somos de entendimento que no futuro governo deverão existir Secretário de Estado da Saúde e Secretário de Estado da Segurança Social.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa. Sr. Deputado?
O Orador: - Não Sr. Deputado.
Quanto ao Governo e a Assembleia da República a, nós dissemos que houve uma política errada do Governo quando os trabalhados da Assembleia da República recomeçaram em Setembro do ano passado, e explicámos porque.
Quanto a nossa posição sobre a formação do Governo, esse é um ponto que já foi aqui focado e que o Sr. Deputado Sousa Franco referira novamente.
Quanto a uma lista de calamidades, eu não disse «uma lista de calamidades», disse sim uma lista de inexistências na política do Governo. Se são calamidades, a classificação e do Sr. Deputado do Partido Socialista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado Sá Carneiro, quando da discussão do pacote, disse que nós tínhamos alternativa - consultem a propósito o Diário da Assembleia da República.
O Sr. Deputado Jorge Leite, estamos inteiramente de acordo com o princípio que o senhor enunciou sobre a necessidade de defender a salvaguarda da dignidade humana. Toda a minha intervenção de hoje pode o Sr. Deputado referi-la aos capítulos 111 e IV da Constituição, sobre «Direitos e deveres sociais, direitos e deveres culturais». Somos...
O Sr. Jorge Leite (PCP): - Só faltou referir as condições de garantia...
O Orador: - ... somos nós que na nossa proposta dirigida ao Governo e ao Partido Socialista em resposta ao memorando do Sr. Primeiro-Ministro salientamos como primeira prioridade o emprego, que defendemos a elaboração de um plano de emprego apontando para o horizonte de 1980, e fazemo-lo com números, com objectivos quantificados.
O Sr. Ministro Armando Bacelar ouviu-me mal, certamente porque o Sr. Ministro não reparou que 90% das medidas inexistentes que referi poderiam ser tomadas sem encargos ou com pequenos encargos. Não quero acreditar que o Sr. Ministro não percebesse isso se tivesse ouvido com atenção o que eu afirmei. É evidente que algumas delas corresponderão a encargos, mas dissemos que até estávamos, dispostos a aceitar, dentro de certos limites, um alargamento do défice orçamental desde que houvesse uma quantificação rigorosa com base em elementos de contabilidade nacional.
Nós sabemos, por exemplo, que o pagamento da pensão social aos 80 000 inscritos -e não aos 50 000 que o Sr. Ministro referiu - envolverá cerca de 910 000 contos. Sabemos que a igualização que defendemos na pensão dos rurais, entre homens e mulheres, envolverá cerca de 975 000 contos mensais, o que significa l 885 000 contos anuais a mais. Sabemos que um aumento real de 20% nas pensões dos rurais a partir dessa igualização significará 1 170000 contos por ano. Entendemos que, e isso é o que o Sr. Ministro e o s«eu Governo parecem não ter entendido, não há efectivamente critérios de base para o financiamento conjugado.
E não refiro quaisquer aspectos de compatibilidade pessoal entre o Sr. Ministro e o Sr. Ministro
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das Finanças, que parece ainda não terem entendido que, tal como acontece em toda a Europa Ocidental, a segurança social não pode assentar exclusivamente no seu financiamento, e hoje, até em muitos casos, nem só em relação às receitas contributivas tem que receber uma contribuição significativa do Orçamento Gerai do Estado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Jorge Campinos.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: É para formular um muito breve protesto e, contrariamente ao que se pode pensar, não é para insistir ou para protestar por não ter vido dada nenhuma resposta quanto ao custo do financiamento. Como o Sr. Deputado Sérvulo Correra afirmou que não tinha dito que a este gabinete governamental faltava coesão, eu quero dizer-lhe que talvez ouvi mal, peco-lhe desculpa, mas o Sr. Deputado fez aquela firmação a pág. 12 do seu discurso, que já foi distribuído, onde na coluna da direita, 2.ª parágrafo, nas duas últimas linhas, se diz: «[...] só demonstra que este Gabinete não tem a homogeneidade e a coesão que reivindica perante a sua natureza mono-partidária.»
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Peço a palavra. Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - É para dar uma breve explicação à Câmara.
O Sr. Ministro Jorge Campinos afirmou que eu rinha dito na minha intervenção que havia incompatibilidade entre os membros do Governo e eu respondi que não tinha afirmado que havia incompatibilidade entre os membros do actual Governo. mas que quando referi as condições para um futuro Governo, entre outras, tinha salientado a necessidade da compatibilidade pessoal dos membros desse Governo.
Risos do PSD e CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sempre esperei que um dia subiria a esta tribuna para defender o Governo contra uma moção de censura. Como nenhum partido da oposição tomou essa iniciativa - aliás, legítima e perfeitamente ao seu alcance -, coube ao Governo a decisão de apresentar a questão da confiança. É sobre ela que incidirei na minha intervenção.
Quando em Julho de 1976 tomou posse o I Governo Constitucional, embora levantando algumas reservas, nenhuma força política utilizou os moios adequados para impedir de forma clara a formação de um Governo de minoria, nem reprovou o seu programa ou pôs objecções de fundo à equipa que o Primeiro-Ministro escolheu. O País estava cansado de Governos provisórios e as sucessivas
vitórias eleitorais do PS -que seriam depois continuadas nas eleições para as autarquias- não propiciavam contestação viável a uma solução governativa que, embora minoritária, fosse definitiva no quadro da legislatura que então tinha inicio. As circunstâncias difíceis em que esse Governo assumia funções não davam ensejo a muita cobiça pelo lugar. O País havia dois anos era uma ditadura. Tinha acabado de sofrer uma revolução que se radicalizara, tinha concedido a independência aos seus territórios ultramarinos e recebido milhares de compatriotas e sofria os efeitos de uma crise económica geral. A necessidade de criação de um clima de tranquilidade política e de paz social e regional, que permitisse o indispensável relançamento económico, era a razão fundamental que deve ter levado os partidos da oposição, pela abstenção, a darem o seu consentimento à solução então adoptada, não fazendo referências especiais a outro tipo de alternativa. Nessa altura, o PCP tinha deixado de falar em «maioria de esquerda» e o CDS e o PSD ainda não reclamavam «a convergência democrática». Dava-se por assente que o Governo teria a legislatura para mostrar o que valia e que em novas eleições o povo português julgaria de novo. O facto de o PS estar no Poder há alguns meses e ter vencido as eleições locais levou até um dirigente da oposição a concluir que essa era a indicação clara de que os Portugueses não queriam ver concretizado outro género de escolha diferente do que estava a ser seguido.
A acção do Governo, de que se reconhece aspectos positivos nas entrelinhas das declarações dos lideres da oposição, tem sido denegrida por ataques de tipo demagógico, onde se não apresentam alternativas de solução concreta para o País no estado em que se encontra, mas se faz por sistema um catálogo de soluções óptimas de impossível realização. Ao Governo são atribuídas as culpas de tudo, tendo-se até criado em algumas pessoas um estado de espírito tal que se um menino se constipa, cai ou apenas espirra, quem tem culpa é o Governo, quem tem culpa é o Dr. Mário Soares.
Risos.
O Governo, que conseguiu um efectivo clima de paz social, desenvolveu as relações democráticas, na sociedade portuguesa, criou as condições para o investimento, sem pôr em causa o núcleo essencial dos direitos dos trabalhadores, é julgado como se fosse o responsável por reivindicações que não promove, por instrumentalizações a que não procede, por radicalizações que não estimula, por manifestações que não convoca, por ódio, violência e extremismo que não fomenta e por pressões a que não recorre.
O Sr. António Esteres (PS): - Apoiado!
O Orador: - A realidade é porém, bem diferente desse tipo de criticas e as intervenções dos membros do Governo neste debate têm mostrado, e mostrarão, que assim é.
Ignora-se que a produção industrial cresceu a um ritmo superior ao previsto no Plano com índices
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recorde na industria ligeira. Omite-se a recuperação do sector da construção civil, do aumento de dormidas de estrangeiros do turismo do incremento espectacular das remessas dos emigrantes. Nada se diz sobre o controlo alcançado sobre a inflação a qual no fim do ano nem de longe atingirá os níveis que a oposição previra e que foi consequência , aliás de medidas aprovadas com o acordo de alguns dos partidos que a compõem. Escamoteia-se o notável aumento do investimento privado, a manutenção do nível de emprego já com aumentos de postos de trabalho em certos sectores- e a redução apreciável do défice corrente das finanças públicas. Regra geral, não se faz um diagnóstico diferente do do governo sobre as tendências da nossa economia, mas também não se propõem alternativas realistas. O caso mas flagrante é o que consiste em criticar o Governo simultaneamente por não reduzir o défice externo e por não promover uma política expansionista, como se estes dois objectivos fossem linearmente compatíveis um com o outro.
Todos os partidos, regra geral combatem a incompetência do Governo, mas todos eles se querem com ele associar. Para prosseguir na política errada do PS, ou para fazer o PS executar e política que propõem, mas que não tem condições para realizar sozinhos.
A oposição não ignora que o Governo e o PS têm uma solução para os problemas. É a crescente radicalização de certos partidos contra o Governo permite concluir que o seu principal objectivo é derrubar o Governo antes que se possam fazer sentir os efeitos positivos da sua política.
Aplausos do PS.
O activismo de cenas personalidades e directamente proporcionai a proximidade de obtenção do grande empréstimo. A oposição, por um lado, não toma a iniciativa de derrubar o Governo e, por outro, move-lhe uma guerrilha de opinião pública que lhe dificulta a actividade normal. A acrescer a isto há o facto de que a oposição não apresenta uma alternativa clara de Poder. Ainda, ontem, o Deputado Freitas do Amaral, que foi tão claro, em certas críticas que fez ao Governo, foi bastante menos nítido quando se referiu ao futuro. Ficamos mesmo sem saber se a solução que defende se situa no âmbito do actual parlamento ou mediante o recurso a eleições gerais antecipadas e se nesta última hipótese o CDS assume a responsabilidade dos prejuízos que daí resultarão para o País, nomeadamente dos meses pedidos, caso se venha a verificar que o novo acto eleitoral não alterará em termos significativos a composição parlamentar. É em nome da exigência de eleições gerais antecipadas que o CDS, não vai dar a confiança ao Governo? Se o é, o País precisa de ser esclarecido. Ou não se manterá de pé a razão alegada pelo CDS, para não recusar a investidura do Governo e, segundo a qual haveria de recusar antes o País numa crise política antes de ser enfrentada a crise económica?
Ao exigir uma clarificação políticas, o Governo coloca os partidos da oposição face ás suas responsabilidades. Quem enfrenta crises e tem solução para elas dá um contributo positivo para a vida democrática. Quem fomenta crises e não apresenta soluções dificilmente explicara ao povo português a sua atitude.
O Sr. Gualter Basílio (PS): - Muito bem!
O Orador: - A oposição quer derrubar o Governo - nada mais legítimo desde que tenha um Governo melhor para ser investido. E o caso? Parece que não! Que motivos levam, então a oposição a este comportamento? A instabilidade pela instabilidade? A crise pela crise? O interesse partidário? O puro parlamentarismo? A arrancada para um período eleitoral? Para a esmagadora maioria dos Portugueses o menos que se pode dizer e que consideram estranho querer derrubar um governo sem ter outro para lá colocar. Ou pior ainda, como ressaltou ontem da intervenção do Deputado Sousa Franco: querer derrubar um governo e não aceitar o encargo de formar um novo governo: ou criticar a oportunidade da questão da confiança, depois de ter levado meses a falar na moção de censura.
O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!
O Orador: - Para o PSD, as moções de censura são sempre oportunas porque apresentadas pela oposição, mas a questão da confiança e inoportuna porque posta pelo Governo. Admite-se como legítimo que a oposição ameace com moções de censura e que prolongue a crise sem as efectivar, mas não se reconhece ao Governo o direito de clarificar a crise, apresentando uma moção de confiança.
A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS): - Muito bem!
O Orador: - É que uma moção de confiança não se refere predominantemente ao passado, à acção exercida pelo Governo, refere-se ao futuro. E ao votar contra a confiança, a coligação derrubante e negativa, assume perante o País o encargo de sanar a coligação governante e positiva. As forças da oposição têm participado no debate sobre a questão de confiança como se estivessem a discutir uma moção de censura: criticam o Governo mas nada dizem sobre a alternativa que têm. O PSD chega ao absurdo de considerar que o Governo PS deve cair que logo em seguida deve ser o PS a formar um governo novo, recusando o PSD nesse caso, como maior partido da oposição, o encargo de tal iniciativa. Em que ficamos? Talvez assim se compreenda a razão pela qual o PSD fala da inoportunidade da questão de confiança.
Certas sectores tem aditado o argumento de que se constituiria uma maioria de esquerda caso o Governo PS não fosse derrubado, chegando mesmo alguns insensatos a dizer que já regressámos a 12 de Março e a 24 de Novembro. Em França existe uma aliança e um programa comum entre o PS e o PC. Se ambos os partidos ganharem as eleições, haverá um governo conjunto de socialistas e comunistas. É a isso que se chama maioria de esquerda. Em Portugal, a situação e completamente diferente. O PS optou por uma política de não alianças que
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funciona para os dois lados: não haverá nem maioria de direita nem maioria de esquerda. E, É curioso que apôs a constante, reafirmação desta política haja quem pretenda ainda insinuar dúvidas. Se houve neste país coligação de facto a dois entre um partido e o PCP não terá sido quando o PPD e o PCP faziam ambos parte do MDP/CDE, pois já terem abandonado esse movimento de outros democratas?
Risos do PS.
E guando o PSD ficou por alguns dias sozinho com o PCP no IV Governo Provisório, depois da saída do PS? O que não se diria hoje do PS e essas situações se tivessem verificado connosco.
O PS não negoceia com nenhum partido o voto neste debate. Não faz cedências a quem quer que seja, nem pede votos a ninguém. E em relação aos votos do PCP - cujo sentido, de resto, não é claro neste momento -, têm a mesma posição que o CDS e o PSD em relação a eles assumem no caso de uma moção de censura ou da própria questão de confiança. Já se ouviu algum dirigente do CDS ou do PSD afirmar que recusa os votos do PCP para aprovar uma moção de censura? Admitindo essa hipótese, não chegou o Eng. Amaro da Costa a afirmar que estavam criadas as condições para uma moção de censura? E se o CDS e o PSD recusassem os votos do PCP contra a questão de confiança? Por que o não fazem? O PSD pode votar com o PCP a Lei das Autarquias, o Deputado Sousa Franco pode garantir que o seu grupo parlamentar tem relações normais com o PCP e que as vai mesmo melhorar a partir de 1980.
Risos do PS.
O Deputado Sérvulo Correia pode aspirar a uma eurocomunicação do PCP.
Risos.
Só o PS é que quando assume posições do mais elementar realismo, que em nada comprometem a sua política de recusa da maioria de esquerda e de não alianças, é logo alvo aos mais descabelados ataques e lhe vêm de dedo em riste apontar faltas e pecados que não comete. Que diria de nós o PSD se fizéssemos o elogio da Intersindical que ainda há bem pouco tempo fez o seu presidente?
Estejam tranquilos. Assim como não aceitou diluir-se na convergência democrática - forma de ilusionismo político para fazer passar a minoritário o maior partido português e o PCP o único partido da oposição -, o PS não vai aprovar por uma política que não é a sua - a de maioria de esquerda - e que pensa não corresponder ao interesse do regime democrático. Torna-se e é estranho que certas personalidades políticas estejam hoje mais interessadas com o PS ou o PCP em unir e aliar estes dois partidos. Que esforço este é para quê?
Algo é estranho quando O Povo Livre fala mais em maioria de esquerda que o Avantel.
Risos.
Adivinha-se claramente o interesse eleitoral em colar artificialmente nos dois partidos, para dai relançar velhos slogans que no passado não produziram efeito e que agora e no futuro produzirão ainda menos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se o PS pelo seu pé não se aliou nem se alia ao PCP não vai certamente fazê-lo pela mão «amiga» do PSD ou do CDS. A questão da confiança foi colocada sobre dois temas precisos: o Governo e o principio das negociações com o Fundo Monetário Internacional. A forma em que tem decorrido a discussão poderá por vezes fazer pensar o contrário. Mas o PS - no Governo ou fora dele, seja qual for o resultado da votação - continua a insistir na plataforma. Plataforma a que aliás aludiram alguns sectores já oposição enquanto o Governo a não propunha, mas que se apressaram a rejeitá-la mal o Governo a adiantou.
Diz o CDS que a questão fundamentai para o Governo não era a da plataforma, mas a do Poder, quando afinal é o CDS que coloca no centro do debate a questão da formação de um II Governo Constitucional. Alega o PSD no mesmo sentido, e esquece que foi exactamente o Deputado Sousa Franco quem pós como questão prioritária a existência de um governo com caras do seu partido, não sei mesmo se com ou se sem plataforma. Isto e, para a oposição, para o CDS e o PSD, a entrada de elementos dos seus partidos no Governo PS* ou a concretização de uma coligação a três e hoje prioritária sobre a realização de qualquer acordo, embora no passado tivessem pontos de vista ligeiramente diferences. Quanto a este ponto, quem mudou? O PS, que sempre disse a mesma coisa, isto é que não faria coligações? Ou o CDS e o PSD, que antes as não preconizavam e que hoje fazem dela? o tema central? O PS mantém-se fiel a si próprio, e a oposição? Disse ontem o Deputado Sousa Franco e eu discordo que a situação hoje é pior do que quando o Governo tomou posse. Se assim é, por que não aceita então o PSD a efectivação de uma plataforma em que começou a falar a partir de certa altura? E se assim é na realidade que motivos terão levado o PSD ao endurecimento de posições em que se encontra?
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - A incompetência do Governo!
O Orador: - Considero que em boa parte as dificuldades encontradas na hora actual se devem à inibição directiva a que conduziu a crise interna no segundo maior partido português.
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Olhe que não!
O Orador: - E o argumento usado pelo CDS de que é o PS que pretende reduzir a plataforma ao mínimo indispensável não é exacto, quando são forças da oposição, e não os socialistas, a pretenderem
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efectuar exclusões reciprocas entre os signatários do acordo.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!
O Orador: - Seja governo ou seja oposição, o PS lutara pela concretização da plataforma: uma vez assinada, respeitá-la-á em ambos os casos. O resultado da votação da confiança em nada alterará o nosso objectivo de a alargar ao máximo, visto que não consideramos que neste voto esteja em causa a plataforma, mas dois pontos precisos e a manutenção da nossa política de não alianças é garante de que no futuro saberemos conservar em pleno a nossa autonomia negocial a qual de forma alguma ficara bloqueada por esta discussão.
O PS encara serenamente a execução da Reforma Agrária, a política sindical e o movimento Carta Aberta, o dialogo com os parceiros sociais e o investimento privado - para referir as questões colocadas ontem pelo CDS - exactamente porque o PS entende não alterar a sua política de alianças nem constituir nenhuma coligação com outro partido. E tem sido precisamente por pensar em questões dessa natureza que o PS tem definido como tem a sua orientação. Ao colocá-las, o Deputado Freitas do Amaral demonstrou por absurdo a justeza da linha política que tem sido seguida pelo meu partido. Por outro lado, o CDS não apresenta de facto no presente quadro parlamentar outra alternativa de governo e refugia-se na possibilidade de eleições gerais antecipadas sem assumir com toda a clareza o risco dessa opção. O CDS assegura empréstimos externos que impeçam uma ruptura cambial ate à formação de um novo governo eleito? O CDS responsabiliza-se pela paragem ao ritmo da actividade económica que tal decisão comporta? O CDS assume o risco que para o regime democrático representa mais esta eleição, em tão curto espaço de tempo, bem como a probabilidade de se não alterar o sistema das forças parlamentares, com o inerente sentimento de absurdo dai resultante em virtude dos meses gastos para nada? Ou o CDS, por motivos de mera ascensão eleitoral, não para salvar o país, mas para salvar o partido,...
Protestos do CDS.
O Orador: - ...pensa que numa nova campanha pode vir a ter mais votos que o PSD e ambos os partidos mais de 51 % e formarem uma coligação? Esta é a questão essencial, e só assim se explica que em matéria de eleições antecipadas o CDS tenha hoje a posição exacta que criticava ontem ao PCP.
do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PS quer salvar o País. O CDS não duvido de que o pretenda também, mas a presente estratégia do CDS está certamente mais voltada para a salvação do partido do que para a salvação do País.
Aplausos do PS.
Protestos do CDS.
O Orador: - Aliás, quando ontem ouvimos o presidente do CDS expor as cinco razões que o levaram a não votar a favor do Governo, ficámos ião impressionados com a natureza da argumentação que supusemos que os motivos alegados fossem suficientes para impedir um voto contrario. As preocupações indicadas pelo CDS - não lançar o País num beco sem saída, impedir a formação de uma maioria de esquerda, evitar a ruptura financeira, não impedir a recuperação económica e não interromper a acção governativa deveriam apontar pelo menos no sentido da abstenção.
Risos do CDS.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Era o que querias!
O Orador: - A não ser essa a atitude do CDS é porque esse partido se situa já no campo da reclamação de eleições gerais antecipadas e nesse caso é porque o voto contra o Governo tem o sentido da reafirmação da sua disputa eleitoral não connosco mas com o PSD.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O CDS não estará então a pôr em causa o Governo, mas a tentar progredir na base de apoio de outro partido. O problema não nos atinge.
Risos do CDS.
O Sr. João Pulido (CDS): - AtÉ parece...
O Orador: - O Governo não receia ser confrontado com outros modelos. E é curioso notar que os partidos da oposição, que tanto- falam em competências mesmo no período mais fecundo da convergência PSD-CDS não tenham constituído um governo sombra.
O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Não se nota.
O Orador: - Assim como se regista o facto de que o PSD não critica o Governo, apontando exemplos escolhidos na gestão que tem feito nos Governos das regiões autónomas.
Sem alternativas reais no quadro desta Assembleia alguns desejariam que o Governo retirasse a moção de confiança, mas ela será mantida. O PS tem uma saída para a questão política, para o Governo e para os problemas económicos.
A democracia e Portugal não estão num impasse. A questão da confiança colocada pelo Governo, seja qual for o resultado da votação; clarificará a vida política. Aos que votarem pelo derrube do Governo e não apresentarem outra solução, demitindo-se das suas responsabilidades, cumprira explicar as razões da sua atitude. Este voto é um voto sobre o futuro, não é uma discussão centrada no passado. O Governo e o PS, que vieram a este debate apresentando claramente uma solução para o futuro, consideram que os problemas portugueses têm solução, e tem solução democrática. É na via do diálogo e não da ruptura, é pelo consenso e não pela discórdia, é com serenidade e não com emoção,
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e com trabalho e não com ócio, é com segurança e não com anarquia, que o presente e o futuro de Portugal têm de ser enfrentados.
Vozes do PS: - Mutuo bem!
O Orador: - Que futuro tem para este país os que ao íntimo já nele deixaram de acreditar? O PS aceita o desafio ...
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!
O Orador: - ... não enjeita responsabilidades, não se demite, nem cede a pressões. O PS trouxe aqui uma proposta realista para o futuro. Uma proposta clara para resolver os problemas. Que nos digam os nossos adversários e que digam ao povo português que alternativa é que têm e na realidade como é que pretendem o futuro de Portugal. Pela nossa parte não faremos. Sr. Presidente e Srs. Deputados, para que esta democracia, em que acreditamos, seja cada vez mais estável, mais límpida e mais justa.
Aplausos do PS.
O Sr. Moura Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Moura Guedes (PSD): - É para um protesto, aliás triplo posto que sucinto Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Moura Guedes (PSD): - Em primeiro lugar, quero protestar contra o tacto de nesta intervenção, como em varias outras procedentes de várias bancadas, inclusive da bancada ao Governo, se ter estado a proceder como se fôssemos nós que tivéssemos apresentado uma moção de confiança, isto é considerando-nos desde já como Governo, o que constitui uma antecipação precipitada contra a qual não podemos deixar de protestar.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
Vozes do PS: - Ah! Ah!
O Orador: - Em segundo lugar, protesto contra uma afirmação muito concreta feita pelo Sr. Deputado Jaime Gama, que acabou de intervir, em determinado passo da sua intervenção, que foi a de que o PS teria ganho as eleições para as autarquias locais. Ora isto não é ilusionismo político, isto e falsidade política,...
A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS): - Não aparado!
O Orador: - ... porque todos sabemos, e o novo português sabe-o claramente, que o PS alcançou era presidências de câmaras municipais exactamente o mesmo numero que o PSD. Tem menos maiorias absolutas nas câmaras municipais do Pais que o PSD foi largamente batido pelo PSD nas eleições para os órgãos de freguesia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
Estes factos são indesmentíveis, e para os confirmar bastará os Srs. Deputados consultarem os números oficiais.
Finalmente, queria protestar contra o facto de o Sr. Deputado Jaime Gama ler falado em contradições do meu partido que, aliás, não consegue concretizar, porque elas nunca existiram.
Risos do PS.
Já o mesmo se não poderá dizer das contradições do Partido Socialista e eu poderia fazer uma longa lista, mas limitar-me-ei a assinalar aqui a mais recente, que é o facto de o seu secretário-geral ter afirmado recentemente que o PS não governaria em maioria de esquerda e de, poucos dias após, ter declarado que nada obstaria a que o Governo se pudesse manter apenas com o voto do PCP, porque os votos têm todos o mesmo valor.
Risos do PS.
Ora, poderá dizer-se que. são duas afirmações diferentes, mas que no mundo representam a mesma realidade, uma vez que todos sabemos o que isto significaria de exigência de compromissos estáveis e profundos entre ambos os partidos a nível político, económico e social, porque o povo português não duvida desta vez da afirmação do Dr. Álvaro Cunhal de que o PCP não daria nunca um aval em branco ao Governo e que o seu apoio tem um preço - um preço elevado para o país e para a democracia.
Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, desejo fazer um contraprotesto.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Em relação ao protesto formulado pelo Sr. Deputado do PSD, desejaria chamar a atenção para três factos.
Em primeiro lugar, o PSD tem caracterizado a sua actuação neste debate, como em geral nos debates, da vida política, por esta posição: ao PSD é legitimo criticar o Governo e o PS; ao PSD é legítimo, através de órgãos representativos seus, insultar os dirigentes do PS e o PS; aos militantes do PSD, incluindo o caricaturista do seu jornal oficial, é legítimo lançar sobre o PS e o Governo as asserções mais indignas e soezes. Mas sempre que o PS, no uso legítimo de um direito de defesa, se atreve - no uso mais elementar de uma linguagem política clara, não polémica nem agressiva a defender os seus pontos de vista e a criticar os pontos de vista do PSD, então o PSD sente-se muito ofendido e acha que não esta aqui para ser julgado.
É evidente que a questão do voto de confiança foi postai pelo Governo, mas o meu partido tem o direito, a propósito da posição do PSD sobre este assunto, de pôr todas as questões que em democracia e legítimo que um partido democrático ponha sobre as razões do vosso voto, as razões da vossa conduta política e o significado da vossa intervenção neste debate.
Aplausos do PS.
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Em segundo lugar, e para não adiantar muito sobre o aparente triunfalismo do Sr. Deputado em matéria de eleições para as autarquias locais, devo dizer-lhe que fiquei satisfeito por saber que nessas eleições quem tinha tido trinta e tal por cento dos votos foi o seu partido e não o meu.
Risos do PS:
Passo a registar isso para o futuro, com bastante agrado, e talvez tenhamos de tirar daí outras ilações políticas.
Quanto à última questão: disse o Sr. Deputado que o seu partido era um partido puro, que não praticava nenhuma espécie de contradição, e que o meu partido é que costumava praticar esse tipo de conduta. Ora, para lhe dar só alguns exemplos, que pretendi omitir na minha intervenção e que apenas agora cito, porque o Sr. Deputado referiu esse problema, e em resposta a questão por si posta, uma vez que não pretendia cita-lo, permito-me lembrar-lhe que o seu partido é conhecido neste pais por ter preconizado a candidatura de cinco Presidentes da República.
Risos.
É conhecido neste país por ter sido o primeiro partiddo a apoiar o actual Presidente da República e o primeiro partido apoiante a retirar-lhe o seu apoio.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É conhecido por ser um partido que, simultaneamente, defende alianças com o PS, faz alianças com o CDS, defende a criação de um grande partido social-democrata e ao mesmo tempo preconiza a criação de uma internacional democrática para combaterem a Internacional Socialista, que, como sabe, é a Internacional de que fazem paute os autênticos partidos sociais-democratas.
Aplausos do PS.
A finalizar a questão das contradições, devo lembrar-lhe. Sr. Deputado, que em Portugal e infelizmente - infelizmente para os Portugueses e para a democracia neste país - o seu partido é o único partido que tem o hábito de mudar de nome.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em meu parecer, nem o Sr. Deputado Moura Guedes nem o Sr. Deputado Jaime Gama, fizeram protestos ou contraprotestos. Tem-se segundo o critério - e não ou viu que o vou agora alterar de que a palavra será dada para protestos sempre que qualquer Deputado a peca para este efeito. não competindo á Mesa, parece, enquanto o Regimento for definido, avaliar a intenção do Deputado que pede a palavra. Assim farei, portanto, e quando a palavra for pedida para protestos será concedida, não interromperei o orador, mas descontarei o tempo que exceder 3 minutos. Parece-me, assim, mais eficaz para evitarmos discussões a este respeito. O Sr. Deputado Moura Guedes excedeu em 20 segundos os 3 minutos. O Sr. Deputado Jaime Gama excedeu em 3 minutos o .tempo dos protestos e esse tempo fui anotado.
Vozes do PSD: - Muito bom!
O Sr. Presidente: - Não poderei, certamente, dar agora a palavra nem ao Sr. Deputado Moura Guedes não ao Sr. Deputado Jaime Gama para outros protestos e outros contraprotestos. Essa forma regimental, em meu entender, está esgotada neste momento. Poderão, todavia, usar da palavra para dar explicações ou para qualquer outro efeito.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faca favor, Sr. Deputado.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - O Sr. Deputado Moura Guedes também desejaria usar da palavra, mas aceita a disciplina partidária, que neste caso justifica que o não faça porque carecemos de tempo.
No entanto eu desejo dar explicações em nome do meu partido, isto é, em nome de todos os Deputados do meu partido aqui presentes, na medida em que pelo Sr. Deputado Jaime Gama foram feitas referências que são insultuosas para o partido e, portanto, para cada um dos nossos militantes.
Em primeiro Lugar, Sr. Deputado Jaime Gama, não tem qualquer correspondência com a realidade a afirmação de que este partido alguma vez tenha defendido a candidatura para a Presidência da República de qualquer outra pessoa que irão fosse o Sr. General Ramalho Eanes.
Risos do PS.
O Sr. Deputado não pode confundir um acto formal e de apoio a uma candidatura - e nessa altura, se bem me recordo, ficaram até bastante incomodados no seu partido com ele - com toda a prévia troca de impressões e análise das possibilidades em alternativa que qualquer partido responsável, e certamente o seu também, fez.
Não é exacto, e este ponto é grave e tem sido objecto de repetidas afirmações do Partido Socialista, e repito que não é exacto, falando em nome do meu partido e do meu grupo parlamentar, que alguma vez o Partido Social-Democrata tenha retirado a sua confiança ao Sr. Presidente da República.
Vozes do PS: - Ah! Ah!
O Orador - A posição do meu partido e que foi declarada por pessoas 'responsáveis é a de manter a sua confiança ao Sr. Presidente da República, o que não significa que não possamos criticar alguns aspectos da sua conduta política com os quais não concordemos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador. - Em terceiro lugar, nós defendemos sempre uma maioria democrática estável com base numa convergência dos panados democráticos - PS, PSD e CDS - e nada unais do que isso.
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Em quarto lugar, nunca dependemos a criação de qualquer organizarão para lutar contra a Internacional Socialista, na qual não estamos filiados porque, com base em puros interesses partidários o PS a isso se tem obstado.
Finalmente, o Sr. Deputado Jaime Gama sabe certamente que este partido logo nos primeiros documentos da sua constituição referiu a sua linha social-democrática e que não pôde constituir-se como partido social-democrata porque um pequeno grupo, nessa altura formalmente constituído, impedia legalmente que adoptássemos desde logo a designação que era a nossa e que, aliás era desde logo, oficialmente a da nossa juventude.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas lembro aqui que o PS deriva de uma organização chamada União Socialista. Não vejo nisso qualquer mal, apenas sublinho o paralelismo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Jaime Gama (PS): - Para dar explicações à Câmara.
O Sr. Presidente: - Peço desculpa aos colegas que catão inscritos, Deputados Rui Pena e José Vitorino, mas terão de aguardar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu não usaria novamente a palavra se não fosse o teor das declarações proferidas peio Sr. Deputado Sérvulo Correia - e até se não fosse pelo facto de essas declarações serem significativamente importantes paira esclarecer as posições do seu partido e para esclarecer o País acerca da verdadeira natureza da linha política do Partido Social-Democrata - , porque efectivamente eu cometi na minha intervenção o equívoco de considerar as posições assumidas por um dirigente político, o Dr. Sá Carneiro, como sendo as posições do Partido Social-Democrata.
Vozes do PS: - Boa!
O Orador: - E como foi essa individualidade política quem publicamente assumiu todas as posições que eu enumerei - e peço que me desmintam neste aspecto, visto que elas são públicas, conhecidas e notórias - , permito-me concluir daqui que das duas uma: ou que o Dr. Sá Carneiro quando as proferiu o fez na qualidade de presidente do Partido Social-Democrata e representava nessa emergência a opinião política do partido ou então concluo, e a conclusão mais verosímil depões nas declarações do Sr. Deputado Sérvulo Correia, que entre essas declarações do Dr. Sá Carneiro, as posições que ele publicamente assumiu e não desmentiu, e o Partido Social-Democrata nesta Câmara não há nada em comum.
Aplausos do PS.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Sérvulo Correia certamente pede a palavra para dar explicações. Penha a bondade.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Dando explicações eu lamento profundamente que o Sr. Deputado Jaime Gama venha para este hemiciclo deturpar declarações do Dr. Sá Carneiro, personalidade política em relação á qual nestes momentos de maior crise o seu partido fica sempre extremamente perturbado.
O Dr. Sá Carneiro nunca declarou que o Partido Social-Democrata tinha retirado o apoio ao Sr. Presidente da República: sempre defendeu uma maioria democrática estável com base numa convergência democrática que os senhores não podem deturpar porque sabem que na nossa terminologia ela sempre significou uma formação política abrangendo os nossos três partidos; o Dr. Sá Carneiro nunca proeurou criar qualquer organização para opor à Internacional Socialista, e quanto à mudança de nome ela não tem nada a ver com o Dr. Sá Carneiro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, peco a palavra.
O Sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Jaime Gama, mas, entretanto, prezados colegas, permitam-me apenas que, sem pretender interferir no debate, porque não o posso fazer -de resto o Regimento especial prevê a atribuição de um certo tempo a todos os partidos e cada partido administra esse tempo conforme bem entender - e sem quebra do respeito devido pela posição dos partidos, lembro a ordem dos trabalhos de hoje: continuação do debate acerca da apresentação peto Sr. Primeiro-Ministro da moção de confiança.
Posto listo, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): -Sr. Presidente, era para dar a seguinte explicação: o respeito por este debate, pela Câmara, pela opinião pública e sobretudo o respeito que da minha bancada existe em relação ao Sr. Deputado Sérvulo Correia, leva-me a considerar que não devemos prosseguir nesta orientação, e pela nossa parte, cessaremos neste momento o debate.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Vejo que compreendeu o meu apelo.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.
O Sr. Rui Pena (CDS): - É para dar uma curta explicação à Assembleia da República.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já tive oportunidade de dizer uma vez ao Sr. Deputado Jaime Gama e ao Partido Socialista a propósito de uma outra vocação importante, o CDS não admite e rejeita todo e qualquer meio por que se pretenda influenciar o seu voto, seja através da mão estendida, seja através da pressão.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Nós saberemos assumir em consciência a nossa responsabilidade relativamente ao que consideramos ser o interesse do País na hora actual.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pelas contas da Mesa, incluindo a hora de intervalo antes da votação, que é regimental, teremos mais de sete horas de sessão. Isto significa que, de um pomo de vista, aliás bastante optimista, a nossa sessão poderá acabar aproximadamente às 3 horas da manhã.
Creio que poderíamos fazer um pequeno intervalo die dez minutos, até porque estamos um pouco fatigados, para reflectirmos no que acabo de dizer.
A reunião está suspensa por dez minutos.
Eram 18 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.
Eram 18 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Peço desculpa pelo atraso no recomeço da sessão, mas houve necessidade de efectuar uma reunião dos grupos parlamentares com um representante do Governo por causa da questão do horário dos nossos trabalhos de hoje.
Há pouco, a sessão foi interrompida por falta de inscrições. No intervalo, dois colegas do CDS informaram-me de que a Radiodifusão Portuguesa havia noticiado que essa interrupção se verificara por falta de inscrições do CDS. Pediram-me que repusessem a verdade, visto que não se tinha verificado esse facto, e assim fiz.
Todavia, a Radiodifusão Portuguesa apresentou-me uma carta esclarecendo o que se passou, transcrevendo a informação dada aos seus ouvintes e juntou uma cópia dessa mesma informação.
Verifica-se, pois que a Radiodifusão Portuguesa não deu essa informação a que na altura nos havia-mos reportado.
Feito este esclarecimento, passamos à continuação do debate.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive de sair de Lisboa ontem à noite, vim hoje de Tomar e ouvi precisamente essa reportagem da Radiodifusão Portuguesa.
Tenho a dizer que a Radiodifusão Portuguesa começou por afirmar que a bancada do CDS estava vazia, o que naturalmente, era capaz de ser verdade.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas não vamos abrir um debate sobre essa matéria. V. Ex.ª tem aqui a reprodução literal uma notícia dada.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Gostaria de a ouvir, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem também a reprodução tonografica. Estes elementos vão ser postos à disposição de V. Ex.ª.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Teria agora a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa, que, entretanto, veio à Mesa perguntar sé seria possível adiar por alguns momentos a sua intervenção. Suponho que está ainda a colher alguns elementos para a mesma.
A Mesa não vê qualquer inconveniente no adiamento pedido, e, nessas circunstâncias, como está também inscrito o Sr. Deputado Aires Rodrigues para uma intervenção, se o Sr. Deputado Amaro da Costa também não vir qualquer inconveniente, eu darei então a palavra ao Sr. Deputado Aires Rodrigues.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Não vejo qualquer inconveniente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Aires Rodrigues.
O Sr. Aires Rodrigues (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros: Os quase dois milhões e quinhentos mil votos no Partido Socialista e na Partido Comunista, quer dizer, os votos da esmagadora maioria do povo trabalhador deste país tinham, independentemente da diferenciação partidária, um significado, comum e claro: a constituição de um governo que defendesse as conquistas de Abril, as consolidasse e alargasse, conquistas que os trabalhadores no seu movimento próprio, através das suas organizações de classe e políticas, tinham alcançado com a queda da ditadura.
No entanto, as aspirações expressas pelos votos dia maioria do povo laborioso não só não foram satisfeitas, como, e cada um pode constatá-lo da forma mais elementar, ao nível da vida quotidiana, na empresa, no campo, na escola ou na rua, foram claramente defraudadas.
Quando, há sensivelmente um ano, nesta Assembleia, votei contra as propostas do Governo do Plano e do Orçamento Geral do Estado; tive oportunidade de declarar que tais propostas a serem aprovadas significavam: o desemprego em quase todos os sectores; as desintervenções e respectiva entrega às entidades patronais das empresas intervencionadas: os despedimentos; a aprovação concomitante e inevitável de leis no sector labora que, cerceando as liberdades de organização dos trabalhadores, permitiam o reforço das entidades patronais (Lei dos Despedimentos, dos contratos a prazo, Lei da Greve, a Lei das Comissões de Trabalhadores), ao mesmo tempo que degradavam as conduções de existência da classe trabalhadora, reduzindo drasticamente o seu poder de compra
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(decretos-leis do congelamento da contratação colectiva, da declaração das empresas em crise, etc., etc.); a aprovação de leis, como a chamada lei das bases gerais da Reforma Agrária e a Lei das indemnizações, que permitem o regresso de indemnizações dos latifundiários e capitalistas: em suma o reforço da reacção, daqueles que querem neste pais restabelecer os privilégios do passado, dos partidos que os representam, do PPD e do CDS.
Hoje, volvido um ano são os próprios dirigentes do Partido Socialista que o vêm reconhecer. Vêm-no reconhecer ameaçados por esses mesmos partidos, para quem não são suficientes estas medidas e leis que querem claramente partilhar o Governo, para as poderem aplicar rápida, e eficazmente, para poderem ir até ao fim na destruição de todas as conquistas da Revolução de Abril, conquistas materiais e liberdades democráticas que não são, naturalmente, realidades separadas.
Há dias, o Sr. Deputado Salgado Zenha afirmava que a linguagem de Sá Carneiro se assemelhava cada vez mais à linguagem de Kaúlza de Arriaga.
É verdade, Sr. Deputado Salgado Zenha, mas é preciso dizer mais. É preciso dizer que, independentemente da natureza dó Sr. Sá Carneiro, aquilo que lhe permite neste momento ter uma linguagem semelhante à de Kaúlza de Arriaga é a política deste Governo.
As manifestações reaccionárias do Porto de apoio a Pires Veloso, a manifestação fascista do 1.º de Dezembro de Lisboa, organizadas ou instigadas pelo PPD e pelo CDS, são a prova evidente de que a política deste Governo não acalmou a reacção, bem pelo contrário, tornou-a mais arrogante e ofensiva.
Mas será que o Governo decidiu mudar de política?
O Sr. Primeiro-Ministro ao vir hoje solicitar uma moção de confiança a esta Assembleia afirmou peremptoriamente que mão haveria mudança de política. Que o Governo mantinha as propostas do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1978 e a plataforma das negociações com o FMI.
Eu não quero criar dificuldades ao Partido Socialista, mas pergunto:
Poderão os trabalhadores da Facar, da Duarte Ferreira, do Copam, da Handy, da J. Francisco dos Santos, etc., etc., que viram delapidado o produto do seu trabalho, a recuperação das empresas abandonadas pelos patrões sabotadores, dar a sua confiança a esta política?
Poderão os trabalhadores das empresas ainda intencionadas, em autogestão dar a sua confiança a esta política, quer dizer à continuação das desintervenções e à respectiva entrega das empresas às entidades patronais?
Poderão os trabalhadores no Alentejo e do Ribatejo, que vêem a garantia do emprego posta em causa, que vêem regressar os antigos latifundiários às terras cultivadas pelos trabalhadores, dar a sua confiança a esta política?
Poderão os trabalhadores ameaçados de desemprego, dirigentes e delegados sindicas, os membros das comissões de trabalhadores, os activistas da classe trabalhadora, ameaçados pela sanha vingativa das entidades patronais que têm agora do seu lado as leis laborais, dar a sua confiança a esta política?
Poderão os milhares de jovens que vêem o seu futuro fechado, que se encontram no desemprego ou impossibilitados do acesso ao ensino, que são atirados para a margem da sociedade, dar a sua confiança a esta política?
Não, os trabalhadores e os jovens não podem votar a sua confiança nesta política.
Não, Sr. Presidente e Srs. Deputados, eu não posso dar a minha confiança a esta política e a este Governo.
Mas, mais ainda: a maioria idos trabalhadores deste país que votaram por uma outra política têm o direito de vir aqui a esta Assembleia, junto dos seus representantes para que eles respeitem o sentido do seu voto, constituam um governo que aplique as medidas socialistas necessárias à solução da. crise, um Governo das organizações políticas dos trabalhadores em maioria nesta Assembleia, um Governo do Partido Socialista e do Partido Comunista.
Os trabalhadores portugueses compreendem perfeitamente apesar dos profetas da desgraça, dos advogados das causas perdidas que no seio da classe trabalhadora 'peroravam sobre a inevitabilidade de um governo com o PPD, que não só tal governo não é inevitável como na realidade impossível, e isso porque os trabalhadores em maioria no País resistiram e se opuseram, resistência e oposição traduzidas nas empresas nas manifestações nas mobilizações de rua. Traduzidas na oposição às desintervenções, à entrega das terras aos latifundiários, aos despedimentos.
Os trabalhadores portugueses, com as suas organizações sindicais e comissões de trabalhadores, no uso de um legítimo direito por eles conquistado, o direito de manifestação, sabem que se vierem a esta Assembleia, onde os seus representantes estão em maioria, para que estes se unam e constituam governo numa base política clara, porão termo definitivamente a qualquer veleidade das forças do passado, civis ou militares.
Os trabalhadores portugueses, disso estou seguro, virão a esta Assembleia!
Como militante socialista, o que nunca renegarei, afirmo aqui responsavelmente que o empenhamento do Partido Socialista na constituição de um governo com o Partido Comunista, na base das medidas socialistas que os trabalhadores aspiram, como uma muralha contra as forças da direita restituiria ao Partido Socialista a sua verdadeira .imagem de partido dos trabalhadores empenhados na luta pelo socialismo.
Tal empenhamento faria de inovo do Partido Socialista, na prática e não em números, o maior partido dos trabalhadores portugueses.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Amaro da Costa pode fazer agora a sua intervenção?
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Posso sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado. Será um gosto ouvi-lo.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito obrigado.
Sr. Presidente, pela sua amabilidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS não pro-
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pos, em Agosto de 1976, uma moção de rejeição ao Programa do I Governo Constitucional porque não desejava provocar uma crise política antes de se tentar a resolução da grave crise económica que, já então, afligia o País.
Isso mesmo foi, ontem, aqui recordado pelo Deputado Freitas do Amaral.
Hoje, quando esta aberta uma evidente crise de Governo no nosso país, faz sentido pôr em relevo a forma como esse Governo proeurou fazer face à crise económica durante o seu mandato.
O crédito que demos ao Governo, há dezasseis meses, unha um objectivo. Importa julgar se ele mereceu ou não o crédito que, gratuitamente e por razões nacionais, lhe damos de modo voluntário por mais de uma vez.
Terá sido eficaz a acção governamental em matéria de política económica e financeira? Eis a pergunta que interessa formular.
A nossa resposta adianto a desde já - e negativa. É globalmente negativa quanto aos resultados alcançados pelo Governo. É negativa quanto às perspectivas do futuro.
Pretendeu o Primeiro-Ministro esclarecer-nos, sua declaração de política geral com que se abriu o debate, que a votação de uma moção de confiança implicava uma referência ao futuro, mais do que uma análise do passado. Como aquela, porém, não tem sentido sem esta, compreender-se-á que o CDS se abalance a tratar do passado e do futuro. E do presente logicamente não falaremos, porque é manifesto o tom de derrota com que o PS e o Governo se apresentaram neste debate.
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comecemos pelas causas da crise económica. Ë tema da natural predilecção do Governo. Falar das causas è como que falar dos alibis. Um governo, seja ele qual for, procura sempre descobrir e explorar as razões que não lhe permitem ter mais sucessos no desenvolvimento da sua política. O CDS não tem qualquer dúvida em exprimir os seus pontos de vista sobre a matéria.
É verdade que o Governo recebeu nas mãos uma economia traumatizada por vícios provenientes do passado anterior ao 25 de Abri], pelas convulsões do período revolucionário, pelas alterações na titularidade e forma de gestão de amplos sectores da economia, pela redução de mercados tradicionais de exportações e importações, pelo a luxo dos desalojados, pela desaceleração acentuada, da corrente emigratória, pelo aumento dos preços internacionais de matérias-primas e pela recessão que durante alguns anos se verificou na maioria dos países da área da OCDE.
Uma voz do PCP: - E ainda se verifica!
O Orador - O próximo Governo poderá ainda invocar em seu beneficio todo esse cortejo de razões. Só que terá todo o direito de lhes associar mais uma: as insuficiências, os atrasos e os erros da política do I Governo Constitucional.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - E, certamente, não deixará de o fazer.
Não nos iludamos, pois. Do que se trata não ô de nos pormos de acordo sobre as causas remotas da nossa grave situação económica. Aos Portugueses o que interessa é saber se o Governo do País mostra ou não capacidade para encaminhar de modo positivo a resolução dos seus problemas.
Em três domínios fundamentais o I Governo demonstrou uma assinalável inabilidade: primeiro, na definição dos objectivos da política económica; segundo, na concretização do modelo de funcionamento da economia e no desenvolvimento da acção de planeamento: terceiro, na gestão corrente da conjuntura.
Comecemos pelo primeiro aspecto.
Pode, em rigor, dizer-se que o Governo foi capaz de formular, até agora, quatro naipes diferenciados de objectivos para a sua política económica. Em dezasseis meses de mandato, não é pedir pouco!
Em Agosto de 1976 o Governo apresentou o seu Programa. Aí defendia como objectivos aparentemente hierarquizados do modelo de desenvolvimento os seguintes: o combate ao desemprego, o desenvolvimento orientado para a satisfação das necessidades sociais e a obtenção de elevado grau de independência em relação ao exterior.
Tentei, na altura, compreender qual era o sentido efectivo e não apenas aparente das prioridades governamentais. Foi infrutífero o meu esforço. Pude, pois; concluir que «o Governo decidiu fazer como que uma sopa de pedra da sua política económica, procurando falar de tudo sem que fique claro o sabor, o tom e a intenção final dessa política».
No final de 1976 foi apresentado o plano económico-social para o ano seguinte. Os objectivos então adoptados pelo Governo eram os seguintes, por esta ordem: melhoria do nível de satisfação das necessidades sociais da população; absorção progressiva do desemprego; contenção da dependência económica externa; redução do défice orçamental; controlo da inflação; correcção das desigualdades no domínio do teor de vida, repartição dos rendimentos e do desenvolvimento regional: consolidação e aceleração do relançamento da actividade económica.
Na proposta de grandes opções do Plano a médio prazo apresentada alguns meses depois, o Governo manteve sucessivamente a mesma escala de objectivos, que tinha apresentado para 1977, mas eliminou as referências à redução do défice orçamental, ao controlo da inflação e ao relançamento da actividade económica, introduzindo, em contrapartida, o objectivo da preparação da adesão à Comunidade Europeia.
Enfim, na sua proposta relativa ao Plano para 1978 o Governo propõe um programa de estabilização económica com os seguintes objectivos: redução do défice de transacções correntes com o exterior para cerca de 35 milhões de contos; redução do actual nível de inflação para taxas próximas dos 20 %; crescimento moderado em volume do produto interno; manutenção da tendência global de recuperação do emprego e minimização dos custos sociais decorrentes da situação existente.
Da comparação destes quatro painéis de objecti-
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vos resulta evidente que, ao longo do tempo, o Governo foi secundarizando a luta contra o desemprego, no mesmo tempo que foi dando cada vez maior importância do problema da redução do défice externo. Entretanto, o objectivo mais permanente relativo a satisfação das necessidades sociais caiu no esquecimento no que se refere ao Plano para 1978. em contradirão flagrante com as ideias contidas no projecto um Plano a médio prazo. Enfim, à luta contra a alta do custa de vida -ausente dos objectivos do Programa ao Governo - foi sendo dada, e bem, cada vez maior importância.
Poderá o Governo pretender justificar-se dos movimentos oscilatórios que entendeu introduzir nos seus documentos de política económica. Mas é evidente que perante tais oscilações teremos de concluir que o Governo levou muitos meses e perdeu muito tempo até se aproximar daquilo que, no inicio, deveria ter reconhecido como necessário.
Só agora - e, pelos vistos, com a ajuda da perspicácia do Fundo Monetário Internacional - o Governo começou a atribuir ao problema do défice externo a primeira prioridade. E de tal forma que o Primeiro-Ministro fundamenta o voto de confiança solicitado à Assembleia da República em torno, entre outras coisas, da condição de redução de um terço, em relação a 1977, do défice da balança de transacções correntes para 1978.
Ora, em Março de 1976 o CDS apresentou ao País o seu «Programa para a Reconstrução da Economia Portuguesa», no qual se indicavam orno objectivos prioritários os seguintes, pela ordem indicada: controlo da balança de pagamentos: criação de emprego: controlo dos preços: satisfação das prioridades sociais.
O Governo levou vinte meses até chegar à conclusão que o CDS formulara: a de que devia dar-se grande importância e prioridade ao problema da balança de pagamentos: pelos vistos, o conselho do Fundo Monetário Internacional agora expresso foi mais relevante e eficaz para - o Governo do que o ponto de vista dos seus concidadãos representados no CDS.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Só que, na nossa opinião, e por falta de remédio a tempo, a situação económica e social se deteriorou. E o desprezo dos objectivos por nós propósitos em Março de 1976 conduziu à complexa posição em que o País se encontra hoje. Ao dar-nos parcialmente razão vinte meses depois, o Governo vem tarde, mais uma vez.
Porque, agora, não basta só atribuir prioridade ao reequilibro da balança de pagamentos. Será necessário, à luz de uma perspectiva temporal mais dilatada, procurar) resolver esse problema articuladamente com a criação de emprego e com o crescimento acelerado do produto, sob pena de comprometermos ainda mais o futuro.
Pelo nosso lado, mamemos, pois, o essencial das nossas propostas e reconhecemo-nos na justiça das nossas próprias analises há muito efectuadas. O acordo do Governo connosco aumentou por um lado e diminuiu por outro: aumentou quanto às questões da importância do défice externo e da luta contra a inflação; diminui quanto ao lugar a dar-se a criação de emprego.
No meio de tudo isto o Governo foi ainda capaz de «enxertar» dois pacotes de medidas económicas cuja fundamentação teórica nunca foi claramente expressada pelas entidades oficiais. O «pacote I» teve o mérito, apesar disso, de constituir um conjunto de medidas no qual era possível descortinar uma assinalável dose de realismo. Mas os seus frutos perderam-se, em grande medida, perante a falta de consistência global da política do Governo. Não basta, na verdade, ter uma intuição certa, num dia 25 de Fevereiro. Nem basta encontrar por diante uma oposição construtiva e aberta, como foi o caso com o CDS. É preciso mais do que isso para que da intuição possam resultar efeitos duradouros, do Governo não conseguiu, manifestamente, acenar o passo com a lógica das suas próprias deliberações, nem logrou completá-las com os esquemas que eram necessários.
Num quadro de objectivos flutuantes, a revelar oscilações de tendências de interpretação no interior do próprio Governo ou do Partido Socialista, compreende-se que ao País não tivesse sido oferecido um modelo consolidado de funcionamento da economia. Daí até ao fracasso da acção de planeamento do Governo iria um passo. Como se viu, esse passo foi dado e consubstanciou-se, exemplarmente, nesse caso insólito que foi o das grandes opções do Plano a médio prazo (1977-1980).
Em 15 de Junho o Governo enviou à Assembleia da República, com um mês de atraso em relação ao prometido, a sua proposta de lei sobre o plano quadrienal. Essa proposta ainda não foi discutida. E muito nos interessaria saber se o Governo estava e está solidário com ela, A questão não é irrelevante, pois foram tantos os rumores sobre a controvérsia que em seu torno se teria gerado no interior do próprio Conselho de Ministros que o País decerto agradeceria uma palavra esclarecedora a este propósito. Até porque o mais activo defensor público dessa proposta se demitiu, entretanto, do Governo.
Cito este caso porque ele me parece revelador das contradições existentes no seio do Governo em matéria de definição do próprio modelo de funcionamento da economia.
Bastará comparar o que se diz no projecto de grandes opções do Plano a médio prazo com a proposta de lei relativa ao Plano paira 1978 para se comprovar a justeza desta observação. Qualquer semelhança entre os pressupostos deste e os fundamentos do planeamento para o partido de 1977-1980 e pura coincidência. E, no entanto, um mesmo Primeiro-Ministro, um mesmo Ministro do Plano e da Coordenação Económica, rubricaram galhardamente ambas as propostas.
Se, não obstante tudo listo, houve, como pretende o Governo, uma retoma sensível da confiança por parte do sector empresarial privado - do que continuamos muito fundamente a duvidar -, então o Governo deveria aceitar que, no nosso país, os responsáveis das actividades económicas privadas dão motivos para apreciável optimismo. Na verdade, se, apesar de tão deficiente capacidade governamental
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para definia as regras de funcionamento da economia, as empresas privadas conseguem o milagre de se mostrarem dinâmicas e de se lançarem francamente no investimento e na produção como o Governo pretende, então o Governo deveria concluir que elas constituem o elemento motor do relançamento económico.
Onde está, então, o fundamente para as criticas que, volta me a volta, dirigentes do Partido Socialista ou Ministros endereçam à capacidade da iniciativa privada em Portugal?
Tudo isto revela, a nosso ver, a falta de lógica governamental. Estamos, afanai, perante o equívoco profundo que em matéria de modelo económico e de planeamento tem presidido à acção governamental. Sem regras claras de funcionamento económico não pode havia uma sã economia de mercado e muito menos um sistema correcto da chamada «coexistência concorrencial».
Pode haver especulação, actividade clandestina, negócios chorudos, liberalismo desenfreado, anarquia. Pode haver da parte do sector privado uma grande capacidade de sacrifício e de resistência às dificuldades. O que não haverá, porém, é a confiança que gera a solidez das economias; não haverá desenvolvimento de projectos orientados pelos objectivos do plano; não haverá solidariedade mo esforço de reconstrução do País. E nisso estamos.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Acresce, todavia, que por cima de tudo isto se apresenta uma complexa e delicada questão técnico-política da maior incidência no traçado de uma correcta acção de planeamento. Refiro-me à venha questão estatística.
Quem tiver tido o cuidado de anotar as intervenções dos diferentes Ministros de vários Governos a propósito da situação económica portuguesa, verificará facilmente que todos afirmaram a existência de uma grave crise económica, definindo-lhe mesmo os traços mãos característicos: inflação, desemprego, elevados défices do Orçamento Geral do Estado e dia balança a pagamentos, prejuízos muito avultados nas empresas públicas e degradação da situação económica e financeira, das empresais privadas, absentismo, quebra de produtividade, etc. Mas também nos recordamos de que todos eles, e sobretudo depois de alguns meses de exercício do poder, vieram afirmar que a crise existia, mas os indicadores económicos em todos marchando de forma muito favorável. A crise não era assim tão grave coimo a oposição tentava fazer crer.
No I Governo Constitucional essa tendência é manifesta. Depois de tudo estar mal, depois diais heranças acumuladas devido às causas já referidas e após - dezasseis meses de governação, tudo ou quase tudo melhorou e feriamos até atingido índices que nunca antes se tinham alcançado. Por exemplo, na rubrica do investimento, nas estimativas apresentadas pelo Governo, o investimento ,eleva-se a 27 % do produto interno bruto a preços de mercado, o que representa volume percentual jamais atingido no nosso país. Mais, de acordo com os números à nossa disposição, Portugal estaria hoje, em posição francamente superior em relação à medida dos países da OCDE.
É, porém, tempo mais do que tempo de encararmos a realidade económica portuguesa de frente.
O investimento não é invisível. Um investimento de 27 % do produto interno bruto representa 176 milhões de comos, o que, mesmo aceitando uma variação de stocks de 30 milhões de contos, nos conduz a 146 milhões de formação bruta de capital fixo. Estes 146 milhões de comos não se vêem, e se fossem uma efectiva realidade deviam ver-se.
Se antes de 25 de Abril as estatísticas portuguesas eram extremamente deficientes, não podemos acreditar que o período anarquizante da fase de perturbações sociais e políticas em que vivemos tenha contribuído para as melhorar.
O CDS tem a sua própria opinião acerca da marcha de certos índices. Mas o que julga dever sublinhar é, pelo menos, a perplexidade que assalta qualquer analista quando comprova o afastamento espectacular dos números indicados no Plano 1977-1980 em relação aos agora tornados públicos para 19977-1978.
E das duas uma: ou o Governo planeia muito mal - e os números em causa estão certos; ou prevê bem e planeia bem e os números em causa têm de estar errados.
O futuro do nosso país não se cozinha numa máquina de calcular. Empresários, economistas e engenheiros, em ligação directa com as realidades e por nós amplamente contactados, acham os números de que o Governo dispõe tão irrealistas como nós próprios os achamos.
Neste quadro, e sem adiantar outras possíveis conclusões, gostaria de formular as seguintes perguntas, sublinhando, no entanto, que com elas, não desejamos pôr em causa a honorabilidade ou a recta intenção de quem quer que seja:
O Ministro das Finanças pode garantir que o saldo da balança de transacções correntes em 1977 não será significativamente superior a 44 milhões de contos?
O Ministro do Plano e Coordenação Económica poderá informar em pormenor como os serviços oficiais chegaram à estimativa de 145 milhões de contos de formação bruta de capital fixo e em que base se estima em 30 milhões de contos a variação de stocks?
O Ministro do Plano e Coordenação Económica pode indicar-nos por que razão a população activa será hoje de 4 milhões, quando todas as anteriores estimativas, oficiais, bem recentes algumas delas, davam o número de 3,5 milhões - valor, aliás, análogo ao previsto para 1980?
Um Governo que tem oscilado na hierarquização dos objectivos a alcançar por falta de enquadramento num modelo global de viabilização da nossa economia e que demonstra evidentes falhas na capacidade de planeamento não se pode furtar a uma gestão corrente cheia de incoerências e contradições a muito custo colmatadas com improvisações, meias medidas e ajudas externas in extremis.
E chegamos, assim, ao terceiro importante aspecto da nossa análise.
Esta incerteza e insegurança governativa transmi-
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te-se muito logicamente à administração e às empresas públicas cuja inoperância e desorientação ião evidentes em muitos casos. Não deixa de se reconhecer, num ou noutro caso, algumas melhorias. Mas elas são sobretudo o resultado do espírito de independência e da capacidade de alguns gestores.
A incapacidade para atacar os problemas fulcrais da nossa economia dentro de um modelo coerente e de uma planificação adequada, tem levado o Governo a dar interpretações parciais de situações sobre as quais há que actuar com firmeza e rapidez. Há erros acumulados que deviam ser publicamente denunciados e combatidos.
O Governo não tem tido a coragem e o realismo de reconhecer que algumas das melhorias recentemente verificadas em domínios sectoriais da economia resultam de meros ajustamentos conjunturais da iniciativa privada a condições de maior estabilidade social que são neste momento as que se podem reputar como mínimas para uma democracia que se institucionaliza.
Insisto. O CDS reconhece que o Governo beneficiou de uma atitude de abertura e de uma grande paciência da parte dos trabalhadores e de muitos empresários. Demonstraram uns e outros grande patriotismo e apego à democracia para assim terem procedido e esperamos, sinceramente, que, no futuro, seja possível contar com a sua compreensão para as dificuldades que ainda temos de enfrentar. O CDS não discute que em algumas áreas da actividade económica houve progressos e muito trágico seria se os mesmos não se tivessem verificado. O CDS não ignora que o Governo dispôs de boa receptividade internacional a muitas das suas propostas.
Mas o que os democratas-cristãos sublinham é a ausência de resposta do Governo às condições excepcionais que lhe foram oferecidas. O que denunciamos é a insensibilidade ou o atraso governamentais no equacionamento de problemas evidentes. O que não aceitamos é que o País tenha um Governo de expressão minoritária e ainda por cima incapaz de tirar partido efectivo da homogeneidade que, segundo ele, preside à sua própria fórmula de composição.
Como se reflectiu, pois, a gestão corrente dos aspectos económicos nas diferente? variáveis e problemas?
Sem ter ainda publicado a regulamentação da lei da delimitação dos sectores público e privado, o Governo mantêm uma ambiguidade inaceitável na definição das regras do jogo económico. Mantém-se, assim, uma lacuna desencorajante para o sector privado com todas as consequências da adopção, pelo Governo, de um casuísmo político s economicamente inconveniente.
A partidarização no. preenchimento de certos órgãos de gestão de empresas públicas ou dos cargos públicos tende entretanto a superar uma necessária hierarquia de competências. Trata-se de aspecto altamente preocupante e que não deixará de produzir os seus efeitos nos resultados dessas mesmas empresas e serviços. O resultado está à vista quando se prevê que os subsídios efectivamente dados a empresas possam atingir, em 1978, um montante de cerca de 21 milhões de contos.
O défice externo tem vindo a acumular-se e coloca-nos numa posição de dependência relativamente às entidades mutuante? extremamente perigosa. O problema é ainda mais grave quando se constata o descuido do Governo ou o seu desrespeito da lei quanto à necessária informação da Assembleia da República sobre aspectos fundamentais relacionados cem o aumento da dívida externa.
Com a estrutura actual da nossa indústria e sem uma política fiscal de apoio não nos parece possível aumentar as exportações por forma a fazer face aos encargos, cambiais do necessário desenvolvimento económico. Ora, o Governo não só se mostra incapaz de fazer progredir de forma significativa as nossas exportações, como demonstra não se sentir capaz de controlar equilibradamente as importações necessárias.
Depois de repetidas promessas de protecção aos preços do chamado «cabaz de compras», a inflação atingiu níveis superiores aos anos anteriores. O facto é tanto mais estranho quando se sabia que uma desvalorização externa do escudo iria ocorrer com repercussões infalíveis nos preços internos.
A tímida desvalorização de 15% criou a expectativa de uma nova desvalorização, o que, por si só, é um factor de grande influência na sua efectivação. A desvalorização deslizante em que vemos a cair é um novo perigo, por romper com os obstáculos pouco lógicos e políticos que uma desvalorização substancial impõe e pode vir a traduzir-se numa cadência de descida confortável para quem governa, mas esse é certamente um método perigoso para a economia.
A falta de um modelo de indexação selectiva face aos ritmos de inflação verificados está criando rupturas em certas variáveis do sistema económico que continuam paralisadas como se nos mantivéssemos em níveis de inflação reduzidos. Os reformados, os detentores de rendimentos fixos, os quadros que vêem os seus salários congelados são exemplos do que afirmamos. Toda a política de taxas de juro está imbuída da mesma falta de enquadramento num modelo de indexação selectiva. Daí resultam consequências funestas para uma actividade económica descapitalizada e sem esquemas automáticos de valorização de activos, de actualização de preços e ainda com hábitos de cobrança e ás pagamentos degradados pelos últimos anos de actividade.
A política de crédito apresenta ainda todos os riscos de ser sectorialmente cega, sendo aplicada em muitos casos por técnicos afastados das realidades concretas de cada sector de actividade. Na situação grave que tem vindo a gerar-se a política de crédito é um problema de importância fundamental, até porque nos últimos quatro anos ela foi muitas vezes utilizada para camuflar o desemprego real e tapar de qualquer maneira o empobrecimento das empregas ou mascarar situações reais de falência técnica. Muitas empresas devoraram já todos os capitais próprios e estão nesta altura a fazer face aos seus compromissos exclusivamente com capitais alheios.
A política fiscal, entretanto, tornou-se um instrumento de desencorajamento do investimento privado e uma fórmula eficaz de captar poupanças para depósitos a prazo e empréstimos públicos que finan-
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ciam a voragem dos défices do Orçamento Geral do Estado e a própria política de crédito.
Ora, se os principais passos no domínio da política fiscal foram dados pelos Governos Provisórios, o actual Governo nada fez para os corrigir, descuidando, aparentemente, a necessidade e a urgência de uma profunda reforma fiscal. Por outro lado, a mesma falta de enquadramento num modelo de indexação selectiva está a esmagar certas classes de rendimentos de uma forma que colocará os quadros médios e superiores numa situação insustentável.
A forma descontrolada como as despesas públicas têm aumentado, a aquisição de imóveis a um ritmo que impressiona, a falta de produtividade dos serviços prestados, somam-se, do lado orçamental, a este quadro negativo. Entretanto, muitos cidadãos praticam formas de evasão fiscal, numa diluição perigosa de direitos e deveres dos indivíduos para com o Estado e reciprocamente.
A política de rendimentos não se mostra capaz de superar as assimetrias geradas entre os vários sectores profissionais nem pôr termo de forma decisiva aos abusos em matérias de subsídios e horas extraordinárias, apesar de nesse sentido se terem feito tentativas e se terem alcançado alguns progressos:
Os leques salariais não se mostram de todo adequados ao nível tecnológico e de desenvolvimento económico em que nos encontramos e desmotivam os técnicos mais qualificados, predispondo-os para a emigração.
A lei das indemnizações, que poderia constituir um factor de arranque do investimento, ainda não apareceu regulamentada. E ela própria constitui um sistema de penalização injusto e gerador de desconfiança tanto para os investidores e aforradores nacionais como estrangeiros. Mas, entretanto, os negócios especulativos têm florescido e proporcionado lucros substanciais.
No domínio da política de investimento, o panorama não é melhor. Em dezasseis meses, o Governo deu a entender predilecção por três políticas diferences: no seu Programa inicial não soube afastar-nos da ideia de que aceitava uma política de capital intensivo, na inércia dos projectos em curso ou em estudo: no Plano a médio prazo valorizou particularmente os investimentos não produtivos em matéria social; agora, parece apontar para a protecção privilegiada aos investimentos orientados para o sector exportador. Talvez o Governo encontre uma explicação para estas sucessivas viragens de opinião. Pelo nosso lado, ficamos perplexos.
Em resumo: no plano de definição dos objectivos, no plano da definição de um modelo de funcionamento da nossa economia, no plano de gestão corrente dos assuntos económicos e financeiros, o Governo não deu boas provas. Como poderá aspirar e ter a nossa confiança?
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconhece o CDS que, seja como for, o País chegou a uma situação particularmente delicada em matéria de pagamentos externos. Dai que este debate lenha sido colocado pelo Primeiro-Ministro, e no domínio económico, sob o signo da aceitação ou não aceitação do princípio das negociações com o Fundo Monetário Internacional.
Respondamos, pois, e directamente, ao problema levantado pelo Governo, dando por entendido que a resposta do CDS à questão de confiança, nomeadamente nos aspectos políticos, já foi ontem adiantada.
O CDS defende e preconiza o princípio de negociações com o Fundo Monetário Internacional. Não aceita, todavia, o resultado das negociações já travadas entre esta organização e o actual Governo, ou seja: não aceita, nomeadamente como principio assente definitivamente, que o défice de balança de transacções correntes para 1978 seja fixado no valor de 35 milhões de contos proposto no Plano.
Devemos, pois, considerar separadamente estes dois aspectos.
Primeiro: o CDS preconiza as negociações com o Fundo Monetário Internacional. Ao ponto a que chegou a nossa situação económica, financeira e cambial, a reconstrução da economia portuguesa exige um forte apoio externo. As sucessivas solicitações a linhas externas de financiamento têm escondido a capacidade negociadora de particulares e do Estado Português. O aumento crescente da dívida externa, acompanhado da ausência de planos de desenvolvimento a médio prazo, não estimula, naturalmente, a confiança dos potenciais financiadores estrangeiros de instituições bancárias privadas, quer de organizações internacionais de crédito quer de Estados amigos. Chegámos, portanto, a uma situação em que nos é útil dispor da opinião avalisadora do Fundo Monetário Internacional, a fim de podermos restabelecer uma mais ampla capacidade negociai com interlocutores estrangeiros, em matéria de recurso ao crédito externo. Aliás, assim contribuirá, progressivamente, para a diminuição das dependências em que estamos projectados.
Segundo: o CDS não aceita, como ponto assente, a proposta governamental quanto ao volume do défice externo para 1978. Não faz sentido, na nossa opinião, discutir os desequilíbrios da balança de transacções correntes na perspectiva de um horizonte temporal tão curto. A economia tem leis próprias. Pensar só em 1978 é aceitar o salto no eseuro para 1979 e os anos seguintes. Ora, isso não é prudente. Como dizia um conhecido político chinês, «é preciso curar a doença, sem matar o doente».
Risos.
O esquema global que o Governo, nos sugere leva-nos a admitir que o seu projectado programa de estabilização poderá ter, se for aplicado, consequências e implicações extremamente complexas, se não mesmo perigosas, na economia e no tecido social. Compreende-se que não possamos assim dar a nossa aprovação cega às conclusões alcançadas pelo Governo no seu diálogo com o Fundo Monetário Internacional. O CDS não participou desse diálogo: não podia jamais ser corresponsabilizado pelos seus resultados.
Esta é, pois, e em síntese, a posição do CDS sobre
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a segunda questão colocada a Assembleia da República pelo Primeiro-Ministro.
Perguntar-se-á: e que propõe o CDS?
O CDS propõe o seguinte:
1.º Que seja formado um II Governo Constitucional;
2.º Que esse Governo reabra as discussões com o Fundo Monetário Internacional;
3.º Que a base dessas discussões seja um modelo consistente para o funcionamento da economia portuguesa para o período 1978-1984;
4.º Que se proponha ao Fundo Monetário Internacional a existência de duas fases muito curtas e intensas de negociações, procurando-se na primeira equacionar a situação de problemas inadiáveis de balança cambial é na segunda os problemas mais substanciais da nossa recuperação económica;
5.º Que, em consequência, se abdique do mito do «grande empréstimo» enquanto tal, reconhecendo-se a sua hipervalorização política pelo actual Governo;
6.º Que se realize um grande esforço no sentido da apresentação de projectos concretos de investimento a instituições financeiras internacionais, designadamente ao Banco Mundial;
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador:
7.º Que se leve a cabo uma grande acção diplomática de esclarecimento e informação junto dos dezassete países hoje dispostos a participar do chamado «grande empréstimo»;
8.º Que sejam adoptadas novas normas para o recurso directo por parte de empresas às instituições estrangeiras de crédito para efeitos de importação, tanto de bens de equipamento como de bens de- consumo, matérias-primas, bens intermédios, combustíveis e lubrificantes, no sentido de descentralizar e flexibilizar as responsabilidades da dívida externa;
9.º Que se desenvolva uma política económica coerente como o modelo de médio prazo discutido com o Fundo Monetário Internacional.
O Sr. Nuno Cadinho de Matos (PS): - Essa é a receita que mata o doente!
O Orador: - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O CDS acredita que é viável reequilibrar a balança de pagamentos até 1984: o CDS acredita que é viável alcançar nesse ano uma estrutura percentual da despesa interna próxima da actual estrutura média dos países da OCDE: o CDS considera que é viável, à custa de certa contracção temporária de consumo público, reduzir o défice do Orçamento Geral do Estado a 1% do produto interno bruto a preços de mercado, em 1984; o CDS considera que é viável promover-se a criação de 500 000 a 600 000 pontos de trabalho desde 1978 até àquele ano; o CDS considera que é viável promover-se, a construção de. 350000 fogos habitacionais neste período e levar a cabo uma ampla acção de reconversão do sector hospitalar e de infra-estruturas educativas: o CDS considera que é viável manter-se, sem agravamento sensível, o peso percentual da carga fiscal no produto interno bruto; finalmente, o CDS considera que é viável levar-se a cabo entre 1978 e 1984 uma ampla reforma do sistema de segurança social.
As grandes opções de planeamento a médio prazo do CDS para o período de 1979-1984 apontam em direcção a essas metas ambiciosas. Estão ao nosso alcance. Exigirão muito esforço, muito trabalho e, sobretudo, uma ampla base de consenso nacional. Será, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não seremos capazes de a construir?
Pelo nosso lado, estamos dispostos a tudo tentar para o alcançar, na defesa absoluta pelas seguintes condições políticas de base: defesa intransigente da sociedade pluralista e do regime democrático; opção europeia de Portugal num quadro de preservação da identidade e da soberania nacionais; incremento acelerado do bem-estar dos Portugueses, baseado num profundo sentido de justiça social; garantia das liberdades económicas e da economia de mercado num quadro de significativa intervenção estatal; mobilização voluntária da população para um projecto de desenvolvimento económico e social acelerado: superação da inoperacionalidade do sector público; forte vontade política de modernização da sociedade portuguesa.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Estas premissas políticas são uma garantia e um desafio. Garantia de que o empenhamento do CDS, em todos os domínios da sua actividade, será sempre o de levar por diante o seu contributo democrata-cristão para a construção de uma sociedade de liberdade, de progresso e de profunda justiça social, no respeito pelas mais. profundas tradições do nosso povo. Desafio para que seja possível unir o maior número de portugueses em torno de um ideal generoso de fé na democracia e de reconciliação nacional e de um projecto de reconstrução da nossa pátria independente.
Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Depois desta intervenção, o CDS dispõe de nove minutos e meio. Tem a palavra o Sr. Ministro Jorge Campinos.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Sr. Presidente, o Governo, através de alguns dos seus membros, gostaria de formular alguns pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Amaro da Costa. Começo por mim: disse o Sr. Engenheiro Amaro da Costa...
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça o favor.
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O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Eu teria o maior gosto, muito prazer e subida honra sem poder responder aos pedidos de esclarecimento de vários Srs. Ministros. Mas o Sr. Presidente da Mesa acabou de informar que o nosso tempo de intervenção está limitado, neste momento, a nove minutos.
O Sr. Presidente: - Nove minutos e meio, Sr. Deputado.
O Orador: - Terei muito gosto iam tomar nota de todos os pedidos de esclarecimento que os Srs. Ministros me queiram fazer e terei muno gosto em lhes dar a reposta ou uma entrevista no órgão oficial do Partido Socialista.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Ou, se o entenderem conveniente, por escrito.
O Orador: - Queira continuar. Sr. Ministro Jorge Campinos.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Devo dizer que o Sr. Deputado Amaro da Costa encontrou uni excelente álibi.
Protestos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam o favor de ouvir o Sr. Ministro. Queira continuar, Sr. Ministro.
O Orador: - Se o Sr. Engenheiro Amaro da Costa que é um jovem engenheiro que acaba de iniciar os seus primeiros passos balbuciantes na economia, administrar amanhã a economia como administra o seu próprio tempo nesta Assembleia, os Srs. Deputados e o povo português compreenderão certos erros imediatamente.
Aplausos do PS e protestos do CDS,
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - É grosseiro, é incrível!
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro Mota Pinto pede a palavra, mas creio que o Sr. Deputado Amaro da Costa deseja certamente dar algum esclarecimento em relação à pequena intervenção do Sr. Professor Jorge Campinos.
Será assim, Sr. Deputado?
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Ministro não vir inconveniente, dou então a palavra ao Sr. Deputado Amaro da Costa.
O Sr. Deputado vai protestar?
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Evidentemente, Sr. Presidente, foi nesse sentido que pedi a palavra.
O Sr. Presidente: - Faço esta. pergunta em seu beneficio, porque se a sua intervenção for para um protesto não conta o tempo.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Tenho consciência de que a minha capacidade para administrar o meai próprio tempo chega para perceber que essa é a realidade.
Balbuciante ou não, Sr. Ministro, há uma coisa que não sou: é malcriado.
Aplausos do CDS e do PSD.
Por consequência, não vou protestar utilizando termos análogos ou sequer próximos daqueles que o Sr. Ministro utilizou. Quando vejo as pessoas perderem o sentido das proporções, atingindo inclusivamente o ponto de pôr em causa a dignidade das instituições - porque as afirmações têm proporção com o local em que são profridas -, penso que elas manifestam uma insegurança muito grande.
Uma voz do PS: - São uns exagerados!
O Orador: - Não tenho eu que interpretar qual será o motivo ou o Fundamento dessa insegurança; o Sr. Ministro sente-a, porventura, para utilizar as expressões que usou. O que jamais me permitirei é, mesmo no plano político, mesmo em relação a um Governo do qual me seria adversário, usar a terminologia, as referências que o Sr. Ministro se consentiu utilizar em relação a mim próprio e, por consequência, em relação a esta bancada e. por conseguinte, em relação à Assembleia e ao povo português.
Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PSD.
O Orador: - Dado que não costumo consentir que por razões de forma haja dúvidas de fundo, eu pedia ao Sr. Presidente da Mesa que consultasse a Assembleia no senado de saber se ela me autoriza, com excepção dos nove minutos que restam de intervenção, ao meu partido, a dar as respostas que os Srs. Ministros pretendam que eu dê em relação às perguntas que entendam por bem formular.
Vozes do CDS: - Muito bem!
Vozes do PS: - Muito mal!
O Orador: - Fá-lo-ei, naturalmente, como alguém que, balbuciante, se inicia nas lides políticas e na economia. Prefiro fazê-lo assim a fazê-lo como alguém que titubeia no estertor moribundo de um governo fracassado.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Dou seguidamente à palavra ao Sr. Ministro sem pasta, Jorge Campinos, mas relativamente ao pedido que o Sr. Deputado Amaro da Costa fez para que se consultasse a Assembleia sobre um eventual alargamento do seu tempo de intervenção, não o poderemos fazer. Foi estabelecido por acordo entre todos os partidos e o Governo que cada partido teria um determinado tempo de intervenção. Só se houver deliberação em contrário da Assembleia é que esse regulamento pode ser alterado.
Tem a palavra o Sr. Ministro Jorge Campinos.
O Sr. Ministro Jorge Campinos: - Sr. Presidente, é para apresentar um contraprotesto:
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Tenho pena de não ter o estilo, de não ter o tom que acaba de ser utilizado pelo Sr. Engenheiro Amaro da Costa.
Ouvi-o com muita atenção, senti que se dominava perfeitamente mas de repente, no fim o verniz estalou.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Espantoso!
Risos do CDS.
O Orador: - ..., e falou da agonia do exterior deste Governo e creio até que a expressão utilizada foi de moribundo.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - E muito bem!
O Orador: - Pois bem. Sr. Deputado, se malcriado fomos, até lhe pediria desculpa, neste momento pode crer que não apresento nenhuma desculpa. Mas gostaria tanto que a esta Assembleia disse cem que meios de financiamento vai o Sr. Deputado realizar o seu programa: o Sr. Deputado, que muito conhece de economia, certamente dirá a esta Assembleia que já- encontrou petróleo em Chelas.
Uma voz do CDS: - Mas que malcriado!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro do Comércio e Turismo.
O Sr. Ministro do Comércio e Turismo (Mota Pinto): - Pedi a palavra para fazer umas pergunta ao Sr. Deputado Amaro da Costa que para o auxiliar na gestão do seu tempo serão formuladas em termos de resposta sim ou não.
O Sr. Deputado Amaro da Costa fez uma analise global da economia portuguesa durante a gestão do Governo e emitiu apreciações valorativas sobre essa análise económica. Nessa analise geral estão comportados alguns aspectos sectoriais e é precisamente sobre dois deles que lhe vou dirigir duas perguntas.
O Sr. Deputado Amaro da Capta falou de inflação e embora não quantificasse, disse que o nível respectivo tinha excedido os níveis previstos. Circunscrevendo-me aos produtos alimentares, eu queria perguntar ao Sr. Deputado Amaro da Costa se sendo o índice dos produtos alimentares que foi distribuído pelo Instituto Nacional de Estatística referente: ao mês de Outubro de 134,2 - 100 são os preços médios de 1976 e não os do início do ano, cujo índice é 110- e o de Abril de 136,3, reconhece ou não que houve uma efectiva contenção do custo do preço dos produtos alimentares nestes últimos seis meses contenção essa devida a uma acção multilateral de fixação de preços máximos como. por exemplo, através do «cabaz das compras», nomeadamente nas batatas e nas frutas, acção esta feita numa medida sem precedente - na historia da administração económica portuguesa, de uma intensificação - da acção da fiscalização, de uma intervenção de organismos públicos nos circuitos de distribuição. Enfim, gostaria de saber se estes meios e estes resultados são ou não uma actividade que a sua objectividade levará a concluir tratar-se de um êxito do Governo.
A minha segunda, pergunta é a seguinte: tendo-se verificado o aumento de preços em Março e Abril e eu compreendo esse aumento e estou à vontade para falar do assunto, pois não fazia então parte do silêncio governativo -, gostaria de saber se o Sr. Deputado Amaro da Costa acha que esse aumento, destinado a reconduzir os preços ás reais estruturas de custos foi ou não medida sensata e realista que deve naturalmente merecer o aplauso de quem, realista e sensatamente, se debruça sobre a fenoménica económica.
A terceira e última pergunta é a seguinte: numa análise global, o Sr. Deputado Amaro da Costa não se referiu a uma actividade que, vista como exportação de serviços, é a segunda maior exportação portuguesa e que é o turismo. Ora, eu quero perguntar-lhe pelos resultados propiciados pela acção do Governo que se traduzem em receitas globais da ordem dos 18 milhões e meio de contos para este ano, contrapostos a 9 milhões de contos do ano passado, em dólares, para que não se diga que isto se deve à desvalorização, 490 milhões este ano para 320 milhões do ano pagado. E a obtenção de resultados, que quase alcançam, e noutros aspectos, ultrapassam mesmo os 73 milhões, tudo isto derivado de uma acção quotidiana resultante de uma desocupação de unidades hoteleiras feita com circunspecção e sensatez, mas oportunamente, do tratamento do problema do abastecimento dos centros turísticos, de se ter conseguido ultrapassar o espectro de uma greve que comprometia a época turística mediante uma acção dúctil mas firme. Queria, portanto, perguntar ao Sr. Deputado vê estas acções e os resultados respectivos relativamente a este sector são ou não um resultado que mais uma vez na sua objectividade terá de reconhecer como um êxito da acção governativa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Amaro da Costa, para dizer sim ou não tenha a bondade.
Risos.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à primeira pergunta do Sr. Ministro Mota Pinto permito-me recordar-lhe que o Plano para 1977 previa que a inflação se, situaria ao nível dos 15%. Ora, os números que me editou conformam, efectivamente, que, nomeadamente contra os produtos alimentares, a inflação superou, e bastante, o valor inicialmente previsto para a inflação no ano em curso.
A resposta â sua segunda pergunta pode ser sim, é a resposta à terceira pode ser talvez.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tinha anunciado que daria a palavra ao nosso colega António Guterres, mas entretanto o Sr. Deputado Veiga de Oliveira veio aqui à Mesa protestar, aliás amigavelmente, chamando-nos a atenção para o horário estabelecido pelos grupos parlamentares e pelo Governo. Assim, segundo a nossa plataforma, o intervalo é as 19 horas e 30 minutos. Estamos em cima da hora, e, visto que não há unanimidade quanto ao eventual prolongamento desta parte da sessão teremos de respeitar o acordo já estabelecido.
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A sessão está, pois suspensa até ás 22 horas.
Eram 19 horas e 30 minutos.
Após o jantar, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vasco da Cama Fernandes.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 22 horas.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção dos Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, pois vou informá-los do tempo de que dispõem para intervir no debate: O Governo dispõe de 107 minutos, o PS de 44 minutos e 30 segundos, o PSD de 26 minutos e 10 segundos, o CDS de 9 minutos, o PCP de 64 minutos e a UDP de 17 minutos. Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Era para perguntar à Mesa se o Sr. Ministro Medina Carreira já estava inscrito.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças está inscrito há mais ou menos três horas.
O Orador: - A notícia, que tenho é de que antes do jactar estavam apenas inscritos dois deputados, que eram o Sr. Deputado António Guterres e eu próprio.
O Sr. Presidente: - Estavam inscritos o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Ministro da Habitação.
O Orador: - Sr. Presidente, queria pedir-lhe que confirmasse na lista das inscrições se assim é ou não, pois creio que os Srs. Ministros mão têm aqui nenhum privilégio de falar antes dos deputados.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito efectivamente tem razão.
Encontram-se inscritos o Sr. Deputado Sérvulo Carreia, o Sr. Deputado Jaime Gama, o Sr. Deputado Amaro da Costa e o Sr. Deputado Aires Rodrigues, que já falaram, o Sr. Deputado António Guterres, o Sr. Deputado Carlos Brito, a Sr.ª Deputada Carmelinda Pereira, que vão ainda usar da palavra, e só depois é que está inscrito o Sr. Ministro Mediria Carreira.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, gostaria ide perguntar à Mesa se será possível, estando eu inscrito em primeiro lugar, ceder o meu lugar ao Sr. Ministro Medina Carreira, aceitando a inscrição no fim da ordem das inscrições neste momento existentes.
O Sr. Presidente: - Com certeza que não há qualquer inconveniente, Sr. Deputado. Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
Risos.
O Sr. Ministro das Finanças (Medina Carreira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que, qualquer que venha a ser a evolução dos trabalhos até à votação, os Srs. Deputados e o Governo se encontram de acordo num ponto que diz respeito à importância de que se reveste para o País o problema das suas relações económicas externas. Eu diria que este é um problema prioritário, que é um problema grave e que é um problema cuja resolução depende, em boa parte, de factores que nos são estranhos. É um problema prioritário, porque sem o seu equacionamento e sem uma perspectiva da sua resolução não é possível gizar neste país quaisquer planos de natureza económica. Este condicionamento deriva da alta dependência económica em que o País se encontra em relação ao exterior e que é evidenciada pela estrutura das nossas importações.
Embora saiba que não é do gosto dos, Srs. Deputados o recurso a números, ele e, por vezes, indispensável para que as ideias fiquem suficientemente fundamentadas.
A estrutura das nossas importações em 1977, no período decorrido até Setembro, é a seguinte: em combustíveis gastámos cerca de 16% ou 17% das nossa» importações, em produtos aumentares 18%, em equipamentos 35% e em matérias-primas 25%. Estes números reflectem o grau da nossa dependência económica em relação ao exterior. Além de ser um problema prioritário, é igualmente um problema grave, porque o estrangulamento das nossas relações com o exterior de terminará necessariamente um agravamento da crise económica, com ela um agravamento da situação social e com ambas um agravamento da situação política; o agravamento de uma ente económica traduzida no aumento do desemprego e da inflação, não favorecendo a recuperação do Investimento e gerando a escassez de bens essenciais; uma crise social decorrente, da instabilidade e do descontentamento que tais factos instauram na população; uma crise política que sempre anda a par com as crises económicas e sociais.
Esta situação de dificuldade nas relações; com o exterior e que é bom que se tenha presente - e ir hoje referir este facto mais de uma vez aqui nesta Assembleia- não é. na realidade, um problema singular no que respeita a Portugal. Mas o que é relativamente singular no que. respeita ao nosso país é a intensidade com que o problema se afirma.
Se quisermos aferir a nossa situação em pagamentos correntes comparando com outros países, em termo.» de produto nacional bruto, nós verificamos que só há um pais na Europa que se encontra em por situação do que a nossa e que é a Noruega, mas esse dispõe de petróleo. E que em termos de percentagem das exportações o nosso défice da balança de pagamentos só encontra à sua frente a
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Turquia. Estamos, por conseguinte, em ambos os casos, em segundo lugar. Isto mostra a intensidade e a gravidade deste problema para o nosso país.
Este é um problema que como caracterizei em terceiro lugar, depende de factores que no todo ou em parte não controlamos.
É conhecida a influência que a recessão económica internacional tem sobre a nossa situação em matéria de relações com o exterior. De 1971 a 1973 as trocas entre países da OCDE cresceram a um ritmo da ordem dos 9%. De 1973 a 1976 cresceram a um ritmo ligeiramente superior a 1%. Isto quer dizer que os países com os quais mantemos mais intensas relações económicas se encontram, também, em relação de dificuldade, e o menor ritmo ou menor intensidade das relações entre eles decresceu nos termos espectaculares que referi. Este facto traz desconhecidas e indiscutíveis dificuldades à votação das nossas trocas com o exterior.
Outro facto que não controlamos e o que resulta dá Independência das antigas colónias. Como é sabido, nós chegámos, cerca do ano de 1970, a exportar cerca de 25% do total das exportações para territórios das amigas colónias. Devido às dificuldades nos pagamentos internacionais ao redor de 1973 exportava-mos 15% e neste momento exportamos cerca de 5%. Houve, portanto, uma quebra apreciável de exportações para os territórios das antigas colónias. A independência desses territórios determinou também que houvesse quebras nas remessas para o continente das pessoas que lá viviam, houve igualmente uma quebra no turismo, ou pode mesmo dizer-se que este desapareceu, assim como também houve uma quebra dos rendimentos dos capitais portugueses ai aplicados. A somar a tudo isto, e como reflexo da descolonização, temos que considerar também esse mal, que não só tem expressão económica como social, que foi o afluxo dos desalojados. Este fenómeno tem portanto, do ponto de vista de que me ocupo, incidências extraordinariamente pesadas.
Outro ponto que nós não controlamos e que causa sérios embaraços à nossa situação financeira com o exterior é o que respeita á subida vertiginosa dos preços internacionais Este fenómeno, traduzido num aumento mais acelerado dos preços daquilo que importamos relativamente aos preços do que exportamos, traduz-se sensivelmente no seguinte: enquanto em 1973 exportávamos certa quantidade de um produto para obter certa Quantidade de outro, neste momento temos de exportar essa mesma quantidade para obter apenas 75 % da quantidade do outro produto. Isso significa que se desvalorizaram as nossas exportações em termos relativos de cerca de 25 %. Naturalmente que os números disponíveis como aliás quase todos os números de que nós dispomos e como e frequente ver-se nos nossos debates, não carecem de um rigor extremo, apontam sim para ordens de grandeza e é neste sentido que tudo o que digo deve ser interpretado. No entanto, estes números devem pecar ainda pela influência que sobre eles exercerão fenómenos indiscutivelmente existentes na nossa sociedade actual, como os da sub e da sobre-facturação.
Tenho aqui uns números que gostaria de lhes dar e que dão talvez, uma ideia mais rigorosa do que vê passou nos últimos anos em matéria de encarecimento dos bens importados. Fiz uma amostra de quinze produtos, que lhes vou indicar quais são e verifiquei que o que importámos desses produtos em 1973 custou menos cerca de 33 milhões de contos do que aquilo que nos custou em 1976. E para que se tenha uma ideia realista das dificuldades que este problema nos apresenta, eu dir-lhe-ei que, quando falei nestes quinze produtos, referia a carne, o bacalhau, as batatas, o trigo, o milho, o arroz, o açúcar, o café, as oleaginosas, o algodão, as fibras têxteis, os combustíveis, os medicamentos, os automóveis e os tractores. Estas quinze categorias de mercadorias custaram em 1976 mais 33 milhões de contos do que em 1973. Isto significa que, se não tivessem custado mais este valor, quase que tínhamos a balança de transacções correntes equilibrada.
Naturalmente que a situação deficitária das nossas trocas cem o exterior verificada nos últimos anos traduziu-se numa subida bastante acelerada do nosso endividamento externo. O tempo de qui deponho é escasso e não quereria gastá-lo citando números, mas queria apenas dizer-lhes que neste momento, em 30 de Outubro, a nossa dívida externa total era de 200 milhões de contos e que a nossa divida pública externa era da 69 milhões de contos. Naturalmente que estas grandes se não tomam porque os 69 milhões estão incluídos nos 200 milhões.
Queria também esclarecer a Câmara relativamente a algumas palavras: que o Sr. Deputado Sousa Franco proferiu aquando da sua intervenção de ontem e que poderiam ter dado a ideia de que o endividamento público no exterior é de facto excessivo. Pois estou de acordo em que ele é excessivo, mas devo esclarecer que uma grande parte do crescimento desse endividamento resulta de garantias prestadas pelo Estado a financiamentos para investimentos nas empresas. Trata-se, portanto, de um ripo de obrigação que não nos causa preocupações de maior.
Relativamente a este fenómeno do endividamento, eu diria que este e quase um fenómeno planetário. Atinge países de diversos continentes, como, por exemplo, a Índia, na Ásia, a Argélia e o Zaire, na África, Portugal, a Espanha, a França, a Inglaterra, a Noruega, a Itália, a Grécia, a Turquia e outros, na Europa, o México, o Brasil, a Argentina e o Chile, no continente americano.
Este fenómeno do endividamento traduz-se ainda por números impressionantes, que eu vou referir em dólares, porque se os referisse em milhões de contos talvez tivessemos um susto maior. O endividamento dos países à escala mundial, exceptuando os países democratas de Leste, era de cerca de 175 biliões de dólares e o endividamento dos países das democracias populares era, há poucos meses, de cerca de 46 biliões de dólares em relação aos países do Oeste, segundo informação do sistema bancário.
Eu cito estes números e estes países para que se não tenha ilusão fácil, que tantas vezes é cultivada no nosso país de que nós somos na realidade um caso ímpar nesta matéria. Como vêem, países de situação geográfica diversificada e com os mais diversos regimes políticos, todos eles sofreram o embate deste problema que é o problema do enca-
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recimento dos produtos externos e da crise económica internacional. Poderiam extrair-se daqui duas questões, que ião as seguintes: será que em todos estes países foi a incapacidade governamental que gerou situações de endividamento espectacular? Será que naqueles países, que têm oposição, as oposições mobilizam toda a capacidade de resolução ciente problema? Naturalmente que seria estranho que assim fosse, em todo o caso é motivo para meditar.
A meditação que eu faço aponta para que o nosso fenómeno se reveste de uma acuidade especial, não porque tenhamos um endividamento grande, porque outros também o têm, mus porque o endividamento tem sido excessivamente rápido numa época em que os financiamentos são cada vez mais difíceis.
Quanto aos aspectos financeiros, naturalmente que, apesar das acusações provindas dos mais variados quadrantes e que naturalmente nós acatamos e tentamos - passe o termo - digerir, há uma política financeira face a esta situação. Poderá dizer-se que esta não foi totalmente eficaz, assim como naturalmente também os outros países têm as suas políticas financeiras, que as situações actuais apontam para o facto de que não foram totalmente eficazes.
Nós temos uma política orçamental que é do conhecimento dos Srs. Depurados e que, tentando traduzir-se num sentido restrito ou de contenção de despesas, especialmente das despesas para consumo, deu os seus resultados, em 1976, de 5 milhões de contos, pois era o que se esperava ter saldo negativo e apenas este «apenas» entre aspas, claro - houve 45 milhões. Neste ano de 1977, quando aqui estive para apresentar o Orçamento, referi-lhes para que o saldo negativo do sector público talvez viesse a ser da ordem dos IS a 19 milhões de contos; quando o Orçamento foi revisto, baixou-se para 15 milhões de contos; e esperamos, na realidade, apesar das dúvidas que nessa altura foram levantadas, cumprir o número que prometemos e anunciámos.
As cobranças das receitas, ao contrário daquilo que por vezes se diz, decorrem em termos relativamente satisfatórios e as despesas realizam-se à cedência prevista e com grandes esforços de contenção, que são conhecidos do público. Neste aspecto do sector público também lhes daria uma notícia detalhada da situação dos avales se para isso tivesse tempo, pois sei que isso è um facto que preocupa os Srs. Deputados, e desde já lhes digo que não preocupou menos o Governo. Posso igualmente dizer-lhes que também aqui houve uma melhoria muito sensível, que se traduziu já na inversão das posições das garantias externas e das garantias internas. Hoje é maior o volume externo garantido do que o volume interno. Quer isto dizer que o volume das garantias para investimento já é maior do que o volume das garantias dadas para cobertura de prejuízos ou para a solução de crises de tesouraria das empresas públicas.
Também tem havido uma política monetária e de crédito, como é sabido. Tem-se procurado que a expansão do crédito não atinja, e muito menos supere, uma taxa equivalente ao crescimento do produto mais taxa de inflação. Por outras palavras, tem-se pretendido que o credito não constitua um factor autónomo de agravamento da inflação. O sector público tem absorvido parte importante
do crédito concedido, e para -, isso contribuiu a impossibilidade de colocação, até esse momento, do valor pensado da emissão FIP e também as dificuldades que tem havido para equilibrar o sector da Previdência.
Os plafonds de redesconto do Banco Central têm vindo a ser diminuídos -, portanto a banca comercial vai dispondo de menos possibilidades de concessão de credito. A elevação das taxas de juro, que tem provocado e algumas compreensíveis dificuldades, filia-se em razões de carácter externo, no sentido da dificultar a especulação que se exerce no escudo com efeitos nocivos, digo mesmo gravemente nocivos, sobre a balança de pagamentos.
As razões internas resultam da necessidade de criar estímulos à poupança e de modo a evitarem em certa medida um consumo excessivo que nos crie embaraços.
A política cambial que tem sido seguida também e do conhecimento dos Srs. Deputados. Houve a desvalorização de Fevereiro, com o objectivo de aumentar a competitividade externa dos nossos produtos, remiam e de um ritmo de inflação mais acentuado em Portugal do que nos países com os quais mantemos relações.
Na política de investimentos, e como sabem, privilegia-se, ou vai tentar priveligiar-se mais acentuadamente os investimentos criadores de emprego e que se traduzam em menores gastos no exterior. Nas medidas directas de contenção das importações foram criados o depósito prévio e a contingentação e foram agravadas as sobretaxas e o imposto de transacções.
Há, portanto, no plano financeiro, todo um conjunto de actuações que têm vindo a ser desenvolvidas no mentido de obstar ao agravamento, com o objectivo de melhoria da situação da balança de pagamentos.
Como o tempo escassa, eu vou passar por cima de alguns pontos que gostaria ainda de focar. Queria apenas dizer duas palavras finais). Eu disse neste lugar, em 11 de Agosto de 1976, o seguinte:
A política cambial deverá hoje prevalecer sobre as outras, isto é, a vida do País deve subordinar-se às condições cambiais do momento.
Em 29 de Dezembro de 1976, aquando da discussão do Plano e do Orçamento, neste mesma Casa, tive a oportunidade de dizer o seguinte:
A situação presente reveste-se de características de extrema gravidade que exigirão, em futuro próximo, a adopção de posições de maior realismo por parte de todos nós. Ninguém se eximirá, perante o perigo da situação cambial, a assumir as responsabilidades que lhe competem. Tratar-se-á, então, de compreender o presente sem ambiguidades e sem fugas para salvar o futuro na honra e na independência.
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O problema cambial não tem, portanto, criado preocupações apenas nos últimos, tempos. Esse problema tinha sido apresentado como o mais grave da nossa vida quando o Governo apresentou o seu Programa. Poderia multiplicar citações daquilo tine disse a este respeito, mas penso que e, todavia, totalmente inútil.
Não tenho o gosto, e muito menos o direito perante um problema nacional, invocar alguma legitimidade pessoal. Impõe-se, em todo o caso, recordar aos Srs. Deputados da oposição, que por vezes me dão a honra da citação, ainda que fora do contexto, que desde a primeira hora disse ao País a verdade sobre a situação. Corri então o risco de ser mal compreendido mas quando a verdade é uma das alternativas, nunca hesito. Jamais ocultei os graves perigos que pairam sobre a nossa sociedade a partir de condicionantes da natureza financeira e económica. Sabem ainda que não proeuro ganhos de qualquer natureza, nem mesmo os políticos pessoais. Preocupo-me exclusivamente com a evolução da nossa terra, e a sorte das nossas gentes. Esse foi o imperativo de consciência que sempre me acompanhou nos duros dezasseis meses que levo de exercício do cargo.
A franqueza com que sempre lhes falei e a mesma com que hoje lhes dirijo estas palavras. Não pretendo fazer, neste momento, um apelo a um certo sentido do voto, também não sei qual vai ser o destino da moção de confiança, mas advirto, com a mesma sinceridade e transparência de sempre, que a queda deste Governo e o vácuo político que poderia seguir-se-lhe envolveriam perigos de alcance incalculável e imprevisível, certamente com risco grave para a democracia. Por estas razões, e como simples cidadão, peço aos Srs. Deputados que, antes de emitirem o seu voto, ponderem na enorme importância deste facto. Nenhuma saída haverá para a crise política se eu não for, ao mesmo tempo, um começo de solução para o problema das resoluções económicas externas.
O actual Governo tem obviamente soluções naturalmente discutíveis, para as sérias dificuldades que enfrentamos, mas precisa porém de tempo para vencer a dureza da conjuntura. E que ninguém se engane nesta matéria: se este Governo não levará dezasseis séculos para os resolver, também nenhum outro Governo que lhe suceda os resolverá em dezasseis.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E precisará da patriótica compreendo do todos para os sacrifícios que já ninguém evitará aos portugueses.
O problema não é. em iodo o caso, e aqui. deste Governo, não é sequer e apenas do partido que o apoia, mas sim o de uma nação inteira que neste momento contempla em expectativa, os seus legítimos representantes.
Aplausos dos Deputados do PS e de alguns do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Primeiro-Ministro. Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O anúncio da apresentação pelo Governo de uma moção de confiança e a fixação do debate que nos ocupa desde ontem criou no País uma enorme a legitima expectativa.
A conhecida ou pressentida gravidade dos problemas económicos e financeiros, a degradação progressiva da qualidade de vida dos portugueses, as renovadas ameaças do fascismo e da reacção, as grandiosas acções populares em defesa da democracia, das conquistas da Revolução e da independência nacional, as conversações entre o Governo e os partidos da oposição e o reflexo destas nos grandes órgãos da comunicação social - tudo tem contribuído para que se aguardasse da palavra do Governo e do seu principal responsável, no momento em que jogam o seu destino, uma apreciação critica, autocrítica, da política até agora realizada e a proposta de uma nova orientação, de uma nova política para enfrentar e vencer os grandes problemas que se colocam ao povo e ao País.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Afinal, ouvidas a declaração política do Primeiro-Ministro e as questões para hoje se reclama a confiança da Assembleia da República, tudo se passa como se o País, o povo, os trabalhadores, os partidos, todos estivéssemos redondamente enganados.
Afinal, tudo se passa como se tivéssemos a melhor política possível, o governo mais sábio e tão engenhoso que, sendo minoritário, produz todas as maiorias possíveis.
Afinal, tudo se passa como se urgentes, urgentes, fossem apenas estas duas questões: o Primeiro-Ministro e o Governo ficam ou vão embora: negociamos ou não cem o FMI. O resto: toda a orientação política a estratégia económica que a comanda - o Orçamento, o Plano, a política social, tudo enfim, discutir-se-á depois.
A proposta de reduzir o debate inadiável sobre a crise política, económica e social e a procura dos caminhos para a sua superação às duas perguntas colocadas pelo Governo, é completamente inaceitável. Inaceitável mesmo para quem a formula.
O debate testemunha que nenhuma tentativa de desviar as atenções para outros problemas e questões, nenhum esforço para artificializar e retirar conteúdo real e concreto a este debate e ao juízo que esta Assembleia vai formular, pode escamotear esta questão crucial hoje fortemente presente na vida nacional: a necessidade de substituir uma política que fracassou em todos os objectivos que dizia ter nomeadamente abrir caminho à recuperação económica e que só obteve algum sucesso nos objectivos que dizia não ter: atacar as conquistas da Revolução, pôr em perigo a democracia e a independência nacional
Aplausos do PCP.
Aceitemos, porém, as duas perguntas do Governo como pomos de referência. A pergunta sobre a manutenção do Governo e da sua fórmula actual leva em linha recta à abordagem da questão das
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alianças de facto do Governo e do PS com a direita. A questão das negociações com o FMI só pode ser encarada no quadro da definição de uma autentica política de recuperarão económica, no quadro de uma plataforma para vencer a crise. As duas pressupõem uma terceira: a opção inequívoca sobre as forças que estão interessadas e empenhadas em concretizar uma tal política e uma tal plataforma. Tais as três questões que em nosso entender importa abordar e esclarecer.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os acontecimentos dos últimos meses puseram em evidência os resultados extremamente nefastos da teoria suicida, cara, durante muito tempo, ao Governo e ao PS, teoria segundo a qual a cedência à pressão da reacção era necessária para descomprimir a atmosfera política, retirar argumentos à direita, - apaziguar a conspiração antidemocrática.
A teoria da cedência foi a cobertura ideológica para a prática da aliança de facto com a direita por parte do Governo e do PS e tem a sua expressão política na recuperação capitalista, latifundista e imperialista.
A violência que se ostenta nas recentes manifestações fascinas, o ódio que transborda de toda a imprensa reaccionária, a ofensiva generalizada da reacção centra a Constituição e as instituições democráticas, tal é o «apaziguamento» conseguido com a política de cedência à direita.
A quebra da produção provocada pelos ataques e destruições na Reforma Agrária e pela devolução de dezenas de empresas ao patronato sabotador, o agravamento de todos os indicadores económicos fundamentais, tal é um resultado patente da política de recuperação capitalista, latifundista e imperialista.
Foi em obediência ás pressões e exigências da direita e em aliança com ela que o Governo e o PS assumiram, a responsabilidade do desencadeamento e desenvolvimento da contra-revolução legislativa, grande operação destinada a criar os instrumentos jurídicos de uma prolongada e persistente ofensiva contra as transformações económicas e sociais realizadas no processo da revolução portuguesa.
Foi em obediência às pressões e exigências da direita, em aliança com ela, que o Governo e o PS lançaram as traves mestras de uma política 'económica e social desastrosa -a política dos pacotes - toda ela orientada para fazer recair sobre os trabalhadores: e outras camadas laboriosas o preço da crise económica e financeira.
Foi em obediência às pressões e exigências da direita, e em aliança com ela, e a pretexto da recuperação económica e de restabelecer a «confiança» do grande patronato que o Governo e o PS lançaram o 1.º pacote: fizeram aprovar a lei da delimitação dos sectores público e crivado: a Lei Barreto contra a Reforma Agrária e a lei dos senhorios ricos, a lei contra o controlo de gestão e os direitos das comissões de trabalhadores: a lei das indemnizações aos monopolistas e agrários: a lei da liberalização dos despedimentos, um vasto e apertado conjunto de medidas e legislação que se eram inteiramente coerentes em termos de estratégia de restauração do poder do grande capital - e dos agrários, nada tinham que ver com as necessidades e problemas objectivos da económica portuguesa, antes as contrariavam frontalmente.
Entregar empresas intervencionadas ao patronato sabotador é exactamente o contrário da estabilidade e dinamização do aparelho produtivo que o País precisa.
Entregar terras a agrários é exactamente o contrário do esforço que se impõe para tornar o Pais auto-suficiente em produtos alimentares.
Entregar milhões de contos pertencentes ao povo português a monopolistas e a agrários que sustentaram o fascismo, é exactamente o contrário de uma política de investimentos voltada para o aumento da produção nacional voltada para garantir pão e trabalho aos Portugueses, e progresso e desenvolvimento a Portugal.
Despedir trabalhadores em massa, lançá-los no desemprego e na miséria, é exactamente o contrário do integrai aproveitamento dos recursos humanos nacionais de que o País necessita para sair da crise e levar por diante a recuperação económica.
Limitar, restringir, mutilar, esvaziar de conteúdo os direitos constitucionais dos trabalhadores é exactamente o contrário da mobilização da força social mais determinante no processo da recuperação económica do País, e mais vitalmente empenhada na defesa e prosseguimento da democracia portuguesa.
Empurrar o Governo e o PS para a realização de uma política completamente divorciada das aspirações dos trabalhadores, fazê-lo pagar um pesadíssimo preço em termos de influência política e social, erigir o preconceito anticomunista em menor denominador comum entre dois partidos de direita e um partido democrático, enfraquecer as linhas de defesa da democracia portuguesa, para depois num ambiente de crise geral e de desastre financeiro iminente, promover o assalto ao poder - tal foi, e é a táctica da direita e da reacção, em que o Governo e o PS se deixaram conscientemente envolver.
No curto espaço de alguns meses desvendaram-se, pública e abertamente, os verdadeiros objectivos e ambições da direita e da reacção: assaltar o poder ou forçar de mediato a sua partilha como forma de coroar e executar até às últimas consequências a contra-revolução legislativa, acelerar o ritmo e a violência da recuperação capitalista, agrária e imperialista, colocar toda a máquina do Estado ao serviço do esmagamento da legítima resistência dos trabalhadores e do povo a uma política de liquidação da democracia portuguesa, restaurar finalmente o poder económico e político do grande capital (associado ao imperialismo) e dos latifundiários.
A ampla, determinada, combativa e legitima resistência dos trabalhadores à ofensiva contra os seus direitos e contra as conquistas da Revolução, a crescente tomada de consciência por parte - de largas camadas da população e vastos sectores democráticos das ruinosas consequências da política de recuperação capitalista e agrária; o sereno mas intransigente exercício dos direitos e liberdades democráticos pelo movimento operário e popular: a justa convicção dos militantes e eleitores socialistas de que uma coligação aberta do PS com a direita seria o seu completo suicídio como partido democrático - todos estes factores que, no seu conjunto, exprimem de algum modo as forças poderosas que estão do
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lado da democracia portuguesa - representam para a direita um obstáculo intransponível para a realizarão das suas ambições no quadro do respeito da Constituição e das instituições democráticas.
A arrogância que nos últimos meses, a direita apresenta, as ameaças que brande, as intrigas que move as pressões ilegítimas em que se desdobra - sendo sinal da agressividade com que procura disfarçar o seu isolamento social, sendo ainda uma nova tentativa de chantagem sobre o PS, tão sobretudo a expressão do seu combate, agora aberto e frontal, contra o regime e as instituições democráticas consagradas na Constituição.
Aplausos do PCP.
Quer se trate do claro propósito anunciado por Sá Carneiro e não desmentido pelo PPD de forçar a alteração da Constituição (através da sua revisão ilegal antes dó prazo constitucionalmente permitido) quer se trate da evidente intenção manifestada pelo CDS de a arrumar na prateleira, e a submergir com um vasto conjunto de legislação ordinária quer se trate arada da exigência feita pela CIP da revisão do quadro legal democrático - tudo isto é, ainda e sempre, a expressão da mesma profunda incapacidade da direita de aceitar e acatar o quadro do regime democrático.
Formalmente, é a questão da confiança no Governo que a Assembleia da República tem vindo a apreciar.
Mas o verdadeiro conteúdo deste debate é necessariamente muito mais amplo porque, mais do que decidir da confiança eu não na fórmula do governo - e insistimos que não é essa a questão que prioritariamente colocamos - se trata sobretudo de julgar uma política.
O Governo é parte altamente responsável, em virtude da sua política, pela gravíssima situação a que se chegou, mas o PPD, o CDS e toda a reacção...
Protestos do CDS.
.. não podem fugir ás suas responsabilidades...
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Reaccionário e o Sr. Deputado!
O Orador - ... como pretenderam ao longo do debate, porque a política do Governo foi. nos pontos essenciais, aquela que eles exigiram, reclamaram, apontaram, apoiaram e aplaudiram.
Aplausos do PCP.
Não restando dúvidas de que os eixos fundamentais da política do Governo foram determinados em aliança com a direita, são em consequência também as próprias concepções da direita que estão hoje em julgamento quando se aprecia a situação económica financeira e social do Pais.
Não venham, pôs, hoje o PPD e o CDS falar candidamente de recuperação económica...
O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - Olhe que não!
O Orador: - ... oferecer-se como reserva de competências para a alcançar, porque está na memória dos trabalhadores e do povo o seu apoio a cada uma e a todas as medidas visando alterar violentamente as novas realidades económicas e sociais criadas pela Revolução e que são uma base indispensável para a recuperação económica do País.
Não venham, pois, hoje o PPD e o CDS chorar lágrimas de crocodilo perante as justas inquietações o preocupações dos Portugueses - a vertiginosa subida dos preços, a diminuição dos salários reais, o desemprego -, porque está na memória de todos a lembrança de que apoiaram a liberalização dos despedimentos a ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, festejaram alegremente o 1.º pacote, inste símbolo de uma política orientada para o aumento do custo de vida, o crescimento do desemprego e a diminuição dos salários reais dois trabalhadores.
Não venham, pois, hoje o PPD e o CDS, fazendo ecoar nesta Assembleia a estratégia da CIP e da CAP, proclamar novamente que é preciso estabelecer (ainda mais!) a «confiança» do grande patronato reaccionário, isto é, não venham dizer que é necessário triplicar as indemnizações, intensificar ainda mais o; despedimentos e o desemprego, agravar as dificuldades e acelerar as falências de centenas de pequenas e medras empresas, colocar os d Mineiros públicos ao serviço da restauração do poder económico e político dos que sustentaram o fascismo.
Aplausos do PCP.
Apesar da negativa e dispensável experiência que o Portugal democrático tem vindo a fazer da teoria das cedências e da prática das alianças de facto com a direita, apesar de estar hoje completamente demarcado o carácter falso e ilusório de tais concepções, o Sr. Primeiro-Ministro voltou ontem a querer colocar o seu governo e o seu partido no «lugar geométrico» das contradições da sociedade portuguesa. Não disse, no entanto, qual o conteúdo concreto de tal posição, não disse contudo que síntese e que compromisso pensam o Governo e o PS fazer entre posições constitucionais e posições anticonstitucionais, entre respeito das novas realidades económicas e sociais construídas no curso da Revolução portuguesa e a intenção clara de as destruir, entre a defesa das instituições e do regime democrático e a conspiração contra o regime e as instituições democráticas.
A própria apresentação pelo Governo da moção de confiança e a situação que a tanto conduziu, ai estão para demonstrar que a teoria das cedências, inspiradora da política do Governo PS, foi completamente derrotada pela vida e pela experiência.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. s Deputados, Srs. Membros do Governo: A apresentação pelo Governo e pelo PS do «Memorando aos partidos políticos e aos parceiros sociais» e a resposta do PCP - «propostas para a elaboração de uma plataforma» - abriram um curto período de negociações entre delegações do meu Partido e dele-
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gações do Governo e do PS, negociações que se encontram suspensas por iniciativa destes.
Na apreciação que delas fazemos, consideramos positivo o exame conjunto de problemas, o diálogo, a ampla troca de impressões e mesmo, em algumas questões uma certa aproximação de pontos de vista.
Consideramos também positivas as afirmações públicas sobre legitimidade constitucional de uma aliança PS-PCP e o repúdio de insinuações - quanto a um eventual golpe de Estado que em tal caso teria lugar.
Da parte do PCP, norteado pela defesa intransigente dos interesses nacionais, houve o sineiro e manifesto desejo de evitar o agravamento dos problemas políticos, económicos, financeiros e sociais e de encontrar para eles uma saída e uma alternativa democrática e patriótica.
O PCP, desde há muito apela ao exame conjunto, com todas as forças e sectores democráticos interessados na defesa do regime constitucional, sem qualquer discriminações, da possibilidade, de uma plataforma que assegurar a recuperação económica e a consolidação das liberdades políticas e da independência nacional.
Defendemos a urgência de ser definida uma real plataforma democrática, constitucional e patriótica de resposta à grave situação que ameaça a economia, o regime democrático e a independência nacional.
Opusemos á desastrosa política de recuperação capitalista, latifundista e imperialista, conduzida pelo Governo do PS com o apoio e o aplauso dos partidos da direita, uma alternativa democrática, assente, indissociável da defesa das conquistas da Revolução, das transformações socioeconómicas que fazem parte do regi-me democrático, do respeito pela Reforma Agrária, as nacionalizações e o controlo de gestão, do respeito absoluto pala Constituição da República.
Ao longo do ano, e particularmente nas reuniões do Comité Central do meu Partido de 3 e 4 de Abril, de 31 de Julho e de 24 de Outubro e na Conferência do PCP para a Recuperação Económica, se por um lado púnhamos em evidência as consequências da política do Governo, designadamente o agravamento dos défices das balanças comerciais e de pagamentos, a progressão do esgotamento das refervas e do endividamento externo, o agravamento brutal das condições de vida dos trabalhadores, a estagnação da produção nacional - por outro lado apresentámos propostas concretas e - urgentes paira a resolução da crise, através de um grande esforço nacional baseado nos recursos o nas energias internas.
Não espanta assim que o PCP (que há longo tempo vem propondo e defendendo a urgência de uma plataforma que defina e integre uma nova política, que há longo tempo vem propondo as unhas fundamentais da alternativa democrática e de recuperação económica), tenha considerado e examinado atentamente o memorando: que o tenha aceite, na conjuntura presente, como ponto de partida para uma imediata negociação com vista ao estabelecimento de um acordo até à data de 30 de Novembro: e finalmente, que tenha apresentado um conjunto de propostas, dando sequência ao diálogo que se anunciava e formalizando os seus pontos de divergência e as omissões que encontrou naquele documento.
Seria legítimo esperar do Governo e do PS a rápida consideração daquelas propostas e a urgente decisão sobre as matérias nelas contidas.
O Governo apresentou o seu memorando em cima da hora, a menor de um mês da discussão e votação das Leis do Plano e do Orçamento, em cima do recomeço das negociações com o FMI, no limiar do ponto de ruptura cambial.
O Governo apresentou o seu memorando com o curtíssimo prazo de treze dias e com o objectivo expresso de concretizar um ou vários acordos globais, parcelares ou pontuais «conforme os casos e as possibilidades que se abrissem».
O Governo apresentou o seu memorando no pleno conhecimento e constatação do fracasso da política de recuperação capitalista, latifundista e imperialista. Apresentou o memorando quando é evidente a total incapacidade dessa política para resolver problemas nacionais: quando se pode calcular o défice da balança comercial no corrente amo em cerca de 100 milhões de contos, o da balança de pagamentos o dobro do previsto, e a taxa de inflação em mais de 30 % (também o dobro da previsto); quando o desemprego atinge cerca de meio milhão - de trabalhadores; quando os encargos da dívida pública passaram de 14 para 25 milhões de contos; quando, depois de sucessivas vendas de ouro (60 t estão definitivamente perdidas), mais de metade do que nos resta já está hipotecado e se noticia que, na ausência do grande empréstimo e da aceitação das condições do FMI, todo o ouro desapareceria no prazo de um ano.
O Governo apresenta o seu memorando num momento em que a sua política suscita o protesto e a oposição de cada vez mais largas camadas da população e centenas de milhares de trabalhadores descem à rua, manifestando-se pela defesa das conquistas da Revolução e da independência nacional, pela defesa da Constituição da República, por uma nova política que sirva e defenda os interessei do povo português e particularmente das massas trabalhadoras.
Por último, o Governo apresenta o seu memorando quando aumenta a arrogância de forças fascistas e fascizantes e se intensificam os ataques à Constituição e à ordem democrática, quando os partidos da direita reaccionária exigem a rápida destruição das transformações democráticas alcançadas com o 25 de Abril e a restauração do poder económico e político dos monopólios (associados ao imperialismo) e dos latifundiários.
Tudo, afinal, circunstâncias nas quais seria legitimo esperar repetimos que o Governo e o PS se apresentassem com ideias claras e uma vontade política determinada e as demostrassem cem a decisão urgente sobre as propostas apresentadas pelo PCP.
Só que, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. membros do Governo, Srs. Deputados, só que no decurso das negociações, o Governo e o PS não demonstraram, nem manifestaram - como se anunciava e se esperava - a real vontade e à imperiosa determinação política de chegar a acordos, mesmo
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que pontuais ou parcelares, que abrissem caminho a elaboração de uma plataforma.
O Sr. Primeiro-Ministro na intervenção que aqui ontem produziu, passa por este assunto como gato por bradas. Limita-se a afirmar que tais acordos não foram possível, nada adiantando sobre as rabões, incidentes e dificuldades que se apresentaram e que eventualmente pudessem justificar o impasse.
Nada diz - e seria isso o que se esperava que fizesse sobre quais os pontos concreto -, de divergência entre as propostas contidas no memorando e as respostas que recebeu de cada um dos partidos políticos.
Repare-se que não esta, nem estava em causa na conjuntura em que foi apresentado o memorando e tendo em conta a sua formulação, a elaborarão de uma plataforma com mais do que um partido. Ainda ontem o Sr. Primeiro-Ministro aqui reafirmou, respondendo a Questões postas pela bancada do PSD; que o acordo poderia ter sido feito com um só partido.
Não colhe, por isso, o que de alguma forma se poderia pretender fazer deduzir da afirmação de que as respostas dos partidos «são profundamente contraditórias entre si», sendo a «dificuldade de dialogo manifesta» e a «busca de um entendimento [...] ultradifícil e demorada».
Da nossa parte, esclarecemos que não fazíamos depender o nosso acordo com o Governo e com o PS e a assinatura de uma plataforma da exclusão do acordo e da assinatura de quaisquer outras forças políticas ou sociais. Fizemo-lo na certeza de que se considerássemos poder subscrever uma plataforma era porque entendíamos que ela serviria os interesses do povo e do País.
Ao contrário, a direita reaccionária, os partidos PPD/PSD e CDS, fazem exigências e impõem condições sobre os participantes da plataforma, afirmam a necessidade, de excluir o PCP e os trabalhadores.
Fazem-no, porque não querem servir o povo e o País, mas os interesses do grande capital, dos monopólios, dos latifundiários, do imperialismo.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Outra vez?
O Orador: - Fazem-no porque não querem uma nova poética de recuperação económica, mas o aprofundamento da política desastrosa de recuperação capitalista, latifundista e imperialista, em ontem à restauração do poder político e económico dos monopólios (associados ao imperialismo) e dos latifundiários.
O PPD/PSD e o CDS, ao mesmo tempo que exigem arrogantemente a partilha do poder e procuram fazer capitular a direcção do PS, apontam abertamente para a liquidação das conquistas da Revolução de Abril e para a revisão da Constituição da República.
O PPD/PSD e o CDS não querem qualquer plataforma de saída da crise, não apresentam qualquer alternativa, querem afinal e só o conluio que lhes permita explorar e servir-se da crise em proveito próprio.
Aplausos do PCP.
E só não vê isto quem não quiser ver!
Para os trabalhadores portugueses, para amplas camadas e sectores da população portuguesa, a questão central está colocada com clareza e evidência: ou se define- uma nova política, na base da defesa das conquistas da Revolução, da defesa da Constituição e no respeito dos ingresses e direitos dos trabalhadores - e então será possível a recuperação económica, na base de um grande esforço nacional -, ou então prossegue e aprofunda-se a política de recuperação capitalista, latifundista e imperialista, com o agravamento da crise, a rotura cambial à vista, os perigos para a democracia e a independência nacional.
Aquilo que é caro para, o povo português não pode ser um equívoco para o Governo e o PS, não pode ser por eles iludido ou ignorado.
O Governo e o PS, abstendo-se de manifestar uma intenção séria de chegar a acordos com o PCP que abrissem caminho a uma plataforma, furtando-se às responsabilidades que a conjuntura presente lhes impunha, constituíram-se numa grande responsabilidade perante o povo português.
A teoria do lugar geométrico, de que nos falou ontem o Sr. Primeiro-Ministro, não pode levar o PS a ignorar o que reconheceu quando apresentou o memorando: que a plataforma da saída da crise é uma exigência imediata e decorrente da gravíssima situação que vivemos.
O PCP apresentou propostas perfeitamente inseridas nos interesses do povo e do País e mostrou-se firmemente decidido e empenhado em esgotar as possibilidades de elaboração de uma plataforma.
No plano político, aceitámos e propinemos que a base da plataforma fosse o respeito absoluto pela Constituição, o respeito pelos órgãos de soberania, a manutenção nos seus actuais limites das diversas formações económicas (nacionalizada, privada, cooperativas, empresas em autogestão e unidades colectivas de produção). Ao mesmo tempo que nos propúnhamos formular propostas concretas formalizando os temos de uma «pausa» relativa aos limites actuais das formações económicas, sublinhávamos que o acordo neste ponto tomaria extraordinariamente mais fáceis acordos nas restantes matérias.
No plano económico e financeiro, rejeitámos a falsa alternativa colocada no memorando, de que ou se aceitava o grande empréstimo do FMI e as condições que lhe querem pôr a reboque, ou ao fim de um ano teríamos esgotado totalmente as nossas reservas. Defendemos em contrapartida a possibilidade de adopção de uma política nacional e de um esforço nacional assente em duas direcções fundamentais: o aumento de produção (de, forma a substituírem-se o mais possível artigos importados por artigos de produção nacional e a aumentarem as exportações) e a redução dias importações (com prioridade para os artigos sumptuários ou cujo consumo possa ser facilmente dispensável). Aceitando declarar que seja considerado como objectivo prioritário a redução dos défices e a redução significativa do actual nível de inflação, propusemos a inclusão na plataforma de objectivos da política económica e financeira: em 1.º lugar, a promoção da produção nacional (estimulando em particular os sectores assentes em compo-
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nentes internas e a produção nacional de produtos importados e não fixando limite ao crescimento do produto interno); em 2.º lugar, uma política de comércio externo assente na contingentação das importações de bens não essenciais, acordos de compensação, compras a credito, promoção e diversificação das exportações; em 3.º lugar, uma política de créditos ligada às linhas de promoção da produção nacional, com critérios selectivos, revisão das taxas de juro e bonificações para os sectores produtivos designadamente pequenas e médias empresas. Reforma Agrária e pequenos e médios agricultores.
No que toca às negociações com o Fundo Monetário Internacional, dada a situação a que chegamos, concordámos com o princípio do prosseguimento das negociações, na base, por um lado. Já aceitação exclusiva da condição de redução dos défices (das balançais comercial e de pagamentos) e mesmo de redução do défice corrente do Orçamento Geral do Estado e do ritmo de inflação e por outro lado da não aceitação de condições relativas a limitação da expansão económica, à política de emprego, à liberalização no imediato das importações, à desvalorização do escudo, às taxas de juro, às estruturas socioeconómicas, ou a quaisquer outros aspectos da política portuguesa cuja debate compete exclusivamente aos órgãos de soberania do nosso país. A rejeição, afinal. das condições que apontam e impõem uma política conducente ao agravamento da crise e que são atentatórias dos interesses, da independência e soberania nacionais.
Finalmente, no plano social, propusemos a manutenção geral do poder de compra dos trabalhadores, a resposta favorável a reivindicações maus urgentes, bem como a adopção de medidas contra os despedimentos e o desemprego.
Estes são, sr. Presidente e Srs. Deputados, os termos abreviados da resposta do PCP.
Por que razão neste conjunto de propostas não foi possível concretizar um acordo, nem sequer em relação a um só ponto? Não concordam o PS e o Governo com a necessidade de manutenção do poder de compra? Ou pretendem continuar a seguir uma política de degradação dos salários reais? Não concordam o PS e o Governo com a manutenção dos actuais limites das formações económicas, como aliás afirmavam no memorando? Será que pretendem prosseguir uma política de destruição as conquistas da Revolução? Não concordam com o aumento da produção nacional como forma prioritária de desenvolver o ataque aos graves problemas nacionais, designadamente os défices da balança comercial e de pagamentos? Não concordam que no mesmo sentido um objectivo prioritário seja a redução das importações?
O PS e o Governo conhecem os sentimentos que milhares e milhares de portugueses, designadamente os trabalhadores, manifestaram no sentido de ser definida uma nova política. Sabem eme, sobre a necessidade e urgência destas medidas, existe uma forte corrente de opinião.
Não parecem ser seguramente assim as dificuldades que eventualmente existam em torno das questões postas que manifestaram o PS e o Governo.
Amarrados aos compromissos e às consequências da sua política, cercados e vigiados pelos que lhes apontaram o caminho, o reclamaram, o apoiaram e aplaudiram, o PS e o Governo actuam afinal como se não tivessem compreendido ainda a extensão dos perigos que pendem sobre a pátria portuguesa e sobre a democracia, e constituem-se, pela ausência de uma vontade política clara, na grave responsabilidade de facilitar as manobras e provocações da reacção e as ruas exigências, para que seja constituído um governo abertamente reaccionário.
Ouvimos aqui ontem o Sr. Primeiro-Ministro afirmar que o PS não faria obstrução de principio e sistemática a um governo que chamou de «convergência democrática», um governo «PPD, CDS e independentes».
Ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro afirmar que se lhe fosse pedido, aconselharia a convidar o presidente do PPD para formar governo.
Nós dizemos: esse é o caminho do capitulacionismo e do demissionismo.
Recusando um acordo possível com o PCP e com QS trabalhadores, o Governo e o PS cedem de novo as exigências e chantagens da reacção e podem abrir-lhe objectivamente as portas do poder.
Aplausos do PCP.
Colocando a falsa alternativa de que «ou decide sozinho em relação a toda a política ou descarta-se das responsabilidades», o Governo e o PS põem em grave risco os interesses dos trabalhadores e do povo português, da democracia o a independência da Pátria.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. membros do Governo: Confrontando com a crescente impopularidade da sua política, sujeito pela direita a um apertado cerco que ele próprio estimulou, o Governo proeurou manifestamente nas últimas semanas alterar a imagem da real situação defensiva em que se encontrava, procurando passar de réu a juiz, de acusado a acusador, de responsável a vítima.
O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - LÁ isso é verdade!
O Orador - Mas a verdade é que não bastam algumas palavras justas para modificar a situação e dar garantias de uma real mudança de atitude. A verdade é que os problemas são tão profundos, as responsabilidades do Governo no seu agravamento tão grandes, que algumas positivas declarações se chocam frontalmente com a realidade.
Colocando à Assembleia dá República a moção de confiança e colocando nos termos que são conhecidos, o Governo pretendeu fazer crer que as responsabilidades são agora dos partidos da oposição, que é a Assembleia da República, no seu conjunto, que tem de fazer a sua opção.
Poder-se-ia dizer que o Governo, de algum modo, se comporta como se a questão que dominasse o quotidiano dos Portugueses, como se a questão mais discutida nas fábricas, nos campos, nas empresas, no conjunto da vida nacional, como se as inquietações e as expectativas que percorrem a sociedade portuguesa, fossem, apenas e exclusivamente uma questão de aritmética parlamentar.
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Manifestamente, é outra a realidade. O que domina a vida nacional o que se afirma nos sentimentos e convicções dos trabalhadores e dos democratas, o que se constitui rapidamente em grande aspiração nacional, é a ampla consciência da necessidade do encontro de soluções positivas para as soluções fracassadas, de definição e concretização de uma política democrática, fiel aos ideais e realizações da Revolução de Abril, que substitua uma política que se desmoronou exactamente porque se voltou contra os valores, a experiência, as esperanças e as raízes da Revolução portuguesa.
Aplausos do PCP.
E é por isso que, perante o povo português e perante o País, na hora actual; quem tem de assumir as suas responsabilidades e fazer a sua opção é, não tanto esta Assembleia, mas o Governo e o Partido Socialista.
Ao Governo e ao PS, a necessidade de optar: ou a lúcida tomada de consciência da grave situação do País o das suas responsabilidades ou o prosseguimento no caminho das ambiguidades 'insustentável, das ilusões suicidas.
Aplausos do PCP.
Ao Governo e ao PS, a necessidade de optar, ou a mobilização dos recursos e energias nacionais, as reservai inesgotáveis de patriotismo e generosidade dos Portugueses, e o seu desejo de intervenção é participação na reconstrução do País; ou uma política rotineira, de feição administrativa, descrente, fatalista e subserviente perante as imposições externas, uma política vencida ã partida porque temerosa da iniciativa popular, distante das aspirações populares, oposta aos interesses vitais do povo trabalhador e da democracia portuguesa.
Aplausos do PCP.
Ao Governo e ao PS, a necessidade de optar: ou uma política baseada no respeito das formações económicas existentes, do seu peso e dinâmica próprias, voltada para a recuperação económica, para um grande esforço nacional para aumentar a produção, reduzir e substituir importações, garantir condições de vida digna aos Portugueses: ou uma política voltada para a violenta destruição das nacionalizações, da Reforma Agrária, do controlo de gestão, em favor da restauração do poder do grande capital e dos agrários, para o agravamento das condições de vida dos trabalhadores, a desagregação do processo produtivo, a recessão e o desastre económico e financeiro.
Ao Governo e ao PS, finalmente, a necessidade de optar: ou o apoio dos trabalhadores e de todas as camadas laborais a uma política democrática, a cooperação e entendimento dos democratas e dos patriotas portugueses fiéis à Constituição e ao regime democrático; ou as prisões, ameaças e chantagens dos grandes capitalistas e agrários, do imperialismo, das forças que os representam no plano político e social, contra o regime e as - instituições democráticas. contra a Constituição, contra o 25 de Abril.
São estas as opções que o povo e o País esperam e recamam que o Governo e o PS façam ao interesse nacional, no interesse da democracia portuguesa, no interesse do seu futuro como partido democrático.
Os trabalhadores e os democratas não compreenderão que o PS adie tais opções, por sujeição à campanha contra a «maioria de esquerda» movida pelos partidos da direita.
Os trabalhadores e os democratas não compreenderão que o PS aceite que personalidades que viram os seus sonhos e ambições políticas abruptamente frustrados e interrompidos com a madrugada libertadora do 25 de Abril venham decretar a proibição de os dois únicos parados democráticos vindos da resistência ao fascismo, se entenderem e cooperarem.
Aplausos do PCP e de muitos deputados do PS.
Os trabalhadores e os democratas não compreenderão jamais que os derrotados sucessivamente em três eleições gerais possam impedir a aproximação de pontos de vista e o encontro de soluções democráticas para os problemas nacionais entre doas partidos que representam a maioria do eleitorado.
Aplausos do PCP.
Os trabalhadores e os democratas não compreenderão que o PS, apesar de colocado nestes dias perante os ataques à Constituição, os planos, a intriga, as ameaças da direita, parte em reconhecer que se é Governo o deve, não apenas a ter sido o partido mais votado, mas irrefutavelmente a que das eleições de Abril de 1976. não saiu a maioria de direita que o PPD e o CDS davam como certa e segura, mas sim uma folgada maioria de socialistas e comunistas.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como tivemos ocasião de relembrar ao longo deste debate, a acção política do PCP determina-se pelo objectivo central de contribuir para o encontro de uma solução democrática que dê resposta à gravíssima crise económica, financeira, política e social que o País enfrenta.
No longo e difícil caminho percorrido até este momento, o que orientou as nossas propostas foi a consciência profunda de que os interesses dos trabalhadores e de todas as camadas laboriosas, e os interesses de Portugal como país livre, democrático e independente, exigiam, dia a dia com maior premência, a elaboração de uma plataforma democrática para vencer a crise, sair das dificuldades actuais, percorrer a larga estrada da recuperação económica, do progresso social, da construção de uma vida melhor mais feliz para os portugueses.
Este debate dá mais razão à razão que nos move, já ainda mais sentido aos nossos esforços, confirma inteiramente a justeza da nossa orientação.
Neste sentido, desejamos aqui declarar solenemente que, até ao momento da votação e depois dela e independentemente, do seu resultado, o PCP manterá, de acordo com a sua posição construtiva e patriótica, a completa abertura e disponibilidade para prosseguir o exame dos graves problemas nacionais, para prosseguir as negociações, para prosseguir a busca de acordos concretos que abram caminho a uma solução democrática e patriótica, que corresponda as aspirações dos trabalhadores e do povo portu-
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guês, ao objectivo da defesa e consolidação da democracia portuguesa, ao respeito e aplicação da Constituição da República e à salvaguarda da dignidade e independência nacional.
Aplausos do PC P.
Entretanto, sublinhamos uma vez mais que te não obtiverem êxito os esforços que continuamos a fazer para a elaboração de uma plataforma que consagre uma nova política e sirva de base à constituição de um novo governo, o PCP entende que a outra alternativa democrática e constitucional que garante os interesses do povo e a defesa da democracia é a formação de um governo de gestão e a realização de eleições gerais antecipadas que permita ao eleitorado pronunciar-se inequivocamente por uma política que salvaguarde a democracia, as conquistas da Revolução e a independência nacional.
Aplausos do PCP.
Neste momento difícil da vida nacional reafirmamos solenemente a nossa confiança de que a iniciativa e a luta dos trabalhadores e das massas populares, a aproximação, o entendimento e a cooperação entre todas as forças e todos os portugueses devotados à causa da liberdade e da Pátria, manterão aberto para Portugal o caminho da construção de um presente melhor e de um futuro de liberdade, democrático e socialista.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sérvulo Correia, tenha a bondade.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.
Desejo, em primeiro lugar, protestar contra as referências inverídicas e infundamentadas que o Sr. Deputado Carlos Brito acaba de fazer em relação a pretensas posições do Dr. Sá Carneiro e a pretensas omissões sobre essas acusações infundadas por parte do meu próprio partido.
O Partido Comunista Português mais uma vez repete aqui uma táctica que é a de que, não tendo verdadeiros fundamentos para atacar os seus adversários na cena política, inventa-os e constitui um cenário que não corresponde de forma alguma à realidade.
Em primeiro lugar, Sr. Deputado Carlos Brito, o meu partido não teria que desmentir quaisquer afirmações como aquelas que o Sr. Deputado refere, pela simples razão de que das não foram feitas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O êxito que o Sr. Deputado menciona não permite por forma alguma a interpretação de que a revisão da Constituição aí referida fosse feita fora dos termos que a própria Constituição prescreve.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Deputado, o seu partido, que é um partido extremamente bem informado.
devia saber que o próprio Dr. Sá Carneiro, interrogado por jornalistas numa conferência de Imprensa a seguir ao Conselho Nacional do meu partido, em Lisboa, em relação a perguntas concretas que foram feitas nesse sentido, explicou que precisamente fora isso, e só isso, - isto é, uma revisão nos termos que a própria Constituição refere -, aquilo de que ele tinha falado e recomendado que se começasse a pensar nela desde já, dada a magnitude dos problemas envolvidos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar protesto por o Partido Comunista Português mais uma vez aparecer aqui a identificar-se com os trabalhadores.
Risos do PCP.
É evidente que há trabalhadores que são comunistas, mas o Partido Comunista Português não pode ignorar a existência de muitos trabalhadores no seio de outros partidos, nomeadamente o meu.
Vozes do PSD e CDS: - Muito bem!
O Orador: - E enquanto o Partido Comunista Português quiser aparecer neste país a identificar-se com todos os trabalhadores, o Partido Comunista Português está a assentar essa sua posição numa tese de legitimidade vanguardista que é incompatível com a democracia e é incompatível com a Constituição que esse partido diz pretender defender.
Aplausos do PSD e do CDS.
Em terceiro lugar, protesto veementemente pela forma como o Sr. Deputado encarou uma hipótese meramente abstracta, uma vez que nesta conjuntura o meu partido já explicou que nunca aceitaria formar governo desde que esse governo fosse minoritário.
Mas, em todo o caso, protesto veementemente contra a forma que o Sr. Deputado utilizou para referir uma hipótese de entrega da missão de formar governo ao chefe do segundo partido mais votado em Portugal
Aplausos do PSD.
uma voz do PCP: - Ao chefe?
O Orador: - Ao chefe, sim, tal como o vosso chefe é o Dr. Cunhal.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Nós não temos chefes, Sr. Deputado!
O Orador: - Os partidos têm chefes, uns democraticamente eleitos outros nomeados nos termos que potências estrangeiras determinam.
Aplausos do PSD.
Considero-me esclarecido, mas lamento profundamente e protesto com toda a veemência contra a consideração de que uma hipótese destas, prevista na Constituição, seja fruto de exigências e chantagens. Por aqui vemos como o Partido Comunista Português continua a interpretar a Constituição, por
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aqui vemos como este partido continua a optar por uma linha não democrática e tem de ser confiado a uma posição de oposição.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, deseja responder já ou deseja responder em conjunto, pois ainda está inscrito o Sr. Deputado Amaro da Costa?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, eu prefiro responder já ao Sr. Deputado Sérvulo Correia.
Sr. Presidente, vou fazer um contraprotesto e anuncio-o previamente, primeiro porque, devia fazê-lo e segundo para o Sr. Presidente não me contar o tempo desta intervenção.
Sr. Deputado Sérvulo Correia, a uma análise política responde-se com uma análise política. Responder com um protesto não é prova de muita competência.
Risos do PSD e aplausos do PCP.
Mas já agora aproveito a oportunidade para ainda, e no meu contraprotesto, lhe dizer duas coisas: primeiro, é que na minha intervenção, na intervenção que fiz em nome do meu grupo parlamentar e do meu partido, não me arvorei, não nos arvorámos, em porta-voz do povo trabalhador. Falámos naturalmente em nome de muitos, que são membros do nosso partido. Procurámos detectar também, identificar, correntes de opinião entre os trabalhadores, o que é perfeitamente legítimo em democracia.
A segunda questão era agradecer-lhe muito uma contribuição que trouxe, inesperadamente, para o esclarecimento de um mistério que agitava a nossa vida política. É que nós não sabíamos como se chamava no PSD o seu ex-presidente e ficámos agora a saber que é chefe.
Risos e aplausos do PCP.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Não é ex-presidente!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Desejava usar da palavra para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - O Sr. Deputado Carlos Brito utilizou como é hábito do seu partido uma linguagem provocatória e ofensiva para se referir ao CDS. A quem usa tal linguagem não deveria espantar, como parece espantar, que o CDS exclua qualquer hipótese de assinatura de uma plataforma de que o PCP fosse também co-signatário.
Vozes do CDS:- Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, muitos trabalhadores, a grande maioria dos portugueses talvez, não se esqueceram do vosso comportamento em 1975 e do preço que ainda hoje temos, também por isso, de pagar.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - E talvez que algumas memórias curtas, solidárias legitimamente em lulas pela liberdade, corram hoje o grave risco de meter a liberdade no ghetto de uma liberdade amputada da sua disseminação total, para privilegiar, porventura, experiências antigas, esquecendo aquilo que é, no fundo, uma experiência recente, da qual, como disse, todos de certa forma estamos a pagar o preço.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para um contraprotesto.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, vou fazer um brevíssimo contraprotesto, à altura do protesto que foi feito pelo Sr. Deputado Amaro da Costa e portanto, com uma linha de agressividade semelhante. Vê-se que o teórico da moderação da linguagem no discurso na nossa vida política, o famoso autor do discurso «Basta, senhores», também sabe usar uma linguagem dura e dessa maneira furtar-se a responder a uma análise séria, responsável, que aqui produzimos e que fizemos para servir os interesses do povo português e da pátria portuguesa.
Aplausos do PCP.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Presunção e água benta...
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres, para uma intervenção.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados: O debate da moção de confiança apresentada pelo Governo tem sido entendido pela oposição como uma boa ocasião para fazer o ponto à evolução da vida económica e social e analisar os efeitos da actuação do Governo nestes domínios. Não me furtarei também a essa análise.
Ao assumir as suas responsabilidades, a equipa coordenada pelo Primeiro-Ministro Mário Soares encontrou um país em que estavam quebrados os equilíbrios fundamentais, que não tinha definidas regras de jogo que balizassem o funcionamento do sistema económico e social, nem possuía os mecanismos institucionais eficazes para promover a sua recuperação.
A estrutura que caracterizou a economia portuguesa no início dos anos 70 tinha sofrido, o impacte simultâneo de três factores externos que alteraram completamente o quadro em que se inseria:
Foi em primeiro Lugar a subida dos custos das matérias-primas e em particular do petróleo bruto, fazendo deteriorar de maneira significativa as relações de troca com o exterior. Só a elevação do preço do petróleo é responsável por cerca de metade do actual défice da balança de transacções correntes.
Em segundo lugar, há que referir a crise internacional. Ela veio a traduzir-se numa quebra sensível na evolução das exportações. Tal quebra é particularmente preocupante no caso dos produtos tradicionais e em particular dos têxteis. Mas a principal conse-
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quência da crise externa foi o súbito estancar da emigração. O desenvolvimento português, a partir do início dos anos 60, não foi capaz de gerar empregos em número significativo. Dai que a progressiva absorção dos excedentes da população rural, à medida que se ia reduzindo o subemprego na agricultura, não tenha sido feita pela criação de postos de trabalho na indústria e nos serviços, mas sim à custa de uma emigração maciça, cujos níveis médios anuais oscilavam entre 100 o 150 mil pessoas.
Se considerarmos o impacte da diminuição cãs saídas de trabalhadores portugueses para o estrangeiro, adicionado á redução drástica do contingente militar e ao retorno dos portugueses das antigas colónias, encontramos um número de desempregados potenciais muito superior ao que actualmente existe. Afinal no período de Governo socialista sempre se têm criado empregos e não em pequeno número.
Aplausos do PS.
O Orador: - Em terceiro lugar, cabe referir a descolonização. O Governo fascista deixou arrastar, por mais de uma dezena de anos, uma guerra colonial sem perspectivas de solução militar, teimosamente agarrado a conceitos imperiais, que mereciam o repúdio unânime da comunidade das nações e para a sustentação dos quais se não vislumbravam em Portugal meios humanos ou financeiros. Tal guerra que, por ironia do destino, se transformou na principal causa próxima da queda do regime que a sustentava, trouxe consigo a inevitável degradação das relações sociais e rácicas nos territórios coloniais, impedindo uma descolonização em que fosse possível garantir a permanência pacífica dos portugueses e a defesa integral dos nossos legítimos ingresses económicos. Dessa teimosia irreparável herdou a economia portuguesa o encargo de sustentar um acréscimo populacional de cerca de 600 000 portugueses, com consequências profundas na deterioração do mercado de emprego e no desequilíbrio entre a produção e o consumo interno.
O Governo Constitucional não precisa de maior elogio do que a simples constatação prática da forma como se vem processando a ritmo espectacular, e sem perturbações significativas, a integração destes portugueses por forma que deixa perplexos todos os observadores estrangeiros, recordados ainda do que foi em França, o regresso da Argélia após a independência, problema à escala bem menor que o nosso.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A descolonização trouxe também consigo a perda de mercados reservados para algumas exportações tradicionais, sobretudo vinho e têxteis, cujas características e qualidade não permitem a fácil substituição de mercados importadores. Foi ainda a crise gerada nos transportadores marítimos e aéreos, concebidos e desenvolvidos prioritariamente para assegurar ligações do tipo colonial.
Mesmo que os factores que atrás descrevi tivessem actuado isoladamente sobre o Portugal do 24 de Abril, mesmo admitindo que nenhumas transformações de fundo aqui tivessem ocorrido, nos planos político, económico e social, o País estaria a braços com uma crise cujas proporções não difeririam significativamente das actuais, crise essa que, naturalmente, teria sido suportada pelos Portugueses por formas bem mais muitas, se não mesmo violentas, pelo uso indisciplinado de bem conhecidos mecanismos de repressão.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As transformações internas registadas vieram no entanto alterar de forma bem expressa o perfil da sociedade portuguesa. Importa acima de tudo realçar os seus aspectos positivos. Mas é preciso também saber detectar as dificuldades originadas pelo processo da transformação num sistema económico e social habituado a vegetar à sombra do proteccionismo, sem tradições de mudança nem mecanismos da adaptação permanente.
No seguimento da Revolução ocorreu a ruptura das regras de funcionamento de um sistema, a que não se seguiu de imediato uma nova definição enquadrado. Ruptura que vão a causar quebras na produção e sobretudo no investimento, uma certa desorganização na aplicação dos instrumentos de regulação da vida económica e na própria vida das empresas. Ruptura que foi acompanhada de uma rápida redistribuição de rendimentos, cuja justiça é indiscutível, mas para a qual não havia bases sólidas na capacidade interna de criação de riqueza, o que acabou por vir a agravar um desequilibro externo já em si considerável.
Foi perante este quadro que os socialistas não hesitaram em assumir as responsabilidades nascidas do voto democrático dos Portugueses.
Quadro para o qual o Governo soube enunciar com coerência uma estratégia e aplicar com continuidade uma política.
Importava em primeiro lugar definir as regras de jogo do salema económico, restabelecer o funcionamento e a eficácia dos mecanismos, criar as condições para a acusação dos agentes económicos, curar as feridas deixadas em aberto pelas recentes conturbações internas. Sem o restabelecimento da paz social e da tranquilidade pública, sem a recuperação do sistema produtivo existente, nenhuma política seria possível neste momento.
Essa a tarefa prioritária a que se deitou ombros, e que se assim não acontecesse comprometeria irremediavelmente o futuro. Não estava em causa, como alguns insistentemente afirmavam iniciar um processo de recuperação capitalista: estava sim em causa dar conteúdo ao sistema constitucional, viabilizar a democracia, garantir e solidificar as grandes conquistas alcançadas pelos trabalhadores portugueses, apôs a Revolução de Abril.
Uma analise comparativa, serena e objectiva do que era Portugal no momento em que o Governo Constitucional tomou posse e do que é Portugal hoje, revela a lucidez da análise então feita, a correcção da estratégia definida e o êxito da actuação entretanto empreendida.
As regras de funcionamento do sistema económico e social «não definidas, no essencial. Os sectores público, cooperativo e privado têm esclarecidas as suas vocações, determinados os seus quadros de actividade, criadas as condições normais de actuação e desenvolvimento.
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O equilíbrio financeiro de grande numero dos agentes económicos foi restabelecido: o nível de stocks foi reposto: a situação da generalidade dos mercadas, normalizada: a inflação, embora com dificuldades, controlada.
Corrigiram-se os exageros havidos na distribuição dos rendimentos, tendo-se conseguido para tal efeito a compreensão dos classes trabalhadoras, como o
revela a estabilidade social do País. Este o índice claro do êxito do papel mediador do Partido Socialista e do seu Governo. Portugal é hoje o país latino com menor número de horas perdidas em greve, em termos relativos.
Por toda a parte a produtividade e a produção atingiram valores normais, pese embora a insistência com que continuadamente alguns referem exemplos dissonantes, que apenas confirmam a regra geral
A confiança na economia e nas instituições tem-se vindo a restabelecer continuadamente. O investimento sofreu mesmo em 1977 um rearranque de amplitude inesperada, aproximando-se dos valores relativos regulares no conjunto da despesa interna. As receitas do turismo e as remessas dos emigrantes atingiram, em divisas, os maiores níveis de sempre, crescendo de 45% e 35% respectivamente. A estrutura da massa monetária está normalizada.
Alguns indicadores numéricos relativos ao ano de 1977 e retirados de estimativas do instituto Nacional de Estatística e do Departamento Central de Planeamento confirmam inegavelmente a justeza das afirmações que fiz.
O produto interno crescerá ao ritmo de 6%, apesar do péssimo ano agrícola. A indústria a cerca de 3% e a construção a 14%.
O investimento aumentou 43%, reconhece-se que em grande parte pela reposição do nível dos stocks, mas a própria formação bruta de capital fixo subiu às 18% atingindo cerca de 146 milhões de contos, o que ultrapassa já os 20% da despesa interna. Já aqui foi afirmado que o investimento não se vê. Mas a confirmar a correcção desta estimativa estão os aumentos do consumo do cimento e do ferro e das importações de equipamentos, factor, alias, essencial no agravamento do défice da balança comercial e o crescimento espectacular na produção interna de bens de equipamento.
Na verdade, a construção de maquinas apresenta em 1977 índices de crescimento da ordem de 40%, tal como aliás, acontece com a construção de maternal de transporte. Isto em contraste com a subida moderada nas industrias viradas para o consumo, como a alimentar - 5,3%, e os têxteis - 0,1%, outro sintoma claro da correcção do anterior desequilíbrio das posições relativas do consumo e do investimento. Mas se mesmo assim quiserem continuar a não ver o investimento, tenho muito gosto em convidar os Srs. Deputaados que assim procedem a visitar comigo o distrito de que sou Deputado - o distrito de Castelo Branco - e a avaliarem com os seus próprios olhos o surto do investimento e desenvolvimento que ali se processa sem paralelo no passado recente, da história portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Boa!
O Orador - Quer isto dizer que tudo está bem e que vivemos no melhor dos mundos? Naturalmente que não.
Subsistam, como é inevitável, os graves desequilíbrios suscitados pela profunda alteração das condições estruturais da nossa economia, devida ao encarecimento das matérias-primas importadas, à crise internacional e à descolonização, desequilíbrios cuja correcção só é possível a longo prazo. Agora que se não diga que tais desequilíbrios são o fruto do 25 de Abril, das liberdades, das nacionalizações ou dos direitos sociais dos «trabalhadores. O que estas transformações ocasionaram pontualmente de negativo foi já entretanto recuperado. Mas mais escandaloso ainda será pretender encontrar, como bode expiatório para o do equilíbrio externo, paira o desemprego ou para a inflação, o Governo Constitucional e a sua actividade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumprida com êxito a primeira fase da estratégia apontada, é agora preciso encardir de frente os problemas de estrutura que subsistem.
O Governo considera com justeza que, no curto prazo, ê à correcção do défice externo que importa dar prioridade.
A salvaguarda da independência nacional e a garantia do desenvolvimento do País em bases sólidas impõem, pois, como segunda fase necessária na estratégia económica a prosseguir, um programa de estabilização para 1978, que tem como objectivos principais a redução do défice das transacções correntes em cerca de um terço e a contenção da alta do custo de vida em termos tais que assegurem um quadro que torne possível aos agentes económicos obedecer na sua acção e critério de racionalidade.
Programa definido por forma a limitar ao mínimo as suas repercursões negativas sobre o crescimento fazendo uso de critérios de rigorosa, selectividade na aplicação dos diversos instrumentos de politica económica, nos domínios monetário, financeiro e cambial.
Programa que nem como orientações fundamentais o apoio prioritário ao aumento da produção agrícola e das pescais; a orientação dos recursos para o investimento e a exportação, limitando o consumo, o equilíbrio do orçamento corrente do sector público administrativo e a limitação do défice global correspondente, o controlo do ritmo de expansão do crédito e o reforço da sus selectividade, a orientação do investimento para o combate simultâneo ao défice externo e do desemprego, pela preferência a dar a projectos do menor intensidade de capital e menor conteúdo importando: o fomento das exportações e a possível contenção das importações.
Programa cujo êxito é condição indispensável para garantir a terceira fase da estratégia económica do Governo Constitucional baseada roa aceleração dos ritmos do crescimento económico, na melhoria progressiva nos níveis do bem-estar para a população portuguesa, e na preparação do País, e das suas estruturas para o processo de integração europeia, garantindo uma eliminação tão rápida quanto possível do gap económico e social que nos separa da generalidade dos países das comunidades europeias.
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face a esta estratégia realista, duas concepções, que consideramos utópicas, tem vindo a ser contrapostas ao debate político recente pelo PCP e pelo CDS.
De um lado, surge a nostalgia do isolamento económico e de uma lógica de funcionamento do sistema baseada em pesados mecanismos de controlo administrativo. É a defesa insistente das técnicas de restrição quantitativa á importação, sem ter em conta os condicionamentos da economia aberta em que nos inserimos, e o perigo de retaliações; é a sugestão continuada do recurso prioritário a linhas de crédito oferecidas por aqueles que pouco têm para vender nos interesse, em substituição dos mecanismos puros, que nos deixam as mãos livres para comprarmos o que quisermos e a quem quisermos: e o repetir do slogan já um pouco estafado da recuperação capitalista, paira caracterizar o que é, no fundo e ao contrário, o assentar em bases sólidas da construção do socialismo democrático. E importa aqui sublinhar que de harmonia com a posição vincada por Mário Soares no seu discurso, o PS, respeitará, naturalmente, as formações económicas e sociais resultantes da revolução e consignadas na Constituição.
As palavras enricas que proferi não significam, no entanto, falta de reconhecimento da atitude de diálogo e abertura que o PCP tem mantido no passado recente e que nos apraz registar, como condição que e para o normal funcionamento das instituições democráticas.
Pena é, se a minha interpretação não está errada, que as intervenções produzidas neste debate careçam o morno á guerra de palavras e não revelem o mesmo espírito de abertura e de diálogo.
Por parte do CDS foi apresentado o esboço de uma. estratégia global de alternativa à política do Governo. Estratégia que assenta numa concepção de expansionismo imediato, que consideramos irrealista, por não ter em conta os condicionantes estruturais que afectam a economia portuguesa. Não está em causa contestar o principio de que não é possível resolver os graves problemas portugueses num contexto de estagnação. Todos catamos de acordo que a chave das
soluções procuradas está no desenvolvimento. Não há, porém, desenvolvimento possível sem um saneamento mínimo das nossas finanças externas, sem assegurar a credibilidade externa da nossa economia. De outra forma, estaremos a construir casas sem alicerces, condenadas inevitavelmente à posterior ruína. Nem sequer o programa de estabilização do Governo aponta para a estagnação, mesmo a curto prazo. O que se propõe é uma política de crescimento moderado em 1978, que crie as garantias indispensáveis ao êxito de uma política de expansão a médio prazo. O ritmo de endividamento para que nos empurraria o modelo proposto pelo CDS. mesmo dando de barato a possibilidade de assegurar o seu financiamento, o que não está garantido, conduzir-nos-ia a curto prazo para o chamado «acordo de credores». Assim perderia qualquer significado prático a independência nacional e ver-nos-íamos certamente na necessidade de aceitar a aplicação de medidas bem
mais drásticas do que as que neste momento importa tomar. Então, sim, a estagnação, senão mesmo o retrocesso, seriam inevitáveis.
A estratégia do CDS está, no entanto, viciada nas duas bases, por assentar no pressuposto de que não existe uma verdadeira recuperação, do investimento.
Dar a proposta de constituição de um chamado «motor de arranque» da nossa economia, constituído pela mobilização restrita das indemnizações, ao seu valor nominal, para a constituição de empresas ou para o investimento.
Não vou acentuar aqui o que tal significaria nos planos moral e da justiça. A ser adoptada tal concepção, seria completamente o principio do tratamento diferenciado as pequenas e médias poupanças e aos grandes impérios financeiros vindo afinal transformar-se pela lógica própria das coisas, num beneficio aos mais ricos em detrimento dos mais pobres.
Nem quero demorar-me na legitimidade política de uma operação que permitiria refazer de uma assentada à estrutura da oligarquia financeira que foi ao longo dos anos um dos principais sustentáculos do regime fascista.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Operação tanto mais insólita, quanto é acompanhada de medidas de austeridade de alcance generalizado. Com que legitimidade se poderia propor, nesse caso, aos trabalhadores, que aceitassem a necessária moderação nas suas reivindicações, com a manutenção, senão mesmo o ligeiro decréscimo do poder de compra dos salários.
Deter-me-ei apenas na adequação técnica de tal proposta à resolução dos nossos problemas. O PS sempre afirmou que as indemnizações deveriam poder canalizar-se para o investimento. A lei aprovada por esta Assembleia permite-o e promove-o, concedendo termos de mobilização bem mais favoráveis do que aqueles que seriam obtidos por venda de títulos no mercado financeiro. Mas fá-lo em obediência a princípios de justiça relativa, estabelecidos peio mecanismo da actualização, e permite enquadra-lo, tendo em conta os equilibrios macroeconómicos fundamentais.
Com o nível do investimento já existente em Portugal, e mesmo que se conceda algum optimismo às estimativas oficiais, a forma de mobilização generalizada ao valor nominal que o CDS propõe corresponderia a uma tal injecção de liquidez no nosso sistema económico e financeiro que poderíamos falar de um motor de arranque, mas de arranque de uma inflação galopante e incontrolável e do colapso externo da nossa economia. Não basta criar moeda para tudo resolver. Para o investimento há limites físicos e há também que assegurar a contrapartida na formação de poupança interna, - complementada, em termos razoáveis, pelo financiamento externo.
A operação proposta de transformação em activos líquidos, imediatamente mobilizáveis, dos bens nacionalizados, de estrutura pesadamente imobilizada, constituídos na maior parte por empresas de baixo nível de rentabilidade (tome-se como exemplo significativo o grupo CUF no seu conjunto, quando não falidas ou à beira da falência (atente-se nos grupos Quina e Jorge de Brito), seria o melhor negocio da história ao capitalismo português.
Aplausos do PS.
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Não compreendemos como é possível que o CDS o proponha. Não seria admissível que o PS o aceitasse.
Importa no entanto, reconhecer o esforço realizado pelo CDS para apresentar uma estratégia global de alternativa que podemos criticar nos seus objectivos
E fundamentos, mas cuja coerência própria apreciamos. A clarificação de funções e que conduz permite encarar o diálogo como possível e desejável.
Não me refiro aqui a estratégia proposta pelo PSD porque, em meu entender, tal estratégia não existe, ou pelo menos não foi explicitada. Quer a moção aprovada no Conselho de Bragança quer os documentos apresentados em resposta à Plataforma ao Governo, constituem um enunciado de intenções algo confuso, sem referenciar com clareza as causas fundamentais da crise, sem definir hierarquizadamente objectivos, escolher meios e estabelecer prioridades nas políticas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não basta dizer que é preciso construir escolas, casas e hospitais, combater a inflação o desemprego, expandir aceleradamente o produto e reduzir os défices. Não basta querer viver no melhor dos mundos e preciso saber como transformar o mundo em que vivemos.
Aplausos do PS.
Só lamento que a capacidade técnica indiscutível de alguns dos mais destacadas dirigentes do PSD lenha cedido lugar a razões de oportunidade política, mais diria eleitoral. Registo o facto. Não me compete aqui julga-lo.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: O Governo Constitucional não se limitou a definir um programa de estabilização a curto prazo. Estão identificadas as causas profundas da crise e os principais vícios de estrutura da nossa economia. Estão definidas as políticas correctivas que a médio prazo permitirão alterar significativamente o quadro em que agora nos movemos.
Em qualquer caso, políticas de estruturas só produzem efeitos a médio prazo. Até lá há que garantir H solvabilidade externa da economia, sem pôr em causa a recuperação económica que está em curso. A estratégia apresentada pelo Governo Constitucional é coerente, é realista e é patriótica. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista dá-lhe nesta Câmara o seu inteiro apoio.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Além do Sr. Deputado Amaro da Costa, há mais alguma inscrição?
Pausa.
O Sr. Deputado Amaro da Costa pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - É para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - O Sr. Deputado António Guterres, seguindo uma prática de fundamentação discutível, permite-se fazer considerações e comentários que eventualmente induzirão em erro quem o escutar, dando-lhe o crédito que normalmente as palavras de uma pessoa honesta, como ele o merecem a quem quer que seja.
Refiro-me em concreto a dois pontos da exposição do Sr. Deputado. Atribuiu ao CDS uma estratégia económica segundo a qual o País se deveria encaminhar para ritmos de expansionismo imediato, o que no dizer, acarretaria tensões inflacionistas incomportáveis e dificuldades de financiamento assinaláveis. Quero dizer ao Sr. Deputado que não há nenhum texto do CDS que o diga, não há nenhuma afirmação de nenhum dirigente do CDS que o afirme e, portanto a construção do Sr. Deputado é uma mera quimera. Para sua informação e melhor esclarecimento, dir-lhe-ei que nas duas hipóteses de planeamento a médio prazo construídas pelo CDS, estabelece-se o seguinte:
Hipótese A - O crescimento da despesa interna previsto para os anos a seguir são os seguintes: 5,3 em 1978; 5,8 em 1979; 6,2 em 1980: 7,9 em 1981; 8,8 em 1982; 9.2 em 1983, e 9,2 em 1984. Onde é que está aqui o expansionismo imediato da economia? Eis o mistério que o Sr. Deputado fará o favor de esclarecer.
Hipótese B - O que o meu partido advoga (não vou ler os números todos) em relação à taxa média de crescimento, com valores elevados, no final do período, da ordem dos 8,6 % e 9,4%, situa-se ao nível dos 7,5% entre 1978 e 1984. Onde é que está aqui o expansionismo imediato? É o que o Sr. Deputado me fará o favor de esclarecer.
A segunda questão diz respeito â mobilização para investimento ao valor nominal. Nós tivemos o cuidado de na nossa contraproposta ao Governo não recuarmos a expressão «valor nominal». O Sr. Deputado permitiu-se, portanto, fazer uso de algo que é um conhecimento privado e como tal sujeito naturalmente às interpretações que conversas privadas podem ter. E note que eu não estou a fazer uma crítica pelo facto de a usar. pois mal corresponde, aliás, a afirmações públicas do meu partido guando do debate dessa mesma lei aqui feita na Assembleia da República. O problema era saber se a tese se mantém idêntica, ou cem ou não algumas adaptações. Devo esclarecer, no entanto, que sim senhor - não tenho qualquer dúvida em o reconhecer -, nós defendemos para certo tipo de projecto a possibilidade da mobilização das indemnizações para investimento ao valor nominal. Mas nós dizemos, com muito cuidado, na nossa contraproposta que se trata de uma orientação selectiva e por consequência sujeita aos critérios orientadores e correctores que a própria Administração Pública, e em particular o Governo, deve adoptar.
O Sr. Presidente: - Esgotou o tempo do seu protesto. Sr. Deputado.
O Orador: - Vou já terminar. Sr. Presidente.
Ver aqui fantasmas de reconstituição de grupos económicos ou a alteração da ordem jurídica no que diz respeito à subordinação do poder económico ao poder político é, Sr. Deputado, ir longe demais. Eu
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aceitaria que o Sr. Deputado Acácio Barreiros me dissesse não esperava isso de si.
Aplausos do CDS.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Arnaut.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres, certamente para um contraprotesto...
O Sr. António Guterres (PS): - Custa-me, sinceramente, recorrer à fórmula do contraprotesto para responder a esta intervenção, que considero perfeitamente normal e legitima e que não me faria recorrer a nenhum contraprotesto. De qualquer das formas, dado que ela foi feita como protesto, apresento a minha intervenção como contraprotesto.
O Sr. Deputado Amaro da Costa citou um conjunto de números de que não tenho conhecimento ou não sou, portanto, capaz de contestar ou de confirmar a validade interna desses números. Se na sua intervenção se esclarece que o CDS renuncia a uma estratégia de expansionismo imediato e adere às concepções do Governo, só posso felicitar-me.
Risos do CDS.
Em relação às questões da mobilização, é evidentemente o próprio conceito da mobilização ao valor nominal que está em causa, em nossa opinião, em termos de justiça relativa. Nós compreendemos que, a um partido que se afirma democrata-cristão, uma coisa que está tão frontalmente em contradição com os valores evangélicos, de dar mais aos ricos do que aos pobres, possa levantar objecções.
Risos e aplausos do PS.
Mas ê um problema que não me compete criticar
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - A humildade fica-lhe bem, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: - Dou agora a palavra ao Sr. Deputado Angelo Correia para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Angelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, não era um pedido de esclarecimento, mas uma declaração de protesto que queria fazer.
O Sr. Presidente: - Queira formular o protesto. Sr. Deputado.
O Sr. Angelo Correia (PSD): - O Sr. Deputado António Guterres nas considerações que teceu, relativamente ao Partido Social-Democrata afirmou que a nossa resposta à crise, conjunto de dois documentos que foram formulados e entregues ao Governo, era uma resposta confusa, parcial, sem objectivos e sem hierarquia suficiente. O Sr. Deputado António Guterres tem de compreender que uma perspectiva de governo para a qual nós nos apresentássemos sozinhos e como tal numa perspectiva relativamente fechada, essa decorria única e exclusivamente do
Programa do Governo apresentado à Nação em Março e Abril, de 1976.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador - Todos e quaisquer documentos que posteriormente o Partido Social-Democrata elaborou, e foram vários, foram conhecidos aqui nesta Câmara quando tivemos oportunidade de discutir o Plano, quando invernos oportunidade de dialogar com o Governo aquando da apresentação do seu Programa e na altura da apresentação do conjunto de medidas designado por «Pacote I». Tivemos então ocasião de explicitar e admirar à conjuntura então vigente algumas melhorias e introduções novas na nossa estratégia económica. Quanto a negociações com o Governo - já que são negociações, já que implicam compromissos impunham cedências - a perspectiva do Partido Social Democrata não poda ser uma perspectiva fechada, mas antes aberta, tolerante e dialogante. Nesse sentido, tinha de ser uma perspectiva que abrisse possibilidades de acordo com vários partidos, uma perspectiva que abrisse possibilidades a acordos consequentes. Nessa óptica, e porque a nossa perspectiva não era fechada, mas antes dialogante, antes tolerante, antes para se chegar a acordo, tinha, naturalmente, pontos de melhoria, tinha pontos que haviam de reunir consenso, tinha pontos que, naturalmente, implicavam opções e cedências. Nesse sentido, falar de um programa confuso e irrealista é não perceber hoje se estava numa atitude tolerante. Mas se pretende analisar a própria estratégia do partido, nesse ponto, temos de remeter o Sr. Deputado para o programa de governo que apresentámos o ano passado. Se o Sr. Deputado não o leu, nós temos o máximo prazer em lho oferecer.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por último, disse o Sr. Deputado António Guterres que uma casa se constrói com alicerces e o Governo no Partido Socialista estaria neste momento a lançar esses alicerces. Se assim é, esses alicerces devem estar muito fundos, de tal modo que não os vemos ainda.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres deseja também dar ainda algum esclarecimento ou fazer um contraprotesto?
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, dado que o Sr. Deputado Angelo Correia fez, aliás de uma forma bastante simpática, um protesto, eu pediria licença para fazer legitimamente um contraprotesto.
O Sr. Presidente: - Queira fazê-lo. Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Gostaria apenas de fazer ao Sr. Deputado a sugestão de um teste.
O PSD tom á frente dos seus destinos neste momento, paio menos em exercício, um homem que é um reputado especialista de direito financeiro e de economia e professor da Faculdade de Direito de
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Lisboa. Eu sugeriria ao Sr. Debutado Angelo Correra que se inscrevesse nessa Faculdade, se candidatasse, a uma das cadeiras que o seu presidente dirige e apresentasse como texto a exame a estratégia económica que consta do documento do seu partido.
Risos do PS.
Estou certo de que, se assim acontecesse, a capacidade e a honestidade do Sr. Prof. Sousa Franco o forçariam a chumba-lo.
Risos e aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Ângelo Correra pede a palavra e vou concedê-la. Mas há-de compreender que não pode agora fazer nenhum protesto, pois já o fez e já foi respondido. Pode prestar um esclarecimento.
Tenha a bondade. Sr. Deputado.
O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quanto a sugestão do Sr. Deputado António Guterres para eu me inscrever ou solicitar o meu ingresso como professor na Faculdade de Direito a fim de analisar e discutir...
Vozes do PS: - É como aluno!
O Sr. Presidente: - Chamo a vossa atenção, Srs. Deputados. O Sr. Deputado Angelo Correia tem todo o direito de se fazer ouvir e há pessoas certamente interessadas em escuta-lo.
Queira continuar, Sr. Deputado.
O Orador - O lapso não foi, digamos, deliberado, mas pensei todavia que o Sr. Deputado António Guterres, dado que na última discussão do Programa do Governo nos citou em termos profissionais se tinha enganado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - De qualquer das formas, gostaria de dizer ao Sr. Deputado o seguinte: Quem analisou, quem sentiu, quem avalizou a política e a estratégia económica do Partido Social-Democrata naturalmente não é aluno nem professor na Universidade. Foi 25% do povo português que acreditou e votou nelas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Carmelinda Pereira.
A Sr.ª Carmelinda Pereira (Indep.) - Sr. Presidente. Srs. Deputados. Sr. Primeiro-Ministro. Srs. Membros do Governo: Os trabalhadores portugueses têm, neste momento, os olhos postos nesta Assembleia onde se procura decidir dos seus destinos imediatos.
Ora, nesta Assembleia da República todos os trabalhadores podem verificar mais uma vez que os representantes políticos daqueles que os exploram, dos grandes capitalistas, dos latifundiários, dos intermediários especuladores se encontram aqui em minoria.
Encontram-se aqui em minoria derrotados nas eleições pelos votos dos trabalhadores, como o foram várias vezes nas empresas, nas, campos e nas ruas deste país.
Todos os trabalhadores podem verificar, mais uma vez que os Deputados do PS e do PCP, uns como outros eleitos pelos trabalhadores, se encontram aqui em maioria; maioria que é expressão da vontade dos trabalhadores portugueses, para que esses partidos constituam o governo que acabe com os despedimentos, o aumento do custo de vida a miséria a incultura: o Governo que comece a tomar as medidas socialistas que permitam a resolução dos seus graves problemas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Nesta Assembleia, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou ontem que seja qual for o resultado da votação da moção de confiança, por ele proposta, não mudara na sua política actual. A política cujas consequências são despedimentos massivos, ao aumento brutal do custo de vida, enquanto os salários são congelados, a entrega de empresas aos antigos patrões, de terras aos latifundiários, que nega o futuro á juventude e que tem reforçado a reacção.
Como se pode aceitar então, que o Sr. Primeiro-Ministro venha propor uma moção de confiança, já não digo para essa política, mas para o seu agravamento brutal sobre a base das propostas do Fundo Monetário Internacional?
Quando os trabalhadores constatam que o PPD, o CDS e os militares não têm os menos nem a força para constituírem eles próprios governo, para governarem directamente em favor daqueles que representam, como se pode aceitar que o Sr. Primeiro-Ministro venha propor-se governar para concretizar a política que corresponde aos interesses daqueles que o PPD o CDS e os militares representam?
Como se pode aceitar que os dirigentes do PCP venham afirmar que e preciso outra política, outro governo, ao mesmo tempo que se dizem dispostos a negociar uma plataforma com todas as forças sociais políticas sem discriminação e admitem votar a proposta do Orçamento Geral do Estado que traduz, no fim de contas, a orientação do Fundo Monetário Internacional?
Srs. Deputados do PCP: Sim. é preciso uma outra política. Uma política que não permita nem mais um hectare de terra entregue «os latifundiários, nem mais uma empresa entregue aos antigos patrões, uma política socialista. Sim, é preciso um outro governo. Mas é preciso que se diga claramente que governo é esse, que pode fazer uma política socialista.
É preciso que se diga que é o Governo do PS o do PCP.
Como se pode aceitar que os Deputados do PS e do PC se preparem para votar um Orçamento Geral do Estado, o qual propõe: imposto profissional e complementar para perto de 20 milhões de contos: o qual propõe como impostos de transacção perto de 88 milhões de contos: enquanto o imposto industrial e predial, o imposto sobre o capital é pouco mais que 17 milhões de contos. Um Orçamento Geral do Estado que propõe 10 milhões de contos para a agricultura enquanto para as forcas armadas, GNR, PSP propõe 28 milhões de contos? Um Orçamento Geral
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do Estado que reduz a verba para a educação, para os transportes, para a saúde, enquanto se propõe dar indemnizações de milhões e milhões de contos a capitalistas e latifundiários?
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O povo trabalhador pode verificar, mais uma vez que os, Deputados do PS s do PCP que de elegeu para defender os seus interesses se encontram em maioria nesta Assembleia. Assembleia que tem poderes para legislar, que tem poderes para aprovar governos, que é o centro do Poder.
Então eu pergunto: Não tem o povo trabalhador o direito de vir aqui em massa a esta Assembleia, que deve ser a expressão da soberania do povo, exigir que essa soberania seja respeitada, a sua vontade cumprida, os seus interesses defendidos e não a vontade e os interesses do imperialismo internacional, dos militares, do PPD, do CDS, na reacção impotente que grita nas ruas do Porto e de Lisboa «Morte ao comunismo e morte ao socialismo»? Não tem o povo trabalhador deste país o
direito de vir a esta Assembleia exigir que os Deputados do PS e do PC retirem de imediato a proposta de ler do Orçamento Geral do Estado, o qual a ser aprovado e aplicado levaria á fome, e miséria e a degradação ainda maior das condições de vida dos trabalhadores portugueses e ao reforço da reacção?
Exigir que se retire os 28 milhões de contos as forças armadas, à GNR e à PSP e que essa verba seja canalizada para dar um aumento salarial justo aos trabalhadores da função pública e aos reformados que auferem a grande maioria reformas de fome?
Exigir que os milhões e milhões de contos previstos para indemnizar capitalistas e latifundiários sejam antes canalizados para desenvolver as, empresas intervencionadas, para a reforma agraria, para a saúde e para o ensino?
Não tem o povo trabalhador deste país. único garante real das liberdades, que ao preço de múltiplos sacrifícios ele conquistou, o direito de vir a esta Assembleia exigir que os Deputadas do PS e do PCP constituam o Governo PS-PCP que faça a política socialista a que os trabalhadores aspiram?
Sim, Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, O povo trabalhador cem o direito de aqui vir para que seja cumprido o mandato que deu aos Deputados do PS e do PC e exigir que seja respeitada a vontade popular, exigir que seja respeitada a democracia, a vontade da maioria.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: Pelas contas da Mesa faltam três horas de debate, mais cerca de uma hora para declarações 'de voto, o que perfaz quatro horas de trabalho imenso. Há a acrescer a isto uma hora de intervalo, o que faz prever que a sessão terminara depois das cinco horas da manhã.
De qualquer forma, e nessa previsão, parece-me útil fazer agora um pequeno intervalo, tanto mais que se encontram fora da sala bastantes Deputados. Sugiro um intervalo de um quarto do hora e convidava os presidentes dos grupos parlamentares para terem a bondade de chegar ao gabinete da presidência, para ordenarmos as inscrições.
Esta suspensa a sessão por 15 minutos.
Eram 0 horas e 15 minutos.
Após o intervalo, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vasco da Gama Fernandes.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 0 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Peço a atenção dos Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP encerra aqui a sua participação neste debate. Já no passado dia 20 de Novembro o III Congresso da UDP definira qual o sentido do nosso voto: Não danamos nenhuma confiança a este Governo. Nem outra poderia ser a nossa posição diante de um Governo que ha dezasseis meses tem governado de costas voltadas para o povo, surdo às reivindicações populares. Não poderíamos esquecer que este Governo votou as leis principais, tomou as medidas económicas mais importantes, com o apoio da direita reaccionária. Não poderiamos esquecer a profunda desilusão de muitos trabalhadoras que votaram PS, precisamente para derrotar o PPD e o CDS, e passaram a ouvir Mário Soares dizer por essa Europa fora que o CDS era o partido que em Portugal revelava maior consciência democrática, ...
Uma voz do CDS: - Muito bem!
O Orador: -... ou então, em fins de Julho, considerava o PPD o interlocutor preferencial. Mário Soares impunha o «Pacote I» e a direita aplaudia. Mário Soares insuflava os trabalhadores da Reforma Agrária, tratava o Alentejo como um pais estrangeiro, fazia a Lei Barreto e a direita ia aplaudindo, Mário Soares ia entregando empresas intervencionadas aos anteriores patrões, propunha chorudas indemnizações aos grandes capitalistas, e a direita ia aplaudindo.
A verdade é que o 25 de Abril ia ficando cada vez mais fraco, as dificuldades do povo iam aumentando, os preços sempre a crescer e o desemprego sempre a aumentar. A direita reaccionária, o PPD e o CDS, iam esfregando as mãos de contentes. Esperavam que o povo fosse desmoralizando e aceitasse cegamente as medidas deste Governo, só porque ele se dizia socialista, até que um dia desmoralizado e desiludido o povo deixasse apagar a chama da liberdade e encolhendo os ombros dissesse: «Isto já está pior que antes do 25 de Abril.» E então a reacção, triunfante, apresentaria a sua solução, a única alternativa que ela tem: o regresso ao Portugal dos monopólios, da exploração e da miséria, o 24 de Abril.
Mário Soares disse há dias, referindo-se ao PPD e ao CDS, que eles parecem não ter solução e apenas pretender a crise pela crise.
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Isso é apenas mera verdade. Eles não tem solução, mas e no quadro do 25 de Abril. Sabem que a sua alternativa só poderia ser erguida sobre os escombros do 25 de Abril. Por isso sempre aplaudiram cada atitude do Governo contra as conquistas dos trabalhadores e em particular a Reforma Agrária, todos eles sabem que elas são os próprios pares do 25 de Abril e são ainda a única esperança da liberdade e da democracia. Da mesma forma que prepararam e aplaudiram o 25 de Novembro, por ter afastado muitos militares de Abril e ter desmantelado as unidades militares onde a consciência anti-fascista dos soldados mais tinha avançado.
E hoje, e preciso dizer que se não conseguiram os seus objectivos, nada temos a agradecer ao Governo do Dr. Mário Soares, mas á lucidez e firmeza dos trabalhadores portugueses que souberam compreender que a defesa da democracia passava pela luta contra a política reaccionária deste Governo que era uma das portas por onde a direita estava a avançar.
E foi no próprio combate a política reaccionária do Governo que se ergueu a barreira que hoje impede o PPD e o CDS de aqui apresentarem qualquer alternativa, de muito menos irem para o Governo.
Enquanto o povo nas ruas e em três eleições livres diz não ao PPD e ao CDS, Mário Soares diz que se sair do Governo sobre a Belém para propor Sá Carneiro para Primeiro-Ministro.
Risos gerais, com destaque para o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
O Orador: - Não esteja a rir. Sr. Deputado, pois foi o que o Sr. Primeiro-Ministro aqui declarou.
Risos.
Bem, mas se se está a rir do Sr. Primeiro-Ministro, nisso acompanho-o.
Risos.
Só que o PPD, com medo da. força dos trabalhadores, apressa-se a dizer que vai a Ode m propor Mário Soares para Primeiro-Ministro. A tal ridículo a força dos trabalhadoras reduziu, a direita reaccionária.
Mas os trabalhadores não ficarão inactivos diante desta primeira vitória das grandes manifestações populares. A ameaça da direita reaccionária e do fascismo e um perigo real. Eles continuarão a conspirar contra a democracia, o imperialismo continuará a exercer o boicote económico e a pressionar mais empréstimos ruinosos, as redes bombistas continuam por desmantelar, os pides estão em liberdade, patrões sabotadores lá regressaram a algumas empresas a maioria dos militares de Abril continuam saneados, no passo que os oficiais reaccionários continuam em funções.
Por isso os trabalhadores não querem este Governo que de conciliação em conciliação vai comprometendo criminosamente o próprio 25 de Abril.
O povo só ficará descansado quando vir o 25 de Abril no Governo.
Por isso votaremos contra este Governo.
É certo que esta decisão de votar contra tem sido motivo de ataques desonestos e de calunias infames que todos os trabalhadores compreenderão que não podem ficar aqui em resposta. Tem o PCP acusado a UDP de estar a fazer o jogo da reacção, e o jornal cunhalisra O Diário, numa das suas últimas edições, até acusa a UDP de ser neonazi e identifica-me a mim com Sá Carneiro e Freitas do Amaral.
Risos gerais.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Vaidoso!
O Orador: - Afinal! como é? Este Governo, segundo o próprio Dr. Álvaro Cunhal, é um Governo que serve a direita reaccionária e agora virar contra este Governo, que afirma que não mudará em nada a sua política, é fazer o jogo da reacção.
Logicamente, se o PCP quer ser coerente com as torpes acusações que faz à UDP deverá votar a favor está a votar contra a recuperação capitalista. Mas se votarem contra este Governo, então terão de explicar ao trabalhadores porque é que a UDP faz o jogo do PPD e do CDS ao anunciar que vai votar contra.
Na verdade, o Dr. Álvaro Cunhal tudo tem feito para impedir a queda deste Governo. Tem dito que se registam «aproximações de pontos de vista» e «alterações positivas na política governamental». Na verdade, se alguém tem alterado as suas posições não têm sido o Governo, mas sim o próprio Dr. Álvaro Cunhal. Em Julho, o Governo dizia sim ã Lei Barreto, e o PCP dizia não à Ler Barreto. Agora o Governo continua a dizer sim à Lei Barreto, e o PC já diz sim à aplicação razoável da Lei Barreto.
Risos e vozes de protesto do PCP.
Antes o Governo dizia sim ao FMI e o PC dizia não ao FMI. Agora o Governo continua a dizer sim ao FMI e o PC passou a dizer sim ao FMI.
Risas e vozes de protesto do PCP.
Se finalmente o PC se abstiver, então terá de explicar qual a utilidade do voto útil de esquerda que pediu aos trabalhadores.
Mas de onde vem estas dificuldades, que faz correr Álvaro Cunhal, como justificar tão miseráveis calúnias à UDP?
É que na situação actual, nas ruas mais de um milhão de trabalhadores começa a exigir que o 25 de Abril vá para o Governo, ...
Risos e vozes de protesto do PCP.
... enquanto nesta Assembleia as .forças que aplaudem o 25 de Novembro estão em dificuldades e cada vez mais divididas. O PCP apercebe-se que se está a gerar uma situação algo semelhante à das últimas eleições presidenciais, em que o povo lutava para levar o 25 de Abril à Presidência e as forças de direita reaccionária e a cúpula do PS procuravam levar o 25 de Novembro à Presidência.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não apoiado!
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O Orador: - Não apoiado?... O Sr. Deputado quer dizer que o PS não apoiou conjuntamente com o PPD e CDS o actual Presidente da República?
O Sr. José Luis Nunes (PS): - É verdade e orgulhosamente.
O Orador: - Ou será que uma vez mais se estão a rir de vocês próprios.
Risos.
Na altura Cunhal ficou isolado, com o seu candidato, mostrando-se que não tinha nenhuma alternativa.
E hoje que o povo luta por uma solução democrática, por levar o 25 de Abril ao Governo, o PC mostra-se hesitante, sem alternativa, e mesmo depois de o Governo afirmar cem vezes que vai prosseguir, e nessa política, ainda precisa de hora regimental que antecede e votarão para se decidir.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Nós vamos votar contra, porque entendemos que a liberdade deve ser defendida não só dos seus inimigos como também daqueles que não sabem ou não têm coragem de a defender.
Nós vamos votar contra, porque as amplas movimentações populares não só repudiam este Governo, como criaram as condições que hoje impossibilitam que o PPD e o CDS formem governo.
Nos vamos votar contra, porque o crescer da luta do povo a defesa intransigente das conquistas de Abril estão a abrir as condições para que em questões de governo seja povo quem mais ordena. Ou seja, abrir caminho a um governo do 25 de Abril do povo. Nessa luta reside a única alternativa, a única esperança de um Portugal democrático, independente e socialista.
Nós vamos votar contra, porque o povo assim o exige.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Acácio dixit.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Veiga de Oliveira PCP): - Sr. Presidente, é para um curto protesto.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O Sr. Deputado Acácio Barreiros fez, antes de mais, uma série de afirmações despauteriantes e passou da leitura de um artigo num jornal para a afirmação de que tal ou tal dos meus camaradas: nomeadamente o secretário-geral do meu partido, estava muito preocupado com as posições da UDP. Fique, descansado, Sr. Deputado, que não estamos preocupados com a sua posição. Nem nós e pouca gente.
Por outro lado, o Sr. Deputado fez rir a Câmara. Ora a questão que estamos aqui a tratar não é de rir, é uma questão realmente grave e preocupante. E quando alguém faz rir deve meditar nas razões por que todos se riem.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Acácio Barreiros. Certamente que é para contraprotesto.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - É, sim, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Eng. Veiga de Oliveira fez um conjunto de afirmações que nada têm a ver com um protesto e que, além do mais carecem de verdade.
Na verdade, o secretário-geral do seu partido como outros dirigentes tem feito em comícios ataques directos a UDP. Na verdade, o jornal O Diário alguns dias a esta parte tem vindo a publicar na sua primeira página a calúnia de que a UDP seria um grupo nacional isto vem na primeira página de O Diário, mas também no próprio editorial dedicado aos ataques contra a UDP. Se a UDP é assim uma coisa que não representa nada, não se compreendem tantos ataques e tanta preocupação.
Queria ainda dizer que nós achamos muito bem que o seu partido critique a UDP, pois está no seu legitimo direito. Mas o que nos não admitimos é que u seu partido faca insultos e calúnias do teor das que tem feito e, sobretudo, que não as justifique, porque, evidentemente, não tem quaisquer provas para o fazer. E que esclareça também por que é que a UDP faz o jogo da reacção. Será porque é contra a aplicação da Lei Barreto? Será porque ë comera a Lei dos Despedimentos. Será porque é contra o 25 de Novembro?
Sr. Deputado, nós compreendemos o nervosismo e até um certo histerismo que leva a certas calúnias sobre a UDP. E que o Sr. Deputado e o seu partido sabem, e a direcção do seu partido sabe-o bem, que quando a UDP diz não à Lei Barreto não está a dizer uma coisa que seja só a posição da UDP, está a dizer uma coisa que foi pintada por muitos militantes do seu partido em fábricas, nas ruas e em toda a pane: quando a UDP se afirma contra a legislação reaccionária e o 25 de Novembro, está também a falar numa coisa que é muito cara aos militantes do seu partido. Portanto, o nervosismo só pode vir de quem está a abandonar as posições que, inclusivamente, prometeu aos seus militantes.
E quero dizer-lhe, ainda, que me estou perfeitamente nas tintas para as gargalhadas desta Assembleia. O que me preocupa, isso sim, são os trabalhadores que estão no desemprego, são, por exemplo, os trabalhadores a quem o seu pá n ido disse que não permitiria a aplicação da Ler Barreto e agora vai negociando a aplicação «razoável» da Lei Barreto. Mas também não temos dúvidas que da mesma forma que o Governo se isolou no Alentejo por ter querido aplicar a Lei Barreto, também se acabarão por isolar aqueles que a quiserem aplicar razoavelmente, porque os trabalhadores querem um Alentejo dos trabalhadores, da Reforma Agrária e não cabe ali nenhuma Lei Barreto, «razoável» ou não.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pediu a palavra, para que efeito?
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para um breve comentário, ou um contraprotesto, para ser regimental...
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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira é capaz de me comunicar a disposição que permite os comentários a um contraprotesto a um contraprotesto!
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP) - Então, Sr. Presidente, como não pode ser um comentário ou um contraprotesto, fará o favor de considera-lo como um esclarecimento à Câmara.
O Sr. Presidente: - Assim esta bem. Sr. Deputado. Tenha a bondade.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O Sr. Deputado Acácio Barreiros fez uma serie de afirmações que não tem qualquer conteúdo.
Mas o meu esclarecimento a Câmara e também para o Sr. Deputado Acácio Barreiros, como lembrança, e que ha limites para o ridículo.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Vítor Sá Machado.
Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Ministro Sousa Gomes.
O Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica (Sousa Gomas): - Sr. Presidente, Srs. Deputadas: Está neste momento em causa um voto de confiança pedido pelo Primeiro-Ministro, nos termos apontados na sua declaração política produzida perante esta Câmara. Supor-se-ia, legitimamente, que as intervenções dos representantes da oposição se centrariam numa resposta as asserções e permissas que consubstanciam as posições do Governo.
A verdade é que a Câmara tem ouvido a oposição e tem permitido notar-se uma fuga a uma resposta directa e cabal às questões formuladas, refugiando-se em argumentos e criticas aprioristicas e recusando-se, pelo menos nos aspectos económicos, à apresentação de propostas viáveis de alternativa às soluções preconizadas pelo Governo.
A oposição situando-se no campo das criticas genéricas e necessariamente fáceis, refugia a sua argumentação numa exploração implícita dos aspectos ideológicos mais evidentes, em se aperceber que os ataques que desenvolve em relação ao Governo atingem por vezes a própria filosofia subjacente ás suas posições.
Assim o primeiro sentimento que gostaria de expressar em relação às intervenções, dos lideres da oposição, no que respeita nos aspectos ligados à analise da situação económica, e o de decepção.
De facto, nada de verdadeiramente novo foi aprestado em relação às criticas estereotipadas a que já nos habituaram os vários sectores da oposição.
O Deputado Freitas do Amaral e posteriormente o Deputado Amaro da Costa, por parte do CDS, apresentaram as já habituais teses acerca daquilo que consideram ser os insucessos do Governo e da alegada inadequação do seu modelo de desenvolvimento.
No pólo oposto, o PCP repetiu mais uma vez nesta Assembleia os seus ataques aquilo que considera ser a política antioperária do Governo.
É fácil ao Governo e á opinião pública compreender as razões determinantes das críticas formuladas por estes dos partidos, já que ambos se apresentam com estruturas ideológicas consistentes e suficientemente diferenciadas da filosofia defendida pelo Governo e pelo Partido Socialista.
Permita-me o Prof. Freitas do Amaral que lhe laça o reparo de ter esquecido, ao sublinhar alguns dos insucessos do Governo, o facto de serem tais eventuais insucessos característicos também, das democracias do mundo ocidental onde os partidos do centro da direita tem maior responsabilidade na condução da vida política. Será conveniente que se explicassem a esta Câmara as razões pelas quais nesses países o investimento não tem dado mostras de retoma, o desemprego apresenta as mais elevadas taxas desde o pós-guerra, os preços continuam a aumentar a própria dívida interna não cessa de crescer.
O PCP, por seu turno, tão insistente nas suas acusações ao Governo por aquilo que define como política antioperária, ignora, pura e simplesmente, que, apesar das extremas dificuldades de todos conhecidas, o Governo tem podido, através de uma política realista e fiel aos grandes princípios do seu Programa, manter o essencial das conquistas dos trabalhadores naquilo que elas têm de mais profundo e consistente, e não obviamente no que elas poderão representar de demagógico e acessório. E não será o PCP que desmentirá o Governo em relação à aceitação que as classes trabalhadoras souberam dar até hoje a uma política realista que o Governo vem praticando, sem esconder os sacrifícios pedidos. O Partido Socialista tem falado uma linguagem de verdade capaz de garantir que cumprirá as promessas de melhoria do nível de vida real dos trabalhadores. Disso é testemunha a paz social em que se tem vivido e já aqui realçada pelo Sr. Primeiro-Ministro.
O Partido Socialista tem desenvolvido, a partir do momento em que aceitou as responsabilidades da governação, uma política de interesse nacional, e por isso é tão atacado à esquerda e à direita.
E esquece-se o CDS e o PCP que a política prosseguida pelo Governo é a única via para a reconstrução do País fora de um clima demagógico e de promessas fáceis ou de quadros históricos que no Ocidente ou no Leste se mostram incapazes de perspectivar o futuro do progresso humano.
Fora destas duas posições situam-se as criticas que ouvimos dos representantes do PSD. Desde já se diga que, no plano ideológico, as posições manifestadas por este partido se afiguram extremamente inconsistentes porventura em mutação. Daquilo que nos foi dado ouvir parece que o PSD terá enveredado por um certo tipo de críticas característica, de formações que nada têm a ver com a social-democracia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E isto não se toma menos verdadeiro pelo simples facto de nas suas exposições, os Srs. Deputados representantes do PSD terem procurado,
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aqui e além, colorir as suas afirmações com alguns motivos das teses habituais dos partidos liberais. A ideia que a oposição pretende dar ao País de que tudo se deteriorou durante os últimos dezasseis meses o Governo contrapõe categoricamente a verdade dos factos, referindo aqui de forma indesmentivel, como de resto algumas intervenções de Deputados do Partido Socialista, os aspectos que traduzem um relativo êxito da política económica do Governo e uma melhora real verificada no conjunto da actividade económica.
Assim, o produto nacional aumentara inegavelmente em 1977 (entre 6% e 7%), apoiado num aumento fortemente positivo, já produção, industrial e da construção, e não obstante o decréscimo ou estagnação observada na produção agrícola, e investimento retomou, atingindo níveis que há um ano nem o próprio Governo ousava esperar, e os sinais de confiança dados pela forte expansão das remessas dos emigrantes e pelo aumento das receitas, do turismo são outros aspectos que se evidenciam como inegáveis no quadro da situação económica.
Mesmo em relação aos problemas estruturais, cuja gravidade o Governo não escondeu nunca no seu próprio diagnóstico, se não foram possíveis todas às melhorias desejadas, não houve, na verdade, a deterioração tão apregoada pela oposição.
O Sr. Ministro das Finanças deu já uma ideia clara sobre os aspectos ligados com as relações económicas externas, designadamente em relação a situação da balança de pagamentos, que constitui sem dúvida o aspecto mais preocupante da situação financeira. Mas mesmo nesta área, se não foi possível conseguir a meta de redução que desejaríamos não houve, porem, uma degradação absoluta da situação. Assim em 1977 o défice das transacções correntes não será superior ao de 1976. E em termos de percentagem relativa ao produto nacional este défice diminuirá mesmo em 1977, não obstante o produto nacional ter crescido a um ritmo superior ao de 1976 e o do investimento ter aumentado mais 40% em volume, dos quais 18% em formação de capital fixo.
Quanto à inflação, a meta inicialmente prevista no Plano para 1977 foi revista, e aqui nesta Câmara - de resto com o aplauso do PSD e do CDS, no âmbito das medidas de 25 de Fevereiro tendo sido necessário aceitar para 1977 valores mais elevados do que os inicialmente programados. Todavia, não se confirmaram as hipóteses de crescimento de 40% de inflação (ontem mesmo aqui o Sr. Deputado Sousa Franco afirmaria que. em vez dos 40% em tempos adiantados pelo seu partido, a inflação seria apenas da ordem dos 32% para 1977: a este respeito posso adiantar que a variação media do índice de preços para 1977 em relação a 1977 não será sequer superior a 21 % e que mercê da política estrutural prosseguida pelo Governo Constitucional, foi possível uma efectiva estabilização aos preços d partir de meados do corrente ano.
Quanto ao problema do emprego, e preciso reconhecer que, ao contrario do que a oposição vem repetindo sistematicamente, a política do Governo não só permitiu a absorção, que ha que considerar espectacular, da grande maioria dos desalmados das ex-colónias, como permitiu evitar a continuação da desagregação da situação do emprego. Refiram-se, a propósito, os dados tornados disponíveis pelo Instituto Nacional de Estatística, e que permitem avaliar o desemprego, que se situa neste momento em cerca de trezentos mil activos e não mais os números anunciados no fim de 1976, de quinhentos mil, é curioso notar, e peço ao Sr. Deputado Amaro da Costa que não leve a mal este reparo que lhe vou fazer, que a estatística para a oposição nunca tinha merecido grandes dúvidas enquanto os indicadores mostravam tendências negativas. Agora que, felizmente para o País, há uma retoma inegável da actividade económica, demonstrada por todo um conjunto de indicadores, há quem na oposição comece a ter dúvidas.
O Sr. Deputado Amaro da Costa disse que não sabia onde estava o investimento de cerca de 146 milhões que na proposta relativa ao Plano para 1978 -, e indica como uma estimativa para este ano. Pois então tome cuidado que pode não ver outras coisas igualmente importantes para este país. É que, efectivamente, a estatística já não se faz a olho. E para sua informação, não querendo trazer aqui aspectos excessivamente técnicos, direi, aliás com simpatia ao Sr. Deputado Amaro da Costa que, apesar da má gestão que atribui a este Governo muito tem mudado e até, a informação técnica e estatística começa a melhorar. E poder-lhe-ia citar, por exemplo, o próprio texto que a Comissão da Comunidade Europeia elaborou a propósito do pedido de adesão de Portugal, em que, a respeito das informações pedidas, diz o seguinte: as respostas aos questionários, que de resto necessitaram de um importante trabalho estatístico da parte da Administração Portuguesa, foram extremamente completas e de uma qualidade notável. Isto e um exemplo de que, mesmo no exterior, quando não no interior, começa a ser possível ver que aqueles alicerces que o Sr. Deputado António Guterres referiu se começam, em alguns aspectos, a ver.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E, perante as criticas formuladas pela oposição, quais as alternativas propostas?
Devo dizer, em primeiro lugar, que as soluções apresentadas em nome do PSD pelo Sr. Deputado Sousa Franco, e sistematicamente repetidas nos seus textos remetidos ao Governo, se afiguram de uma total pobreza e falta de originalidade...
Risos do PSD.
...e de um irrealismo que chega a ser demagógico. O PSD não consegue formular na sua análise crítica qualquer aspecto original em relação ao diagnóstico da nossa situação.
É preciso que o Pais saiba que a esse diagnóstico feito pelo Governo a oposição não juntou ainda qualquer elemento original, limitando-se a repetir os próprios dados da análise feita pelo Governo.
Aplausos do PS.
Mas algumas soluções tem o seu cunho de originalidade. É o caso do Plano Nacional de Emprego referido pelo PSD. Mas o que é esse Plano? Será uma
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ideia paralela aquela que durante o IV Governo Provisório o Ministro Murteira apresentou?
Considera ainda a oposição que o Governo tem falhado por não adoptar uma política expansionista. Mas como pode a oposição negar o esforço feito pelo Governo, que permitiu, depois da recuperação de 5% em 1976 a manutenção de um crescimento entre 6% a 7% para 1977? Como e possível a oposição querer uma política expansionista e criticar simultaneamente o Governo pela manutenção de elevados défices da balança de pagamentos correntes?
O CDS e o PSD não foram capazes de explicar, nas suas propostas, como era possível, sem o programa de estabilização proposto pelo Governo para 1978, conseguir a prossecução de um programa de desenvolvimento mais acelerado que o próprio Governo pretende e deseja realizar, mas que exige a progressiva redução do défice externo.
Para contrapor á política de empréstimos conseguida pelo Governo junto dos países ocidentais - o chamado empréstimo de cerca de 750 milhões de dólares - refere o PSD que a solução cria um miniplano Marshall. Cabe perguntar se as ajudas conseguidas pelo Governo não ultrapassam aquilo que poderia constituir uma ajuda não ligada, no âmbito de um plano desse tipo.
É evidente que existem menores dificuldades na obtenção de outros empréstimos para o financiamento de projectos produtivos. Simplesmente é necessário encontrar formas de financiamento global para a economia portuguesa que superem os défices constituídos pela balança de transacções correntes com o exterior.
É disso que se trata, e não de criticar o Governo por obter empréstimos pretensamente para consumo. Com efeito, num país que investiu em 1977 mais de 16Ü milhões de contos e que obteve financiamentos para equilíbrio da balança de transacções correntes de cerca de 40 milhões de contos e ridículo esse tipo de argumentação, que pretende lançar a ideia de que tais financia mentos possam ter sido destinados, exclusivamente, ao consumo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A oposição não se coibiu também de referir que a política económica e financeira do Governo não é coerente. Refere o problema do diagnóstico e dos objectivos. Quanto ao diagnóstico da situação económica, não conhecemos críticas consistentes. Há que reconhecer que a própria oposição já aqui teve, apesar de tudo. palavras positivas para o próprio diagnóstico feito pelo Governo. Quanto aos objectivos e opções da política económica, preocupa-se a oposição com o facto de o Governo, ao apresentá-los, não o ter feito sempre, rigorosamente, com a mesma expresso formal.
Para que esta questão se esclareça devidamente parece necessário relembrar ao CDS e ao PSD que os objectivos centrais da política económica têm constituído, desde o inicio da actividade governativa do Partido Socialista, uma estrutura dotada de coerência e objectividade, que se poderá sintetizar da seguinte forma: em relação aos objectivos, e opções de médio prazo: redução das desigualdades verificadas em relação aos estratos economicamente desfavorecidos, correcção dos fortes desequilíbrios existentes a nível regional e melhoria da satisfação das necessidades fundamentais e básicas da população; restabelecimento dos equilibrios económicos fundamentais e necessários a um crescimento estável e não inflacionário: preparação da adesão à Comunidade Económica Europeia, tendo em conta as alterações que as estruturas produtivas terão de sofrer e as correspondentes modificações de caracter social que a sociedade portuguesa terá de enfrentar.
Estas grandes metas traduzem, em objectivo opções de curto prazo que para o ano ide 1978 já estão consubstanciadas num programa a apresentar à Assembleia, da República e que prevê num crescimento adequado à redução do défice de transacções correntes, a diminuição e contenção do processo inflacionista, à manutenção da situação de melhoria do emprego.
São portanto inconsistentes as afirmações feitas no sentido de fazer crer que o Governo não tem uma política global nem uma estratégia económica coerente. É igualmente falso que o Governo não tenha apresentado um conjunto de medidas adequadas à resolução dos grandes problemas da economia portuguesa.
O modelo subjacente ao memorando apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro é atacado, também, por considerar exclusivamente objectivos a realizar no próximo ano. Esse ataque, não nos parece válido já que a oposição não ignora que o Governo preparou as bases das grandes opções do Plano a médio prazo as quais deverão, introduzidas as necessárias actualizações, até por iniciativa do Governo -, ser objecto de apreciação por esta Câmara.
Deve acrescentar-se que o Governo tem, neste momento, em estudo cenários para o período 1980-1984, no âmbito do qual se considera possível uma expansão da nossa economia a níveis substancialmente mais elevados, baseados não ao no crescimento da indústria como ainda na recuperação da agricultura e pescas.
No entanto, que ninguém tenha ilusões a este respeito: para se atingir o estádio de desenvolvimento que todos desejamos é absolutamente imperioso solucionar os problemas conjunturais de curto prazo relacionados com a balança de pagamentos.
Aqueles que nos atacam, pelas nossas propostas de estabilização para o próximo ano, têm de reconhecer que tal estabilização é indispensável para uma recuperação em anos futuros. É sabido que algumas meras de desenvolvimento, previstas no .nosso projecto para médio prazo, são considerados ambiciosas no próprio contexto das economias europeias.
Acusa-nos a oposição de, com os programas de austeridade projectados para o próximo ano, abrirmos o caminho a um desemprego crescente e a uma alta do custo de vida.
São acusações que não foram objecto de demonstração e cujo erro importa denunciar.
O programa para 1978 comporta, na verdade, uma expansão. Expansão porventura moderada mas superior à média esperada para os países europeus da OCDE, excluindo a Alemanha Federal, e sensivelmente mais elevada do que a dos nossos parceiros mediterrânicos.
Longe de abrir o caminho ao desemprego o programa que o Governo pensa implementar impedirá um tratamento recessionista na economia portuguesa
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mais duro nos anos subsequentes e irá permitir, em qualquer caso, a recuperação do nível de emprego. É, também a única estratégia capaz de debelar algumas das razões persistentes da inflação de que enferma a nossa economia e deste modo será legítimo esperar resultados positivos nessa área.
O Governo sabe que ais (soluções que propõe determinam sacrifícios e impõem algumas dificuldades aos Portugueses, mas nunca enveredará pelo caminho irresponsável das falsas e aliciantes promessas irrealizáveis a curto prazo.
Foi muito esclarecedor ter ouvido, ontem e hoje nesta Câmara, algumas propostas miríficas e fáceis que a oposição - sobretudo o PSD e o CDS - diz ter para a fácil resolução da crise. Historicamente ficou esta Câmara habilitada a julgar, em tempo próximo, do realismo ou irrealismo dessas propostas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Há também um tema que o Governo não quer esquecer. Pode estar o País certo de que o Governo fez do Plano o seu instrumento privilegiado e que manterá, como acção privilegiada no controlo da economia, o papel delineado através do Plano. Será também o Plano que servirá para mobilizar o País em torno de grandes objectivos de médio prazo, mas importa dizer que o Governo não fará do Plano um fetiche sagrado. As medidas conjunturais adoptadas, mesmo quando aparentemente se afastam dos parâmetros inicialmente previstos, destinaram-se a salvaguardar a prossecução de objectivos mais essenciais defendidos no Plano.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Quero terminar e diria que, em termos globais e específicos quanto aos aspectos económicos, a oposição não conseguiu demonstrar com efectividade: que no quadro das limitações existentes a política económica do Governo não tenha tido êxito relativo e indiscutível, que o diagnóstico de conjuntura apresentado pelo Governo não é correcto e corajoso quanto às soluções apontadas para a correcção dos aspectos estruturais; a oposição não conseguiu também demonstrar que as soluções propostas pelo Governo para resolver a crise económica tenham alternativas reais.
A oposição não conseguiu provar, no concreto, que existem alternativas ao estabelecimento de um acordo com o Fundo Monetário Internacional, nem tão-pouco que a proposta feita pelo Sr. Primeiro-Ministro, sobre a necessidade de uma base de consenso nesta matéria, não seja necessária face às dificuldades a vencer no próximo ano.
As criticas pontuais e a argumentação eleitoralista utilizada pela oposição, por falta de enquadramento global, não são assim suficientes para demonstrar ao País que existem alternativas para resolver a crise económica.
A aprovação ou rejeição do voto de confiança ao Governo será julgada historicamente não só em termos políticos mas também em termos das consequências económicas que dela decorrerá para o povo português.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia, presumo que para um protesto.
O Sr. Angelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, se fosse necessário caracterizar o discurso do Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica, poder-se-ia dizer, muito sucintamente: dilúvio de palavras, num deserto de ideias.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Risos do PS.
O Orador - Disse há pouco o Sr. Deputado António Guterres que a nossa, proposta, no domínio económico, era confusa. Diz o Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica do Governo Socialista que a nossa proposta não é confusa, antes tem aspectos liberais. A confusão existe, não há dúvida, dentro do espírito do Partido Socialista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Caracterizar a nossa proposta como liberal significaria que, primeiro ponto, admitíamos uma forte e substancial redução da importância do sector público em Portugal. Não o fizemos, pois isso significaria desvirtuarmos e minimizarmos um papel intervencionista do Estado na economia da sociedade portuguesa. Significaria, também, admitirmos um sistema completamente livre de mercado sem qualquer controlo e intervenção das autoridades públicas. Não o fizemos. Desse modo caracterizar a nossa proposta como liberal é pura demagogia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Segundo ponto: fiz o Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica que a nossa proposta, em muitos pontos, é irrealista e que não é original. Irrealista ou realista, depende da capacidade da sua execução; mas o que está em causa neste momento, nesta Câmara, é o voto de confiança à acção de um Governo e não a propostas de partidos da oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Inverter os termos do diálogo significa, pura e simplesmente, escamotear as questões e o Governo estar a encontrar o bode expiatório para o fracasso da sua política.
Aplausos do PSD.
A Nação não o pode consentir em termos de verdade política.
Terceiro e último ponto: Uma das críticas fundamentais que fizemos ao Governo é estarmos a optar a decidir, a pensar e a julgar em termos de uma estratégia anual de curto prazo para 1978. Diz o Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica que o Governo tem pensado as estratégias até 1984. Se as tem, porque as não apresenta? Porque permite que a oposição julgue o Governo numa perspectiva conjunturalista e de curto prazo, sem introduzir as variáveis de médio prazo? Por que é que é o próprio Governo que dá azo à sua crítica?
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, como há mais pedidos de esclarecimento eu perguntava-lhe se deseja responder imediatamente ou aguardar.
O Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica: - Isto é um protesto, Sr. Presidente, portanto vou responder já.
O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica: - Eu só uso da palavra como contraprotesto porque suponho que foi a forma utilizada pelo Sr. Deputado Angelo Correia.
Eu quereria dizer que a sua intervenção, extremamente viva, felizmente não se consubstanciou em nada que justifique a forma de protesto.
Aplausos do PS.
Mas aproveito para lhe dizer que não caracterizei as propostas do PSD como liberais. Disse sim que se tinha assistido a flutuações ligadas à ideologia subjacente ao PSD e que as intervenções dos Deputados do PSD faziam, por vezes, força em certos leit-motivs de carácter liberal. É evidente que e uma opinião minha. O País julgara.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Fiquei também satisfeito por referir que ais omissões, que diz existirem e que reconheceu existirem nas propostas do PSD afinal não significam falta de capacidade de diálogo do Governo nem uma porta fechada em relação às posições do PSD. De facto não é o Governo que quer fechar as portas ao diálogo, nem a propósito da moção de confiança que está em causa, nem a propósito do Plano para 1978. nem a propósito do Plano a médio prazo. E verdade que dispomos de elementos para discutir, mas e preciso criar o espaço de diálogo. E eu fico satisfeito por ouvir, da sua boca, que na sua bancada, pelo menos, não se fechará a boca ao diálogo de futuros problemas que têm de ser debatidos a nível nacional.
Aplausos do PS.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - E é verdade, Sr. Ministro!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Sr. Presidente, muito obrigado, mas obviamente não vale a pena.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Ministro, ouvi com certa perplexidade o número d.e 300 000 desempregados, fornecido na sua intervenção, enquanto no Plano a médio prazo esse mesmo número era da ordem dos 452 000. Eu queria perguntar se será que o Sr. Ministro, para demonstrar a política de emprego do Governo, não considerou desempregados as centenas de milhar de jovens que procuram ú primeiro emprego. Com a política de educação e de emprego seguida por este Governo Constitucional, nós estamos crentes de que o problema de primeiro emprego se agravou e que é hoje mais difícil e incerto o futuro de muitos e muitos jovens do nosso país. No entanto, num encontro realizado recentemente pelas organizações da juventude do meu partido, o problema do emprego foi considerado o problema central da juventude portuguesa. Por isso mesmo eu pergunto ao Sr. Ministro quantos são, actualmente, os jovens que procuram o primeiro emprego e quais foram as medidas que o I Governo Constitucional fez neste campo.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, como há mãos dois Srs. Deputados inscritos para pedidos de esclarecimento, eu gostaria de lhe perguntar se deseja responder imediatamente ou se aguarda o termo das perguntas.
O Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica: - Respondo no final das perguntas, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas para formular perguntas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro, a minha camarada pôs o problema do primeiro emprego e eu abordo o problema dos inquéritos e, portanto, os métodos estatísticos. O Sr. Ministro sabe, tão bem como eu que é absurdo comparar um número com .ºutro: o primeiro número dos 400 000 ou 500 000 desempregados, cuja primeira pessoa a anunciá-lo publicamente foi o Sr. Secretário de Estado do Plano, e este número do inquérito, que esteve fechado nas gavetas do Instituto Nacional de Estatística durante mais de oito meses, que tem muitas limitações técnicas como sabe e cujos fogos novos não foram inquiridos e que é a todos os títulos muito duvidoso e que nós previamente também o denunciámos. Mas de qualquer maneira é absurdo poder comparar, pois não se pode comparar estes dois números, como sabe.
No entanto a minha pergunta era esta: concorda ou não o Sr. Ministro que a política das desintervenções em que o patronato sabotador, logo que tem ocupado as empresas, tem passado aos despedimentos sucessivos e a política da elevação das taxas de juro, que tem arretado o agravamento financeiro às pequenas e médias empresas, tem concorrido ou não para o agravamento do desemprego, dos despedimentos e que a realidade demonstra que, efectivamente, o tem?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica: Mais uma vez se assistiu neste debate, á insistência feita por membros do Governo pelo facto de não haver da parte da oposição - em que nós certamente estamos incluídos - alternativas. Nós já deixámos passar isto várias vezes, mas não é justo que se insista.
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O Sr. Ministro, todo o Governo e esta Câmara, e também o povo português, sabem que nós em termos o aparelho de Estado à nossa disposição, nem nada que se pareça, fizemos um inventário das situações e concluímos com propostas, que podem não ser consideradas, porque não agradam ou parque politicamente não convém, mas que nem bases e que tom como se costuma dizer, pernas para andar. Mas a minha pergunta ia a outra questão.
Disse o Sr. Ministro que houve uma melhoria real do conjunto da actividade económica. Não negará, nem o Governo o nega, que houve uma diminuição dos salários reais no ano de 1977: não nega que houve, apesar de tudo o aumento ou pelo menos o estacionamento da situação de desemprego: não nega que houve uma taxa de inflação que ronda os 30% e eu peco-lhe que conclua que a melhoria da actividade económica - se a houve - foi só, e só para os capitalistas e em prejuízo, e só, daqueles que trabalham e vivem dos rendimentos fixos. A pergunta e se está ou não de acordo com esta conclusão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica para responder, se assim o desejar.
O Sc. Ministro do Plano e Coordenação Económica: - Tenho agora três questões postas pelos Srs. Deputados Zita Seabra, Carlos Carvalhas e Veiga de Oliveira.
É importante a pergunta sobre a situação do desemprego. O inquérito revelado ou tornado disponível recentemente pelo INE é um inquérito que foi realizado de forma sistemática desde, 1974 e o Governo vai tornar públicos não só os resultados como a crítica metodológica já feita. É um inquérito que pode ter uma margem de erro. como todos os inquéritos e estatísticas têm, mas o que nós temos, neste momento é a certeza de que os seus números por mais margem de erro que se possa querer imputar-lhes, têm uma validade substancialmente superior a todas as outras estimativas. De resto, quando foi feita a análise nos trabalhos preparatórios do Plano a médio prazo, o próprio Governo informou que a estimativa de 500 000 desempregados não era consistente. Portanto, que provinha de trabalhos feitos no Ministério do Trabalho que evidentemente tinham o seu mérito e eram, sem dúvida nenhuma, um esforço feito pelos serviços respectivos, mas que se baseavam em extrapolações a partir dos centros de inscrição no desemprego, e próprio técnico da OCDE que nos visitou rejeitou essas estimativas. E neste momento, depois de ter analisado os dois inquéritos, considera que o numero dos 300 000, obtido pelo inquérito permanente e que continuara a ser feito, publicado e actualizado, dá uma validade bastante maior. É, de resto, este inquérito que permite detectar um conjunto de situações, uma das quais referiu a Sr.ª Deputada Zita Seabra, que efectivamente ao contrário do que os outros indicadores do Ministério do Trabalho permitiam supor é o primeiro emprego que fé m aumentado, enquanto que a procura de novos empregos tem acusado algumas melhorias. Ou seja, é efectivamente ao nível dos jovens que saem do sistema escolar e que ascendem ao mercado de trabalho que se tem agravado, de forma sensível, o desemprego.
Perguntou-me a Sr.ª Deputada Zita Seabra quais as medidas que o Governo propõe e eu penso que são neste pequeno esclarecimento que lhe poderei responder a uma exaustiva lista que foi tornada pública. ainda recentemente, num colóquio promovido pela Secretaria de Estado da População e Emprego. Mas o Governo terá o maior gosto em facultar, se forma escrita e detalhada, as medidas que estão a ser promovidas.
De resto, no âmbito do Plano para 1978 prevemos acelerar, de forma intensa, as acções de formação profissional, porque se detecta também, através deste inquérito, uma inadequação entre a procura de emprego e as capacidades de resposta e de solicitação e de habilitações para os empregos disponíveis.
Por outro lado, este inquérito permite, de forma insofismável, mostrar que desde 1975 houve uma recuperação também a nível de emprego. Ter-se-á - criado qualquer coisa como mais 100 000 empregos em Portugal. É em parte à custa disso que foi possível absorver a população de activos dos retornados e muitas dezenas de milhares de pessoas que não tinham ocupação.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pergunta concretamente se terá havido ou não uma melhoria e a minha resposta é que houve, efectivamente, uma melhoria, porque apesar daquilo que o Sr. Deputado Carlos Carvalhas referiu sobre as desintervenções, aumento das taxas de juro, criação de situações de dificuldades para as empresas, a verdade é que foi possível pela política do Governo pôr a funcionar os mecanismos necessários da economia para dar um mínimo de confiança e para que muitas empresas retomassem a sua laboração, para que muitas empresas que tinham encomendas mas não queriam admitir turnos, não queriam laborar com maior intensidade, o passassem a fazer. Portanto, no seu conjunto nós pensamos que houve uma melhoria. E eu, Sr. Deputado, na minha intervenção não escamoteei que, face aos problemas essenciais da balança de pagamentos, do emprego e da inflação, as melhorias eram relativas, mas disse sim que não tinha havido a deterioração que foi apregoada.
O Sr. Cavalheira Antunes (POP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Cavalheira Antunes, pode-me dizer para que efeito pede a palavra?
O Sr. Cavalheira Antunes (PCP): - Era para dar uma curtíssima explicação à Câmara acerca de uma afirmação do Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente; - Creio que o Sr. Deputado Carlos Carvalhas deseja fazer um protesto.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, eu tinha pedido ao Sr. Ministro se me dava licença de o interromper e como o Sr. Ministro me deu licença eu ia faz-lhe uma pergunto.
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O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
Sr. Deputado Carvalheira Antunes, eu já lhe darei a palavra.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Sr. Ministro conhece bem o inquérito e sabe bem que não pode inferir que houve uma melhoria em relação ao emprego a partir de 1975. Tanto mais que o que esse inquérito revela e que aumentou o subemprego e dai que se possa dizer ou apontar que a população activa tenha aumentado.
Mas a resposta que nos deu não responde a questão que foi colocada. E é esta: é que efectivamente não pode comparar os dons valores e os dois valores têm os mesmos limites de erro. Esta é que é a realidade.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Também peço à palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -S r. Ministro, eu esto certo que não fugiu à questão, pois não costumo vê-lo fugir às questões, unas talvez tenha sido perturbado por várias perguntas.
O que eu referi não era que não tivesse havido uma melhoria no conjunto, pois isso está fora de causa. A questão que se pôs foi que tendo havido uma melhoria na actividade económica, mas tendo havido também uma baixa de salários reais e um aumento da inflação - nomeadamente acerca de 30 % -, isso melhoria repartiu-se da seguinte maneira: melhoria para os capitalistas, à custa de quem viu diminuir o seu salário real e de quem viu prejudicado o seu rendimento fixo pela inflação. Isto é, a melhoria teve reflexos completamente diversos para aqueles que vem da exploração do trabalho e para aqueles que vivem do trabalho. Esta era a questão. E a pergunta era se isto era ou não verdade.
Eu não insisto na pergunta, mas parece que está claro que era verdade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica.
O Sr. Ministro do Plano e Coordenação Económica: - Muito rapidamente, porque, de facto, emas respostas retiram tempo necessário à intervenção ao Sr. Primeiro-Ministro. Eu diria simplesmente que a questão que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira põe é muito mais complexa do que aqueles termos em que está a ser posta. E dir-lhe-ei que a minha resposta, apesar de tudo, não é positiva. Desde o 25 de Abril os trabalhadores não perderam ainda os ganhos dos aumentos Manuais.
Quanto à sua pergunta eu dir-lhe-ia que os 500 000 desempregados, que foi uma estimativa avançada pelo Ministério do Trabalho não são de facto, comparáveis. É uma estimativa de um número que possivelmente nunca existiu.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavalheira Antunes.
O Sr. Cavalheira Antunes (PCP): - Prescindo da palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral para uma intervenção.
O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma breve intervenção final antes do encerramento do debate. As principais conclusões que o CDS julga poder tirar deste debate são as seguintes:
Em nossa opinião, o Governo não respondeu cabalmente ou não respondeu de todo às principais perguntas, dúvidas e pedidos de esclarecimento que lhe apresentámos. O Governo não invalidou, em nossa opinião, as principais críticas que lhe fizemos. O Governo manteve todas as suas posições anteriores, não alterou nenhuma delas, não formulou, que se saiba, novas propostas de negociações, não apresentou ideias novas para ultrapassar o desacordo verificado por ele próprio há uma semana, no dia 30 de Novembro. Mais ainda: o Sr. Primeiro-Ministro declarou solenemente que não alteraria a política seguida que aqui, que não modificaria a actual forma governai vá e, sobretudo, que não faria concessões a sua esquerda nem à sua direita para evitar a queda do Governo. Não pode, pois, estranhar-se que essa queda possa vir a concretização, porque, se acaso não houve acordos secretos e sendo patente que os não houve públicos, por que razão haviam os partidos da oposição, a quem nenhuma concessão terá sido feita, de apoiar um Governo que não é o seu? O Governo do PS tem de compreender que a oposição tem os seus pontos de vista próprios, de que não pode abdicar perante um Governo que não transige nos seus. Os partidos da oposição são pandos políticos, não são instituições de benemerência.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - A questão de confiança foi apresentada a esta Assembleia dia República sob a forma de duas perguntas, das quais a primeira é esta: deve ou não manter-se o Governo constitucional! de que é Primeiro-Ministro o Sr. Dr. Mário Soares?
O Sr. Primeiro-Ministro fez notar, aliás, que o que está em causa é o Governo no seu conjunto e a fórmula governativa, nada fendo o voto de hoje a ver com o mérito ou o demérito político dos vários membros do Governo; individualmente considerados.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Segunda: Aceita-se ou não o princípio das negociações com o Fundo Monetário Internacional e a condição da redução de um terço do défice da balança de transacções correntes em 1978?
A resposta clara, directa e concisa do CDS à primeira questão é, neste momento, a seguinte: o I Governo Constitucional não deve mantende porque não foi possível fazer um acordo tripartidário PS/PSD/CDS que consideramos essencial, porque o balanço da actuação do I Governo Constitucional até aqui ê considerado por nós insatisfatório, porque a situação económica, financeira e monetária do País tem vindo a piorar, em nossa opinião, e não a melho-
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rar, e porque o Governo actual não nos dá garantias de conseguir inverter a evolução desta situação num sentido positivo. Não tem, aliás fundamento nenhum dizer-se que pretendemos derrubar o Governo porque a situação está a melhorar e não queremos deixá-lo colher os frutos da sua boa sementeira. Primeiro, porque a verdade é que a situação piora e, em segundo lugar, porque, se fosse, verdade que esta situação estava a melhorar, este Governo que durante o tempo dá sua vigência se recusou a fazer sempre um simples acordo parlamentar com quem quer que fosse, não teria abandonado o seu isolacionismo pana vir agora propor uma plataforma como a que propôs.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - A segunda questão, a resposta clara, directa e concisa do CDS é, neste momento, a seguinte: aceitamos o princípio das negociações com o FMI, mas não acertamos os termos até agora ajustados pelo Governo e designadamente a redução proposta para o défice da balança de transacções correntes. Primeiro, porque consideramos perigosíssimas as consequências económicas e sociais desse acordo, nesses termos; segundo, porque entendemos que ele deve ser inserido no contexto mais amplo de um modelo diverso de desenvolvimento a médio prazo: terceiro, porque, não tendo nós participado nas negociações nem tendo recebido informações detalhadas da forma como decorreram, o CDS não pode avalizar perante os seus eleitores e perante o País um negócio que não conheça ma sua totalidade e em relação ao qual tem as maiores dúvidas de que o Governo tenha conseguido o máximo que noutras bases teria sido certamente possível obter para Portugal. Não está em causa a seriedade dos negociadores. Está em causa a capacidade de negociações e o modelo dentro do qual ela decorreu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, diz um ditado popular Inglês que é melhor acender-se uma luz do que queixar-se da escuridão. Procuremos, pois, ver um pouco mais para além do momento actual; Se o Governo cair, ou melhor, quando o Governo cair, hoje ou mais tarde, que soluções propõe o CDS para a crise?
O meu colega Amaro da Costa já apresentou hoje em 9 pontos as propostas concretas da solução económica que o CDS preconiza. Farei agora o mesmo quanto à nossa proposta política para o futuro imediato, parque é importante que o povo português conheça a opinião do CDS quanto ao que se poderá ou deverá passar se ou quando cair o I Governo Constitucional. A proposta política do CDS traduz-se nos seguintes pontos, que sinteticamente passo a enumerar:
1.º Tentativa de constituição de um governo maioritário de acordo entre partidos ou, se tal não for viável, tentativa de constituição de um Governo maioritário de iniciativa ou mediação presidencial;
2.º Se nenhum governo maioritário puder ser encontrado a curto prazo do actual quadro parlamentar, dissolução da Assembleia da República e convocação de eleições gerais antecipadas;
3.º Antes ainda da dissolução, aprovação de uma nova lei eleitoral que, além de permitir rever o regime de recenseamento, modifique substancialmente, dentro dos limites constitucionais, o sistema eleitoral português, de modo a facilitar em cada legislatura a formação de governos maioritários;
4.º Reinicio dos esforços de negociação de uma plataforma programática tripartida que dê ao País a serenidade de um rumo definido por amplo consenso nacional e facilite a tarefa do Governo que se seguir;
5.º Tentativa muito rápida de acordo tripartido, anterior mesmo à plataforma principal, quanto ao modelo alternativo a apresentar ao Fundo Monetário Internacional e participação dos signatários desse acordo (em conjunto com o II Governo Constitucional, se neste não estiverem directamente representados) na :nova fase das negociações a empreender com o FMI;
6.º Reflexão profunda dos partidos portugueses quanto às suas responsabilidades na resolução dos problemas nacionais e na preservação dais instituições democráticas;
7.º Esforço muito sincero dos partidos que contribuíram para a eleição do Presidente da República, ao sentido de o ajudarem a encaminhar a resolução da crise da forma que melhor sirva o interesse nacional, sem lhe negarem, no momento em que pessoalmente tiver que intervir, o apoio que ele próprio lhes não recusou até aqui;
8.º Esquecimento recíproco de anteriores querelas, recriminações e azedumes entre partidos e seus dirigentes, de modo a facilitar os convenientes acordos interpartidários e reduzir ao mínimo os factores de agravamento da crise.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Serenidade, civismo e confiança na possibilidade de os homens se entenderem e os problemas se resolverem e de os tempos melhoraram para os portugueses.
Portugal vencerá a sua crise.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é possível compreender a posição do PS e os debates que aqui se travaram se se esquecer o que foi a historie em Portugal antes dó 25 de Abril e depois do 25 de Abri. A mim cabe-me, como representante do Grupo Parlamentar Socialista, fazer, por parte do meu grupo, a síntese da nossa posição. Todos nós sabemos o que foi o fascismo em Portugal, todos nós sabemos o que foi o 25 de Abril, todos nós sabemos os momentos, as vicissitudes e as controvérsias que se geraram depois do 25 de Abril. Não vamos, nem pretendemos definir a posição dos outros grupos. Apenas definirei a posição do Grupo Socialista. Os socialistas sempre lutaram pela liberdade no tempo do fascismo, saudaram o 25 de Abril como uma aurora de esperança para Portugal e depois do 25 de Abril, nas confrontações que houve entre Portugueses e que estiveram e estão bem presentes nos confrontos verbais havidos hoje aqui nesta Assembleia, o PS desempenhou o papel de medianeiro entre os partidos rivais, entre as regiões geográficas
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antagónicas, de modo a encaminhar Portugal para a unidade, para a solidariedade e a democracia.
Aplausos do PS.
Seja qual for o juízo que outros grupos parlamentares possam fazer, e isso não é da minha competência, a verdade é que hoje nós ouvimos, em estilos e em estruturas mamais que nos lembram murtas vezes estilos e estruturas mentais que eram correntes nos circulas dirigentes de antes do 25 de Abril, a teoria e a doutrina de que o que se passou em Portugal deve ser capitalizado como capital de desespero. A posição do PS é a de que tudo o que se passou depois do 25 de Abril, mesmo os confrontos entre nós, deve ser capitalizado como um capital de esperança.
Aplausos do PS.
Não interessa nós estarmo-nos a recriminar constantemente sobre o que se passou, não apenas entre três partidos, como sugeriu o Sr. Deputado Freitas do Amaral há momentos. Nós devemos esquecer as recriminações entre todos os portugueses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E para nós é (perfeitamente estranho que o Sr. Deputado Freitas do Amaral, ilustre professor da Faculdade de Direito de Lisboa, como aliás, o seu colega Professor Dr. Sousa Franco, da mesma Faculdade de Direito, nos falem em reconciliação nacional e pretendam excluir os comunistas dessa reconciliação. Eu pergunto: porquê?
Aplausos do PS.
Será porque nessa Faculdade leccionou o Sr. Professor Cavaleiro de Ferreira, que inventou as medidas de segurança para os comunistas e outros antifascistas e se pretende que possa haver um parlamento democrático ou uma vida democrática com medidas de segurança? Eis uma questão que eu queria pôr e gostaria de ver respondida.
Nós pensamos que devem ser esquecidas as recriminações entre todos os portugueses e a reconciliação entre todos os portugueses e a reconciliação não pode ser hipocrisia. A reconciliação deve ser predicaria e praticada. A prédica sem prática é hipocrisia. Eu não quero fazer de maneira nenhuma ofensa a nenhum dós Deputados aqui presentes, inclusivamente ao Sr. Professor Freitas do Amaral e ao Sr. Professor Sousa Franco, em cuja sinceridade democrática acredito, mas, naturalmente, como nós ouvimos e, aliás, com atenção e até com interesse as vossas criticas, será natural que do mesmo modo ouçam também as novas observações. A posição do PS em todos os conflitos portugueses terão de ser compreendida: nós somos medianeiros. Procurámos evitar os confrontos entre os Portugueses, de modo que não fossem encaminhados para uma guerra civil.
O CDS foi perseguido em Portugal e nós sempre defendemos, sem medo e sem receio, o directo de o CDS exercer Livremente as liberdades democráticas; quando foi proposta a saída do PSD do VI Governo Provisório, nós sempre defendemos o direito a que esse partido permanecesse no Governo Provisório. Mais do que isso, nós nunca fizemos objecções a que o CDS fizesse parte dos governos provisórios, e o PSD então.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isso não significa, de maneira nenhuma, que nós hoje reconheçamos o direito aqueles que no passado foram perseguidos de serem agora perseguidores. Nós condenamos as perseguições dos fascistas contra os antifascistas: nós condenamos as perseguições dos comunistas contra os elementos conservadores na. vida portuguesa; nós hoje condenamos também o ambiente persecutório que se pretende desencadear na sociedade portuguesa em sentido inverso ou, para serem ditas as coisas pelas suas palavras, em sentido reaccionário.
Aplausos do PS.
A atitude do PS de medianeiro na vida portuguesa não é uma frase que se diga apenas no Parlamento ou nos comícios, é uma vocação, é uma prática que está profundamente marcada nos nossos corações. Nós não renunciaremos a essa nossa vocação e a essa nossa prática.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Foi nessa vocação e mesa prática que o Sr. Primeiro-Ministro, Dr. Mário Soares, este ano fez várias negociações com os partidos políticos aqui representados e com os parceiros sociais. Dada a impossibilidade de se chegar a acordo nos segredos dos gabinetes, essas negociações foram transpostas para o Parlamento e verificámos que essas negociações, que partilham de - uma posição «m que não se negociava a nossa posição política - porque o respeito deve ser recíproco - e na qual se propunha apenas a negociação de problemas concretos na vida portuguesa. tanto o PSD como o CDS deram respostas que significaram o repúdio total dessas propostas, impondo questões prévias que não eram acertáveis.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Não é verdade!
O Orador. - Se me permite, eu, para não me descontarem muito tempo, irisa prosseguir.
O PPD disse com toda a clareza: nós só aceitaremos entrar no debate dos problemas concretos se porventura mo Governo entrarem «caras nossas» - cito o Sr. Professor Sousa Franco. O CDS, mais hábil, e até porque goza de uma direcção mais estável..
Risos do PS.
..., mas uniforme e homogénea, adoptou uma atitude mais subtil, mas que leva ao mesmo resultado, e disse: não, nós não negociámos com este Governo, este Governo vai ser derrubado ou então demite-se e então negociaremos, sim, com o II Governo Constitucional.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Não é verdade!
O Orador: - Naturalmente que não se pode pedir, por mais cristãos que nós sejamos, embora o nosso cristianismo não se inspire no do CDS...
Risos.
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..., naturalmente que não se pode pedir a ninguém que se suicide apenas para satisfazer o desejo, catedrático ou não, dos lideres dos outros grupos parlamentares.
A atitude do PC foi mais conciliadora e não impôs questões prévias, aceitando entrar no diálogo sobre esses problemas concretos. Por que motivo é que .essas negociações não foram levadas a termo? Não foram levadas a termo porque o PS. e nomeadamente o Governo presidido por Mário Soares, pensou que seria necessário e vantajoso o acordo pluripartidário e plurisocial para se encaminhar a solução dos problemas portugueses no sentido mais construtivo possível, a bem do Nação, a bem do País e a bem de todos os portugueses. Naturalmente que sem entrar no debate e no pormenor desses problemas, em cujas negociações não participei, nós temos que reconhecer que da nossa parte houve um bloqueio íntimo, um bloqueio que se pode resumir em poucas palavras: a de que se fizéssemos um acordo isolado, com um só partido, sobre questões mesmo que puramente pontuais, isso poderia prejudicar a nossa vocação de medianeiros. Isso não significa que, se porventura o Governo continuar as negociações, elas não prossigam com todos os partidos, com o CDS, com o PPD, com o PS. também, porque nós também somos ouvidos às vezes pelo Governo Constitucional...
Risos
.... e com o PCP até com a UDP, apesar da singularidade da sua representação neste Parlamento. E naturalmente que estou certo de que o Sr. Primeiro-Ministro poderá, melhor do que eu, dizer que o esforço fundamental do Governo Constitucional será o de procurar chegar a esse acordo plural e pluripartidário. Se isso não for possível, então o Governo Constitucional, deverá resolver qual a opção a tomar. Mas o nosso objectivo é o de conseguir esse objectivo, é o de conseguir esse desiderato.
Têm sido feitas críticas à posição do Governo Constitucional e à do próprio PS. Lembro, por exemplo, a critica do Sr. Professor Sousa Franco de que o PS tem uma política d* flamingo, isto é ou é apoia num pé ou noutro. Essa critica pode parecer exacta, mas não é. Nós procuramos realizar o nosso projecto, mas como ele não se coaduna com o de nenhum dos outros partidos, apoiamo-nos naquele que mais se aproxime do nosso. Seja como for, a estratégia por parte do CDS e do PPD funda-se em duas razões subjacentes que nunca foram expressas aqui em público, mas que circulam por todo o País como sendo o grande capital político que levará ao sucesso ou ao triunfo dessa táctica de isolar o PS e de, em seguida, o destruir como, aliás o Dr. Sá Carneiro, com aqueda sinceridade que lhe é peculiar e a que eu presto homenagem, acaba de dizer no último número do Povo Livre.
E essas duas razões são a de que se o Partido Socialista se apoiar apenas no Grupo Parlamentar Comunista, nesta Assembleia da República, «era desautorizado pelos nossos aliados ocidentais mais importantes e de que, portanto, ficará condenado ao isolamento internacional.
Eu deverei dizer-vos que esse argumento não nos atemoriza. Nós consideramos que os nossos aliados ocidentais mais importantes têm à sua frente homens como o presidente Cárter, o chanceler Schmidt, o presidente Valéry Giscard d' Estaing e o primeiro-ministro Cadlaghan, que, como democratas exemplares que são, não irão, de maneira nenhuma, adoptar pana com os Portugueses regras contrárias às da democracia política de que eles são 'exemplo nos seus próprios países.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Outro argumento subjacente é o de que o povo português reagirá de tal maneira que o Partido Socialista será derrubado por si próprio, por falta de apoio popular. A esse propósito, eu ouvi aqui expressões que julgava já se não encontrarem no vocabulário português, tais como: crédito de confiança, agradecimento ao crédito que vos damos, etc. E, naturalmente, eu devo dizer-vos que essa linguagem está deslocada no tempo, no espaço e no destinatário.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!
Aplausos do PS.
O Orador: - Nós não pedimos crédito de confiança a nenhum partido aqui representado, dispensamo-lo, não agradecemos, como não agradeceremos, nenhuma votação que aqui seja feita a nosso favor. Nós não vivemos em feudalismo, vivemos em democracia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Não há hoje senhores feudais, e é bom que isso fique definitivamente assente. Temos um crédito de confiança do povo português, e só perante ele, e a ele, é que nós prestamos contas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Seja como for, hoje em dia estarão aqui presentes votações a propósito da moção de confiança e há dois resultados visíveis: ou a moção de confiança é aprovada ou é reprovada.
O Sr. Braga Barroso (PSD): - La Palisse!
O Orador: - Eu devo dizer-vos, em primeiro lugar, que não agradecemos votos e nem sequer nos defendemos dessas insinuações que cheiram muito a certos interrogatórios a que nós, antifascistas, fomos submetidos antes do 25 de Abril - de que teríamos ou não contactos com os elementos comunistas.
Aplausos do PS.
Eu penso que essa linguagem deve ser banida dos costumes e da democracia portuguesa, porque a democracia é uma prática, e a mais difícil das revoluções não é a das instituições nem a revolução social, nem a revolução política, da revolução mental.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Enquanto ela se não processar, a democracia pode ser um jogo de arlequim e às vezes nós damos conta disso nesta Assembleia.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Seja como for, se porventura o Governo for abaixo, nos devemos dizer-vos que não recriminaremos nenhum partido pelo facto de ter contribuído com os seus votos ou com as suas abstenções para que o Governo seja derrubado.
A Sr.ª Maria Barroso (PS): - Muito bem!
O Orador: - Nós pensamos que todos os Deputados têm o direito de livremente, tomarem aqui a posição que quiserem, no exercício dos seus direitos democráticos, como nos amanhã nos reservaremos o mesmo direito, seja para que Governo for. Portanto, não há ameaças, pelo contrário, nós apreciamos que neste momento estes partidos que estão na oposição tenham pela primeira vez. depois do 25 de Abril, o direito de derrubar, através de meios democráticos, um governo constitucional e democrático eleito pelo povo português.
Aplausos do PS.
Não pedimos nem agradecemos votos, como evidentemente nenhumas promessas vos faremos «obre essas coligações académicas que serão mais próprias para cursos de Ciência Política nas Faculdades de Direito do que para um Parlamento de pessoas experimentadas e que em matéria de democracia podem dar lições e não recebê-las, sobretudo de quem as pretende dar.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se porventura o Governo passar, seja com que votos for o Governo Constitucional continuará a sua actividade, prosseguindo as suas negociações com todos os partidos aqui representados, sem recriminações, sem ressentimentos, e no melhor espirito de reconciliação entre todos os portugueses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se porventura os destinatários ou os parceiras nessas negociações as quiserem prolongar, ou continuar, nós prolongá-las-emos com todos eles, sem excepção, e o Governo Constitucional então decidirá, em relação a cada partido, se porventura fará ou não os acordos que se impuserem. Mas - e sem que isto possa parecer qualquer recriminação individual - eu peço que o Sr. Professor Freitas do Amaral, quando comparticipai nessas negociações, comparticipe nelas como negociador e não como um biógrafo de si próprio, que vem recolher os materiais para fazer as suas intervenções nesta Assembleia, porque não se me afigura que seja essa a finalidade. Quando chegar ao termo da sua carreira política, poderá escrever as suas memórias, mas eu, infelizmente, já cá. não estarei para ter o prazer de as ler.
Risos.
Em vida política, o «amaral-centrismo» pode interessar ao CDS mas não interessa, com certeza, a este Parlamento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Rui Pena (CDS): - Não adiado!
O Orador - Seja qual for a solução que venha a ser adoptada, não é motivo para alarmismos. Eu nisso dou razão a todos os Deputados aqui presentes. A democracia portuguesa tem, em si, as possibilidades de resolver todos os seus problemas, e resolvê-los-á com eleições ou sem eleições. Nós pensamos que as eleições, neste momento, não são muito indicadas para o povo português. Mas se porventura elas se realizarem, nós disputá-las-emos, com ou sem as prévias reformas eleitorais que o Sr. Professor Freitas do Amaral aqui nos veio indicar. Isso é um problema a ver.
Risos do PS.
E já que se fala em eleições, também convirá lembrar que foi o PPD o primeiro partido que em Junho de 1974, pela voz do Dr. Sá Carneiro e espero que esta referência ao vosso chefe vos não melindre ...
Risos.
... pediu o adiamento das eleições para a Assembleia Constituinte, marcadas no programa do MFA para 25 de Abril de 1975. Isso provocou a queda do Governo e, mais tarde também, o Partido Comunista quis adiar as mesmas eleições, pela boca do Dr. Álvaro Cunhal. E é talvez o motivo por que tanto o Dr. Sá Carneiro como o Dr. Álvaro Cunhal são os dois grandes ausentes neste Parlamento que, pela sua actividade concreta, tentaram contribuir para que ele se não reunisse o mais cedo possível.
Seja como for as eleições não se realizarão no momento, nem nas condições determinadas pelo Sr. Professor Freitas do Amaral. Realizar-se-ão se porventura os órgãos constitucionais que têm legitimidade constitucional para o fazer assim o entenderem. E a esse respeito nós também seremos ouvidos.
O Governo foi aqui criticado por muitos motivos, e eu deverei dizer-vos que seria absurdo admitir-se que algumas dessas críticas não têm fundamento. É evidente que há. em todas as críticas, sempre uma certa parcela de verdade. Mas o que não ha dúvida nenhuma é de que não há, nem haveria, nenhum Governo possível, em Portugal, que pudesse fazer mas e melhor do que o Governo Constitucional presidido por Mário Soares.
Aplausos do PS.
Reparemos na segurança individual dos cidadãos portugueses. Onde há mais segurança para os cidadãos portugueses? No Continente português, onde governa o Governo Socialista, ou nos Açores e na Madeira, onde o Governo é social-democrata?
Eis uma pergunta.
Aplausos do PS.
O Sr. Sousa Fernandes (P9D): - Isso é demagogia!
O Orador - Em matéria de economia enumeramos em muitas discussões, mas é evidente que há aspectos positivos, e muito positivos, na vida económica portuguesa. O seu progresso é indiscutível. O investimento privado foi espectacular.
Risos do PSD e do CDS.
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E são precisamente os sucessos do Governo socialista que assustam alguns partidos.
A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS): - Muito bem!
Risos do CDS.
O Orador: - Pois não se assustem, porque nós também não estamos assustados. Quando se voltar a fazer eleições, o povo português resolvera, com lições ou sem lições.
É certo que o défice externo se mantém ao mesmo nível que o do ano passado, segundo parece, mas esqueceu-se aqui também de mencionar que para essa circunstância uma das razões de mais peso foi a baixa na produção agrícola, que foi de 5 % o que mostra que um dos sectores prioritários, como, alias, é reconhecido no Plano apresentado pelo Governo para 1978, e precisamente o sector alimentar. Tentei descobrir nas varias propostas, eruditas que vieram dos outros partidos, nomeadamente do CDS e do PPD, visto que a do PCP é muito singela, não contém propriamente uma alternativa, mas apenas um ponto de vista sobre certos problemas concretos, e não descobri qualquer alusão a esse problema ...
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Não é verdade!
O Orador: - ... nomeadamente na do PPD, onde se invoca sempre a velha ideia do investimento externo como principal motor da recuperação económica portuguesa, repetição da velha ideia de um miniplano Marshall, de que efectivamente, não me consta e não sei ainda, até hoje, qual será o país que estará na disposição de o conceder. Pois se o conceder comm certeza que será bem vindo. E também duvido de que se porventura for o PPD a governar com o seu chefe ou sem o seu chefe, a sua obtenção seja mais fácil ou mais rápida.
Risos do PS.
Houve lacunas e houve deficiências - o Primeiro-Ministro reconheceu-o aludindo a essa reestruturação que vai efectuar. E fala-se também em apego ao Poder.
O Sr. Presidente: - - Desculpe, Sr. Deputado, terminou a sua hora.
O Orador: - Como?
Risos.
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Orador: - Bem, se isso é uma ordem para eu cessar, eu cesso: Muito obrigado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Não se tratou, efectivamente, de uma ordem, porque eu para, cabo-de-ordens ainda me falta muito.
Risos.
Sou apenas um simples presidente que se limitou a chamar a atenção do orador para os prazos estabelecidos por todos os partidos. Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Leal.
O Sr. Cunha Leal (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para um protesto.
Risos do PS.
Bem, poderia começar por protestar contra a insolência que provém da bancada do Partido Socialista, mas como já estamos habituados a isso, passo adiante.
Protesto contra a circunstância de o Sr. Deputado Salgado Zenha, ilustre Deputado, ter aqui afirmado que o meu partido pretendia perseguir o Partido Comunista ao estilo que se usava antes do 25 de Abril.
Protesto, porque isto é um desvirtuamento total das nossas afirmações e do nosso comportamento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - A única coisa que nós não queremos é colaborar com, o Partido Comunista na elaboração de uma plataforma de Governo.
Risos do PS.
Mas a este respeito podemos louvar-nos num lugar selecto que veio num jornal e que passo a ler:
Não queremos ligações com ele porque alguém me disse que é uma força totalitária que põe em perigo qualquer projecto democrático.
Talvez que esta expressão, proferida há cerca de um ano, não seja alheia ao Sr. Dr. Salgado Zenha...
Aplausos do PSD.
Protesto contra a circunstância de que novamente, numa retournelle que se está tornando fastidiosa, se tornou a invocar o que se passa nos Açores e na Madura, quando está por de mãos esclarecido que aquilo que se lá passa de mau não sofre comparações, para melhor, com aquilo que se passa aqui e provém precisamente da não colaboração do Governo central.
Risos do PS e aplausos do PSD.
Protesto contra a circunstância de, para justificarem posições, se arvorarem em medianeiros e salvadores nacionais, quando ainda há dias se puderam ler nos jornais determinadas afirmações que casso a reproduzir:
Quer eu próprio, como Primeiro-Ministro e como secretário-geral do PS, quer o meu partido, tudo faremos para auxiliar o Sr. Presidente da República nas situações em que ele se encontre, porque o considero u garante das instituições democráticas.
Aplausos prolongados do PS.
Espero que o Sr. Presidente me desconte a euforia das palmas do Partido Socialista!
Risos.
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É, contudo, acontece só isto: é que pela boca do mesmo secretário-geral. Dr. Mário Soares, é negada uma das hipóteses possíveis da solução democrática deste país que é o recurso a um governo de inspiração presidencial não permitindo que nenhum dos Srs. Deputados socialistas possa no mesmo comparticipar.
E por ultimo, quero dizer-lhe o seguinte: que registei que os senhores daquela bancada...
Vozes do PS: - Deputados!
O Orador: - .. não pedem nem agradecem votos, mas que se eles vierem como um de entre eles já afirmou - serão bem-vindos.
O Sr. António Macedo (PS): -E são bem-vindos!
O Orador: - E assim terá possibilidade o Sr. Dr. Mário Soares de reconstituir e reformular um Governo aonde terá lugar adequado, na pasta da Educação, pelas provas dadas, - o Sr. Dr. Jorge Campinos.
Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - É para fazer um contraprotesto.
Eu tenho a impressão de que o Sr. Dr. Cunha Leal, entusiasmado pela sua eloquência, que nós sempre admirámos, não teria, talvez por deficiência minha, compreendido o que eu disse. O que eu disse é que o Partido Comunista é um partido de oposição e continuara a sê-lo enquanto o Partido Socialista for governo. O que eu disse é que consideramos antidemocrático e anticonstitucional que um outro partido de oposição pretenda que o Governo não possa ter contactos com o Partido Comunista...
Vozes do PSD: - Mão é isso!
O Orador: - ...º com ele celebrar acordos pontuais nas mesmas condições que foram oferecidas aos demais partidos de oposição. É anticonstitucional, é antidemocrático: mas assim como nós ouvimos tantas coisas, com paciência evangélica..
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Viu-se, viu-se!
O Orador: - ... sem nos incomodarmos, sem nos irritarmos, é natural que de vez em quando possamos dizer qualquer coisa que em comparação com a vossa cerimónia está muito abaixo disso. É até insolente da vossa parte.
Aplausos do PS.
O Orador: - Quanto aos Açores e à Madeira, naturalmente que o Governo poderá responder, mas eu devo dizer-vos que dificilmente esperaria que de um Ministro como o Dr. Mota Amaral, filho espiritual dilecto do Dr. Marcelo Caetano, algo de melhor ele pudesse fazer!
Aplausos do PS.
O Sr. António Vasconcelos (PSD): - Demagogia!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Pressente, eu queria nó interpelar a Mesa quanto nos tempos disponíveis, na medida em que temos um Deputado nosso que deverá intervir agora.
O Sr. Presidente: - Com certeza, vamos já ver.
Pausa.
Ora, vou responder ao Sr. Deputado Marques Mendes.
O Governo tem 52 minutos e 30 segundos, o PS já teve mais 2 minutos e 30 segundos, o PSD ainda tem 25 minuto, o CDS tem 30 segundo.
Risos.
Pelo menos, deve chegar para pedirem a palavra.
Risos.
O PCP tem 12 minutos e a UDP tem 6 minutos. Tem a palavra o Sr. Deputado Sérvulo Correia.
O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendo fazer um breve protesto em relação ás últimas palavras proferidas pelo Sr. Deputado Salgado Zenha.
A história a todos julgara, a história com objectividade irá repor a actuação e o papel de cada um na evolução da sociedade portuguesa nestes últimos anos.
Queria, protestar, em primeiro lugar, por se ter feito uma afirmação destas em relação a alguém que não está aqui para se defender, alguém que foi eleito pelo povo português para Deputado desta Câmara e alguém que foi escolhido por um órgão constitucional e legítimo para presidir ao Governo de uma região autónoma.
Queria ainda lembrar o seguinte: os percursos que as pessoas seguiram, preocupadas com a evolução do seu país antes do 25 de Abril, foram diferentes. Houve muitas maneiras de mostrar coragem vontade na evolução em relação a um modelo constitucionalmente democrático. E o Dr. Mota Amaral, aqui nesta sala suportou sozinho, contra ódios desenfreados, com a maior coragem e a maior verticalidade, um ataque em que, com a maior calma, defendeu aquilo que era evidente para as pessoas mais lúcidas, mas que não era evidente para muitas outras.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro e Castro.
O Sr. Ribeiro e Castro (CDS): - Sr. Presidente, era apenas para um brevíssimo protesto quanto à intervenção do Dr. Salgado Zenha.
Em primeiro lugar, queria notar que a chuva de protestos e contraprotestos que habitualmente as intervenções do Dr. Salgado Zenha sempre provocam nesta
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Assembleia mostra como o PS é o apaziguador e medianeiro da sociedade portuguesa:...
Risos do CDS.
O Orador: - Em segundo lugar, gostava de referir que aquilo que, na linguagem metafórica que é habitual ao Dr. Salgado Zenha, chamou de «amaral-centrismo» mais não é do que a preocupação de um homem e de um partido em se manterem coerentes com as suas posições.
Se o Sr. Dr. Salgado Zenha cultivasse aquilo que eu poderia chamar, na mesma linguagem metafórica de «zenha-centrismo», com certeza que não era nos vícios nem nas contradições que, ainda há pouco, uma frase citada pelo Sr. Deputado Cunha Leal demonstrou.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Franco.
O Sr. Sousa Franco (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados. Srs. Membros do Governo: Só no inicio da discussão sobre a confiança ao Governo, interpretada pelo Sr. Primeiro-Ministro, formulou ele aos partidos representados nesta Assembleia duas perguntas se aceitavam votar a confiança em relação à actual fórmula de governo e se aceitavam votar a confiança relativamente às negociações em curso com o FMI.
Pela nossa parte, justificámos já ontem, amplamente, qual o motivo por que não acentávamos votar a confiança relativamente as negociações com o FMI. Quer a política económica do Governo, que criticamos com base em alternativas quer as negociações que estão em curso, acerca das quais não temos suficiente - informação quer o facto de elas não estarem concluídas e se não nos propor qualquer orientação que devesse ser prosseguida no seu decurso justificam plenamente a recusa de votar a confiança quanto a negociações que nos são alheias, infelizmente, mas que muito tem que ver com o futuro do País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Cabe agora, e à luz do debate efectuado, responder à segunda pergunta: aceitamos ou não votar a confiança a este Governo na sua actual fórmula? Creio que a melhor forma de o fazer será tentar extrair algumas conclusões deste debate, diria mesmo lições se porventura isso não ofendesse o Sr. Deputado Salgado Zenha. Em primeiro lugar e desde logo este debate revelou que o Governo e o PS, tiveram que vir aqui confessar que falhou a sua fórmula de governo minoritário flutuante, à qual o PSD vem contrapondo, de há muito a solução de maioria democrática estável. Minoritário na composição, minoritário no apoio parlamentar, minoritário nas adesões que recolhe na sociedade portuguesa, o Governo nunca esclareceu porque veio só agora, pedir o voto de confiança. É para nós claro que ao tentar sucessivamente um emaranhado contraditório de compromissos, para fazer passar cada lei na Assembleia, o Governo foi perdendo os últimos resíduos de confiança prática dos partidos da oposição democrática. Ficou bem á luza indefinição da política daí resultante, que não agrada nem a gregos nem a iro anos e que não corresponde a nenhuma linha decisão definida, mau a uma série infindável de negociações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, é para nós claro que, impossibilitado que estão os acordos pontuais e promessas relativamente a questões importantes, o Governo terá de passar o Rubicão da confiança com o apoio de algumas das forças aqui representadas, ou cai. Por outro lado, o Governo precisa de apoio parlamentar, para ler uma acção legislativa coerente, em carie condiciona a eficácia da sua acção.
Carecei, sobretudo neste momento, face ao desencanto crescente do povo português - em boa parte resultante d& sua acção face à crise económica e social -, de quem avalise, maioritariamente, uma política de austeridade que vem propor em termos muito impreciso» a esta Assembleia. Vem propor por que foi queimado em hesitações constantes todas as alternativas que se lhe podam pôr ao longo destes dezasseis meses. Não há planos de austeridade que possam executar-se sem o maior apoio social possível. É evidente que o Governo vem aqui tentar suprir à última hora a sua base de apoio minoritário para conseguir um apoio maioritário para uma política de austeridade para a qual os outros partidos não foram ouvidos nem achados.
Tudo isso terá o Governo, se algum partido votar com o PS a favor da confiança. O PS e o partido que cem ele votar suportarão maioritariamente o actual Governo a partir de agora, a actual fórmula governativa e as negociações com o Fundo Monetário Internacional estado em que se encontram. Em segundo lugar, é clara a resposta à pergunta inicial que formulámos ao Sr. Primeiro-Ministro sobre a questão de confiança: porquê só agora?
O Governo veio aqui porque pretende conseguir, colocando a oposição sob a ameaça de abandonar à beira do esgotamento cambial e com uma situação ainda mais deteriorada do que a que recebeu, um aval à política que quiser seguir, livre e discricionária mente e que não define nem negoceia. A alternativa é: ou apoiam a política que só eu definirei, ou vou-me embora. Por isso, só agora foi apresentada a moção de confiança, depois de negociações que o PS nunca quis estender ao fundo dos problemas e em que não apresenta ideias novas e perspectivas negociais.
A gravidade da situação presente é inegável. Os riscos de um vácuo de poder foram aqui muito bem acentuados pelo Sr. Ministro das Finanças e são por nós sentidos com plena consciência.
Entendamos, no entanto. que isso não é razão paia mais uma vez como partido da oposição, votarmos ao Governo um apoio que só os partidos do Governo ou de situação lhe devem dar. Isso não é, a nosso ver, uma razão para que o Governo não caia. Será, sim, razão para que o Sr. Presidente da República, a quem cabe constitucionalmente esse papel, encontrar rapidamente uma fórmula válida de substituição com a cooperação dos partidos democráticos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - A terceira lição: O Governo veio aqui colocar apenas o problema da fórmula do Governo, pretendendo convencer o País de que e assim que o PSD levantou a questão. Ora, para nós, a questão fundamental é a de ter uma política coerente e definida para resolver os problemas concretos do País. Daqui a extensão e precisão da proposta de plataforma com que respondemos ao memorando do Governo e da qual o Governo só aceitou discutir a questão governativa.
Este, para nós, é o problema central como vamos, em termos de consenso maioritário,- resolver as necessidades fundamentais da sociedade portuguesa, como vamos travar a deterioração constante da qualidade de vida, do bem-estar da justiça social deste país. Foi esse o problema que, face as nossas propostas o Governo não discutiu, nem nas negociações nem aqui.
Mas importante, embora secundariamente, é também a questão da fórmula do Governo. Saber qual o novo Governo que ira executar a plataforma interpartidária a que é urgente chegar para que neste país a democracia funcione com eficácia, com realismo e, com base na regra da maioria.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É, efectivamente, necessário, para que qualquer plataforma não seja letra mona. um i nova equipa que tenha um perfil capaz de assegurar a sua execução eficaz e de garantir o máximo empenho e a maior adesão do povo português à execução de um programa de salvação nacional, que o PSD, por seu lado, há muito vem reclamando.
Vê-se, pois, que afinal as coisas são diversas daquilo que foi apresentado neste debate. Para o PS o que é essencial é o poder, o Governo. Para nós o essencial é a política e a orientação a seguir. Esta é a diferença entre os dois partidos, esta a diferença entre as duas propostas, esta a razão por que as negociações não avançaram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Tanto é assim que, ao longo destes dezasseis meses, nós chegámos ao extremo de propor várias vezes - primeiro sós, s depois de Maio em conjunto com o CDS- uma plataforma parlamentar e interpartidária de que aceitávamos excluir uma nova fórmula de Governo. E foi o PS, que precisava do apoio parlamentar, quem se deu ao luxo de recusar, considerando a nossa proposta insultuosa.
Mas uma vez ficou claro perante o povo português quem agiu com coerência e até com sacrifício pessoal, só pela democracia, e quem pôs o Poder acima da democracia e o partido acima da País.
Aplausos do PSD.
O PS, na parte que nos respeita - julgo que em termos globais, depois das declarações que aqui -, não tem o apoio da maioria democrática. Ficou aqui demonstrado. E não o tem, primeiro porque não o quis e agora porque o não merece.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em quarto lugar foi dito aqui que nos não apresentámos alternativas. É evidentemente falso.
No domínio económico e no domínio social temos propostas coerentes e globais que desde 1974, vimos apresentando ao País, muito antes das propostas que outros partidos aqui representados foram elaborando.
Vozes do PSD: - Muito bom!
O Orador: - O núcleo essencial dessas propostas a hierarquia dos objectivos nelas contidos, a estratégia a que obedecem tem sido fundamentalmente a mesma, com adaptações periódicas. Agora estamos procedendo a mais uma, à evolução das circunstâncias do País.
Temos uma alternativa baseada na defesa do sector público, mas também no reconhecimento do papel essencial da iniciativa privada. Temos uma alternativa baseada numa expansão activa que assenta, prioritariamente, na exportação, no investimento e no desenvolvimento económico. Temos uma alternativa baseada numa perspectiva de longo prazo, e não apenas na capacidade de ir ultrapassando os cabos de dificuldades em 1978, como a proposta do Governo, infelizmente é.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Temos alternativas no domínio económico e social. Mas alternativas que são sempre as mesmas, com adaptações circunstanciais. Não temos quatro hierarquizações de objectivos, três políticas cambiais, duas ou três políticas a médio prazo, como o Governo tem.
Aplausos do PSD.
Temos, por outro lado - e esse é um penhor seguro do teor social-democrata das nossas propostas -, orgulho de ler sido o único partido que na sua resposta ao memorando do Governo elaborou uma plataforma não apenas política e económica, mas também social. Entendemos que a satisfação das necessidades sociais, a defesa dos rendimentos reais dos trabalhadores portugueses, o estabelecimento da justiça social nesta sociedade, que o Governo tem deixado deslizar perigosamente para o capitalismo selvagem, são elementos fundamentais de defesa dos interesses dos trabalhadores portugueses e de qualquer plataforma que possa ter o nosso apoio.
Aplausos do PSD.
Isto nenhum outro partido o fez. Isto demonstra que muito à direita das nossas propostas e da nossa prática está isso sim, a política e o Programa do Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em quinto lugar acentuaria que este debate foi decepcionante. Nenhumas propostas novas da parte do Governo, o repisar da argumentação tradicional, a teimosia em nos colocar como réus num julgamento que não aceitamos.
Tentou-se colocar o PSD na posição de ser praticamente ele a responder neste debate. Nós respondemos efectivamente, mas desde o início dissemos que quem está aqui a ser julgado, na sua política e nas
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suas propostas e o Governo. O país conhece as nossas alternativas. Nós não sonhamos que as formular muitas vezes, mas formulamo-las. O País sabe a capacidade que temos de a revelar. O País sabe que podemos se que e se a fórmula minoritária como aqui foi proposta recebesse a abstenção inicial do Partido Socialista, formar equipas de governo e executar as nossas propostas com eficácia, com coerência e com capacidade. Mas o País sabe também que não nós mesmos, que temos uma só palavra e que - porque não somos maioritários - nunca participaremos num governo que não seja maioritário, ou seja, que não tenha o apoio consentido de uma maioria desta Câmara e de uma maioria do povo português.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Aplausos do PSD.
O Orador: - Uma sexta conclusão tiraria ainda deste debate. Neste momento não há solução estável que não passe ou pela maioria de esquerda ou pela negociação de uma plataforma democrática tripartidária. Depois desta votação, haja ou não crise do Governo, são estas as duas alternativas. A fórmula do Governo minoritário morreu hoje.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Entendemos que essa plataforma democrática interpartidária deverá ser executada por um novo governo, designado em condições a negociar e a definir no âmbito da própria plataforma. Mas é importante que esse novo governo tenha participação e amplo apoio maioritário o mais amplo apoio maioritário possível, e que seja incumbido de realizar uma política nova e coerente, que concerne a maior adesão social dos Portugueses e mobilize o povo para o trabalho e a reconstrução nacional. Não achamos que seja possível consolidar a democracia e vencer a crise neste clima de descrença, de passividade, de crítica constante que em termos populares decorre da insegurança e da deterioração das condições de vida.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só se consolidará a democracia neste momento por um governo e uma plataforma maioritária e também por um governo eficaz, capaz de resolver os problemas que os Portugueses sentem na sua vida quotidiana. Senão, a principal responsabilidade da acção deste Governo terá sido não apenas a de não ser um governo capaz de responder às expectativas iniciais que da boa vontade nele muitos puseram mas a de determinar as condições de viabilidade e sólida implantação do regime democrático.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Julgamos que é necessário um empenhamento forte para consolidar a democracia e é de facto mau nascimento que um governo minoritário se aferre ao poder e às suas propostas, recuse o diálogo ao longo de dezasseis meses e ainda por cima não seja capaz de atacar definitivamente a crise económica e social. O povo português tem razões para estar descontente com o Governo, não tem razões, e queremos provar-lhe, para estar descontente com o sistema democrático.
Aplausos do PSD.
Não irei aqui repetir a historia das relações, entre os partidos democráticos, toda a teia de relações e de propostas que entre os vários partidos ao longo destes dezasseis meses foram elaboradas para vencer a crise. Ela foi ia, no essencial, feita pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral e eu pouco teria da nossa parte a acrescentar. Acentuo que o PSD foi o primeiro partido que se opôs a um aspecto importante da política do Governo, ao votar contra o Plano para 1977 em Dezembro pagado os factos demonstraram que tínhamos razão. Depois disso, seguimos sempre uma linha firme, mas não sistemática, de oposição, preocupados em criar ao Governo condições para que pudesse governar, apoiando selectivamente as medidas que nos parecem indicar uma intenção correcta e os sectores com perspectivas mais positivas.
O tempo foi revelando que tal apoio afinal, não produziu os resultados esperados face a uma actuação geral de mera gestão rotineira de apagar fogos, de indefinição em catavento, de execução hesitante e de diminuo apoio social, como foi demonstrado pá o meu camarada Sérvulo Correia. Pois que tudo isto é indiferente à forma minoritária de Governo, entendemos que é importante tirar a conclusão dessa análise.
Temos, por nós, a consciência de que, como partido de oposição, levámos ao extremo limite a nossa capacidade de entendimento, de paciência e de apoiar selectivamente o que poderia ser positivo - e que às vezes o mão era por falta de continuidade e capacidade de execução. Agora é tempo de pensarmos todos em salvar a democracia e o País. O povo português julgará se o PS, ao dizer «ou isto, ou o dilúvio», «ou Governo minoritário do PS ou não aceitamos qualquer outra solução» «nem autorizamos os nossos militantes a nela participarem», coloca em primeiro lugar os seus interesses partidários, ou opta pelos interesses reais de concórdia e de solidariedade nacional que a todos os partidos se impõem especialmente nesta hora.
Aplausos do PSD.
Em democracia o diálogo e o compromisso são essenciais. Os partidos não maioritários não são alternativas só por si, constituem alternativas se coligados com os outros. As alternativas democráticas constroem-se no diálogo, não se fecham em fronteiras inultrapassáveis.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sem entendimento não há democracia. Eis aqui razões mais do que suficientes para, salvo elementos de última hora que nos levassem a rever a nossa posição no final deste debate - e que não surgiram -, entendemos que deve ser negativa a resposta a dar à primeira pergunta que foi feita pelo Sr. Primeiro-Ministro. Sem uma nova plataforma política que defina uma nova política capaz de lograr o consenso maioritário do povo português não podemos dar a nossa confiança a este Governo, nem sequer se for reestruturado em termos que o
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Sr. Primeiro-Ministro - sem responder, aliás, à pergunta que lhe fiz nesse sentido - não quis precisar aqui. E se lha déssemos, isso seria mais um factor de descrédito da democracia. Não apenas por de novo se diluírem as fronteiras entre partidos do Governo e partidos de oposição, não apenas por de novo se confundirem os projectos e as pospões claras tomadas em público serem à última hora alteradas por negócios de bastidores, sobretudo porque julgamos que esta Assembleia só se desacreditaria perante o povo português se vaiasse uma confiança em sentido contrario a desconfiança que o povo português em neste Governo em consequência da sua actuação. O voto da Assembleia não pode ser julgamos nos. contrario ao voto da sociedade portuguesa, sobre cite Governo. É em conformidade com isto que votaremos.
Uma última razão para votar contra: a análise que fazemos da deterioração crescente das condições de vida do povo português e da incapacidade que dezasseis meses, que não e tempo para fazer milagres, mas e tempo para ter já alguma obra, revelaram em inverter as tendências negativas que se estavam verificando na economia portuguesa. Abstenho-me de analisar aquilo que já o foi. Áreas fundamentais Dará a edificação do estado democrático estão na mesma ou pior, como a comunicação social e a administração pública. Áreas fundamentais para a satisfação das necessidades dos Portugueses e da qualidade da vida estão na mesma ou pior, como a habitação, a política social e a própria política económico-financeira. O poder local não tem sido instaurado devidamente, prevalecendo um centralismo assustador. No domínio da educação, investigação e cultura, - depois de um começo auspicioso, caiu-se na falta do projecto global e na incapacidade absoluta de gestão; e mesmo em outras áreas, designadamente no combate à criminalidade crescente, a acção do Governo é francamente negativa. Por isso mesmo não julgamos que o Governo possa refugiar-se atacando o PSD como se fôssemos nós, sociais-democratas, o Governo. Não somos, já o dissemos, nem aceitamos sê-lo.
Seriamos capazes de o ser se tivéssemos o apoio da maioria do povo português, mas como não o temos, tal como o PS, então recusamos tal desafio e tal proposta. Para quem se preocupa com a política como forma de resolver os problemas do povo e de realizar a sua vontade, é evidente a conclusão que em consciência devemos tirar de quanto fica dito. Ela abrira novas soluções para o futuro? O voto da desconfiança em que caminhos coloca o povo português?
Naturalmente que a democracia contêm sempre alternativas. A primeira e que o Governo passe em termos de maioria de esquerda, a segunda é que o Governo caía..
Se o Governo cair, o caminho aberto é o de confiar no funcionamento dos mecanismos constitucionais, ao abrigo dos quais o Sr. Presidente da República poderá promover os acordos interpartidários necessários a constituição de uma plataforma de base maioritária e à constituição de um novo Governo, para o qual sejam escolhidos os mais competentes, com um novo programa, nos termos elaborados de harmonia com essa plataforma. Entendemos que a forma preferível seria a coligação tripartida, mas outras propostas avançamos na nossa resposta ao memorando do Governo, estando, como sempre, abertos a qualquer negociação que o Governo ou o PS não transformem, eles próprios, em conversa de surdos.
Essas propostas implicariam sempre uma plataforma tripartida maioria e formas de governo que fossem capazes de assegurar simultaneamente a confiança do povo e a competência governativa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Diz o PS: se nas acusam de incompetentes parque querem associar-se a nós? Pela simples razão de que numa maioria coerente no presente quadro de representação partidária, pode estabelecer-se sem o PS na Assembleia e no País. É por imposição democrática que o propomos: e por imposição das regras democráticas que dizemos que, se o PS o recusar, então apenas resta ao Pais ou a maioria de esquerda ou a antecipação de novas eleições. Opostos como somos a qualquer princípio de Governo PS-PCP, preocupados como estamos - mas isso não é motivo para alterar o nosso voto - com aproximações que ainda hoje neste hemiciclo se verificaram nesse domínio, preocupados como estamos com a evolução de muitas votações do PS, desde a lei das incapacidades cívicas até enricas perigosas à liberdade de imprensa, opor-nos-emos frontalmente à maioria de esquerda mas naturalmente, sendo uma maioria, ela pode funcionar se o PS e o PCP o quiserem.
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo Sr. Deputado.
O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem ainda dois minutos.
O Orador: - Fica, portanto, apenas como outra alternativa as novas eleições. Não depende isso de nós, mas do Sr. Presidente da República. Julgamos, todavia, que o povo português começa a fartar-se desta política, que exige cada vez mais dos responsáveis entendimento, eficácia e resolução dos seus problemas, reais, e que o País se ressentirá de tal solução de último recurso. Não temos, todavia, medo das eleições. Exigi-las-emos se não se chegar rapidamente a uma solução. Propomos que se façam mas depressa e já, se o PS não acertar participar numa fórmula de entendimento maioritário.
É necessário que o PS aceite ou criar uma transição para se gerir em base maioritária e democrática este país ate 1980 ou submeter-se, mas já ao veredicto eleitoral, que não propomos, mas terá sido imposto pela sua recusa, pela sua total falta ao abertura a qualquer entendimento. Não ê possível adiar mais soluções sólidas e definitivas, soluções claras, e definidas, se queremos salvar a democracia e o País.
A concluir, diria eu que em democracia e entre democratas, seja qual for o resultado desta votação,
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não há guerras, haverá apenas derrotas provisórias, que bem poderão abrir caminho a novas soluções mais conformes à vontade e aos interesses do povo. Para isso os partidos representados nesta Assembleia, e o PS em primeiro lugar, pois sem ele não se forma qualquer maioria coerente, são indispensáveis. A recusa à participação em quaisquer novas soluções que sob a égide do Presidente da República, nos termos constitucionais, venham a ser construídas só significaria que para alguns é acessória a questão da política, de uma política nova de salvação nacional, e que lhes interessa o poder, nem que seja um poder velho e desgastado. Recusamo-nos, a querer que tal possa ser duradouramente a atitude de verdadeiros democratas. Recusamo-nos a crer que pessoas com um passado e um presente como o Dr. Mário Soares nossam entrincheirar-se em posições deste tipo. Recusamo-nos a crer que os partidos representados nesta Câmara poisam ficar cegos e surdos ao anseio de entendimento que existe no povo português. Por isso não estamos pessimistas, estamos serenos. Se clarificação houver, ficaremos a saber com que apoios conta o PS: se crise houver, haverá saída para a crise, porque o povo português o impõe e a democracia é, tem de ser sólida.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Antes de mais, quero rectificar ao Sr. Deputado que efectivamente me enganei, porque a hora que estava a ser contada aqui pelo cronometro, precioso porque está aqui à esquerda, não era aquela que eu dizia. O Sr. Deputado apenas excedeu um minuto da hora que lhe era concedida.
Srs. Deputados, parece que terminaram as inscrições. Vou dar a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, se porventura deseja usar dela já.
Pausa.
O Sr. Primeiro-Ministro pede-me para perguntar à Câmara se deseja um pequeno intervalo ou se pode começar no uso da palavra imediatamente.
Pausa.
Tem então a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PS à subida do Sr. Primeiro-Ministro à tribuna.
O Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soaras): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Durante este debate muitas coisas foram ditas, algumas importantes, mas muitas outras naturalmente ficaram por dizer. Foram expendidos, por um lado e outro, argumentos e contra-argumentos. Foram feitas críticas. Algumas com um certo fundamento, reconhecemo-lo sem qualquer esforço, outras, a nosso ver, profundamente injustas. O Governo insistiu e defendeu muitas das porções tomadas perante ataques permanentes a que foi sujeito. É fácil adjectivar, é fácil, de certa maneira, criticar. Governar é bem mar» difícil. Mas houve também aqui neste hemiciclo algumas palavras de justiça. Essas, naturalmente, o Governo agradece-as. De resto, estamos nitidamente convencidos, e isso queremos dizê-lo ao povo português, que o tempo, e certamente um tempo próximo, dar-nos-á razão.
Falou-se talvez mais do passado do que era legítimo esperar e, tirando algumas das últimas intervenções, quase não se encarou o futuro, nem o futuro próximo, imediato, nem o futuro mais distante. O Governo lamenta que isso tenha acontecido, visto que, tendo vindo aqui pôr uma questão de confiança, parece que mais do que do passado, embora o passado seja naturalmente, uma condicionante extremamente importante para fundamentar uma decisão, interessaria falar do futuro. Houve como que um certo enquistamento nas posições reciprocas.
Disse o Presidente em exercício do PSD que da parte do partido do Governo e do Governo havia a intenção de pôr o PSD no banco dos réus. É evidente que essa intenção da nossa parte nunca existiu nem poderia existir. Mas, sentados ali em baixo, na bancada do Governo, também nós recusamos estar no banco dos réus.
Aplausos do PS.
Porquê então a moção de confiança? Já o explicámos suficientemente ao País. Todos nós sentimos aqui a necessidade de uma clarificação, e este debate, qualquer que seja a saída e o resultado, produziu essa clarificação.
Por outro lado, o CDS e o PSD, que tanto e tão virulentamente nos atacaram, dizendo que desejavam a queda do Governo e que a consideravam mesmo uma condição de progresso e de saída necessária para vencer a crise, têm ao menos que nos prestar esta justiça elementar: é que nunca poderiam conseguir esse desiderato se o Governo não quisesse, como voluntariamente quis, lancetar o abcesso pondo aqui a questão de confiança.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Nesta questão da confiança não viemos pedir a ninguém um aval nem um cheque em branco. Não pedimos um aval, Sr. Deputado Sousa Franco, porque, como tive ocasião de dizer aqui com bastante clareza, a seguir à votação da moção de confiança, por força da Constituição, teremos muito brevemente de discutir dois textos fundamentais onde se exprime, de uma maneira completa, a política do Governo para 1978. E, se nós aceitámos retirar, logo no início das negociações a que procedemos com os partidos, o Plano a medro prazo, dada a posição rígida que os partidos tinham, justamente em relação a esse Plano, fizemo-lo na pressuposição que isso poderia ser objecto da plataforma, como era legítimo que fosse. Virem agora, ainda por cima. acusar-nos de não termos política a médio prazo, quando sabem muito bem porque é que o Plano a médio prazo foi retirado. isso não nos parece relevar da boa fé.
Pusemos duas questões singelas a esta Assembleia. A primeira é saber se a Assembleia entende ou não que o Governo deve mudar, e naturalmente o seu Primeiro-Ministro. Porquê falar no Primeiro-Ministro? Porque constitucionalmente o Primeiro-Ministro é o coordenador da acção do Governo e o responsável dessa mesma acção. Em segundo lugar, porque, sabendo-se como se sabe e como foi
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dito, que o Governo seria reestruturado, é evidente que não se tratava do Governo na sua composição - actual, que eventualmente poderia mudar, mas sim, e naturalmente, da fórmula do Governo e do seu principal responsável. Mas, se fosse votada a confiança ao Governo, é óbvio que acerca da política não há nenhuma incerteza, visto que a referência a esse Governo e como não poderia deixar de ser, o programa que aqui foi apresentado quando, iniciámos a nossa caminhada.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - Muito bem!
O Orador: - Programa que é de realização ate ao fim da legislatura, que em parte e em muitos aspectos foi já realizado e que, como é natural, anualmente tem de ir sofrendo as correcções naturais e próprias da conjuntura.
Por outro lado, a segunda pergunta incidiu sobre o Fundo Monetário Internacional, - sobre o princípio das negociações. É exacto que no memorando estes dois pontos já estavam indicados e é exacto também que as respostas ao memorando foram diferentes de partido para partido. Enquanto no que respeita à primeira pergunta havia uma relativa abertura do PCP, que sempre disse que o problema do Governo e da sua fórmula era secundário e que o que interessava era, sim, o problema da política, da resposta do CDS, lida sem uma reflexão profunda, poder-se-ia concluir que havia a mesma abertura. Mas a verdade é que, estudadas bem as condições e sendo uma delas, como era o consenso também do PSD, a nosso ver essa aparente abertura transformava-se, como se transformou, num fechar a porta. Quanto ao PSD, como se sabe, esse fechar a ponta foi absoluto. Por isso, nós entendamos, quanto ao primeiro pomo, conforme havíamos dito no memorando, que tínhamos de trazer à consideração desta Assembleia a votação da questão de confiança.
Claro que a questão das negociações com o Fundo Monetário Internacional é uma questão extremamente importante, se não mesmo decisiva, para Portugal. E nas respostas que já aqui ouvi, nos considerandos, nos distinguimos que os diferentes partidos fizeram, compreende-se que já todos estão intimamente convencidos da necessidade de ter de admitir-se a inevitabilidade das negociações com o Fundo Monetário Internacional. Alguns, como por exemplo o CDS, põem condições que, a nosso ver, são externamente perigosas e constituem para esse partido uma pesadíssima responsabilidade em relação ao futuro. Quero referir-me à não aceitação, por parte do CDS, da redução proposta para o défice. Neste sentido, o PSD, embora aparentemente diga que não, está interessado em discutir o problema das negociações com o Fundo Monetário Internacional - e quando o faz o que não quer e comprometer-se -, introduziu no seu articulado algumas cláusulas, donde se conclui que eles aceitam efectivamente aquilo que sabem ser algumas das recomendações, do Fundo Monetário, em especial essa da redução do défice. Se não houver redução do défice, pelas razões que enunciei, pelas razões que hoje também aqui referiu, com especial autoridade, o Sr. Ministro das Finanças, que aliás foi aplaudido, e muito justamente, pela bancada do CDS, a rotura financeira portuguesa é inevitável. E, embora neste momento já não tenha ocasião para fazer perguntas - mas elas ficam feitas e são ouvidas peto povo português-, eu gostaria de perguntar onde ficará a democracia, onde ficarão os projectos desenvolvimentistas do CDS se, a curto prazo, houver uma rotura financeira.
O Sr. Engenheiro Amaro da Costa sugeriu que era talvez possível encontrar em préstimos de circunstância ou intercalares, para, se houvesse uma situação grave, como aliás será iminente se o «grande empréstimo» não se concretizar, resolver o problema. Eu que, como o Sr. Engenheiro Amaro da Costa sabe, tenho alguma experiência dessa matéria e que, como foi aqui referido por um dos Srs. Deputados - parece que pelo Sr. Prof. Freitas do Amaral -, em duas circunstâncias graves para o País, e sem ser membro do Governo, ajudei a resolver esse problema, desafio o Sr. Engenheiro Amaro da Costa e o seu partido, não obstante as relações que têm -e reconheço que são importantes - na Europa e na cena internacional, a conseguir esse feito. Se o conseguirem, felicito-os. Mas, se houver uma rotura financeira ou se ela estiver iminente por efeito da votação do seu partido e de outros, o Sr. Engenheiro Amaro da Costa e o seu partido ficarão com certeza constituídos na obrigação de o conseguirem.
Aplausos do PS.
É claro que, falando do futuro, o que interessa neste momento não são recriminações nem críticas sobre o passado, o que interessa é o futuro. Penso que todos nós nos vemos como homens do futuro e não como homens do passado. E por isso o que interessa é discutir e ver o que se vai passar.
Como se sabe, há duas hipóteses, e tenho que as contemplar em ambos os casos, mesmo que já tenha, como é natural, a minha convicção íntima. Assim, há a hipótese, afirmativa, de o Governo passar e então a pergunta que todos devemos fazer a nós próprios, a pergunta que interessa ao País, é esta, se isso acontecer os partidos da oposição acatarão a vontade democrática da Câmara, como nós acataremos no caso contrário? Isto é, terminarão com a guerrilha permanente contra o Governo que vêm fazendo sem descanso, desde sempre? Sim ou não, e uma questão que se põe.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E eu que tenho essa pequena vantagem em relação a muitos dos presentes, e particularmente em relação ao Sr. Deputado Sousa Franco, eu que tenho o hábito de ler os jornais iodos logo pela manhã e que venho para aqui com a imprensa lida, hoje, quando aqui cheguei, linha lido o jornal do seu próprio partido, o Povo Livre, e li lá uma coisa que está em completa contradição com aquilo que o Sr. Presidente em exercício, do PSD aqui afirmou. Li uma frase do Dr. Sá Carneiro que lá se encontra, que é importante, que é grave,
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que tem de ser ponderada pelo povo português e que diz isto:
Hoje é claro que a democracia portuguesa pode e deve salvar-se sem o PS e, se necessário, contra o PS.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - Ele é sincero!
O Orador: - Significa isto. Srs. Deputados do PSD, uma de duas coisas, e daqui não podemos fugir: ou o líder efectivo do vosso partido quer salvar a democracia fazendo um governo minoritário, pois sem o PS e sem o PCP, porque o artigo é contra o PCP, o Governo tem necessariamente de ser minoritário, ou então se não é essa a esperança, talvez ele esteja a pensar noutra coisa, como pensou em 17 de Julho de 1974.
Aplausos do PS.
Ambas as coisas são bastante graves e eu compreendo a situação do vosso partido e aprecio, aliás, sinceramente o esforço de moderação de posições dos Deputados do PSD que aqui usaram da palavra em intervenções de fundo, tanto o Sr. Deputado Sousa Franco como o Sr. Deputado Sérvulo Correia, mas é necessário que, de uma vez por todas, o povo português possa saber quem ê que efectivamente dá o tom à política do vosso partido, porque isso e extremamente importante, como segundo partido que é, para a democracia portuguesa.
Há, evidentemente, a outra hipótese: o que se vai passar se o Governo for derrubado? É incontestável que o povo português está inquieto e basta andar nas ruas e circular de norte a sul, do País para perceber como está a ser seguido com paixão, com preocupação o debate que nós aqui estamos a travar. É que efectivamente estão em causa problemas extremamente sérios, e, sem querer dramatizar, tenho o dever de chamar a atenção da Câmara e do País para esses problemas.
Os jornais da direita dizem: «Soares derrotado». «Soares substituído por Soares». Em primeiro lugar, se o Governo cair, é evidente que o Partido Socialista entende, como já disse, que, sem que se esgotem outras fórmulas possíveis e que aqui foram referidas, certamente não aceitará a incumbência de tentar formar novo Governo. Isto não representa resposta a uma afirmação de um Deputado do PCP, isto não representa, da nossa parte, espírito de capitulação. Até hoje não temos consciência - e devemos dizê-lo com muita firmeza - de alguma vez termos capitulado perante a direita. Devemos dizer claramente aos Srs. Deputados do PCP, vocês que nos conhecem e que há pouco prestaram justa homenagem ao nosso espírito de resistência tal como nós prestamos justa homenagem ao espírito de resistência do Partido Comunista ao fascismo, que nunca capitulámos perante a direita, como muito bem sabem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não capitulámos em 48 anos de fascismo e estivemos convosco todos esses anos na oposição. Não era agora que o iríamos fazer.
Aplausos do PS.
Simplesmente temos uma concepção do que e defender a democracia, defender os ideais do 25 de Abril e defender o próprio espirito da nossa Revolução, ao qual somos fieis.
Aplausos do PS.
A nossa ideia é a de que, se não fosse n acção do Partido Socialista, nomeadamente nestes dezasseis meses de Governo, as diferentes formações económicas portuguesas, inegavelmente como das conquistas da nossa Revolução a que somos fieis, tinham sido comprometidas.
Aplausos do PS.
Se não fosse a nossa fidelidade ao espírito do 25 de Abril e aquilo que nos fizemos, e asseguramos nomeadamente nestes dezasseis meses de governo, era muito natural que a extrema-direita tivesse já apagado, como deseja, todas as recordações da nossa Revolução.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nós dissemos sempre - esta inscrito no nosso Programa - que governávamos para vencer a crise, salvar a Revolução e manter neste povo a confiança na ideia do socialismo.
Aplausos do PS.
O CDS sempre se disse não socialista, não sendo de estranhar que manifestem um certo enfado sempre que se fala de socialismo, de nacionalizações, de autogestão, de empresas mistas. Quanto ao PSD, que durante muito tempo se disse social-democrata...
O Sr. Marques Mendes (PSD): - E continua!
O Orador: - ..., e até um dos seus vários secretários-gerais se disse social-democrata leninista, é um bocadinho mais difícil de admitir que sinta tanto enfado quando se fala de socialismo e de conquistas da Revolução de Abril..
Aplausos do PS.
Todavia, já se exerceram muitas pressões sobre o PS e o governo socialista e elas hão-de continuar, qualquer que seja o resultado desta votação. Simplesmente, não imaginem os Srs. Deputados que nas, que não aceitámos governos de coligação, que sempre nos mantivemos e manteremos fiéis à política de não alianças, se porventura conseguirem derrubar o Governo, iremos ceder às pressões a que não cedemos até agora.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se têm ilusões a este respeito, o que julguei entender no discurso que aqui fez há momentos o Sr. Deputado Sousa Franco, desiludam-se.
Risos do PS.
Nós temos sido fiéis àquilo que sempre dissemos desde a campanha eleitoral, que, pelas razões já expendidas mil vezes e - pela nossa posição, de que
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nos orgulhamos, na sociedade portuguesa não faríamos aliança nem com a direita nem com a extrema-esquerda...
Risos do CDS.
...aliança definitiva e aliança para governar, e manter-nos-emos fieis a essa nossa política de não alianças.
É evidente que neste momento, Srs. Deputados, não tenho qualquer pretensão de poder inflectir o nosso voto, qualquer que ele seja. Penso que a sorte, como se diz, está lançada as decisões estão tomadas. O Sr. Deputado Freitas do Amaral disse que até ao fim do debate poderia considerar uma modificação de atitude a esta Assembleia. Já o Sr. Deputado Amaro da Costa, que e em relação a si próprio muito susceptível, o que compreendo perfeitamente, mas em relação aos outros não o é tanto, a imagem elegante de que o Governo estava no «estertor de um moribundo». Pois estará. O Governo não fez portanto qualquer concessões para -, e manter no Poder, porque não quer ficar no Poder a qualquer preço como de facto nunca quis - é isso que ressalta de tudo o que até agora aqui dissemos. E esse foi o profundo erro em que sempre quer o PPD quer o CDS laboraram: pensar que estávamos agarrados às cadeiras do Poder.
Risos do PSD.
O exercício do poder pelo poder é uma prática da direita. Srs. Deputados, não é uma prática da esquerda e nós somos homens de esquerda. Nós temos princípios, somos fiéis aos nossos princípios.
Aplausos do PS.
Isso não quer dizer que nós no Governo ou fora dele, não continuemos a lutar por uma plataforma. Mas, atenção! Existe uma crise, essa crise digo-o sem alarmismo, vai porventura agravar-se. Mas, cumprindo o que considero ser o meu dever perante os portugueses tenho de os advertir a todos disso: a crise vai-se agravar. As crises os senhores sabem-no muito bem, são propicias as oposições e nefastas dos governos. Os senhores, que porventura se preparam para ser Governo, unham atenção a esta advertência.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito obrigado!
Risos.
O Sr. Herculano Pires (PS): - Não têm nada que agradecer.
O Orador: - Mas como as decisões porventura estão tomadas, sinto-me à vontade para dizer aquilo que penso que deve ser feito e que sempre foi feito pelo Governo, que e falar ao povo português, que nos segue a todos, a linguagem da verdade. Posso dizer-lhes que assisti, há muitos anos, á queda do Governo Mendes France e nessa altura Mendes France - sou suficientemente modesto para não me comparar, a Mendes France -, no último discurso que fez perante a Assembleia, uma Assembleia que não tinha suficiente informação daquilo que representava para a França, como representou, a queda do réu Governo, que, apesar de ser um Governo só de cinco meses, foi um Governo histórico para a França, perante a incapacidade que ele sentiu de convencer os deputados dos seus próprios pontos de vista e das nuvens que se estavam a acastelar. como se acastelaram, teve uma espécie de crise, teve palavras de um grande ressentimento e de uma grande amargura. Direi pois aos Srs. Deputados que nunca ouvirão da minha boca nem palavras de ressentimento nem palavra? de amargura. Dir-vos-ei apenas palavras de serenidade.
O Governo foi muito atacado, foi responsabilizado por tudo e por nada. É evidente que, como tudo antigamente dependia do Governo, o povo português porventura ainda continua a pensar que tudo depende do Governo sendo-lhe atribuídas todas as culpas, mesmo aquelas que não lhe pertencem. É normal que assim seja, mas pouco se reconheceu aqui o que o Governo fez de bem. Será que nestes dezasseis meses não se tomaram medidas acertadas, não se fez nada de positivo nem nada que fique efectivamente para o povo português? Não é a mim que cabe nem isso interessa neste momento, dizer o que se fez ou não, mas parece-me que é impossível negar que houve uma efectiva recuperação económica, que houve a retorna do investimento,. que cresceu de 40 % em relação ao ano passado, que houve a retoma espectacular do turismo, das remessas dos emigrantes, que houve um crescimento de cerca de 6,5 % e com certeza que em matéria de indústria houve um crescimento muito maior, da origem dos 12%.
Noutras circunstâncias, falou-se algumas vezes nesta Câmara do cimento, e quando nós dizíamos que o índice do cimento era um índice, as pessoas diziam: «Pois, no tempo do Champallimaud havia cimento e hoje não há cimento suficiente no mercado.» É altura de vos fazer uma pequena confidência. Quando havia numerosíssimas bichas para irem buscar o cimento que parecia não existir, o Sr. Ministro da Indústria disse: «Bem, descansem, o Governo vai importar cimento.» Na realidade, importámos 15000 t de cimento. Consomem-se 400000 t por mês, só importámos 15000 t. Mas, por se saber que importámos 15000 t, desapareceram, como por encanto, as bichas do cimento.
Risos e aplausos do PS.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Não o há ainda!
O Orador: - Isso dá ideia aos Srs. Deputados de como se organizam as campanhas e quais os fins que visam. Nós sabemo-lo, e quanto a isto - também queria dizer aos Srs. Deputados- temos alguns outros segredos, pequenos, mas elucidativos para o povo português. Di-los-emos a seu tempo.
Quanto à definição do nosso caminho no domínio do sistema económico, a intervenção do meu camarada António Guterres foi bastante esclarecedora. E o que é que se passou em relação à Europa e que progressos fizemos em relação à nossa integração no Mercado Comum? Os Srs. Deputados breve-
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mente conhecerão o projecto de relatório que foi feito pela, Comissão e verão que as negociações também ai, estão em bom caminho. E o que e que o Governo fez para terminar o contencioso com os países africanos de expressão portuguesa? Pense-se o que se pensar e diga-se o que se disser dessa matéria, uma das nossas directrizes e uma das vias que temos interesse, um interesse vital, em prosseguir.
A cooperação com esses países.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Falou-se da absorção dos desalojados, indicou-se que conseguimos estabilizar a partir de Março-Abril deste ano, a subida dos preços, tema que foi, em certa altura, um dos grandes motivos da propaganda da oposição e que depois deixou de ser. Da mesma maneira é inegável que não deixamos aumentar o desemprego, não obstante a recusa que existe da parte dos países europeus em reabsorver a mão-de-obra portuguesa e as dificuldades, por virtude da recessão internacional, de absorverem mão-de-obra portuguesa, não obstante o volume imenso dos retornados. Nós veremos brevemente, se tivermos um Governo do PSD -partido que coloca como prioridade da sua política a luta contra o desemprego aquilo que e capaz de fazer.
Houve também uma paz social efectiva é inegável ainda que as instituições democráticas foram consolidadas. E não vale a pena falarmos da obra legislativa imensa, criando outra estrutura jurídica neste país, que foi feita pelo I Governo Constitucional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A situação é difícil. Os problemas não estão resolvidos. Mas, Srs. Deputados, onde é que no mundo estão resolvidos os problemas? Onde é que na Europa a situação não é extremamente difícil? E à pergunta do meu camarada Deputado Jaime Gama - em resposta já não me recordo a que Sr. Deputado - sobre o que se passava em Espanha, que projecta ter um crescimento para o próximo ano de 1% sobre o que se passa na Itália, onde existe um Governo minoritário democrata-cristã eu até acrescentaria que esses dois países não tiveram quarenta e oito anos de fascismo, não tiveram catorze anos de guerra colonial, não tiveram a descolonização, não tiveram os abalos produzidos pela própria revolução nas estruturas económicas e sociais deste pais, e, apesar disso, não estão em melhores condições do que nós não obstante os governos de democracia cristã que tem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não desejando em fazer aqui considerações pro domo mea, acho preferível perguntar ao PSD e ao CDS para que o país entenda a pergunta, é pena que outra equipa governativa seria capaz de fazer melhor e, nessa hipótese qual. A resposta a esta pergunta é que o povo querera ouvir.
O Sr. Presidente: - O Sr. Primeiro-Ministro desculpará - deploro muito chamar-lhe a atenção como, aliás, deploro em relação a qualquer orador em intervenções deste tipo - , mas chamo-lhe a atenção para o facto de que só lhe restam sete minutos para esgotar o seu tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, eu pediria autorização à Câmara para me deixar terminar a minha exposição.
O Sr. Presidente: - A Câmara tem alguma coisa a opor?
Pausa.
Faça favor de continuar, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: - Serram capazes o PSD e o CDS - e nisso peço desculpa ao meu amigo e camarada Jorge Campinos, pois não estou de acordo que tivessem falado balbuciando, mas de uma maneira catedrática e a justo título, embora como é sabido - não é o caso - no nosso país, muitos catedráticos às vezes balbuciem, -- isso é verdade os senhores certamente dão-me razão -, seriam, capazes o PSD e o CDS, repito, de fazer melhor do que nós? Eu, por mim, admito que sim, quo seriam capazes de fazer melhor, mas pergunto-lhes porque é que recusam ao País esse imenso serviço que era virem governar e fazer melhor do que nós, dando prova daquilo que valem, das vossas competências, daquilo que efectivamente são. Se é preciso salvar a democracia contra o PS, como disse o Dr. Sá Carneiro, por que diabo é que os senhores hesitam em formar um Governo PSD-CDS, mostrando assim a vossa competência? O País não entenderá que lhe recusem essa competência.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Isso já está mais que explicado.
O Orador: - A última pergunta para que o País também desejaria obter resposta é esta: por que é que se somos tão incompetentes devemos nós, continuar? Não se compreende a teima dos dois partidos. Diz-se que nós somos teimosos, mas naturalmente. como hão-de concordar, não há só um teimoso há necessariamente sempre dois.
Risos.
Pois essa teima em quererem associar-se connosco para governar persiste, mas nós diremos que não. Se somos tão incompetentes, como dizem, por que diabo é que havemos de ser nós a patrocinar um governo em que estejam integrados?
Aplausos do PS.
O Sr. Prof. Freitas do Amaral indicou na sua primeira intervenção cinco razões para votar a confiança. Eu ouvi as suas razões, ponderei os seus argumentos, li-os depois de os ouvir, e devo dizer-lhe que penso que a lógica iria no sentido contrário ao da conclusão que tirou.
Na verdade, quanto à primeira - não interromper uma certa acção governativa -, é certo que fez varias criticas à nossa acção governativa, mas o
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Sr. Prof. Freitas do Amaral também sabe com certeza que o óptimo é inimigo do bom e não creio que esteja tão seguro de ser capaz de resolver os problemas que nós hão resolvemos até agora. Porque não creio que esteja tão seguro disso, pergunto porque é que neste momento é que se vai interromper a acção governativa e acentuar uma crise? Estou a vontade para fazer esta pergunta, visto que a vossa decisão está tomada e é só por isso que a faço.
Segunda pergunta: tendo dito o Sr. Professor que era preciso criar condições para vencer a crise económica, pergunto-lhe como é que vamos criar cisas condições para vencer a crise económica sem uma política de concertação. Pela força?
Na situação actual, uma das coisas que reconheceu na acção positiva do nosso Governo foi que houve uma efectiva paz social. Teria sido por acaso que isso aconteceu, Sr. Deputado? Será que não deveriam ser ponderados pelo CDS o problema da concertação e o problema da confiança? E. quando se fala em confiança, naturalmente há tendência para pensar na confiança dos empresários, mas há a considerar também a confiança dos trabalhadores, que são a maioria deste país.
Aplausos do PS.
Mas mesmo relativamente aos empréstimos estarão o CDS e o PSD tão seguros de que os empréstimos - os verdadeiros, não os ideológicos, os empréstimos autênticos - estão também convencidos que o melhor será derrubar neste momento o Governo? Eu, francamente, Sr. Deputado, não tenho essa convicção. Houve alguém que disse, noutro país, a França concretamente, numa situação não muito diferente desta, que «a direita francesa era a mais estúpida do Mundo». Eu não sei se a extrema-direita portuguesa não estará a rivalizar com a direita francesa...
Risos do PS.
A terceira pergunta é como evitar a rotura financeira pois o Sr. Deputado Amaro da Costa admitiu implicitamente essa possibilidade. Já me referi a isso e direi que até agora o Governo, desde que começou a sua actividade -, isto é, logo no início de Agosto de 1976, teve sempre suspensa sobre a sua cabeça, ou seja, sobre a cabeça de todos os portugueses, essa espada de Dâmocles terrível, que é a ameaça de uma rotura financeira. O Governo, porém, graças a iniciativas diplomáticas, que foram criticadas por muitos dirigentes de vários partidos, conseguiu evitar isso. É fundamentalmente por esta razão - é preciso dizer isso que o povo português tem gozado e continua a gozar, apesar de tudo, do bem-estar, da tranquilidade e da segurança que tem tido nestes dezasseis meses. O que será o futuro do povo português vier a dar-se essa rotura? É uma pergunta que deixo em suspenso, cabendo aos partidos que nos derrubarem a responsabilidade da resposta. Eu não desejo ser excessivamente pessimista, mas daqui a alguns meses se o Governo cair como desejam, pelo menos já explicitamente, o PSD e o CDS não me refiro ao PCP porque ainda não definiu claramente a sua posição mas refiro-me aos outros dois - falaremos disso se efectivamente conseguirem levar avante o vosso propósito.
Quanto a questão da maioria de esquerda - outra razão era impedir a maioria de esquerda -, já dissemos que não há maioria de esquerda, como não haverá maioria de direita. E também dizemos que não cederemos a nenhuma chantagem que se queira fazer sobre aos acerca dos votos do Partido Comunista.
O Sr. Herculano Pires (PS): - Muito bem!
O Orador: - Não tendo tido medo, nos momentos difíceis, de que certamente os senhores se lembram, porque algumas vezes bateram às nossas portas, de que nos chamassem fascistas ou reaccionários, garanto-lhes. Srs. Deputados, que também não teremos medo amanhã, como não tivemos medo durante os 48 anos de fascismo, que nos chamem comunistas.
Aplausos do PS.
Per isso vos direi, Srs. Deputados - e já agora mais outro exemplo da França -, se a direita francesa por medo de Léon Blum - isto é um facto histórico -, se lançou nos braços de Hitler, será bom que a direita portuguesa, por medo do Partido Comunista não se lance nos braços de um novo Pinochet, porque acerca disso também digo a esta Câmara que, se houver alguma ameaça fascista, nós nos uniremos para fazer barreira ao novo Pinochet.
Aplausos gerais.
Sim, Srs. Deputados, se nós tivemos quarenta e oito anos de oposição - eu, modestamente, só tive trinta e dois, dada a minha idade, mas trinta e dois anos de oposição activa -, somos capazes de ser oposição. O País não tem dúvidas acerca disso. Somos antifascistas - o País também não tem dúvidas acerca disso - e estamos, e estaremos, com a Revolução de Abril.
Aplausos do PS e dos membros do Governo.
O quinto exemplo foi o de não precipitar o País num beco sem saída. É, de facto, uma boa questão. O Sr. Deputado disse que a democracia tem sempre alternativas. Devo dizer-lhe que isso é uma boa frase. Nós temo-la empregado, e pode-se empregar essa frase, porque é tónica salutar, mas temos vário exemplos na Europa de casos em que para as democracias não houve alternativa, visto que veio o fascismo. E essa eventualidade, dada a arrogância que toma a extrema-direita, também tem de ser contemplada, porque, Srs. Deputados, havendo vazio de Poder, descrédito do Parlamento, impasse entre os partidos, rotura financeira e crise económica, quais são os outros elementos necessários para que haja objectivamente uma situação propicia a que o fascismo avance efectivamente?
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - E quem e o culpado?
O Orador: - Mas acerca disso eu sei - e faço essa justiça ao Sr. Deputado Freitas do Amaral, visto que me estou a referir a ele e ao seu discurso, como aliás o meu camarada Zenha fez ainda há pouco - que se acontecesse uma tal situação, o Sr. Deputado, bem como os Srs. Deputados do PSD nomeadamente
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os Srs. Deputados que aqui intervieram, Sousa Franco e Sérvulo Correia, estariam ao nosso lado. Não tenho dúvidas nenhumas acerca disso, mas pergunto-lhes: que responsabilidade terão no derrubar agora do Governe? É evidente que eu sei que é próprio dos partidos da oposição quererem derrubar os governos: e perfeitamente próprio e sei que é difícil a pressão dentro dos quadros desses partidos, pois os partidos são máquinas de se chegar normalmente ao Poder. Não o ignoro. Mas, perante a situação que vivemos e no estado em que estamos, seria útil que nós todos - portanto falamos no interesse nacional de que todos já falámos - o contemplássemos e que, antes de tomarmos decisões que podem fazer derrapar a nossa jovem democracia, reflectíssemos maduramente.
É evidente que se o PSD e o CDS se apresentassem como alternativa do Poder...
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Outra vez?!
O Orador: - ...º problema estava resolvido.
Eu só me permito fazer estas reflexões e submetê-las ao povo português porque, quer um quer outro dos partidos, nos disseram que afastavam essa ideia e vão agora atirar com as responsabilidades para cima do Presidente da República, que é garante das instituições portuguesas e da democracia. Aquilo que nós. partidos, não fomos capazes de resolver, seria o Presidente da República capaz de fazer? Compreende-se isso numa estratégia para queimar e comprometer o Presidente da República e não para o defender como deve ser defendido.
Aplausos do PS e protestos do PSD e CDS.
O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Não apoiado!
O Orador: - Está no seu directo de o dizer, Sr. Deputado. Devo lembrar-lhe porém, que o ouvi, que também não estive de acordo e nunca lhe disse «não apoiado». Mas eu sou mais tolerante do que o Sr. Deputado...
O Sr. Cunha Leal (PSD): - Nós fomos tolerantes em lhe permitir falar para além da hora e a nós isso não nos foi permitido.
O Orador: - Se o Sr. Deputado entende que me devo calar, calo-me neste momento; mas como a Câmara me concedeu mais algum tempo, continuarei, e estou quase no fim.
O Sr. Cunha Leal (PSD): - V. Ex.ª prometeu que era pouco e agora está a desenvolver.
O Orador - O povo está preocupado. Mas além dessa tal hipótese, que, a nosso ver seria um premente envenenado para o Sr. Presidente da República, de um tal Governo de mediação presidencial - se isso for tentado, depois nós veremos -, a par disso, já dois dirigentes principais de dois partidos puseram o problema das eleições antecipadas, de uma maneira sensivelmente diferente.
Eu pergunto aos Srs. Deputados se também isso de abrirem tão rapidamente a porta a eleições antecipadas - o quinto acto eleitoral em tão pouco tempo, dois anos e meio - não será extremamente grave para a democracia.
Quanto ao PCP, direi também alguma coisa.
O PCP costuma distinguir-se das análises maximalistas da UDP e das análises igualmente maximalistas dos nossos simpáticos dissidentes do Ps.
Risos.
E costuma distinguir-se por dois factos fundamentais: um é o seu realismo político, outro e o facto de ser um partido de massas.
Será que foram auscultadas as massas trabalhadoras? Será que essas mansas trabalhadoras, aqueles que vão sentir na carne a nossa decisão, nas fábricas, nas empresas, por esse País fora, quererão a queda do actual Governo, com um grandíssimo grau de probabilidade de a esse Governo suceder um Governo de direita? Esta é a pergunta que faço ao PCP dizendo desde já que não creio que as massas trabalhadoras desejem isso.
O Sr. António Esteves (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quem terá a certeza neste pais de que, após a nossa decisão desta noite e se o Governo cair, não se irá criar uma dinâmica do direita ou de extrema-direita extremamente perigosa para todos aqueles que acreditam na democracia e nas liberdades?
Compreendo muito bem as dificuldades do PCP depois das campanhas encarniçadas que fez contra o Governo do PS durante estes dezasseis meses, mas o problema, senhores do PCP é vosso inteiramente vosso. A nossa posição é clara: não pedimos os vossos votos, não enjeitaremos os vossos votos.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Cunha Leal, devo dizer-lhe que estou no fim.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Ainda bem!
O Orador: - Penso que disse tudo o que julguei meu dever dizer aqui:. Disse-o com sinceridade, sem, no mínimo, desejar ferir ninguém, pois não é meu hábito, e respeitando sempre - como julgo ter sido sempre a regra, sem falha, do meu comportamento - os adversários, sejam eles quais forem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se o Governo cair. resta-me desejar boa sorte ao novo governo, pois bem necessita dela. Nós, PS, nessa hipótese, comportar-nos-emos como verão, como oposição responsável que não fará obstruções sistemáticas e que continuará a defender nesta Câmara aquilo que julga ser o interesse nacional.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - É o que temos feito!
O Orador: - Permitam-me apenas uma nota pessoal, para terminar: durante estes dezasseis meses fiz o melhor que pude, fiz o melhor que sabia, fi-lo com o sacrifício de todas as horas, de todos os momentos e sem estar nunca a contemplar os meus
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próprios interesses, nem sequer, o que seria legítimo.
Os da minha família.
Suportei, como todos os Ministros que me acompanharam, críticas infundadas, ataques pessoais, alguns gratuitos, muitas calúnias e algumas mesmo daquelas que doem fundo. Muitas vezes me lembrei de uma frase de António Sérgio, que foi meu mestre, e que vem na porrada dos Ensaios: «Venho do Bairro Alto, cosidinho de facadas.» Esta é aliás, a triste sina dos homens públicos portugueses. Penso que a assumi com a coragem que pude.
Quanto aos meus Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado, desejo deixar-lhes aqui uma palavra para o seu patriotismo, dedicação e competência. Não é fácil ser Ministro, Secretário nem Subsecretário de Estado neste país. A oposição vai verificá-lo bem depressa se for Governo.
Submeto-me, como disse no inicio desta sessão, integralmente ao veredicto desta Assembleia. Se o Governo cair, dir-vos-ei: Não caio com alegria, porque a situação do País não é susceptível num momento destes de proporcionar alegria, mesmo que isso seja o retirar de um pesadíssimo fardo de sobre os ombros. Mas também não cairei nem com azedume nem com ressentimento.
De qualquer modo, é necessário deixar a Portugal, aos Portugueses, a esta Câmara, uma palavra de esperança, uma palavra de serenidade e de confiança. O povo português um recursos extraordinários, o povo português é um grande povo, e muitas vezes os seus dirigentes, a começar por nós, não terão estado a altura daquilo que nós devemos a esse povo tão grande que é o nosso.
Confiemos no povo português, que ele encontrará com certeza uma solução democrática.
Aplausos dos Deputados do PS e dos membros do Governo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa.
O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Jamais me passou pela cabeça que depois de o Sr. Primeiro-Ministro usar da palavra neste debate o meu grupo parlamentar se sentisse na obrigação de pedir para usar da palavra para fazer um curto protesto.
Protestos do PS.
Não era o momento, nem a hora, nem a ocasião para o fazer, e se o faço é porque a gravidade de certas afirmações proferidas neste hemiciclo pelo Sr. Primeiro-Ministro exige que do meu grupo parlamentar saia uma palavra líquida e bem clara relativamente a algumas invectivas, a algumas insinuações que o Sr. Primeiro-Ministro se permitiu fazer um dia, pouco depois das eleições legislativas de 1976, num debate na televisão, Diogo Freitas do Amaral disse a Mário Soares o seguinte: «Espero. Sr. Doutor, que, tal como soube evitar ser o Kerensky de Portugal, não seja jamais o Allende dos Portugueses.» É nessa ocasião o Dr. Mário Soares, com a galhardia que ninguém lhe nega e com a prontidão de resposta que ninguém lhe recusa, disse: «Esteja descansado, nunca o serei.»
Eu quero recordar isto aqui hoje porque não há Pinochet sem Allende...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - ..., não há ditadura de direita sem erros dramáticos da esquerda.
Aplausos do CDS.
Em democracia, a responsabilidade não é da direita nem da esquerda, a responsabilidade é dos democratas no seu conjunto, e se eles falharem no seu conjunto, se falharem na sua unidade e se falharem na sua coesão, a democracia não poderá sobreviver. Só sabendo do pôr sempre acama do acidental o essencial é que a democracia sobreviverá.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Não é com rupturas e não é com a apresentação de divergências salutares, que são a essência da própria democracia e do próprio fenómeno oposicionista...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - .... que se pode construir a democracia a sério. Repito: Quem, da bancada do Partido Socialista e mesmo da bancada do Partido Comunista ou da UDP, poderá negar que a esquerda no Chile com ele os erros graves e que esses erros abriram o caminho, as portas, para a ditadura fascista que depois se instalou?
Não é correcto, não é historicamente certo dividir um país para arranjar um fantasma que seja o cavalo de batalha da luta política, mesmo que essa luta tenha a legitimidade de um partido que defende honestamente o seu próprio Governo.
Aplausos do CDS.
Quero, portanto, esclarecer o Sr. Dr. Mário Soares, em particular, se sobre isso tem alguma dúvida, que antes mesmo, se o caso se dar, de socialistas ou comunistas terem de ir para a rua para defender a liberdade e a democracia em Portugal, nós estaremos na primeira barricada, porventura à frente dos senhores, para dar o exemplo.
Aplausos do CDS.
Julgo desajustado, por consequência, o tipo de apelo dramático que o Dr. Mário Soares proferiu nesta madrugada. E mais grave foi porque a nosso ver, incorreu - involuntariamente, concedo, mas incorreu- numa injustiça fundamental. É que para nós, para além das diferenças que existam entra os diferentes partidos, para além do facto de uns serem apoios do Governo e outros serem oposição, em Portugal existe um fenómeno político autónomo de base legítima, democrática, genuína, e esse fenómeno é o da Presidência da República. E nós não temos quaisquer dúvidas em dizer que em Portugal não há qualquer receio a temer de instauração de qualquer dita-
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dura enquanto Ramalho Eanes for Presidente dos Portugueses.
Aplausos do CDS, PSD, PS e membros do Governo.
Termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Admitirem-se hipóteses trágicas e dar-lhes um tom dramático é sempre de certa forma lançar nos espíritos as dúvidas.
Apresentar como um perigo iminente e real um perigo a curto prazo, um perigo a ser dramatizado da forma como o Sr. Primeiro-Ministro o fez neste debate, esta noite, a questão da eventualidade da instauração de uma ditadura fascista em Portugal, é a nosso ver, uma grave imprudência política.
Pelo nosso lado demos provas, em ocasiões que aparentemente e de um ponto de vista estritamente sectorial ou partidário poderiam parecer difíceis, de em relação ao Presidente da República, a nossa atitude ter sido sempre de uma estreita completa e total lealdade, procurando em momentos talvez menos favoráveis defendê-lo, protegê-lo e conseguir essa realidade fundamental que é a de garantir a identificação do seu próprio eleitorado, o eleitorado presidencial, que existe, com o próprio Presidente. Não podemos, Sr. Dr. Mário Soares, aceitar que nos venha dizer que nós estamos interessados em «queimar» o Presidente da República. Não podemos tolerar a insinuação e teremos de protestar contra a afirmação.
Vozes do CDS: -Muito bem!
O Orador: - Se há em Portugal algum fenómeno grave que perturba a solidez das instituições e o fenómeno da não convergência entre a maioria presidencial, a maioria governamental e uma maioria parlamentar estável
Aplausos do CDS.
É desse fenómeno, ao qual o Partido Socialista e responsável, que resultam erosões sucessivas do Presidente da República e é isso que era necessário evitar. Dissemo-lo há um ano, não fomos ainda compreendidos, mas talvez um dia nos venham a dar razão.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Franco.
O Sr. Sousa Franco (PSD): - Sr. Primeiro-Ministro, vou ser muito breve.
Em primeiro lugar, ficámos profundamente chocados e espantados com a maneira como, a propósito de uma quentão de confiança, o Sr. Primeiro-Ministro, dramatizou a situação portuguesa. Sabemos que ela é grave, mas sabemos também que do ponto de vista institucional o povo português, nas instituições constitucionais têm certamente recursos paca sair de uma crise, se crise houver.
Vozes do PSD: - Muito bom!
O Orador - Não reconhecemos qualquer efeito construtivo em confundir o Governo com o sistema democrático.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não entendemos que seja possível defender que, se houver crise, o Presidente da República não está à altura eu em condições de a resolver, uma vez que é a ele que cabe designar o Governo e promover os entendimentos interpartidários necessários à superação da crise.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não entendamos que se fale da eventualidade de um Pinochet português quando temos forças armadas disciplinadas, respeitadoras da Constituição e integradas no espírito de primazia do poder civil democrático sobre o poder militar.
Aplausos do PSD e do CDS.
Não aceitamos que se esteja a fazer qualquer distribuição de culpas quanto a uma eventualidade que, por nosso juízo, entendemos remota e contra a qual, não tenho duvida, todos os que estão nesta Câmara lutariam com o mesmo empenho e com o mesmo ardor. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, se não aceito, de forma alguma, porque a democracia é um valor que está acima das divergências partidárias ...
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ... que neste momento o Sr. Primeiro-Ministro - porque no fundo lhe caberia este papel - se esteja a pôr no lugar do principal responsável pela queda da democracia, porque seria a acção do Governo que teria de criar condições para isso, se não aceito que a votação normal de uma questão de confiança seja feita em clima de coacção política, visto que um acto normal de democracia não pode virar-se contra as instituições...
Aplausos do PSD.
... não posso em todo o caso deixar de lhe fazer uma pergunta que se insere no quadro, da sua hipótese. Certamente, se houvesse um risco desses estaríamos todos unidos para defender a democracia ou, para lutar por ela se fosse suprimida. Sendo assim, porque não nos unimos, agora, para viabilizar esta democracia, ao serviço do povo português?
Risos do PSD e do CDS.
Um segundo ponto, muito mais rápido, com serenidade e concisão. Foi mencionado neste hemiciclo um artigo do Dr. Sá Carneiro publicado no Povo Livre. Devo dizer que o li e que o li na totalidade...
O Sr. Meneses de Figueiredo (PS): - Já não é mau!
O Orador. -....e não apenas na frase... que o Sr. Primeiro-Ministro citou. E não entendo que haja qualquer oposição entre aquilo que aqui, afirmei e o que consta desse artigo. É evidente que, âmbito
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do artigo - e naturalmente quem o não leu não poderá fazer comentários aproprositados - a afirmação tem um sentido bem preciso: «A democracia portuguesa pode e deve salvar-se sem o PS e, se necessário, contra o PS.» E diz-se logo a seguir: «Não proibiu ele já aos seus militantes que participassem em qualquer governo que não seja de PS e independentes?»
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que há neste artigo é uma crítica muito clara à posição fechada do PS quanto à formula minoritária do Governo.
Aplausos do PSD.
Se o PS persistir nessa posição, é evidente que a democracia terá de se salvar contra o PS. através de um Governo de composição presidencial, com a base de apoio que consiga obter nesta Câmara, através de inovas eleições, através de qualquer coisa que transcenda o impasse que o PS, e só ele, criou.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas isto não significa nada de contraditório com aquilo que eu disse: que para salvar a democracia, como nenhuma maioria coerente e possível sem o PS, o PS é imprescindível e confiamos em que saiba sobrepor o interesse do País ao seu mero interesse partidário.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em terceiro lugar, queria observar-lhe que já não é novo para nós um estuo de actuação que consiste em virar o PSD contra o Dr. Sá Carneiro o Dr. Sá Carneiro contra o PSD.
O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Ë chão que deu uvas, não tem qualquer significado ou utilidade usar essa táctica.
O Sr. Fernando Pinto (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A actual direcção do PSD é uma direcção investida de plenos poderes, assume todas as suas responsabilidades.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não há quaisquer razão para falar de líderes ocultos, de direcções transitórias, de posições que sejam não avalizadas por chefes que estão em casa a mexer os cordelinhos.
Aquilo que é dito peio PSD é dito pelo PSD desta bancada.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Dr. Sá Carneiro terá dentro do partido, como militante que é, a posição que o Congresso de Janeiro resolver atribuir-lhe. Até lá somos nós que representamos o PSD.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares): - Quando o Sr. Deputado Amaro da Costa pediu a palavra, eu pensei em não fazer um contraprotesto, mas depois, como ele fez muitas afirmações que me pareceram a mim também graves e como depois se seguiu no uso da palavra o líder em exercido do PSD, eu penso que, já que a Câmara sem um Regimento destes, tenho também de usar das prerrogativas que o Regimento me da de fazer eu próprio um contraprotesto.
Chamo a atenção desta Câmara para o seguinte: se há uma intervenção de fundo, de um líder de um grupo parlamentar ou de um primeiro-ministro sobre um assunto de tanta relevância e tanta importância nacional, como é o de que estamos a tratar, e se de fala mais um ou dois minutos, um Deputado logo lhe chama a atenção, mas se, pdo contrario depois disso um Deputado pede a palavra para fazer um protesto, este pode falar indefinidamente, sem limite de tempo.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Esse agora!
O Orador: - Deve dizer-se que esta situação é uma situação bastante originai Mas este é um assunto sobre o qual ovos teremos de debruçar noutra altura.
Pedi a palavra para formular um contraprotesto por três ou quatro razões. Em primeiro lugar, porque eu penso que se pode pensar em tudo aquilo que eu disse, pode-se criticar com toda a vivacidade tudo aquilo que eu disse, pode-se, até, não admitir aquilo que eu disse, mas o que não se pode é tentar pôr na minha boca aquilo eu eu próprio não disse.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isso eu não posso consentir e nomear damente no que se refere ao Sr. Presidente da República. Toda a gente sabe a confiança, a estima e o respeito que o PS tem pelo Sr. Presidente da República, toda a gente sabe como nos momentos mais difíceis sempre apoiamos o Sr. Presidente da República.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Faiar de um governo presidencial- e ele nunca o fez - é, segundo o nosso ponto de vista, inconveniente paira o papal que a Constituição, a nosso ver, atribui ao Sr. Presidente da República.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Visto que, segundo a Constituição, o Presidente da República não governa, ele é o árbitro e é o garante.
Por outro lado desde o início se sabe que nunca o PS acertou que se falasse em maioria presidencial. Vir de novo insistir nessa história da maioria presidencial é coisa que não me parece legítimo. O PS apoiou e escolheu o seu candidato, general Ramalho Eanes, sem lhe pedir nada em troca e independen-
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temente das decisões dos outros partidos, fossem elas quais fossem. E mesmo durante a campanha sempre o PS se demarcou da campanha que fizeram os outros partidos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, os partidos que faiam tanto em maioria ,presidencial não se podem esquecer que quando apoiaram o Sr. General Ramalho Eanes sabiam perfeitamente que estavam a apoiar um candidato que disse publicamente que se fosse eleito Presidente da República dos Portugueses, chamaria para constituir Governo o secretário-geral do PS.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E sabia-se já nessa altura, porque isso era público e é público desde a campanha eleitoral de Abril passado, que o PS só formaria Governo se este fosse um Governo homogéneo socialista com independentes, sem coligações de outra ordem e portanto, sem coligações partidárias. Não me consta que, nessa altura, nenhum membro de nenhum partido da agora chamada maioria presidencial tivesse protestado por esse facto.
Aplausos do PS.
Por outro lado, relativamente a Allende e a Pinochet, eu nunca disse que não seria um Allende no sentido pejurativo da palavra. Eu tenho a honra de ter sido talvez porventura dos poucos que se encontram nesta sala que conheceram Allende pessoalmente e fui amigo dele, mas tenho ainda a dizer que tenho muito respeito por ele pelo seu sacrifício e por aquilo que ele fez peia democracia no Chile.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, nunca poderia referir-me a Allende fazendo um paralelo com Kerensky. Queria, portanto, fazer esta precisão, para que sobre ela não fique dúvidas.
Também não fiz perpassar por esta Câmara - isso não foi dito por mim e portanto não me pode ser atribuído (aliás, o discurso sairá, estenografado ou gravado, na folha oficial) - a ameaça de um golpe militar qualquer. Não o disse. Portanto, não se me atribuam ou não se me insinuem essas palavras a mim.
O Sr. Herculano Pires (PS): - Muito bem!
O Orador: - Eu aventei uma hipótese que estou firmemente convencido que não se verificará: e nós lutaremos todos contra a sua possível verificação. Também o disse e estou certo disso. Mas, Sr. Deputado Amaro da Costa permita-me que lhe diga que goste de ouvir a sua declaração, sincera e emocionada, de que, se houvesse uma eventualidade cosias, que V. Ex.ª também admitiu em hipótese, estaria na primeira fila das barricadas. Tomo nota, pois considero-a um compromisso de honra.
Manifestações de desagrado do CDS.
Por outro lado, também desejo dizer que não usei de nenhum dramatismo especial em relação á situação portuguesa. Mas a situação portuguesa comportai, no plano financeiro, uma grave ruptura, como o Sr. Deputado Sousa Franco talvez saiba ainda melhor do que os Srs. Deputados da bancada do CDS, porque esteve ligado às Finanças e sabe também perfeitamente qual a situação que existe, neste momento, na Tesouraria do Banco de Portugal. Ele em consciência saberá que eu não exagere uma vírgula quando falei em ruptura e quando falei na gravidade dessa mesma ruptura. Não exagere uma vírgula, Srs. Deputados! Nem fiz perpassar aqui nenhuma espécie de fantasma inventado para criar qualquer espécie de coacção psicológica que não está nos meus hábitos.
Portanto, não ma atribuam aquilo que eu não disse.
Por outro lado, Srs. Deputados, parece que se conclui perfeitamente bem de tudo o que eu disse que eu aceito, não só de boa mente mas também com todo o fair-play democrático, a queda e substituição do Governo. Ressalta perfeitamente de todas as palavras que proferi que eu aceito isso e que o considero como um exercício de democracia. Sempre o disse. Foi por isso mesmo que eu pus aqui, nesta Assembleia, a questão de confiança. Portanto, não imaginem que eu não contemplo a questão da mudança de Governo.
Quanto à declaração do Sr. Deputado Sousa Franco acerca dos líderes ocultos e dos líderes efectivos do seu partido, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que tomei nota da sua declaração. E penso que, se outros méritos não teve o facto de ter havido protestos e contraprotestos depois da minha intervenção, houve um muito grande para todo o País, que foi a sua palavra de esclarecimento. Acredito. E acredite, Sr. Deputado Sousa Franco, que - e digo-lhe isto sem intenção alguma de intervir no seu partido, pois o Sr. Deputado sabe muito bem que nunca em circunstância alguma o que fazer, e podaria tê-lo feito, mas não o fiz - essa palavra de esclarecimento era necessária, porque a sensação do País não é essa que o Sr. Deputado afirmou. No entanto, uma vez que o afamou e como o considero um homem de honra, eu aceito-a como boa e também tomo nota dela.
Queria dizer-lhe ainda, Sr. Deputado, que o que eu não aceito é a sua interpretação do artigo escrito pelo Dr. Sá Carneiro. Isso eu mão aceito, porque o que lá está escrito é perfeitamente claro, toda a gente entende que neste artigo o que está escrito é que poderá ter de se defender a democracia sem o PS com certeza e se for necessário mesmo contra o PS. Ora, o que eu gostaria que o Sr. Deputado me explicasse - no entanto, parece-me que não vale a pena continuarmos o diálogo porque a sua explicação com certeza que não foi convincente para ninguém neste particular - é como é que é possível defender a democracia através de uma sucessão democrática, nesta Câmara, sem o PS e contra o PS. Isso é exactamente o contrário de tudo o que disseram, porque se não faria sentido que os senhores se encarniçassem tanto em querer uma coligação com o PS. A ser assim, não faria qualquer sentido.
Portanto, neste ponto há uma contradição efectiva que nenhuma argúcia jurídica poderá esbater.
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Ainda em relação ao artigo do Dr. Sá Carneiro eu queria dizer que o Sr. Deputado Sousa Franco e o seu partido poderão fazer iodas as profissões de fé de respeito pelo Sr. Presidente da República, e eu acho bem que o façam, porque são salutares, mas quem ter esse mesmo artigo percebe várias vezes, nesse artigo, as «facadas»» - desculpe o termo que eu emprego - que se lá dão ao Sr. Presidente da República. Isso é incontestável e o próprio terá a hombridade de o reconhecer. O Sr. Deputado Salgado Zenha já aqui disse, e eu repito, que o Dr. Sá Carneiro pode ter muitos defeitos imas há um que ele não tem, que é o de ser hipócrita. Isso ele não é, antes pelo contrário: o Dr. Sá Carneiro diz as coisas pelo seu nome, e no artigo di-lo claramente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Temos agora um intervalo de uma hora.
Eram 4 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 5 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Vamos então, Srs. Deputados, votar a moção de confiança apresentada pelo Governo.
Submetida à votação, foi rejeitada, com 159 votos centra (PSD, CDS, PCP, UDP e Deputados independentes Carmelinda Pereira, Aires Rodrigues, Brás Pinto, Lopes Cardoso e Vital Rodrigues) e 100 votos a favor (PS).
O Sr. Presidente: - Como a moção não foi aprovada, e de harmonia com o n.º 2 do artigo 201.º do Regimento, comunicarei ao Sr. Presidente da República o resultado da votação, para efeito do disposto no artigo 198.º da Constituição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Gomes, para proferir a declaração de voto do PCP.
O Sr. Joaquim Gomes (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Ministros: A votação da moção de confiança ao Governo culmina, como assinalava o Comité Central do PCP no último domingo, o fracasso político de recuperação capitalista, latifundista e imperialista, que conduziu o País à beira do desastre. Culmina também o fracasso da fórmula de Governo PS sozinho, aliado de facto à direita.
Ao apresentar-se nesta Assembleia em Agosto de 1976, o Governo prometia então resolver os problemas económicos, financeiros e sociais do País. Prometeu entre outras coisas a defesa da Reforma Agrária, das nacionalizações e do controlo operário, que declarou «irreversíveis», a redução dos défices das balanças comercial e de pagamentos, «a criação maciça de novos postos de trabalho».
O balanço de dezasseis meses de governação revelam que nem estas nem outras promessas foram cumpridas. Os resultados (oram precisamente o contrário do anunciado.
As linhas mestras da política do Governo PS, aliado de facto à direita, têm sido de ataque sistemático às conquistas dos trabalhadores e à Revolução, têm sido de contínuas cedências às exigências do grande capital, dos grandes agrários e do imperialismo.
A restituição de terras aos grandes latifundiários e exploradores capitalistas, a entrega de grandes empresas ao patronato sabotador, tudo isto conduziu ao agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo português.
Ai contra-revolução legislativa, conduzida em aliança com os partidos reaccionários, levou à degradação da situação política, económica e social em que nos encontramos, conduziu-nos à beira do desastre financeiro.
Ao declararmos que não assinaríamos nenhum cheque em branco queríamos dizer que não daríamos, nem daremos, qualquer espécie de aval à continuação de uma tal política.
Ante o agravamento da situação, o PCP tem vindo a insistir na necessidade de se discutir e aprovar uma plataforma. Considerámos como indispensável que sã chegasse a acordo em pontos capitais, como sejam: manter o poder de compra do povo trabalhador, respeitar os limites entre as diversas formações económicas, assegurar a Reforma Agrária, as nacionalizações e o controlo de gestão, promover um grande esforço patriótico de recuperação económica tendo como bases fundamentais os recursos internos e a vontade e a intervenção dos trabalhadores, dos agricultores, das massas populares.
Convém afirmar aqui que não fizemos exigências quanto à composição do Governo. Entendemos e declarámos inúmeras vezes que para nós o fundamental era a aprovação de uma plataforma, porque a partir daí todo o resto se simplificaria, mesmo a composição do Governo.
Aceitámos igualmente o memorando do Governo como base de discussão. Salientámos que nele havia pontos positivos que podiam servir, em nosso entender, como base de exame conjunto e de possíveis acordos. Por isso fizemos propostas concretas. Insistimos na necessidade de acordos para se sair da crise. Porém as respostas do Governo à nossa boa vontade e as nossas propostas nunca passaram de «declarações de boas intenções».
Os discursos do Sr. Primeiro-Ministro na abertura e encerramento do debate não deixam antever qualquer mudança de fundo na orientação. Não apareceu nesses discursos uma única note que conduzisse à ideia de que estejam a ser encaradas medidas para evitar a continuação de uma política cujos resultados desastrosos estão à vista. Isto sem prejuízo de algumas afirmações positivas feitas no discurso de encerramento.
Afirma-se a vontade de dialogar, mas, ao mesmo tempo, recusa-se qualquer alteração na política até agora seguida.
Então há que perguntar: que diálogo é aquele que o Governo propunha? Com quem pretendia de facto dialogar? E para que política?
Consideramos positivo que se tenha podido dialogar, que se tenha podido mesmo avançar no exame de um ou outro ponto, ainda que o Governo se tenha mantido sempre na negativa em relação aos problemas avançados. Mesmo depois de o Governo dar
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por findas as negociações, declarámo-nos dispostos a um entendimento com o Governo e com o PS. Por isso esperámos até ao último minuto para decidir a nossa votação. E por isso votámos contra a moção de confiança apresentada pelo Governo.
Os partidos da direita, ansiosos por intensificarem a ofensiva contra as conquistas da Revolução e por restaurarem o poder económico e político dos monopólios e latifundiários, desencadearam violentos ataques contra o Governo. Com estes ataques os partidos reaccionários pretendem alijar as, responsabilidades que têm de facto na política de recuperação capitalista e latifundista praticada pelo Governo e apresentar-se como alternativa.
As críticas dos partidos de direita ao Governo PS não são porque a democracia esteja em perigo, mas dantes porque ainda vivemos em democracia. As críticas dos mesmos partidos ao Governo não são porque a Reforma Agrária esteja em perigo, mas porque ela subsiste. Não são porque a recuperação capitalista agrave a situação económica, mas porque continuam a existir os sectores nacionalizados e intervencionados e o controlo de gestão é ainda uma realidade.
Admitir, como o fez o Sr. Primeiro-Ministro, a hipótese de passar nesta Assembleia um governo PPD-CDS constitui em si uma declaração extremamente inquietante.
Em democracia, entregar o Poder àqueles que querem liquidá-la, aos que não votaram a Constituição ou que abertamente estão contra ela, seria atitude que o povo português não poderia deixar de recusar.
Um governo PPD-CDS significaria o agravamento brutal da crise política, económica e social, significaria pôr imediatamente em perigo todas as conquistas dos trabalhadores e da Revolução. Um tal governo só poderia constituir-se com o apoio do PS. Parecemos inacreditável que o PS pudesse dar tal apoio.
A saída para a crise só pode ser encontrada com uma alternativa democrática para a política actual. E uma tal alternativa, no quadro das instituições e da actual correlação de forças políticas, só é possível com os trabalhadores, e não contra os trabalhadores, só é possível através do entendimento dos democratas, designadamente de socialistas e comunistas.
O fascismo e a reacção estão particularmente activos. Repetem-se campanhas, manobras e actividades de desestabilização. Multiplicam-se as ameaças. As forças da democracia estão, porém, em condições de lhes fazer frente com êxito e impedir que se concretizem os planos de restauração do poder económico e político dos monopólios e dos latifúndios, que significaria a liquidação do regime democrático e a instauração de uma nova ditadura.
As semanas próximas exigirão das forças democráticas um alto sentido de responsabilidade.
O PCP espera que os acordos que não foram alcançados antes da votação da moção de confiança o sejam futuramente.
Pela nossa parte faremos todos os esforços para que isso seja possível. Estamos prontos a prosseguir com todos os democratas, especialmente com os socialistas, o exame conjunto da situação e dos problemas nacionais, com vista a alcançar uma plataforma patriótica que, depois da votação da moção mais ainda do que antes, se torna não só necessária como indispensável.
O PCP confia inteiramente em que o povo português, neste momento difícil, saberá encontrar o caminho para vencer as dificuldades actuais, assegurar a saída da crise, o bem-estar do povo trabalhador, a consolidação e o prosseguimento do regime democrático, o respeito pela Constituição, a defesa da independência nacional.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria começar as minhas considerações por dizer ao Sr. Dr. Marro Soares que a UDP não tem dúvidas nenhumas de que, no caso de um golpe fascista, es militantes socialistas, como todos os antifascistas, lutariam nas barricadas para defender a liberdade. Só que as barricadas da luta contra o avanço do fascismo e contra a possibilidade de um golpe fascista são hoje barricadas bem concretas: a defesa da Reforma Agrária, a luta contra os despedimentos, contra o regresso dos patrões sabotadores, contra a recuperação capitalista. E temos de reconhecer que o Governo não tem estado nessas barricadas e até tem atacado essas barricadas dos trabalhadores. E porque os trabalhadores exigem um Governo que esteja nessas barricadas hoje é que a UDP não pode dar qualquer confiança a este Governo.
Sobre o Chile queríamos dizer que em primeiro lugar, se é verdade que a esquerda cometeu erros, foi a direita quem deu o golpe e, em segundo lugar, queríamos dizer que o principal erro das forças de esquerda no Chile foi o terem acreditado nas declarações hipócritas de certos fascistas em favor do regime constitucional. Não nos esqueçamos que o próprio Pinochet, em véspera do golpe, declarava a Salvador Allende o seu respeito pelo regime constitucional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pressionado pelo isolamento e repúdio popular, atacado pela direita reaccionária, desgastado pela falência da política económica e pela instabilidade política desses factores resultante, não teve o Governo outra solução senão a de vir pedir a esta Assembleia o apoio necessário para se manter como governo.
Cai este Governo completamente desacreditado aos olhos do povo e isolado no seio dos trabalhadores.
Nas últimas grandes manifestações populares - dia 18 e 19 no Porto e em Lisboa, dia 28 no Alentejo e nas últimas semanas em todos os pontos do País - as centenas de milhares de trabalhadores que à rua saíram repudiaram claramente a política governamental, repudiaram os ataques à Reforma Agrária, a subida do custo de vida, o congelamento dos salários, as negociações com o FMI e as suas imposições arrogantes, os trabalhadores repudiaram a escalada reaccionária!
O voto da UDP contra a moção de confiança apresentada pelo Governo não é mais do que a
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expressão do sentir bem vivo dos trabalhadores, firmemente manifestada de norte a sul do País.
Apoiar este Governo significaria apoiar a sua política. Significaria apoiar as tentativas de destruição da Reforma Agrária, a odiada Lei Barreto, as cargas da GNR contra os assalariados rurais, a restituição das terras aos latifundiários parasitas.
Apoiar este Governo significaria sancionar as desintervenções nas empresas, o regresso dos antigos patrões sabotadores, as cargas policiais sobre os operários em greve, os despedimentos selvagens, a inflação galopante e a miséria crescente do povo.
Apoiar este Governo significaria dar um cheque em branco às negociações com o Fundo Monetário Internacional, à política dos cíclicos empréstimos ruinosos, a submissão às exigências imperialistas.
Apoiar este Governo significaria, finalmente, apoiar a política reaccionária que tem fortalecido o poder económico e político dos monopólios e latifundiários, que tem aberto a porta à ofensiva reaccionária dos Sá Carneiro e Pires Veloso, que tem pactuado descaradamente com as manobras fascistas e separatistas.
Poderia a UDP alguma vez sancionar esta política?
O voto da UDP contra a moção de confiança apresentada pelo Governo é a única atitude consequente com as aspirações democráticas e revolucionaras do povo português.
Poder-se-ia no entanto dizer, e o PCP o tem insinuado, que se estaria a assistir a uma alteração, mesmo que ligeira, mesmo que imperceptível, na política governamental.
O próprio Governo tinha afirmado nesta Assembleia que nenhumas alterações poderia introduzir na sua política. E nem era necessária tanta franqueza por parte do Dr. Mário Soares. A análise do memorando que nos foi apresentado e os debates a que aqui assistimos já mostraram que o Governo pediu o apoio desta Assembleia unicamente para prosseguir a sua política ruinosa e antipopular.
O voto da UDP contra a moção apresentada reafirma as conclusões do seu III Congresso: mantendo-se o Governo do Dr. Mário Soares, nenhuma alteração é possível â actual, política antipopular do Governo.
E, quando nos vêm dizer que Mário Soares era a única barreira possível ao fascismo e que apoiá-lo era a única forma de evitar um governo do PPD e CDS, somos obrigadas a lembrar que em ires eleições consecutivas o povo português votou claramente contra a direita, expressando a sua firme vontade de jamais deixar que em Portugal se repitam os 48 anos de fascismo.
É necessária uma mudança. O povo português mentia que não podia depositar qualquer confiança em Mário Soares, que era necessário derrubá-lo e abrir novos caminhos na política nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje caiu o Governo. Que futuro se abre aos Portugueses?
Várias soluções são apontadas. Desde o governo presidencialista a novo governo do PS com independentes, passando por um Governo PSD-CDS, as propostas da direita reflectem a crise política que é provocada peia sua divisão em torno da alternativa que melhor possibilite uma nova ofensiva contra o movimento popular e contra as conquistas de Abril.
Fala-se já hoje num governo presidencialista que sob a égide do general Eanes agruparia pretensas «competências» e as apresentaria como um governo de «salvação nacional», única saída face ao fascismo. Em nome do «realismo político», há mesmo elementos sinceramente antifascistas que perderam toda a confiança na força do movimento popular e são iludidos por esta ideia absurda de que as conquistas democráticas e a Constituição podem ser defendidas por um regime autoritário e autocrático baseado nas forças militares. Todos aqueles que facilitem a instauração de um regime autoritário sob a égide dos militares reaccionários tornar-se-ão responsáveis perante o nosso povo por abrir condições para a instauração de uma nova ditadura e por desencadear mecanismos políticos conducentes à implantação de um regime fascizante.
Fala-se já hoje também num governo de coligação PSD-CDS que, dando seguimento à ofensiva da direita e apresentando-se como saída perante o descalabro a que o Governo de Soares conduziu o País, seria um governo forte, da direita, um governo decidido a cortar, sem hesitações, todas as bandeiras progressistas que hoje ainda flutuam nos céus de Portugal. O próprio Mário Soares - desmentindo mais uma vez qualquer empenho em erguer a apregoada «barreira intransponível à reacção» - diz que vai aconselhar o Presidente da República a convidar o PSD a formar o Governo.
A tarefa que hoje ré coloca a todos os democratas, a todos os antifascistas, a todos os homens de esquerda, a todo o povo trabalhador de Portugal, é a de impedir que à queda do Governo de Soares sobrevenha um governo da direita reaccionária, sobrevenha uma mais profunda viragem à direita no Governo e no País.
Os antifascistas, os trabalhadores, o povo português, tiveram forças para resistir às medidas reaccionárias do Governo, tiveram forças para isolar e desacreditar o Governo do Dr. Mário Soares. O povo português terá igualmente forças para impedir um governo ainda mais direitista, terá forças para descer à rua, paralisar por completo esse governo e precipitar a sua inevitável e vergonhosa queda.
Não pensem os reaccionários, não sonhem os fascistas, que a queda de Soares possa dar lugar a um governo da direita reaccionária!
Os trabalhadores, com a mesma determinação de que deram provas, com a mesma unidade que demonstraram nas últimas grandes manifestações de rua, saberão levantar-se contra um governo da direita, saberão como há dias disse um Deputado antifascista, fazer com que esse governo não dure oito dias em Portugal.
Nessa hora grave que o País atravessa, a UDP chama todos os trabalhadores, todos os antifascistas, todos os homens livres do nosso país, a tomarem mas suas mãos a, iniciativa de indicar na rua o governo que pretendem.
É com a nossa luta, com a nossa unidade, com a nossa firme vontade de abrir um futuro novo ao
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País, que rasgaremos o caminho da liberdade e do socialismo.
É hora de sair de novo à rua em luta pelo futuro. Seremos mais fortes ainda do que o fomos nas últi-mas manifestações sindicais, seremos mais fortes ainda porque temos claros objectivos de luta: impedir um governo da direita, batalhar por um governo ao serviço das aspirações do povo.
Ê hora de dar cumprimento à proposta unanimemente aprovada pêlos sindicatos no último plenário sindical. É hora de uma jornada de luta nacional que mostre à reacção e ao imperialismo a força imensa, a força de milhões, a força dos trabalhadores.
É hora de unidade. Serão responsáveis todas as forças políticas que sabotarem a unidade combativa do povo. Assumirão as suas responsabilidades perante os trabalhadores todos aqueles que se opuserem à sua unidade e à sua luta.
É hora de romper com a expectativa e sair à rua em luta pelas mais sentidas aspirações do povo português. A UDP declara solenemente a todos os democratas e antifascistas, a todos os trabalhadores comunistas, socialistas, católicos progressistas, a todos os homens livres, a todas as organizações de esquerda, a todo o povo de Portugal, a sua firme disposição de lutar ao vosso lado, de combater ao vosso lado, em torno de uma plataforma de luta que é a nossa, que é a de todo o povo trabalhador de Portugal.
Lutemos por quatro pontos essenciais que são bandeira de unidade do povo português.
Lutemos em defesa da liberdade e das conquistas democráticas da Constituição. Pela libertação imediata dos antifascistas presos, pela proibição das actividades fascistas, dissolução do MIRN e dos jornais fascistas, pela prisão de Kaúlza e de todos os conspiradores reaccionários, pides e bombistas.
Lutemos pelo bem-estar da classe operária e dos trabalhadores. Contra a política dos pacotes, pelo congelamento dos preços dos bens essenciais, pela saída dos CCT's e o aumento dos salários, pela proibição dos despedimentos, contra a devolução das empresas intervencionadas, pela revogação da lei do sector público e do sector privado.
Lutemos em defesa da Reforma Agrária e dos direitos dos rendeiros, caseiros, pequenos e médios agricultores contra a Lei Barreto, contra a Lei do Arrendamento Rural, por uma política de apoio aos camponeses.
Lutemos em defesa da independência nacional. Contra as ingerências do Fundo Monetário Inter-nacioal e a política dos empréstimos ruinosos, pelo fim das bases estrangeiras em território pátrio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qualquer que seja o Governo que se suceda ao que hoje foi derrubado, nada nem ninguém poderá deter a marcha vitoriosa do povo português para a liberdade e o socialismo! O povo português manterá levantadas as bandeiras das conquistas de Abril, da Reforma Agrária e das nacionalizações, estilhaçará o pacto social de miséria e resistirá firmemente, as medidas antipopu-lares dos governantes.
É nas nossas mãos que está o futuro do País. Soares, Sá Carneiro, Freitas do Amaral, são homens provisórios. O povo, esse, é dono do futuro.
E se se caminhar para eleições gerais antecipadas, uma nova vitória estará ao alcance do povo: a direita será de novo derrotada, o fascismo será de novo esmagado e Deputados revolucionários serão eleitos por aqueles que trabalham, lutam e sofrem com a política de exploração e miséria dos governantes reaccionários.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta, igualmente para uma declaração de voto.
O Sr. Basílio Horta (CDS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Assembleia e com ela o País tiveram ocasião de presenciar nos últimos dias o funcionamento pleno das instituições democráticas naquilo que elas têm de mais decisivo: a permanência ou a queda de um Governo constitucional.
O regime e a democracia que o inspira estão de parabéns, pois longe parecem ir os tempos em que os Governos caíam e se constituíam por força de «golpes» que serviam apenas «avanços» ou «recuos» de forças totalitárias, avessas à liberdade e nostálgicas de passados ditatoriais ou ambiciosas de futuros totalitários.
Longe, com efeito, parecem ir os tempos em que governantes e Deputados eleitos democraticamente eram insultados, sequestrados e vilipendiados perante os olhos angustiados de todo um povo que soube reagir a tempo e confiar eleitoralmente nos que venceram os candidatos a novos ditadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por tudo isto que este debate se traduziu num sucesso na caminhada do povo português para o seu desenvolvimento pleno, que só será viável em liberdade e no total respeito das leis e das instituições.
Foi precisamente no uso pacífico dessa liberdade que o CDS, assumindo integralmente as suas respon-sabilidades, votou contra a moção de confiança posta nesta Assembleia pelo Governo.
Exigia-o, antes de mais, o interesse nacional que se não pode compadecer com a permanência de Governos que não podem servir o País, dada, nomea-damente, a exiguidade de sua fórmula política.
Justificava-o amplamente a ambiguidade, a indecisão e a incapacidade política do Partido Socialista, que tendo faltado a compromissos, perdido oportunidades e alienado alianças merecia aprender exemplar lição democrática.
Impunha-o finalmente o próprio sistema partidário, que se não podia compadecer com a manutenção da um Governo que por ser minoritário tinha de buscar na oposição o suporte político que o sufrágio eleitoral lhe havia negado.
Em suma, como disse o Deputado Freitas do Amaral: «...este Governo e, com de, a fórmula política em que se apoia esgotaram a sua capacidade de acção política. Nada de novo, com efeito, se pode esperar deles...»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma fase do nosso processo se encerrou. Outra mais importante se inicia.
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Sabemos agora, talvez melhor do que nunca, que o futuro não pode esperar por quem teima em sacrificar a teimosias passageiras reflectidas em condutas políticas superficiais.
Há que pensar seriamente em Portugal e nos Portugueses. Não se pode por mais tempo, sob pena de gravíssimos riscos que a História se encarregará de julgar, protelar as soluções que se impõem.
O CDS mantém-se disposto nesta nova e decisiva fase a encarar responsavelmente os caminhos que ainda se mantêm abertos e aqueles que forçosamente se terão de abrir no futuro próximo que se aproxima. Confiamos na capacidade do Sr. Presidente da República para resolver a actual crise política de acordo com os princípios que estiveram na base da sua eleição.
Temos esperança que o Partido Socialista, analisando a nova situação à luz dos ensinamentos agora colhidos, assuma as suas responsabilidades e encete um novo comportamento político mais consentâneo sem a confiança que uma importante parcela do povo português nele depositou.
Mas se ainda assim o impasse democrático se mantiver, então reunirá sempre, como último recurso, a convocação de eleições gerais antecipadas, já aqui o dissemos que não as desejamos, por sabermos os adiamentos e os sacrifícios que vão comportar. Mas não as tememos, por sentirmos que é crescente a confiança do eleitorado no nosso partido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com o 25 de Abril caiu um regime, caindo o Governo que o representava. Hoje caiu um Governo e com isso fortaleceu-se o regime.
Em Portugal um regime não é mais um governo. Essa a grande lição, - a profunda lição do debate aqui travado. Debate que, em nosso entender, teve momentos altos na profundidade das questões em confronto e na importância da publicidade dos argumentos contraditados, mas que igualmente sofreu com a agressividade pueril, com a palavra menos medida com a resposta menos temperada.
Grandezas e misérias de um Parlamento que para bem da democracia terá de ser sempre um palco onde o povo se revê.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Caiu o Primeiro Governo Constitucional.
Tenhamos esperança na rápida formação e no êxito político do segundo governo constitucional. O País não espera: para bem de Portugal, para a consolidação da democracia, para o futuro dós Portugueses, esse governo tem de ter êxito.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tenha a bondade.
O Sr. Magalhães Mota (PSD): - Sr. Pressente, Srs. Deputados: Quase no final da sua primeira intervenção, o Primeiro-Ministro distinguiu a moção de censura da moção de confiança, referindo a primeira ao passado e a última ao futuro. Censura-se o que se fez ou não fez; confia-se em relação ao tempo seguinte, sugeriu.
A verdade, diremos nós, é que censura e confiança têm a mesma ligação com o passado, o presente e o futuro. Passado, presente e futuro são as nações vivas.
A moção de censura avalia uma acção passada, mas essencialmente para evitar que essa acção prossiga no futuro. A moção de confiança, essa só a avalizam um passado e presente que garantam tempos melhores.
Não há, em democracia, a confiança pela confiança sem raízes, sem projecto, sem caminho aberto ou iniciado. Em democracia, ninguém é conduzido para o eseuro e pelo eseuro. Há mm projecto que se constrói Por todos. Em que cada caminho novo começa nos passos já dados.
É por isso que ao tentar discutir a moção de confiança apenas no plano de futuro, o Governo esqueceu que a confiança se alicerça em provas.
Quando se evita a clareza e a frontalidade por parte de quem - sem se guardar para o fim - aqui deveria ter vindo a demonstrar o que fez e o que não fez e, neste caso, o porquê de não ter feito, sem deixar culpas solteiras ou querer abrigar-se em responsabilidades de outros.
Ainda que houvesse - mas não há - desvarios alheios, fariam eles a justiça do Governo?
Quem da política não tem a concepção do vão da janela ou dos assíduos de camarilha real, não aceita o disfarce, nem a falsidade, - nem a conspiração sem grandeza, que é o mexerico. Os Portugueses, que vivem este momento, de nós exigem que os respeitemos, até na natural emoção de alguns. Exigem clareza, verdade, justiça e consciência. Não perceberam que, com impudor, se lhes tivesse escondido a crueza de uma crise que agora lhes pintam negra e próxima. Não admitem que se lhes tenham contado histórias de prosperidades, para os despertarem com a ameaça de não sei quantos caos.
Aqui estamos para dizer que há motivos de esperança. Que para um democrata, a democracia têm sempre soluções, e em democracia havemos de encontrá-las.
A verdade deste debate é que o Governo que, por intermédio desta Assembleia, pedia a confiança dos Portugueses não prestou contas. Sem vantagem em olhar para trás, também não nos apresentou frente para onde se pudesse olhar. Não só quis evitar se discutisse o seu passado e o sou presente. Quis também tornar nebuloso o tal futuro paira que pediu confiança.
Quando o Sr. Primeiro-Ministro anunciou aqui a breve e profunda remodelação do Governo que à eventual confiança se seguiria, foi o primeiro a negar-lhe essa confiança, pese embora a saudação final reconfortante. Este Governo não linha, ao menos desde anteontem e publicamente, a confiança do seu Primeiro-Ministro.
Não é sequer um problema interno, desde que aqui foi posto. Cada vez que um Ministro falou deixou-nos na dúvida de saber se era ou não um Ministro futuro a pedir-nos confiança, alguém a ser abrangido na profunda remodelação, ou quem, estilo actos finais, estivesse na derradeira prova a ver se ficava ou se saía.
O problema da confiança foi colocado por este Governo a favor de um governo futuro que se não sabe qual fosse, pretendendo fazer esquecer o que este fez e, especialmente, o que não fez e devia ter feito. Teríamos - nós e todos os portugueses para além daqueles que representamos - apreciado
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que ao pedir-se confiança para o futuro em nome de um qualquer futuro governo, nos fosse dito com que projecto e rumo, com que soluções. Dizer que com as de agora, é demasiado pobre, pois todos sabemos que as não há.
Ontem ficou no ar, sem ser sequer remetida para próximas entrevistas, uma pergunta: Tem o Governo, em negociações com o FMI, alternativa para essas negociações?
A última intervenção do Primeiro-Ministro constitui essencialmente confissão da inoportunidade da apresentação da moção agora e até que perante os riscos delineados, de numa menor ponderação perante o risco que a sua apresentação constituiria.
Por isso, se terá desvirtuado o sentido do debate. Talvez inconscientemente o Governo e o PS procuraram transformar ene debate na moção da nossa confiança, esquecidos de que era o Governo e só ele a estar em causa. Esquecidos de que ninguém por eles pediu a moção. Esquecidos de que ao mesmo tempo que nos acusam por os não termos antes sujeitado a uma moção de censura, não podem criticar-nos por em tempo por aos considerado como o mais inoportuno terem colocado a moção de confiança.
Tivéssemos, como outros, o gosto da interpretação , psicanalística e seriamos tentados a dizer que ao tornar-nos centro do debate o Governo e o PS se assumiram como oposição, mas nas reconheceram, implicitamente, como alternativa. Por isso não atacaram outros eu os atacaram menos. Procederam como se quisessem testar já a confiança que a nossa alternativa social-democrata possa merecer.
Haverá quem pense, futebolisticamente, que a melhor defesa é o ataque. Mas quando a defesa se preocupa em queimar tempo, lançando a bóia para fora, tentando a picardia, o insulto e provocando faltas, é natural que um povo que arbitra não deixe de assinalar o jogo baixo.
Não valerá a pena justificar longamente o nosso voto. O mérito de não ser surpresa é o valor de coerência. Votámos contra o Plano para 77; o tempo foi revelando que os nossos apoios eram apenas desejados em momentos de aflição. Queria-se a salvação do Governo; não a do País. Claro era que hoje teríamos que dizer não.
Caiu este Governo sem surpresa, mas não caiu a democracia. Estamos certos de que, ao menos nisso, não haverá em nós divergências.
Mas digamos também que não caiu - digamo-lo com a coragem de quem acredita nos homens e no futuro - o Partido Socialista, que, democratas que somos, respeitamos. Caíram incompetências e vaidades sem sentido. Caíram isolacionismos estéreis, arreganhos de fachada, triunfalismos sem senso. Terão caído as clientelas sustentadas, e por isso louvaminheiras, os especuladores políticos, os arregimentados. Mas isso é um beneficio para qualquer partido democrático. O andar de ganga inútil que são os oportunistas e os proteccionistas. O poder repensar que os interesses do País obrigam os partidos - todos - a nele acima de tudo pensarem. Ganhou-se essa oportunidade de podermos colaborar nessa tarefa nacional, sem questões fechadas nem diálogos de surdos.
E porque ganhou a democracia, teremos ganho todos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - Como é evidente, o Partido Socialista acatará, religiosamente, a determinação tomada por esta assembleia.
Congratula-se com o facto de os grupos parlamentares terem decidido em democracia, em plena Liberdade e sem coacção, conforme aqui, e justamente -, foi afirmado. Foi o Governo Constitucional que provocou lesta moção de confiança a fim de dar a todos os aqui presentes, mesmo aqueles que combateram a realização, no devido tempo, das eleições para a Assembleia Constituinte, a possibilidade de exercitarem os direitos que em certos momentos do passado eles próprios quiserem contrariar na sua efectivação.
Portanto, sem recriminações, e sem ressentimentos, nós congratulamo-nos com o exercício do direito da vossa parte.
A democracia, no entanto, é liberdade e é responsabilidade, e é também o direito ao erro. Nós dá nossa parte estamos convencidos que esta Assembleia cometeu um erro.
Seja como for, há um ponto que é preciso que fique perfeitamente claro. Num tom um tanto ou quanto funéreo da parte de todos os grupos parlamentares, não se viram sequer - as clássicas palmas em que certos grupos são sempre tão férteis, mesmo nas simples declarações de voto, as declarações de voto foram recheadas de declarações paternalistas em relação ao Partido Socialista. Nós dispensamos o vosso paternalismo, porque uma das regras da democracia é que cada partido se rege por si próprio.
Aplausos do PS.
Não há que criar alarme porque a democracia e praticaria e exercitada. Não é este o movimento para responder nos devidos termos a cenas hipocrisias e a certas pretensas autoridades morais, que não têm a autoridade nem a moralidade necessária para nos darem a nós lições de moral.
Aplausos do PS.
A história que já nos julgou por muitos actos que praticámos está a julgar-nos também, neste momento, e continuará o seu julgamento em relação ao futuro. Simplesmente, o Partido Socialista sempre foi, numa frase que aqui foi; referida, o medianeiro da sociedade portuguesa entre grupos antagónicos, quase persecutórios uns em relação aos outros, e hoje, digamos que sem surpresa para nos, esses grupos coligaram-se para derrubar o Governo Socialista. Que se entendam, portanto, entre si para resolver o problema da crise que daqui resulta. A liberdade, e responsabilidade, todos nós praticamos a liberdade, nós assumimos a nossa responsabilidade, os outros grupos que assumam as suas próprias responsabilidades.
São esses os nossos votos.
Aplausos do PS, dos membros do Governo e de parte do público das galerias, com gritos de «PS. PS. PS».
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9 DE DEZEMBRO DE 1977 653
O Sr. Presidente: - Claro que eu estava ...
Numa das galerias continuam as manifestações, com gritos de «Soares amigo, o PS está contigo».
O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Guardas o favor de mandarem evacuar essa galaria imediatamente.
Seja quem for que ai estiver, eu não posso consentir como Presidente desta Assembleia, a imiscuição das galerias nos trabalhos da mesma. Portanto, os senhores façam o favor de serem disciplinados e serem correctos, que é a melhor forma de servir a democracia.
Aplausos do PS, PSD e CDS.
Srs. Deputados, como disse, vou agora mesmo redigir a comunicação ao Sr. Presidente da República acerca do resultado desta votação, isto de harmonia com a Constituição. Ela será entregue ainda hoje, embora seja dia feriado, mas entendo que o devo fazer hoje, já que o Sr. Presidente da República tem poucos dias disponíveis, pois, como sabem, vai partir na segunda-feira para uma viagem oficial à Alemanha Federal.
O Presidente desta Assembleia tem de afirmar que, fosse qual fosse o resultado desta votação, as palavras que vai pronunciar a seguir seriam as mesmas.
Efectivamente, fez-se democracia, votou-se livremente e a decisão será acatada. Estes são os princípios pelos quais nós, os antifascistas, nos batemos desde sempre: respeito pela liberdade, respeito pelos Órgãos de Soberania.
A política é feita, como todos nós sabemos, de altos e baixos, de contradições, de positivos e negativos. A política passa, os políticos passam, a Nação fica.
Ergo comovidamente o meu pensamento ao Portugal democrático que aos todos estamos a construir e dirijo aqui - uma saudação confiante à alta personalidade do Sr. Presidente da República.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, como é do vosso conhecimento, na sexta-feira não haverá sessão, reunindo só as comissões.
A nossa próxima sessão será na terça-feira, às 15 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: ratificação n.º 21/I, relatava ao Decreto-Lei n.º 427-B/77; votação final global da ratificação n.º 18/I, início da discussão da ratificação n.º 24/I e votação final global da ratificação n.º 19/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 344/77.
Está encerrada a sessão.
Eram 6 horas e 40 minutos.
Partido Socialista (PS)
Alfredo Fernando de Carvalho.
Amadeu da Silva Cruz.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Chaves Medeiros.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Pinheiro Silva.
António José Sanches Esteves
António Riço Calado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Benjamim Nunes Leitão de Carvalho.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Jorge Ramalho dos Santos Ferreira.
Carlos Manuel da Costa Moreira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Delmiro Manuel de Sousa Carreira.
Etelvina Lopes de Almeida.
Fernando Abel Simões.
Fernando Luís de Almeida Torres Marinho.
Florival da Silva Nobre.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco de Assis de Mendonça Limo Neto.
Francisco do Patrocínio Martins.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Jaime José Matos da Gama.
João Francisco Ludovico da Costa.
João Joaquim Gomes.
João José de Carvalho Taveira Pinto.
João Soares Louro.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
José Ferreira Dionísio.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Medeiros Ferreira.
José Maria Parente Mendes Godinho.
José dos Santos Francisco Vidal.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís José Godinho Cid.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.
Manuel Barroso Proença.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Teresa Vieira Bastos Ramos Ambrósio.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Paulo do Vale Valadares.
Sérgio Augusto Nunes Simões.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Victor Manuel Ribeiro Fernandes de Almeida.
Partido Social-Democrático (PSD)
Anatólio Manuel dos Santos Vasconcelos.
Antídio das Neves Costa.
António Augusto Gonçalves.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Luciano Pacheco de Sousa Franco.
Arcanjo Nunes Luís.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Eduardo José Vieira.
Fernando José da Costa.
Henrique Manuel de Pontes Leça.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
João Vasco Paiva.
Jorge de Figueiredo Dias.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Almeida de Oliveira Baptista.
José Bento Gonçalves.
José Ferreira Júnior.
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654 I SÉRIE - NÚMERO 18
José Gonçalves Sapinho.
José Joaquim Lima Monteiro Andrade.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Manuel Ribeiro Sérvulo Correia.
José Rui Sousa Fernandes.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Manuel Sérgio Vila Lobos de Menezes.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Nicolau Gregório de Freitas.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Centro Democrático Social (CDS)
Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Alcino Cardoso.
Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
António Jacinto Martins Canaverde.
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Drogo Pinto dei Freitas do Amaral.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel Farromba Vilela.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.
Henrique José Cardoso Menezes Pereira de Morais.
João Lopes Porto.
João da Silva Mendes.
José Cunha Simões.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
José Luís Rebocho de Albuquerque Christo.
José Manuel Cabral Fernandes.
José Manuel Macedo Pereira.
José Vicente de Jesus de Carvalho Cardoso.
Luís Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Luís Esteves Ramires.
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Narana Sinai Coissoró.
Nuno Kruz Abecassis.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Vítor António Augusto Nunes de Sá Machado.
Walter Francisco Burmester Cudell.
Partido Comunista Português (PCP)
Carlos Alfredo de Brito.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Paiva Jara.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
União Democrática Popular (UDP)
Acácio Manuel de Frias Barreiros,
Independentes
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS)
Fernando Tavares Loureiro.
Partido Social-Democrático (PSD)
Victor Hugo Mendes dos Santos.
Independentes
Carlos Galvão de Melo.
O CHEFE-ADJUNTO DOS SERVIÇOS DE REDACÇÃO, Januário Pinto.
PREÇO DESTE NUMERO 53$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA