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I Série - Número 36

Quinta-feira, 9 de Fevereiro de 1978

DIÁRIO Da Assembleia da República

I LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 FEVEREIRO DE 1978

Presidente: Exmo. Sr. Vasco da Gama Fernandes
Secretários: Exmos. Srs. Alberto Augusto Martins da Silve Andrade
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão aí 10 horas e 35 minutos.
Depois da comunicação da Mesa de que o CDS retirara o projecto de lei n.º 19/I, referente ao Conselho de Informação da ANOP, e bem assim o pedido de ratificação n.º 1311, iniciou-se o debate sobre o programa do II Governo Constitucional.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Octávio Pato (PCP), Magalhães Mota (PSD), Acácio Barreiros (UDP), Freitas do Amaral (CDS). Segado Zenha (PS). António Rebelo de Sou:>a (PSD) e Carlos Carvalhas (PCP) e o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (António Arnaut).
Em pedidos de esclarecimento, protestos, contraprotestos ou explicações à Câmara relativamente a algumas intervenções usaram da palavra, além do Sr. Ministro do Comércio e Turismo (Basílio Horta), os Srs. Deputados António Guterres (PS), Oliveira Dias (CDS), Carlos Robalo (CDS), Narana Coissoró (CDS), José Luis Nunes (PS). Amaro da Costa (CDS), Carlos Brito (PCP), Jorge Leite (PCP), Veiga de Oliveira (PCP), Alda Nogueira (PCP), Macedo Pereira (CDS), Zita Seabra (PCP), Manuel Gomes (PCP), José Jara (PCP), Antídio Coita (PSD), Sérvulo Correia (PSD) e Maria Emília de Melo (PS), aos quais responderam os respectivos oradores.
Entretanto o Sr. Deputado Veiga de Oliveira (PCP) leu um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos referente à substituição de alguns deputados do PS e do CDS.
No decorrer da sessão procedeu-se também à eleição dos dois lugares de vice-presidente vagos, tendo sido eleitos os Srs. Deputados Tifo de Morais (PS) e Martins Canaverde (CDS).
O Sr. Deputado Sérvulo Correia (PSD), em nome do grupo parlamentar do seu partido, apresentou uma moção de rejeição do Programa do Governo e um requerimento no sentido de que a mesma fosse objecto de votação nominal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e S minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho Martins do Vale.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Álvaro Monteiro.
Amadeu da Silva Cruz.
António Barros dos Santos.
António Cândido Macedo.
António Chaves Medeiros.
António Fernandes da Fonseca.
António José Pinheiro da Silva.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando F. C. Pereira Bacelar.
Armando idas Santos Lopes.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Benjamim Nunes Leitão de Carvalho.
Bento Elísio de Azevedo.
Cari os Cardoso Lage.
Carlos J. Luís Cordeiro.
Dieter Dellinger.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Emídio Rui Vilar.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Fernando Reis Luis.

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Fernando Tavares Loureiro.
Florival da Silva Nobre.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco António Marcos Barracosa.
Francisco de Assis de Mendonça Lino Neto.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marçal Monteiro Curto.
Francisco do Patrocínio Martins.
Herculano Rodrigues Pireis.
Jaime José Mateus da Gama.
João Francisco Ludovico da Costa.
João Soares Louro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
José Ferreira Dionísio.
José Luís do Amaral Nunes.
José Maximiano Albuquerque de Almeida Leitão.
Luís José Godinho Cid.
Manuel do Carmo Mondes.
Manuel Joaquim Paiva Peneira Pires.
Manuel Lencastre Menezes de Sousa Figueiredo.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Tito de Morais.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Teresa Madeira Vidigal.
Mário Manuel Cal Brandão.
Pedro Santos Coelha
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Sérgio Augusto Numes Simões.
Telmo Ferreira Neto.
Vasco da Gaitam Lopes Fernandes.

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Amândio Anes de Azevedo.
Amantino Marques Pereira de Lemos.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Américo de Sequeira.
Anatólio Manuel dos Santos Vasconcelos.
António Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Júlio Simões de Aguiar.
Arcanjo Nunes Luis.
Armando António Correia,
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Fernando Adriano Pinto.
Francisco Barbosa da Costa.
Francisco Braga Barroso.
Henrique Manuel de Pontes Leça.
João António Martelo de Oliveira.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
João Lúcio Cacela Leitão.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.
José Alberto Ribeiro.
José Aduano Gago Vitorino.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Gonçalves Sapinho.
José Joaquim Lima Monteiro Andrade.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Manuel Ribeiro Sérvulo Correia.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Júlio Maria Alves da Silva.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Manuel Henrique Pires Fontoura.
Manuel Sérgio Vila Lobos Menezes.
Manuel Valentim Pereira Muar.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Nicolau Gregório de Preditas.
Nuno Gil Pires.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Victor Hugo Mendes dos Santos.

Centro Democrática Social (CDS)

Abel Fernando Coelho Santiago.
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Ângelo Alberto Rivas da Silva Vieira.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Carlos Martins Robalo.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.
João Carlos Filomeno Malhó da Fonseca.
João José Magalhães Ferreira Pulido de Almeida.
José Cunha Simões.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
José Vicente de Jesus de Carvalho Cardoso.
Luís Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Luís Esteves Ramires.
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Maria José Paulo Sampaio.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Mendes Tavares.
Vítor Afonso Pinto da Cruz.
Walter Francisco Burmester Cudell.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Matos Zuzarte.
António Marques Pedrosa.
Cândido de Matos Gago.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Hahnemann Saavedra de Aboim Inglês.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Joaquim S. Rocha Felgueiras.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Gomes.
Manuel Gonçalves.
Manuel Peneira Franco.
Maria Alda Barbosa Nogueira.

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Nicolau de Ascenção Madeira Dias Ferreira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Raúl Luís Rodrigues.
Severiano Pedro Falcão.
Victor Henrique Louro de Sá.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

União Democrática Popular (UDP)

Acácio Manuel de Frias Barreiros.

Independentes

António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Galvão de Melo.
José Justiniano Taboada Brás Pinto.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 162 Srs. Deputados.
Temos quórum.

Está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Comunico à Assembleia que o CDS deliberou retirar o projecto de lei n. º 19/I, referente ao Concelho de Informação da Anop, o mesmo sucedendo com o pedido de ratificação n.º 13/I.
Vamos iniciar o debate sobre o Programa do Governo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Pato.

O Sr. Octávio Fato (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Ministros: A composição política e o programa do novo Governo que se apresenta à Assembleia da República e ao País depois de 16 meses de Governo do Partido Socialista, aliado de facto à direita, e depois de 2 meses de crise governamental, revelam claramente que as lições da vida e da experiência foram desprezadas, que as aspirações dos trabalhadores não foram enfrentadas, que não houve a coragem de corrigir esses erros e não houve o empenho de optar pela política que a gravidade dos problemas nacionais reclama.
O Governo de coligação PS-CDS ainda não tinha enfrentado o juízo soberano desta Assembleia e já se tinha defrontado com uma significativa indignação dos trabalhadores e de muitos amplos sectores democráticos. A composição e programa do Governo encontrou um ambiente geral de frieza e falta de entusiasmo, até mesmo entre aqueles que seria de esperar serem os seus defensores e propagandistas - uma larga inquietação e amargura - manifestamente nas fileiras do Partido Socialista. Esta a imagem indiscutível de um governo que nasce divorciado dos interesses, objectivos e aspirações que percorrem hoje a sociedade portuguesa, a de um governo que promete ao País uma orientação dezenas de vezes proclamada e dezenas de vezes fracassada, a de um governo rotineiro e sem imaginação, e por isso mesmo incapaz de transmitir ao País o entusiasmo e a confiança necessários para o sucesso das novas tarefas colectivas.
Ao longo de 1976 e 1977 foi-se ampliando incessantemente na vida nacional a consciência de que a recuperação capitalista, agrária e imperialista, longe de trazer a prometida solução dos gravíssimos problemas nacionais, era um factor do seu agravamento, uma fonte de novas dificuldades, perigos e perturbações. A experiência mostrou que a recuperação capitalista e agrária era, tão só e apenas, a recuperação violenta e brutal de posições por parte dos capitalistas e agrários, a intensificação da exploração como principal objectivo da produção, o agravamento das distorções, a desorganização do aparelho produtivo e a quebra de produção, o desemprego e a redução brutal do nível de vida, tanto dos trabalhadores como de todas as camadas laboriosas.

A Sr.ª Hermenegilda Pereira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E por isso se tornou cada vez mais ampla e mais forte a aspiração nacional de ver concretizada uma política de recuperação económica visando a reanimação geral das actividades produtivas, o aumento da produção nacional e da produtividade, a expansão económica numa perspectiva de desenvolvimento ao serviço do Povo e do País, e na convicção de que a saída da crise passa pelo respeito das grandes transformações democráticas erguidas pela revolução portuguesa ...

Aplausos do PCP.

... as nacionalizações, a reforma agrária, o contrôle de gestão e exige que os limites, entre as diversas formações, económicas (sector nacionalizado, sector cooperativo, unidades da zona da reforma agrária, sector privado) sejam mantidos.
No dia 6 deste mês, realizou-se uma reunião plenária do Comité Central do Partido Comunista Português, a fim de examinar a situação criada pela formação do Governo de coligação PS-CDS e pela apresentação do Programa. Dessa análise conclui-se, entre outros aspectos, que «o Programa faz apenas ligeira referência aos sectores não capitalistas criados na economia portuguesa. Não dá garantia formal do respeito pelos limites actuais das formações económicas. Quase ignora a Reforma Agrária. Aponta esquemas que põem em causa os sectores e empresas nacionalizadas (criação de sociedades de investimento e de desenvolvimento regional, reprivatizações, etc.). Consagra apenas, uma página ao sector de propriedade social. Abandonando o Programa do Partido Socialista e anunciando a revisão do anterior Plano a médio prazo, toma o Programa do CDS o primado do sector capitalista, a cujos interesses fica submetido o sector público. O Programa visa manifestamente a restauração do poder do grande capital sobre a economia nacional e sobre o aparelho do Estado».

A Sr.ª Hermenegilda Pereira (PCP): -Multo bem!

O Orador: - O Programa do Governo anuncia o prosseguimento da imoral e escandalosa entrega ao patronato sabotador de empresas intervencionadas - onde os trabalhadores investiram milhares de horas

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de trabalho gratuito, meses e meses sem salários, Sacrifícios e esforços sem conta, numa exaltante dedicação aos interesses da economia nacional.
Ao longo de 1976 e de 1977, foi-se fortalecendo a consciência nacional de que sem os trabalhadores, sem o seu empenho criador, sem ter em conta o respeito pelos seus direitos e aspirações, não seria passível garantir a saída da crise económica e financeira em que o País se debate.
Contra esta evidência, o novo Governo anuncia o prosseguimento da ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, da política de agravamento das suas condições de vida, da intensificação dos despedimentos, da tolerância perante as violências, represálias e perseguições patronais, e com tal orientação mostra que não é a confiança dos trabalhadores que pretende mobilizar, mas sim as boas graças do grande capital e do imperialismo que pretende conquistar.

Aplausos do PCP.

Ao longo de 1976 e 1977, foi-se ampliando a consciência da necessidade de um grande esforço nacional voltado para o aumento da produção nacional, para a plena utilização dos recursos e capacidades do País, como condição essencial da diminuição do deficit da balança de pagamentos e como caminho indispensável para subtrair o País ao abismo da dependência externa.
Contra este sentimento generalizado, o novo Governo vem anunciar o prosseguimento de uma política subserviente perante as exigências dos credores internacionais e descrente das possibilidades e energia nacionais. Quando o problema crucial do País é aumentar a produção nacional e reduzir importações, o novo Governo aceita os limites impostos pelo Fundo Monetário Internacional para a expansão económica e exibe uma atitude- fatalista perante o volume actual das importações. Não apresenta as medidas necessárias e corajosas de um plano de substituição de artigos importados por produção nacional. Longe de apontar para uma dinamização geral da actividade produtiva que corresponda aos interesses dos trabalhadores e dos pequenos e médios industriais e comerciantes, propõe que o País mergulhe no ciclo infernal e catastrófico da quebra do poder de compra dos trabalhadores, redução do mercado interno, quebra da produção, elevação das taxas de juros, falências, desemprego, depressão económica geral, agravada da dependência de empréstimos externos.

Uma voz do PS: - São uns malandros!

Risos.

O Orador: - O novo Governo, era vez de apontar o caminho do trabalho e do esforço nacional, vem outra vez alimentar ilusões, distrair esforços, com a miragem da integração de Portugal na Europa do capitalismo monopolista do Estado.
Na passada quinta-feira, a coligação PS-CDS inventou um novo inimigo e quis pôr a circular o fantasma de um nacionalismo de carácter estreito e isolacionista. A leitura do Programa do Governo mostra bem que o que incomoda e perturba a coligação PS-CDS é o enraizado sentimento patriótico das massas populares e das forças democráticas de que é preciso defender a dignidade e a independência nacional, o sentimento de que é preciso assegurar, em todas as circunstâncias, que sobre os destinos de Portugal sejam os portugueses a decidir.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Programa do novo Governo, na política que propõe, nas concepções que defende, nas formulações que usa, na filosofia que o inspira, dá bem uma ideia da extensão das cedências do Partido Socialista ao seu parceiro da coligação, dá bem a ideia de quanto o Programa do Partido Socialista foi sacrificado em favor do programa do CDS.
O Programa do novo Governo propõe a milhares e milhares de socialistas que abdiquem dos seus mais genuínos ideais.
No Programa do novo Governo, inspirado no Programa do CDS, não falta sequer a velha visão corporativa do processo social em que, à moda do Estatuto do Trabalho Nacional, as empresas são definidas como «uma comunidade de interesses» e o País como devendo ser uma grande e unida família em que os explorados confraternizariam alegremente com os exploradores, os humilhados seriam solidários com os que os humilham.
O Programa rato ma as velhas concepções vindas do tempo do fascismo acerca da expansão da produção nacional na base da exportação, o que servia e servirá novamente para acentuar a dependência em relação às multinacionais e aos mercados imperialistas.
O Programa da coligação com o CDS, revela o propósito de pôr a Constituição na prateleira, esvaziando-se do conteúdo e subvertendo gradualmente a organização do sistema económico que ela consagra, debilitando progressivamente as conquistas que são a base indispensável à realização do projecto de sociedade que a Constituição incorpora.
O País tem vindo a assistir ao espectáculo deprimente de ver os dirigentes de um partido democrático para justificar a sua aliança com o partido da extrema-direita parlamentar desdobrar em afirmações contraditórias e opostas ao que sempre afirmaram.
Não é apenas a política de alianças do Partido Socialista que mudou na direcção da direita. Mais do que isso, são verdadeiras acrobacias verbais que hoje transformam caceteiros em honestos democratas, votantes contra a Constituição em garantes do seu cumprimento, um partido da direita em partido do centro.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os dirigentes do Partido Socialista podem continuar a campanha em que estão empenhados para reabilitar a imagem do CDS, podem passar a chamar-lhes todos os dias pela alcunha de «democratas-cristãos» ...

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - O Sr. Deputado entrou na asneira!

... mas podem estar certos de que, com isso, apenas se distanciarão mais e mais do Partido Socialista e

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deste Governo, aquelas centenas de milhar de democratas e de cristãos, que exactamente porque o são, partilham de elevados ideais democráticos, de justiça e progresso social, de uma vida melhor, que sabem ser ameaçados pelo CDS.

Aplausos do PCP.

Os dirigentes do Partido Socialista procuram insistentemente apresentar a sua coligação com o CDS como inevitável e como forma de salvar a democracia.
Mas hoje, vendo a composição do Governo e o seu Programa, está completamento claro que «e o Partido Socialista se alou com a direita foi porque não se quis entender com a esquerda, e se não se quis entender com a esquerda foi porque quis manter a mesma política, agravando-a com a coligação com o CDS.

Aplausos do PCP.

Para justificar tal coligação, são atiradas para o ar ambíguas referências à eventualidade de não se poder chegar a eleições gerais antecipadas, é referida expressamente a possibilidade de aventuras antidemocráticas, é traçado o quadro catastrófico de um país à beira de confrontações baseadas em violentos antagonismos sociais e regionais, é atribuída à direita uma força social que ela não tem.

O Sr. Aboim Inglez (PCP): -Muito bem!

O Orador: - O Dr. Mário Soares, enquanto cidadão ou Secretário-Geral do seu Partido é livre de emitir as opiniões que entenda, mas é inadmissível que o Primeiro-Ministro do Governo da República dê ao Estado democrático português a imagem de uma sociedade coagida por obseuros conspiradores reaccionários.

Aplausos do PCP.

Pela nossa parte queremos aqui reafirmar que o dever dos democratas não é exagerarem a força da direita, é trabalhar para a reduzir; que o dever dos democratas não é invocar forças obscuras que se oporiam a soluções democráticas mas sim mobilizar a consciência democrática dos portugueses para as isolar e derrotar.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP):- Muito bem!

O Orador: - A intriga, as manobras e a conspiração reaccionária podem ser vencidas pelo recurso ao entendimento e acção comum das forças progressistas, dos trabalhadores e dos democratas e nunca com cedências sucessivas à direita.
Fazendo uma coligação com o CDS, abrindo à sua influência sete Ministérios, um dos quais -o da Reforma Administrativa - com ligações tentaculares aos outros Ministérios, ao sector público e ao aparelho de Estado o Partido Socialista assume a pesadíssima e histórica responsabilidade de abrir as portas da fortaleza democrática ao Cavalo de Tróia da extrema-direita parlamentar e de, com isso, estimular a arrogância das posições reaccionárias em toda a vida nacional, acentuando perigos e ameaças para o regime democrático.

Aplausos do PCP.

Coligando-se com o CDS, o Partido Socialista expõe-se a renovadas pressões da direita, que deposita no enfraquecimento, na desagregação e desprestígio do Partido Socialista, muitas das suas esperanças de vir um dia a dominar os órgãos de poder sem necessidade de se aliar ao Partido Socialista.
Coligando-se com o CDS, o Partido Socialista aceitou e criou uma situação que, em três eleições sucessivas, o Povo Português rejeitou, ao reduzir a cinzas as fanfarronadas eleitorais da direita e ao dar sempre uma folgada maioria a socialistas e comunistas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - 7,5 % foi o que tu tiveste!

O Orador: - A vida continuará a demonstrar que o caminho da democracia portuguesa só pode ser o caminho inspirado pelos altos valores de solidariedade da resistência antifascista, pelos elevados ideais do 25 de Abri, pela intervenção dinâmica e generosa dos trabalhadores na vida da Pátria e nunca um caminho inspirado na desconfiança e nos ressentimentos contra o 25 de Abril e no desprezo pelos trabalhadores.
No Programa do Governo e na própria intervenção do Primeiro-Ministro aqui produzida, a dureza, a violência, insensatez e cegueira da política de recuperação capitalista aparecem envolvidas na cortina de fumo da acalmia política, da paz social, do realismo e do bom senso, da solidariedade nacional.
Mas o que o novo Governo pede não é acalmia política. Pede sim ao Partido Comunista Português, aos democratas, aos próprios militantes do Partido Socialista, a todos os que protestam e se indignam contra esta orientação, que quebrem os seus compromissos com o povo trabalhador, colaborem na política de recuperação capitalista, de agravamento dos problemas nacionais e de liquidação da independência nacional.
O novo Governo não pede paz social. Propõe sim a rendição e a capitulação do movimento operário perante uma política hostil às aspirações dos trabalhadores, voltada para o agravamento das suas condições de vida; propõe a resignação geral perante o aumento do custo de vida, os despedimentos, o desemprego, as violências e arbitrariedades.
O novo Governo não promete realismo e bom senso. Mostra sim o máximo irrealismo ao afirmar pretender defender a democracia ao lado dos seus inimigos, ao pretender sair da crise económica dando força aos mais interessados no seu agravamento, ao impor leis e medidas que vão contra as novas realidades do Portugal democrático.
O novo Governo não propõe solidariedade nacional. Pretende sim que todas as camadas laboriosas, -os trabalhadores, os empregados, os camponeses, pequenos e médios comerciantes e industriais- se submetam aos interesses egoístas e parasitários de um grupo reduzido de grandes capitalistas e agrários. Pretende sim que os objectivos e interesses nacionais se submetam às decisões, pressões e exigências do imperialismo.
No Portugal democrático de hoje, a estabilidade política, económica e social, um clima de solidariedade democrática & nacional são certamente possíveis,

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mas na base do respeito da Constituição, das conquistas da Revolução, dos direitos dos trabalhadores, com o objectivo da recuperação económica, ao serviço do povo e do País, e em torno de uma política democrática correspondente aos interesses de Portugal como País livre e independente.

Aplausos do PCP.

Os perigos e dificuldades que o novo Governo anuncia, mais e mais determinam o Partido Comunista Português a prosseguir com entusiasmo e confiança a luta em defesa do regime democrático, das conquistas da Revolução e da independência nacional.
Na Assembleia da República, os Deputados comunistas continuarão infatigavelmente a trabalhar para que sejam aprovadas leis progressistas que sejam fiéis à Constituição da República e correspondam aos interesses dos trabalhadores e do Povo português.
Advertindo que o novo Governo não tem condições, pela sua composição e política, para dar resposta aos problemas centrais da vida nacional, o Partido Comunista Português não deixará, no entanto, de considerar positivamente eventuais decisões e medidas que se mostrem favoráveis aos interesses populares e nacionais.
Em todos os planos da vida nacional, em todos os locais onde se travam as grandes batalhas diárias em defesa da liberdade, do progresso e da recuperação económica do País, o PCP prosseguirá a sua intervenção construtiva e responsável para que, com todos os democratas, se erga na nossa Pátria e vida melhor, mais próspera e feliz a que os Portugueses têm direito.
O Partido Comunista Português, na sua intervenção na vida nacional, exercerá firmemente as liberdades e direitos consagrados na Constituição, combaterá todas as tentativas de as restringir ou mutilar, respeitará sempre a legalidade democrática e exigirá que outros a respeitem também e devotará todas as suas energias e reforços para que se mantenha e consolide no País uma intensa vida democrática que assegure que a opinião e a vontade dos Portugueses é tida em conta na solução dos problemas nacionais.
Sr. Presidente: O novo Governo, pela sua composição e Programa, longe de ter atenuada a necessidade de uma alternativa democrática, mais a confirma.
A realidade portuguesa e a vontade do Povo português, a gravidade dos problemas nacional e a urgência de lhes dar solução, a imperiosa necessidade de corresponder às aspirações populares, acabarão por tornar inadiável uma nova política baseada no respeito pela Constituição e pelas instituições, no respeito pelas liberdades e pelas outras conquistas da Revolução, na saída da crise através de um grande esforço nacional que mobilize o trabalho, a inteligência e o patriotismo dos Portugueses, e a formação de um Governo com uma composição adequada à realização desta política democrática e patriótica.

Aplausos do PCP.

A vida continuará a mostrar que uma alternativa democrática é possível com os trabalhadores e não contra os trabalhadores, é possível, não contra o Partido Comunista Português, mas com a capacidade, o dinamismo e a intervenção generosa que são timbre do Partido Comunista Português.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente: No passado dia 2, o Sr. Primeiro-Ministro prestou daqui uma «homenagem especial ao CDS», a juntar a anteriores elogios feitos ao Presidente deste mesmo Partido. Lembrar-se-á o Sr. Primeiro-Ministro, que numa data próxima do 25 de Abril, o ditador de então, Prof. Marcelo Caetano, também prestou uma homenagem ao que é agora presidente do CDS, escrevendo, entre outras coisas, o que passo a citar: «... consola-me sobretudo a ideia de que outros continuarão o labor a que me dediquei durante tantos anos com entusiasmo e vontade de bem servir. E de entre esses contiuadores, permitir-se-á que destaque o Doutor Diogo Freitas do Amaral», «... pela admiração que me merece ...», tendo Marcelo Caetano terminado a sua dedicatória, manifestando ao actual Presidente do CDS o desejo de que «o futuro lhe seja propício como merece».

Risos do PCP.

Quererá o Partido Socialista servir de escadote para que se realizem os votos expressos pelo continuador de Salazar?
Como representantes do Partido Comunista Português, também consideramos oportuno prestarmos hoje aqui uma tripla e sentida homenagem, mas de sentido contrário. Em primeiro lugar, homenagear os mortos do Tarrafal ...

Aplausos do PCP.

...símbolos da resistência antifascista cujos restos mortais irão em breve ser transladados para o solo da nossa capital -, e com eles homenagear todas as vítimas do terrorismo fascista, e os milhões de portugueses que durante quase meio século sofreram as agruras da ditadura do poder dos monopólios e latifundiários, aliados ao imperialismo. Em segundo lugar, homenagear os capitães de Abril e todos os patriotas que ajudaram a derrubar a ditadura fascista, a acabar com as guerras coloniais e a implantar as liberdades democráticas...

Aplausos do PCP.

...em terceiro lugar, homenagear todos os trabalhadores, os democratas e portugueses de variadas camadas sociais ou tendências políticas, que lutaram para destruir o poder dos monopólios e dos latifundiários, que promoveram as nacionalizações, a Reforma Agrária, o controlo de gestão, homenagear todos os que contribuíram, directa ou indirectamente, paira elaborar e fazer aprovar a democrática e progressista Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do PCP.

A homenagem que aqui prestamos a esses milhões de portugueses, é também como que um caloroso apelo no sentido de todos compreenderem que um Governo de coligação com o CDS é um passo na

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direcção do passado, dum passado que não deve voltar.
Aos muitos milhares de democratas, incluindo muitos socialistas, que estão confundidos, frustrados ou indignados, a todos dizemos que as forças democráticas e patrióticas são bastante mais fortes que as forcas da reacção. Há razões para confiar na luta que continua, e que deve congregar e unir todos os Portugueses que amam a democracia, o progresso social e a independência nacional, todos os que defendem a Constituição e as grandes conquistas nela consagradas, todos os que aspiram a ver caminhar o País no rumo do socialismo traçado na Constituição.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres, para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Octávio Pato, como o Sr. Deputado certamente não ignora realizaram-se intensas negociações entre os partidos políticos representados nesta Assembleia e, nomeadamente, entre o Partido Comunista Português e o Partido Socialista no período que antecedeu a formação do II Governo Constitucional. O Partido Comunista tem afirmado, repetidamente, que considera adquirido tudo quanto foi acordado no decorrer dessas negociações com o Partido Socialista, mesmo se elas não levarem a um acordo total. E já aqui foi afirmado que o PCP espera que o Partido Socialista seja fiel aos pontos que defendeu no interior dessas negociações e em relação aos quais chegou a acordo com o Partido Comunista.
Eu queria perguntar ao Sr. Deputado então qual o significado político da forma clara, precisa, inequívoca, com que o Sr. Deputado acaba de fazer uma negação frontal de tudo quanto tinha sido acordado entre os dois partidos no decorrer desse período de negociações e em particular no que se refere ao programa de estabilização para 1978.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Pato quererá responder no fim?

O Sr. Octávio Paio (PCP):- Sim, Sr. Presidente, responderei no fim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias para pedidos de esclarecimento.

O Sr. Oliveira Dias (CDS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros: Eu desejava fazer algumas perguntas ao Sr. Deputado Octávio Pato e, em primeiro lugar, não deixando de manifestar desde já também o meu protesto, eu queria perguntar-lhe em que texto e a que é que se referia o Prof. Marcelo Caetano quando elogiava o Prof. Freitas do Amaral nos termos em que V. Ex.ª o citou.

Ritos do PCP.

E queria perguntar a V. Ex.ª, nomeadamente, se isso dizia respeito à actividade política ou à actividade profissional.

Risos do PCP.

Queria ainda perguntar ao Sr. Deputado Octávio Pato se, no seu partido e entre os Deputados do seu partido, não figuram personalidades que tenham merecido louvores pela sua actividade profissional antes do 25 de Abril.
Queria também perguntar ao Sr. Deputado se, quando se referiu ao facto de que muitos trabalhadores se viram na contingência de, em empresas intervencionadas ou nacionalizadas, terem tido que passar numerosos meses sem receber qualquer salário, acha bem ou mal que isso tenha acontecido e a que é que se deve esse tacto, a nosso ver deplorável.
Queria perguntar-lhe ainda, Sr. Deputado Octávio Pato, tendo V. Ex.ª dito que o Programa do Governo deve apontar para a reanimação económica e para a expansão da produção, se considera isso incompatível com uma política de aumento das exportações e porquê.
Queria igualmente perguntar-lhe, quando fez referência à vinculação de Portugal à Europa do capitalismo monopolista de Estado, a que Europa se refere: se é à Europa Ocidental ou à parte da Europa em que efectivamente o Estado tem o monopólio da actividade produtiva e da actividade económica.
E, finalmente, mais duas perguntas. Quando o Sr. Deputado se referiu à criação do Ministério da Reforma Administrativa, o Sr. Deputado ficou efectivamente surpreendido pelo facto de a reforma administrativa ter que ver com todos os ministérios. Pergunto-lhe que conceito de reforma administrativa é o seu e se o seu conceito de reforma administrativa se refere a um só ministério ou a alguma parcela menor ainda do serviço público.
O Sr. Deputado afirmou que o CDS era democrata-cristão por alcunha. Eu pergunto se tem V. Ex.ª legitimidade para qualificar de democrata-cristão qualquer partido, de onde lhe vem essa legitimidade, ou se pelo contrário carece inteiramente d« autoridade para qualificar um partido de democrata-cristão ou não...

Risos do Sr. Cavalheira Antunes (PCP).

... E se as entidades que legitimamente tem qualidade; e competência, internacionalmente reconhecida, para dizer se sim ou não um partido merece ser acolhido nas organizações internacionais democratas-cristãs reconhecerem ou não já essa qualidade ao CDS.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Vou repetir um pouco a última pergunta do meu colega de bancada Oliveira Dias, até porque a intervenção do Sr. Deputado Octávio Pato, pela repetição de intervenções já feitas nesta Câmara, pela repetição de slogans, pela repetição de ditos, acerca de um Programa do Governo, acerca de uma manifestação, acerca de qualquer coisa, me parece que o slogan é o mesmo.
Gostaria, pois, de lhe concretizar mais a segunda pergunta a referir-lhe o seguinte: além da legitimidade do uma certa má-fé, além da legitimidade de uma certa

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calúnia, além da legitimidade que utilizou da prática de um certo tipo de democracia, que outra legitimidade é que pode apresentar a esta Câmara para alcunhar um partido de democrata-cristão como o CDS que, pratica e defende a democracia-cristã e que, inclusivamente, é filiado na União Europeia das Democracias Cristãs?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Que falta de imaginação!

O Orador: - E devo dizer-lhe o seguinte: Não me atrevo, efectivamente, a utilizar as alcunhas que muitas vezes são utilizadas pelo seu partido, porque parto do princípio de que os partidos que estão representados nesta Câmara deviam merecer dos outros o mínimo de respeito e o mínimo de decoro dentro de uma linha democrática, o que, natural e normalmente, não é a prática da bancada do Partido Comunista Português.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não deixa de ser uma ironia da democracia portuguesa, uma originalidade do nosso processo revolucionário, que uma individualidade que recolheu apenas 7 % dos votos do eleitorado português venha aqui falar em nome de 92%.
Naturalmente que o Sr. Deputado Octávio Pato tem o direito de dizer aqui na Assembleia tudo quanto lhe vem à cabeça, mesmo que isso represente prova inequívoca de má-fé, de calúnia e de mentiras. Com certeza que o CDS não irá responder a todas as mentiras porque, como disse o Secretário-Geral do Partido Comunista aquando da discussão do Programa do I Governo Constitucional, se o nosso partido fosse perder tempo em rebater todas as mentiras do PCP, não tinha tempo para fazer mais nada. Portanto, as mentiras ficam com V. Ex.ª, com os vossos Deputados, e nós vamos trabalhar para a democracia e para o País.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar gostava de dizer o seguinte: com certeza que o Sr. Deputado Octávio Pato vai dizer a esta Assembleia, exactamente, a publicação e o local onde o Prof. Marcelo Caetano escreveu as palavras que aqui acabou de ler. Naturalmente que é uma prova de grossa má-fé vir aqui, diante desta Assembleia e das câmaras da televisão, repetir quatro linhas sem dizer o ano, a publicação e o teor da publicação em que tais palavras foram escritas. Mas, isto faz parte da técnica fascista que o Partido Comunista sempre usou e usará, porque é próprio dos fascistas, dos totalitaristas, confundir a política com a Universidade e a ciência e vice-versa. Os fascistas não fazem distinção entre política e ciência, consideram a Universidade como uma mera correia de transmissão do poder político...

O Sr. Aboim Inglês (PCP): - O Sr. Deputado lá sabe, lá sabe!

O Orador: - ...e por isso mesmo, quando o Sr. Octávio Pato aqui confunde a ciência e a Universidade com o Estado não faz mais do que seguir a verdadeira técnica antidemocrática de que o seu partido é um exemplo aqui em Portugal.
Depois de feito este protesto, queria-lhe perguntar uma coisa: em que parte do Programa do Governo, e principalmente no sector do trabalho, encontrou V. Ex.ª qualquer alusão, qualquer similitude, qualquer analogia, com a filosofia que informava o Estatuto do Trabalho Nacional?
Gostaria que, em vez de palavras vagas e teóricas que, naturalmente, não interessam a ninguém, V. Ex.ª dissesse a página do programa do Governo onde está isso escrito.

Vozes do CDS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS):- Sr. Presidente, eu usava da palavra para um protesto.
Referiu-se o Sr. Deputado Octávio Pato aos mortos do Tarrafal, aos resistentes antifascistas e à homenagem que lhes prestava. E como o Sr. Deputado Octávio Pato teve ocasião de verificar, não houve ninguém, para além do seu partido, que se erguesse a bater palmas ou a fazer qualquer espécie de saudação. A razão, Sr. Deputado, é muito simples: é que os mortos do Tarrafal e os homens de resistência antifascista morreram, não para aplicarem a vontade de um partido mas para instaurarem em Portugal uma democracia livre e pluralista como esta que estamos aqui a construir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E não podem, de forma nenhuma, ser ou servir de bandeira de um partido, até porque, se houve lá muitos comunistas, houve muitos socialistas e houve, sobretudo, muitos anarquistas, que os agora Srs. Deputados do Partido Comunista, consideravam, na época, de forma pejorativa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nentie sratidlo, não se misture em querelas partidárias aquilo que é o património nacional e aquilo que nós todos, que estamos representados nesta Assembleia, defendemos e consideramos. Os mortos do Tarrafal e os resistentes antifascistas pertencem à História, prestar-lhes-emos homenagem, mas agora, numa consabida frase, «mais do que homenagear os mortos trata-se de salvar os vivos». É este o Programa do II Governo Constitucional.

Aplausos do PS e de alguns Deputados do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Como mão há mais inscrições para pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Pato para responder.

O Sr. Octávio Pato (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apraz-me registar, coroo aliás não

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é surpresa, que é do lado da bancada do CDS que apareceram aqueles que maus sentiram as declarações que foram por mim feitas em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e, ao mesmo tempo, também verificar que neste momento parece ser o CDS o principal defensor do Programa do Governo que estamos a debater.

Aplausos do PCP

O Sr. Salgado Zenha (PS): -Olhe que não!

O Orador: - Começando pela primeira pergunta feita pelo Sr. Deputado Guterres, é um facto real que houve intensas negociações entre delegações do Partido Comunista Português e do Partido Socialista, houve um progresso significativo, conforme o meu Partido já teve ocasião de realçar. Progressos esses que, se se tivesse na verdade chegado a um acordo, teriam sido um factor importante para a unidade de acção e de pensamento entre comunistas e socialistas e entre muitos outros democratas, em defesa daquilo que nós consideramos que é, efectivamente, essencial, que é a luta em defesa da recuperação económica do País, em defesa da democracia, em defesa da Constituição e das conquistas que estão consagradas na Constituição.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Está a brincar connosco!

O Orador: - Mas da mesma forma que consideramos -e já foi dito no meu discurso- que não nos cabe a nós a responsabilidade por não termos chegado a acordo em questões que nós considerávamos de primacial importância, designadamente no campo das nacionalizações e no que respeita à Reforma Agrária, é evidente que, se o Partido Socialista tivesse chegado a acordo connosco nestes pontos, ter-se-ia dado um importante passo em defesa daquilo que deve ser comum a comunistas, a socialistas e a democratas que tem um pensamento comum e real de defender a democracia e de trabalhar para a recuperação económica do País.
Ora, se na verdade isso não foi possível, nós continuamos a pensar que essa responsabilidade não nos cabe a nós mas foi sim pelo facto real de que o Partido Socialista estava mais interessado num acordo com o CDS do que num acordo à esquerda, com o Partido Comunista Português.
Por outro lado, podemos dizer o seguinte: nós mantemo-nos fiéis a tudo aquilo que defendemos, continuamos fiéis a tudo aquilo que foi acordado nas negociações entre as delegações do Partido Comunista e do Partido Socialista, gostaríamos de verificar, na prática, se o Partido Socialista pensa da mesma forma e vai actuar da mesma forma. Mas uma coisa desde já podemos dizer: é que muito daquilo que foi acordado nas negociações entre os comunistas e os socialistas já está a ser contrariado pelo próprio Programa que aqui está a ser debatido, pelo Programa da coligação com o CDS.

Aplausos do PCP.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - O Sr. não falou nisso!
O Sr. Deputado não falou no Programa!

O Orador: - Creio que ao responder ao Sr. Deputado Oliveira Dias vou, ao mesmo tempo, responder mais a um dos outros Deputados que levantou uma questão análoga: é onde está o elogio feito pelo Prof. Marcelo Caetano ao Prof. Diogo Freitas do Amaral, e se isso está ligado a qualquer actividade política. Todos sabem certamente - especialmente os Deputados do CDS - que isto faz parte de uma nota introdutória do Prof. Marcelo Caetano ao seu Manual de Direito Administrativo.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Isso não deslustra ninguém, antes pelo contrário.

O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Foi preciso tirar a saca-rolhas!

O Sr. Amaro- da Costa (CDS): - Não elogiou também o Miguel Galvão Teles?

Vozes do CDS: - Isso está ligado à política?

O Orador: - Essa questão de se dizer se isto está ou não ligado à actividade política, isso é mais que contestável...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ah é?!

O Orador:- ... porque poder-se-á perguntar: então quando o Prof. Marcelo Caetano, quando o Sr. Prof. Silva Cunha e muitos outros professores declaradamente fascistas ...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E o Miguel Galvão Telles?

O Orador: - ...estavam à frente das universidades mas ao mesmo tempo à frente dos grandes monopólios da vida portuguesa, isso não tinha nada a ver com a actividade económica e política do País?

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Não foi isso que eu lhe perguntei.

O Orador: - Perdão, quero dizer se isto tem ou não alguma relação com a actividade política. Creio que foi gosta essa questão.

Protestos do CDS e contraprotestos do PCP.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): -Eu perguntei-lhe se no seu Grupo Parlamentar não tinha havido pessoas a merecer elogios de personalidades da Universidade antes do 25 de Abril.

O Sr. Presidente: - Ó Srs. Deputados, tenham paciência. É claro que eu já sei perfeitamente o que diz o Regimento em matéria de apartes, mas penso que não se trata agora de apartes, já se está a entrar em diálogo e esse diálogo só pode ser permitido com consentimento do orador.
Creio que me fiz compreender. Faça favor de continuar, Sr. Deputado Octávio Pato.

O Orador: - Poder-se-ia ainda acrescentar uma outra questão que me parece importante: é que, no que respeita à actividade científica que muitos

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gueses de elevada craveira desenvolveram no nosso país em épocas bem difíceis, apesar de ser fundamental ou exclusivamente uma actividade científica, isso mesmo não obstou a que muitos homens da mais elevada craveira tivessem sido expulsos das cadeiras das universidades portuguesas, precisamente porque eram patriotas e democratas.

Aplausos do PCP.

E não me consta que aqueles que receberam elogios do Dr. Marcelo Caetano pela sua actividade científica tivessem, eles também, feito alguma coisa ino sentido dessas situações não se verificarem no Portugal fascista de quase meio século.

Aplausos do PCP.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Como é que sabe?

O Orador: - Quanto à Europa a que nós nos referimos, é evidente Sr. Deputado, que, quando nós nos referimos à Europa, é à Europa dos monopólios...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É evidente!

O Orador: - ... àquela Europa, àqueles monopólios que durante dezenas de anos ajudaram a oprimir o Povo Português, a explorar e a manter na mais negra exploração liminares e milhares de trabalhadores portugueses. Era a essa, à Europa dos monopólios, que nós nos estávamos a referir e é precisamente contra este sistema de...

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - E na outra não há monopólios!?

O Sr. Carlos Robalo (CDS):- Nem há polícias, nem casas especiais para hóspedes... Não há nada! E só liberdade! ...

Risos.

O Orador: - Não há dúvida nenhuma que o Sr. Deputado Carlos Robalo precisa de mais alguma coisa do que verniz democrático; o verniz democrático não chega para o Sr., precisa de mais alguma coisa.

Risos.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados querem que eu interrompa a sessão?
Se o quiserem interrompo-a mesmo, mas isto, efectivamente, não podia continuar assim.
Faz favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Quando às questões relacionadas com o Ministério e ligadas á Reforma Administrativa, para além das preocupações que já foram aqui adiantadas na intervenção que fizemos há uma coisa que na verdade estranho que essa tarefa tenha sido dada precisamente a um partido, aquele que causa, realmente preocupações. E não é por acaso, aliás, que esse Partido não está no centro, conforme ele se intitula, mas está aí precisamente nesse lado, na extrema-direita parlamentar.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - E vocês estão na extrema-esquerda!

O Orador: - Que seja dado a um Ministro do CDS essa tarefa, uma tarefa que vai, inevitavelmente interferir com todo o aparelho de Estado, com toda a Função Pública, e inclusive, com as próprias empresas nacionalizadas, com esse sector, precisamente, que mais do que nenhum outro o CDS procura liquidar, procura comprometer e procura na verdade alterar, com o objectivo da reconstituição do poder dos monopólios, do poder capitalista...

Aplausos do PCP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O que é preciso é alterar a estrutura gonçalvista, Sr. Deputado'

O Orador: - Quanto a algumas outras perguntas que aqui me foram feitas designadamente pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, queria dizer-lhe que quando, se diz que foram feitas aqui afirmações mentirosas, gostaria que o Sr. Deputado provasse onde é que estão essas mentiras.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não temos tempo!

O Orador: - É a melhor forma de o Sr. Provar se na verdade sou eu que sou um caluniador, ou se é, na verdade, o Sr. Deputado que está a exercer essa mesma função de que me está a acusar a mim.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão da «comunidade de interesses», é simples. Não tenho aqui neste momento o Programa do Governo, mas se quiser posso dizer-lhe.... A expressão é exactamente esta, fala-se numa comunidade de interesses «a empresa é uma comunidade de interesses». Se está interessado posso desfolhar o Programa a ver onde é que está, e está lá com certeza. Se não estiver lá, nesse caso, o Sr. Que me desminta aqui publicamente.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso é tirar uma expressão fora do texto ou do contexto.

O Orador: - O problema é saber se haverá ou não uma comunidade de interesses entre explorados e exploradores, Sr. Deputado. É precisamente essa a terminologia do passado fascista. Foi precisamente com essas duas expressões que durante dezenas de anos a ditadura fascista proeurou oprimir o Povo Português.
Portanto, esta terminologia é a terminologia do passado, á qual os Srs. Continuam agarrados e porque preciosamente os Srs. Querem voltar ao passado...

Vozes do CDS: - Não apoiado!

O Orador:- ...e mos queremos defender o presente e assegurar o futuro, é que na verdade nós estamos em oposição ao vosso partido.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Aqui está a calúnia!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Amaro da Couta, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - É para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Amaro da Costa (CDS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será necessário esclarecer de uma vez por todas qual é o tom que o Partido Comunista deseja adoptar no debate democrático se é a provocação ou se é a análise serena e lúcida dos problemas.
O Sr. Deputado Octávio Pato, tanto quanto eu pude ouvir -e ainda bem que não ouvi o mesto-, dedica-se a fazer construções fantasmagóricas que nada provam e apenas resultam...

Uma voz do PCP: - Mas se o senhor não ouviu...

O Orador: - O que eu ouvi foi suficiente e é em votação ao que ouvi que protesto. Se não tenho esse direito ou se não me dão essa liberdade, fico a fazer um bom juízo da vossa tolerância.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): -Essa é boa!...

O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Pato por consequência permite-me fazer insinuações, calúnias,

-porque o são ...

O Sr. Aboim Inglês (PCP): - Olhe que não, Sr. Deputado!

O Orador: - ... e não tenho medo nenhum à palavra - em relação as actividades de carácter profissional que foram os envolvidas pelo presidente do CDS no passado. O Sr. Deputado agora demagogicamente algo que é real e que foi o facto de muitos professores universitários foram todos afastados das suas funções antes do 25 die Abril. Isso é verdade. Mas eu gostava de saber o que é que o Sr. Deputado Octávio Pato fez, ou o seu Partido, para recolocar nas suas funções as pessoas do CDS que foram saneadas depois do 25 de Abril, só paio facto die o sarem.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Risos do PCP.

Orador: - Em particular, alguém que se senta na bancada do Governo neste momento e que foi saneado da sua função apenas e exclusivamente por ser membro fundador do CDS, quando lhe tinha sido sempre recusado o exercício da função de docente na Universidade de Coimbra, justamente porque não pactuava com o regime. O que é que o Partido Comunista fez a favor da reintegração do Dr. Vítor Sá Machado é o que eu gostava de gabar. Onde é que está a vossa liberdade na democracia?

Aplausos do CDS.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contraprotesto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Sm Deputados: Um muito breve contraprotesto, para dizer que quem tem que esclarecer o tom que quer imprimir a este debate e com a responsabilidade de ser partido do Governo é o CDS, E até pelas reacções a que aqui acabamos de assistir e que levaram o próprio Presidente da Assembleia a anunciar que poderia ter que interromper a sessão.

Aplausos do PCP e risos do CDS.

É esse comportamento truculento, que vai já ao ponto de querer impedir os deputados das bancadas que criticam e que se opõem à solução que foi encontrada para a crise governativa, que os Srs. Deputados do CDS terão de moderar se quiserem que, pelo menos, seja de algum modo crível o verniz e as proclamações democráticas que com tanta facilidade prodigalizam.
Na verdade, o CDS tem que, enquanto partido representado nesta Câmara e agora enquanto partido do Governo, se habituar à crítica democrática. E não pode tomar como calúnias afirmações que são verdadeiras...

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Olhe que pode!...

O Orador: - ...como a realidade física comprova. Nós afirmamos que o CDS é um partido da extrema-direita parlamentar. Isso está à vista de toda a gente. É falso?

O Sr. Cunha Simões (CDS): - E o Partido Comunista onde é que está?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O PCP é um partido golpista, toda a gente o sabe.

O Orador: - O CDS procura agora adoptar um nome que não é o seu. É legítimo chamar a isso uma alcunha. O Prof. Freitas do Amaral foi elogiado pelo ditador Marcelo Caetano...

O Sr. Cunha Simões (CDS): - E muito bem. Isso não deslustra ninguém.

Risos.

O Orador: - Vêem os Srs. Deputados como não são calúnias aquilo que afirmamos?!

Aplausos do PCP.

Ora ali está uma reacção intempestiva, mas que tem a grande virtude de ser verdadeira.

Risos e aplausos do PCP.

Na nossa intervenção fizemos afirmações que não são caluniosas. Ao CDS cabe responder politicamente, com um comportamento e uma atitude democrática, a essas críticas e a essas acusações. Se alguém é aqui

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passível de suspeita de não defender a democracia e de não ser solidário com as ideias democrática? ...

O Sr. Cunha Simões (CDS): - São vocês!

O Orador: -...é o CDS.

Aplausos do PCP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Lembre-se do 24 de Novembro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Eu pedi a palavra para dar um breve esclarecimento à Câmara.
Começo por lembrar, o que não vem ao caso, mas que terá enfim a sua importância, uma afirmação feita por um camarada meu numa reunião do meu Partido, e que era esta: «Nós não ramos inimigos nem são inimigos da democracia aqueles que no passado foram fascistas, são inimigos da democracia aqueles que no presente são fascistas.» Dito isto, gostava de dizer que o Prof. Diogo Freitas do Amaral foi presidente da Assembleia Geral da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa no ano de 1962. Gostava de dizer também que em 1963 o Sr. Prof. Diogo Freitas do Amaral discursou no dia da abertura da Reitoria com o conhecimento e o apoio prévio das associações de estudantes devidamente reunidas.
Isto é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o contributo do Partido Socialista para que em Portugal se instale o regime dos partidos democráticos e seja eliminado para sempre o regime dos partidos da calúnia.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra ao Sr. Deputado Magalhães Mota, queria esclarecer o Partido Comunista que quando afirmei que estava disposto, se fosse obrigado a isso, a suspender a sessão referia-me não só ao barulho que ouvia do CDS como do Partido' Comunista.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ora toma que já comeste!

O Sr. Presidente: - Referia-me a ambos. Devem calcular que só numa situação in extremis é que eu interromperia a sessão.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sn. Magalhães Mota (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo iniludível um certo sentimento de desencanto que um pouco por toda a parte terá seguido o início deste debate. Não só porquanto o Primeiro-Ministro, nas quase duas horas do seu discurso, -ou seja, cerca de metade do tempo total que ao meu Partido M atribuído- o fez «sem ter apresentado o Governo, que ainda não está completo, nem o Programa do Governo de que praticamente não falou», na síntese crítica die António Sousa Franco.
Mas também, e fundamentalmente, porquanto como no poema de Pessoa «o que não faz sentido é o sentido que tudo isto tem».
Não terá deixado de impressionar, em primeiro lugar, a força posta na questão da identidade. O Primeiro-Ministro aqui esteve a lembrar o passado e o passado recente. E não deixa aliás de ser curioso que nesse recordar de momentos, considerados significativos duma identidade, não tenha sido escolhido um só referente à única experiência portuguesa de Governo exclusivamente PS.
A verdade, havemos de reconhecê-lo, é que não seria fácil incluir a experiência do I Governo, no rol identificador. Se o Dr. Mário Soares -que é obviamente o mesmo- viesse dizer que este Governo não é mais do que o Governo «profundamente remodelado» que sugeriu quando da votação da moção de confiança, creio que não agradaria... pelo menos ao CDS. E também creio que é por saber que sendo «diferente» a outros não agrada, que tanto se esforçou por lembrar que os socialistas são os «mesmos».
Os mesmos que recusavam uma política de alianças, à esquerda e à direita, ou, mais modestamente, que tendo assumido esse compromisso perante o próprio partido e o eleitorado não o poderiam alterar sem reunir um Congresso e, até, sem novas eleições.
Os mesmos que em 7 de Dezembro pela voz do mesmo Primeiro-Ministro consideravam a existência de um governo minoritário (sem alianças à esquerda ou à direita) «uma condição decisiva para a evolução pacífica e democrática do sistema português e para o reequilíbrio sociológico e nacional do País -na medida em que se destina a evitar irredutíveis divisões e graves e violentas confrontações de tipo político, social ou regional». Os mesmos que na mesma ocasião e discurso consideravam sem sentido nem sequer seriedade (uma associação governativa) «depois das críticas tão azedas e repetidas que nos tem dirigido». Os mesmos que do CDS afirmavam, ainda nessa data e discurso, não ser de estranhar que «manifestem um certo enfado sempre que se fala de socialismo, de nacionalizações, de autogestão, de empresas mistas».
A identidade é difícil. Obriga à coerência.
Para mim tenho que alguma coisa mudou. E que importa saber o quê e porquê e quanto mudou.
Mudou, em primeiro lugar, a fórmula minoritária do Governo. Mais eufemismo, menos eufemismo, chame-se-lhe de base ou com personalidades, a verdade é que, mais ou menos envergonhada, duma coligação PS-CDS se trata. Duma coligação em que inclusivamente -e com o cerimonial que foi certamente o considerado adequado tornou público- e, como deve ser, primeiro se fez um programa e só depois se formou Governo.
O Programa de Governo há-de pois referir-se àquele outro acordo interpartidário que o precedeu. Porque resultante, há-de, finalmente, em consequência das negociações que entre os Partidos decorreram e que levaram ao acordo PS-CDS.
Também aqui caberá recordar o debate sobre a moção de confiança. Disse então o Presidente do CDS:

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No decurso das negociações travadas entre o CDS e o Governo [...] não se ajustou uma nova política económica e financeira, com base na qual os partidos signatários da plataforma pudessem vir a fazer frente comum e ante o FMI, apresentando-lhe um novo modelo como resultado de uma revisão, do lado português, do quadro de interlocutores, e de responsáveis pela definição da política a adoptar.
Tão pouco se chegou a acordo, nas negociações efectuadas, quanto à dimensão necessária da base política e social de apoio a um novo Governo constitucional.
E justificava assim o CDS a tese de um acordo parlamentar tripartido:

O que o CDS pensa é que no contexto actual, que é muito grave, se torna indispensável encontrar a mais ampla base de consenso nacional que for aceitável para vencer a crise - e não apenas, como parecer o objectivo do PS, a menor base die entendimento parlamentar que for necessária para apoiar o Governo.
Por outras palavras, nós entendemos que se deve procurar alargar a plataforma ao máximo possível, enquanto o PS parece desejar restringi-la ao mínimo indispensável.
O nosso objectivo é conseguir maximalizar a viabilidade nacional da plataforma, ao passo que o objectivo do PS parece ser tentar minimizar o risco partidário da solução.

São, repito, palavras textuais de Diogo Freitas do Amaral nesta Assembleia em 6 de Dezembro último.
Poderia limitar-se a repetir - e deixar que o julgamento, por outro seja feito -, que alguma coisa mudou.
Mas disse que, para verificar o quê, porquê e quando mudou, iria recordar o debate sobre a moção de confiança apenas em mais um episódio. Todos estarão lembrados que o meu colega de bancada Marques Mendes obteve do presidente do CDS resposta afirmativa e um esclarecimento pedido, o de saber se ao CDS chegara a ser feita qualquer proposta de acordo com o PS com a exclusão do PSD. Mas recordo também, o protesto do então Ministro sem pasta Jorge Campinos. Segundo este, «o CDS propôs ao Governo um acordo bilateral, acrescentando ainda que o Partido Socialista deveria conduzir as negociações de maneira a levar o PSD punha como ponto prévio, e contrariamente ao CDS, a questão da composição do Governo. Mais ainda que visse o caso CDS poderia considerar que havia ruptura da «convergência democrática» e que o CDS, contrariamente ao PSD, não havia nenhum inconveniente na adesão do PCP, a um acordo com o Governo, desde que esse acordo não fosse contrário entre o Governo, o Partido Socialista e o próprio CDS.
Recordo o facto, não porque ele não tenha sido, então objecto de réplica, nem por conhecer como as coisas se passara. Mas para sublinhar que, ao menos neste caso concreto, não terá havido mudança mas apenas progresso ...

Aplausos do PSD.

...e também aqui não pretendo julgar, sem sequer da veracidade das versões.
Aqui, repito, não terá havido mudança. É isso o importante do acordo PS/CDS.
É que o PS continuou a querer restringir uma plataforma «ao mínimo indispensável, à menor base de entendimento parlamentar necessária para apoiar o Governo». Por isso convinha o parceiro menos exigente.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - Aquele para quem o interesse pelo poder fosse suficientemente forte para renunciar por exemplo á economia de mercado aceitando a coexistência concorrencial, que quando da apresentação do I Governo Amaro da Costa não sabia o que fosse e esperamos que, pelo menos agora já saiba.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Já.

Risos do PSD.

O Orador: - Pois não é verdade, que foram as negociações PS-PCP que se romperam e não o CDS a declama-as como não aceitáveis?
Pois não é verdade que o CDS também repensou - à luz do FMI- a sua ideia sobre a taxa de crescimento mínimo para a nossa economia? Credo que PS e CDS obtiveram o que pretendiam - e isso é salutar numa negociação.
Mais «óleo de fígado de bacalhau», menos «óleo de fígado de bacalhau»... e tombem a, imagem é reveladora (não parece que tenha sido por ácaro que se tenha encontrado um remédio que, como fortificante, parece ter caído em desuso...) certo é que o CDS é também Governo e o PS não delirou de o ser.
A História fará a História, dizendo quem mais cedeu a quem.

O Sr. Cunha Rodrigues (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas no somatório de ganhos e perdas, haverá que perguntar-se se o País ganhou...

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ..., se a solução é estável, se é coerente, se nos permite - a todos - razões para esperança, o máximo divisor comum a que chegaram os dois partidos? Mais: se a complacência fácil do CDS, permitindo que se evitasse o maior consenso nacional possível a um projecto de futuro, não compromete e adia esse mesmo projecto de futuro?

Aplausos do PSD.

Disse que o programa era um máximo divisor comum. Mas tenho dúvidas. E nem sei se também entre nós, não teremos dois Partidos separados por um programa comum.

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Os meus colegas de bancada aqui aprofundarão os aspecto principais« desse programa que, sem compromissos do calendário, sem hierarquias nem prioridades, que por isso é apenas e também um discurso. Outro. Com outras palavras. Mas apenas palavras.
Se a identidade afirmada e o calar sistemático do Programa são significativos, não o são menos o ênfase posto em dois pontos particulares.
O primeiro é o que diz respeito à Lei de Bases sobre Reforma Agrária, que será aplicada «mas a partir do diálogo com os interessados e sem recurso a violências escusadas ou na ponta das baionetas».
Para nós temos que «sem recurso a violências escusadas» devem ser aplicadas todas as leis e no Alentejo como em Santa Comba ...

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - .... pelo que dizer-se que só a Lei de Bases sobre a Reforma Agrária é assim aplicada «a partir do diálogo com os interessados» parece antes promessa de, pelo menos, dilatar no tempo a aplicação.

Aplausos do PSD.

Será assim? Nem isto ficou claro -e é bom que fique- nem ficou claro se antes falhara o diálogo ou abundara o recurso a «violências escusadas» ... ou se, como antes pretendia o CDS, a lei vai ser alterada, «a partir do diálogo com os interessados».
Significativo é também que se pense -ou continue a pensar - em termos, «corporativos». Pois, não serão os Portugueses, todos, os interessados em tudo?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É, finalmente, importante que a opinião pública tenha retido ao discurso como uma das suas ideias- fundamentais a da criação de um organismo contra a corrupção.
É significativo que o Primeiro-Ministro tenha abordado o tema, a que o Presidente da República viam aliás se referindo pelo menos desde 5 de Outubro de 1976, embora minimizasse a importância do que e classificou de «atoardas».
Há aliás para o Primeiro-Ministro rumores e «rumores» já que não se coibiu de referir um qualquer boato -não pode ser mais que isso, uma vez que o Primeiro-Ministro não calaria factos de que tivesse conhecimento sonegando-os à Polícia Judiciária e arriscando-se a ser «encobridor» - sobre bombistas nas ilhas.

Vozes do PSD: - Muito tem!

O Orador: - Que fique claro: pela nossa parte, não colaboraremos em qualquer campanha de insinuações ou de atentados á dignidade de seja quem for.

Aplausos do PSD.

A tanto nos abriga o respeito peia nossa própria dignidade.
Mas não permitiremos que se desarme ou descanse nessa luta, doa a quem doer. Nem permitiremos que os co-responsáveis se escudem no silêncio, na cobardia e na falsa solidariedade que é cumplicidade.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pensamos que o País exigia - e exige-se - não só uma mudança de gestores, mas uma mudança de gestão.
De palavras andamos todos fartos.
É tempo de se concluir que os rótulos e os slogans não chegam. Que as promessas não bastam. E que os compromissos necessários obrigam a clarificar e concretizar tudo. Obrigam a precisar os caminhos e os meios.
Passam necessariamente pela informação, peio debate aborto, pelos contratos leais, pela adesão popular a uma política claramente definida.
O acordo de governo PS/CDS ocupou-se da situação da informação prevendo a reestruturação da Imprensa Estatizada, a neutralidade partidária e o pluralismo efectivo na Rádio e na Televisão e também a colaboração dos dois partidos nos conselhos de informação e nas leis relativas à Comunicação Social.
Aí parece um ponto em que o acordo terá sido fácil. Tão fácil que, de novo, se suscita o problema da «regularização de direito e de facto das taxas e respectivo sistema de cobrança» com que, afinal, o CDS está de acordo.
Tão fácil que se vai trabalhar «um inovo conceito de publicidade» -descoberta que desde já Se regista, na medida em que assim se invalida a ideia, também publicitária «do viver com aquilo que temos»...

Risos do PSD.

...e regressou a ideia da TV a cores que era do I Programa, tinha sido rejeitada e agora continua em estudo.
Não contém o Programa novidade;.. Não o são nem as desintervenções «eventuais» anunciadas néon a declaração da «inreversiibilidade da inserção no sector público» das empresas do «Notícias», «Capital», «Século» e «Popular» sem prejuízo da sua reestruturação». Tudo vem no índice, tudo tem cadastro histórico.
Mas, visto o caso de «O Século», visto o destino das promessas feitas por Manuel Alegre, o que importa perguntar é se ao manos será nova a vontade de fazer alguma coisa, e designadamente se vai ou não ser cumprido o n.º 5 do artigo 38.º da Constituição que impõe sejam repostas as condições de igualdade que a prática de avales e as facilidades concedidas à Imprensa estatizada tornaram hora morta, isto é, se vai ou não sor apoiada a Imprensa regional e local e a Imprensa não estatizada em termos de a repor em igualdade de condições.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Coexistência concorrencial «a sério».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sc e por dentro das coisas que as coisas são, há que evitar «portas falsas». O compromisso PS/CDS tem as suas causas e a sua lógica própria. Não lhe inventemos desculpas.

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Quem o fez quê o assuma, em plenitude. Quem o apoia, que o diga. Com verticalidade e com honradez. Porque a grandeza não está em demonstrar como deviam ser as batalhas dos outros, mas em não fugir às próprias. O óleo de fígado de bacalhau só é amargo para quem o engole.
O acordo não se fez para evitar eleições, nem estas são um mal a esconjurar ainda que possam não convir a este ou aquele. Nem se fez por penoso sacrifício por amor da Pátria.
Não somos menos portugueses na Oposição.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - Recusamos o «patriotismo» que Eça denunciava, em que se não ama mas se namora, em que em vez de obras se impingem odes. Quando se pretende mais pão e mais justiça, não se pode responder lembrando a tomada de Cochim.

O Sr. Cunha Rodrigues (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Relativamente o problema da balança de pagamentos, aqui e agora, se tivermos para tal trabalho e talento. Não, termos ido até à índia...

O Sr. Marques Mendes (PSD): -Muito bem!

O Orador: - ... como escreveu Ferreira Dias «Se à obra do nosso «tempo falta o estímulo religioso de quatrocentos, temos de compensá-lo com a consciência mais perfeita dos deveres locais e a necessidade mais premente de olharmos ao prestígio da nossa bandeira - prestígio de textura complexa que já não vive apenas de ponta das espadas, mas de um misto de força, de riqueza, de organização, de inteligência e de sentimento. E se podemos desculpar-nos de não ter força, que é função do número, não sei como poderemos airosamente justificarmo-nos da falta de predicados que só dependem da qualidade».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente:- Não há nenhum pedido de esclarecimento?

Pausa.

Visto não haver pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP):- Sr. Presidente, Sr Primeiro-Ministro, Sr. Deputados: A UDP sobe a esta tribuna com profunda apreensão pelo futuro de Portugal, pelos negros caminhos por onde querem levar a democracia portuguesa e pelas sérias ameaças que se erguem ao 215 de Abril.
Não vimos aqui participar num qualquer debate sobre um qualquer governo. Nem sequer se trata de um programa de Governo simplesmente mais á direita que o anterior. Trata-se de um Governo em que tomarão parte representantes da extrema-direita, homens que votaram contra a Constituição da República, homens que sempre manifestaram um ódio profundo aos capitães de Abril, à Reforma Agrária, às ocupações, ao movimento sindical, às comissões de ao direito à greve».
A dura realidade é esta. Nem sequer são pasmados quatro anos depois de Abril e já o CDS está no Governo. De tal forma esta facto feriu os sentimentos democráticos dois trabalhadores, que Mário Soares, mo seu primeiro discurso, não apresentou programa nenhum, e gastou o tempo todo a justificar a presença do CDS no Governo.
Só que é impossível justificar aquilo que não é justificável. Pode o Dr. Mário Soares procurar os argumentos que quiser que não conseguirá vender gato por lebre, porque os trabalhadores, os democratas, sabem quem é o CDS.
O CDS foi um Partido que votou contra a Constituição, e ao fazê-lo mão só votou contra o projecto social feia como contra as conquistas democráticas e populares do 25 de Abril. O CDS é um partido dirigido por figuras altamente comprometidas com o regime fascista, e que, durante o reino de Salazar e Caetano, nunca sequer foram vistos a manifestar as mínimas discordâncias. Eram parte integrante da própria ditadura. O CDS é um Partido que logo após o 25 de Abril congregou a reacção contra o avanço do movimento popular e da democracia. O CDS ê um Partido que aqui mesmo nesta Assembleia se chegou a abster na condenação dos atentados bombistas nas ilhas. O CDS é um partido cuja brigada de choque que da juventude é conhecida pelos liceus de todo o País como um bando de nazis, de caceteiros, de desordeiros filhos-família. O CDS é o Partido cujo dirigente máximo ainda há dias classificou de «popular» a arruaça fascista de Santa Comba Dão.
Este é o verdadeiro CDS e não aquele que o Dr. Mário Soares aqui nesta Assembleia tentou apresentar como democrata.
A onda de protestos dos trabalhadores e die milhares dia antifascistas são bem a prova do repúdio que a presença do CDS no Governo merece.
Aos camaradas socialistas, a todos os homens de pensamento verdadeiramente livre e progressistas a que se mantêm fiéis aos ideais socialistas, a esses, que i ao trocaram a luta pelo socialismo pelas cadeiras, estofadas do poder a qualquer preço, a esses camaradas nós expressamos a nossa mais profunda convicção de que - unidos e firmes - os trabalhadores deste país são ainda suficientemente fontes para erguer o 25 de Abril, defender a Constituição, salvar Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Preocupou-se o Dr. Mário Soares em apresentar, mesta tribuna, o seu acordo com o CDS como sendo um imperativo democrático e mesmo uma vitória da democracia. É pois necessário debruçarmo-nos sobre as «virtudes democráticas» deste acordo.
Não se trata, como é sabido, de um acordo pontual, mas sim de um acordo que abrange todos os aspectos essenciais da vida política e que prevê profundas reformas na administração pública, no ensino e na saúde. E é um acordo que deixa de tal forma a direcção do Partido Socialista nas mãos do CDS que o Primeiro-Ministro não poderá tomar qualquer medida de fundo sem previamente consultar o Prof. Freitas do Amaral, nem os ministros que não «ao do CDS poderão deixar de informar os homens de confiança deste Partido, nos diversos ministérios, antes de tomarem qualquer decisão importante.

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Mas, ainda mais ultrajante: a direcção do PS prepara-se para substituir o Dr. Vasco da Gama Fernandes cujo passado antifascista todos respeitamos, por qualquer discípulo de Marcelo Caetano - ao que se diz o próprio professor Freitas do Amaral, que passaria, assim a ser a segunda figura da República.
Um tal acordo só poderia conduzir a um governo reaccionário. Basta olhar mais de perto a sua composição para vermos até que ponto Mário Soares comprometeu a democracia. O CDS tem três pastas ministeriais decisivas. O Ministério dos Negócios Estrangeireis fica nas mãos de Sá Machado, que foi saneado da Gulbenkian após o 25 de Abril por incompetência. Isto quer dizer que nem passaram quatro anos após o 25 de Abril e já é o CDS quem escolhe quem são e quem não são os amigos de Portugal. E quem são esses amigos do CDS quis o Dr. Mário Soares diz serem apoios indispensáveis à democracia portuguesa? São as chamadas democracias cristãs que por essa Europa fora constituem os sectores mais reaccionários do imperialismo. É o caso do Sr. Strauss, que, quando o Sr. Presidente da República visitou a Alemanha, se declarou amigo pessoal de Salazar e disse esperar que o professor Diogo Freitas do Amaral tivesse menos vergonha de dizer o que realmente é Strauss foi o único político europeu que foi ao Chile visitar Pinochet e de lá veio a dizer que o assassino do povo chileno era um homem de boa vontade. Tais são os amigos do CDS que o Dr. Mário Soares tem o descaramento de dizerem serem apoios necessários á democracia portuguesa.
Outro Ministro é um homem forte da CIP o Secretário-Geral do CDS, antigo membro da Comissão Administrativa da União Nacional, o Sr. Basílio Horta, e fica com o Ministério do Comércio e Turismo, o que quer dizer que os grandes intermediários vão continuar a viver à farta, a especulação vai crescer, es pequeno? agricultores vão continuar a ver o produto do seu trabalho pago a preços de miséria, e as donas de casa vão continuar a ver os preços dos produtos subirem escandalosamente. Quer dizer, o Dr. Mário Soares coloca no Ministério do Comércio um homem forte dos grandes intermediários da CIP e depois quer que o povo acredite que ele vai combater a subida escandalosa dos preços, isto é, combater a própria CIP.
Finalmente, toda a gente sabe que uma das principais dificuldades da democracia, portuguesa, do sector nacionalizado e de todos os serviços públicos em geral, reside no facto de o antigo aparelho administrativo que foi herdado do fascismo praticamente não ter sido remodelado. Pois essa tarefa de fundo, a reforma administrativa, o Dr. Mário Soares entregou-a agora ao Dr. Rui Pena, que é ho>e um dos advogados dos bombistas, dessa escória fascista que tantos crimes cometeu.
A única conclusão que de isto tudo se pode tirar é a de que este acordo PS-CDS, que deu origem ao Governo cujo programa agora apreciamos, longe de ser um imperativo democrático e destinado a viabilizar a democracia, é um acordo antidemocrático, virado contra as conquistas populares do 25 de Abril e contra a própria democracia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo que foi apresentado pelo Dr. Mário Soares como um imperativo nacional é um Governo que leva ao extremo a nossa dependência face ao estrangeiro. Apresentado como um Governo que vai regatear com o Fundo Monetário Internacional, o seu programa económico, já tem prevista a satisfação das principais exigências do Fundo Monetário Internacional.
No Programa do Governo lê-se esta coisa espantosa: «O motor do desenvolvimento só pode ser constituído pelos sectores que produzem bens que são objecto de transacção com o exterior, seja para a exportação seja para a importação.» Diz ainda o Programa do Governo que o padrão de desenvolvimento nem que assentar na abertura da nossa economia ao estrangeiro, e na sua especialização: tal é a principal exigência do Fundo Monetário Internacional entregar Portugal de joelhos ao. imperialismo. Mas diz mais o Programa do Governo: «Nunca o motor de desenvolvimento nem a orientação do aparelho produtivo poderá ser determinado directa e predominantemente pela satisfação de necessidades internas através da produção nacional.»
Ou seja, em vez de assentarmos o nosso desenvolvimento na produção daquilo que necessitamos, em e da protecção do mercado interno através do reforço das barreiras alfandegárias -, a fim de desenvolver a nossa indústria d outros sectores produtivos, em vez de uma política de substituição de importações por produtos nacionais por forma a diminuir a nossa dependência, em vez de tudo isso, este Governe vai abrir ainda mais o nosso mercado à concorrência das poderosas empresas industriais imperialistas e multinacionais, vai orientar a nossa economia para uma especialização para ficarmos a produzir aquilo que for permitido pela concorrência internacional. Irão ser os imperialistas a ditar aquilo que cabe produzir a Portugal.
Esta é a velha política que sempre arruinou ente país, é a política pela qual há muitos anos atrás nós ficámos a produzir vinho para a Inglaterra e eles, a venderem-nos os produtos manufacturados, o que conduz u à ruína da nossa agricultura, ao atrofiamento da nossa indústria, à nossa dependência económica, política e militar face ao imperialismo.
Hoje, este Governo antinacional, rendendo-se diante do Fundo Monetário Internacional sem um mínimo esboço de patriotismo, limita-se a seguir a mesma política ruinosa. Assim ficarão nas gavetas do MAP os projectos de produção em Portugal da beterraba sacarina, da batata de semente e de inúmeros outros, produtos essenciais, não serão alargadas as áreas de regadio; a Reforma Agrária será atacada, em vez de se aproveitar a revolução nos campos do Alentejo pata produzirmos o pão de que necessitamos. Os pequenos e médios agricultores verão esmagadas as suas esperanças, diante da inundação dos nossos mercados pelos produtos agrícolas da Europa. Também a nossa indústria será profundamente abalada pela concorrência internacional, e este Governo limita-se a apontar-lhe como saída a sua especialização num ou noutro sector em que tivermos capacidade de competir. Tal política é desastrosa não só para os trabalhadores em geral mas até para os milhares de pequenos e médios camponeses e industriais. É uma política de ruína o desemprego.

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Mas é claro que este plano antinacional está entrelaçado com a mais descarada política a favor dos monopólios e dos latifundiários. Enquanto se pede ao povo austeridade, se prometem dias de grandes sacrifícios, aos grandes monopolistas vão ser pagos, até Julho, milhões de contos de indemnizações. E como se isso não bastasse, ainda lhes vai ser permitido criarem sociedades financeiras de investimento, ou seja, a criação de uma banca privada em concorrência com a banca nacionalizada. Numa altura em que as cooperativas vêem o crédito cortado, numa altura em que numerosas pequenas e médias empresas agrícolas e industriais são empurradas para a ruína devido à subida das taxas de juro, numa altura em que se criam dificuldades de toda a ordem ao sector nacionalizado, o Governo mostra bem as suas reais intenções ao distribuir milhões de contos aos Melos, aos Champallimauds, aos Quinas e a outros tubarões e ainda por cima permitir-lhes criar as suas próprias sociedades financeiras. Surge claro que é arruinando o novo Alentejo das cooperativas e UCPs, é arrumando o sector nacionalizado, e as pequenas e médias empresas, que o Governo pretende abrir as portas para que os grandes monopolistas e o imperialismo ergam de novo o seu império em Portugal a trabalhar para meia dúzia de tubarões e para os estrangeiros.
Logicamente, este império dos monopólios e do imperialismo só poderá ser erguido sobre a miséria de quem trabalha. Barita ver que os produtos do cabaz de compras vão ser aumentados, o que quer dizer que as donas die casa vão regressar da praça com os seus cabazes cada vez mais vazios. Mas, demagogicamente, diz o Governo que os salários vão acompanhar a subida do custo de vida, que afirma não ultrapassar os 20 por cento. Para já, era preciso dizer que o aumento de 20 por cento nos salários nem sequer permite aos trabalhadores recuperar a perda do poder de compra, mesmo se os preços não aumentassem este ano. Basta dizer que o nível real de salários é hoje inferior ao de 1968. Mas o próprio Governo está tão pouco convencido que o custo de vida só vai subir 20 por cento que ele próprio começa por admitir que esse número seja largamente ultrapassado. Aliás, já em 1977 diziam que o custo de vida ia crescer 15 por cento, e por isso limitaram a subida dos salários a esses 15 por cento, e na realidade a subida do custo de vida foi de mais de 30 por cento, reduzindo a pó os aumentos de salários.
Este Programa de Governo coloca de tal forma Portugal dependente do estrangeiro, ajoelha-se de tal maneira diante do Fundo Monetário Internacional, que diz textualmente que ele próprio só poderá ir para a frente se entretanto a Europa recuperar da crise em que está mergulhada. Quer isto dizer que as esperanças de Portuga] não estão no trabalho do seu povo mas, no capitalismo europeu.
É este o patriotismo deste Governo. A tais extremos chegámos.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: É claro que para tornar possível este acordo e este Governo reaccionário, o Dr. Mário Soares teve que meter na gaveta o socialismo. Mas o que não pode deixar de revoltar qualquer homem de esquerda é que ainda por cima venha dizer isso o fez para viabilizar a democracia e recuperar a economia.
Quer dizer, um homem que se diz socialista declara diante de todo o País que para salvar a democracia é preciso pôr de parte por uns tempos o socialismo.
Como se o socialismo não tivesse solução para os problemas do povo, como se as medidas económicas necessárias pana evitar o descalabro financeiro fossem incompatíveis com o socialismo.
Mas a verdadeira gravidade deste abandono do socialismo no acordo PS/CDS ainda fita mais clara se tivermos em conta que tal acordo é válido até 1980, que é precisamente o ano em que a Constituição pode ser revista. Perante isto, pode até o Dr. Mário Soares garantir-nos que o CDS morre de amores pala Constituição que os trabalhadores deste país percebem que com este acordo o CDS conseguiu que 96 anulasse o principal objectivo da Constituição, que é o socialismo. O CDS, que votou contra a Constituição por a Considerar socialista, consegue hoje ser Governo ficando o socialismo na gaveta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Dr. Mário Soares, na altura da votação da moção de confiança do I Governo, quis recordar aqui a memória de Salvador Allende, memória essa bem querida para iodos os democratas. Sobre isso queremos dizer que Salvador Allende jamais baixou as bandeiras do socialismo para deixar entrar no Governo o CDS lá do Chile,- o -, chamados democratas-cristãos. E por essa atitude de firmeza e coerência, Salvador Allende mereceu o respeito e a admiração de iodos os democratas.
E queremos aqui citar as palavras de Carlos Alta-mkano, Secretário-Geral do Partido Socialista chileno, que dizia que o principal erro da esquerda no Chile foi não se ter apoiado com firmeza e sem hesitação na força e na iniciativa do povo, para atacar com redobrada energia e esmagar as conspirações, o boicote económico e as ameaças da direita reaccionária, dos, fascistas e do imperialismo.
Terá de ser esse o caminho para o socialismo em Portugal, se não quisermos ver a liberdade e a democracia cada vez mais ameaçadas, se quisermos ter a coragem de impedir que Portugal possa vir a ser o Chile da Europa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gravidade da situação a que chegámos impõe a todos os trabalhadores, a todos os antifascistas e democratas, a tarefa de tirar rápidas lições do passado.
Durante dezoito meses o I Governo Constitucional foi decretando leis cada vez mais reaccionárias, foi tomando todas as medidas que a direita exigia, foi fortalecendo económica e pó unicamente os monopólios e os latifúndios, foi facilitando progressivamente a ingerência imperialista.
Durante dezoito meses o Partido Socialista foi fazendo a política que a direita dele exigia, ao mesmo tempo tentava sossegar os seus militantes dizendo tratar-se de medidas necessárias e tranquilizava os trabalhadores afirmando que apesar de tudo jamais se aliaria à direita, jamais faria alianças, quer à direita quer à esquerda.
Durante dezoito meses, à sombra do Governo PS a direita foi crescendo de arrogância, os fascistas e separatistas foram intensificando a sua actividade criminosa, nasais coroo Kaúlza, começaram a orgão!»

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zar-se e a actuar abertamente. Sentiram-se pois com forças para pressionar a queda ao Governo. E Mário Soares, que durante todo esse tempo tinha afirmado que jamais se aliaria à direita, que isso faria perigar a democracia, é cie próprio agora quem traz a extrema-direita para o Governo. Não foram aqueles que lutaram contra a política reaccionária de Soares que possibilitaram a formação deste segundo Governo - foi Soares quem deu forças à direita para exigir a sua entrada.
Com a queda do I Governo Constitucional exigia-se uma iniciativa pronta e audaz da classe operária, dos trabalhadores, dos democratas e antifascistas. Com a queda do I Governo Constitucional impunha-se, como a UDP na altura indicou, que o povo indicasse por todo o País, nas ruas e locais de trabalho, o governo que pretendia. As reivindicações populares deviam ser erguidas, a expectativa devia ser quebrada, uma jornada nacional de luta devia ser promovida fazendo ver à direita a força imensa, a força de milhões de trabalhadores portugueses.
E aqui pesadas responsabilidades cabem a todos aqueles que se levantaram contra a UDP acusando estas propostas de esquerdistas e aventureiras; aqui pesadas responsabilidades cabem ao Dr. Álvaro Cunhal e ao seu partido, que apelaram à calma e à serenidade, criaram, a expectativa nas negociações, afirmaram que estavam a ser conseguidos avanços, alimentaram a ideia de que uma viragem à esquerda estava a ser efectuada no sedo da direcção do Partido Socialista.
Os resultados estão hoje à vista. O CDS está no Governo. A campanha de ataques e calúnias do PCP à UDP não tem outro objectivo senão o de dividir os trabalhadores, lançar poeira para os olhos dos seus militantes e esconder a tremenda responsabilidade do PCP na situação hoje criada.
A UDP confia que os trabalhadores saberão repudiar a continuação das calúnias e do divisionismo, e saberão encontrar os caminhos de unidade, de discussão política séria, de luta decidida para evitar males maiores e reabrir os caminhos de Abril.
Àquelas, felizmente poucas, direcções sindicais que ultimamente, para grande espanto dos trabalhadores, têm atacado a UDP, nós queremos dizer que reconsiderem e tenham o discernimento de perceber que, na gravidade da situação actual, o que os trabalhadores que as elegeram estão à espera é que ataquem este Governo com o CDS e não que façam da UDP o réu inimigo principal.
Pela nossa parte continuaremos, com firmeza, a criticar em termos políticos, e não com calúnias e insultos, aquilo que nos parecer errado, pois esse é o caminho da unidade dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao povo português já bastaram 48 anos de racismo. Durante 48 anos tivemos mortos, deportados, torturados, famílias enlutadas e miséria por todo o Portugal. Durante 48 anos mártires sem conta riscaram o livro negro dos crimes da reacção e do fascismo.
Nesse tempo, alguns dos deputados que hoje estão neste Parlamento foram perseguidos pela ditadura, e o próprio Dr. Mário Soares teve de ir para o exílio quando os homens que hoje mote no Governo nem uma palha na altura mexeram e alguns deles estiveram mesmo comprometidos com a ditadura.
Com o 25 de Abril o povo viu chegada a hora de dizer: basta!
Não são agora as ameaças crescentes da direita reaccionária, não são agora as chantagens de Mário Soares que virou as costas aos anseios democráticos e socialistas de todos aqueles que nele confiaram que farão parar o povo português na sua luta pela liberdade e pelo socialismo.
Mas as lições devem ser tiradas. E hoje, que o Dr. Mário Soares nos vem fazer uma descarada chantagem acusando os «excessos» e os «abusos» de favorecerem a reacção, os trabalhadores tem de dizer claramente: nós não abusámos! Nós não fomos longe de mais! Nós fomos, isso sim, demasiado benévolos descurámos a nossa ofensiva e a nossa organização! Fomos demasiado brandos para com os inimigos da liberdade!
Os que durante 48 anos oprimiram e amordaçaram Portugal estão hoje no Brasil, na Suíça, ou passeiam-se em liberdade no nosso país. São esses que hoje de novo nos ameaçam.
Não serão as chantagens do Dr. Mário Soares que intimidarão o povo português. Mais do que nunca, e antes que seja tarde, o povo ir-se-á levantar.
Os protestos mais amplos, as tomadas de posição mais enérgicas, as reivindicações mais sentidas, as greves s paralisações em defesa das conquistas de Abril e contra o CDS no Governo, serão a legítima resposta do povo português à ofensiva dos reaccionários.
A UDP, desta tribuna, lança um apelo muito sério, um alerta solene, a todos os operários revolucionários, a todos os trabalhadores antifascistas, a todos os democratas e patriotas: unamo-nos decididamente, avancemos num grande bloco popular antifascista para barrar o passo à reacção, para lutar contra o governo de direita, para salvaguardar as conquistas do 25 de Abra!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho que dizer uma palavra, pois não posso deixar de a dizer, mas sei que ela vai ser convictamente inútil. Acho que por uma questão de pedagogia, devemos ter um pouco de cuidado com expressões que são excessivamente graves quando aplicadas à honra e consideração das pessoas. A palavra «chantagem» está, efectivamente, considerada por toda a nossa literatura, por toda a nossa oratória e por todas as nossas atitudes como uma palavra extremamente grave. Peço aos Srs. Deputados, de qualquer partido, seja ele qual for, que eliminem do seu dicionário unia palavra tão grave e tão importante, sob o aspecto negativo e sob o aspecto pejorativo, como é a palavra «chantagem».
Espero que a Câmara me tenha compreendido.

O Sr. Acácio Barreiros(UDP):- Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: a palavra «chantagem», no sentido político, quer dizer, como toda a gente sabe, agitar

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falsos espantalhos, levantar falsas ameaças e tentar criar nos trabalhadores o medo por determinadas situações. Portanto, quando eu disse «chantagem» referia-me à palavra muito usada em termos políticos, já muitas vezes usada aqui em discursos sem qualquer advertência. Â expressão «chantagem política» tem este significado preciso, e foi nesses termos, e não no sentido de ofender pessoalmente quem quer que seja, que eu utilizei a palavra aqui, nesta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Não se trata de pessoas, e a intenção não seria essa, simplesmente dá-se uma circunstância perfeitamente lamentável: e que os nossos dois dicionários são totalmente diferentes.

Risos.

Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira, a fim de ler um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, para depois continuarmos a sessão.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Relatório a parecer

Em reunião realizada no dia 8 de Fevereiro de 1978, pelas 11 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de Deputados:

1 - Solicitada pelo Partido Socialista:

Joaquim Manuel Barros Sousa (círculo eleitoral de Coimbra), por Fernando Abel Simões; António Ribeiro Campos (círculo eleitoral de Coimbra), por Fernando Gomes Vasco; João Lima (círculo eleitoral de Emigração), por Maria Alzira de Lemos; João Joaquim Gomes (círculo eleitoral de Lisboa), por José Santana Campos Rodrigues; José Gomes Fernandes (circulo eleitoral do Porto), por Serafim Olindo Ramos Bastos; António Fernando Marques Ribeiro Reis (círculo eleitoral de Santarém), por Fernando João Ferreira de Carvalho.

2 - Solicitada pelo Partido Centro Democrático Social:

Alcino Cardoso (círculo eleitoral do Porto), por Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues; João Lopes Porto (círculo eleitoral de Coimbra), por Caetano Maria Dias da Cunha Reis; Nuno Kruz Abecassis (círculo eleitoral de Lisboa), por António João Pistacchini Gomes Moita.

3 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são real e actualmente os primeiros candidatos eleitos ainda não solicitados na ordem de precedência da lista eleitoral apresentada a sufrágio pelos referidos partidos nos respectivos círculos eleitorais.

4 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.

5 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Presidente: - Álvaro Monteiro (PS); Vice-Presidente: - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (PSD); Secretários:- Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS); José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP); António Cândido Miranda Macedo (PS); Herculano Rodrigues Pires (PS); Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo (PSD); Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS); Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP).

O Sr. Presidente: - Sejam bem-vindos os Deputados que agora iniciam as suas funções. Quero também dirigir uma palavra de saudade e de reconhecimento aos méritos e às qualidades dos Deputados que partem.
Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral para uma intervenção.

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começa hoje o debate parlamentar acerca do Programa do II Governo Constitucional. Compete-me definir aqui a posição oficiai] do CDS, que é de apoio ao novo Governo. Antes, parem, de entrar no âmago da intervenção que me proponho fazer, gostada de endereçar muna saudação especial ao Sr. Primeiro-Ministro e a toda a sua equipa, felicitando-os pelas altas funções em que foram empossadas e desejando-lhes o maior êxito na difícil missão a que meteram ombros. E, se me é permitida uma mota die cunho partidário, quero fazer desta tribuna uma referência calorosa aos meus amigos e colegas centristas que integram o Governo. Nós, no CDS, sofremos demasiados ataques, caminhadas e até agressões físicas para que postamos deixar passar em o aro este momento, que é de reconhecimento público dos méritos de um partido, da lucidez de uma estratégia e da exemplaridade de um comportamento político.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faz hoje precisamente dos meios que esta Assembleia derrubou o I Governo Constitucional. Foi longa a crise então aberta, e muitos portugueses, não habituados às demoras próprias de uma negociação democrática, acharão, porventura, que ela foi longa de mais.
Mas em democracia as soluções têm de ser encontradas pelo diálogo, pela concertação, pelo compromisso - e não saem, como em ditadura, da vontade imperativa de um só, antes implicam toda uma série de deliberações internas dos partidos envolvidos e de ajustamentos recíprocos destes entre si, que não permitem muitas vezes avançar tão depressa como se pretenderia.
Vale a pena, em todo o caso, sublinhar que a crase se desenrolou de forma pacífica e normal, com completo respeito das normas constitucionais aplicáveis e sem perturbações da ordem pública, sem momentos significativos de agitação social e sem querelas partidárias excessivas ou reprováveis.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Os órgãos de comunicação social, à parte uma ou outra especulação inevitável, contribuíram de um modo geral para o ambiente responsável que se viveu.

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Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - As Forças Armadas não exerceram qualquer interferência ao desenvolvimento do processo ide superação da crise. O Conselho da Revolução foi ouvido nos termos constitucionais sem que jamais transparecesse em público o que quer que fosse das suas deliberações ou dos votos individuais de qualquer dos seus membros. E, para cúmulo, o segundo maior partido português atravessou todo este período a braços com uma crise interna - que soube resolver genericamente e que pode solucionar com total autonomia sem ingerência de terceiros nos seus assuntos internos.
Creio que cotes factos merecem ser postos em conjunto e devidamente sublinhados. Não só porque tiveram, no período em que ocorreram, um efeito altamente benéfico na sedução ao mínimo dos factores de crise mas também porque representam, para o futuro, um exemplo a reter, uma garantia a conservar e um valioso precedente a seguir.
Alguns analistas de vocação e ofício recusam a tais factos qualquer valor positivo, e atribuem-nos à indiferença popular. «Podariam, com verdade, dizer de si próprios, como Aristóteles: «Eu sou o espírito que todo nega!»
Porém, aqueles de nós que mantemos através dos aparelhos partidários um contacto permanente com as bases e, portanto, com o País sabemos muito bem que os nossos concidadãos não estiveram adormecidos durante o desenrolar da crise, nem se mostraram nunca insensíveis às declarações feitas, às posições adoptadas ou aos desfechos passáveis.
Não. Se tudo se passou como se passou, de uma forma que sem exagero poderemos dizer modelar, não foi por acaso, nem por indiferença, nem por insensibilidade.
Foi, em primeiro lugar, porque o povo português é pacífico por natureza e aprecia que os negócios públicos sejam tratados com a serenidade e a compostura de quem está tão seguro «te si que não precisa de gritar paira fazer ouvir a sua voz, nem de incultar para dar forca às suas razões, nem de correr para atingir a tempo o seu destino.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem?

O Orador: - Foi, em segundo lugar, porque os dirigentes partidários compreenderam o que deles se exigia num momento tão difícil e cultivaram a moderação que deles se esperava numa situação tão delicada.

O Sr. Amaro «Sá Cosia (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E foi, em terceiro lugar, porque nesse sentido actuou - pelas condições que tem vindo a criar, pela forma como sempre intervêm e por exemplo que de si próprio dá - o Sr. Presidente da República, que uma vez mais, nesta crise como em tantos outros momentos, se afirmou como verdadeiro garante das instituições democráticas e ficou merecedor, com redobradas razões, da confiança e do apoio de todos quantos sinceramente desejam para Portugal um futuro de paz, de justiça e de liberdade.

Aplausos ao CDS e ao PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O II Governo Constítucional, todos o sabem, resulta de um acordo político previamente celebrado entre o CDS o PS. Não vou aqui relatar como decorreram as negociações que entraram nesse acordo, nem julgo necessário explicar de novo por que motivos de ordem nacional e partidária o CDS não excluiu esta solução do quadro dias hipóteses possíveis e acabou por entender que podia e devia adoptá-la.
Está dito e redito que o Partido Socialista e o Centro Democrático Social são partidos distintos, cuja história, cujos programas e cujos astreados são diferentes e diferentes continuarão a ser. Não temos de renunciar, nem renunciámos, a nada de verdadeiramente essencial para ajustar este acordo. Verificámos, sem, que tínhamos em comum um conjunto de ideias e de princípios capazes de constituírem uma base sólida para cooperarmos no Governo: aderimos a um mesmo conceito de democracia política, aceitamos os dois a participação activa de Portugal na NATO, desejamos ambos o ingresso do nosso país no Mercado Comum europeu, compartilhamos das mesmas opções fundamentais em política externa, encontramo-nos de acordo quanto à necessidade de acatar e fazer acatar a Constituição e o ordenamento jurídico dela decorrente, concordamos a não prosseguir uma política de novas nacionalizações nem uma política de desnacionalizações e, enfim, pudemos concluir que fazemos uma mesma análise da situação política e económica actual do País - necessidade de evitar eleições gerais antecipadas, urgência de encontrar uma solução para a crise financeira e indispensabilidade de renegociar com o Fundo Monetário Internacional.
A partir destas bases, foi possível preparar e concluir entre o PS e o CDS um acordo político principal e, em anexo, dois acordos de política económica e financeira, dos quais resultaram a formação e o programa do novo Governo. Os textos dão-nos satisfação, «solvem nas suas cláusulas um determinado número de problemas que importava clarificar à partida e contém, nalguns preceitos fundamentais, os mecanismos que reputamos necessários e suficientes para solucionar as questões que forem surgindo no decurso da acção governativa e da cooperação parlamentar e interpartidária.
Não moveu o CDS, ao aceitar esta solução, e sei que também não moveu o PS, qualquer motivação de interesse partidário ou de utilidade imediata. Tivemos sobretudo em vista o interesse nacional - que reclamava uma solução, que aconselhava uma solução construída pelos partidos políticos e que impunha uma solução de base maioritária.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Era necessária, antes de mais, uma solução. O País não podia continuar indefinidamente sem um Governo, sem uma política, sem um poder executivo. E precipitá-lo em eleições gerais antecipadas - que aliás nos seriam favoráveis, segundo tudo leva a crer- representaria um erro grave e de custo económico, social e político excessivamente elevado.
Era aconselhável uma solução construída pelos partidos políticos e encontrada entre eles. Foi esse o sentimento predominante nas principais formações existentes, era essa a exigência do interesse nacional, tal

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como nos pareceu dever ser entendido nas circunstâncias actuais, e foi nesse sentido também que &e pronunciou, com a especial autoridade que na matéria possui, o Sr. Presidente da República.
Impunha-se, enfim, unia solução de base maioritária. Porque a fórmula minoritária do Governo já tinha demonstrado as suas insuficiências. Porque essa fórmula havia sido recusada pela Assembleia da República, no voto que proferiu acerca da questão de confiança. E sobretudo parque só um governo maioritário poderia dispor dos apoios parlamentares e nacionais indispensáveis a uma acção governativa eficaz, em particular no combate à crise económica e financeira.
Parece-me importante sublinhar, neste momento e neste lugar, este aspecto que, em minha opinião, constitui por certo o aspecto mais relevante e de maiores consequências políticas da solução ajustada entre o PS e o CDS: o facto de o País contar doravante com um governo constitucional maioritário.
É a primeira vez que tal sucede no actuai regime político e, portanto, é a primeira vez que tal sucede desde os tempos já distantes da I República.
A partir de agora -e se esta Assembleia der luz verde, como se espana, ao novo Governo-, passará a existir uma maioria no Parlamento e no País, com base na qual e em nome da qual governará o II Governo Constitucional. A existência duma maioria é uma novidade. Importa por isso que os principais interessados não tardem em tirar do facto todas ilacções e efeitos que ele comporta e, nomeadamente, como já afirmou a propósito o Sr. Primeiro-Ministro, que a maioria se assuma frontalmente como maioria que é e, por consequência, se organize e estruture de modo a poder desempenhar as funções que nessa qualidade lhe cabem. É a esta luz que deve entender-se a criação duma comissão parlamentar mista PS-CDS, de harmonia com o acordo assinado entre os dois partidos, que deverá constituir-se e entrar em funcionamento muito brevemente.
Mas o facto de passar a haver uma maioria de apoio ao Governo não é a única consequência do carácter maioritário da nova fórmula política em vigor. A segunda consequência, não menos importante, é que doravante existe uma minoria, que essa minoria constituir a Oposição e que, par conseguinte, ao contrário do quis alte aqui vinha sucedendo, a Oposição passou a ser minoritária.
Trata-se dum facto normal. O Governo e a maioria não têm consigo a unanimidade, têm adversários e isso é perfeitamente natural em democracia. Mas a Oposição é agora minoritária e haverá de reconhecer-se como tal.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, nem a Oposição tem o direito de impedir o Governo de governar, porque constitui minoria, nem o Governo terá qualquer pretexto para não governar, porque dispõe de uma maioria.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Ficam mais claras assam as cotas e bem repartidas as responsabilidades à Oposição caberá fiscalizar, criticar e propor alternativas; ao Governo competirá governar e resolver os grandes problemas nacionais.

O Sr. Amaro da Cosia (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Perguntarão alguns: mas será a fórmula política que serve de base a este Governo a melhor fórmula possível?
A política não se compadece com especulações académicas. A verdade é que, no momento de tomar decisões, nenhuma outra fórmula se revelou possível e esta mostrou-se viável. Para quê prolongar exercícios intelectuais cuja oportunidade passou? Fazê-lo pode, porventura, interessar aos que acabaram por ficar de fora e julgam, aliás legitimamente, que poderiam dar no Governo um contributo válido e eficaz. Mas não interessa grandemente ao Governo, nem à maioria parlamentar, nem aos partidos que a formam: porque este Governo .não será julgado peia configuração das suas fronteiras mas sim pela eficácia da sua actuação.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - É, pois, fundamentalmente das condições da eficácia governativa que me ocuparei de seguida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O II Governo Constitucional apresenta-se ao País e a esta Câmara em consequência do acordo político firmado, em 19 de Janeiro do ano corrente, entre o Partido Socialista e o Centro Democrático Social. Por força desse acordo, deu-se corpo a um governo maioritário e a uma maioria parlamentar e nacional. É esta a primeira condição da eficácia de qualquer governo democrático. Está assegurada.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Também nos termos e por efeito do citado acordo PS-CDS, o Governo -que é de base PS e não de coligação- conta com a participação de personalidades do CDS a título individual e não em representação do partido.

Risos do PCP.

É um novo Governo, assente numa nova fórmula política, dotado de novo programa e no qual entraram caras novas em número superior ao que em termos europeus é habitual nestes casos e, sem dúvida, em número bem mais elevado do que o daqueles que transitaram do I Governo Constitucional para este. O propósito renovador é assim evidente e o rejuvenescimento da equipa governativa, incontestável.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A satisfação com que vejo entrar novos nomes, e alguns do meu partido, para o Governo vai de par com a pena que sinto por ver sair homens públicos de valor, que se afirmaram e prestigiaram no anterior Executivo, que merecem uma palavra de louvor pela obra que aí realizaram e a quem faço a justiça de pensar que não irão mudar de combate pelo simples facto de agora mudarem de posto.

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O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador. - A entrada de alguns elementos do CDS para o Governo, bem como a saída deste de alguns membros do PS, tem-se prestado a umas quantas especulações que cumpre não deixar sem a resposta adequada por pane do CDS. E a resposta é, pura e simplesmente, a de que tais especulações não têm qualquer fundamento.
Alega-se que a saída de determinados elementos do PS poderá significar uma maior abertura em relação aos pontos de vista situados à esquerda do PS Ninguém admitirá, com certeza, que o CDS se tivesse disposto a entrar para o Governo, de tal forma e em termos tais que o II Governo Constitucional viesse a ter uma prática política mais à esquerda que a do primeiro.

Vozes do PCP: - É.

Risos do PCP.

O Orador: - Também se insinua (ou se desejaria nalguns círculos) que pelo facto de entrarem para o Governo certas personalidades do CDS poderá passar a haver alguma tolerância ou compreensão para os pontoa de vista situados à direita do CDS. Puro engano. O CDS continuará a adoptar e a exigir de todos os seus militantes um comportamento democrático exemplar. Seremos neste ponto intransigentes. Que não haja quaisquer ilusões a esse respeito.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além das novidades da fórmula que lhe serve de suporte e da composição que apresenta, o novo Governo surge também com uma nova estrutura orgânica e com um novo programa.
Do ponto de vista estrutural, merecem uma referência particular a diminuição do número total de Ministros e de Secretários de Estado, a remodelação da Presidência do Conselho de Ministros, a criação ou reestruturação de determinados departamentos que faziam falta e a fusão ou união de alguns Ministérios e Secretarias de Estado cuja proximidade ou afinidade funcional o vinha reclamando de há muito.
Na impossibilidade de me pronunciar aqui sobre todos os pontos dignos de nota, destacarei apenas um que me parece de longe o mais relevante: Quero referir-me à entrega de responsabilidade das Finanças, do Plano e da Coordenação Económica a um único titular. Solução que, com uma ou outra denominação, vigora hoje em dia em quase todas as democracias europeias, era por muitos (entre os quais me conto) preconizada e defendida de há anos a esta parte. Sem ela não teríamos nunca, com toda a certeza, uma política económica, financeira e monetária global, unitária e coerente. Ora num momento em que se situam precisamente ai os nossos mais graves problemas, a dualidade, a descoordenação e porventura o conflito nessa área constituiriam, fatalmente, caminho certo para o abismo. A concentração das atribuições e competências num único responsável, a que agora se procedeu, aliada à escolha para o lugar de quem é, sem margem para dúvidas, um dos melhores economistas portugueses,..

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... representam, portanto, não apenas um grande passo em frente, mas sobretudo a garantia plena de que o II Governo Constitucional se encontra apetrechado como nenhum outro para enfrentar com ânimo e vencer com êxito o grave problema da nossa crise económica e financeira.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Creio, pois, que sob o aspecto estrutural a nova equipa governativa marca um assinalável progresso no sentido do aperfeiçoamento da orgânica governamental, que de resto se anunciou ora continuar a aprofundar-se no âmbito da tão necessária reforma administrativa, finalmente reconhecida e aceite como tarefa prioritária do Governo.
Passando agora ao Programa do Governo, começarei por recordar que em Agosto de 1976, por ocasião do debate parlamentar de investidura do I Governo Constitucional, declarei nesta tribuna que o respectivo Programa se caracterizava por um louvável esforço de moderação, de realismo e de pragmatismo; que eram especialmente positivos os capítulos relativos à democracia pluralista, à defesa nacional, à política externa e à educação; que, para além die alguns defeitos formais, podia acusar-se o Programa de ser totalmente omisso quanto a determinadas matérias de relevo, como, por exemplo, a política a seguir em relação ao território de Macau ou o enunciado de uma acção eficaz de ordenamento do território e desenvolvimento regional; e, por último, quê o programa não era de modo nenhum satisfatório no capítulo da política económica, financeira e monetária, tendo mesmo a propósito afirmado eu: «O CDS lamenta não ver no Programa do Governo uma saída segura para a crise económica portuguesa.»
Pois bem: O CDS pode hoje declarar, muito diferentemente, que as principais omissões e deficiências do Programa do I Governo foram colmatadas ou rectificadas no Programa do II, sem que este, como é natural, tenha deixado de oferecer os aspectos positivos que o anterior já revelara. Em especial, o CDS deseja saudar o facto de no Programa do II Governo Constitucional se incorporar ou reflectir o essencial da matéria programática incluída no texto dos acordos assinados com o Partido Socialista.
À luz do presente programa e dos acordos políticos e económicos que estão na sua génese, pode seguramente afirmar-se que o II Governo Constitucional definiu tem a forma e o método pelos quais se propõe alcançar aqueles que, no modo de ver do CDS, serão os cinco grandes objectivos que devem marcar e orientar a actividade dos Poderes Públicos em Portugal nos próximos anos, a saber:

1.º - Manter o nosso regime político no quadro duma democracia pluralista;
2.º - Conduzir a saída da nossa economia para fora da crise em que se encontra;
3.º - Organizar a entrada do nosso país para dentro do Mercado Comum europeu;
4.º - Resolver os problemas concretos do povo português;

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5.º - Dar aos Portuguesas confiança em si mesmos e nas capacidades de Portugal.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para muitos dos nossos compatriotas, o grande problema, todavia, não reside nisso: não residirá, com efeito, em desinteligências quanto ao diagnóstico dos nossos males, nem em divergências insanáveis quanto à terapêutica a utilizar, nem sequer - a partir de agora - em desavenças quanto à escolha daqueles que hão-de ser chamados a estudar, a receitar e a aplicar o tratamento. Para muitos, o grande problema é sobretudo este: será que o mal ainda tem cura? Será que o doente ainda se pode salvar? Ainda valerá a pena?
Perante a dúvida que se tem instalado no espírito de tantos, é preciso estar consciente da missão política essencial que ao presente Governo vai competir.
Este Governo tem a responsabilidade de dar resposta às inquietações e interrogações do nosso povo. Este Governo tem a seu cargo a difícil tarefa de suscitar a fé e a esperança no coração dos Portugueses. Este Governo tem de ter a noção clara de que tudo é possível se houver coragem, força de vontade e trabalho.
Numa palavra, este Governo tem de saber que pode ter êxito. Os dois partidos que o apoiam têm de saber que podem ganhar esta campanha em que se empenharam. O povo português tem de saber que pode sair da crise em que se acha mergulhado.

Vozes do CDS:- Muito bem!

O Orador: -Como estávamos mos «m 1974? Estávamos em ditadura, estávamos em guerra, estávamos voltados para o Terceiro Mundo.
Como estamos hoje? Estamos em democracia, estamos em paz, estamos voltados pana a Europa.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Como editávamos em 1975? Em plena agitação revolucionária, a caminho do totalitarismo e sob o domínio de governantes não desejados nem escolhidos por nós.
Como estamos hoje? Em plena normalidade constitucional, em liberdade pacífica e governados por dirigentes livremente eleitos pelo povo português.

Vozes do CDS e do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - E o CDS no Governo!

O Orador: - Em quatro anos apenas, quantas transformações, quantas angústias, quantas lutas, mas também quantas vitórias?

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Será que nos vai faltar o ânimo quando nos resta apenas travar a última grande batalha?
A verdade é que Portugal dispõe actualmente dos meios necessários para vencer a crise que o atormenta.
Estamos, é certo, enfraquecidos na nossa moeda, empobrecidos nas nossas finanças, desorganizados na nossa economia. Mas nem tudo são dificuldades. Somos um povo que trabalha ...

A Sr.ª Ercília Talhadas(PCP): - Com o CDS no Governo!

O Orador: -..., temos consideráveis recursos naturais para explorar, estamos a criar salutares hábitos de poupança, temos quem queira investir entre nós, dispomos de um apoio internacional tão intenso como raramente se terá manifestado, abrem-se-nos novos mercados e novas cupom unidades nos quatro cantos do mundo, dispomos de tecnologias com interesse para inúmeros países menos desenvolvidos que nós, beneficiamos de uma posição geográfica e estratégia de grande relevo, temos uma cultura enriquecida pela história e pela abertura ao exterior, somos considerados bem-vindos no Mercado Comum europeu, continuamos parceiros desejados e apreciados na NATO, contamos com umas Forçais Armadas hierarquizadas, disciplinadas e dignificadas...

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!

O Orador: -.... possuímos uma juventude numerosa e animada de ideal, vivemos em paz, não sofremos ameaça nas nossas fronteiras, nem alimentamos ambições territoriais que nos possam envolver em guerra contra terceiros: com todas estas vantagens e com tantas cartas para jogar, por que esperamos para arrancar definitivamente para a frente?

O Sr. Amaro da Cesto (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Não fiquemos todos à espera da solução supostamente ideal, que talvez chegasse numa manhã d(c) nevoeiro... O sebastianismo aplicado a uma economia do século XX não terá nunca a beleza de um sonho poético, será apenas um sinónimo rude e feito de pobreza, de enfraquecimento e de marginalização no concerto das nações.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - De modo que este Governo tem de desbloquear os ânimos e as vontades, concitar a confiança e afastar as dúvidas, as incertezas e o cepticismo. Tem de dar um sopro de vida, de frescura e de eficácia à política portuguesa. E tem de explicar ao nosso povo que se Portugal não poderá ser nunca o país mais poderoso do mundo, nem pode ser tão cedo o mais rico ou o mais avançado, pode, com certeza e desde já ser o mãos aberto, o mais generoso e o mais humano.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Vencer a crise está ao nosso alcance. Não é tarefa excessiva nem demasiado pesada para nós. Bastará que os governantes tenham a coragem moral necessária para tomar as decisões difíceis que se impõem; que os políticos tenham o bom senso necessário para compreender e viabilizar a fase delicada que nos espera; que os empresários tenham a

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lucidez necessária para assumir a sua responsabilidade fundamental que é empreender, investir e administrar; que os trabalhadores tenham a vontade e a disposição necessárias para se dedicarem à produção com redobrado afinco; que os funcionários públicos tenham o zelo e a diligência necessários para colaborar com competência e executar com prontidão; e que os grupos ou categorias mais favorecidos tenham a inteligência necessária para aceitar novos e mais pesados sacrifícios que o bem comum lhes vai exigir.

Vozes do PCP: - Claro!

O Orador: - Que todos os portugueses, em suma, aceitem ter hoje menos do que desejam para poderem receber amanhã mais do que prevêem.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O esforço que de todos vai ser exigido será grande. Por isso terá de ser concentrado.
Façamos pois convergir, durante os próximos doze meses, todas as nossas atenções e capacidades no objectivo prioritário - vencer a crise económica. Não nos desviemos um só milímetro do essencial, não nos deixemos distrair pelos diversos incidentes do dia-a-dia, nem nos perturbemos com pequenos factos que não ficarão na história.
Se assim for, estou certo de que conseguiremos alcançar essa vitória por que todos os portugueses anseiam e, então, lançados com firmeza os alicerces, partir de bases mais sólidas para a construção dia felicidade, da grandeza e do futuro de Portugal.

Aplausos do CDS e do PS.

O Sr. Presidente: - Os nossos trabalhos continuarão às 15 horas.
Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Cardos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados e Sr. Deputado Freitas do Amaral: Depois de ouvirmos o Sr. Deputado, as preocupações que temos nesta bancada relativamente à solução governativa encontrada resultam acrescentadas, não pela sua afirmação de que não haverá política mais à esquerda - já o esperávamos - nem tão pouco pela organização do seu texto e pelo estilo em que o vasou, falando agora como homem do Governo. Estilo, aliás, que recorda um tipo de discurso que durante décadas se tornou inconfundível para os Portugueses - não é uma acusação de plágio.
Mas passo então a formular as perguntas.
O que significa «que a maioria se assuma frontalmente como tal»? Frontalmente, em face de quem?
o que significa estruturar a maioria? O que significa organizar a maioria? O que significa «que a minoria se assuma como tal»? Que direitos lhe retira? Compartilha do ponto de vista do Sr. Primeiro-Ministro, segundo o qual o CDS revelou, no decorrer das negociações, uma grande abertura ou, pelo contrário, pensa que o CDS atingiu, quer no que toca ao programa, quer no que toca à distribuição de pastas e de outras posições, os objectivos fundamentais que tinha em vista? Recordo-lhe que o Sr. Deputado afirmou que o CDS não renunciou a nada de essencial. E, depois de tudo isto, o que significa vencer a última batalha?

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Leite, também para pedidos de esclarecimento.

O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Freitas do Amaral: Formulo uma pergunta simples: O Sr. Deputado; em tempos não muito longínquos, concretamente em Julho de 1976, disse que o problema da construção do socialismo em Portugal estava ultrapassado, não porque, note-se, como entende o St. Primeiro-Ministro, a questão do socialismo se tenha de meter na gaveta, mas porque, imagine-se, para o Sr. Deputado Freitas do Amaral Portugal era já um país socialista.
Sendo certo que o CDS tudo fará pelo capitalismo e nada pelo socialismo, eu pergunto: O CDS entra agora para o Governo porque considera que o I Governo Constitucional restaurou em Portuga! o capitalismo?

Risos do PSD.

Ou entra para o Governo na intenção, aliás lógica, na opinião do partido do Sr. Deputado, de destruir aquilo que entretanto foi conquistado e que o próprio Sr. Deputado Freitas do Amaral considerou como passos fundamentais na construção de uma sociedade socialista em Portugal?

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, também para pedidos de esclarecimento.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Professor Freitas do Amaral, deputado nesta Assembleia e principal responsável do Partido do Centro Democrático Social, foi particularmente claro na sua intervenção. Afirmou que este Governo era forçosamente mais à direita -não o fez por estas palavras, mas é claro que o disse- e que, se não fora assim, naturalmente o CDS não poderia dele participar.
No estilo, nos esquemas lógico-formais e nas subtilezas mostrou ser um homem de raras qualidades...

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Muito bem!

O Orador: -... , mas mostrou também ter um passado e uma ascendência política que não ilude ninguém, Sr. Deputado.
Tendo o Sr. Deputado a certa altura afirmado que «se não nos preocuparmos com certos pequenos factos que não ficarão na história ...» e tendo concluído «... pelo êxito e peio futuro desta aliança do PS com

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o CDS», sem contudo nos dizer o que eram os pequenos factos que não ficarão na história, e como os safanões dados a tempo também são pequenos factos que não ficam na história, eu atrevo-me a perguntar ao Sr. Professor, e Deputado nesta Assembleia, Freitas do Amaral, o que é que pretende significar com os pequenos factos que não ficarão na história. Pergunto, por exemplo, se são pequenos factos o aumento do custo de vida que se avizinha e que se anuncia com o Programa deste Governo, se são pequenos factos a perda do poder de compra dos salários, que também se anuncia, se são pequenos factos a falência de pequenas e médias empresas e o despedimento em massa, se são pequenos factos a interferência inconstitucional nas organizações sindicais dos trabalhadores, se são pequenos factos os prejuízos que certamente resultarão, para a democracia e pana a prática democrática, dos choques que tudo gerará, se são pequenos factos o aumento da dependência económica do imperialismo e os prejuízos que isso causará à nossa independência, se são estes pequenos factos que não ficarão na história do Sr. Professor, e Deputado nesta Assembleia, Freitas do Amaral.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Nogueira.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros: O Sr. Deputado Freitas do Amaral rotulou de exercícios intelectuais os juízos e opiniões políticas da Oposição sobre a política nacional que não coincidam exactamente com a opinião do Governo PS/CDS. Rotulou ainda de especulações os juízos e opiniões políticas que a Oposição formula e formulará sobre a entrada de membros do CDS para o Governo. A pergunta que faço é a seguinte: será que com esses rótulos, aliás errados ou mal aplicados, o Sr. Professor pretende começar, desde já, a dar lições à Oposição sobre o que se pode e não pode, deve e não deve disser? Será que com estes rótulos o Sr. Professor pretende começar a tapar a boca à Oposição?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por antepor às minhas respostas às perguntas da bancada do PCP a verificação de que o Partido Comunista não encontrou na minha exposição da manhã grandes possibilidades de ataque ou contestação.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Essa é boa!

O Orador: -- E não conseguiu, através deste número elevado de perguntas, pôr em causa nem a defesa da fórmula que aqui fiz, nem as considerações que apresentai sobre as condições de eficácia do trabalho governativo. Nada daquilo que era essencial no meu discurso foi atacado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Isto apesar de o Partido Comunista ter podido beneficiar de duos horas suplementares para meditar nas perguntas que me havia de pôr.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Deixo de lado as referências quase insultuosas quanto a problemas de estado. Sei onde querem chegar, mas devo dizer que não me perturba nada essa vossa intenção. O «estilo é muito diferente, desde logo neste ponto: é que os meus textos são ditos nesta Assembleia e sobre eles aceito responder ao Partido Comunista.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Concretizando as respostas às perguntas do Sr. Deputado Cantos Brito, quero dizer-lhe que quando me refiro à necessidade de a maioria de assumir frontalmente como tal, estou naturalmente a pausar que o deve fazer face à Oposição. Quando faio em organizar e estruturar a maioria, refiro-me à necessidade de pôr em prática, como aliás disse no meu discurso, toda uma série de mecanismos que estão previstos nos acordas celebrados entre o PS e o CDS, designadamente quanto à cooperação parlamentar e governamental. E, quando digo que, em ratona opinião, a minoria se deve assumir como tal, refiro-me à necessária modificação psicológica nos espíritos dos deputados da Oposição, resultante do facto de que até agora, sob a égide do I Governo Constitucional, vivíamos numa situação algo aberrante em democracia, que era a de a minoria ser Governo e a maçaria ser Oposição, ao passo que agora que vamos viver numa situação mais normal, em que a maioria apoia o Governo e a Oposição é minoritária.
Pode pois o Sr. Deputado estar sossegado que com esta declaração não pretendo ide modo nenhum retirar, ou propor que se retirem, quaisquer direitos à Oposição, e o Sr. Deputado recordar-se-á provavelmente de que o Estatuto da Oposição foi apresentado mesta Casa pelo CDS, e será certamente mantido, até estaremos dispostos, Sr. Deputado, se nisso virem interesse, em acrescentar ao Estatuto da Oposição tal como foi votado aqueles outros direitos que nós propúnhamos para a Oposição e que outros partidos, designadamente o PCP, cortaram no Estatuto que foi aprovado.

Aplausos do CDS.

Quando disse que o CDS não tem de renunciar a nada do que para si é essencial, não me refiro às negociações dos problemas conjunturais do momento, porque toda a negociação é um compromisso, refiro-me obviamente ao projecto político de longo prazo.
Já aqui foi declarado pelo Sr. Primeiro-Ministro, como Secretário-Geral do Partido Socialista, que o Partido Socialista, como é natural, não renuncia ao seu projecto finai da construção do socialismo. O CDS também não renuncia ao objectivo final da construção de uma sociedade democrata-cristã inspirada no personalismo e no humanismo cristão.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Simplesmente, uma coisa são os projectos políticos de longo prazo, outra coisa são os programais da Governo para resolver problemas con-

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cretos, sobretudo em momentos de crise. De resto, ou gostaria de recordar que para a constituição do II Governo todos os quatro maiores partidos desta Assembleia participaram em negociações. Todos aceitaram, à partida, poder negociar com vista ao encontro de uma nova fórmula de que saísse o II Governo Constitucional, incluindo o PCP, que também aceitou negociar - com certeza que não o fez na disposição de renunciar a qualquer coisa que para si fosse essencial.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador:- Sr. Deputado Carlos Brito, quanto à última questão, sobre o que pretendamos dizer com a expressão «vencer a última batalha que falta travar», muito claramente, como resulta do contexto do discurso, nessa parte referia-me â grande batalha que é necessário travar para vencer a crise económica. Esse é, no conjunto das grandes batalhas deste período e das consequências da turbulência revolucionária, a última grande batalha que falta vencer e que é necessário vencer se quisermos preservar a democracia e a independência do nosso país.

Vozes do CDS: - Muito bom!

O Orador: - Ao Sr. Deputado Jorge Leite eu dir-lhe-ia o seguinte: nós pensamos que de facto, como eu disse no discurso de Julho de 1976, foram dados passos muito importantes no sentido da transformação das estruturas económicas e sociais do País, de modo a poder dizer-se que o nosso país e já, sob certos aspectos, um país com estruturais socialistas. Não entrámos neste acordo de entendimento com o Partido Socialista nem entrámos para o Governo com a preocupação de restaurar o capitalismo, nem com a preocupação de destruir aquilo que foi conquistado legitimamente com o 25 de Abril. Isso está duo e redito e consta do próprio testo que assinámos com o Partido Socialista e que aliás reproduz declarações que eu já tinha feito várias vezes. Não entrámos com esses objectivos, entrámos com a preocupação de conseguir ajudar o nosso país, que está em aflição, a vencer este transe e a superar a sua crise.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Falso!

O Orador:- Sr. Deputado Veiga de Oliveira, enganou-se na citação que fez da minha intervenção. Eu nunca declarei nem declaro que este Governo e um Governo mais à direita do que o I Governo Constítucional. Senão não participaríamos nele. O que eu disse foi que nós não aceitámos participar no Governo para o tornar mais à esquerda do que aquilo que ele era quando só o Partido Socialista lá estava, o que é, apesar de tudo -faço justiça à inteligência do Sr. Deputado-, bastante diferente.
Quanto à minha referência aos pequenos factos, posso sossegar o Sr. Deputado. Efectivamente, eu não considero que o aumento do custo de vida seja um pequeno facto, que não é. Tenho-o dito muitas vezes nesta Casa e o Sr. Deputado, que no seu grupo parlamentar e no seu partido tem bons ficheiros, pode encontrar essas declarações. Não considero a perda do poder de compra nem as falências que se produzi um pequeno facto, nem a perda da independência nacional seria um pequeno facto, obviamente, embora ela tenha estado muito mais arriscada em 1975, por culpa do seu partido, do que estará em 1978.

Aplausos do CDS.

Mas quero dizer que para mim nada disso são pequenos factos. O que eu queria dizer era que temos de nos concentrar sobre o essencial. O essencial é o grande esforço nacional que é preciso fazer para vencer a crise económica e financeira que nos pode deitar para o abismo e os pequenos factos a que eu me referia são as tricas, são os questiúnculas, são as querelas partidárias estéreis, são todos estes pequenos incidentes e pequenos nadas do dia-a-dia, a que por vezes algumas pessoas tendem a dar muita importância, mas que no fundo não a tem. E já agora, se me permitem, incluirei também no grupo dos pequenos factos aquelas pequenas batalhas que por vezes o PCP trava para depois, alguns meses mais tarde, vir a dizer que já não é preciso voltar ao assunto porque não gosta de lutar por causas perdidas.
Finalmente, e em relação à Sr.ª Deputada Alda Nogueira, queria dizer-lhe que não pretendo dar lições a ninguém, pode ter a certeza disso. De resto, nestes últimos três anos e meio tenho tido poucas oportunidades de exercitar a minha profissão. Como sabe, fui saneado de professor da Faculdade de Direito de Lisboa. Não me consta que o Partido Comunista se tenha preocupado muito com isso ou tenha sustentado que não deveria haver saneamentos políticos em democracia.
Fui convidado, já em Outubro ou Novembro de 1977, para regressar à faculdade a que pertenço...

O Sr. Domingos Abrantes (PCP): - Sinal dos tempos!

O Orador:- Sinal dos tempos! Tem razão, Sr. Deputado. Sinal de que finalmente, vamos tendo democracia. Ou V. Ex.ª quer defender, com essa sua observação, que eu deveria continuar saneado de professor e do cargo que conquistei .por provas públicas? Será isso que V. Ex.ª pretende defender?
Quero dizer-lhe, portanto, que não tenho a intenção de dar lições à Oposição, mas tenho o direito, como Deputado, de dizer o que penso acerca do modo como a Oposição e deve comportar, tal como os Srs. Deputados da Oposição tem o direito de dizer o que pensam acerca do modo como o Governo ou os partidos que o apoiam devem conceber essa função. De ambos os lados temos esse direito e, como eu não faço tenção de cercear, no mínimo que seja, os direitos da Oposição, também pediria à Oposição, e em crucial ao PCP, que não procurasse cercear os direitos ou do Governo ou dos partidos que o apodam.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha para uma intervenção.

O Sr. Salgado Zenha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Compete-me a mim, em nome do Grupo Parlamentar

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Socialista, exprimir o seu ponto de vista sobre o II Governo Constitucional e o seu Programa. A nossa posição é a de aprovação e de apoio.
Depois de 28 de Maio de 1926, ou seja, após o intervalo de mais de 50 anos, e este o primeiro Governo pluripartidário que - a persistir - estará legitimado na sua origem pelo voto popular e democrático.
Nos termos da nossa Constituição, todo o governo, para se habilitar constitucionalmente, deverá beneficiar de uma ampla investidura por parte de dois Órgãos da Soberania popular: O Presidente da República e o Parlamento. O presente Governo foi empossado pelo Presidente da República. Reata agora que esta Assembleia sobre ele se pronuncie. Um dos pontos que a Oposição parlamentar mais tem censurado é a sua competição pluripartidária.
No entanto, tal composição pluripartidária foi de regra na maioria dos Governas Provisórios, ou mais concretamente, em todos eles, excepto no quinto. De regra foi também durante a í República. Na monarquia liberal foi pouco frequente, embora todos a acatassem como facto institucionalmente normal, sempre que ocorreu.
Por que motivo haverá agora que estranhá-la?
Nós, socialistas, consideramos que a composição do actual Governo de dominante socialista e participação adjuvante CDS é salutar, democrática e patriótica. Expliquemo-lo.
A maior parte da Europa foi corroída por uma epidemia ditatorial e fascista, após a Primeira Guerra Mundial Portugal também foi por ela contaminado. Por razões históricas de todos conhecidas, aconteceu que em Portugal essa ditadura foi mais longa do que nos demais países. Contudo, se é certo que a democracia actual é uma democracia nova, virada para o futuro, com inúmeras características derivadas das nossas vivências próprias, não menos certo é que ela reata a tradição liberal e parlamentar da monarquia constitucional e da I República, cuja prática de mais de um século ainda hoje nos inspira em medida apreciável. Não é por acaso que os nossos debates têm lugar nas mesmas Cortes de S. Bento, onde presentemente pousa o coração da vida política portuguesa, tal como anteriormente sucedera na monarquia e na república democráticas.
Após uma ditadura de quase meio século, não é de admirar que entre nós tivesse havido sérios confrontos. De qualquer mudo, cies não atingiram a violência da guerra civil de 1832-1834, que foi seguida do mais duradoiro período de vida constitucional portuguesa. Estamos convictos de que o velho ditado «após a tempestade a bonança» se confirmará mais uma vez. Com a diferença de que as regras do viver na tempestade e na bonança não são precisamente as mesmas.
Como já muitas vezes tem sido dito, a reinstauração da democracia em Portugal coincidiu com um difícil e inevitável processo de descolonização e o alastrar duma grave crise económica mundial que nos atingiu duramente. Aliás, a própria Revolução de 25 de Abril entrelaça-se dialecticamente nesses dois fenómenos, que em parte a precipitaram.
Sob o ponto de vista da política internacional, é patente a luta pela modificação da actual relação de forças entre as potências e os blocos respectivos, luta essa que encontra a sua expressão privilegiada na guerra económica e nos conflitos militares localizados.
Neste contexto, a construção de um Portugal democrático é, também, um combate pela independência nacional, o que exige de todos .nós um esforço concertado e patriótico.
Há que rejeitar a mitologia liberal de que a representação parlamentar esgota por ai a vida democrática, mito esse que é frequentemente repudiado pela nossa Constituição. Não a esgota, mas e um dos seus elementos mais significativos. A nossa democracia é, constitucionalmente, uma democracia parlamentar, ou seja, uma eurodemocracia. E quer os comunistas portugueses contestem, ou não, a existência do eurocomunismo, que tanto incomoda a rigidez do seu leninismo passadista, a verdade é que o regime português é eurodemocrático, na linha das melhores tradições progressistas portuguesas. É e será.
A democracia parlamentar portuguesa tem encontrado ao longo da sua história várias contestações permanentes. Uma delas de extrema-direita que encontrou em Salazar o mais aguerrido dos doutrinários. Outra de lastro anarco-sindicalista na I Republica, que ressuscitou explosivamente no anarco-populismo do tempo, de Vasco Gonçalves. Será ingenuidade supor que essas tendências de inspiração autoritarista ou anarquista, bem vivas e embaraçosas na história portuguesa, desapareceram como que por milagre. Simplesmente, a democracia expande-se pé a democracia. O supremo mandamento da democracia é: não perseguiras! Não podaremos admitir que os Portugueses se persigam de novo através de inquisições religiosas ou políticas, divididos pela intolerância e pela impotência de assumir a liberdade em responsabilidade.
Se é certo que uma democracia se constrói com democratas, não menos certo é que uma democracia nunca se pode firmar por métodos antidemocráticos. Tantas vezes se tem discutido qual o caminho para vencer as nossas dificuldades. E no entanto ele é bem simples: democracia, justiça social, organização, educação, disciplina e solidariedade nacional. Fora destes princípios, não há salvação. Pretender viver-se em sucessivas e histéricas amarqueiraidas só poderá levar ao retorno da ditadura. Pretender que votar atrás é a solução poderá ser o apelo ao covarde, não a bússola de um povo viril e corajoso.
Há que pôr termo à guerra civil fria em que temos vivido desde decénios, primeiro durante a ditadura e depois, na revolução. Há que viver em Portugal, para Portugal, e como portugueses.
Após a fase revolucionária dos governos provisórios, e uma vez jugulada a insurreição anarco-populista de 25 de Novembro, nós, socialistas, pensamos que, no caso de ganharmos as eleições, o I Governo Constitucional deveria ser composto apenas por socialistas e independentes. Estando excluída a participação do PCP, pela própria natureza das coisas, pois não pode governar em democracia parlamentar quem nela não acredita e contra a qual combateu, receámos quis uma aliança com outros partidos pudesse desencadear tendências revanchistas que, em última análise, fizessem perigar a própria organização democrática e constitucional.
Porém, após 16 meses duma actuação a tantos títulos notável, o I Governo Constitucional foi derrubado

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por esta Assembleia. E do auscultar do seu voto, bem como das determinações do Sr. Presidente da República, resultou que a anterior fórmula não poderia ser reenviada antes teria ds assentar num pacto com outro ou outros partidos, que garantisse ao novo Governo uma base parlamentar alargada.
A primeira característica de um democrata é agir democraticamente. Daí o nosso acordo com o CDS, do conhecimento público, que tanto o CDS como nós honraremos escrupulosamente.
Não há democracia sem compromisso!» democráticos, como não há compromissos democráticos sem lealdade democrática. Seremos fiéis a estes principiou. Sempre assim temos procedido.
Findo o I Governo Constitucional cabe aqui uma palavra de elogio à sua obra patriótica, progressista e pacificadora, com especial destaque para o Primeiro-
Ministro Mário Soares cujo prestigio é cada vez maior no País e na comunidade internacional.

Aplausos do PS.

Cumpre-nos também exprimir o nosso aplauso à pessoa do Presidente da República, General Ramalho Eanes, cujo elevado senso arbitrai, democrático nacional é um dos pilares mais seguros da nossa vida constitucional.

Aplausos do PS e do CDS e dos membros do Governo.

Algumas criticas tem sido feitas ao nosso pacto com o CDS, conforme se tem verificado hoje nesta Assembleia, mas sem razão de ser.
O Partido Socializa é adepto do socialismo em liberdade.
Para nós a ditadura colectivista não é o socialismo. Assim como o socialismo não se distingue do capitalismo pelo grau da extensão do seu sector público, mas pena natureza do seu modo de desenvolvimento económico e cultural.
Os regimes colectivistas que se intitulam hoje só «socialismo real», para utilizar uma conhecida expressão, não foram até hoje senão o produto do subdesenvolvimento económico e cultural. Não triunfaram nunca em nenhum Estado desenvolvido, não apenas em países atrasados. Nunca surgiram a partir de estruturas democráticas e através de processos democráticos oriundos dessas mesmas estruturas.
Trata-se de ditaduras colectivas, não de regimes socialistas democráticos. Para nós. colectivismo e socialismo são algo de muito diferente. Não somos colectivistas, como jamais sacrificaremos u liberdade ao socialismo Este. para nós é a liberdade potenciada ao serviço da liberdade do homem e não à instrumentalização do Estado, de monopólios de listado e de partidos únicos para a criação de novas formas de dominação do homem pelo homem.
O socialismo democrático é uma estratégia de libertação do homem do medo, da miséria da exploração e da dominação. E jamais se poderá libertar o homem suprimindo a liberdade. Isso é e seria um contra senso.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Daí que para consolidar a liberdade se possa e deva firmar com um partido como o CDS, um pacto que tem por fim o progresso de. Portugal e a consolidação da democracia.
Isto não significa que não cotejamos abertos a reatar as negociações com o PSD. com vista à efectivação de um acordo de tipo semelhante ou outro, que não altere as características do Governo actua! Ou com o PCP, para sem incidências governamentais procurarmos encontrar a resolução de problemas para bem do povo português.
Pensamos serem tantas as nossas dificuldades, que devemos reduzir os nossos desentendimentos. Sendo certo que prosseguiremos sem desfalecimentos se porventura, os nossos interlocutores julgarem de modo diverso.
O Programa de Governo apresentado a esta Assembleia é um programa de estabilização económica, democrática e constítucional e também um programa de independência nacional, pois que visa a reduzir o nosso deficit externo, verdadeiro e urgente imperativo patriótico.
Quero ainda saudar aqui todos os membros do II Governo Constítucional, seja qual for a sua posição política: PS, CDS ou Independentes. Sobre eles impedindo uma missão histórica. Cumpri-la-ão, como nós cumpriremos a nova.
Faço um apelo a todos os portugueses para que através da diversidade das suas opções políticas, lutem pelo nosso porvir. Não há que voltar para trás, nem destruir o presente. Há, sim, que caminhar para o futuro, construindo-o com o nosso trabalho, a nossa coragem, a nossa inteligência e a nossa determinação.
O acordo PS/CDS que está na base do presente Governo permitir-lhe-á trabalhar frutuosamente para a sua realização ale 1980. Nessa altura, os Portugueses ajuizarão livremente através do seu voto.
Então melhor se compreenderá que a democracia é uma prática e que o socialismo ê uma esperança. E essa esperança chama-se povo português.

Aplausos do PS e do CDS e dos membros do Governo.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Para um breve protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr Primeiro-Ministro e Srs. Ministros: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, desejo protestar contra a afirmação do Sr. Deputado Salgado Zenha de que o meu partido e os comunistas não acreditam na democracia.
Não vamos dizer como o CDS a propósito de tudo e de nada, que é um insulto ou unia afirmação quase insultuosa. Quanto a nós e pior do que isso. Da parte do Sr. Deputado Salgado Zenha e um ataque gratuito e uma vez que reduziu tudo a uma que tão de fé, nós admitiríamos que isso pudesse ser dito por outra pessoa, mas não pelo Sr. Deputado Salgado Zenha, que conviveu connosco nas cadeias; fora delas, que conviveu tão perto de nós, e que sabe quantos os sacri-

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ficámos e quanto nos empenhámos na luta pela democracia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Salgado Zenha.

O Sr. Salgado Zenha (PS). - Pedi a palavra, Sr. Presidente, só para prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Brito.
A minha expressão não foi a de que o PCP não acreditava na democracia, mas sim a de que não acreditava na democracia parlamentar.
Aliás, eu creio não ter utilizado qualquer expressão injuriosa É uma expressão repetidamente feita pelos mais altos líderes do vosso partido Ainda recentemente o Dr. Álvaro Cunhal o afirmou na Faculdade de Letras de Lisboa. conforme relatos vindos- nos jornais - apenas se poderá pôr a hipótese de o relato não ser verídico, o que, evidentemente, poderá acontecer.
Mas, realmente, recordando as posições do vosso partido durante o ano de 1975, em que tal afirmação foi repetida a saciedade, nesta Assembleia e fora dela, creio que citei um facto que se pode considerar como histórico Julgo, portanto, que o »eu protesto não um fundamento.

O Sr Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra.

O Sr Presidente: -Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É um e sela ré e i manto muito breve, para dizer que o Sr Deputado Salgado Zenha está a fazer confusão com a afirmarão de que. Portugal não é uma democracia parlamentar Temo-la sustentado e, naturalmente, estamos no direito de o fazer, pois é uma interpretaçâo nossa do Estado português, como está inscrito na Constituição A afirmação de que temos combatido a democracia parlamentar, essa é sua Sr. Deputado.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou dar-lhes uma boa notícia não há mais inscrições, pois que, com certeza, terminou o debate.

Risos.

Posso dar já a palavra ao Governo, mas, como eu sou muito paciente, vou esperar um bocadinho que os senhores subam as escadas e venham inscrever-se.

Risos.

O mais curioso é que ninguém se mexe.

Risos.

Pausa.

Tem a palavra o Sr Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, eu espero que não esteja a contar o tempo ao meu partido, que é pouco. Apesar de não haver inscritos, temos ainda muita coisa para dizer.
Eu propunha que houvesse uma interrupção organizarmos as diversas intervenções é evidente que não será aceitável que um partido se suceda na tribuna, que o Governo entretanto não exponha aquilo que até agora ainda não expôs ou ainda que, em alternativa, se encerrasse agora o debate quando ainda há muita coisa para dizer.
Portanto, para se organizar tudo isso, eu propunha uma interrupção de meia hora para que o Sr. Previdente e a Mesa decidissem como organizar a continuação do debate.

O Sr. Presidente: - Quanto à questão de a Mesa organizar o debate, eu acho um bocado difícil. Os senhores é que hão-de organizar o debate como quiserem. No entanto, dada a vossa exposição e como já se encontra na Mesa um requerimento a pedir a, interrupção, a sessão fica suspensa por meia hora.

Eram 15 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amónio Rebela de Sousa.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados: Para se proceder a uma análise sistemática da política económica que o Governo se propõe prosseguir, no sector do comercio e no domínio do contrôle de preços, importa ter presente que a mesma se encontra, fundamentalmente, condicionada pelas grandes linhas gerais de actuação ao nível da organização da economia e do Programa de Estabilização para 1978.
Daí que se torne possível considerar dois níveis distintos de análise:
- o da articulação das grandes linhas gerais da actuação nos domínios da organização da economia e do Programa de Estabilização Económica para 1978 com as medidas sectoriais previstas para o comércio interno e externo e para o contrôle de preços, dentro de certos limites;
- o da eficácia, coerência interna e aplicabilidade das medidas sectoriais propostas.
Em termos gerais, as orientações a prosseguir no domínio da organização económica apontam para a necessidade de se regulamentar as leis fundamentais, as quais definem a matriz caracterizadora do sistema económico-social em que iremos viver, e para a coexistência de diferentes sectores concorrenciais, bem como para «o reconhecimento do mercado como fonte de dados importantes para a racionalidade da economia portuguesa».
Todavia, o Programa de Governo nada adianta de concreto quanto aos critérios gerais a que essa mesma regulamentação deverá obedecer, omitindo, também, qualquer referência a uma lei da concorrência, o que não deixa de se revestir da maior importância em termos de política de preços, tanto mais que, no mesmo programa, se fala na necessidade de uma «política de verdade», neste domínio.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - De facto, não se percebe que o Governo se esqueça de que os vícios provocados por uma excessiva concentração das estruturas produtivas podem e devem ser contrariados pelo funcionamento de uma lei disciplinadora das relações de mercado, em que, nomeadamente, se tenha presente a necessidade de se evitar situações de discriminação entre o sector público e o sector privado, controlando-se, simultaneamente, as práticas de abuso de posições dominantes (que por sinal, também podem verificar-se nos sectores vedados à iniciativa privada) e o exercício de práticas comercia» restritivas.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, não deixa de ser significativo constatar-se que o Programa de Estabilização para 1978, tal como é apresentado no Programa do Governo em apreciação, não apresenta diferenças relevantes em relação aos principais elementos caracterizadores do modelo contraccionista proposto pelo Fundo Monetário Internacional, o qual já estava subjacente ás propostas de lei do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1978, apresentadas pelo I Governo Constitucional á Assembleia da República. O menos que poderá dizer-se é que do facto de o CDS ter entrado para o Governo parece não ter resultado n introdução de alterações significativa na política económica que, em termos globais, se pretendi seguir, o que nos deixa algo perplexas, pois todos nos recordamos das criticas frontais formuladas pelos centristas a actuação ineficaz e desligada da realidade levada a cabo pelo sector económico do I Governo Constitucional. Mas em política há sempre surpresas e talvez seja a altura de se concluir que essa aparente discordância era mais fictícia do que real e que as divergências manifestadas em relação à votação de íeis fundamentai? - isto é, no essencial - não obstam a que se verifique convergência no secundário, isto é, na repartição de lugares ao nível do aparelho de Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador. - Não entrarei agora na análise dos possíveis indutores resultantes da aplicação de um modelo de estabilização conjuntural excessivamente contraccionista na economia nacional, uma vez que a este problema se referia posteriormente o meu colega de bancada Ângelo Correia. Todavia, não quero deixar de mostrar até que ponto uma política global excessivamente contraccionista é ou não compatível com a gradual suspeição dos estrangulamentos estruturais existentes e com a progressiva inserção de Portugal no espaço económico europeu.
Entrando na análise sectorial respeitante ao comércio interno e externo, convém, desde já, salientar três aspectos distintos:
— Em primeiro lugar não se torna difícil concluir que se verifica uma nítida perda de qualidade quando comparadas as partes sectoriais do Programa de Governo com a parte relativa á definição de uma política económica global, independentemente da consideração de lacunas ou de imperfeições a que, em certa medida já me referi;
- Em segundo lugar, verifica-se a repetição de muitas ideias já expostas nas partes correspondentes à organização da economia e ao Programa de Estabilização, nomeadamente nos números 4.1.2, 4.1.3. e 4.1.4. do Programa do Governo;
- Finalmente, constata-se que se está perante um menor desenvolvimento do diagnóstico de partida e uma mais deficiente enumeração de objectivos e de medidas concretas do que no Programa do l Governo Constitucional.
Se não vejamos...
No capítulo do comércio interno, o Programa de Governo confunde, em vários casos, meios com objectivos, medidas a adoptar com metas a atingir.
É assim que se considera uma medida «organizar os circuitos de distribuição, de maneira a permitir uma grande facilidade de acesso da oferta dos diferentes mercados», quando se trata, manifestamente de um objectivo.
Mas mais, considera-se, ainda, que «clarificar os problemas inerentes ao lançamento de uma rede de frio e de armazenamento» e que «fomentar todas as formas de cooperação, quer entre produtores quer entre comerciantes» são medidas, quando parece, mais uma vez, óbvio que continua a falar-se de objectivos.
Diz-se, na alínea a) do número 4.2.2., respeitante, ainda, às medidas a adoptar no sector do comércio, que importa «fomentar a produção, quer pelo aumento da produtividade..., quer pela reconversão», o que constitui um objectivo geral e não uma medida especifica da actuação concreta no sector considerado.
Em boa verdade, para além da necessidade de acções de esclarecimento e de informação, parece que o Programa de Governo considera não existirem quase nenhuns outros problemas, no capitulo do comércio interno.
Por outro lado, o Programa do Governo é, ainda, pouco claro nos objectivos para que aponta, ficando, neste e noutros aspectos, aquém do Programa, do I Governo Constítucional. Assim, diz-se, por exemplo, que se pretende garantir o abastecimento dos produtos inerentes ao normal funcionamento das actividades económicas mas logo se adianta que se terá em conta as limitações decorrentes da redução do deficit da balança de Transacções Correntes. Melhor dizendo, garante-se, mas não se garante totalmente. Afirma-se que se assegurará o regular abastecimento público dos produtos alimentares e outros bens de primeira necessidade dentro dos níveis que forem programados. Mas, já não se pedindo que nos digam os níveis poder-se-ia, pelo menos, procurar dar uma ideia das propriedades que, neste domínio deveriam ser respeitadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um outro aspecto a considerar consiste no facto de se falar na racionalização dos produtos de distribuição sem todavia, nada de concreto se prever a esse respeito. Em particular nada se adianta quanto a selecção de áreas de intervenção, sabendo-se como se sabe que existem graves problemas por resolver em muitos sectores como por exemplo no dos materiais de construção ( e designadamente no sector dos cimentos e nos dos adubos) a juzante das empresas públicas em funcionamento.

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Vozes do PSP: - Muito bem!

O Orador: - Paralelamente, não deixa de ser de estranhar que nada se diga sobre o Estatuto do Comerciante, o qual entrou há relativamente pouco tempo em vigor, apresentando vários aspectos criticáveis, nomeadamente quanto à sua aplicação.
De facto, para além da sua fluidez na definição das diversas actividades comerciais e até da sua discutabilidade em relação a um ou outro caso (nomeadamente no que se refere aos agentes comerciais), o referido estatuto estabelece uma grave confusão entre funções de administração e funções das associações patronais e até entre funções dos órgãos do poder local e estas últimas.
Simultaneamente, o Estatuto do Comerciante comporta disparidades no tratamento dos comerciantes que já exerceram a actividade. É o caso dos retornados das ex-colónias que, apesar de muitos anos de exercício da actividade, ficam impedidos de continuar a exercê-la em Portugal se não tiverem a escolaridade obrigatória, ao contrário do que sucede a um comerciante qualquer que sempre lenha exercido a actividade na metrópole.

Vozes do PSD: -Muito bem!

€> Orador: - Embora o Programa de Governo refira a necessidade do estabelecimento de um clima de confiança para o investidor privado, não esclarece, devidamente, o que entende por «taxa mínima de lucro», tendo feito referências a este respeito, a garantir no futuro, aspecto este que se reveste da maior importância para a prossecução de uma política económica coerente no sector do comércio e ao nível do contrôle dos preços.
A que deverá, então, ser igual a «taxa mínima de lucro» (bruto) se a taxa de juro dos títulos ds dívida pública atinge os 18 por cento - livre de impostos - e se nos lembrarmos de que a tributação tem uma incidência significativa no volume global dos lucros?
E, caso o Governo consiga responder a esta pergunta, como é que será possível conciliar a «articulação da política de taxas de juro com o esquema da depreciação gradual do escudo», por um lado, com a necessidade de contenção da inflação, por outro lado?
No que respeita ao comércio externo, também se torna possível detectar várias limitações e significativas lacunas.
Também aqui o Programa do I Governo Constitucional apresentava uni melhor e mais aprofundado diagnóstico da crise, procedo a uma seriação mais equilibrada de objectivos - referindo, expressamente, a necessidade de diversificação das relações económicas externas e de fomento da imagem de Portugal como país exportador de produtos industriais e de serviços - e comportava uma enumeração mais exaustiva de medidas a adoptar.
Ficam, neste capítulo, por cobrir áreas de interesse relevante para as exportações como, por exemplo, o seguro de crédito e o apoio financeiro a proporcionar a actividades ligadas ao sector de exportação.
Mas mais, ainda, fica-se por se saber quais as concepções do Governo quanto aos critérios selectivos a aplicar em relação às importações, nada se adiantando, também, quanto ao facto de haver ou não da parte do Executivo a firme intenção de impedir a dispersão e o atropelo de competências que conduziram, recentemente, a um agravamento substancial na situação do registo prévio, impedindo as empresas de programar minimamente a sua actividade e desmotivando-as a executar quaisquer planos de alargamento da sua produção.
Fica-se, também, sem se saber qual a estratégia de conquista de novos mercados externos e de consolidação de posições nos mercados tradicionais, designadamente nos países da CEE.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quando disse qualquer referência aos mercados africanos e, em particular, aos novos países de expressão portuguesa.
Não se esclarece se o Governo julga ou não satisfatório o mecanismo correspondente à efectivação de «contratos de desenvolvimento para a exportação», tal como tem funcionado até ao presente, e se se considera ou não que o Instituto Português de Fomento da Exportação dispõe dos meios técnicos suficientes para desempenhar as funções que lhe são atribuídas.
Ignora-se o problema da necessidade de uma maior especificação dos medos necessários para se garantir uma qualidade mínima aos produtos de exportação.
Esquece-se, finalmente, a imperiosidade de um maior esclarecimento quanto às medidas concretas a adoptar, no domínio da introdução de incentivos à exportação, não se percebendo se o Governo tem ou não a intenção de prosseguir com u utilização de subvenções ou de outros tipos de apoio, de acordo com critérios pré-determinados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, se no sector do comércio os progressos parecem ser inexistentes e os recuos parecem ser evidentes, também no que respeita à política de preços se continua, em larga medida, a incorrer num erro de fundo.
É que o contrôle de preços, sobretudo numa perspectiva de médio prazo, não se consegue apenas, nem fundamentalmente, a partir de uma política de crescentes restrições ao consumo e à concessão de crédito. Não é que não se torne necessário aplicar algumas restrições, dada a nossa situação de avultado deficit da balança de transacções correntes e a incapacidade de resposta imediata da produção face às solicitações da procura interna.
Todavia, a componente estrutural da nossa inflação só poderá ser combatida por políticas de fomento da produção, de reconversão da esfera produtiva e de incremento dos índices de produtividade. Só a partir de uma política de rendimentos e do combate à rigidez estrutural da oferta se torna possível superar os estrangulamentos de fundo existentes, inclusive ao nível da nossa balança comercial.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sintetizando, parecem ser bem evidentes as contradições, as inadequações, os desajustamentos entre os diversos níveis de análise abarcados pelo Programa do Governo.

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De facto, nem existe uma articulação capaz entre as grandes linhas gerais de actuação nos domínios da organização da economia e do Programa de Estabilização com as medidas sectoriais previstas para o comércio interno e externo e para o contrôle de preços, nem tão pouco estas últimas são de molde a poder esperar-se uma actuação governativa eficaz e minimamente coerente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nada nos permite pensar que, de acordo com o Programa de Governo em apreciação, não se tenderá para um modelo de estagnação e desemprego, com agravamento dos estrangulamentos estruturais e sem qualquer abrandamento significativo da inflação.
O mal deste Programa de Governo está em, mais uma vez, se dar prioridade a uma política de improvisação e de generalidades, política essa que é reflexo da ausência de compromissos concretos e da procura em se solucionar a crise mais pela via de mecanismos de partilha do poder do que pelos caminhos do estudo, em profundidade, dos problemas concretos do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estamos perante uma situação de «convergência de oportunidade» no poder, o que não deixará de se reflectir negativamente nos centros de decisão, em termos de profundas dificuldades de conciliação dos diversos objectivos.
Nós, sociais-democratas, não somos dos que, de acordo com uma concepção economicista e hegelianista do dever histórico, falam em «suspensão» da construção do socialismo democrático, nem tão pouco pertencemos ao grupo daqueles que, pelos vistos, só a aceitam temporariamente.

Aplausos do PSD.

Para nós, a construção de uma sociedade mais livre, mais próspera e mais igualitária corresponde, a cada momento, ao socialismo do possível, não confundindo a qual que, para uns são recuos necessários com aquilo que, para outros, são avanços toleráveis.
Também não pertencemos à categoria daqueles que pertencem que a primeira tareia política da esquerda democrática está em aumentar as suas capacidades de persuasão e em aprofundar as suas convicções, esquecendo o lado real da economia e os interesses de um povo que aspira a ver solucionados os verdadeiros problemas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como também mão pretendemos estar no Poder por estar no Poder, como alguns que viam, dantes, na aprovação de leis como as da Delimitação dos Sectores Público e Privado e da Reforma Agrária um condenável heterodoxia esquerdizante do Partido Social-Democrata, mas que, porventura já acharão a actual fórmula governativa como correspondendo a uma solução «realista» e «equilibrada».

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - O povo português não encontrará em paliativos ou esquemas de convergência no acessório a verdadeira resolução dos seus problemas.
Volvido mais de ano e meio sobre a aprovação do Programa do I Governo Constitucional, a situação mudou sem que tenha ficado claro que as perspectivas de superação da crise sejam melhores do que então. Antes pelo contrário, tudo parece indicar que ainda se está longe de uma solução duradoira.
Volvidos mais do ano e meio, muito mudou e outros mudaram.
Mas não nós, sociais-democratas, que permaneçamos fiéis ao nosso programa e ao compromisso assumido perante o eleitorado e perante o povo português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo para pedir esclarecimentos.

Uma voz do PSD: - Vamos ver esses golpes baixos!

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - S: o Sr. Pré «Mente e os Srs. Deputados me permitem, eu gostaria de dizer, em resposta a um aparte da bancada do meu lado direito que em termos de golpe» baixos será muito difícil pedir-lhes meças. Não vou entrar efectivamente nesses golpes baixos, até porque a própria exposição do Sr. Deputado Rebelo de Sousa, que me merece a maior consideração, não permite nem golpes baixos nem golpes altos.
Eu queria fazer-lhe um pedido de esclarecimento muito ligeiro, porque ouvi uma intervenção baseada numa não clarificação de medidas e objectivos, numa limitação de alíneas, numa limitação de pontos, e eu fiquei confundido e a pensar se o Sr. Deputado teria lido ou não o Programa do Governo e se o Sr. Deputado Rebelo de Sousa ficaria satisfeito -e este é o meu pedido de esclarecimento- se o conteúdo do Programa do Governo aparecesse com mais alíneas, isto é, onde estão vírgulas pôr pontos finais e pôr um b), um c), um a -l), um b-J). Foi essa a ideia com que fiquei da intervenção do Sr. Deputado Rebelo de Sousa, que me entristeceu um pouco e me surpreendeu, porque estou habituado a ouvir-lhe intervenções de fundo. Esta é aquilo a que eu chamaria uma intervenção de pormenor. Lamento. Também lamento que o Sr. Deputado refira de facto em termos tão comparativos o Programa do I Governo Constitucional e o Programa do II Governo Constitucional. E queria perguntar-lhe se a sua posição, ou a do seu grupo parlamentar, quando da discussão do I Governo Constitucional incidiu sobre o problema do comércio externo e do comércio interno.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres, igualmente para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Guterres (PS): - Eu desejava começar por agradecer ao Sr. Deputado Rebolo de Sousa as referências elogiosas que fez ao I Governo Constitucional. E queria apenas perguntar-lhe se essas referências traduzem o arrependimento do seu partido pelo facto de ter contribuído nesta Câmara para a sua queda.

Risos gerais.

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O Sr. Presidente: - Está bem, é uma pergunta como outra qualquer.

Risos gerais.

Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa, ainda para pedir esclarecimentos.

O Sr. Amaro da Costa (CDS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é decerto necessário ajudar a inteligência dos meus ilustres colegas fazendo neste momento uma pequena reflexão de carácter político geral.
A intervenção do Sr. Deputado Rebelo de Sousa foi a primeira intervenção - eu ia a dizer de fundo, mas não foi de fundo efectivamente...

Risos do CDS.

... que teve a intenção de ser de fundo, acerca da matéria concreta do Programa do Governo e utilizou um método, que certamente todos estamos conscientes de qual foi, que consistiu em dizer: o capítulo do comércio externo, isto é, leia-se: o Ministro do Comércio e Turismo é muito mau e o Ministro das Finanças e do Plano é muito bom. Quer isto dizer, se formos lógicos na extracção das consequências desta análise, que o Deputado Rebelo de Sousa se prepara para ser semimportante do Governo, e porventura apoiante de uma parte substancial do mesmo, na medida em que, segundo estatísticas dadas ontem na Televisão, apenas 16,66 por cento dos membros do Governo são do CDS.

Risos.

Simplesmente poderia ter feito este método, poderia dar resultado esta táctica se fossam outras as pessoas representadas no Governo e fossem outros os partidos subscritores do acordo de que resultou o Governo.
O Primeiro-Ministro esclareceu a Assembleia e o País de que o Governo era solidário colegialmente e esclareceu também que o programa que apresentava era o Programa do Governo, não era o programa nem do PS nem do CDS e, naturalmente, muito menos seria o do PSD.

Risos do CDS.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Há quem diga que é.

O Orador: - Nessas condições, o método político seguido pelo Sr. Deputado Rebelo de Sousa na sua intervenção é um método ligeiro, leviano e que subestima a qualidade política das pessoas do CDS que estejam no Governo e, naturalmente, a própria solidariedade que o Governo, no seu conjunto, terá, não só em relação a essas personalidades como em relação a quaisquer outras.
Vale a pena fazer esta reflexão, não se fosse dar o caso de o Sr. Deputado Rebelo de Sousa ficar convencido de que tinha tido êxito com o método ou de os seus colegas sentirem a tentação de o imitar, porque, se o imitarem, imitam-no mais e não terão sucesso.

O Sr. Fernando Pinto (PSD): - É uma opinião!

O Orador: - Posta esta reflexão prévia, que, como digo, não pretende ajudar em nada a inteligência dos Srs. Deputados, porque isto tornou-se óbvio desde o primeiro momento da sua intervenção, vale a pena, no entanto, pôr-lhe algumas questões que ilustram ainda mais o sentido -eu vou dizer uma palavra que não pretendo insultuosa- o sentido primário com que abordou o tema.
O Sr. Deputado disse que ia dedicar-se à análise do capítulo do comércio interno e externo. Ora várias das suas observações não tiveram nada a ver com esse capítulo, mas tiveram, isso sim, a ver com o capítulo dedicado à organização da economia. Dou um exemplo, ou dois exemplos, se quiser.
O Sr. Deputado fez inquirições sobre taxas mínimas de lucro, que constam não do capítulo do comércio interno e externo, mas sim do capítulo da organização da economia, nomeadamente do capítulo dedicado ao estímulo ao sector privado.
O Sr. Deputado disse que o Programa não falava de contratos de desenvolvimento para a exportação. Efectivamente fala, mas fala num capítulo diferente daquele a que o Sr. Deputado se queria reportar. Quanto a este assunto dos contratos de desenvolvimento para a exportação, é evidente que a sua inclusão está noutra parte, que não aquela a que o Sr. Deputado disse que se ia referir.

Uma voz do PSD: - Está tudo fora do sítio!

O Orador: - Esse aparte, que eu repito e permito fazer meu - está tudo fora do sítio - é efectivamente verdade. No discurso do Sr. Deputado Rebelo de Sousa realmente está tudo fora do sítio.

Risos.

O Sr. Deputado falou na ausência de referência à reestruturação de organismos dedicados ao fomento da exportação. Suponho que não vamos pretender que o Programa do Governo seja propriamente um catálogo de todas as reformas, embora muito mais do que aquelas que seria de esperar estejam nele mencionadas. O que é certo é que justamente noutro capítulo, que não é aquele que o Sr. Deputado queria referir, fala-se na dinamização do funcionamento dos departamentos oficiais envolvidos no processo do comércio externo, bem como na revisão da legislação referente a esta matéria, nomeadamente a do regime de contratos de desenvolvimento para a exportação, etc.
Isto portanto para dizer também, e é a segunda observação, que posso formular em termos de pergunta, se o Sr. Deputado quiser, que a sua intervenção não teve sequer por objectivo aquele que previamente anunciou, isto é, dedicar-se ao capítulo do comércio externo e interno, teve, sim, a intenção de fazer uma «sopa de pedra» daquilo que na altura lhe saiu.

Risos do CDS.

Terceiro comentário: o Sr. Deputado insistiu muito na ausência, que lamentou, de diagnósticos aprofundados no capítulo do comércio externo e interno. Eu não sei qual é a noção que o Sr. Deputado tem sobre o que é um programa de Governo, mas recordo bem que de um documento, muito citado, do seu pró-

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prio partido, «As linhas programáticas gerais do Conselho Nacional de Bragança», não constava nenhum diagnóstico de nada em matéria económica e o grau de aprofundamento e escalpelização das questões ficava a milhas de distância, para menos, do que consta do Programa do Governo.
É evidente que neste Programa de Governo, em comparação com o Programa do I Governo Constitucional, existe uma sensível redução dos capítulos e das matérias dedicadas a diagnósticos de situação e existe, isso sim, um aprofundamento e alargamento substancial das zonas do mesmo programa que se dedicam à apresentação de medidas concretas e de sugestões concretas. O Sr. Deputado queria mais diagnósticos. Os académicos querem sempre mais diagnósticos. Nós, políticos, temos de julgar os governos pelas obras e por aquilo que se propõem fazer e contentamo-nos com o enunciado dos objectivos e das medidas concretas que os governo, pensam tomar.
Feitas estas três observações, é verdade que na intervenção do Sr. Deputado Rebelo de Sousa pouco fica que permita sequer estabelecer um debate sobre matéria em concreto suscitada por ela - talvez sobre o Estatuto do Comerciante, que saiu há pouco tempo à luz do dia e sobre o qual o Sr. Deputado aproveitou a oportunidade para fazer uma teorização que não chegou a fazer quando o estatuto foi publicado nesta Assembleia. O Estatuto do Comerciante é uma responsabilidade do I Governo Constitucional. Poderia acontecer que o II Governo Constitucional quisesse revê-lo, mas seria pelo menos estranho que, sendo constituído segundo a fórmula «Governo de base PS com personalidades», o PS, no Programa do II Governo Constitucional, viesse a aceitar a inscrição de quaisquer comentários críticos acerca da forma como o I Governo Constitucional se tinha comportado. Seria pelo menos aberrante, para não lhe chamar outra coisa. De onde as observações que o Sr. Deputado fez sobre este ponto serem também deslocadas e extemporâneas. Eu diria, como o Perry Mason, que foi uma intervenção irrelevante e imaterial.
Também o Sr. Deputado teorizou -e esse era um ponto que talvez tivesse importância aprofundar - acerca da articulação da política das taxas de juro com a desvalorização do escudo e o contrôle da inflação. Curiosamente, também é matéria que não diz respeito ao capítulo do comércio interno e externo, mas sim ao capítulo da organização geral da economia, que o Sr. Deputado tanto elogiou. Mal se compreende que, elogiando tanto esse capítulo, venha justamente pôr em causa um dos aspectos essenciais da estratégia em matéria de política monetária e cambial que o Governo pensa prosseguir. Mas aqui -e esta é afinal, depois de tudo espremido, pois estive e esforçar-me, mas não consegui mais, a única pergunta que lhe consigo formular - o Sr. Deputado está ou não de acordo com a política de desvalorização do escudo em função da evolução do ritmo da inflação, o Sr. Deputado está ou não de acordo com uma política conjuntural de adaptação das taxas de juro à evolução da própria inflação?
Estas são pois as questões que lhe ponho e agradecia que na resposta me indicasse as alternativas que o seu partido para o curto prazo, pois disto se
trata, e concretamente para 1978, pretenderia apresentar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Macedo Pereira, também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): -O Sr. Deputado Rebelo de Sousa na sua intervenção apontou as suas baterias para a Pasta do Comércio e Turismo e levantou uma série de objecções àquilo que leu no Programa do Governo.
Apontarei as minhas baterias, se me permite a expressão, a um artigo seu publicado recentemente no jornal Expresso, segundo o qual a sua social-democracia era uma resposta de esquerda aos problemas do seu país.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - E é!

O Orador: - Fico encantado com isso, Sr. Deputado Sérvulo Correia.

Assim sendo, queria fazer-lhe uma pergunta muito comezinha, cuja resposta a maioria do povo deste país decerto aguardará. Na sua opinião, o sector privado da economia -neste caso muito concreto, as empresas do sector privado do ramo do comércio - deverão ser toleradas, como quando dos governos provisórios de que o seu partido fazia parte, ou, como muito recentemente até alguns responsáveis do Partido Socialista vêm já dizendo, o sector privado é fundamental à recuperação da crise económica que o País atravessa? Esta é a primeira questão que lhe pó ano.
Segunda e última questão: Cotejado o Sr. Deputado cotejado o Programa do Governo com outros programas de Governo, concretamente com o do I Governo Constitucional, perguntava-lhe se concorda ou não que as medidas ora propostas no Programa do Governo não se podem compadecer com as medidas, eu diria muito mais académicas - não diria demagógicas, mas talvez muito mais, eleiçoeiras- propostas pelo Sr. Deputado, com a gravíssima crise que o País atravessa, muito» especialmente com o surto inflacionista que espreita, com o desemprego, etc.
Concretamente, Sr. Deputado, eram estas as duas questões que desejava colocar e às quais agradecia respostas» muito concretas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Basílio Horta, também para pedidos de esclarecimento.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo (Basílio Horta):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com muita atenção a intervenção do Sr. Deputado Rebelo de Sousa, no sentido de reter as sugestões concretas, as críticas, oportunas que fossem susceptíveis de melhorar e de implementar a acção do Governo neste sector. Com efeito, é um. sector importante, quer no Comércio interno quer no comércio externo. Naquele existem problemas graves e delicados no que toca ao abastecimento, sendo problemas que se perfilam com muito rigor, pois da sua resolução depende neste momento a satisfação de necessidades essenciais da população portuguesa. Era pois com a maior atenção que

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o Governo ouvia da Oposição, e ainda por cima de um técnico nestas matérias, a sugestão concreta, a crítica construtiva capaz do melhorar o que foi agora apresentado.
Não nos atingem comparações feitas com programas de governos anteriores. Nós estamos para melhorar e todas as críticas que vierem nesse sentido serão bem recebidas. Mas, como não consegui apreender concretamente quais os pontos em que piorámos, porque, em sua opinião, em nenhum melhorámos, gostava muito de lhe perguntar, no que respeita quer ao comércio interno quer ao comércio externo, que pontos devemos acrescentar, que pontos devemos modificar, que medidas novas devemos adicionar em ordem a que a acção do Governo neste sector possa efectivamente servir melhor os interesses da população, porque é isso, Sr. Deputado, o que está em causa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Rebelo de Sousa para responder, se assim o entender.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PSD): - Em primeiro lugar, começaria por responder o mais sinteticamente possível às perguntas que me foram formuladas pelo Sr. Deputado Carlos Robalo.
O Sr. Deputado Carlos Robalo interrogou-se sobre se eu teria lido o Programa do Governo e se a questão estaria fundamentalmente no facto de o Programa do Governo ter ou não alíneas. Tenho a dizer-lhe que o problema não é esse. De facto li com atenção o Programa do Governo, podendo o Sr. Deputado estar descansado a esse respeito. O que acontece é que, se alguma característica tem o actual Programa do Governo, designadamente no que respeita a aspectos de ordem sectorial, é precisamente a de ser muito rico em alíneas e bastante pobre quanto a conteúdo real.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - E isto é tanto mais verdade quanto importa aqui salientar que precisamente no capítulo do comércio interno e externo o próprio Programa do I Governo Constitucional se apresentava muito menos pródigo em alíneas, mas, no entanto, mau grado as deficiências e lacunas que não deixou de apresentar e que nós tivemos oportunidade de referir aqui na Assembleia da República, apresentava uma maior coerência interna e uma maior consistência, pelas razões que mais adiante poderei desenvolver.
Quanto à pergunta que me foi formulada pelo Sr. Deputado António Guterres, se estamos ou não arrependidos de termos exercido uma posição bastante crítica em relação à acção governativa do I Governo Constitucional, devo esclarecer que talvez o Sr. Deputado esteja um pouco esquecido de que nós, quando discutimos aqui o Programa do I Go>-verno Constitucional, não adoptámos de forma alguma uma posição de crítica destrutiva ou sistemática. Tivemos mesmo a preocupação, já depois de o I Governo Constitucional ter começado a exercer as suas funções, de desenvolver uma actuação de critica construtiva, tendo ido até ao encontro da necessidade de num ou noutro caso aprovar leis fundamentais, como veio a acontecer, nesta mesma Assembleia da República.
É incorrecto dizer-se que nós adoptámos desde o princípio uma posição de crítica frontal. O que aconteceu foi que a actuação concreta do I Governo Constitucional ficou muito aquém das perspectivas que eram abertas pelo próprio Programa do Governo. E foi precisamente na medida em que em grande parte esse mesmo programa não foi cumprido e na medida em que nem sempre se foi dando uma execução caba) às linhas de orientação geral que tinham sido preconizadas inicialmente que nós fomos aumentando a intensidade da nossa oposição relativamente ao Executivo.
No que respeita às críticas que foram formuladas e às perguntas apresentadas pelo Sr. Deputado Amaro da Costa, devo desde já esclarecer que não era minha intenção, de forma alguma, estar a atacar ou a criticar este ou aquele membro do Governo em particular. Aliás estranho que o Sr. Deputado Amaro da Costa tenha sentido no fundo tão intensamente as dores por uma personalidade que está no Governo enquanto elemento independente e não tanto como representante do CDS, aliás de acordo com uma exposição inicialmente feita pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Amaro da Costa (CDS): -Dá-me licença que o interrompa. Sr. Deputado?

O Orador: - Se me permite era intervir no fim, pois não gostaria de perder uma coerência mínima em termos de esquema de análise de resposta.
Mas, continuando, vinha tudo isto a propósito do facto de se dizer que o método adoptado foi mais um método ligeiro e que, no fundo, a própria exposição não era mais do que uma autêntica «sopa de pedra», na medida em que não apresentava propostas alternativas concretas. Isso não é assim. Sabe-se que o nosso partido, o Partido Social-Democrata, tem propostas alternativas concretas. Tive ocasião de referir alguns pontos muito concretos. Não foi só o Estatuto do Comerciante. Foi também a necessidade de uma estratégia de conquista de novos mercados, foi o problema da definição de mecanismos de selectividade relativamente às importações, enfim, toda uma série de questões. O que penso, isso sim, e que se corre um pouco o risco de este Programa do Governo ser infelizmente uma «sopa de pedra», na medida em que não se apresenta com um mínimo de coerência interna.
Quanto à pergunta que colocou no sentido de eu estar ou não de acordo com uma política de desvalorização ou depreciação gradual do escudo e também no que respeita à evolução das taxas de juro, devo desde já esclarecer que o que o Governo não fez, e esse é que é o problema concreto, foi dizer se opta por um esquema de depreciação deslizante do escudo, em que porventura venha a ter-se todos os inconvenientes dessa depreciação deslizante sem ter nenhuma das vantagens, até porque esse esquema não é acompanhado de um conjunto de medidas incentivadoras da exportação, ou se, pelo contrário, opta até eventualmente por desvalorizações mais significativas do escudo, mas articuladas com conjuntos ordenados de medidas

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incentivadoras da exportação. Este é que é um problema de fundo, como é um problema de fundo o saber até que ponto é que se pode ir em termos de política de sucessivos aumentos de taxa de juro, porque - e este é um problema que não podia ser de modo algum posto de parte em termos de análise da situação económica - não se pode estar, por um lado, a dizer que se vai adoptar uma política de aumento das taxas de juro e, por outro lado, a prever uma taxa de inflação apenas da ordem de 20%, uma vê? que, como se sabe, uma política de sucessivos aumentos da taxa de juro, com os efeitos indutores negativos que isso inevitavelmente não deixará de ter na estrutura de custos das empresas, irá muito provavelmente levar a que haja a tentação fácil de repercutir os aumentos de custos nos preços por parte de um número muito elevado de empresas que se encontram numa difícil situação económico-financeira.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Macedo Pereira, fome colocada uma pergunta, isto pondo de parte a consideração que o Sr. Deputado me merece, que me parece bastante descabida.
O nosso partido já afirmou por várias vezes que considera que o sector da iniciativa privada tem um papel fundamental a desempenhar em termos de desenvolvimento da situação económica. Isto não é de forma alguma incompatível com um projecto social-democrata, mesmo com aquilo que lhe poderá causar eventualmente alguns calafrios, que é um projecto social-democrata que se diz de esquerda moderada ou esquerda realista.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Também de esquerda!

O Orador: - Finalmente, quanto à intervenção e à correspondente pergunta formulada pelo Sr. Ministro Basílio Horta, no sentido de saber quais os pontos prioritários para nós em termos de definição de uma política de comércio interno e quais as diferenças existentes -e este é um outro aspecto importante - entre o Programa de Governo, que agora está a ser debatido nesta Assembleia, e o Programa do I Governo Constitucional, embora já tenha dito isso na minha exposição, não me custa nada repetir que o Programa do I Governo Constitucional, e isto em termos muito gerais, apontava muito mais claramente para um diagnóstico da situação económica, não é importante, não é só um mero exercício de académicos, porque o que acontece é que sem um diagnóstico de partida é muito difícil tentar encontrar as soluções concretas para os problemas que importa enfrentar. Para além disso, o referido programa tinha também o cuidado de definir objectivos muito mais claros. Garantia, por exemplo, e esta é uma diferença, os fornecimentos de produtos essenciais, excluindo qualquer hipótese de haver restrições a esses mesmos fornecimentos essenciais, ao contrário do que parece subentender-se do Programa de Governo que está agora em apreciação. uma vez que se faz uma referência às limitações decorrentes da situação existente, ao nível da balança de transacções correntes.
Por outro lado, o Programa do I Governo Constitucional apontava, &m termos de política de comércio externo, para problemas como o da diversificação das exportações, como o da escolha criteriosa de mercados preferenciais. Este tipo de análise não é agora feito, em termos de comércio externo, tão profundamente como era feito no I Governo Constitucional. Enfim, havia toda uma outra gama de problemas que não chegaram a ser abordados com tanta profundidade neste Programa de Governo como no Programa do I Governo Constitucional. Querer-se-á com isto significar que nós não tínhamos qualquer posição crítica em relação ao Programa do I Governo Constitucional? De forma alguma. O que isto quererá dizer é que não houve uma melhoria qualitativa deste Programa de Governo em relação ao anterior. O que nós queremos dizer com isto é que não se ganhou em coerência e em termos de se apontar para soluções eficazes que possam permitir resolver os problemas concretos do País. É isto que importa dizer, porque, antes do mais, temos de ser objectivos e ao termos objectivos temos de reconhecer os próprios méritos de programas vindos de momentos anteriores e de outros partidos, que não o nosso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados., foi acordado na reunião dos grupos parlamentares que se procedia hoje à eleição dos dois cargos vagos de Vice-Presidente - do Partido Socialista e do Centro Democrático Social.
Se os Srs. Deputados estivessem de acordo, interromperia neste momento a sessão -para dar um pouco mais de tempo- até às 18 horas, pedindo aos grupos parlamentares o favor de fazerem chegar ao meu gabinete um ofício com os nomes dos candidatos, para se proceder à elaboração das listas.

Está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada para a votação, com vista ao preenchimento dos dois lugares de Vice-Presidente vagos.

Procedeu-se à votação.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se ao escrutínio. Procedeu-se ao escrutínio.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, o resultado do escrutínio é o seguinte: Manuel Tito de Morais -146 votos, António Jacinto Martins Canaverde-107 votos, nulos - 31 votos, brancos - 28 votos.
Felicito os nossos colegas Tito de Morais e Martins Canaverde pela sua eleição e assim proclamo-os eleitos Vice-Presidentes.

Aplausos do PS e do CDS.

O Sr. Presidente:- Daqui a momentos vou dar a presidência ao Sr. Vice-Presidente José Vitoriano e amanhã, às 10 horas, tomará a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para apresentar um requerimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

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O Sr. Sérvulo Correia (PSD):- Sr. Presidente Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Do ponto de vista do Partido Social-Democrata, a avaliação de fundo que temos de fazer em relação à fórmula política que ora nos é proposta assenta em três parâmetros. Esses parâmetros são: em primeiro lugar, a própria natureza da fórmula política subjacente a este Governo, isto é, um Governo de base PS com personalidades, ou, como hoje aqui foi dito, com dominância PS e coadjuvância CDS; em segundo lugar, a composição do Governo, que agora conhecemos na sua esmagadora maioria; em terceiro lugar, o texto do próprio Programa do Governo que tivemos ocasião de analisar ao longo dos últimos dias.
Estes são para nós os parâmetros fundamentais. É certo que os termos do debate que ora está em curso poderão influir ainda, de algum modo, na nossa decisão e fundamentalmente essa influencia poderia surgir se algo de inesperado, mas que de momento não prevemos, viesse ainda a acontecer.
Por outro lado, a nossa posição, já marcada na Assembleia Constituinte, foi a de que não seria conveniente que os governos que se apresentassem a esta Câmara requerendo a sua investidura dela pudessem sair investidos em funções sem que a Câmara praticasse um acto positivo, através de uma votação.
Por estas razões, entendemos, desde este momento, apresentar à Câmara uma moção de rejeição do Programa do Governo, do seguinte teor:

Considerando que o Programa do I Governo não foi objecto de qualquer votação e que tal ambiguidade não deverá continuar a ser permitida;
Considerando que, embora directamente perguntado, o Governo não esclareceu se apresenta ou não uma moção de confiança;
Considerando que é imperioso tornar claro quem apoia e se compromete neste Programa do Governo:
O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD) propõe a rejeição do Programa do Governo (artigos 20.º, N.º l, alínea c) e 198.º do Regimento).

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Simultaneamente, apresentamos, e vamos fazer chegar à Mesa, um outro requerimento, nos seguintes termos:

Ao abrigo do n.º 2 do artigo 109.º do Regimento desta Assembleia, requerem os deputados do PSD abaixo-assinados a votação nominal da proposta de rejeição do Programa do Governo apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, temos portanto que obedecer, e façam favor de verificar se estará certo, à regra do antigo 198.º do Regimento, que diz:

«1. Até ao encerramento do debate, e sem prejuízo deste, poderá qualquer grupo parlamentar apresentar uma moção de rejeição do Programa do Governo.

2. Entretanto o debate, proscrever-se-á na mesma e após um intervalo de uma hora, à votação.

3. Até à votação, a moção de rejeição pode ser retirada.
Os três restante números pouco interessam já. Portanto, parece-me que temos que abrir um debate, desde já e em primeiro lugar, quanto à moção de rejeição. Vamos portanto cumprir a regra do artigo 198.º do Regimento.
Está aberto o debate.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD):- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Depurados: Nos termos do Regimento a moção de rejeição, se não vier a ser retirada, será votada depois do encerramento do presente debate, havendo uma hora de intervalo. Portanto não vejo, Sr. Presidente, que haja neste momento lugar à abertura de qualquer debate. Há, isso sim, um segundo requerimento no sentido de que essa moção de rejeição venha a ser votada por voto nominal. Aí, em nosso entender, está ao critério da Meca pôr já esse segundo requerimento à votação ou deixá-lo também para a altura, do encerramento do debate. Deixamos, portanto, esse segundo aspecto ao critério da Mesa.

O Sr. Presidente: - Tenho a impressão, salvo o devido respeito, que o Sr. Deputado Sérvulo Correia disse precisamente o que eu estava a dizer...

Risos do PSD.

... Eu disse que ia dar cumprimento ao artigo 198.º do Regimento e é o que vou fazer.
Vamos então abrir a debate, que obedecerá às regras do artigo 198.º do Regimento, e depois, no fim, com certeza, será objecto de votação o requerimento que foi apresentado.
Está aberto o debate.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Parece que há aqui uma dúvida. Como é uma matéria' die certo modo nova, vou ter novamente o antigo 198.º do Regimento paira tirar essa mesma dúvida. O artigo 198.º diz: «1. Até ao encerramento do debate, e sem prejuízo deste...)) Está certo -e peço desculpa-, pois o artigo diz: «...e sem prejuízo deste...»
Continua então o debate sobre o Programa do Governo.
Tem a palavra o Sr. Ministro António Arnaut

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (António Arnaut):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se estranhará que as minhas primeiras palavras sejam de sincera homenagem á Assembleia da República, á qual me honro de pertencer. Órgão democrático por excelência, reflexo natural das nossas esperanças e ansiedades estou certo que esta Assembleia, cuja actuação tem constituído importante factor de pacificação da vida política, como ainda recentemente o reconheceu o Sr. Presidente da República, continuará a assumir a sua responsabilidade histó-

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rica, dando ao País o exemplo do seu empenhamento na construção da sociedade mais livre e mais fraterna, traçaria na Constituição.
Aproveito, pois, esta oportunidade paira saudar V. Ex.ª Sr. Presidente Vasco da Gama Fernandes, cujo passado é penhor da idoneidade com que exerce o seu alto cargo, e para cumprimentar cordialmente os Srs. Deputados, a quem ofereço e de quem espero a mais franca colaboração.

O Sr. Salgado Zenha (PS): -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados- O programa, do Ministério dos Assuntos Sociais não constituía um simples de boas intenções, mas um compromisso conscientemente assumido perante o povo e os seus legítimos representantes.
É nossa firme determinação enfrentar com humildade o coragem as questões que nos serão colocadas. Humilde, face à sua magnitude e complexidade de coragem, para as resolver, ultrapassando as dificuldades naturais e artificiais, num e pinto de diálogo permanente, de entendimento democrático e de cooperaçâo construtiva.
Os portugueses estão preparados para suportar alguns sacrifícios decorrentes da conjuntura económico-financeira e dos recursos disponíveis. Pensamos, porém, que tais sacrifícios não devam ser exigidos nos domínios da segurança social e da saúde, porque delas depende, em grande paridade de vida e a concretização da esperança da esmagadora maioria dos portugueses, especialmente dos reformados, dos desprotegidos e dos trabalhadores pobres.
O Ministério dos Assuntos Sociais terá de ser, assim, um verdadeiro Ministério da Justiça Social que responda eficaz e prontamente às justas ansiedades do povo e ás expectativas abertas pela Revolução de Abril.
Por isso, será necessário que todos do Ministro ao mais modesto funcionário- se sintam impregnados por um espírito dinâmico, renovador e solidário no desempenho da tareia aliciante que ora nos está confiada a correcção das desigualdades; e injustas, o reconhecimento efectivo do direito de todos à saúde e ao bem-estar social, a protecção da infância e dos cidadãos, na doença, velhice, invalidez, viuvez, orfandade» a desemprego, em suma, assegurar uma existência digna aos portugueses, para que possam viver a liberdade em segurança.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Fazer o que puder com os meios que tiver. Consolidar as conquistas sociais alcançadas pelos trabalhadores e arrancar pragmaticamente para medidas inovadoras de fundo, procurando deixar uma marca progressista no sector da saúde e da segurança social.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não se trata de uma utopia. Porque o sonho se faz obra paio trabalho, pela perseverança e pelo calor humano dos actos. Realizaremos o possível e procuraremos moldar o impossível para que o futuro o torne viável.
Não repetirei aqui os passos fundamentais do nosso Programa de Governo, que procuramos fosse esquemático e objectivo. Daí esta intervenção, à guisa de preâmbulo, a demarcar as linhas da força e o sentido político que o norteiam. Mas seja-me permitido aproveitar esta tribuna para sublinhar aos Srs. Deputados e à Nação as principais medidas que vão ser tomadas.
Em primeiro lugar, a oração e a instalação progressiva do Serviço Nacional de Saúde, para o que nos comprometemos a abonar, no prazo às 5 meses, o diploma legal, que defina as suas bases jurídicas, técnicas, administrativas e, financeiro.
Aproveito, aliás, para pedir aos Srs. Deputados, especialmente aos que integram a Comissão de Segurança Social e Saúde, a todas as entidades e organizações do Sector, e aos trabalhadores do Ministério, a sua prestimosa colaboração.
O Serviço Nacional de Saúde será finalmente uma realidade. Como foi anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro, o Governo escolheu os distritos de Vila Real, Guarda e Beja, dos mais carenciados do País como zonas-piloto para a implantação acelerada do Serviço Nacional de Saúde.
A criação deste serviço e o início do seu funcionamento ainda no corrente ano é um ponto de honra do Ministro e do Secretário de Estado da Saúde. Assumimos solenemente, esse compromisso perante a Assembleia da República.
Sem embargo e como consta do programa, adoptaremos medidas imediatas que garantam uma actuação qualitativa da situação actual, apelando à participação dos utentes, das organizações autárquicas e sociais para o melhor funcionamento dos serviços.
No campo da Segurança Social, mobilizaremos os nossos esforços para a criação às um sistema unificado e descentralizado, de acordo e com a participação das associações sindicais e outras organizações dos trabalhadores, como resulta imperatrivamente do artigo 63.º da Constituição, sem prejuízo, naturalmente do apoio às instituições privadas de solidariedade social não lucrativas.
Intensificaremos as acções relativas à protecção dos nossos emigrantes, da infância, dos inválidos, dos idosos e dos trabalhadores rurais.
Assim e de acordo cem o Programa, será revisto o regime de abono de família em correspondência com a afixação de «mínimos vitais familiares; serão actualizadas as pensões de velhice, invalidez e sobrevivência, e serão uniformizadas as pendões dos trabalhadores rurais, acabando-se com a diferenciação entre as pendões para homens e para mulheres.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador:- Será intensificada a rede de equipamentos sociais paira a primeira infância e para a terceira idade, procurando alcançar-se uma cobertura territorial que proteja a infância desvalida e evite a marginalização do idoso.
Vai-nos ser exigido um grande esforço e por só não haverá complacência para os que pretendam entorpecer ou sabotar a realização da justiça social. Saremos rigorosos para os que faltam ao seu dever permite a colectividade ou dissipem em despesas aces-

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sónias o que é indispensável para ocorrer às necessidades inadiáveis dos tempos.
Uma grande disciplina orçamental, o contrôle das baixas, a eliminação e repressão dos abusos, a racionalização dos consumos e gastos, a economicidade dos recursos e a moralização dos serviços, são condições imprescindíveis à eficácia do sistema que nos propomos ajudar a construir.
Este programa pode ser acusado de excessivamente audacioso e talvez o seja, face às Limitações financeiras do País em geral e do sector em particular. Mas a audácia é uma qualidade dos portugueses e por vezes a sorte protege os audazes. Foi por isso que dobrámos o cabo e chegámos à Índia e que as «tormentas» se transformaram em «boa esperança».
O tempo dirá só conseguimos dobrar este cabo.
Está em causa o desuno dos portugueses. Assumiremos o povo que somos e a pátria a que pertencemos.

Aplausos do PS e dos membros do Governo.

Entretanto assumira a presidência o Sr. Vice-presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- Sr. Ministro, acabo de ouvir a sua intervenção e faço-lhe uma pergunta muito simples.
O Sr. Ministro falou no apoio -não tenho bem presente qual o termo que usou - à infância. Ora uma das últimas medidas tomadas pelo anterior Governo, mais precisamente por um seu Secretário de Estado que também exerce funções no actual Governo, o Secretário de Estado da Segurança Social, foi exactamente uma portaria de 11 de Janeiro, que restringe o pagamento que até aqui vinha a ser feito à alimentação dos lactentes e que constitui uma importante conquista depois do 25 de Abril. Assim, é extrema mente restringido o apoio dado aos lactentes, passando a partir desta portaria a ser pago única e exclusivamente o leite. E isto, como o Sr. Ministro certamente já percebeu, está a provocar a mais viva indignação e interrogação a milhares de mães neste país que por vários condicionalismos, que o próprio Programa refere, não tem meios financeiros que lhes permitam dar uma alimentação completa a um lactente. Uma das consequências desta portaria vai ser certamente o fazer com que as nossas crianças até aos oito meses -os filhos dos camponeses e dos operários - passem a ter exclusivamente o leite como alimentação, com todas as consequências que isso lhes vai trazer.
Portanto, eu perguntava ao Sr. Ministro se está nos seus planos, a partir da sua própria intervenção, alterar esta portaria e fazer austeridade não propriamente na alimentação dos lactentes -aqueles que precisam efectivamente do carinho de todos nós-, mas noutros aspectos em que há efectivamente boas razões para se fazer austeridade.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro António Arnaut, como há mais Deputados inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou aguarda peias outras perguntas?

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Aguardo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Gomes.

O Sr. Manuel Gomes (PCP): -Sr. Ministro, vou ser muito breve nas perguntas que lhe vou apresentar.
Assim, quais são os critérios» que o Governo tenciona seguir para aumentar o quantitativo das reformas no que se refere ao regime geral e, em particular, ao regime especial, onde estão incluídos os mais desfavorecidos, os trabalhadores rurais?
A segunda pergunta refere-se à suspensão dos subsídios de lar. Quais as alternativas para esta supressão?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Jara,

O Sr. José Jara (PCP):- O Sr. Mastro, togo mo início da sua intervenção, disse que o Programa do Governo nesta matéria não era um programa de boas intenções, mas sim um compromisso real, e acrescentou que em termos financeiros não haveria sacrifícios no campo da saúde e segurança social. Ora a pergunta muito concreta que eu quero desde já fazer-lhe é esta: o Governo prevê alguma alteração do sistema de financiamento da Segurança Social? É porque até ao momento o que se tem verificado é que o financiamento tem sido exclusivamente feito com base nos descontos dos trabalhadores. E ainda assim eu queria aqui lembrar que se sistema tem falhado porque em muitas empresas o patronato não tem feito os descontos, e consequentemente não tem processado as contribuições em tempo oportuno, & que inclusivamente neste momento se acumulam 17 milhões de contos de dívidas à Previdência. Portanto, a minha primeira pergunta resume-se em saber se o Governo prevê alguma alteração do sistema de financiamento da Segurança Social.
Outra pergunta muito concreta é esta: tendo em comia que o abono de família está bastante desactualizado, na medida em que o actual montante de 250$00 foi fixado há já alguns anos -há 4 ou 5 anos-, gostaria de saber se o Governo prevê em concreto e, no caso afirmativo, em que montante o aumento do abono de família.
Ainda uma questão bastante concreta é esta: o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais Talou na implantação rápida do Serviço Nacional de Saúde e muito nos compraz que tenha referido isso. No entanto parece-nos um pouco absurdo que se fale no Serviço Nacional de Saúde e se preconize a sua aplicação apenas em três distritos. Visto que é um serviço nacional que envolve carreiras a nível nacional e uma política nacional de saúde, como é que se vai aplicar o Serviço Nacional de Saúde apenas a nível de três distritos e como é que se pode considerar que são esses os distritos mais necessitados, quando nós sabemos que há muitos outros igualmente carenciados?
Outra questão que eu ainda lhe queria colocar é a seguinte: os utentes dos serviços de saúde durante este ano assistiram ao aumento progressivo do preço dos medicamentos, apesar das promessas em contrário aqui feitas nesta Assembleia pelo Sr. Secretário

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de Estado da Segurança Social. Ora eu pergunto qual é a política de medicamentos e de preços de medicamentos preconizada pelo Ministro dos Assuntos Sociais.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Deputado Antídio Costa.

O Sr. Antídio Costa (PSD): - Sr. Ministro dou Assuntos Sociais, eu gostaria que me esclarecesse acerca de uma dúvida que me assiste e que é muito simples.
Ultimamente tem V. Ex.ª muitas vezes referido que quer empenhar-se na organização de um verdadeiro Serviço Nacional de Saúde e eu gostaria de lhe colocar esta simples questão: pretende V. Ex.ª basear o ambulatório do futuro Serviço Nacional de Saúde nos serviços médicos da Previdência ou tem outras perspectivas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sérvulo Correia.

O Sr. Sérvulo Correia (PSD):- Sr. Ministro, em matéria de saúde o programa do Governo aponta como principal medida concreta o estabelecimento de três zonas-piloto em três distritos e V. Ex.ª" acaba de ratificar solenemente esse compromisso constante já do texto do programa, no sentido de que nesse ponto o mesmo será levado a cabo. No entanto, Sr. Ministro, a instituição destas zonas-piloto nestes distritos, significa que uma quantidade de jovens médicos, que aí terão de ser colocados nos termos desses programas-piloto, terá de contar com o apoio técnico de especialistas, especialistas que não existem na grande maioria dos lugares necessários, que não existem neste momento nesses distritos. Deste modo, eu gostaria de saber em que termos é que o Ministério dos Assuntos Sociais tenciona superar esta lacuna, sem o que o sistema não funcionará. Pensa o Ministério dos Assuntos Sociais que simples prémios pecuniários para fixação de especialistas, que já terão sido mencionados, irão ser suficientes para resolver esse problema? Por outro lado, dadas as carências financeiras em matéria orçamental, disporá o Ministério dos Assuntos Sociais das verbas para o pagamento desses prémios?
A minha segunda pergunta é esta: o Sr. Ministro, na sua curta intervenção, acaba de referir como orientação estruturadora do sistema nacional de segurança social a sua descentralização. No entanto, esse termo «descentralização» é também muito utilizado no texto do Programa do Governo, texto esse que faz assentar a estruturação do sistema no Decreto-Lei n.º 549/77, de Dezembro passado, que está pendente perante esta Assembleia para ratificação. E desde já posso adiantar que o meu partido irá criticar fortemente esse diploma, porque aí, sempre que se fala de descentralização, está-se na prática a tratar de uma coisa completamento distinta, que é a desconcentração, isto é, a transferência de competências do Ministro e dos seus mais directos colaboradores para entidades deles dependentes a nível distrital, mas não, de maneira nenhuma, transferência de atribuições e de competências dos órgãos centrais do Estado para órgãos do poder local, nomeadamente para as autarquias locais. Será que o Sr. Ministro, na condução do seu Ministério, vai entender a descentralização neste sentido puramente burocrático de desconcentração?
Finalmente, referiu o Sr. Ministro uma medida com a qual nos congratulamos, que ora aponto da no texto que elaborámos e- apresentámos ao Sr. Primeiro-Ministro em resposta ao memorando que em tempos o apresentou aqui ma Assembleia da República, medida esta relativa ao nivelamento das pensões dos rurais, sem discriminação de sexo. Congratulamo-nos com essa medida que nós próprios sugerimos, mas notamos Que a par dela falta última outra que também sugerimos, que seria a de ,nos amos subsequentes ne proceder a aumentos relativos da pensão da ordem dos 20 %, sem prejuízo, da actualização resultante da indexação. Que pensa o Ministério dos Assuntos Sociais fazer nestes, outros domínios?

O Sr. Presidente: -Como mão há mais pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro António Arnaut para responder, se assim o entender.

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é-me grato responder desde já, embora sucintamente, às questões que me foram colocada, mas eu gostaria que o diálogo entre a Assembleia, e o meu Ministério de desenvolvesse de uma forma profícua e útil para ambas as partes. Por isso penso que vamos ter oportunidade de continuar ente diálogo e espero, como disse na curta intervenção que fez, a vossa indispensável colaboração, designadamente a dos Srs. Deputados que constituem a Comissão de Segurança Social e Saúde.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra pergunta-me o que penso fazer relativamente aos subsídios para aleitação, dado que a paritária 0,2, 11 de Janeiro tenha dificultado a atribuição desses subsídios. Ora eu penso que o espírito da referida portaria não foi criar dificuldades às crianças pobres, mas essencialmente limitar certos abusos que se completam nesse facto. De qualquer forma, Sr.ª Deputada Zita Seabra, posso garantir-lhe que o Ministério dos Assuntos Sociais estará atento a casos problemas e que desenvolverá com os esforços no sendo da protecção da infância desvalida, dos filhos dos trabalhadores e de operários de que falou.
O Sr. Deputado Manuel Gomes perguntou-me quais são os critérios para aumentar o quantitativo das reformas em geral e em especial as dos trabalhadores rurais. Sobre isto, como disse na minha intervenção, nós temos que fazer o que pudermos de harmonia com os meios de que dispusemos, mas penso que de qualquer forma o orçamento o orçamento previsto para esse sector e sobretudo a compressão das despesas supérfluas nos permitirão introduzir algumas melhorias na reforma dos trabalhadores rurais. Para já, vamos proceder ao seu nivelamento e vamos, dentro do possível, proceder ao seu aumento.
O Sr. Deputado José Jara perguntou-me se o Governo prevê alguma alteração do sistema de financiamento da Segurança Social. Ora, como o Sr. Deputado pode verificar pela leitura do nosso programa, a responsabilidade do Estado neste sector tende á criação de um sistema que pressupõe o financiamento das despesas pelo próprio Estado e, mais do que isso,

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à atribuição destes subsídios independentemente do valor pecuniário da prestação.
O Sr. Deputado falou-me também no Serviço Nacional de Saúde e diz que é um absurdo falar em Serviço Nacional de Saúde quando no início se prevê a sua implantação apenas em três distritos, tal como pergunta as razões que levaram a escolher os distritos referidos e não outros. Ora, como o Sr. Deputado bem sabe, o Serviço Nacional de Saúde não pode ser posto a funcionar ao mesmo tempo em todo o País, isto é, no Continente e nas Regiões Autónomas. E não só as dificuldades materiais, e humanas, mas também a necessidade que há de estabelecer zonas-piloto para assim se aquilatar da adaptação desse serviço às necessidades, específicas de cada região justificam o facto. A escolha dos distritos de Vila Real, Guarda e Beja foi determinada, por um critério que pode ser discutível, mas que nos pareceu o critério mais razoável. São dos distritos mais carenciados do País:, onde não há praticamente nada no domínio da saúde. Aliás, um situa-se ao Norte, outro ao Centro e outro ao Sul do País, quer dizer em regiões que têm particularidades próprias, o que vai permitir ao Serviço Nacional de Saúde fazer os devidos ajustamentos.
Quanto a saber-se qual a política preconizada em matéria de medicamentos, tenho a dizer que vamos dentro em breve constituir um grupo de trabalho para estudar cada importante matéria e creio que o Sr Deputado José Jara poderá dar também algum contributo para a resolução da questão.
O Sr. Deputado Antídio Costa perguntou-me se o Serviço Nacional de Saúde se vai basear nos serviços da Previdência Social se há outras perspectivas. Quanto a isto, Sr. Deputado, eu penso que naturalmente nesta matéria podáramos fazer profundas inovações e criar um Serviço Nacional de Saúde eficaz, que proteja realmente a saúde dos portugueses, isto é, que seja determinado pelas necessidades colectivas que responda prontamente a essas necessidades.
O Sr. Deputado Sérvulo Correia observou que há dificuldades em conseguir-se apoio técnico de especialistas nos referidos distritos e pergunta como é que o Ministério pretende superar essa lacuna, É evidente que há muitas dificuldades nessa matéria, e não só em especialistas. O Sr. Deputado, por exemplo, não falou no problema das instalações. Quanto ao problema dos especialistas, nós pensamos em superar essa dificuldade fazendo cursos acelerados de especialização, incluindo no estrangeiro. Temos aliás auxílios da Organização Mundial de Saúde neste sector.
Quanto à descentralização do sistema de segurança social, não será uma (descentralização burocrática, será uma descentralização autêntica, guardando todavia paira os órgãos centrais uma actividade normativa.
Creio que respondi a todas as questões que me foram postas. Se há alguma lacuna, peço desculpa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas para uma intervenção.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP}:- Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: O Programa do Governo da coligação- PS/CDS não é um programa do Partido Socialista com algumas incidências resultantes do acordo com o CDS Não. Estamos em presença, sim, de um verdadeiro programa comum, em que nos pontos essenciais as reivindicações e formulações do CDS se encontram em cheio.
Na verdade, este Programa repleto de formulações, vagas, omissões e objectivos contraditórios, apresenta duas questões muito concretas a regulamentação das indemnizações aos capitalistas e latifundistas, que aparece repetida, em vários capítulos, com certeza para evitar o esquecimento e a regulamentação da delimitação do sector público e do sector privado, que o mesmo é dizer, abrir mais brechas para o ataque ás nacionalizações.
Estas eram, aliás, as duas principais reivindicações da Deputado do CDS Amaro da Costa, no seu discurso sobre a moção de confiança ao I Governo Constitucional, a que lhe juntava mais uma: a indexação idas taxas de juro, também inscrita neste Programa e que, a s»r concretizada, será mais um passo na liquidação de milhares de pequenas empresas.
E isto não fica por aqui. Talvez os Srs. Deputados não saibam,, mas o CDS aplicou um teste psicotécnico a Portugal e concluiu, sem apelo nem agravo que a vocação do País é para, o capitalismo! Assim, na página 77, alínea g), pode ler-se no Programa: As empresas participadas podem e devem passar para o sector privado «de acordo com a lei e a vocação do País»! E na alínea h) dos objectivos da política do turismo, da responsabilidade de um Ministro do CDS e da CIP, citamos: «Clarificação e resolução rápida da situação de empresas sob intervenção ou indirectamente nacionalizadas fendo um conta que o sector turístico tem uma vocação privada», fim de citação. Mas vejamos ainda o que nos diz a alínea i) das medidas para o comércio externo, da responsabilidade dó mesmo Ministro, citamos: «Assegurar que o Estado não intervirá no sector privado do comércio externo, a não ser a título supletivo [...]», ou seja, a não ser para tapar buracos! ...
intenções mais claras não podiam ser expressas.
E o que terá isto a ver com o artigo 2.º da nossa Constituição, que diz textualmente: «A República Portuguesa é um Estado democrático [..,], que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras.» Ou com o artigo 80.º: «A organização económico-social da República Portuguesa assenta no desenvolvimento das relações de produção socialistas [...].»
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Deputados: Perante a actual crise económica e financeira, seriam de esperar medidas concretas que dessem resposta
nomeadamente, ao deficit da balança de transacções correntes. No entanto, assistimos à repetição das velhas fórmulas e panaceias, contidas na política dos pacotes que a vida já demonstrou ao que conduzem: agravamento da situação económica e financeira, deterioração do nível de vida dos portugueses aumento de despedimentos e da. morsa dependência externa.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: No programa económico de estabilização para 1978, não encontramos medidas que levem ao aumento da produção nacional de produtos (importados, ao aproveitamento dos recursos e energias nacionais, à redução

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drástica das importações de luxo, sumptuárias ou desnecessárias, mas encontramos sim a antecipação às exigências do FMI e a aplicação das clássicas medidas de política orçamental e monetárias dirigidas á contenção da despesa interna. Mesmo quando aparentemente apresente medidas positivas como a substituição de importações logo lhe coloca no limite a competitividade externa, ao mesmo tempo que indica o sector alimentar como sector privilegiado para tal acção. Só que, quando se desfolha o programa para o sector agrícola nada se diz sobre a substituição de (Importações, sobre a introdução de novas culturas (quer seja a beterraba sacarina, quer seja o tabaco, ou outras).
Será que a menção à substituição de importações é só para deitar poeira?
Por outro lado, a manutenção da desvalorização gradual do escudo continuando a ser geradora de inflação e o aumento das taxas de juros, acompanhado dos limites de crédito, não só contribuirão para a diminuição da produção como levarão à ruína milhares de empresas, nomeadamente nos nossos sectores tradicionais da têxtil e da indústria da madeira.
Também a política orçamental não foge ao esquema: redução de subsídios e transferências e aumento da carga fiscal que, eufemisticamente, se rotula de ligeira!...
Quanto à política de combate à inflação, o Governo estabelece como previsão 20% para o aumento de preços. Ao mesmo tempo que a considera «meta ambiciosa»! No entanto, o conjunto de medidas que estabelece não conduzem a esse resultado e o Governo sabe-o desde já.
Estamos perante a mesma situação quando aqui, nesta Casa, se aprovou o Plano para 1977, em que o Governo PS se comprometeu a uma taxa de inflação de 15 %. Ora a verdade é que esta se saldou em cerca de 40 % quando comparada com o nível de preços em Dezembro ou à volta de 30% se se quiser utilizar a técnica do Sr. Primeiro-Ministro e comparar com os preços médios de 1976.
Ainda neste capítulo e no campo das promessas, vem o Governo de novo falar na elaboração do «código de preços». Mas então, o que é que aconteceu com o prometido «código de preços» para 1977? Onde é que ele está? E como se explica que o Governo continue a insistir na política de contrôle d ï preços a posteriori quando o próprio Ministro do Piano e da; Finanças declarou, perante as câmaras da TV, que a liberalização dos preços em 1977 conduziu a uma especulação desenfreada ...
Diz ainda o Governo que irá manter o célebre «cabaz de compras», cujo peso nas despesas familiares apresenta pouco mais de 10 %. Mas Jogo de seguida, não só se afirma que os preços dos produtos do «cabaz» serão aumentados primeiro antes de lá serem metidos como não se dá qualquer garantia quanto ao seu regular abastecimento.
A experiência de 1977 mostra que o Governo reduziu a distribuição de carne congelada e que ninguém encontra hoje à venda a pescada congelada!
Em conclusão, este plano para 1978 pode, de facto, sintetizar-se em poucas palavras: aportar o cinto aos trabalhadores e aos pequenos empresários para o alargar aos grandes capitalistas e aos países prestamistas.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Sem prejuízo da análise mais profunda que sobre alguns sectores camaradas meus aqui virão fazer, adiantáramos, desde já, algumas notas.
No que toca à indústria, o programa é vago e contraditório.
É contraditória a política dia crédito preconizada {assim como a adesão à CEE) com uma política de desenvolvimento que para ter êxito temia de se basear em todas as forças produtivas nacionais, mais a mais quando a estrutura industrial portuguesa assenta em pequenas e médias empresas, em que mais de 90% têm menos de 100 trabalhadores!
É contraditória a redução da dependência externa, nos domínios comercial, tecnológico e financeiro, com a promoção de investimentos estrangeiros e o critério de dar prioridade aos que contribuem para a nossa inserção na CEE.
É vago, muito vago principalmente na questão de fundo, quanto à definição de qual o sector motor do desenvolvimento económico e industrial; quanto ao respeito pelas formações económicas, e quanto à observância constitucional que deve ao Plano, cuja existência e observância visa não consentir a anarquia na produção, limitativa do desenvolvimento e da correcção da nossa estrutura industrial.
Quanto à política da energia, o I Governo ainda afirmava que o programa do sector eléctrico «visava um plano de electrificação rural de forma a eliminar nos próximos 5 anos as zonas do País ainda não electrificadas».
No actual afirma apenas que «se incentivará a electrificação rural, com o recurso ao regime contratualista sempre que tal seja aconselhável». Mas nem sequer se fixam quaisquer metas.
Afirma-se que se acelerará o aproveitamento dos recursos hidroeléctricos. Mas não se anuncia um único projecto novo.
Fala-se no «incremento da utilização dos escassos recursos materiais de que dispomos». Mas omite-se a .prospecção dos carvões e o aproveitamento das lignites.
Vejamos agora o turismo.
A política de turismo ignora qualquer diagnóstico da situação, nomeadamente a existência de um sector empresarial público e a situação financeira do País. Ignora áreas fundamentais, como sejam a balança turística, o turismo interno, a concentração regional de dormidas e de mercados emissores; a política de preços e de promoção a seguir.
Este programa é claro que visa fundamentalmente três objectivos muito concretos:

1) Uma política de recuperação capitalista;
2} Uma política de desemprego no sector;
3) A melhoria da rendibilidade das grandes empresas privadas à custa da colectividade.

Uma voz do CDS: - Não apoiado!

O Orador: - Eu também o não apoio. É na verdade, o que se pode chamar um programa digno do Ministro que tem!

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Por último, reparemos em dois ou três pontos da política de transportes que nos dão uma ideia clara dos objectivos.
Enquanto o I Governo definia como objectivo da política de transportes «contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos,, tornando menos onerosas as deslocações obrigatórias... facilitando o acesso à educação e à cultura», este programa fiel ao Fundo Monetário Internacional diz peremptoriamente: «Será necessário proceder a ajustamentos tarifários de modo que os preços acompanhem os acréscimos die custos!»
Por outro lado, refere em relação ao sistema portuário o «estabelecimento de um regime de concessões de terminais portuários», ou seja, a entrega do que é rendível à «área» capitalista...
Sr. Presidente, mas o que toca o ridículo no programa deste sector, o sector dos transportes, e demonstra a maneira como este foi elaborado, é quando se compara os dois programas, no tocante aos princípios.
No programa do I Governo podia ler-se quanto à participação dos trabalhadores: «Incentivo da participação e contrôle pelos trabalhadores e utentes na gestão das unidades de produção, apoiando as experiências válidas de autogestão no sector nacionalizado e promovendo a criação de cooperativas de profissionais.»
Os autores do segundo programa, ao quererem eliminar o termo contrôle s corrigir a gaffe da frase «apoiar as experiências de autogestão do sector nacionalizado», deixaram este saboroso naco de prosa para o qual chamo a atenção dos, Srs. Deputados: «Incentivar a participação dos trabalhadores e utentes na gestão das unidades de produção, nomeadamente pela promoção de cooperativas de profissionais»... O que será que isto quer dizer?
Gostaríamos de deixar ainda uma nota ao capítulo sobre a «Estratégia de Desenvolvimento» para referir a surpresa que nos causou, ao ver reeditada uma velha tese salazarista e caetanista, ou seja, «que o motor do desenvolvimento só pode ser constituído pelos sectores que produzem bens que sejam objecto de transacção com o exterior, nomeadamente para a exportação»! Nós pensávamos que no nosso caso seria a formação não capitalista como aliás o têm reafirmado economistas de vários quadrantes, nomeadamente do PS, mas, afinal, vemos que não...
Será mesmo isto o que se quer dizer? Será que o Sr. Ministro do Plano subscreve esta tese? Fica aqui a interrogação.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Este programa não vai resolver os problemas da nossa economia mas antes, pelo contrário, agravá-lo. Manter-se-á a deficit da balança comercial, aumentará o desemprego, a dívida externa e a dependência. Os salários reais sofrerão novo corte e milhares de empresas serão condenadas à ruína.
Se esta política se concretizar, este Governo será o coveiro de milhares de empresas e ficará totalmente claro o que quer dizer o CDS quando afirma defender o sector privado.

Aplausos do PCP.

Isto é, defender os grupos económicos, os monopolistas os Bulhosas, os Oueias e os Melos, à custa da ruína das pequenas e médias empresas e da destruição do sector nacionalizado.
Mas quer o queiram quer não, as leis económicas continuam a demonstrar que a recuperação capitalista é incompatível com o desenvolvimento económico e a vida nos mostrará, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quem tem razão.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Amaro da Costa para pedir esclarecimentos.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, vou limitar-me a fazer-lhe três perguntas simples.
Quanto a observações que fez acerca do sector do turismo, para melhor compreensão do sentido das sus» críticas e dos seus comentários, seria pedir muito ao Sr. Deputado que nos elucidasse acerca do papel que atribui à iniciativa privada no sector do turismo e daquele que considera ser de reservar para o sector público nesta área, nomeadamente tendo o Sr. Deputado em conta a circunstância de nesta matéria, pelo menos, não haver qualquer inovação relativamente ao procedimento adoptado pelo I Governo Constitucional, perguntando-lhe se tem nomeadamente em conta o facto de no debate efectuado nesta Câmara a propósito do Plano para 1977 ter sido claramente identificada como opção, por parte desse Governo, a opção de que o turismo devia ser fundamentalmente da responsabilidade do sector privado e portanto a sua vocação privada devia ser preservada e acautelada.
Em todo o caso, há uma questão mais importante que valia a pena esclarecermos e talvez esclarecermos de uma vez por todas, se fosse possível. É a questão relacionada com as negociações com o Fundo Monetário Internacional. Talvez seja lacuna minha, talvez seja deficiência de informação. Embora seja leitor atento dos textos do PCP, como costumo dizer, por obrigação, que não por devoção, não fui ate agora capaz de identificar claramente uma posição nítida, transparente e clara do Partido Comunista acerca do problema do Fundo Monetário Internacional. Admito desde já que seja por ignorância minha ou incúria na leitura e no estudo desses» lex-toi. No entanto seria útil que sobre esta matéria o País, e esta Câmara em particular, conhecesse com pormenor e com rigor qual é a posição do PCP. Para ajudar a essa clarificação, permitir-me-ia concretizar algumas questões, duas ou três, que ilustram o sentido da minha interrogação.
O PCP, segundo penso, aceita a necessidade de no imediato existirem negociações entre o Governo português e o Fundo Monetário Internacional. Posso estar errado, se estiver errado corrigir-me-ão, mas este problema das negociações com o Fundo Monetário Internacional não é um problema abstracto. Constava do memorando do Primeiro-Ministro do J Governo Constitucional, apresentado nesta Câmara, e constava em termos de detalhe que certamente não escaparam a ninguém. A receita do Fundo Mone-

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tário Internacional era traduzida em vários aspectos de políticas a desenvolver no campo financeiro e em algumas do campo económico, mas havia algumas traduções simbólicas dos resultados quantitativos a que se teria chegado no acordo ou na negociação do I Governo Constitucional com o Fundo Monetário Internacional Indo mais longe, e uma vez que o I Governo caiu, era provável, era desejável, que o II Governo Constitucional tentasse um quadro de negociações com o Fundo Monetário Internacional mais benéfico para o nosso país. Dado que uma das questões que está em causa é a redução do deficit da balança de transacções correntes em 1978 relativamente aos volumes de deficit verificados em 1977, pergunto ao Sr. Deputado se o PCP alguma vez aceitou que esse deficit em 1978 se fixasse em 800 milhões de dólares. Pergunto também ao Sr. Deputado se alguma vez, nalguma instância, o PCP aceitou que se trabalhasse no sentido de que a taxa de inflação em Portugal no ano de 1978 não fosse superior a 20% e se alguma vez, nalguma instância, o PCP aceitou que a elevação da massa salarial em 1978 se situasse como limite em tomo dos 20%, com a possibilidade no entanto, como consta alias do Programa do Governo, de se realizar um ajustamento a meio do período, tendo em conta eventuais flutuações, para cima da taxa de Inflação e após valores de acréscimo na taxa de inflação superiores a certos índices.
Talvez estas sejam questões concretas que interessasse esclarecer, para no concreto se perceber de uma vez por todas quais são os limites dentro dos quais o PCP considera que existe hipoteca do Governo português ao Fundo Monetário Internacional e quais são os limites dentro dos quais considera razoável, se é que considera razoável, a existência de negociações com o mesmo Fundo.
A terceira questão tem a ver com aquilo que o Sr. Deputado, não sei bem com base em que textos ou em que fundamentos, apelidou de concepção salazarista ou caetanista ...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Eu já sabia!

O Orador: -... e que tem a ver com a definição que no Programa se dá, e não só no Programa mas também noutros textos, do sector motor da economia portuguesa, isto é, do sector que tem que desempenhar um papel estratégico. É evidente que os sectores numa economia são mais ou menos motores, mais ou menos fundamentais, consoante a análise que se faz dos problemas que é preciso resolver. O sector não é motor em abstracto, o sector é motor para alguma coisa, para algum objectivo que se considera prioritário. O Programa do Governo decorre de uma análise de objectivos a curto prazo bastante bem definidos e isso conduz a que se elenque à cabeça de todos os objectivos da política económica o da redução progressiva do deficit da balança de pagamentos, isto é, o problema das relações externas da economia portuguesa aparece na análise do Programa do Governo como o problema número um. Assim sendo, o sector motor para resolver esse problema deveria conceber-se como um sector capaz de contribuir para a que resolução, Pode não se dizer que esse é o problema fundamental e que o problema da balança de pagamentos não é um problema em si próprio, é um problema derivado e que, sendo derivado, há um problema prévio e um objectivo prévio que tem que ser definido e identificado. Se o Sr. Deputado for capaz de fazer esse milagre de ginástica que é conseguir meter o Rossio na Betesga nesta matéria de economia, ficar-lhe-ia grato, mas em todo o caso gostar Já de saber qual é para si o sector motor da economia portuguesa, se é ou não -parece que não é - o sector exportador de bens e serviços e o que contribua para a redução de importações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Emília de Melo, também para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Maria Emília de Melo (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, é só para um curto pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que falou nas empresas intervencionadas.
Em primeiro lugar, pergunto ao Sr. Deputado e concorda, como penso que sim, que os sectores definidos na Constituição são o sector público, o sector privado e o sector da propriedade social, não se fazendo portanto qualquer referência a sectores intervencionados. Assim sendo, pergunto se concorda ou não que o processo de desintervenções deve continuar e, já que fez tantas citações do Programa, talvez nesse aspecto pudesse ter citado as duas últimas linhas do último parágrafo da página 72, que diz: «as medidas legais nele contidas -Decreto-Lei n.º 422/76- que se mostram mais adequadas ao seu progresso e sem prejuízo da prévia consulta dos trabalhadores sobre a solução mais aconselhável para a desintervenção.» Gostaria de perguntar se o Sr. Deputado está ou não de acordo com isto.

O Sr. Presidente: - Se a Câmara não se importa, darei a palavra ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas para responder, apesar de já serem 20 horas, a fim de arrumarmos este assunto hoje.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez se confirma que o CDS está na primeira linha da defesa do Programa do Governo. Desta vez ainda conseguiu ser secundado.
Em relação à primeira questão que mie colocou, sobre o turismo e qual o papel da iniciativa privada neste domínio, pendamos que a iniciativa privada no turismo tem um papel importante a desempenhar, mas também o tem o sector nacionalizado, que no Programa não é referido. Mais ainda: é tal a intenção do Sr. Ministro em atacar o sector nacionalizado que, em relação ao auxílio às pequenas e médias empresas, o Programa praticamente não contempla qualquer medida. Mas ao Sr. Deputado Amaro da Costa, que me parece que em questões económicas e muito forte, mas que em relação ao Programa me parece que o não conhece muito bem, chamo-lhe a atenção para o seguinte: é que nas alíneas a), g) e li) do ponto 3 - «Melhoria da rentabilidade e viabilização das empresas privadas à custa da colectividade»- não há qualquer medida de apoio as pequenas

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Na política quanto ao desemprego do sector, nas alíneas g) e/) do Programa, o que se procura é, com base na melhoria da produtividade, os despedimentos colectivos. E em relação à alínea h) é claro, passar tudo o que se possa, depressa e bem depressa, para o sector privado. Este é que é o grande programa do Ministro, que também é um dos directores da CIP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em relação à segunda pergunta que me colocou, as negociações com o Fundo Monetário Internacional, começo por lhe agradecer ter feito e Também estamos de acordo em que é necessário reduzir a taxa de inflação, mas com o que não estamos de acordo é com as medidas preconizadas para se reduzir o deficit da balança de transações correntes, nomeadamente o aumento das taxas de juro, os limites de crédito, isto é, as medidas monetaristas, as medidas orçamentais e de limitação de crédito, que levarão à ruína das pequenas e médias empresas, a uma baixa de produção e a uma estagnação económica, e essas são as medidas do Fundo Monetário Internacional que repudiamos e com que não estamos de acordo, porque isto conduzirá à estagnação e ao desemprego. Esta foi a resposta clara que o PCP deu em relação às negociações com o Fundo Monetário Internacional.
Em relação à pergunta relativa ao sector motor die desenvolvimento, queria chamar a atenção do Sr. Deputado para o facto de que também outros Ministros da Indústria, do tempo de Salazar, descobriram esta nova fórmula die que a solução para os problemas económicos era produzir para o exterior, mas nós pensamos que a solução dos problemas económicos está em produzir para satisfazer as reais necessidades do nosso povo, está em utilizar todos os recursos nacionais, lesta em utilizar o principal motor da nossa economia, aquele que pode arrastar todos os outros sectores, que é o sector nacionalizado, que é o principal motor da economia portuguesa, e não em promover a produção para o exterior. Sr. Deputado, hoje nem Adam Smith, se aqui estivesse nesta Câmara, defenderia essa tese, mas o CDS parece que sim, parece que continua a defendê-la.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Não seja analfabeto!

O Orador: - Eu não posso admitir uma interrupção desta ordem da parte daquele Sr. Deputado. Aliás, ele é useiro e vezeiro em apartes destas.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção dos Srs. Deputados.

O Orador: - Em relação à pergunta da Sr.ª Deputada do PS, queria dizer-lhe que há uma grande distância entre a teoria e a prática. Não conheço nenhum dos objectivos do Plano para 1977 que o Governo tivesse cumprido, apesar de aqui a isso se ter comprometido, e em relação às empresas participadas gostaria die lembrar o que se passou com a MUNDET e com a FACAR, apesar de em votações democráticas, e por mais de uma vez realizadas, os trabalhadores terem afastado a hipótese de essas empresas serem devolvidas ao patronato.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, amanhã iniciaremos os trabalhos às 10 horas. Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 5 minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS)

Alfredo Pinto da Silva.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Jorge Maneira Portugal.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Miguel de Morais Barreto.
António Rico Calado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Manuel da Costa Moreira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Delmiro Manuel de Sousa Carneira.
Fernando Abel Simões.
Fernando Luís de Almeida Torres Marinho.
Fernando João Ferreira de Carvalho.
Florêncio Joaquim Quintas Matias.
Jerónimo dia Silva Pereira.
João da Silva.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Cândido Rodrigues Pimenta.
José Manuel Medeiros Ferreira.
José Manuel Parente Mendes Godinho.
Ludovina das Danes Rosado.
Luas Abílio da Conceição Canário.
Luís F Jipe Nascimento Madeira.
Lufo Patrício Rosado Gonçalves.
Manuel Augusto de Jesus Lima.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Pereira Dias.
Maria Alzira Costa de Castro Cardoso Lemos.
Maria Emília de melo Moreira da Silva.
Maria Margarida Ramos de Carvalho.
Maria Teresa Vieira Bastos Ramos Ambrósio.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Rui Paulo do Vale Valadares.
Serafim Olindo Ramos Bastos.
Teófilo Carvalho dos Santos.

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Partido Social-Democrata (PSD)

Antídio das Neves Costa.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
António Luciano Pacheco de Sousa Franco.
António Manuel Barata Portugal.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José da Costa.
Gabriel Ribeiro da Frada.
Jorge Ferreira de Castro.
Jorge de Figueiredo Dias.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Augusto Almeida de Oliveira Baptista.
José Dento Gonçalves.
José Ferreira Júnior.
José Rui Sousa Fernandes.
Luis Fernando Cardoso Nandim de Carvalho.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Élia Brito Câmara.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Olívio da Silva França.

Centro Democrático Social (CDS)

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
António Jacinto Martins Canaverde.
António João Pistacchini Gomes Mota.
António Simões Costa.
Caetano Maria Dias da Cunha Reis.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Domingos da Silva Ferreira.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel Farromba Vilela.
Henrique José Cardoso Menezes Pereira de Morais.
João Gomes Abreu de Lima.
José Luís Rebocho de Albuquerque Christo.
José Manuel Cabral Fernandes.
José Manuel Macedo Pereira.
Rui Fausto Fernandes Marrana.

Partido Comunista Português (PCP)

Francisco Manuel Duarte.
José Manuel Paiva Jara.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Manuel do Rosário Moita.

Independentes

Carmelinda Maria dos Santos Pereira.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

Fernando Jaime Pereira de Almeida.
Fernando Gomes Vasco.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
José João Santana Campos Rodrigues.

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Barroso Marques de Figueiredo.
António José dos Santos Moreira da Silva.
Eduardo José Vieira.
Fernando José Sequeira Roriz.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.

Centro Democrático Social (CDS)

João da Silva Mendes Morgado.
Rui Garcia de Oliveira.

O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.

PREÇO DESTE NÚMERO 23$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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