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1398 I SÉRIE-NÚMERO 39

vado dos votos exigindo firmes medidas, apesar dos apelos dos professores, dos pais e dos estudantes, apesar das tomadas de posição das organizações políticas progressistas da juventude, incluindo e por diversas ocasiões da própria Juventude Socialista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Posto este breve enquadramento ao texto constante do Programa do Governo, algumas considerações concretas sobre aquilo que desde já se pode ver ou perceber.
O aparelho escolar e o sistema de ensino têm, em regra, duas funções interligadas - a de dar uma formação profissional e a de veicular e reproduzir valores culturais, ideológicos e sociais. O ensino é, a um tempo, reflexo da sociedade e agente sobre da. Nas sociedades divididas em classes estas duas funções do aparelho escolar tendem a reproduzir e a manter a divisão de classes existentes na sociedade.
Isto, Srs. Deputados, não são elucubrações meramente partidárias. A Constituição acolhe-o e, face a essa compreensão, traça princípios programáticos e imperativos de ordem política geral e ideológica:

O princípio de que a democratização da educação a ser promovida pelo Estado visa contribuir, cito, «para o desenvolvimento da personalidade e para o progresso da sociedade democrática e socialista (artigo n.º 73.º, n.º 1»;
O princípio de que o Estado deve modificar o ensino de modo a superar a sua função conservadora da divisão social do trabalho;
O princípio do estímulo e favorecimento do acesso dos trabalhadores e dos filhos das classes trabalhadoras ao ensino e às mais elevadas qualificações.

Trata-se de traços fundamentais da visão constitucional dos direitos e deveres culturais, e como tais deviam merecer e marcar o programa de qualquer Governo democrático.
Entretanto, o Programa do Governo PS/CDS ignora essa dimensão cultural do ensino e os princípios referidos. O que nos oferece é uma visão tecnocrática que não técnica dos problemas do ensino, aparentemente desenquadrada de qualquer perspectiva política afirmativa. É digo aparentemente desenquadrada porque a omissão das formas de concretização dos princípios constitucionais vai de par com a presença implícita de uma ideologia tecnocrática, da recusa política de avançar no cumprimento de tais princípios. E digo que se trata de uma visão tecnocrática e não técnica parque a dimensão técnica dos problemas e das soluções, que é evidentemente fundamental, pressupõe uma articulação clara com uma dimensão de explicitação progressista; e a tecnocracia é precisamente o aparente eliminar dessa articulação para melhor esconder a sua base política direitista. É o que sucede neste Programa.
Torna-se entretanto claro que essa base é a da continuação da política de recuperação capitalista. Este é o programa que poderá servir no campo do ensino o grande capital, na sua tentativa de restauração do seu poder na economia nacional.

Aplausos do PCP.

Quais as necessidades do País a que se visa adequar a actividade educativa?
Serão as necessidades do desenvolvimento da economia com base nas grandes transformações económicas e sociais conquistadas pela Revolução Portuguesa e consagradas no projecto constitucional de transformação da nossa sociedade, ou as necessidades de um reduzido grupo de grandes capitalistas e de imposições do imperialismo? Que técnicos industriais e agrícolas? Que tipo de gestores? Uma parte da resposta é-nos dada pelo que o Programa contém no plano económico. A outra deduz-se do que há de compartimentação estanque dos graus escolares, na profissionalização restritiva que permite o contrôle repressivo dos mercados de trabalho e de emprego, na não previsão prioritária das medidas. Veja-se, por exemplo, o parágrafo 3.4.2.3., que diz que a selectividade se acentuará nos cursos complementares do ensino secundário e que convém no fundo despachar o maior número de estudantes possível, das escolas até aí. Sabendo nós que para quem o diz selectividade é sinónimo de rigor e qualidade de formação, parece poder entender-se que até aos cursos complementares o ensino pode decorrer em grandes preocupações de qualidade no sentido da despachar o mais depressa possível os jovens trabalhadores para o mundo do trabalho, e que, a partir daí, a partir do curso complementar, se entrará no mais forte crivo social de técnicos médios e superiores. Ou seja, alargar, por um lado, a base de recrutamento de mão-de-obra, com um mínimo de formação profissional que a torna rendível para o patronato, que facilite a formação de contingentes de desempregados de modo a poderem ser jogados como pressão contra a subida de salários e a manutenção do poder de compra dos trabalhadores. E, por outro lado, estreitar por crivos e becos sem saída o tipo, a origem social e a função social dos técnicos, de modo a poderem ser instrumentos dóceis do grande capital.
Que dizer da orientação vocacional focada no secundário geral? Tememos que no contexto deste esquema de ensino venha a servir para se concluir que o filho do sapateiro tem imenso jeito para vir a ser sapateiro e que o filho de um engenheiro tem imenso jeito para vir a ser engenheiro.
Há que dizer Srs. Deputados, que o Partido Comunista Português tem defendido, e aqui mesmo na Assembleia da República, e propugnado a necessidade de que à todos os níveis de ensino se incentive a ligação do ensino à vida, do ensino à prática. Ninguém tem insistido mais na necessidade de dotar o secundara de um terminal profissionalizante e de adaptar o ensino superior às necessidades do desenvolvimento do País em quadros técnicos preparados para o ingresso na vida profissional. Mas o que aqui é proposto é bem diferente, e inspira-se sobretudo na visão veiga-simoniana de formação profissional, restritiva, quase exclusivamente praticista e criando becos sem saída.
A dimensão tecnocrática «expurgada» dos imperativos políticos da Constituição verifica-se ainda, por exemplo, na reiterada incapacidade de pensar o problema da extinção do analfabetismo e da educação permanente, desaparecendo mesmo esta expressão e a formulação das suas medidas integradoras, tal