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3508 l SÉRIE - NÚMERO 88

Como povo que atravessou a histórica fazendo-se dizer por outros e com outros, não somos hoje donos da língua que falamos.
Dizer não em português não é só dizer papo-seco que o lisboeta consome ao seu pequeno-almoço.
Dizer não em português é dizer muitos espaços e culturas; muitos modos de pensar e de estar no Mundo; muitas formas de assumir o quotidiano e de o projectar no futuro.
O Dia Internacional da Língua Portuguesa será; pois, antes do mais, para nós, uma grande festa da fraternidade - festa de todos os que no seu dia-a-dia se reconhecem nos códigos seculares que fazem a nossa língua.
Mais do que intuitos pedagógicos, ou mesmo de salvaguarda de um património comum, vemos nesta celebração uma afirmação de mútuo reconhecimento e solidariedade.
Ao saudarmos a nossa língua comum, estaremos, necessariamente, a reconhecer as raízes e os laços que tão profundamente nos unem. Mas não estaremos com certeza a defender um património estático.
Sabemos que o português de amanhã será obra de todos. £ dizemo-nos desde já solidários com tudo o que de belo e de útil se vier a dizer com a língua de Gil Vicente e de Camões.
Da nossa solidariedade com o belo não vale a pena falar. Apoiaremos todas as iniciativas que visem encorajar e valorizar a produção literária em língua portuguesa e julgamos que o Dia Internacional poderá ser ocasião privilegiada para que os méritos de velhos e novos escritores, em qualquer quadrante, sejam devidamente reconhecidos e estimulados.
Onde o grupo parlamentar da UEDS desejaria colocar uma ênfase particular é na necessidade de continuarmos os esforços empreendidos nos últimos anos pela nossa Missão junto da UNESCO, no sentido de criar códigos' comuns entre todos os países de expressão oficial portuguesa, no que se refere à nova linguagem Científica e técnica, hoje em permanente elaboração.
É um domínio aparentemente menos nobre -a ciência serve também o útil, e não exclusivamente o belo desinteressado-, mas é sem dúvida um dos grandes domínios onde se forjará a língua do futuro.
Vamos -cada uma das comunidades que se exprime em português- «aportuguesar» à nossa maneira os vocábulos técnicos que a era da automação nos proporá, em primeira mão, em inglês? Ou vamos criar vocábulos comuns, fiéis às nossas raízes e ao nosso contexto vivencial?
O Dia Internacional da Língua Portuguesa velará por esta e por muitas outras questões com que a temática da língua portuguesa neste momento se confronta.
Por isso nos alegramos e saudamos, com todos os grupos parlamentares aqui presentes, a proposta que hoje aqui será votada, esperamo-lo, por unanimidade.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscrevemos a proposta de

resolução sobre o Dia Internacional da Língua Portuguesa e vamos aprová-la porque constitui uma iniciativa justa, sob sugestão da Sociedade de Língua Portuguesa.
A língua, que é património e é devir, incumbe-nos preservá-la e difundi-la enquanto património, mas, do mesmo modo, não a crestar nem a estiolar nas dimensões do seu devir.
Uma língua que tem atravessado todas as vicissitudes da história e que vem sendo elaborada pelo nosso povo, em termos de a considerarmos hoje não apenas um dos fundamentais veículos de expressão dá nossa cultura e de identidade do nosso rosto, mas também um elo que nos religa a outras culturas e a outros povos, é, sem dúvida, algo que devemos acarinhar e tratar com todo o desvelo, mas também com todo o realismo.
A língua portuguesa, que esteve, num passado recente, submetida à sufocação por parte da ditadura fascista, encontra hoje, no Portugal democrático, novas expressões da sua realização.
Em democracia, uma língua frutifica, desenvolve-se e enriquece-se qualitativa, e quantitativamente por essa cadeia enorme que, é a criatividade popular.
Devemos não esquecer isto e pensar nas responsabilidades que nesta matéria cabem ao Estado democrático: o combate ao analfabetismo, o combate a todas as deficiências da rede de ensino e a defesa dos elementares princípios de uso correcto da língua portuguesa nas instâncias políticas e diplomáticas, nacionais e internacionais, o que, como é sabido, muitas vezes, infelizmente, se não faz; por outro lado, a difusão e, do mesmo modo, o aprimoramento da capacidade e das potencialidades da língua junto dos emigrantes; por outro lado ainda, nos órgãos de comunicação social e por toda a parte, a defesa estrénua dos seus mais radicais e elementares valores, o que não pode confundir-se com o fechar de portas ao que de positivo advém da influência de outras culturas, mas também não pode confundir-se com o relaxamento e o abastardamento que a descaracterizam e desconfiguram. A língua não é um sinónimo de povo, não é um sinónimo de cultura, não é uma fórmula abstracta de dizer uma pátria. A língua é uma fronteira, talvez porque, enquanto tal, se afirma na sua identidade própria, mas é uma fronteira aberta, porque permeável, porque favorecedora da intercomunicabilidade, do enriquecimento estético e cultural, entre diferentes produções dos diferentes povos.
E, nessa dimensão, uma palavra muito peculiar neste momento cabe relativamente aos novos países de expressão portuguesa, ao Brasil e a todas as comunidades que, sob o uso da língua portuguesa, mantêm incólumes, e enriquecedoramente, os estratos que, vindos de trás, nos projectam e nos dignificam.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Está encerrado o debate. Passamos de imediato à votação da proposta de resolução.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, tendo a Assembleia aplaudido de pé o resultado da votação.

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