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O Orador: - Só que até nisso o Governo é inepto: algumas das propostas tapa-olhos - podemos chamar-lhes assim - foram repescadas do refugo dos artigos rejeitados em todos os orçamentos do Estado debatidos nos últimos anos (é o caso do famigerado imposto de saída do País, anatemizado em 1981 pelo PS e pelo PSD) e proposto agora em termos perfeitamente tolos; quanto à oneração das viaturas automóveis, barcos e aeronaves, o Governo já tinha no orçamento em vigor uma linha de orientação centrada em torno dos chamados sinais exteriores de riqueza. A proposta agora apresentada insere-se numa outra linha que acaba por deixar de fora certas viaturas de luxo hoje abrangidas e por deixar de lado (curiosamente!) a questão, hoje prevista, das moradias com piscina ou campo de jogos (alguém deve saber porquê e para quem é feita esta viragem do Governo).

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Diga-se, aliás, a talho de foice, que o Governo também acabou por deixar cair o tão propagandeado, a certa altura, propósito de tributação de segundas residências e outras que tais.
Não é este o momento de detalhar a análise de tudo aquilo que entre bluffs e ameaças reais se contém nas propostas do Governo. Muitos outros camaradas meus terão ocasião de apreciar em profundidade as numerosas implicações das medidas que nos são propostas pelo Governo. O que importa, em sede desta impugnação, é que para levar a cabo esta operação contra a bolsa dos Portugueses o Governo pretende exercer uma violência inédita, digamos até cavernária, contra a Assembleia da República, pretende impedir que esta exerça os seus poderes num domínio dos mais fundamentais e quer que a Assembleia, do mesmo passo, viole a Constituição tributária.
Ora, em matéria fiscal e orçamental (tanto ou mais que nas restantes) mesmo os maus, os péssimos objectivos, só podem ser realizados através de certos e não de quaisquer meios. Há formas, há competências, há limites. A Constituição acautela que as relações entre os cidadãos e o fisco não possam confundir-se com a selva ou com a extorsão inquisitorial. A história dos parlamentos - todos o sabemos - é, em grande medida, a história da supressão dessas confusões e da fixação de limites que representam para os cidadãos uma importante garantia. E essa garantia que as propostas de lei n.º 38/III a 44/III põem em causa.
Donde a presente impugnação através da qual o Grupo Parlamentar do PCP afirma e demonstra 3 coisas: em primeiro lugar, que com a operação traduzida na apresentação conjunta destas 7 propostas o Governo pretende levar a cabo uma revisão encapotada do Orçamento do Estado vigente, à revelia do procedimento constitucionalmente previsto para o efeito; em segundo lugar, que quanto à sua substância concreta, o alvo verdadeiro da operação governamental é o agravamento intolerável das distorções, taras e injustiças do sistema tributário, ao arrepio dos rumos traçados pela constituição fiscal e com grave lesão dos rendimentos dos trabalhadores e de outras camadas profundamente atingidas pela política governamental de corrosão do poder de compra, estagnação da produção e de agravamento das nossas dependências; em terceiro lugar, afirmamos e provamos que o Governo pretende prosseguir a desgraçada política económica e financeira em que se inserem estas propostas inconstitucionais, usurpando sistematicamente as competências próprias da Assembleia da República, sonegando-lhe informações vitais, querendo castrá-la de qualquer efectiva intervenção nas escolhas e na celebração dos compromissos que talharão ou condicionarão o futuro dos Portugueses nos próximos anos.
Tudo isto afirmamos e provaremos. Basta que sobre os factos nos debrucemos um pouco mais para comprovarmos que todas estas imputações não pecam por excesso.
A primeira pergunta a fazer é, segundo nós, esta: como se inserem estas propostas, esta operação, na nossa situação orçamental? A resposta é: mal!
Portugal, além de não ter plano para 1983, vive, no tocante às finanças públicas, uma situação de escanifrada anomalia: o orçamento que temos é o mesmo orçamento que tínhamos quando estava na oposição o principal partido que agora está no Governo. Esse orçamento, que trazia o carimbo de «provisório», sofre alterações constantes no processo de execução, é refeito e desfeito à toa, sem que lhe bulam na letra (está cada vez mais definitivo e cada vez mais letra-morta). O Parlamento, que nesta matéria tudo devia ordenar e controlar, nem sequer é informado das miudezas elementares quanto mais das informações relevantes, vão levá-las a Nova Iorque, nada controla, quase nada ordena.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E dir-se-ia que este Governo busca, e busca por todos os meios, uma situação de anomia orçamental de indiscritível ausência de regras e controles. Quer assumir, num quadro que é cada vez mais opaco, obseuro e malsão, poderes exorbitantes para dirigir, rumo ao abismo, a nossa barca orçamental bem desconjuntada. A rota, essa vai traçada sigilosamente segundo os mapas do Fundo Monetário Internacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não pode ser. O Governo não pode continuar a vir aqui pedir inconstitucionalidades sobre inconstitucionalidades em matéria financeira, ainda por cima a poucas semanas da entrada em vigor das normas da revisão constitucional, que lhe reduzem drasticamente os poderes orçamentais.
Em Julho assistimos, com incredulidade e indignação, à apresentação, pela primeira vez na história do constitucionalismo, de uma proposta através da qual o Governo pedia à Assembleia que se auto-expropriasse dos seus poderes indelegáveis em matéria de autorização de despesas públicas para os depositar, inteiros, nas mãos ministeriais. Era um pedido de ditadura financeira por 6 meses - como então dissemos e ninguém ousou desdizer - e, em boa hora, após duros e persistentes esforços, a proposta foi retirada, derrotada. Foi para o museu histórico das monstruosidades legislativas e lá está até agora amortalhada.
Passados 2 meses, eis que nos chega à porta um cortejo de propostas não menos dignas do museu dos horrores legislativos.
Donde, o primeiro fundamento da impugnação do PCP: o Governo quer fazer uma revisão orçamental à revelia das normas para os efeitos constantes da Constituição da República.