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REUNIÃ0 PLENÁRIA DE 22 DE SETEMBRO DE 1983

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO.-O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 45 minutos.

Antes de ordem do dia. - Foram aprovados os n.os 15 a 24 do Diário.
Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e da resposta a um outro.
Em declaração política, o Sr. Deputado Daniel Bastos (PSD) chamou a atenção do Governo e da Câmara para os problemas mais candentes que afectam Trás-os-Montes, nomeadamente o distrito de Vila Real.
Também em declaração política, o Sr. Deputado José Tengarrinha (MDP/CDE) criticou a actuação do Governo, em especial no campo económico.
Foram discutidos e votados os seguintes votos: de pesar e protesto, pela condenação à morte de 3 jovens do ANC na África do Sul, apresentado pelo PCP, MDP/CDE, UEDS e ASDI, que foi aprovado; de protesto, contra a destruição, pelas autoridades soviéticas, do avião comercial sul-coreano e de apoio às medidas tomadas pelo Governo, no caso, do PS e PSD, que também foi aprovado; de protesto, em relação ao incidente verificado com jornalistas portugueses aquando da escala do Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, George Bush, na base das Lajes, nos Açores, do PCP, que foi rejeitado; de pesar e protesto, pelo ataque, por parte do exército da Indonésia, à povoação de Viqueque, em Timor-Leste, o que provocou grande número de mortes, subscrito por todos os grupos e agrupamentos parlamentares, que foi aprovado.
A diverso título, pronunciaram-se sobre os mesmos os Srs. Deputados Alda Nogueira (PCP), Carlos Lage (PS), César Oliveira (UEDS), Jorge Lemos (PCP), Raul de Castro (MDP/CDE), Cardoso Ferreira (PSD), Nogueira de Brito (CDS), Magalhães Mota (ASDI) António Rebelo de Sousa (PS), Luís Beiroco (CDS), Vilhena de Carvalho (ASDI), Lopes Cardoso (UEDS), Manuel Alegre (PS), Raul Gomes dos Santos (PSD), Furtado Fernandes (ASDI), João Comes (PS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Lemos Damião (PSD), Rodolfo Crespo (PS), Carlos Brito (PCP) e Hasse Ferreira (UEDS) e fizeram declaração de voto os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) e Montalvão Machado (PSD).

Ordem do dia. Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, sobre substituição de deputados do PSD e do CDS.
A Assembleia concedeu prioridade e urgência para a discussão das propostas de lei n.os 38/III (aumento da percentagem, para o Estado, do imposto especial sobre o jogo); 39/III (imposto incidente sobre boîtes, bares, night-clubs e locais congéneres abertos depois da meia-noite); 40/III (imposto de saída do País); 41/III (imposto extraordinário incidente sobre os rendimentos colectáveis sujeitos a contribuição predial, imposto de capitais e imposto profissional); 42/III (imposto especial sobre os veículos ligeiros de passageiros e motociclos de cilindrada superior a determinados limites, barcos de recreio e aeronaves; 43/III (elevação da taxa de sisa para 15 % nas transmissões de prédios urbanos ou de terrenos para construção de valor igual ou superior a 10000 contos), e 44/III (alteração do imposto do selo), registando-se intervenções, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado (Alípio Dias), dos Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), Carlos Brito (PCP), Raul de Castro (MDP/CDE), Carlos Lage (PS), Nogueira de Brito (CDS) e Almerindo Marques (PS).
Foi aprovado um requerimento da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias no sentido de que esta funcione até 14 de Outubro próximo, tendo o Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP) proferido declaração de Voto.
Procedeu-se às eleições do presidente do Conselho Nacional do Plano, que foi eleito, e para os lugares vagos do Conselho Superior de Defesa Nacional e do Conselho de Comunicação Social, que serão repetidas parcialmente.
Iniciou-se a discussão na generalidade das propostas de lei atrás referidas, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, os Srs. Deputados Octávio Teixeira, Ilda Figueiredo, José Magalhães, Zita Seabra e Carlos Brito (PCP), Bagão Félix e Nogueira de Brito (CDS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 45 minutos.

Encontravam-se presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
Aníbal Coelho da Costa.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José Santos Meira.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto R. Santana Maia.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo.
Ferdinando Lourenço de Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Joaquim Gomes.
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José António Borja S. dos Reis Borges.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Filipe Pessoa Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria de Jesus Barroso Soares.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sotto Mayor Leal Cardia.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
César Augusto Vila Franca.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Mendes da Costa.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.

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José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Luís António Pires Baptista.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Raul Gomes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Victor Pereira Crespo.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Manuel Silva Ribeiro Almeida.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Raimundo do Céu Cabral.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Bernardo Lobo Xavier.
António José Castro Bagão Félix.
Cristiano Brandão Lopes.
David José Duarte Ribeiro.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias M. Coutinho de Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
José Henrique Meireles de Barros.
José Luís Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte de Góis.
Narana Sinai Coissoró.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
José António Furtado Fernandes.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca. José Manuel do Carmo Tengarrinha. Raul Fernandes de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a primeira parte do período de antes da ordem do dia destina-se à aprovação dos n.ºs 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23 do Diário da Assembleia ela República, 1ª série, respeitantes às reuniões plenárias de 5, 6, 7, 8, 11, 12, 13, 14 e 15 de julho, respectivamente, e o n.º 24, respeitante à reunião da Comissão Permanente de 27 de Julho.

Pausa.

Srs. Deputados, há quórum para os trabalhos, mas não há quórum para votação, pelo que suspendo a sessão por 15 minutos.

Eram 10 horas e 47 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 11 horas e 5 minutos.

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Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda não existe quórum para se poder proceder a qualquer votação. Peço, pois, aos Srs. Presidentes dos grupos parlamentares para se pronunciarem sobre o assunto.
Poderíamos, talvez, começar pelas intervenções ...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, atrevia-me a sugerir à Mesa e aos Srs. Deputados que fizéssemos o debate de todos os votos agendados para hoje e que depois os votássemos em conjunto.

Vozes do PCP: - Não, não!

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - E as declarações políticas?

O Orador: - Sr. Deputado, o meu entendimento é o de que as declarações políticas se farão depois da discussão e votação dos votos, porque têm sempre oportunidade de ser feitas, mesmo quando o período de antes da ordem do dia está terminado. Se fizermos o contrário, o que acontece é que as declarações políticas absorvem o período de antes da ordem do dia e os votos ficam, mais uma vez, adiados.
Julgo que foi esta razão que levou a conferência dos líderes parlamentares a aceitar que hoje se discutiriam os votos, com o tempo globalmente estabelecido, ou seja, 8 minutos para cada grupo ou agrupamento.
Penso que esta é a forma mais sensata: começar pelos votos e depois passarmos às declarações políticas, uma vez que estas não ficam prejudicadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, lembro-lhe que ainda está em causa a votação dos Diários da Assembleia ...

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, informo-o de que o entendimento do MDP/CDE não coincide com o do Sr. Deputado Carlos Lage.
Pensamos que a dignidade de uma declaração política é uma praxe desta Casa que deve ser mantida. Portanto, nós consideramos que, independentemente dos 8 minutos concedidos a cada partido para a discussão dos votos, se deve proceder imediatamente à leitura das declarações políticas, para o que já nos inscrevemos anteontem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero pronunciar-me sobre a questão que está a ser objecto de discussão em Plenário e para dizer que, pela nossa parte, está assente um compromisso solene de que os votos serão discutidos hoje de manhã. Creio que isto sobreleva tudo o mais.
Parece-me, pois, não haver razão para que atropelemos o Regimento e as praxes da Assembleia da República e que as declarações políticas, que pela sua dignidade têm ocupado sempre, desde que a Assembleia da República funciona, o início do período de antes da ordem do dia, sejam agora remetidas para depois dos votos.
Vamos, pois, ouvir as declarações políticas e a seguir, seja qual for o tempo que estas consumirem os votos serão discutidos e votados de acordo com o compromisso que ficou assente da conferência dos líderes dos grupos parlamentares.
Portanto, nós fazemos questão que os votos sejam discutidos e votados hoje de manhã.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero fazer aqui uma guerra por causa desta questão, mas, na verdade, as coisas serão diferentes se agora forem apreciados os votos e feitas as declarações políticas depois. E é assim porque, naturalmente, se iniciarmos a sessão pelas declarações políticas - e estas vão inevitavelmente absorver todo o período de antes da ordem do dia - e apreciarmos os votos a seguir, passaremos, inevitavelmente, toda a manhã com estas questões.
Se primeiramente apreciarmos os votos - que serão discutidos na hora do período de antes da ordem do dia - e se a seguir se proferirem as declarações políticas, não há pedidos de esclarecimento nem protestos que sejam susceptíveis de ser respondidos ou formulados e a sessão acabará em tempo razoável.
Por outro lado, também se pergunta: sabendo os Srs. Deputados que as declarações políticas têm sempre prioridade, para que é que, então, os votos são apresentados na Mesa? Qual é a intenção e a finalidade da apresentação de votos? É apenas uma descarga de consciência, é apenas um gesto quixotesco sem qualquer sentido?
Sr. Presidente, nesta conformidade, o Grupo Parlamentar Socialista aceita a decisão que o Sr. Presidente tomar. No entanto, parece-nos que o mais razoável seria seguir o caminho que indicámos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, com efeito, na reunião dos líderes dos grupos parlamentares ficou assente que estes votos seriam apreciados e votados hoje.
Se esgotarmos o tempo do período de antes da ordem do dia com outros assuntos, os votos já não serão votados hoje. Pelo contrário, se as declarações políticas forem feitas depois, automaticamente o tempo do período de antes da ordem do dia será acrescentado para que elas possam ser produzidas.
Não creio, pois, que esta alteração, que, em princípio, os grupos parlamentares aceitaram na reunião, vá prejudicar de qualquer maneira o debate.
Tem a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca

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23 DE SETEMBRO DE 1983

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, é evidente que na reunião dos líderes parlamentares aceitámos que se procedesse hoje b discussão e votação dos votos, com o que continuamos de acordo. Mas gostaríamos que não fosse quebrada a praxe que aqui sempre se tem verificado de as declarações políticas terem toda a prioridade.
Seria um mau principio que hoje, exactamente hoje, se ultrapassasse essa praxe. A verdade é que nada impede que o nosso partido faça a declaração política - e creio que não é apenas o nosso partido - e que, no caso de se chegar ao termo da hora do período de antes da ordem do dia, se prolonguem os trabalhos por mais meia hora.
E, Sr. Deputado Carlos Lage, não há, com certeza, grande preocupação de tempo por parte dos partidos da maioria, pois já são 11 horas e 15 minutos
até agora não houve quórum. Se, realmente, todos os partidos estivessem aqui
à hora regimental, como nós estávamos, já tínhamos uma hora e um quarto de trabalho efectivo e não estaríamos agora a discutir e a preterir as discussões políticas.
Sr. Presidente, nós queremos que se cumpra a praxe e o Regimento, como sempre se tem levado a efeito, dando-se prioridade às declarações políticas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já temos quórum para votar, pelo que vamos seguir a ordem dos trabalhos.
Uma vez que não há consenso para se fazer ao contrário, far-se-ão primeiro as declarações políticas e depois ver-se-á.
Portanto, Srs. Deputados, e de acordo com o ponto 1 do período de antes da ordem do dia, estão em aprovação os n.ºs 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23 do Diário da Assembleia da República, 1 º série, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 5, 6, 7, 8, 11, 12, 13, 14 e 15 de Julho, e o n.º 24, respeitante à reunião da Comissão Permanente de 27 de Julho.

Pausa.

Não havendo qualquer objecção, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vai ser feita a leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Abaixo assinado dos ajudantes de despachante da Alfândega do Porto (sede), remetendo fotocópia da exposição apresentada a S. Ex º o Sr. Presidente da República, apelando para que também esta Assembleia interceda no sentido de lhes ser feita justiça.
Carta de Vasco Marques, aposentado dos CTT e residente no Bombarral, expondo a situação de injustiça de que foi alvo, por não lhe ter sido considerada uma promoção nos quadros da empresa e solicitando que sejam tomadas providências.

Da Assembleia Municipal de Olhão, transcrevendo uma moção que foi aprovada naquele órgão autárquico, exigindo a aplicação integral da lei das finanças locais.

Da Câmara Municipal de Lagos, remetendo um exemplar da moção aprovada naquela autarquia, acerca das tarifas da energia eléctrica, manifestando discordância pela aplicação da Portaria n º 755-A/83.
Da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses, Intersindical Nacional, com sede em Lisboa, dando conhecimento da diligência efectuada, por oficio, junto do Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, no sentido da prorrogação do prazo para apreciação do projecto de diploma sobre a suspensão ou redução temporária da prestação de trabalho.

Telexes

Dois telexes do Sindicato dos Trabalhadores na Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul, dando conhecimento das posições já expressas por várias entidades doa sectores que representam, que condenam a lei dos despedimentos (lay-off).
Dois telexes do Gatimor - Gabinete dos Assuntos de Timor, contendo comunicados acerca das prepotências das autoridades indonésias, nomeadamente perseguições aos resistentes e o massacre de 260 aldeões, incluindo mulheres e crianças, apelando para que se denunciem mais estas dramáticas situações, no sentido de se evitarem novos massacres.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos:

Na reunião do passado dia 20 de Setembro: ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Daniel Bastos; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados Vidigal Amaro e Zita Seabra; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Mulato Correia; aos Ministérios da Administração Interna e Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Angelo Correia; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado José Vitorino, e ao Ministério da Administração Interna e Secretaria de Estado da Administração Autárquica, formulada pelo Sr. Deputado José da Cunha e Sá.
Na reunião do dia 22 de Setembro: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Brito; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelos Srs. Deputados António Rebelo de Sousa, Paulo Barral e Leonel Fadigas, e à Câmara Municipal do Porto, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Laranjeira Vaz.

Por sua vez, o Governo respondeu a um requerimento apresentado pelos Srs. Deputados João Teixeira, Daniel Bastos e Abílio Araújo Guedes, na sessão de 28 de Julho passado.

Entretanto, tomou assento na bancada do Governo, o Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares (Armando Lopes).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Daniel Bastos.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O «Reino Maravilhoso» como Miguel

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Torga designa a sua terra, Trás-os-Montes e Alto Douro, continua a ser sinónimo de isolamento, de interioridade, de dificuldades nos diferentes sectores que determinam as condições de vida dos que ali residem e labutam, agarrados pela força telúrica que domina a sua existência.
A região transmontana, cheia de contrastes, rodeada por escarpadas serranias, quase intransponíveis, quase estéreis, recobertas de raquíticos gravetos ou salteadas, de onde a onde, de densas florestas, prenhe no seu âmago de extensos socalcos cultivados de vinhedos ou planícies atapetadas de prados, cereais e leguminosos, agreste, num clima de acentuada amplitude térmica, dividida entre terra fria e terra quente, paradisíaca pelo contraste de paisagens multicolores, acolhedora pelo trato afável, hospitaleiro e franco das suas gentes, é tema para mais uma reflexão, grito para mais ,um alerta, exemplo para mais um clamor da injustiça que se eterniza e continua a fazer-se sentir agudamente.
Chamar a atenção do Governo, através dos meios de que dispomos, e, muito especialmente, desta Câmara para os problemas mais candentes que afectam Trás-os-Montes, nomeadamente o distrito de Vila Real, é imperativo daqueles que, como nós, sentem no dia a dia as dificuldades, auscultam os brados de revolta, adivinham o crescente desencanto, pressentem o desespero de um povo simples, pacífico, honrado e trabalhador, ciente das suas obrigações de cidadãos, mas igualmente consciente dos seus direitos e das injustiças de que através dos tempos tem sido vítima.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Exemplos desta marginalização são as dificuldades crescentes na agricultura, quase único factor económico de subsistência na região, agravadas pela subida desmesurada do preço dos adubos; são a deficiente distribuição e comercialização dos diferentes produtos da terra; são as diferenças de tratamento provocadas pelo custo de transportes de mercadorias, como o cimento, enquanto a electricidade aí produzida é mais cara na origem do que em certas localidades do litoral; são o estado lastimoso das suas vias férreas; são a falta de cobertura televisiva do segundo canal e a permanente irregularidade do primeiro; são a cada vez mais depauperada e deficiente rede de estradas de que as ligações Vidago-Chaves, Vila Real-Sabrosa e Vila Real-Amarante são exemplos gritantes; são, enfim, inúmeros problemas, que têm sido levantados nesta Câmara sem que qualquer eco tenha influenciado quem compete partilhar, equitativamente, os bens que são pertença da comunidade nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O principal eixo rodoviário e de penetração para toda a região, que desde Basto se estende até Miranda, e uma estrada de largas dezenas de anos, que se desenvolve num traçado anguloso, enleante, qual réptil fugindo no emaranhado da floresta, atravessando as penedias alcantiladas do Marão e ligando o litoral duriense ao extremo nordeste das terras bragançanas.
Estrada de perfil antiquado, desajustado às necessidades do tráfego da vida actual, encontra-se em péssimo estado de conservação, agravando o tradicional isolamento e dificultando, cada vez mais e progressivamente, o desenvolvimento a que os transmontanos têm direito e o consequente equilíbrio inter-regional do nosso País.
As obras da via rápida IP/4, cujo lançamento foi publicamente anunciado há cerca de 3 anos, encontra-se na fase inicial, somente com 2 dos seus 14 troços em execução, quando o período previsto para conclusão total das obras teria como limite o ano de 1985.
Desde há vários anos que tem sido afirmada por vários responsáveis governamentais a intenção de dar continuidade à execução total deste projecto e expendida a opinião de que tal empreendimento é vital para o tão propalado desejo de se desenvolver toda a região norte interior.
Apesar de tais afirmações terem sido feitas com ênfase, em cerimónias públicas que mais responsabilizavam os seus autores, verifica-se, pela decorrer dos trabalhos, que tais obras se arrastam indefinidamente, em ritmo de tal maneira lento que nada ficarão a dever, pelo tempo de duração, às célebres «obras de Santa Engrácia».
Atendendo a que nenhum dos lanços actualmente em construção se situa na zona da serra do Marão, onde num percurso de cerca de 25 km mais se fazem sentir as dificuldades de locomoção, onde as curvas contínuas, o acidentado dos terrenos, os buracos do pavimento, as bermas esventradas, a estreiteza da faixa de rodagem, são um perigo constante, sugere-se que, de imediato, se tomem medidas que atenuem o mal-estar e o desencanto de todos quantos vêem na estrada do Marão um dos principais óbices para o desenvolvimento de todo o Nordeste Transmontano.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador. - Foi com satisfação expectante que todos os vilarealenses assistiram à cerimónia de assinatura pelo anterior Primeiro-Ministro do concurso de pré-qualificação para a empreitada deste lanço rodoviário; foi com idêntica e renovada esperança que tiveram conhecimento que no Programa do actual Governo, no capítulo referente ao equipamento social, se menciona a seguinte passagem:

Os programas de investimento conferirão prioridade à reabilitação da rede existente e ao completamento dos itinerários principais Porto-Bragança [...]

Pela confluência dos 2 factores apontados, o lançamento da estrada do Marão, entre o Alto de Espinho e Amarante, poderá ser uma realidade em breve; no entanto, o atraso que se tem verificado no desenvolvimento deste processo, aliado ao facto de tal troço de estrada ser de difícil execução, o retardamento será inevitável e alguns anos nos separarão ainda dessa benéfica e ansiada realidade.
A degradação existente na actual rodovia impede que se adie por mais tempo uma resolução equilibrada e eficaz; não se pode esquecer que, mesmo com a via rápida concluída, há várias povoações que ladeiam a actual estrada que não poderão deixar de continuar a utilizá-la. Na conjugação de todos os factores expostos e na procura de solução que evite o iminente isolamento do Nordeste Transmontano apelamos com toda a veemência, exigimos com todo o vigor e a frontalidade de quem se julga ciente de um direito inquestionável, que seja acelerado e se desenvolva com a rapidez que

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tão dramática situação exige, todo o projecto da IP/4, sobretudo no trajecto de ligação Campeã-Amarante e, de imediato, se preceda à renovação do piso na actual estrada, com um tapete betuminoso, que atenue os malefícios da degradação existente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por várias ocasiões e por diferentes formas temos reclamado e dado a conhecer algumas das dificuldades e principais necessidades que mais atingem os nossos concidadãos de Trás-os-Montes e Alto Douro; por várias vezes os problemas agora apontados têm sido expostos nesta Assembleia.
Que desta vez, para além de um chamamento de atenção, para além de um alerta, esta intervenção seja considerada um grito uníssono, desesperado, de todos os transmontanos que exigem justiça e que as palavras se consubstanciem em obras.
Que o eco desta intervenção seja auscultado, que ele imediato se tomem medidas tendentes a dar soluções adequadas e que a descrença se transforme em esperança e esta em realidades.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul de Castro, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Para formular um pedido de esclarecimento ao orador que acaba de intervir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os pedidos de esclarecimento ficam inscritos para a próxima sessão.
Tem a palavra, também para uma declaração política, o Sr. Deputado José Tengarrinha.

O Sr. José Tengarrinha (MDP/CDE): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: A actuação do Governo PS-PSD desenhou já com suficiente nitidez as coordenadas da sua orientação para que possamos avaliá-lo não só pelo que fez, até agora, mas também pelas consequências que provocará no futuro do nosso País.
Antes de tudo, que poderemos dizer do Partido Socialista que chefia o Governo, nele mantém as principais responsabilidades e se comprometera com grande ênfase, perante o eleitorado, a 100 medidas nos primeiros 100 dias, das quais foram cumpridas não mais de uma dúzia? O que se fez no combate à corrupção, considerada a primeira das prioridades? E a revisão do novo Código Penal, e a aprovação do plano de construção de barragens hidroeléctricas, e os estímulos fiscais para as empresas investidoras e geradoras de novos postos de trabalho, e o crédito de risco de investimento para PMEs a constituir, e a criação de uma nova classe empresarial, e a revisão do sistema de incentivos ao investimento industrial, e o desenvolvimento do sector empresarial do Estado na área das pescas, e á implementação do crédito agrícola assistido, e o estímulo à criação de entrepostos cooperativos para comercialização de produtos agrícolas, e os esquemas de reforma de agricultores idosos, e o lançamento do programa de construção de pequenas barragens para conquista de novas áreas de regadio, e a revisão da lei das rendas comerciais, e a aprovação de um esquema de animação e retoma do sector da construção civil, e a revisão do regime de renda habitacional e a actualização do salário mínimo nacional,
e a institucionalização do diálogo com os parceiros sociais- apenas para citar algumas das mais importantes.
E, no entanto, no próprio documento em que eram feitas estas promessas, podia ler-se:
Das muitas medidas no seu manifesto-programa, o PS seleccionou 100 que, pela sua importância e urgência, se compromete a tomar nos primeiros 100 dias de governo. Não há entre as medidas escolhidas medidas demagógicas ou eleitoralistas. Não se promete o que não se pode cumprir. É um compromisso sério que o PS formalmente assume perante os portugueses e pelo qual se obriga a dar contas. Um compromisso pelo qual deseja ser julgado como índice de competência, seriedade e eficácia. Ao propor um tal compromisso, o futuro governo representará algo de novo no panorama político português. Os Portugueses avaliarão esta proposta de seriedade que o PS lhes apresenta.

Perante isto, não poderemos deixar de interrogar-nos, com inquietação: como se quer que a democracia se prestigie, que os partidos aprofundem as suas raízes na sociedade, que os cidadãos acreditem em certos políticos quando as promessas são feitas tão levianamente que parece nunca ter havido ideia de cumpri-las, quando as intenções têm a ligeireza de um jogo de prestidigitação, quando as palavras mais não são do que muros de silêncio para esconder os reais propósitos?
Porém, foi o Governo rápido noutras medidas, com a delimitação dos sectores - retomando a lei da AD, mas que esta não tivera força política para fazer aprovar-, alteração da legislação laborai, contenção de aumentos salariais das empresas públicas e na função pública, subida de taxas de juro, elevação brusca de preços de bens essenciais, desvalorização do escudo, mudança nas chefias militares e tantas outras que mostram indiscutivelmente que no fundamental a actuação deste Governo não apresenta diferenças qualitativas significativas em relação aos da AD. Ou melhor, as diferenças que existem resultam de este Governo ter agora condições políticas mais favoráveis para levar para a frente medidas que os da AD pretenderam mas não puderam concretizar. Como principal responsável do Executivo, o Partido Socialista esqueceu as suas promessas ao eleitorado e apresenta, no plano programático, uma conduta que mais se identifica com a vertente de direita do PSD o que certamente não deixará de ser causa de equívocos no quadro político partidário. E o que é ainda mais lamentável é que esta actuação não seja orientada por necessidades governativas, mas para aplanar o campo que permita a realização de projectos de ambição pessoal que nada têm a ver com os problemas do País.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tem-se argumentado que sem a tomada urgente de medidas financeiras - visando a redução do défice da balança de transacções correntes com a consequente contenção do recurso ao endividamento externo, a redução do défice orçamental, a resposta aos compromissos externos- se entraria numa situação próxima da rotura, que poria em causa

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o nosso futuro. Mas não é aí que se situa a nossa divergência. Não duvidamos de que esses problemas são decisivos para o País. A nossa divergência começa por situar-se no facto de tais medidas conjunturais serem tomadas sem uma definição do modelo de desenvolvimento que se impõe, como tivemos ocasião de afirmar quando da discussão do Programa do Governo. Continua a ser como se, ao querer tapar um buraco, não se pense que se está a abrir, mais longe, um buraco maior.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Muito bem!

O Orador: -- Com efeito, o Governo ainda não definiu como se articulam os programas de gestão conjuntural de emergência, com o de recuperação financeira e económica e o de modernização de economia portuguesa, pelo que as medidas tomadas imediatamente não se sabe até que ponto irão favorecer ou contrariar os programas de maior duração e consequentemente as questões estruturais da economia portuguesa. E não se venha dizer que esta é a única opção possível.
Única opção possível porquê? Porque o FMI, ao negociar o empréstimo, estaria a impor-nos condições idênticas às que impes - com os desastrosos resultados conhecidos - ao Chile, ao Brasil, à Argentina, à Venezuela, ao México? Estaríamos tentados a pensar assim, mas é o próprio Ministro das Finanças e do Plano que nos afirma, categoricamente, que tais imposições não foram feitas. Resulta, pois - assim temos de acreditar- de uma orientação do Governo que até é contrária, de resto, à que inicialmente tinha afirmado. Com efeito, no seu programa, o Governo afirmara que «actuações isoladas, descoordenadas - no limite, discordantes - significariam também novos elementos de agravamento das dificuldades reais. Por isso, o Governo se propõe adoptar uma abordagem integrada dos problemas financeiros e económicos do País». E, mais adiante, afirma mesmo que «o programa de recuperação financeira e económica constituirá o quadro de referência para a implementação do programa de gestão conjuntural de emergência e o ponto de partida indispensável para que possam ser seriamente encaradas as realidades e as necessidades de transformação estrutural da economia».
E é ainda o Ministro das Finanças e do Plano quem, nesta Assembleia, no debate sobre o Programa do Governo, diz que «nenhum dos programas é estanque ou autónomo. Procurar-se-á, pelo contrário, assegurar uma efectiva abordagem global e integrada da política económica portuguesa». Em face destes princípios enunciados pelo Governo, mas contrários à sua prática, nós afirmamos que os objectivos da política conjuntural deverão subordinar-se à opção fundamental de criar condições para aumentar a produção nacional e reduzir o défice da nossa economia, numa perspectiva de reforço do aparelho produtivo que faça face ao alargamento do mercado interno e contemple a especialização necessária, no quadro da revolução tecnológica em curso e de um novo posicionamento de Portugal na divisão internacional do trabalho, como o MDP/CDE disse no seu programa eleitoral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os aumentos constantes e rápidos dos preços dos bens essenciais lançados por este Governo têm provocado o mais brusco abaixamento do poder de compra, sem que, no entanto, haja qualquer contrapartida em esperança, em perspectiva de melhoria futura. Estas e outras medidas ao longo de 100 dias de governação desastrosa foram suficientes para que aquela que se proclamava a maior maioria de sempre, já hoje, no plano social, nem sequer já seja maioria, tendo alterado a confiança de uma boa parte dos portugueses. A partir de agora o Governo e a maioria parlamentar estarão cada vez mais divorciados e até em posição cada vez mais frontal em relação à maioria do País. Não poderá o Governo queixar-se de terem sido executados planos subversivos de desestabilização nem de terem sido ultrapassados quaisquer limites constitucionais pela oposição. Acontece até que o Governo perde a confiança de uma boa parte dos que haviam dado apoio eleitoral aos dois partidos que o sustentam sem que tenha havido grandes refregas políticas e sociais, num período relativamente calmo, morno.

Tão rápida diminuição da base social de suporte deste Governo leva-nos a admitir que nunca ele teria tido, efectivamente, o apoio correspondente à soma eleitoral do PS e do PSD. E sabido que as coligações têm normalmente, neste plano, um efeito multiplicador; ora, no caso desta coligação, parece ter havido um efeito exactamente contrário.

Frequentemente surge a justificação de que as medidas de austeridade qualquer governo as teria que tomar, pelo que cairia inevitavelmente no desagrado público. Mas o que este Governo provocou foi mais do que isso: gerou o desânimo e fez perder a esperança porque não mostrou que a austeridade seja paga igualmente por todos, nem dá perspectivas de que conduza, mais tarde, à superação das nossas dificuldades fundamentais. Aparece agora cada vez mais claramente que as medidas restritivas servirão, quando muito, para atenuar o imediato e não para salvaguardar o futuro. Daí o desânimo, a descrença que vão crescendo.
Hoje pode afirmar-se com toda a segurança que o Governo já falhou completamente na indispensável missão de entusiasmar, mobilizar as energias do País missão indispensável quando se sabe que sem esse entusiasmo e energia não há projecto de reconstrução económica que vingue. Já em relação a governos anteriores tivemos ocasião de ver como falharam os projectos de recuperação a partir da acção de técnicos aparentemente competentes, mas que não tiveram devidamente em conta a especificidade da realidade nacional e a força da dinâmica social que não pode ser regulamentada por leis do Governo nem medida por fórmulas matemáticas.
Como querer vencer a crise económica sem a participação activa, entusiástica dos produtores-directores? E como obter essa participação com uma política que lhes é francamente desfavorável?
Bem cedo se calaram os governantes com o tão apregoado pacto social, que fora um dos pilares da campanha eleitoral do Partido Socialista. Nem sequer foi referido na recente conferência de imprensa dada pelo Governo.
Porém, o consenso - que se disse só esta coligação poderia obter- não foi seriamente tentado e cedo se transformou em confronto. Estamos a assistir a um desiquilíbrio cada vez mais acentuado em desfavor dos que tem menos rendimentos, dos que estão na base da produção nacional. Foi a confirmação do que se previa, para uns, a decepção e o desencanto

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para outros, o endurecer do descontentamento para um número cada vez maior.
Em face disto, não é a atitude de diálogo que o Governo procura ainda desenvolver, antes afirmando uma posição crescentemente endurecida, que em muitos e graves aspectos contraria cada vez mais frontalmente as normas democráticas.
E evidente também que, com, estas medidas, se pretende obter graves efeitos como intimidação social e como questão política. Refiro-me às medidas económicas que não pude citar neste momento.
Em situações de forte contestação social e política, a repressão económica nunca teve menores efeitos do que a repressão policial. Lembramo-nos sempre daquele governante miguelista, quando das lutas pela liberdade, que pedia um conselho para esmagar os liberais, dado o falhanço das forças, da Torre de S. Julião das torturas, e que recebeu como sábia resposta: «Vá-se-lhes aos viveres, Senhor, vá-se-lhe aos víveres!». Mas esta repressão económica e social que ameaça abater-se sobre centenas de milhares de trabalhadores, embora não menos brutal do que a repressão policial, não conseguirá vencer os que lutam pelo pão e pela justiça social.
A situação é tanto mais preocupaste quanto é certo que, como confessam os próprios governantes, nos meses que se vão seguir ainda mais duramente vão fazer-se sentir os efeitos das medidas de austeridade, principalmente quanto à elevação de preços, contenção de salários, despedimentos e falências. O pior ainda está para vir - como todos reconhecem. E como reagirá então o Governo, numa situação muito mais difícil, quando hoje já revela tão grande incapacidade para enfrentar as críticas que lhe são feitas e tanta rigidez e incapacidade de diálogo perante o descontentamento social? Se neste momento o seu endurecimento mostra dispor de uma abertura democrática cada vez mais reduzida e de um espaço de manobra social cada vez mais exíguo, qual será a sua actuação quando a dureza e a amplitude das críticas e do descontentamento forem ainda maiores, como é inevitável?
Ao optar por esta linha de actuação no campo económico, financeiro e social, o Governo está também, obviamente, a fazer uma opção política. E nessa opção não cabe a ampliação das liberdades e dos direitos dos trabalhadores e dos cidadãos em geral. Essa opção conduz inevitavelmente à drástica diminuição do espaço democrático em que nos movimentamos, bem como de muitos dos direitos e regalias que o 25 de Abril nos trouxe.

Por isso, é cada vez mais notória a incomodidade, quando não o repúdio, mesmo em sectores políticos que inicialmente apoiaram este Governo. Os sentimentos democráticos prevalecerão em todas as situações. E com eles, ao lado da determinação dos que produzem directamente a riqueza do Pais, ao lado daqueles desfavorecidos para quem o 25 de Abril foi feito que, em última instância, será construído o Portugal democrático.

Aplausos do MDP/CDE e elo PCP.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado Carlos Lage?

O Sr. Carlos Lage (PS): - É para formular um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado José Tengarrinha.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado fica inscrito para a próxima sessão, assim como o Sr. Deputado Jorge Lemos que também pediu para pedir esclarecimentos.
Srs. Deputados, vamos agora entrar na apreciação e votação dos votos que foram apresentados a esta Câmara.
Como os Srs. Deputados sabem, por acordo entre os diversos grupos parlamentares, cada grupo e agrupamento parlamentar disporá de 8 minutos em conjunto, que poderão utilizar como melhor entenderem.
A apreciação dos 4 votos será feita em conjunto. Vão ser lidos.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas):

Vogo do pesar e protesto

Considerando que:

3 jovens patriotas da ANC na África do Sul -Marcus Motanng, Jerry Mosololi e Simon Molgoerane - foram condenados à pena capital e executados há dias, por enforcamento, em Pretória;
O Governo racista de Pretória manteve-se surdo aos múltiplos apelos de clemência da comunidade internacional (ONU, Comunidade Europeia, Paris, Washington, Movimento dos Não Alinhados, OUA, etc.);
A Assembleia da República tem condenado em várias ocasiões o apartheid e a pena de morte;
Os deputados abaixo assinados propõem que esta Câmara manifeste o seu pesar e protesto.

Este voto é subscrito por deputados do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI.

Voto do protesto

O caso do avião comercial sul-coreano abatido pela aviação soviética provocou a mais profunda consternação na opinião pública mundial e o repúdio de todas as pessoas não influenciadas pela propaganda soviética.
Nada justifica o derrube de um avião comercial com 269 vidas humanas, que nada têm a ver com a psicose da segurança que parece ter atingido as autoridades soviéticas.
Facto tão grave não pode deixar de suscitar uma tomada de posição desta Câmara que sempre tem tomado a defesa da paz e dos direitos humanos à escala universal.
Nestes termos, os deputados abaixo assinados propõem o seguinte voto de protesto:

A Assembleia da República Portuguesa protesta veementemente contra o acto brutal e desumano cometido pelas autoridades soviéticas que ordenaram a destruição do avião comercial e provocaram a perda trágica de 269 vidas humanas.
Manifesta também o seu apoio às medidas tomadas pelo Governo da República.

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Este voto é subscrito por deputados do PS e do PSD.

Voto de protesto

No passado dia 11, durante uma escala na Base das Lajes, Ilha Terceira, Região Autónoma dos Açores, o vice-presidente dos EUA, Sr. George Bush, deu uma conferência de imprensa em que respondeu a questões colocadas por órgãos de informação dos Estados Unidos da América.
Quando um jornalista do Diário Insular, de Angra do Heroísmo, pretendeu colocar uma questão ao visitante, e à qual este anteriormente havia acedido responder, verificou-se que as luzes da equipa de televisão norte-americana presente na sala foram apagadas, tendo o jornalista interpelante e outros colegas de profissão, também portugueses, sido alvo de insultos e empurrões por parte dos serviços de segurança do político norte-americano e impedidos de colocar qualquer pergunta.
Esta questão reveste-se de particular gravidade por se tratar de factos ocorridos numa base militar estrangeira estabelecida em território nacional, pois documenta como ficam alienados os direitos de soberania e os direitos dos cidadãos portugueses mesmo exercendo a actividade de jornalistas.
A Assembleia tia República não pode, assim, ficar indiferente perante os factos ocorridos recentemente na Base das Lajes.
Nestes termos, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte voto de protesto:

A Assembleia da República protesta contra a ocorrência dos factos acima referidos, recomenda ao Governo que faça sentir ao Governo dos EUA a ofensa que atingiu a Pátria Portuguesa e reclama a adopção de medidas para que tais factos não voltem a repetir-se.

Este voto é subscrito por deputados do PCP.

Voto de pesar e protesto

Segundo notícias difundidas a partir da Austrália, confirmadas pela comunidade timorense em Lisboa, soube-se que nos dias 20 e 21 de Agosto passado, o exército da Indonésia praticou uma das mais bárbaras acções de entre as que tem vindo a cometer em Timor Leste executando, a sangue frio, um número de pessoas calculado entre 200 e 300, da povoação de Viqueque, a maior parte das quais, velhos, crianças e mulheres.
Os sentimentos de humanidade que um tal crime reclama e o respeito pelos princípios fundamentais dos direitos humanos, atingidos, no caso denunciado, ao ponto de a própria morte de inocentes ter sido o preço do barbarismo indonésio, justificam que os deputados signatários apresentem à Assembleia da República o seguinte voto de pesar e de protesto:

1) A Assembleia da República comunga dos sentimentos de dor dos familiares das vítimas do genocídio indonésio praticado na povoação de Viqueque e de idênticos sentimentos da comunidade timorense;
2) A Assembleia da República emite o seu protesto veemente e a sua mais firme condenação pela prática de tão nefando crime;
3) A Assembleia da República apela para a comunidade internacional no sentido de, pelos meios ao seu alcance, tudo fazer para que se não repitam actos de violência em relação ao povo de Timor Leste, a quem legitimamente assiste o direito à autodeterminação.

Este voto é subscrito por Srs. Deputados de todos os grupos e agrupamentos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

Tem a palavra a Sra. Deputada Alda Nogueira.

A Sra. Alda Nogueira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentámos na Mesa da Assembleia da República em 16 de junho, o voto que foi lido em primeiro lugar, voto de pesar e protesto, a propósito de um acontecimento trágico, a execução de 3 jovens militantes da ANC, que provocou a mais viva indignação e o protesto da opinião pública mundial, de organizações internacionais como as já referidas, e de organizações nacionais congéneres, como a Assembleia da República Francesa que, à data, suspendeu os seus trabalhos em sinal de protesto.
De então para cá, não só o apartheid, com todas as suas trágicas consequências, se mantém, como se mantém e intensifica a luta dos povos de todo o mundo contra o apartheid, sob formas cada vez mais organizadas. E dentro da própria África do Sul a luta dos patriotas, apesar e contra a repressão feroz, intensificou-se de tal forma que em Agosto último foi constituída a Frente Unida Democrática, a organização mais ampla contra o apartheid ali constituída desde 1950, de que fazem parte 400 organizações sul-africanas.
No que respeita ao nosso país, a par da intensificação da luta do nosso povo contra o apartheid, o território nacional tem sido utilizado para a organização de actividades contra a República Popular de Angola, por exemplo, em apoio dos intentos e da agressão do Governo de Pretória contra aquele pais. Como se explica que dirigentes de um partido que fez parte do anterior Governo e que continua no Governo actual tenham tido conversações com Jonas Savimbi, dirigente da Unita?
Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, voltamos hoje a apresentar aqui o nosso voto, que vamos votar favoravelmente, e pensamos que a Assembleia da República só se dignificaria aprovando-o.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, queria apenas interpelar a Mesa, no sentido de ser esclarecido

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23 DE SETEMBRO DE 1983

se a discussão dos votos é conjunta. E que se a discussão é conjunta, eu gostaria de intervir apenas depois de os outros Srs. Deputados apresentantes dos votos de protesto e pesar fazerem a apresentação.
O Sr. Presidente: - Com efeito, a discussão é conjunta. O Sr. Deputado pedirá a palavra quando o entender.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa no sentido de saber porque razão a discussão dos votos é conjunta. É que penso que o que tinha ficado acordado era que haveria um tempo global para todos os votos, tempo que cada grupo parlamentar distribuiria como bem entendesse.
Penso não ter qualquer espécie de sentido fazer-se uma discussão conjunta desses votos, pois a única coisa que há de comum entre eles é serem votos, mais nada. No fundo, a discussão conjunta serve apenas para descaracterizar a própria natureza dos diferentes votos.
Penso, pois, que a discussão de cada um dos votos deve ser separada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, também nós pensamos o mesmo.
Sugeri à Mesa, no início deste debate, que se procedesse à votação dos votos - a votação, repito no final, até porque então não tínhamos quórum, mas não pedi que se fizesse uma discussão conjunta.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havia quórum para votarmos, mas parece que agora já haverá ...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é só para dizer que a discussão conjunta não faz sentido; o que faz sentido é observarmos a regra na qual acordámos outro dia e que era a de, para todos os votos, cada grupo ter apenas 8 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, neste momento há precisamente 126 Srs. Deputados presentes. Se sair um, deixa de haver quórum.
O Sr. Deputado João Amaral está a pedir a palavra. Faça favor.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, a questão da discussão conjunta foi levantada através de uma intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage e a questão que neste momento se coloca é a de sabermos se as discussões são separadas, se é possível fazer a votação no fim.
Ora, eu queria chamar a atenção do Sr. Presidente e dos Srs. Deputados para o seguinte: cada partido tem, nesta matéria, o direito de intervir, ou durante a discussão ou sob a forma de declaração de voto. Ou seja, não tem um mínimo de sentido fazer-se a discussão separadamente e a votação só no fim porque
o que se pode pressupor então é que há um todo que é constituído por um debate, por uma votação e pelas declarações de voto, que lhe são subsequentes. De outra forma todo o debate ficará inquinado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, é para manifestar, uma vez mais, o nosso desacordo que a discussão seja conjunta porque carece de sentido.
Penso que se não houver quórum, a votação se pode fazer no final, ordenadamente, e a seguir a cada uma das votações far-se-ão as declarações de voto sobre aquela votação concreta. Penso que assim não se confunde nada nem se prejudica a clarificação das posições dos diferentes grupos parlamentares em relação a cada um dos votos.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se assim o entenderem, vamos fazer a discussão separada, voto por voto. Depois, vota-se o voto em discussão e fazem-se as respectivas declarações de voto, tendo em atenção que cada grupo e agrupamento parlamentar dispõem globalmente de 8 minutos.
Está, pois, em discussão o primeiro voto apresentado pela Sr.ª Deputada Alda Nogueira e outros Srs. Deputados. A Sra. Deputada Alda Nogueira já fez a sua intervenção pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não obstante terem passado quase 3 meses sobre a execução de 3 jovens opositores do regime sul-africano e do apartheid, a Assembleia da República deve hoje formular mais uma condenação moral e mais um protesto político contra a sucessão de execuções capitais que o regime sul-africano vai fazendo para evitar a modificação, no bom sentido, das relações raciais na África do Sul e proporcionar e permitir às populações de cor uma verdadeira autonomia.
Mas, não queremos também deixar de assinalar que há um traço de união entre este voto relativo à África do Sul e os votos relativos ao abate do boeing sul-coreano e aos massacres cometidos em Timor.
Há, evidentemente, um traço de união. É uma condenação da violência política, é uma condenação dos atentados aos direitos humanos.
Não me parece, desde já, que seja razoável e que seja aceitável que se possa votar favoravelmente uns e rejeitar outros. Isso só evidenciará, em minha opinião, uma grande duplicidade política e uma grande ausência de moral. Por isso, nós, socialistas, votamos favoravelmente esses 3 votos.
Quero terminar esta minha rápida intervenção dizendo que nós condenamos todas as formas de crime e de acções de violência.
E permito-me citar as palavras de um grande cientista, que é, simultaneamente, um grande pensador, François Jacob, que diz: «todos os crimes da história são consequência de algum fanatismo»; todos os massacres foram cometidos por virtude e em nome da verdadeira religião, do nacionalismo legítimo, da política idónea ou da ideologia justa.

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Nós rejeitamos a absolutização de valores e de atitudes políticas que levam ao destroçar do homem e ao espezinhar de valores fundamentais e espirituais.

Aplausos do PS, do PSD, da UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: queria muito rapidamente exprimir a nossa opinião sobre este voto agora em apreço e começar por dizer que, certamente por um equívoco, má leitura ou esquecimento que não quero qualificar - porque não poderei fazê-lo- a Sra. Deputada Alda Nogueira referiu-se a este voto sobre a África do Sul como «nosso voto», quando a verdade é que ele é subscrito, entre outras pessoas, pelos Srs. Deputados Raúl de Castro, Magalhães Mota, Vilhena de Carvalho e por mim próprio. Portanto, não se trata de um voto do Partido Comunista. Aliás o próprio papel timbrado de que consta o voto diz «Assembleia da República» e não qualquer outra referência partidária.
Queria, pois, exprimir a nossa opinião favorável sobre este voto e sublinhar que a Assembleia da República, na véspera da visita do Presidente Samora Machel, terá uma atitude correcta votando favoravelmente este voto dado que se integra, aliás, numa política de condenação do apartheid e do racismo na África do Sul e é perfeitamente compatível e adequado à política de abertura que Portugal tem manifestado ultimamente em relação a estes problemas e a esta problemática.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge (Lemos (PCP): - Era para prestar um esclarecimento relativamente à intervenção do Sr. Deputado César Oliveira, caso V. Exa. não o faça.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a minha camarada Alda Nogueira anunciou o voto em nome do Grupo Parlamentar do PCP uma vez que em conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, quando foi colocada a questão da manutenção ou da retirada deste voto, todos os partidos cujos deputados haviam subscrito este voto, exceptuando o PCP, declararam publicamente que retirariam dele a sua assinatura, pois pensavam que esse voto poderia ser retirado por não ter grande actualidade.
Inclusivamente, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou nessa altura uma posição de reserva e comunicou posteriormente ao Sr. Presidente que, face à gravidade do problema de que tratava esse voto, nós não o retirávamos e o mantínhamos subscrito por deputados do PCP.
Era este o esclarecimento que queríamos dar ao Sr. Deputado César Oliveira.

0 Sr. Presidente: - E exacto, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cerdoso (UEDS): -Sr. Presidente, desculpe-me mas isso não é exacto.
O que nós manifestámos foi a nossa disponibilidade em retirar o voto se os outros signatários assim o entendessem. Isto é completamente diferente de termos retirado a nossa assinatura do voto. E retirávamo-la porque pensávamos que os votos têm cada um uma componente que é puramente circunstancial para além de questões de fundo e, pelo mecanismo a que estão submetidos os votos, com frequência eles perdem a actualidade que os poderia justificar, embora as questões de fundo que lhe estão subjacentes permaneçam.
Portanto, foi esta a nossa disposição: a de aceitarmos que o voto fosse retirado sendo signatários e não a de desdizermos a nossa assinatura nesse voto, o que é uma coisa muito diferente, Sr. Presidente.

O Sr. (Presidente: - Sr. Deputado, houve talvez uma má interpretação do problema. Eu vou ler o nome dos Srs. Deputados que inicialmente apresentaram o voto.

O Sr. porfie (Lemos (PCP): - Dá-me a palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é rapidíssimo.
E apenas para dizer que não se pense que da nossa parte há alguma má vontade contra outros subscritores.
Nós agradecemos o esclarecimento. Pode ter sido um mau entendimento nosso, mas ficará registada a correcção feita pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Presidente: - Vou então ler agora os nomes dos Srs. Deputados que assinaram este voto: Alda Nogueira, César Oliveira, Jorge Lemos, Raúl de Castro, Magalhães Mota e Vilhena de Carvalho.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Raúl de Castro.

O Sr. Raúl de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tivemos dificuldades em entender a intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage ao pretender associar 3 votos depois de anteriormente ter intervindo no sentido da apreciação separada de cada um dos votos ora em apreço.
O MDP/CDE subscreveu, juntamente com deputados de outras bancadas, esta moção de repúdio pelo acto repugnante que foi a execução de 3 patriotas da África do Sul.
Ao subscrevê-la o MDP/CDE tem em vista, como aliás por mais de uma vez sucedeu nesta Assembleia, a condenação veemente do regime do apartheid na África do Sul.
E supomos - é esse o sentido da nossa intervenção - que esta Assembleia, ao observar o proposto minuto de silêncio, estará não só a prestar uma homenagem de solidariedade aos 3 jovens patriotas executados na África do Sul, mas também, a afirmar a sua condenação do regime do apartheid.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

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O Sr. Cardoso )Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também nós, Partido Social-Democrata, votaremos favoravelmente este voto.
Entendemos que sempre que estão em causa o direito à vida não se pode, em circunstância alguma, deixar de criticar qualquer que seja a forma assumida da violação deste direito.
T, independentemente do regime do apartheid, que nós também condenamos, não podemos deixar de lavrar aqui o nosso protesto, ainda que decorrido já bastante tempo sobre esta execução, e deixar de criticar muito seriamente a África do Sul por, nesta circunstância, ter eliminado 3 vidas humanas.

O Sr. (Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o CDS apresentou alguns votos justificados por circunstâncias de momento e por isso mesmo, com o intuito de contribuir para o funcionamento célere, eficaz e compreensiva! desta Assembleia, retirou esses votos.
Foi nesse sentido que retirámos um voto de congratulação pelo êxito da visita de Sua Santidade à Polónia e foi nesse sentido que quis contribuir para o novo andamento desta Câmara.
Quanto a este voto, apesar de determinado por uma circunstância de momento, entendemos porém que se refere a questões fundamentais. Nele está em causa um atentado ao direito à vida. E como partido democrata-cristão que é, o CDS, formado pelos valores do humanismo cristão, sempre se tem pronunciado quando em qualquer circunstância pensa estar em causa o direito à vida. Tenho-o feito em várias circunstâncias, em virias oportunidades, dentro e fora desta Câmara.
É por isso que condenamos a existência da pena de morte na União Sul-Africana, é por isso que condenamos o acto resultante dessa existência e que se traduziu na morte destes 3 homens nesse pais.
Votaremos, pois, favoravelmente o voto que aqui nos é apresentado por deputados de vários grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também nós votaremos favoravelmente o voto apresentado porque desde há muito, e nesta Câmara, sempre temos apoiado todos os protestos contra as violações dos direitos do homem - e o mais elementar deles é o direito à vida- onde quer que elas tenham lugar.
O significado desta nossa votação é o de sublinhas a nossa condenação deste atentado contra e vida humana num lugar concreto porque condenamos todos os atentados A vida humana, onde quer que eles tenham lugar, porque, do mesmo modo, condenamos a violência nas suas várias formas e nos vários lugares onde ela se pratique, porque condenamos também até aquelas formas de violência que abafam lentamente a vida e que se esforçam por se ocultar, que se afadigam em envolver em segredos mesmo os seus actos mais brutais.
Pensamos que o que está em causa é que todas as ideologias totalitárias pensam fabricar os homens e por isso penam também poder prescindir do contributo dos homens. Por isso os eliminam, por isso os abafam, por isso os destroem.

O Sr. Presidente: - Não há mais ninguém inscrito, por isso vamos passar à votação deste voto de protesto.

Submetido à votação foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à discussão do voto de protesto contra o acto cometido pelas autoridades soviéticas ao ordenarem a destruição de um avião comercial sul-coreano.
Tem e palavra o Sr. Deputado António Rebelo de Sousa.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não pode deixar de condenar o atentado perpetrado contra centenas de vidas humanas que seguiam no avião Boieng da Coreia do Sul por diversas razões.
Em primeiro lugar porque consideramos que se tratou de um acto de violência que, como tal, deve ser condenado por todos aqueles que acreditam que é na paz, na democracia e na solidariedade que se resolvem os problemas; em segundo lugar porque está hoje em dia provado que não foram sequer garantidas as condições mínimas necessárias para se ter a certeza de que se poderia forçar a aterragem do avião que violou o espaço aéreo soviético e as gravações existentes - a intervenção do próprio piloto provam-no sobejamente; em terceiro lugar o simples facto de haver uma violação do espaço aéreo, como ainda há pouco tempo aconteceu com um avião búlgaro em espaço aéreo suíço, não justifica de per si que se possa perpetrar um atentado contra vidas humanas como aconteceu no caso do avião Boeing da Coreia do Sul: em quarto lugar nós pensamos que é uma estranha forma de racismo essa que consiste em considerar que em relação a certos casos de violência é preciso contestá-los e condená-los e em relação a outras vidas humanas em que igualmente são praticados actos de violência tudo se justifica, tudo se explica por razões que nada têm a ver com os princípios da solidariedade e da liberdade.
Para nós, socialistas democráticos, a liberdade e o principio da solidariedade humana não têm qualquer tipo de preço.
Esta é a nossa posição e estranho é que pudesse realmente ser outra porque, como deputados e representantes do povo português, não actuamos nem intervimos como embaixadores de interesses que são alheios aos interesses do povo português ...

Aplausos do PS e do PSD.

..., nem podemos pactuar com actos de violência que a todos os títulos merecem ser apontados como maus exemplos em relação ao futuro.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

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O Sr. (Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não pode o Grupo Parlamentar do CDS deixar de se associar ao voto de protesto proposto pelas bancadas da maioria.
Em primeiro lugar, porque estaremos sempre ao lado da defesa dos direitos humanos e neste caso, mais uma vez, o primeiro desses direitos - o direito à vida- foi flagrantemente violado; condenaremos a violação dos direitos humanos onde quer que ela tenha lugar e quem quer que sejam os violadores.
Em segundo lugar, porque entendemos que este acto criou mais um elemento de insegurança e de perturbação nas relações internacionais. Pensamos que as superpotências têm uma especial responsabilidade nas relações internacionais porque detendo um aparelho militar poderoso têm também que criar as condições de controle rigoroso do seu próprio poderio, o que não se verificou neste caso, independentemente de considerações sobre regimes políticos e ideologias.
No momento em que muitas vozes na comunidade internacional se têm levantado alertando para os perigos crescentes de uma das superpotências se transformar cada vez mais numa sociedade militar - e citarei por todos Castoriadis - este acto é verdadeiramente inquietante na medida em que vem demonstrar, de uma forma clara, que o poder civil começa a ter dificuldades em controlar o poder militar e em controlar o poderoso aparelho militar que começou a criar e que tem vindo a desenvolver.
Isto é particularmente grave para uma potência que continuamente se afirma como campeã da paz nas palavras, mas que nos actos - e desta vez de forma flagrante- demonstrou, através da sua conduta, não contribuir para a segurança internacional e para um clima generalizado de paz.

Aplausos do CDS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aviação militar soviética, ao abater o avião comercial sul-coreano, revelou-se ao serviço da morte, destruindo calculada e friamente a vida de 269 cidadãos pacíficos de diversas nacionalidades.
A consciência universal, temperada no respeito pelos valores da vida humana, não podia deixar de reagir e de condenar crime tão nefando, como aliás tem sido feito a diversos níveis e instâncias.
Chegou o momento de esta Assembleia da República se fazer eco também da consciência do povo português que, sendo em geral respeitadora dos direitos humanos, repudia e condena esse mesmo crime.
Estamos, assim, com a iniciativa dos proponentes deste voto, em coerência com os nossos princípios, sempre ao lado dos cidadãos pacíficos, vítimas da opressões, quando não mesmo da morte, par parte dos impérios da violência, tantas vezes disfarçados sob o manto do pacifismo e dos falsos pregões de paz.
O abate do avião sul-coreano força-nos também a meditar sobre se a sua condenação verbal ainda que de contento altamente moral, corresponde, em termos de estrita justiça, à gravidade do crime cometido. Pensamos que não. Por isso, aderimos sem hesitação à
ideia da necessidade de medidas sancionatórias, ao menos como as que foram adoptadas por diversos países, incluindo o nosso, em relação aos responsáveis morais e políticos de mais este crime contra a humanidade.

Aplausos da ASDI, do PS, do PSD, do CDS e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputada Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso ]Ferreira (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com a maior indignação que a comunidade internacional tomou conhecimento, nos primeiros dias de Setembro, da atitude da União Soviética ao abater com aviões militares um avião civil de carreiras normais, provocando assim a morte dos seus 269 passageiros e tripulantes.
Entendemos que esta atitude, para além das dificuldades que vem causar no relacionamento internacional e no desanuviamento que todos nós queremos, vem naturalmente pôr em causa e pôr em cheque os tão alegados e tão propagados direitos humanos que por parte da União Soviética tem tido o movimento que nós sabemos.
Por isso o Partido Social-Democrata sugere que esta Assembleia, por unanimidade, se pronuncie com um voto de pesar e ao mesmo tempo com um voto de repúdio pela atitude da União Soviética.
São, ao fim e ao cabo, as mesmas razões que nos levaram a anunciar o voto favorável ao voto do Partido Comunista que está em causa. E o direito essencial à vida humana que está em causa e entendemos que, nesse caso, circunstância alguma pode justificar a atitude que foi tomada.
Por isso o Partido Social-Democrata irá votar favoravelmente este voto.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que não há palavras - pelo menos tenho dificuldade em encontrá-las - para classificar o crime que foi cometido pela aviação soviética ao derrubar um avião civil com 269 passageiros.
E difícil, dizia eu, encontrar adjectivos. E um crime que merece da nossa parte uma condenação clara, inequívoca e firme., uma condenação que se baseia nos mesmos princípios que nos levam a condenar crimes idênticos cometidos seja onde forem. E penso que só essa condenação unânime que recusa todos os atentadas contra os direitos fundamentais da pessoa humana, sejam eles praticados onde forem e que não admite fronteiras nem razões que os possam justificar, pode dar sentido e coerência a essa condenação.
A coordenação que não seja unânime em todas as circunstâncias não passa de pura hipocrisia ...

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ..., como hipocrisia serão os apelos à paz e aos direitos humanos por parte daqueles que não hesitam em praticar o crime que praticaram.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS, da ASDI e da UEDS.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao associarmo-nos ao voto apresentado pelo Partido Socialista e pelo Partido Social-Democrata não assumimos mais do que uma posição de coerência, uma posição de respeito por valores fundamentais e, no fundo, uma posição de respeito por nós próprios.

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD, do CDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Como não há mais inscrições vamos passar à votação deste voto de protesto contra a destruição do avião sul-coreano.

Submetido à votação, foi aprovada com votos a lavor do PS, do PSD, do CDS, da ASDI, da UEDS e do Sr. Deputado independente António Gonzalez, votos contra do PCP e a abstenção do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para uma declaração de voto.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As nossas primeiras palavras nesta declaração de voto são para lamentar profundamente as vítimas do trágico caso ...

Risos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de se manterem em silêncio.

O Orador: - do jambo sul-coreano, as vitimas sacrificadas no altar da corrida aos armamentos e da histeria belicista e para lamentar também que o caso
seja agora trazido ao Parlamento português ...

Risos.

... quando em todo o mundo decai a campanha e o próprio Reagan se remeteu ao silêncio ante embaraçosas interrogações que lhe são feitas na imprensa internacional.

Uma voz do PSD: - É falso!

O Orador: - Os novos factos vindos a lume e o silêncio a que se remeteram as autoridades dos Estados Unidos são de tal natureza que legitimam a conclusão de que, mais do que um trágico episódio da guerra da espionagem, estamos perante uma monstruosa provocação ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PS e do PSD.

O Orador: - ... um reichtag aéreo.

Risos.

Talvez muitos dos Srs. Deputados, os que eram vivos então, aquando do reichtag, também culpassem os comunistas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Um reichtag aéreo, dizia eu, com 0 objectivo de impedir conclusões positivas da Conferência de Madrid, da Conferência de Genebra e, em geral, da paragem da corrida aos armamentos e passos positivos no desanuviamento da tensão internacional.
Nós veremos quem se vai ter de arrepender perante a história. Nós estamos convencidos de que não teremos de fazer um acto de contrição perante a história.

Aplausos do PCP.

Protestos do PS e do PSD.

E quanto a atitudes de incoerência e de hipocrisia não há como a política nacional para que o nosso povo nos possa julgar a todos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nós não nos deixamos manipular ...

Risos.

... pelos autores da guerra e pelos atiçadores do holocausto nuclear.
Julgamos ter uma consciência mínima do que significaria uma nova guerra mundial para o nosso povo e para a humanidade inteira.
Por isso não actuamos como algumas cabecinhas loucas ...

Risos.

... que reagem ao primeiro estímulo de Washington. Não! Nós pensamos que é nossa obrigação, das forças responsáveis e patrióticas portuguesas, tudo fazer para contribuir, na medida do possível, para a causa da paz.

Aplausos do PCP.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Exa. sabe que não pode fazer um protesto.
Foi uma declaração de voto que foi feita e não dá lugar a protestos.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, não sei se, dado o sistema de gestão do tempo que foi acordado, não o poderia usar para um protesto.
Se não também lhe confesso, muito francamente, que farei esse protesto ao intervir a propósito de um outro voto, no tempo de que disponho, se não me for concedido, neste momento, o direito para um protesto.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, então assim fará.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE absteve-se nesta votação pelas razões que sucintamente passamos a expor: consideramos que o incidente ocorrido com o avião sul-coreano não está devidamente esclarecido, como, aliás, se verificou nos debates do Conselho de Segurança da ONU e pelas reacções da imprensa internacional, nomeadamente a norte-americana, que noticiou ter havido simultaneamente um voo de um aparelho norte-americano que procedia a operações não autorizadas sobre território da URSS, facto este confirmado pelo presidente dos Estados Unidos da América e largamente noticiado entre nós e em todo 0 mundo.
As dúvidas subsistem e a própria NATO reflecte-as, tendo os países que integram esta organização recusado tomar medidas comuns de represália.
O MDP/CDE espera a conclusão dos trabalhos de uma comissão de inquérito cuja criação foi preconizada, e que apoiaremos, e que servirá para esclarecer totalmente todos os factos que rodearam o voo do aparelho sul-coreano, o seu desvio de 20º, a violação não autorizada durante mais de 2 horas de um espaço aéreo, penetrando cerca de 500 km no interior de um Estado soberano.
O MDP/CDE lamenta, como é evidente, a perda de vidas inocentes, mas este lamentável incidente trás novamente para a ordem do dia a necessidade premente de se pôr termo a actos que podem conduzir a situações muito mais graves, de se pôr termo à psicose de guerra, às agressões a povos que lutam pela democracia, pela sua liberdade e autonomia, que se ponha termo à desenfreada corrida aos armamentos, que só interessa a complexos militar-industriais, enfim, que se criem definitivamente condições para uma vivência pacífica entre os povos.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o período normal de antes da ordem do dia, mas julgo interpretar a opinião de todos os grupos parlamentares continuando o debate destes votos até final.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, considero que as palavras proferidas pelo Sr. Deputado
Carlos Brito ofendem a minha honra e a minha qualidade de deputado e de subscritor da moção que
acabou de ser votada, pelo que peço a palavra ao
abrigo do direito de defesa.

O Sr. )Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que para tudo há um limite.
Para a subserviência, para o seguidismo, para a falta
de independência política ou da independência de espírito.
As palavras proferidas aqui pelo Sr. Deputado Carlos Brito, na qualidade de presidente do Grupo Parlamentar do Partido Comunista, são graves para a democracia portuguesa, ofendem o bom senso, a inteligência, a nacionalidade e a independência crítica e a independência de espírito que deve ter qualquer cidadão responsável e qualquer cidadão português.
Elas são um péssimo serviço à verdade, um péssimo serviço ao seu próprio partido e, sobretudo, de certa maneira, um atentado moral à paz e ao direito de se apreciar os crimes que são cometidos.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Verifica-se que, na verdade, o Sr. Deputado Manuel Alegre não tinha razões para pedir a palavra.
Quanto aos insultos que me dirigiu devolvo-lhes todos e digo: o que me acaba de fazer é um acto inadmissível de subserviência em relação aos Estados Unidos da América.

Aplausos do PCP.

Risos do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - É para fazer uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. (Presidente: - O PSD já teve uma intervenção, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Não, Sr. Presidente, como declaração de voto não tivemos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estive a consultar a Mesa e não há unanimidade, mas, por maioria, entendemos que o Sr. Deputado tem direito a fazer uma declaração de voto que vai contar, evidentemente, no tempo atribuído ao seu partido.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
A declaração de voto será muito curta.
Votámos afirmativamente, como não podia deixar de ser. Profundamente respeitadores que somos da pessoa humana e da liberdade não poderíamos ter deixado de votar como votámos.
Não votámos afirmativamente pela facto de ter sido um avião soviético que derrubou um avião de passageiros da Coreia do Sul. Teríamos votado de igual forma se tivesse sido um avião americano a derrubar um avião russo de passageiros.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Aquilo a que acabamos de aqui assistir foi uma das mais afrontosas manifestações de incoerência e de hipocrisia do Partido Comunista Português.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, da ASDI e da UEDS.

Hipocrisia quando se comenta a perda de 269 vidas humanas, mas não se tem a coragem de votar afirmativamente o voto que aqui tinha sido proposto; incoerência quando há pouco, há poucos minutos, se votou afirmativamente pela perda de 3 vidas humanas só porque isso aconteceu na África do Sul. Nós teríamos votado também afirmativamente se essas 3 vidas tivessem sido perdidas na União Soviética ou nos Estados Unidos da América.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar queria perguntar à Mesa o seguinte: ao abrigo de que disposição regimental usou da palavra
o Sr. Deputado Montalvão Machado pare produzir uma declaração de voto, uma vez que o seu partido já tinha intervindo durante o debate do voto, fazendo, aliás, a sua apresentação?

Em segundo lugar, queria fazer uma interpelação indirecta ao Sr. Deputado Montalvão Machado, que, sendo vice-presidente da Comissão de Regimento e
Mandatos, deu um mau exemplo do que não é cumprir o Regimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, foi aqui dito, no início da discussão, que a seguir às votações os partidos tinham direito a fazer as declarações de voto.

O Sr. João Amaral (PCP): - Quem não usasse da palavra!

O Sr. Presidente: - Foi assim que foi entendido.
Srs. Deputados, não vale a pena estarmos a discutir.
Aliás, em relação a outros votos também foram apresentadas declarações de voto sem se ter levantado este problema. Foi assim que foi interpretado e foi assim que foi feito.

Uma voz do PCP: - Não pode ser!

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Pode ser, pode!

O Sr. Presidente: - Por outro lado, é contado o tempo utilizado por cada partido que, de acordo com a resolução dos grupos parlamentares que reuniram, o podiam distribuir conforme entendessem. Foi por essa razão que dei a palavra ao Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra em defesa de uma interpelação indirecta que o Sr. Deputado Jorge Lemos me dirigiu e que entendo que ofende a minha honra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Queria só dizer ao Sr. Deputado Jorge Lemos, muito rapidamente, que não recebo lições suas, nem do seu partido, quer como deputado, quer como vice-presidente da Comissão de Regimento e Mandatos.

Uma voz do PS: - Nem como cidadão!

Uma voz do PCP: - É assim mesmo!

O Sr. Jorge Lemos (PCP) - Sr. Presidente, não tentei dar lição a nenhum deputado desta casa.
Penso que esta casa tem um Regimento e é obrigação, particularmente das pessoas que integram a Comissão do Regimento e Mandatos, conhecê-lo.

O Sr. Presidente - E é em termos de uma disposição regimental que o Sr. Deputado acaba de falar, não é verdade?

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- Sr. Presidente, o meu nome foi referido. Usei da palavra talvez incorrectamente por V. Ex.ª ainda não ma ter dado, mas, logicamente, para usar do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora apreciar o voto de protesto contra a ocorrência de factos que tiveram lugar no decorrer de uma conferência de imprensa na base das Lajes.
Está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Gomes dos Santos.

Pausa.

Entretanto, o Sr. Deputado Lopes Cardoso está-me a fazer sinal. Faça favor Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS):- Sr. Presidente, fiz sinal à Mesa porque tinha-me inscrito para intervir a respeito deste voto já há muito tempo e penso que muito tempo antes dos outros deputados.
Mas não vamos perder tempo com isso, Sr. Presidente, V. Exa. dar-me-á a palavra quando entender.

O Sr. Presidente: - E possível que tenha havido um lapso da parte da Mesa, mas o Sr. Deputado está realmente inscrito a seguir ao Sr. Deputado Raul Gomes dos Santos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, penso que se o voto existe na Mesa é porque alguém o apresentou. Não se compreenderia, pois, que começasse a ser discutido sim ser dada a palavra pelo menos ao partido que o apresentou.
Se o Sr. Deputado do PSD já estava inscrito não quero cortar-lhe a palavra, mas acho que é regimental que seja o partido que apresentou o voto o primeiro a intervir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, realmente é normal que seja o apresentante a apresentar o voto, mas, na realidade, o grupo apresentante só se inscreveu depois e ele não é obrigado a apresentá-lo.
Contudo, se os Srs. Deputados Raul Gomes dos Santos e Lopes Cardoso não virem inconveniente em que seja o Sr. Deputado Jorge Lemos a intervir em primeiro lugar dou-lhe a palavra.

O Sr. Raul Gomes dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, acho conveniente, e muito bem; que seja o Partido Comunista o primeiro a falar sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge (Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentámos um voto relativo a um grave incidente que sucedeu numa base militar estrangeira em território nacional quando, durante uma conferência de imprensa promovida pelo Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, foi impedida, pelo insulto e pela agressão, a possibilidade, antes acordada, de jornalistas portugueses questionarem, também eles, o responsável norte-americano.
Com este nosso voto não pretendemos questionar o direito, que é legítimo, de se organizarem conferências de imprensa a fim de explicar à opinião pública nacional e internacional um concreto ponto de vista sobre um qualquer concreto problema.
No nosso entender está em causa um atentado a um direito de soberania do Estado Português, praticado em Estado português contra cidadãos portugueses por autoridades estrangeiras.
Este facto é tanto mais grave porquanto se tratava de um jornalista devidamente acreditado e que, no território nacional, tem os seus direitos claramente consagrados em lei aprovada por esta Assembleia da República.
O protesto que trazemos a esta Assembleia não se esgota apenas no Partido Comunista Português. Inclusivamente, os responsáveis do Governo da Região Autónoma dos Açores já tornaram público esse protesto.
É, pois, nosso entender que a Assembleia da República não pode, ela própria, também, deixar de protestar e de fazer ver ao Governo que actos como este não se podem repetir e que é tempo que se tomem medidas para que não volte a acontecer este espezinhar da independência de soberania do nosso país em território que ainda é português e que ainda continuará a sê-lo.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Gomes dos Santos.

O Sr. Raul Gomes dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O acontecimento a que se reporta o voto do Partido Comunista Português diz directamente respeito à Região Autónoma dos Açores e foi por isso, tal como o Sr. Deputado acabou de afirmar, que o Governo Regional, como órgão legítimo de governo próprio do arquipélago, assumiu desde logo uma posição enérgica de repúdio, protestando e exigindo, através dos canais competentes, que o trânsito de altas individualidades, em especial pela Base Aérea n." 4 das Lajes, se subordine às regras protocolares que, de uma forma ou de outra, estão estabelecidas em todo o mundo. Importa que essas individualidades, por mais altas que sejam, não confundam a hospitalidade e a amizade com a submissão, esta totalmente incompatível com a dignidade de Portugal.
Assim, aceitarei, em coerência, a posição assumida pelo Partido Comunista Português, mas não poderei votar favoravelmente o seu voto, porque os factos nele referidos não traduzem a rigorosa verdade dos elementos que concorrem para essa situação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tinha dito há pouco - e devo, nesse sentido, um esclarecimento à Câmara - que aproveitaria esta minha intervenção para fazer o protesto que, na ocasião, não me foi possível formular. Porém, não o vou fazer por uma razão muito simples: penso que depois da intervenção do Sr. Deputado Manuel Alegre, que subscrevo inteiramente, não tenho, a esse propósito, rigorosamente nada a acrescentar.
Em relação ao voto em apreço, se usássemos na nossa bancada o tipo de argumentos expendidos pela bancada do Partido Comunista, se tivéssemos a mesma conformação ideológica e mental, diríamos que este voto teria saído de cabeças tontas que reagem ao primeiro estímulo de Moscovo. Não o dizemos, porque não usamos esse tipo de argumentos.

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD, do CDS, e da ASDI.

E, dentro de uma linha que sempre temos rigorosamente procurado respeitar - que e a de apreciarmos cada caso pelo que ele vale em si próprio, independentemente da origem dos proponentes e dos próprio considerandos que eventualmente possam envolver a decisão proposta -, queria, para terminar, dizer apenas que entendendo que a posição assumida pelos responsáveis no incidente ocorrido na base das Lajes nos parece condenável, daremos o nosso voto favorável ao voto de protesto apresentado pelo Partido Comunista Português.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Furtado Fernandes.

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP fundamenta o seu voto de protesto em alegados factos que não ocorreram efectivamente. Daí que extraia, naturalmente, conclusões excessivas e, por isso, totalmente desajustadas em relação ao que aconteceu na base das Lajes.

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23 DE SETEMBRO DE 1983

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É evidente que a ASDI considera que na base das Lajes, como parte integrante que é do território português - e não base estrangeira como erradamente refere o Partido Comunista Português -, terão que ser observadas as regras respeitantes aos contactos com a informação de personalidades em trânsito. Não é, no entanto, exacto - como alega o PCP - que o jornalista tivesse sido alvo de empurrões ou que os jornalistas portugueses tivessem sido impedidos de colocar qualquer pergunta ao Sr. Vice-Presidente dos Estados Unidos da América. Tanto assim foi, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que 2 jornalistas portugueses fizeram perguntas ao Sr. Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, perguntas que foram respondidas.
Por essa razão, a ASDI votará contra o voto de protesto pelo PCP, reiterando ainda o disposto no artigo 5 º, n" 3, da Constituição da República, onde se consagra que u0 Estado não aliena qualquer parle do território português ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce [...] ».
Entendemos que a defesa da soberania dos estados não pode ser exaltada por certas forças políticas apenas quando e onde elas julguem tacticamente oportuno. Dirá o PCP que estamos perante um argumento estafado! No entanto, perante a repetição hipócrita da dcfe5a da soberania dos estados, aqueles que tem dessa defesa um conceito que não se restringe nem se anula cem as fronteiras geográficas terão que, em todas as circunstâncias, denunciar essa hipocrisia. Foi isso que, pela nossa parte, fizemos.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Igualmente, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Gomes.

O Sr. João Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos que este voto de protesto apresentado pelo Partido Comunista Português assenta em bases que não correspondem à verdade. De facto, os acontecimentos não se passaram tal como aqui são descritos, pois a verdade é que o Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, Sr. George Bush, declarou que apenas responderia a perguntas de um ou dois jornalistas, a uma ou duas perguntas, mais concreta mente. O que se passou, segundo a informação que obtivemos de fonte que reputamos do mais fidedigna possível, foi que, perante a pergunta que um terceiro jornalista português colocou ao Vice-Presidente norte-americano, este respondeu que, de acordo com a informação dada inicialmente, já não responderia a essa terceira pergunta.
De qualquer modo, sabemos que não houve qualquer tipo de insultos, nem de empurrões, nem de agressões relativamente a qualquer profissional dos meios de comunicação social. Isso foi referido por um jornal açoriano, concretamente o Correio dos Açores, e acredito que foi com base nessas notícias deste jornal que o Governo Regional dos Açores apresentou um protesto através das vias diplomáticas competentes, que depois foi esclarecido, de modo que hoje é ponto completamente assente que não houve, de facto, nem insultos, nem empurrões, nem violência.
Na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se tivesse existido este tipo de comportamento de quaisquer forças de segurança norte-americanas para com os jornalistas portugueses nós, socialistas, não podíamos deixar de votar favoravelmente este voto de protesto. De facto, não houve e há aqui uma informação deturpada. Aliás, consideramos a vário título - permitam-me a expressão - «grotesco» que, a propósito de um incidente deste tipo, se use a expressão «ofensa que atingiu a Pátria portuguesa».
Para nós, este voto de protesto do PCP apenas se inscreve num princípio e numa linha de orientação que é a de tentar «envenenar» as relações entre Portugal e os Estados Unidos da América. Mas creio que este objectivo do Partido Comunista Português não será conseguido e iremos votar contra este voto.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os valores do patriotismo essenciais à realização do homem integral, são valores fundamentais no programa do Partido do Centro Democrático Social. Não podemos, porém, acompanhar o Partido Comunista neste voto e não poderemos deixar de fazer algumas observações em relação a ele, sublinhando, aliás, intervenções que já foram feitas hoje nesta Câmara.
Em primeiro lugar, sublinhar a hipocrisia com que o voto é apresentado. Ao mesmo tempo que se quer tirar desforço daquilo que se chama uma «ofensa à Pátria portuguesa», considera-se a base das Lajes como uma base militar estrangeira. A base das lajes não é uma base militar estrangeira, mas sim uma base militar nacional, na qual foram concedidas facilidades a uma potência militar estrangeira que, no exercício dessas facilidades, terá de respeitar a nossa soberania e de actuar de acordo com regras de protocolo e de delicadeza que sejam normais ao convívio entre as Nações.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, também não podemos aceitar que, de qualquer modo e tal como aqui á caracterizado, um incidente simples deste tipo possa considerar-se que constitui uma «ofensa que atinge a Pátria portuguesa».

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não atinge a Pátria portuguesa quem quer, e não podemos banalizar os valores da Pátria e o seu conceito, considerando que ele é atingido por incidentes deste tipo.
Se o incidente fosse verdadeiro - e hoje verificamos, através das intervenções de Srs. Deputados naturais da Região Autónoma dos Açores, que há dúvidas sobre a forma como decorreu o incidente mas mesmo que fosse verdadeiro, era outro o tipo de protesto que esta Câmara devia fazer. Nunca deveria fazer um protesto por uma «ofensa à Pátria portuguesa». A Pátria portuguesa não é, nem será nunca, ofendida deste modo.
Por isso, votaremos contra o voto de protesto apresentado pelo Partido Comunista Português.

Aplausos do CDS, do PSD e da ASDI.

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O Sr. Presidente: - Igualmente, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais nada, ficámos a saber que o Sr. Deputado João Gomes, que também é jornalista, não foi obter informações junto do seu Sindicato, o dos jornalistas, que já tomou posição clara sobre este assunto e cuja direcção é, aliás, da sua área política, portanto insuspeito para saber exactamente o que se passou na base das Lajes. É possível que o Sr. Deputado João Gomes já esteja mais informado do que o próprio Governo Regional dos Açores, do que o próprio Ministro da República e gostaríamos de saber onde é que foi obter as informações para desmentir claramente o Governo Regional dos Açores, o Ministro da República e o próprio Sindicato dos jornalistas.

Protesto do PS.

O Orador: - Talvez à Embaixada dos Estados Unidos da América, Sr. Deputado!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protesto do PS.

O Orador: - Nós conhecemos bem a independência do Sr. Deputado!
O MDP/CDE vai, pois, votar favoravelmente o voto de protesto contra a actuação dos elementos da segurança do Vice-Presidente dos Estados Unidos da América, Sr. George Bush, no aeroporto português das Lajes, que maltrataram e insultaram os jornalistas portugueses no exercício das suas funções profissionais. O que se passou constitui um facto muito grave, atentatório das nossas liberdades e demonstrou o tipo de procedimento de pessoas que nos Estados Unidos da América podem ser autoridades de relevo, mas que no nosso país não detêm qualquer poder.
Compreendemos perfeitamente que o Vice-Presidente dos Estados Unidos da América não queira responder às questões dos jornalistas, tanto mais que iriam por certo incidir sobre as negociações da base das Lajes. Ninguém, como é evidente, pode ser obrigado a conceder entrevistas ou satisfazer pedidos de profissionais de informação. Mas impedir os jornalistas portugueses de exercerem livremente a sua profissão, utilizando para isso métodos violentas e insultuosos, demonstra desprezo para com a comunicação social portuguesa e desprezo pelo Estado democrático que nos prezamos de ser. São métodos talvez aceitáveis nos Estados Unidos da América - do que francamente duvidamos -, que nos fazem lembrar métodos utilizados pelo regime derrubado em Portugal no 25 de Abril de 1974, e que repudiamos totalmente.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pretende usar da palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Pretendia dar explicações à Câmara, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, devo informá-lo que o seu Grupo Parlamentar dispõe apenas de 1 minuto.
Entretanto o Sr. Deputado João Gomes pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Gomes (PS): - Sr. Presidente, considero que as palavras proferidas pelo Sr. Deputado Corregedor da Fonseca atingiram a minha dignidade profissional e de deputado e, por isso, gostaria de dizer brevíssimas palavras a esse respeito.

O Sr. Presidente: - Lembro-lhe, Sr. Deputado, que lhe será contado o tempo.
Como, entretanto, o Sr. Deputado Jorge Lemos estava inscrito, tem em primeiro lugar a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, são curtas explicações e referem-se, fundamentalmente, à intervenção do Sr. Deputado Raul Gomes dos Santos, do PSD, na qual disse que o sentido do voto estaria incompleto. Queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que se se trata de introduzir qualquer referência à posição já assumida pelo Governo Regional dos Açores temos todo o gosto em a introduzir. Não foi por menos consideração para com o Governo Regional que não a referimos aqui.
Quanto aos factos, parece que eles estão claros e faço minhas as palavras do MDP/CDE, uma vez que temos pouco tempo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. João Gomes.

O Sr. João Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, invocando a minha qualidade de jornalista, proeurou aqui atingir, de uma maneira que considero inaceitável, a minha pessoa, referindo nomeadamente o seu Sindicato e as informações que possui.
Quero dizer, muito rapidamente, que as afirmações que aqui proferi foram feitas com base que considero o mais fidedigna possível. Acho, e insisto, que não houve qualquer espécie de insulto nem de agressão a qualquer jornalista português na base das Lajes ...

Uma voz do PCP: - Essa é boa!

O Orador - O Sr. Deputado Corregedor da Fonseca quer que eu refira as fontes, quando há, na nossa profissão de jornalistas, algumas regras deontológicas relativamente a essa matéria ...

Risos e protestos do MDP/CDE e do PCP.

Mas quero dizer-lhe que se tem algumas dúvidas quanto à informação deturpada sobre esta matéria, o Sr. Deputado deve consultar o Governo Regional dos Açores e, nomeadamente, o seu Presidente, que penso estar, neste momento, suficientemente esclarecido e documentado para proceder aos esclarecimentos que forem necessários.
Relativamente à insinuação que fez de eu obter informações na Embaixada dos Estados Unidos da América, quero dizer ao Sr. Deputado Corregedor da Fonseca que se o senhor tem hábitos nessa matéria eu desconheço-os inteiramente.

Aplausos do PS e do PSD.

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23 DE SETEMBRO DE 1983

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pretende usar da palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, solicitava-lhe que nos informasse de quanto tempo dispõe ainda o nosso grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Dispõe de 3 minutos, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca MDP/CDE - Sr. Presidente, não temos tempo. O protesto do Sr. Deputado João Gomes não merece um contraprotesto,

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação do voto de protesto apresentado pelo Partido Comunista Português, que tem estado em discussão.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra ela do PS, do PSD, do CDS e ela ASDI, e votos a favor do PCP do MDP/CDE, da UEDS e do Sr. Deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do voto de pesar e protesto contra os actos de violência cometidos em Timor-Leste.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que este voto de pesar e de protesto que está subscrito por todos os partidos e grupos parlamentares desta Assembleia e que foi desencadeado por nossa iniciativa é, por si, suficientemente esclarecedor como também é esclarecedor o facto de ele representar, por parte desta Assembleia, uma atitude que é, à partida, de unanimidade.
Pensamos que laços profundos, que são laços históricos de gerações, laços de sangue derramado, os laços na tradição do povo maubere de pacto de sangue, nós unem às populações de Timor. Por isso não nos são indiferentes todas as violências e todos os atentados praticados contra a humanidade, o genocídio que em Timor e sobre a sua população decorre mais particularmente nos toca.
Constituímos hoje, sobre a Terra, um mundo e uma humanidade. Estamos ligados à razão de ser, à sobrevivência da humanidade toda.
A Assembleia da República de Portugal, com a consciência de que está, no âmbito das suas limitações, a fazer um protesto solene, chama à atenção da humanidade inteira para que não pode mais ocultar a realidade dos factos e que não mais razões de interesse a façam catar perante os atentados cometidos. Este é o significado profundo deste voto.
A todos os estados, a todas as nações, a todos os homens que amam a liberdade e que se sentem solidários com a vida de outros seres humanos, este voto se destina.
Cremos não mais ser possível que a humanidade continue a refugiar-se sobre questões de interesses, para recusar, atentar, reflectir e actuar, perante aquilo que em Timor se está a passar.

Aplausos da ASDI, do PS e do CDS.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD)- O Partido Social-Democrata, ao subscrever este voto de pesar e protesto conjuntamente com outras forças políticas, fê-lo imbuído de um sentimento profundo e, por isso o votaremos favoravelmente. Para nós, atitudes desta natureza serão sempre reprovadas, independentemente do local do globo em que sejam perpetradas. Com maior incidência o fazemos pelas razões de alma que nos ligam a Timor.
Além do que se passou na povoação de Viqueque nos passados dias 20 e 21 de Agosto, passam-se todos os dias autênticos atentados à vida e ã dignidade humana. O regime de ]acarta, num arremedo de loucura, vendo o terreno fugir-lhe no campo diplomático, proeurou, com intimidações publicitadas, proceder i1 limpeza dos Timorenses até quebrar a sua resistência. Porém, vendo que os resistentes Timorenses não eram facilmente vencíveis, proeurou alcançar uma vitória mais fácil, guerreando, torturando, saqueando e matando mulheres, velhos e crianças.
Mas que vitória, Srs. Deputados? Uma vitória que cerca de 150 000 soldados indonésios não conseguiram, ao longo de 8 anos, contra 8000 guerreiros timorenses? Como é possível vencer um povo que tem a sua cultura, a sua religião e a sua língua? Será pela força das armas? Não! Cremos que não!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos convencidos que enquanto se lutar em Lospales, Viqueque, Lega, Baucau, Sarna e Ainaro - e neste momento luta-se existem timorenses, mesmo faltando ao mundo livre - mesmo faltando ao mundo livre, repito uma parcela chamada Timor-Leste. Sem pretender citar quem quer que seja, permita-se-me desejar que os timorenses vivos continuem a ser dignos dos que todos os dias tombam e que os homens livres do mundo e que as nações livres do mundo despertem e combatam, por todos os meios, quem indevidamente combate os timorenses de Leste.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rudolfo Crespo.

O Sr. Rudolfo Crespo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista vai votar favoravelmente este voto no entendimento de que ele constitui não só a condenação do facto isolado que nele se transcreve, mas de todas as atrocidades que têm sido cometidas pelos exércitos de ocupação da Indonésia. É, na verdade, a um verdadeiro genocídio que se assiste.
Portugal tem responsabilidades particulares e responsabilidades históricas em direcção a Timor e todas as pressões que possam ser feitas no âmbito nacional e internacional para pôr cobro ias violências, às atrocidades e para permitir que o povo maubere tenha direito à autodeterminação e independência devem ser levadas a efeito por todos os órgãos de soberania e, particularmente, por esta Assembleia da República. Gostaria de lembrar que esta Assembleia já conseguiu que, ao nível da União Interparlamentar e antes mesmo que o caso fosse julgado na ONU se aprovasse uma moção de condenação da Indonésia.

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Penso e proponho que este voto seja, ao mesmo tempo, um voto para que numa das próximas reuniões da União Interparlamentar -que, segundo penso, se deve realizar em Jacarta- a delegação portuguesa faça dessa reunião uma plataforma para uma condenação internacional, no sentido de que as delegações dos vários países possam visitar Timor e possam condenar, de uma maneira frontal e de modo ater uma grande repercussão na opinião pública internacional, a política da Indonésia, indo assim em defesa do povo maubere.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP)-. - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dispomos de muito pouco tempo e, por isso, vou sintetizar aquilo que temos a dizer.
Em primeiro lugar, ao subscrevermos este voto associamo-nos ao essencial das palavras que o Sr. Deputado Magalhães Mota teve, há pouco, ocasião de dizer, transmitindo e manifestando todo o nosso protesto, mas também a nossa solidariedade à luta que o povo timorense está travando com heroísmo.
Queria acrescentar, e neste momento isso é que me parece importante, que a partir da comissão eventual que está constituída, poderíamos multiplicar as iniciativas no sentido de sensibilizar a opinião pública nacional que está extremamente mal informada acerca da situação em Timor e também sensibilizar a opinião pública internacional. Permita-me adiantar aqui, no Plenário da Assembleia da República, uma sugestão que teremos ocasião de repetir depois na comissão eventual: que dediquemos uma sessão plenária da Assembleia da República à discussão do caso de Timor. Que melhor maneira de sensibilizarmos a opinião pública nacional e de a repercurtir na opinião pública internacional do que realizar todo um Plenário da Assembleia da República dedicado a este caso?

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Propunha que a comissão eventual se encarregasse de organizar essa sessão especial da Assembleia da República, pois estou certo que este é um contributo que podemos dar à luta do povo timorense e que esta é a melhor forma de solidariedade que podemos expressar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem n palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE subscreveu este voto agora em apreço e que parece reunir a unanimidade das bancadas da Assembleia da República. A chacina praticada em Agosto último pela Indonésia em Timor é mais um trágico episódio da luta travada pelo povo maubere pela sua independência e autodeterminação.
Todos os dias em Timor o seu povo luta contra o ocupante Indonésio! Por isso a Assembleia da República, e em particular o nosso grupo parlamentar, associa-se inteiramente a este voto. Mas, merecendo

também apoio a sugestão aqui apresentada pelo Sr. Deputado Carlos Brito, no sentido de se realizar uma sessão especial nesta Assembleia, cremos que, para lá desta posição, desejável será que todos os órgãos de soberania se empenhem em posição idêntica na defesa dos interesses do povo de Timor e, em especial, que o Governo, na próxima sessão da ONU, tome posição consentânea com a assumida por esta Assembleia da República, defendendo inequivocamente o direito do povo de Timor à sua autodeterminação, contra a ocupação de Timor-Leste pela indonésia.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero ser muito rápido. O meu camarada Lopes Cardoso é um dos subscritores deste voto, por isso suponho que não restam dúvidas a nenhum deputado desta Casa que a UEDS e o seu agrupamento parlamentar condenam firmemente a acção que a ditadura indonésia tem exercido em Timor-Leste, o impedimento da expressão da vontade livre de um povo e, com muito mais vigor, obviamente, as acções de genocídio e de massacre empreendidas pelas forças armadas indonésias. Timor-Leste é, de facto, um país onde não foi levado até ao fim o processo de descolonização, é um país que está na realidade ocupado e em relação ao qual, não só esta Assembleia da República, não só os órgãos de soberania, mas no quadro dos países que política e geopoliticamente são próximos, há a máxima obrigação de empreender esforços conjuntos que levem ao reafirmar da condenação internacional da ditadura indonésia.
Nesse sentido, as acções que esta Assembleia possa empreender e, designadamente, a intervenção dos seus delegados à União Interparlamentar na próxima conferência a realizar dentro de algumas semanas, será extremamente importante. As últimas notícias que chegam trazidas pelos refugiados e por entidades internacionais e que se reportam, designadamente, às dificuldades postas à acção da Cruz Vermelha e a novas notícias da persistência do exército indonésio nestes massacres, mais não fazem do que levar-nos a reafirmar a condenação da acção das forças armadas da ditadura indonésia em relação ao povo de Timor-Leste. povo que queremos ver livre.

Aplausos da UEDS e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao associar-mo-nos, através da minha assinatura, a este voto da iniciativa da ASDI, fizemo-lo pelas mesmas razões fundamentais que nos levaram a votar favoravelmente o voto hoje aqui apresentado sobre as mortes na Unido Sul-Africana e sobre o abate do avião sul-coreano. Mas fizemo-lo, também, porque a violência que diariamente atinge o povo timorense, impedido de escolher o seu próprio destino, e a violação frontal e brutal do direito à vida que teve lugar no caso especial da matança de Viqueque, e de tantos outros que infelizmente se repetem a ritmo também

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quase diário em Timor, sensibilizam-nos de modo muito particular, atentos os laços específicos que nos ligam ao povo timorense, laços que testemunham o modo como fizemos história e que atestam a nossa presença no mundo.

Aplausos elo CDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação deste voto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. (Presidente: - O Sr. Magalhães Mota pede a palavra para que efeito?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): -Sr. Presidente, queria apenas sugerir à Mesa que este voto seja transmitido por V. Exa. ao secretário-geral das Nações Unidas e a todos os países acreditados por embaixadas ou outras delegações diplomáticas em Portugal.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Assim será feito, Sr. Deputado.
Srs. Deputados interrompemos aqui os nossos trabalhos. Convoco, portanto, a Assembleia para as 15 horas e 30 minutos, pedindo aos Srs. Deputados para serem pontuais.
Está interrompida a sessão.

Eram 13 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

Toma assento na bancada do Governo o Sr. Subsecretário de Estado do Orçamento (Amorim Pereira).

O Sr. Presidente: - Vamos entrar no período da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, vou apresentar ao Governo um requerimento cuja utilidade se esgota em breve prazo. Solicitava a V. Exa. que esse requerimento, referente ao prazo de apreciação do projecto de decreto-lei sobre suspensão ou redução temporária de trabalho, pudesse ser despachado pela Mesa com nota de «muito urgente» e, ao mesmo tempo, solicitava ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares que lhe desse rápido andamento visto que o prazo que referi se está a esgotar.
Aproveito para solicitar ao Sr. Presidente a convocação da conferência dos líderes dos grupos parlamentares dado que pretendemos fazer aí a entrega de dois requerimentos para fixação de ordem do dia: um relativo ao projecto de lei sobre Vizela, para 20 de Outubro, e outro relacionado com o projecto de lei sobre salários em atraso, para 27 de Outubro. Em relação a este segundo projecto de lei vamos apresentar um requerimento de pedido de concessão de processo de urgência para o qual solicito o seu agendamento para amanhã.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado fará o favor de fazer chegar à Mesa esses requerimentos que serão imediatamente despachados. Em relação à conferência dos líderes dos grupos parlamentares já tinha intenção de a convocar para o intervalo desta sessão.
Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Em reunião realizada no dia 22 de Setembro de 1983, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:

Mário Martins Adegas (círculo eleitoral de Aveiro) por José Augusto Ferreira de Campos (esta substituição é pedida para os dias 22 e 23 de Setembro corrente, inclusive);
Joaquim Eduardo Gomes (círculo eleitoral de Setúbal) por Francisco Mendes da Costa (esta substituição é pedida para o dia 22 de Setembro corrente);

2) Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:

Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (círculo eleitoral de Braga) por Cristiano Brandão Lopes (esta substituição é pedida para os dias 22 e 23 de Setembro corrente, inclusive);
Henrique Paulo das Neves Soudo (círculo eleitoral de Setúbal) por Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes (esta substituição é pedida para os dias 22 e 23 de Setembro corrente, inclusive).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir,
uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos Deputados presentes.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado. (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nu-

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nes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Rui Monteiro Picciochi (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Manuel António de Almeida de A. Vasconcelos (CDS) - João Corregedor
da Fonseca (MDP/CDE) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como ninguém se inscreve, vamos votar o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos que acaba de ser lido.
Submetido à votarão, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Vamos entrar agora na 1 º parte do período da ordem do dia que respeita à apreciação do pedido de prioridade e urgência solicitado pelo
Governo para discussão das propostas de lei n.º 38/III, 39/III, 40/III, 41/III, 42/III, 43/III e 44/III.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da apresentação do seu Programa à Assembleia da República, o Governo teve ensejo de salientar que, face às dificuldades com que a economia portuguesa se tem vindo a defrontar, a política económica a prosseguir em 1983 e em 1984, aparece determinada pela imperiosa necessidade de se restabelecerem alguns mecanismos fundamentais que se encontram perturbados, com destaque para as situações da balança das transacções correntes e do Orçamento do Sector
Público Administrativo, em partilhar, de um dos seus principais componentes, que é o Orçamento do Estado.
Daí a elaboração de um Programa de Gestão Conjuntural de Emergência que, de uma forma equilibrada e serena, mas simultaneamente rigorosa e firme, vai
recriar as condições que, a partir de 1984, vão possibilitar a prática de uma política de desenvolvimento susceptível de operar a indispensável reestruturação da economia portuguesa.
Como é evidente, não se pretende implementar uma política restritiva cega, mas, outrossim, uma política realista, sem falsos alarmismos, que não se justificam,
que possibilite a consecução daquele objectivo.
Ao propor à Assembleia da República a aprovação de novas medidas, na área da fiscalidade, o Governo tem a exacta consciência de que esta a solicitar ao
povo português um esforço adicional significativo para ultrapassar as dificuldades com que se defronta a economia do nosso pais, mas, não obstante, não hesitou em fazê-lo. De facto, o Governo tem a certeza de que o momento que passa exige que cada português se interrogue sobre o que pode fazer para cooperar na grandiosa tarefa de restituir à economia portuguesa as condições indispensáveis ao seu normal funcionamento e desenvolvimento. Importa assim inverter a prática, que tem vindo a ser seguida, de cada português procurar obter o máximo de «benesses» do Estado.
Em matéria de orçamento, torna-se assim absolutamente necessário a adopção de medidas que conduzam à contenção dos respectivos défices, em particular do corrente, dado os seus reflexos negativos na área do investimento, da inflação e até naquilo que representa de falta de solidariedade no que toca às gerações futuras.
Neste momento e com a finalidade de esclarecer devidamente os portugueses da razão de ser desta medida extraordinária, importa recordar como evoluiu, nos últimos anos, a divida pública portuguesa, o montante de juros que o Orçamento do Estado se viu obrigado a suportar e as principais causas deste endividamento.
No que respeita à evolução da dívida pública nos últimos anos devo referir que em 1974, em 31 de Dezembro, ela ascendia a 61,6 milhões de contos e que os juros que o Orçamento do Estado suportou foram da ordem dos 3,2 milhões de contos. Em 1983 o Orçamento do Estado terá provavelmente de fazer face a 221 milhões de contos de juros, sendo em 31 de Dezembro de 1982 o valor da dívida pública da ordem dos 938,5 milhões de contos.
Se os Srs. Deputados tiverem interesse nisso poderei fornecer a evolução anual da dívida pública. São números que nos dão bem a ideia da difícil situação com que nos defrontamos.

Anos
Divida interna
e externa
(milhões de contos)

1974 61,6
1975 99,1
1976 152,2
1977 209,7
1978 296,2
1979 419,7
1980 478,1
1981 709,6
1982 938,5

A evolução dos juros processou-se da seguinte forma:

Em milhões de contos

Anos

Juros e outros
encargos Amortizações Total

1972 ................. 1,5 1,1 2,6
1973 ................. 1,5 1,2 2,7
1974 ................. 1,7 1,5 3,2
1975 ................. 2,5 1,7 4,2
1976 ............... 5,3 2,3 7,6
1977 ................. 10,1 3,1 13,2
1978 .............. 20,4 4,2 24,6
1979 .............. 29,0 7.3 36,3
1980 ................. 37,4 10,0 47,4
1981 .............. 62,2 24,6 86,8
1982 ..... ... ... . 101,4 42,0 143,4
1983 162,1 60,4 222.5
1984 .............. 219,1 98,8 317,9

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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI) - Sr. Secretário de Estado, o Relatório do Banco de Portugal, referente ao ano de 1982, quando fornece os números relativos à evolução da divida pública - são elementos fornecidos pela Direcção-Geral do Tesouro-- dá-nos números ligeiramente menores em relação a alguns dos anos considerados, designadamente 1980. Pressupondo que os dados do Sr. Secretário de Estado têm a mesma origem - a Direcção-Geral do Tesouro- pergunto-lhe se são mais actualizados do que os constantes no Relatório do Banco de Portugal.
Será exacta esta minha asserção?

O Orador: - Sr. Deputado, o que lhe posso afirmar é que são números facultados pela Direcção-Geral do Tesouro.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Mas de certeza os seus são mais recentes; a diferença é, aliás, muito ligeira!

O Orador: - Espero que estejam certos visto que são facultados pela Direcção-Geral do Tesouro e pela junta do Crédito Público.
Fica assim caracterizada a evolução da dívida e o montante dos juros suportados pelo Orçamento do Estado em cada um dos anos.
Aproveito ainda para referir a evolução nos últimos anos da relação existente entre o montante de juros respeitantes a cada exercício e a respectiva receita fiscal:

anos

Percentepens

19,3
25,1
31,1
37,3
41,3

(º) Estlmntiva.

E uma evolução que diz bem da necessidade de controlar rapidamente o défice do Orçamento do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E possível apontar algumas das causas que contribuíram para este crescente e sucessivo endividamento do Estado. Sem ter uma preocupação exaustiva passarei a enumerar aquelas que, na minha opinião, mais contribuíram para explicar o aumento referido: as admissões de pessoal na função pública, a criação de novos serviços e as suas reclassificações;

Uma voz do PCP: - São os trabalhadores ... !

O Orador: - A aplicação da Lei das Finanças Locais que implicou a transferência, para as autarquias locais, de avultadas verbas, a partir de 1979, e que não foi acompanhada de uma transferência paralela de responsabilidade; em menos grau, a transferência de verbas para as regiões autónomas; a transferência

de verbas para o sector empresarial do Estado, quer e titulo de subsídios quer a titulo de aumento de capital; os subsídios concedidos por vários fundos e serviços autónomos, com destaque para o Fundo de Abastecimento; os encargos com a descolonização; as bonificações e os benefícios fiscais concedidos; o fenómeno da evasão fiscal, é uma explicação para alguns défices; as transferências para o Serviço Nacional de Saúde; há ainda um valor residual que tem de se imputar aos juros que somos obrigados a suportar por força dos sucessivos endividamentos.
Entendemos que o que antecede explica pois, num primeiro momento, a particular atenção que o Governo está a dispensar às finanças públicas no sentido de levar a efeito o seu saneamento e é neste quadro que se insere a apresentação à Assembleia da República deste conjunto de propostas de lei.
De facto, ao iniciar as suas funções e ao levar a cabo uma análise de execução do Orçamento do Estado no ano em curso, o Governo constatou que a não serem tomadas de imediato medidas de excepção, o seu défice ascenderia a 204 milhões de contos, comprometendo assim seriamente não apenas em 1983, como nos anos subsequentes, um dos objectivos fundamentais da sua política económica, ou seja, a contenção do défice.
Neste momento talvez seja oportuno explicar à Assembleia as razões por que é que no orçamento provisório para 1983 se estimou um défice na casa dos 150 milhões de contos e por que é que, se não fossem tomadas algumas medidas, esse défice ascenderia, no final do ano, a 204 milhões de contos. Procurarei avançar razões, quer do lado da receita, quer do lado da despesa.
No que respeita à receita, as duas principais razões que se podem avançar para explicar o agravamento do défice situam-se, respectivamente, na área do imposto de transacção e na área da sobretaxa de importação
Porquê na área do imposto de transacção? Fundamentalmente por três ordens de razões: a primeira, tem a ver com a circunstância de, quando foi preparado 0 Orçamento para 1983, em Setembro de 1982, se prever a elevação da taxa normal de 15 % para 17 % e de se prever que o imposto de transacção por litro de cerveja passaria de 12$ para 15$. Como é sabido o Orçamento do Estado não entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1983, mas sim em 1 de Março de 1983, ou seja, houve aqui uma decalage em matéria de recebimento de receitas.
A segunda razão diz respeito ao facto de o Governo de então estimar que a taxa de inflação seria da ordem dos 22 % a 23 %, ou seja, o imposto de transacção, que incide sobre o preço de venda, teria um comportamento melhorado. Só que, na realidade, o índice de preços, nos finais de julho/Agosto, aponta para uns 21,9% (Setembro de 1982/Agosto de 1983), e uma das classes mais importante para o efeito do imposto de transacção, a classe respeitante ao vestuário e ao calçado, apenas evoluiu na ordem dos 19,6 %; por outro lado, em 1982 o imposto de transacções ficou aquém do que estava previsto e, por isso, quando se fez a previsão para 1983, partiu-se de uma base menos elevada.
E, portanto, este conjunto de razões que explica o desvio que se está a notar e que é da ordem dos 10 milhões de contos.
No que respeita à sobretaxa de importação, onde vamos igualmente, no final do ano, deparar com um

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desvio da ordem de grandeza de 10 milhões de contos, o que explica a situação é o seguinte: o VIII Governo Constitucional, ao fazer a previsão das receitas para 1983, partiu do princípio que a elevação, como o veio a fazer, de 10 % para 30 % da taxa normal da sobretaxa permitiria multiplicar por 3 as receitas cobradas a este título. Foi, de facto, uma posição que, do meu ponto de vista, não é totalmente certa uma vez que, como todos sabemos, nestas áreas funciona o fenómeno da «elasticidade fiscal». Isso foi levantado na altura, foi posto em cima da mesa, mas pensou-se que isso não se viria a verificar.
Um segundo fenómeno respeita, de certo modo, felizmente, ao volume que as importações vieram a adquirir; o terceiro fenómeno que explica o mau comportamento da sobretaxa de importação, respeita ao facto da respectiva taxa, ao ter sido elevada de 10 para 30 %, ter determinado que muitos empresários, muitas empresas, tivessem solicitado e apresentado pedidos de isenção de direitos e de sobretaxa, mesmo nalguns casos em que se sabia que não teriam grandes possibilidades de ser atendidos. No entanto, foram processos que foram estudados, tiveram de se dar pareceres, quer no âmbito do Ministério da Indústria, quer no âmbito do Ministério das Finanças, o que provocou o ganho de quatro a cinco meses.
São razões deste tipo que se observam em relação à sobretaxa de importação; pode dizer-se que parte dela não está perdida e virá, possivelmente, a ser arrecadada em anos futuros.
São fundamentalmente na área das receitas, estas duas ordens de razões que explicam o desvio que se está a encontrar. Quanto aos outros impostos directos e indirectos a cobrança está a processar-se normalmente; haverá num imposto ou noutro algumas distorções mas, no conjunto, pode dizer-se que a cobrança se está a processar normalmente.
Gostaria de referir à Câmara que o facto de haver uma diferença - para menos - na ordem dos 20 milhões de contos, num conjunto, grosso modo, de 440 milhões de contos, isso significa um desvio de 4 % a 5 %.
No tocante às despesas, as principais razões dos desvios desfavoráveis situam-se, fundamentalmente, na área do Serviço Nacional de Saúde, na área da Segurança Social, na área da Direcção-Geral do Tesouro no tocante à estimativa dos juros dos Bilhetes do Tesouro - recordo que entre o momento em que o Orçamento foi preparado e o momento actual, a taxa de juro respectiva aumentou 7 pontos, andava na casa dos 13, 14 e está hoje em 21 -, e, finalmente, na área do reembolso de financiamentos externos por força da desvalorização do escudo e da valorização do dólar.
Este, o conjunto de razões que, quer do lado da receita quer do lado da despesa, explicam o empolar do défice do OE, não obstante os esforços que tem vindo a ser desenvolvido no sentido da maior disciplina nas áreas da despesa pública e do combate à evasão.
Neste ponto, é importante salientar, que no período compreendido entre o início do ano e 26 de Agosto, como resultado das acções de combate à fraude e evasões fiscais, o montante de impostos encontrados em falta, adicionado das respectivas multas, ascende a 13,4 milhões de contos contra 10,7 milhões de contos em igual período de 1982 e 6,9 em 1981.
Gostaria de salientar também os esforços que foram feitos no sentido de intensificar a fiscalização e, naturalmente, a liquidação e cobrança de impostos na área da sisa e do imposto de sucessões e doações.
Na área da sisa estão já a funcionar, quer em Lisboa, quer no Porto, grupos especiais no sentido de verificarem a sisa que foi liquidada. Assim, como resultado da actuação destes grupos já temos resultados positivos que se situam na ordem do milhão de contos. O mesmo se poderá dizer em relação a iguais grupos de trabalho que foram criados para a área do imposto de sucessões e doações, onde, para este ano, podemos esperar arrecadar mais um milhão de contos.
Queria ainda referir que está em fase adiantada de conclusão todo um estudo que visa tipificar e penalizar as infracções tributárias e que, por outro lado, estamos em condições de apresentar, a esta Câmara aquando da apresentação da proposta de lei do Orçamento Geral do Estado para 1984, o modo de se tributarem os sinais exteriores de riqueza.
Este conjunto de medidas que estão a ser tomadas, para além do esforço que o Governo está a fazer no sentido de controlar a despesa pública - esforço feito com particular incidência no Orçamento para 1984 dizem bem do empenhamento total que se está a dedicar a esta imperiosa tarefa de se conter o déficie do Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, desculpe, mas está a exceder em muito o tempo que lhe foi concedido.

O Orador: - Sr. Presidente, estou mesmo a acabar. Se me concedesse mais dois minutos terminaria.

O Sr. Presidente: - Se são 2 minutos, a Câmara certamente não se vai opor [...].

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado deseja intervir no meio de uma intervenção?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, era apenas para sugerir o seguinte: o Sr. Secretário de Estado tem direito a fazer duas intervenções nesta matéria, uma de 20 minutos e outra de 10. Penso que toda a Câmara estará de acordo com o facto de o Sr. Secretário de Estado poder usar os dois tempos de seguida ...

Vozes do PCP: - Não, não, não ...

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Pelo menos a minha bancada está!
Se assim acontecesse, o Sr. Secretário de Estado numa única intervenção poderia usar do seu tempo para dar explicações à Câmara que são extremamente úteis e que justificam este pedido de prorrogação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Meta, o Sr. Secretário de Estado tem 15 minutos, como qualquer outro partido, para intervir nesta fase do debate relativo ao pedido de urgência.
Como foi solicitada pelo Sr. Secretário de Estado a concessão de mais 2 minutos para terminar a sua intervenção, penso que a Câmara não se vai opôr, pelo que dar-lhe-ei de imediato a palavra.

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O Orador: - Sr. Presidente, em jeito de conclusão, depois de ter invocado este conjunto de razões que explicam a prioridade e urgência que o Governo atribui a esta matéria, gostaria apenas de sublinhar as razões que levaram o Governo, aquando da apresentação deste conjunto de propostas de lei a esta Câmara, a não ter salientado a necessidade de ouvir as regiões autónomas, em particular, as assembleias regionais.
O Governo, fazendo a articulação do artigo 229 º da Constituição com o n º 2 do artigo 231º e tendo em atenção um parecer da Comissão Constitucional, concluiu que não estamos perante uma matéria que interesse exclusivamente, ou predominantemente, às regiões autónomas. Mais do que isso, nos termos de um parecer da Comissão Constitucional, se as regiões autónomas, nomeadamente as assembleias regionais, entenderam que não deve ser aplicado um ou outro destes impostos nas respectivas regiões autónomas têm sempre a faculdade de tomarem a iniciativa de, perante esta Câmara, dizer que não pretendem a aplicação deste ou daquele imposto.
Gostaria, também, de salientar que as eventuais receitas destes impostos, que vierem a ser arrecadadas nas regiões autónomas, serão pertença das regiões autónomas e serão por estas aplicadas, obviamente nas respectivas despesas.
Suponho que esta explicação é importante para justificar o porquê da não recomendação de serem ouvidas as assembleias regionais.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço u palavra para pedir um esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado ... Ministro em exercício ao que parece!

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, o ponto da ordem de trabalhos que estamos a discutir, como sabe, respeita ao processo de urgência pedido pelo Governo. É um processo que implica o sacrifício de direitos dos deputados e dos grupos parlamentares, que implica dispensa de apreciação em comissão, é, portanto, um processo que tem de se justificar por razões de grande urgência. Se assim não for o próprio debate parlamentar e a contribuição que a Assembleia é chamada a dar em relação a diplomas desta natureza ficam muitíssimo amputados.
Da intervenção do Sr. Secretário de Estado colheram-se muitas informações avulsas, pouco correntes e pouco concatenadas, na minha opinião, mas não se compreenderam quais as razões da grande urgência que originaram o facto de não se poder esperar mais 5 dias de modo a que a Assembleia trabalhe segundo os seus próprios métodos. Quais são as razões de tão grande urgência?
Relativamente à questão do défice - um argumento invocado em abstracto nos preâmbulos das propostas de lei - que ontem aqui foi objecto de várias perguntas dos deputados e que obteve uma primeira resposta não satisfatória, como se tornou patente, do Sr. Ministro de Estado, esperávamos que o Sr. Secretário de Estado viesse hoje esclarecer quais são as suas razões efectivas. Em termos quantificados o Sr. Secretário de Estado adiantou apenas um número: 10 milhões de contos em relação ao imposto de transacção. Não adiantou outros números e era importante que o fizesse porque entre 10 milhões e 50 milhões - que é o buraco - faltam 40 milhões! Como é?
O Sr. Secretário de Estado invocou depois que tinha havido um agravamento de despesas com o Ministério da Saúde, com a Segurança Social, mas eu pergunto: quais foram? Como foram feitas?
É isso que era importante dizer. )á que não explicou as razões da urgência ao menos em relação a estas razões era necessário que o Sr. Secretário de Estado fosse um pouco mais longe para compreendermos e podermos decidir em consciência acerca das questões que são postas, designadamente acerca deste caso concreto da urgência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao ouvirmos o Sr. Secretário de Estado ficou-nos a ideia de que a sua intervenção não era sobre a ordem de trabalhos de hoje, nem, até, sobre a de ontem, mas, talvez, sobre uma de anteontem se porventura existisse!
A intervenção que o Sr. Secretário de Estado aqui apresentou é uma intervenção totalmente isolada, por um lado, do problema da urgência, que obriga à dispensa de baixa à comissão das propostas de lei, e, por outro lado, das questões concretas que ontem aqui foram levantadas.
Efectivamente, esta Câmara não teve ensejo de ouvir, da parte do Sr. Secretário de Estado, uma referência concreta a nenhuma das sete propostas que o Governo apresentou. O que nós ouvimos foi uma exposição técnica, da qual me permito salientar o interesse dos dados sobre a evolução da dívida externa e dos juros, com referência a dados estatísticos que depõem muito pouco a favor da política posta em prática a partir de 1976 visto que, mesmo na secura dos números, o que aqui se deduz é que a partir de 1976, se estabeleceu uma política económica que se traduz num avolumar vertiginoso da dívida pública e dos juros da dívida externa. Fora disso o meu grupo parlamentar ficou sem entender em que é que o Sr. Secretário de Estado estabeleceu ligação entre esta descrição técnico/financeira da evolução da situação da dívida pública, o problema concreto do processo de urgência que o Governo solicitou, e o problema concreto das sete propostas de lei.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a primeira coisa a esclarecer é saber o que é que estivemos a discutir, se foi ou não o processo de urgência.
Precisamos de saber se o Sr. Secretário de Estado se propõe fazer uma outra intervenção para abrir o debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que todos estão conscientes daquilo que se está a discutir, no

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entanto, cada deputado, tal como o Sr. Deputado Carlos Brito ou qualquer outro, tem o direito de abordar o problema da forma como melhor entender. Se o Sr. Deputado não se entende esclarecido pede esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado [...] Foi, aliás, o que fez.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, na minha bancada há vários Srs. Deputados que querem fazer perguntas ao Sr. Secretário de Estado [...] .

Vozes do PSD: - Façam perguntas.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - [...], precisamos é de saber qual é o ponto de ordem de trabalhos e se o Sr. Secretário de Estado vai fazer uma intervenção de abertura do debate para lhe podermos colocar todas as questões - que são muitas - que queremos ver esclarecidas.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Sr. Deputado Carlos Brito sabe perfeitamente o que é que estamos a discutir.

Vozes do PCP: - O Sr. Secretário de Estado é que não sabe!

O Orador: - Estamos a discutir o processo de urgência pedido pelo Governo - que acompanhou as propostas de lei- que consiste, ao abrigo do artigo 243 º do Regimento, em pedir o seguinte:

A Assembleia deliberará após debate, em que terão o direito de intervir apenas um dos requerentes e um representante de cada partido, por período não superior a um quarto de hora cada um, a dispensa de exame em comissão ou a redução do respectivo prazo.

O Governo pede a dispensa do exame em comissão destas propostas e, por isso, a urgência consiste em justificar, perante a Câmara, não só a sua necessidade intrínseca, como a dispensa de baixa à Comissão. Ora, o Sr. Secretário de Estado deu explicações detalhadas, com números e dados concretos, acerca da urgência desta matéria.

Risos do PCP.

Se o Sr. Deputado Carlos Brito quiser fazer sofismas ou raciocínios circulares, pode fazê-los, no entanto, isto é óbvio: o Sr. Secretário de Estado justificou o processos de urgência, justificou a urgência, os grupos parlamentares vão intervir sobre esta matéria e depois vota-se.
L isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que estamos a fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sra. Zita Seabra (PCP): - E depois?

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de (Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a minha intervenção procurei justificar a urgência que o Governo tem na adopção destas propostas de lei. O Governo tem consciência de que o défice, em 1983, não pode ascender a 204 milhões de contos, o Governo tem consciência que só o pode evitar se forem rapidamente tomadas medidas na área da fiscalidade e foi essa a razão que levou o Governo a apresentar a esta Câmara um conjunto de propostas de lei.
São estas as razões que, em meu entender, sobejamente justificam a apresentação deste conjunto de propostas de lei.

O Sr. Octávio Pato (PCP): - Que grande resposta!

Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, e Srs. Deputados, queria intervir neste debate a propósito de uma questão prévia relacionada com a audiência das regiões autónomas neste processo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe que o interrompe mas o que se está a discutir é o pedido de urgência formulado pelo Governo.
Deu realmente entrada na Mesa uma carta do Sr. Deputado, que fiz distribuir. Creio que esse assunto deverá ser tratado quando discutirmos as propostas e não agora durante a discussão deste processo de urgência, que terá de ser resolvido.
Se o Sr. Deputado estivesse de acordo, faria, pois, a sua intervenção a seguir à votação do processo de urgência.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, penso que poderia adiantar se fizesse já a minha intervenção, mas não sendo esse o entendimento da Mesa fá-la-ei noutro momento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - E para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
Peço imensa desculpa, mas no meio de toda esta confusão, estou realmente sem saber se estamos ou não a discutir a urgência e, nessa conformidade, se está realmente reservado a um representante de cada grupo parlamentar 15 minutos para intervir.

O Sr. Presidente: - Está sim, Sr. Deputado. É evidente que está! Aliás, creio que a redacção da ordem do dia é absolutamente clara quanto ao que se está aqui a fazer. Não há discussão nenhuma, a não ser quando a querem fazer!...
Acontece é que não há nenhum Sr. Deputado, de nenhum grupo parlamentar, que tenha ainda pedido a

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palavra para intervir neste assunto, de forma que vamos passar à votação.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, era para intervir sobre o pedido de urgência.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Representantes do Governo: o Grupo Parlamentar do PCP vai obviamente votar contra as urgências pedidas pelo Governo para as suas 7 propostas de lei de agravamento da carga fiscal.
Esta posição decorre antes de tudo das mesmas razões que nos levaram a impugnar a admissão das 7 propostas governamentais. Se é certo que a coligação governamental acabou por impor pela maioria dos seus votos a admissão das propostas de lei, é manifestamente evidente que os argumentos da inconstitucionalidade que contra elas foram carreados pelos partidos da oposição permanecem sem contradita convincente.

A Sra. Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A muito poucos sobrarão agora dúvidas de que as propostas governamentais de agravamento da carga fiscal, tal como foram apresentadas, violam os princípios estabelecidos pela Constituição em matéria de política orçamental e também de política fiscal e atentam simultaneamente contra as competências e prerrogativas da Assembleia da República nestes domínios.
Permanece ainda como um grande mistério neste debate, mesmo depois das explicações dadas ontem pelo Sr. Ministro de Estado Almeida Santos e hoje pelo Sr. Secretário de Estado, a razão que levou o Governo a optar por um terreno tão pantanoso numa matéria - a de arrecadação de receitas públicas - em que a relação entre o Estado e os cidadãos deve ser meridianamente clara e perfeitamente conforme com a Constituição e a lei para que as responsabilidades se tornem exigíveis.
O Governo e a maioria governamental dão-se conta dos riscos?
Mesmo no quadro da sua desastrosa política não haveria formas constitucionais de proceder?
Porque não apresentou o governo PS/PSD uma lei formal de revisão do Orçamento? É uma pergunta que permanece. O Governo diz que não está preparado, mas o que é que lhe falta para apresentar essa proposta formal de revisão do Orçamento? Porque procura o Governo a todo o transe arredar a Assembleia da República da definição da política orçamental, atentando desta forma contra a Constituição e os princípios básicos do regime democrático? Porque se refugia o Governo em expedientes ridículos como os utilizados em julho pretendendo que o Parlamento se auto-expropriasse das suas competências e os usados agora quando pretende ser autorizado a arrancar aos contribuintes, sobretudo aos trabalhadores, mais de 20 milhões de contos, mas escamoteia as contas das despesas e os critérios a quem lhe deve conceder a autorização, isto é, nos deputados, à Assembleia da República?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que é que teme o governo de Mário Soares-Mota Pinto? Que riscos pretende prevenir?
São interrogações legitimas, Sr. Secretário de Estado.
A nosso ver o que o Governo acima de tudo quer evitar é um debate sério sobre a situação económica e financeira do País e a política governamental de ataque à crise.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo pretende que a RTP, a RDP e a imprensa estatizada e da mesma forma que a privada afecta à coligação continuem a glosar as grandes frases retóricas e vazias atiradas por Mário Soares na conferência de imprensa de 7 de Setembro.

A Sra. Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo gostaria de poder conduzir o debate sobre a política económica e financeira exortando o povo a apertar o cinto com argumentos tão «profundos» como aqueles que então usou o Primeiro-Ministro ao afirmar «o êxito excedeu a minha expectativa» e ao proclamar «não há alternativas a esta política, tudo o que se disser em contrário é totalmente falsos.
Mas repare-se em que se cifram os sinais positivos no plano económico e financeiro invocados por Mário Soares na sua conferência de imprensa e respeitando a sus própria inventariação.
São os seguintes:

Uma mudança de atitude (dos bancos internacionais);
Uma boa receptividade (às emissões de títulos);
Um interesse manifestado (com os investimentos em Portugal).

Tudo muito objectivo como se vê!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Então não havemos todos nós de ter confiança nestas balelas? E a Assembleia da República, não deve ela votar tudo aquilo e só aquilo que o Governo entender e com a pressa que o Governo achar necessária? Não era este o sentido das palavras iniciais do discurso ontem aqui proferido pelo S. Ministro de Estado Almeida Santos?
Aqui está como o governo PS/PSD desfigura com a sua prática o regime democrático e as suas instituições.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto nos leva à segunda razão fundamental pela qual dizemos não às urgências pedidas pelo Governo.
Na opinião do Grupo Parlamentar do PCP, a urgência em termos de actividade da Assembleia da República é um debate geral sobre a situação económica e financeira que estabeleça rigorosamente a dimensão da

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crise, que ponha a nu as verdadeiras orientações que comandam a política governamental, e os exactos compromissos assumidos com o Fundo Monetário Internacional e clarifique finalmente as verdadeiras medidas capazes de modificar a situação presente.

Aplausos do PCP.

Como o governo PS/PSD é incapaz de promover um tal debate como lhe competia, é que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou uma interpelação ao Governo.
E de toda a lógica que em matéria de política económica e financeira a urgência, aliás como estabelece o Regimento, deve ir para a interpelação do PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A interpelação do PCP com vista à abertura de um debate geral centrado predominantemente sobre as medidas de política económica e financeira deve obviamente ter precedência sobre a discussão e a votação de qualquer revisão orçamental e de medidas avulsas que criem novos impostos ou agravem as taxas dos existentes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo e a coligação governamental PS/PSD recusam um debate geral sobre política económica e financeira porque temem o desmascaramento da sua política e da sua actuação.
O Governo proclama que a culpa da situação é dos governos anteriores e anuncia a publicação de um livro branco «sobre a situação de desastre financeiro que o Governo herdou». Ninguém de boa fé contestará que o actual Governo herdou uma situação de desastre não só no plano financeiro mas no plano económico também. O PCP foi aliás o primeiro partido a classificar assim a política da AD. Agora acrescentamos que o presente governo PS/PSD prossegue em todos os domínios fundamentais a política da AD e nalguns com agravamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O presente governo PS/PSD prossegue assim a política de desastre nacional que intenta responsabilizar e como a prossegue em patamares cada vez mais baixos continua a marcha para o abismo, para a bancarrota.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Um debate geral sobre política económica e financeira inevitavelmente demonstrará que não foi o PS que impôs a mudança que enunciou na campanha eleitoral, foi o PSD que assegurou a continuidade da governação anterior.

Aplausos do PCP.

E é precisamente a isto que o Governo e a coligação governamental pretendem fugir.
Mas o Governo e a coligação governamental proclamam também que os sacrifícios são igualmente repartidos, que são sacrifícios para todos.

Não foram precisos mais do que 100 dias para se tornar evidente que a política de austeridade do Governo PS/PSD, como anteriormente a da AO, são as protecções, os amparos, o regabofe dos dinheiros e meios públicos para os grandes capitalistas e os monopolistas do tempo do fascismo, enquanto para os trabalhadores e o povo em geral é o ataque mais monstruoso às suas condições de trabalho e de vida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como Álvaro Cunhal afirmou recentemente no seu discurso na Festa do Avante:

A preocupação e o objectivo do Governo não e que a economia portuguesa recupere, mas que os capitalistas recuperem a economia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Contra o povo trabalhador abateram-se de uma só vez as mais negras pragas da sociedade capitalista: a subida vertiginosa dos preços, o rápido alastramento do desemprego, o aumento dos impostos. Mas a estes clássicos meios de exploração dos trabalhadores e de extracção da mais valia por eles produzida juntam-se agora, generalizadamente sob a vigência deste Governo liderado pelo PS, a praga dos salários em atraso.
O não pagamento de salários pelas entidades patronais traduz em alguns casos a crise da nossa economia, mas já se tornou com evidência um novo processo de exploração e acumulação capitalista. O que é espantoso é que tratando-se de uma flagrante violação da lei não se conheça da parte das entidades governamentais qualquer iniciativa para pôr cobro a uma situação tão escandalosa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo dá assim cobertura e estimula o capitalismo selvagem!

A Sra. Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O orador: - Mário Soares gabou-se aqui há vários anos atrás no Clube Americano ter sido ele que impôs em 1976 e 1977 uma drástica redução do poder de compra dos trabalhadores portugueses. Não há dúvida que Mário Soares pode agora gabar-se de ter batido o seu próprio record.

Aplausos do PCP.

Um debate geral sobre a política económica e financeira faria inevitavelmente a prova disto. E uma tal conclusão que o Governo e a coligação governamental não querem que seja tirada.
As presentes medidas fiscais constituem aliás uma nova ilustração da política de injustiça social seguida pelo Governo PS/PSD.
Assim, para uma nova arrecadação de receitas da ordem dos cerca de 22 milhões de contos que as 7 propostas, se aprovadas, podem permitir, os 2 impostos que mais directamente incidem sobre os trabalhadores, o que incide sobre o imposto profissional e o agrava-

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23 DE SETEMBRO DE 1983

mento do imposto do selo, representariam cerca de 20 milhões de contos.
Teremos ocasião de demonstrar durante o debate o carácter demagógico de que se revestem os impostos que incidem sobre as chamadas manifestações exteriores de riqueza. Aqui importa assinalar apenas que esses impostos se destinam a camuflar o golpe brutal que o Governo se prepara para desferir contra os trabalhadores portugueses arrebatando-lhe parte substancial do 13º mês.
E a prenda de Natal que os Governos anteriores sonharam dar à população laboriosa do nosso país, mas não conseguiram e que o Governo de Mário Soares e Mota Pinto se prepara agora afanosamente para concretizar. Esperamos que não o consiga também.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas falando desses impostos sobre os sinais exteriores de riqueza, estranha-se não encontrar entre as propostas de lei apresentadas pelo Governo a criação do tão anunciado novo imposto sobre as casas com piscina e as segundas e as terceiras residências.
O que levou o Governo a recuar nesta matéria? por mais que se não queira não se consegue deixar de pensar na piscina de Nafarros e nas várias residências de alguns membros do Governo.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo comprometeu-se com o FMI a aceitar vergonhosas condições: a diminuição do produto nacional, a subida dos preços, os despedimentos em massa, os tectos salariais nas empresa públicas e na função pública, o ataque às empresas públicas, a suspensão dos projectos de investimento, a liquidação dos grandes projectos de desenvolvimento, a subida das taxas de juro e a continuação da desvalorização deslizante.
Trata-se quase ponto por ponto do oposto à política que é necessário fazer para a saída da crise.
A crise existe, ninguém o põe em dúvida. Mais, ninguém põe em dúvida que são necessárias medidas enérgicas e urgentes.
Mas a urgência não pode ser só ir buscar, inconstitucionalmente, aos bolsos dos portugueses que menos podem, novos milhões de contos. A grande urgência é retirar finalmente a conclusão de que a política há 7 anos prosseguida não serve e de que é necessário uma nova política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Denunciámos atrás e denunciaremos no debate o carácter demagógico e a pequena relevância financeira dos impostos que incidem sobre os chamados sinais exteriores de riqueza, mas não seremos nós que votaremos contra eles. Mais, entendemos que esses impostos poderiam apontar o caminho que se seguido com coragem, se seguido com determinação e com justiça social poderia levar a bons resultados.

Aplausos do PCP.

Esta operação de agravamento da carga fiscal, merece-nos, no entanto globalmente a mais decidida oposição constituindo um novo e incomportável sacrifício para o nosso povo, representa o prosseguimento e a consagração dos caminhos tortuosos que estão a conduzir o nosso país ao desastre. Tal é a última e determinante razão para recusarmos as urgências pedidas pelo Governo.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um protesto, o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não teria formulado este protesto à intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito, não obstante as enormidades que pontuam a sua intervenção desde a primeira à última frase, se não fosse o extremo a que chegou.
Com efeito, algumas das afirmações do Sr. Deputado Carlos Brito - do estilo desta: que a política deste Governo e do PS desfigura o regime democrático e as suas instituições- só são possíveis porque os conceitos e os critérios de democracia do Sr. Deputado Carlos Brito não são os conceitos nem os critérios de uma democracia parlamentar vigentes na doutrina democrática, e são os conceitos que, partindo do Marxismo-Leninismo, os recusam na verdade, por princípio e por filosofia.

Vozes do P5: - Muito bem!

O Orador: - Só assim se pode entender a condenação que faz do Partido Socialista e do actual Governo.

Aplausos do PS e do PSD,

Mas, Sr. Deputado Carlos Brito, como disse, apesar destas enormidades e outras do estilo - que é prosseguida uma política de desastre nacional, que se trata de um regabofe dos dinheiros para os capitalistas não teria protestado não fosse o extremo a que o Sr. Deputado Carlos Brito chegou ao atacar o Primeiro-Ministro, Secretário-Geral do Partido Socialista, por métodos deselegantes, imorais e inaceitáveis, sob todos os pontos de vista, quer de decoro quer de moralidade.
O Sr. Deputado Caros Brito, atacou-o dizendo que tem uma piscina e que tem várias residências. Mas isso só é demonstrativo de que a vida privada do Sr. Primeiro-Ministro é do conhecimento público, e de que não tem nada a esconder, ao passo que ninguém sabe qual é a residência do seu Secretário-Geral!

Aplausos do PS e do PSD.

E nem Mário Soares nem qualquer socialista tem receio de declarar os seus bens, nem tem receio dos impostos sobre os sinais exteriores de riqueza.

Vozes do PS: - Muito bem!

Uma voz do PSD: - E o Carvalhas? E o Magalhães?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para contraprotestar.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Quando o Sr. Deputado Carlos Lage estava na oposição tinha mais qualidades! Agora já nem sequer é capaz de ouvir? Eu até nem falei da política governamental; quando falei do desrespeito pelas instituições, falei da prática, e prática essa que temos tido ocasião de observar aqui na própria Assembleia da República, o que é portanto uma evidência. Queria só fazer-lhe notar isso.
O Sr. Deputado disse depois várias enormidades que resultam da má audição. Tudo que eu disse foi geralmente deturpado. Mas é um hábito, assim é mais fácil criticar! Se formos às coisas certas é difícil porque temos toda a razão nesta matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas diz o Sr. Deputado que insultei o Sr. Primeiro-Ministro, que ele não tem nenhum receio de declarar os seus bens, que não tem nenhum receio dos impostos sobre as manifestações exteriores de riqueza!
Lembro-lhe que declarei, na minha intervenção, que não iríamos votar contra todos aqueles impostos que são contra as manifestações exteriores de riqueza!
Agora diga-me o seguinte: se ele não tem medo, então vamos também ao imposto sobre a segunda e a terceira residência e vamos ao imposto sobre as casas com piscina. Ora aí está, aí está uma medida alternativa, Sr. Secretário de Estado!
Vamos a isso!

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, acho que se estamos a discutir medidas de austeridade, se estamos a discutir os sacrifícios que se pedem ao nosso povo, considero que não é nada deselegante falar dos sacrifícios que se devem pedir a quem está no Governo, ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... a quem está nos órgãos da República, a quem ocupa, digamos, os lugares do Estado! Não é nada deselegante! Isto é obrigatório, isto é necessário!
Aliás, observo que até na própria proposta de lei do Governo em relação ao imposto sobre o imposto profissional são considerados os detentores de cargos públicos, todos eles são abrangidos. Portanto, não há nenhuma deselegância. Deselegante, Sr. Deputado Carlos Lage, foi a maneira como o Sr. Deputado respondeu. Isso é que foi deselegante.
Mas vamos taxar as piscinas, vamos taxar os sinais exteriores de riqueza, e depois veremos quem é taxado e quem não é taxado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Sr. Presidente, já agora permitia a interrupção do Sr. Deputado Carlos Lage e depois concluiria.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Carlos Brito, somos favoráveis ao imposto sobre os sinais exteriores da riqueza.

O Orador: - Das piscinas também?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Das piscinas também, designadamente sobre a piscina de água aquecida que a Embaixada Soviética tem em Portugal.

Risos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Ó Sr. Deputado Carlos Lage ...!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, deixe-me falar, porque já esgotou o seu tempo.
Não vou consentir que este debate continue desta maneira. Se volta a suceder corto a palavra seja a quem for - quero que isto fique bem ciente na cabeça de todos os Srs. Deputados. E pedia ao Sr. Deputado Carlos Brito o favor de terminar o mais rapidamente possível.

O Sr. Carlos brito (PCP): - Sr. Presidente, se me permite dava uma explicação à Mesa. Permiti uma interrupção ao Sr. Deputado Carlos Lage, o que é corrente e praxe usual na Assembleia da República. Não sabia o que o Sr. Deputado Carlos Lage ia dizer, e ainda que soubesse ter-lhe-ia sempre permitido que me interrompesse porque acho que realmente é triste que o Sr. Deputado Carlos Lage ponha no mesmo pé o Sr. Primeiro-Ministro e a Embaixada da União Soviética.
Mas o que lhe digo, Sr. Deputado Carlos Lage, é que não fuja à questão. O que sugeri é que seja reposto aquilo que o Governo anunciou, isto é, o imposto sobre as segundas, as terceiras residências e sobre as residências com piscina. E acho que esse é o bom caminho. Sr. Deputado Carlos Lage, não fuja para o campo internacional, quando não é capaz de discutir o campo nacional, como geralmente acontece.

Aplausos do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não sabia que tanta gente tinha piscina!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.

Uma voz do PSD: - Olha o eco!

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O objectivo do presente debate é o carácter de urgência que o Governo pediu para as 7 propostas de lei que aqui apresentou. Todavia, da exposição aqui feita pelo Sr. Secretário de Estado pudemos apenas concluir aquilo que já constava do preâmbulo das próprias propostas, isto é, que se trata de o Governo, através delas, obter receitas para ocorrer ao défice do orçamento.
Não houve da parte do Sr. Secretário de Estado qualquer explicitação da política económica que o Governo está a pôr em prática. A única referência à política económica do Governo foi a afirmação de que um dos objectivos fundamentais do Governo é a redu-

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ção do défice. Todavia, uma afirmação destas ouvimo-la, triste e infelizmente, ser feita em 1926 por alguém que então ocupava a pasta das Finanças e isso produziu os resultados que todos nós conhecemos. Para além disso, nada ouvimos do Sr. Secretário de Estado quanto à política económica do Governo.

É evidente que sabemos qual é a política económica do Governo, mas não porque o Governo explicite quais são as linhas da sua política, e é evidente que, mesmo em relação ao orçamento e por detrás do orçamento, mesmo em relação a ele, estão opções políticas que dirigem e comandam esse mesmo orçamento.

Precisamente porque continuamos e o País continua a ignorar qual é a política do Governo, o nosso grupo parlamentar apresentou hoje 100 requerimentos sobre a aplicação das 100 faladas medidas, cuja aplicação até agora se desconhece. Apenas o Sr. Secretário de Estado acrescentou que desejaria que cada português se interrogasse sobre aquilo que pode fazer para ocorrer à situação deficitária do orçamento. Mas, Sr. Secretário de Estado, só o afastamento total das realidades da vida do nosso povo pode levar o Sr. Secretário de Estado a fazer esta afirmação.

O que cada português ... hoje se interroga é sobre aquilo que não pode fazer, sobre aquilo que cada vez menos pode fazer no nosso país como consequência da política económica que o Governo está a pôr em prática.

O processo de urgência - e era isso que estava hoje aqui em discussão- visa impedir que as propostas de lei baixem à respectiva comissão, para ela se pronunciar. Sobre isto o Sr. Secretário de Estado não apresentou nenhuma razão justificativa da pretendida urgência. E até, ao contrário da urgência que o Governo reclama, pudemos ouvir na sessão de ontem nesta Assembleia uma afirmação do Sr. Deputado Carlos Lage, da qual se conclui que no seu entender e no juízo do próprio grupo parlamentar - visto que aqui referiu que se poderiam introduzir modificações e se poderiam introduzir melhoramentos, nomeadamente na proposta de lei n.º 41/III - nada justificaria que as propostas deixassem de baixar à respectiva comissão.

Por estas razões, porque efectivamente não foram apresentadas quaisquer razões que justifiquem o pedido de urgência, porque, pelo contrário, com o pedido de urgência o Governo mais uma vez se procura subtrair a dar satisfações e explicações a esta Câmara e ao País sobre política económica - que o Sr. Secretário de Estado também aqui não trouxe -, o Grupo Parlamentar do MDP/CDE votará contra o pedido de urgência apresentado pelo Governo.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Queria pedir um esclarecimento, mas, na verdade, destina-se mais, a esse título, a também esclarecer o Sr. Deputado Raul de Castro sobre o processo de urgência e a questão da baixa à Comissão.
Não vou, naturalmente, debater o fundo da sua intervenção. Haverá oportunidade, no debate, na generalidade, de analisar as questões que coloca, mas pareceu-me entender que o Sr. Deputado lamentava que assim não se pudessem introduzir alterações nos diplomas porque não baixavam às comissões.
Ora, não é esse o entendimento nem a óptica, quer do Governo, quer do Partido Socialista. Pedimos a dispensa de baixa à Comissão para não ficarmos numa situação indefinida. A Comissão emitiria um parecer que levaria mais ou menos dias, em seguida esse parecer vinha ao Plenário e todo o processo se alongava. O que pedimos é que haja dispensa de baixa ã Comissão, dando-se a votação na especialidade no Plenário - e, por conseguinte, também se pode introduzir alterações na especialidade, no Plenário -, ou se houver consenso entre todos os grupos parlamentares, e era este o estilo de trabalho que preferíamos, constituir-se rapidamente a comissão de economia, após a votação na generalidade, e esta ainda até amanhã emitiria um parecer sobre as perguntas na especialidade.
Por conseguinte, não queremos evitar que haja propostas de alteração na especialidade, que elas possam ser discutidas e nalgum caso ser aceites. Dado este esclarecimento, penso que em grande parte a argumentação do Sr. Deputado nesta matéria fica perfeitamente sem bases no que diz respeito à possibilidade de alterar as propostas que o Governo nos apresentou.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Raul de Castro.

O Sr, Raul de Castro (MDP/CDE): - Verifico, afinal, que o que afirmei era exacto. Na realidade, e Sr. Deputado Carlos Lage entende que nas propostas do Governo importa introduzir alterações. Verifico ainda que a sua sugestão da criação de uma comissão de economia, que rapidamente se pronuncie sobre as propostas do Governo, procura impedir que a Comissão de Economia, Finanças e Plano se pronuncie sobre as propostas de lei, antes impõe a criação de uma outra comissão, que iria desempenhar uma função idêntica.
Por isso, continua a parecer-me que nesta parte- e, naturalmente, não apenas por estas razões, mas por outras que apresentei na minha intervenção - não poderemos votar favoravelmente a urgência pedida pelo Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Ministro, tenho muito gosto, como pode calcular, em o tratar nessa qualidade. Está hoje aqui nessa qualidade, é essa a qualidade que lhe foi ontem aqui atribuída pelo Dr. Almeida Santos, e é com gosto, creia, que a nossa bancada o trata nessa qualidade, como pode calcular.
A intervenção de V. Exa., Sr. Ministro, veio confirmar o teor da nossa intervenção de ontem e um dos fundamentos em que assentamos a arguição de inconstitucionalidade das propostas do Governo.
Logo ao pedir a urg8ncia para o respectivo processo legislativo o Governo sentiu necessidade de se referir ao orçamento e deu-nos explicações sobre o défice e as suas origens, a que as receitas fiscais agora procuradas irão porventura fazer face.

Foram poucas ou nenhumas, porém, as explicações sobre as alternativas para a política de agravamento fiscal decidida e para os agravamentos propostos e as razões da própria urgência não foram também claramente explanadas à Câmara.

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Admitimos que essas razões de urgência existam. A incorrecção formal com que o Governo se apresenta, porém, mais uma vez perante esta Câmara, não nos permite, como não permite, entendemos, à própria Câmara, observar devidamente a necessidade dessa urgência.

Por outro lado, a situação de verdadeiro estado de necessidade de que o Governo tão dramaticamente tem falado ao País e à Assembleia, coaduna-se mal, temos de convir, com a solução encontrada para o problema levantado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota sobre as regiões autónomas e os órgãos de soberania nacionais com os órgãos de soberania das regiões autónomas.

Então, tão grande necessidade e urgência em cobrar os impostos propostos à Câmara podem compatibilizar-se com a eventual falta de aplicação dos diplomas nas regiões autónomas?

Não compreendemos muito bem a lógica que liga estas duas posições. Por isso mesmo, Sr. Secretário de Estado, porque admitimos que haja urgência, mas achamos que o Governo não deu provas cabais dessa urgência e seguiu um processo errado ao apresentar-se perante a Câmara, nós não votaremos contra mas iremos abster-nos.

Quanto ao mais, quanto às incongruências das propostas com o sistema fiscal delineado na Constituição e quanto ao gravame que para os cidadãos contribuintes constituirão as medidas que VV. Ex.as propõem, tratarão disso os meus colegas de bancada quando nos pronunciarmos sobre o fundo da questão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procurarei ser muito breve nessa intervenção exactamente porque me parece que nós, deputados, deveríamos ter um pouco a noção da economia de tempo, por um lado, e, por outro lado, a noção política da função da Assembleia da República.
Isto, é ontem discutimos a constitucionalidade ou não dos textos que estão em apreciação, neste momento da ordem de trabalhos estamos, naturalmente e só, a discutir a urgência e a dispensa de apreciação pela comissão de especialidade. Francamente, foi neste sentido que toda a gente de boa fé tinha que entender a intervenção do Sr. Secretário de Estado. Pontificando e dando ênfase aos aspectos quantificados, vejamos, para sermos honestos connosco próprios e para com os Portugueses, o que é que está em causa.
Podemos, na fase seguinte da discussão destes textos legais, ter divergências - são salutares -, são manifestamente esperadas e naturalmente são desejadas para que cada um dos portugueses saiba o que sobre os problemas dos portugueses pensa cada um dos partidos portugueses. Mas entendemo-nos: neste momento o que interessa é, só e só, saber se se justifica ou não que se conceda urgência e dispensa de apreciação na comissão própria às propostas em análise.
Assim sendo, volto a apelar à clareza, à responsabilidade política e técnica para o seguinte: a urgência tem a ver com quê? Tem a ver., primeiro, com a necessidade que o Governo tem de cobrir o défice, fazendo incidir impostos que devem ser recolhidos ainda em 1983, com vista, claramente, a reduzi-1o. Para a fase seguinte discutiríamos as origens, as causas, etc., etc., do défice, mas agora, para analisar a urgência, é só, e só, isto o que está em questão.
A segunda, a razão para a urgência é que, como é óbvio, os textos em análise dizem que as medidas 'entram em vigor a 1 de Outubro, e temos que ter presente o que isto significa!
Outras, são razões simples, mas importantes, para a urgência. Quanto aos textos e seu conteúdo, lá chegaremos! Respeitemos e punhamos um mínimo de disciplina na discussão!
Se há quem queira - por cada vez que fala sobre este assunto- fazer imputações directas ou indirectas ao Governo, isso é outra questão, mas isso não é obedecer ao Regimento!
A outra questão tem, naturalmente, a ver com o que toda a gente sabe: é uma situação de emergência, 'vêm no Programa do Governo as medidas de emergência, e esta é uma medida de emergência!

O Sr. José Magalhães (PCP): - De qualquer maneira ...?!

O Orador: - Obviamente que não é de qualquer maneira, Sr. Deputado! Por acaso ouvi o seu aparte e dir-lhe-ei que não é de qualquer maneira porque daqui a um pouco, se formos capazes de lá chegar, vamos discutir se é ou não de qualquer maneira!

Uma voz do PCP: - É à revelia da Constituição ...?!

O Orador: - Sr. Deputado, não responderei a mais nenhum aparte porque não faço apartes na Assembleia.
Se é ou não é à revelia, já foi julgado anteriormente! Ou isto é um círculo vicioso que andamos como as pescadinhas com o rabo na boca ou com o dedinho atrás do rabo?
Portanto, isso já foi discutido, e a seguir vamos discutir outra coisa! Agora, e só, o que está em causa é a urgência. Eu pretendia apenas, exactamente na economia de tempo, fazer uma declaração em nome do meu partido, sobre o porquê da urgência, mas foi a própria evolução da discussão que me levou a intervir apelando para o bom senso de todos os depurados desta Assembleia no sentido de nos circunscrevermos ao que está em causa! E o que está em causa são, de facto, os aspectos que justificam a urgência do Governo. Por mim, e em nome do Partido Socialista, é evidente que reconhecemos urgência a estes textos. E é só. E vamos ao que importa, discutir o porquê da urgência!

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou-me cingir rigorosamente àquilo que está em discussão, ou seja, o processo de urgência que nos é pedido.
Tal como o pedido é formulado, aplica-se a regra supletiva do artigo 246.º do Regimento, com excepção da sua alínea a). Ou seja, aquilo que consta do pedido de urgência formulado pelo Governo é que, em vez

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de haver um exame em comissão pelo prazo de 5 dias, o processo respeitante a estes projectos não tenha baixa à comissão. Em tudo o resto, porque o processo de urgência é pedido, funciona a regra supletiva do artigo regimental que acabei de invocar, o artigo 246.º, e, portanto, estão fixadas as regras para o debate na generalidade, para o debate na especialidade e para a discussão de propostas de alteração.
Assim sendo, julgo que temos todos os elementos para nos podermos pronunciar sobre o assunto, e pela nossa parte diremos, com toda a simplicidade, que consideramos suficiente o tempo que o Regimento nos concede para o debate na generalidade destas propostas de lei. A distribuição de tempos que costuma ser feita em termos regimentais não nos contempla normalmente com tempos superiores e, portanto, não seria, pela nossa parte, senão uma exigência excessiva o exigir agora tempos superiores.
Em segundo lugar, temos oportunidade de apresentar propostas de alteração na especialidade e pensamos, finalmente, que obteremos uma vantagem importante em termos de discussão precisamente para um debate mais aprofundado. E que a discussão na especialidade - visto que o Governo nos pede a dispensa de baixa à comissão - terá que ser feita aqui, em Plenário.
Ou seja, vamos aqui pronunciar-nos, caso a caso, sobre cada uma das alterações propostas, sobre cada um dos artigos da proposta de lei sobre que haja propostas de alteração apresentadas.
Assim sendo, para quem advoga que este debate seja tão aprofundado quanto possível, o ser um debate travado em Plenário corresponde precisamente a este objectivo. Por tudo isto daremos o nosso voto favorável ao processo de urgência e não discutirei, neste momento, a questão suscitada há pouco a propósito das regiões autónomas, perante a qual pediria ao Sr. Presidente que logo que encerrado este debate me dê a palavra para tratar desse assunto concreto, visto que ele já foi abordado ao longo desta discussão do processo de urgência, mas não quereria infringir o pedido que o Sr. Presidente me fez, e a que correspondi, de não tratar dele neste momento.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Bom, Sr. Deputado, em relação às suas últimas palavras pensei que o número a seguir é o da votação e que poderíamos fazer a votação, o intervalo durante o escrutínio, e depois, quando entrarmos na discussão das propostas, abordava-se logo de início esse problema.
Não havendo mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vamos votar o pedido de urgência, apresentado pelo Governo, para as propostas de lei n.os 38, 39, 40, 41, 42, 43 e 44/III.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, da UEDS e da ASDI, votos contra do PCP e do MDP/CDE e as abstenções do CDS e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrou na Mesa um requerimento da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o qual irá ser lido pelo Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas):

Os deputados abaixo assinados, que são a maioria dos membros da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, considerando que esta Comissão tem pendentes de parecer diversos projectos e propostas de lei que lhe foram submetidos para esse efeito e considerando também que a Comissão recebeu muitas comunicações ,que carecem de ser encaminhadas, requerem a V. Exa., ao abrigo do disposto no artigo 57.º, n.º 1, do Regimento, que a Assembleia autorize o funcionamento da referida Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, durante o período que antecede o início do funcionamento normal desta Assembleia da República, ou seja, da presente data até 14 de Outubro próximo, inclusive, uma vez que tal se mostra indispensável ao bom funcionamento dos seus trabalhos.

Os Deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias: Margarida Salema - Fernando Afonso - Azevedo Soares - Luís Beiroco - José Sarmento Moniz - José Martins Pires - João Corregedor da Fonseca - Vilhena de Carvalho - Maria Odete Santos - Luís Saias - Beatriz Cal Brandão - João Gomes - Igrejas Caeiro - Fernando Amaral - Jorge Lacão - Agostinho Branquinho - José Magalhães - José Manuel Mendes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, esse requerimento tem cabimento ao abrigo do n.º 2 do artigo 57 º do Regimento, e se for formulado nos termos do mesmo articulado pode e deve ser despachado pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe o meu atrevimento, mas, salvo melhor opinião, o n.º 2 do artigo 57 º do Regimento diz que o Presidente pode promover a convocação de qualquer comissão para os 15 dias anteriores ao início da Sessão Legislativa, que não é o caso.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Mas, Sr. Presidente, é que a Sessão Legislativa começa no dia 15 e o requerimento é pedido precisamente para esse período: depois do dia 1 e até ao dia 15.

O Sr. Presidente: - O requerimento diz: «desde esta data até ao dia 14 de Outubro» e nós estamos a 22 de Setembro, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): - Era só para esclarecer que o requerimento se refere a um pedido de autorização de funcionamento da Comissão desde a presente data até ao dia 14. Por outro lado, o n.º 2 do ar-

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tigo 57.º do Regimento refere-se ao Presidente da Assembleia da República e não ao Presidente da Comissão.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP)- - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é para uma curta declaração de voto em relação à posição que assumimos na votação que acabámos de fazer.
O Grupo Parlamentar do PCP votou a favor do requerimento, no sentido da possibilidade de funcionamento até ao dia 15 de Outubro da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, porque pensa que com esta autorização será possível, caso a maioria não o venha a obstruir, levar a bom termo o conjunto de diligências parlamentares que o Grupo Parlamentar do PCP oportunamente propôs relativamente à Empresa Pública Notícias/Capital, a saber, a convocação do Membro do Governo responsável para a Comissão, a visita àquela empresa e os contactos com os representantes dos trabalhares e com o conselho de gerência.
Penso que este debate é necessário e ainda bem que a Assembleia da República assim o entendeu. Pensamos que agora, em comissão, o trabalho vai estar mais facilitado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora ao ponto n.º 2 da 1ª parte da ordem do dia.
Como não estamos, exactamente, na hora regulamentar do intervalo, poderíamos proceder imediatamente às eleições adiadas da sessão do dia 20 e posteriormente far-se-ia o intervalo, enquanto se realizava o escrutínio.
Conforme já referi, pedia aos senhores presidentes dos grupos parlamentares o favor de se reunirem comigo no meu gabinete.
Vamos, assim, proceder às eleições do Presidente do Conselho Nacional do Plano, para os lugares vagos do Conselho Superior de Defesa Nacional e do Conselho de Comunicação Social, adiadas da sessão do dia 20.
Vai proceder-se à chamada.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está encerrada a votação.

Aproveitaremos o intervalo regimental para se proceder ao escrutínio, sendo a sessão reaberta logo que o mesmo esteja terminado.
Está, pois, suspensa a sessão.

Eram 18 horas.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário irá proceder à leitura dos resultados das eleições.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Eleição para o lugar de Presidente do Conselho Nacional do Plano: 206 votos entrados.
O resultado da eleição é o seguinte: 136 votos a favor, 61 contra, 4 votos brancos e 4 abstenções.
Eleição para o lugar vago no Conselho Superior de Defesa Nacional: 206 votos entrados, 6 votos nulos, 6 votos brancos.
O resultado da eleição é o seguinte: José Ângelo Ferreira Correia, 121 votos a favor, 34 votos contra, 38 votos brancos e 1 abstenção; Joaquim Gomes dos Santos, 36 votos a favor, 26 votos contra e 132 votos brancos; Lino Carvalho Lima, nenhum voto a favor, 26 votos contra e 168 votos brancos.
Eleição para os lugares vagos no Conselho da Comunicação Social; 207 votos entrados.
O resultado da eleição é o seguinte: Luís Fernando Cardoso Nandim de Carvalho, 127 votos a favor, nenhum voto contra e 80 abstenções; Manuel Mendes Nobre Gusmão, 143 votos a favor, nenhum voto contra e 64 abstenções; Paulo Sacadura Cabral Portas, 133 votos a favor, nenhum voto contra e 74 abstenções.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em face dos resultados que acabaram de ouvir, não foi eleito o candidato para o Conselho Nacional do Plano, Apolinárìo José Vaz de Portugal, por não ter atingido os 138 votos necessários.
No que se refere ao Conselho Superior de Defesa Nacional não foi eleito nenhum dos candidatos, por não terem atingido o número requerido de votos.
Quanto ao Conselho de Comunicação Social, foi eleito o candidato Manuel Mendes Nobre Gusmão, não tendo sido eleitos os candidatos Luís Fernando Cardoso Nandim de Carvalho e Paulo Sacadura Cabral Portas, por não terem atingido o número necessário de votos.
Em face destes resultados, terá de proceder-se a novas eleições para os cargos que ainda não foram preenchidos, pelo que a Câmara será informada, oportunamente, da data em que essas eleições se realizarão.
Srs. Deputados, entremos agora na segunda parte da ordem do dia.
O Sr. Deputado Magalhães Mota enviou à Mesa uns ofícios sobre a eventual inconstitucionalidade destas propostas de lei e solicitou a palavra, pelo que lha vou conceder.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Há pouco, no início dos nossos trabalhos da tarde, o Sr. Secretário de Estado já teve ocasião de enunciar qual era o entendimento do Governo a este propósito. E, se cito bem, explicitou que, ao abrigo da alínea f) do artigo 229 º da Constituição, as receitas cobradas nas regiões autónomas reverteriam a favor dessas regiões e que de nenhum modo ficava excluído que as regiões autónomas, se entendessem modificar ou não aplicar sequer a cobrança destas receitas, poderiam exercer esse seu poder constitucional. Este entendimento seria, designadamente, o entendimento do Governo e para

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além deste assento constitucional, baseava-se ainda no Parecer n.º 26/78, da Comissão Constitucional.

Creio que explicitado este entendimento boa parte da questão suscitada está, naturalmente, ultrapassada.
No entanto, gostaria de salientar que o entendimento que foi tornado explicito pelo Governo ressalva, pela nossa parte, as questões levantadas.

Pensamos que o interesse das regiões está salvaguardado através deste entendimento e que, portanto, o problema que tentávamos levantar, e que tinha em vista precisamente o interesse das regiões autónomas, está naturalmente acautelado.
Em todo o caso, e em abono da interpretação que sustentámos, gostaria de dizer que o Parecer n.º 26/78, da Comissão Constitucional foi precisamente suscitado por uma impugnação, em matéria de constitucionalidade, feita pela Assembleia Regional da Madeira e que o entendimento da Comissão Constitucional se baseou, A época, na existência de estatutos provisórios.
E verdade que esse entendimento se mantém em relação à Madeira, visto que a Madeira não tem ainda estatuto definitivo, mas o entendimento da Comissão Constitucional no Parecer n.º 26/78, já não é possível em relação à Região Autónoma dos Açores, visto que aí o estatuto da região já não prevê disposição semelhante à que constava dos estatutos provisórios e que obrigaria a uma proposta das regiões no sentido da alteração.
Este é o fundamento da nossa opinião. Mas, repetindo, os interesses das regiões estão, do nosso ponto de vista, acautelados pela interpretação que o Governo formulou e tornou explícita no inicio desta intervenção.
Assim sendo, não merece objecção da nossa parte que a discussão possa prosseguir.

O Sr. Presidente: - Segundo o que já foi acordado na reunião dos lideres dos grupos parlamentares, vai proceder-se à discussão na generalidade de todas as propostas de lei que estão agendadas, que são as seguintes: proposta de lei n.º 38/III - Altera os artigos 34.º e 36.º do Decreto-Lei n.º 48 912, de 16 de Maio de 1969 (aumento da percentagem para o Estado, do imposto especial sobre jogo); proposta de lei n.º 39/III - Cria um imposto sobre boîtes, barca, night-clubs e congéneres locais nocturnos que estejam abertos depois da meia-noite; proposta de lei n.º 40/III - Fixa o imposto de saída do País; proposta de lei n.º 41/III - Cria um imposto extraordinário incidente sobre os rendimentos colectáveis sujeitos a contribuição predial, imposto de capitais e imposto profissional; proposta de lei n.º 42/III - Cria um imposto especial sobre veículos ligeiros de passageiros, motociclos de cilindrada superior a determinados limites, bar cos de receio e aeronaves; proposta de lei n.º 43/III Eleva a taxa de sisa para 15 % nas transacções de prédios urbanos ou de terrenos para construção no valor igual ou superior a 10 000 contos; proposta de lei n.º 44/III -- Altera o imposto do selo.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito da prioridade destas propostas de lei, tive já ocasião de esclarecer esta Câmara das razões que, no entender
do Governo, levaram a formular este conjunto de propostas de lei, em matéria de fiscalidade.
Não gostaria de maçar demasiado VV. Exas., mas penso, no entanto, que é imgortnnte referir novamente 3 ou 4 pontos que me parecem primordiais nesta área.
O primeiro ponto é que o endividamento do Estado Português cresceu, nos termos em que referi perante o Parlamento, em cerca de 60 milhões de contos em 1974 para 988 milhões de contos nos finais de 1982.
Vimos igualmente o peso crescente, praticamente inaceitável, dos juros da dívida pública, em matéria da receita fiscal. Repito que os juros da divida pública, mesmo no pressuposto que o Parlamento venha a tomar aqui as medidas que são solicitadas e propostas pelo Governo, representarão já, em 1984, 40 % da receita fiscal.
Portanto, tive ocasião de referir ao Parlamento as principais razões que explicam como é que o défice, previsto inicialmente para 150 milhões de contos, se nenhumas medidas vierem a ser tomadas em matéria de fiscalidade, atingirá nos finais do ano cerca de 204 milhões de contos.
Referi em particular o que se passou em matéria de imposto de transacções e da sobretaxa da importação. Na altura não citei, pelo que o faria agora, os principais desvios desfavoráveis que se verificaram na área da despesa pública. Nessa área temos, fundamentalmente, os seguintes desvios desfavoráveis: em primeiro lugar, temos necessidade de reforçar os subsídios às empresas públicas com 8 milhões de contos; temos necessidade de reforçar a segurança social com 2,6 milhões de contos; temos igualmente necessidade de reforçar o Serviço Nacional de Saúde com 4 milhões de contos; temos necessidade de reforçar os juros da divida pública, concretamente na área da divida flutuante, ou seja, dos bilhetes do Tesouro, com 10 milhões de contos; temos também, na ordem externa, de reforçar os pagamentos de dívida anteriormente contraída e que se vão vencendo ao longo de 1983, com 3,5 milhões de contos; temos também, para encerrar as contas do Fundo de Garantia de Riscos Cambieis, da atribuir uma dotação de 4 milhões de contos àquele Fundo, que é gerido pelo Banco de Portugal.
Suponho que conjugando esta enumeração de desvios desfavoráveis na área da despesa pública com aqueles outros que anteriormente foram citados na área da receita explico perante o Parlamento a razão de ser do défice, inicialmente previsto, no Orçamento Provisório para 1983.
E porque o Governo tem consciência da necessidade de travar fortemente o endividamento do Estado, sob pena de comprometer seriamente o futuro dos Portugueses, sob pena de não poder controlar no futuro 0 processo inflacionista, estas razões levaram o Governo a apresentar este conjunto de propostas de lei.
Suponho que os números que foram citados são de per si suficientes para esclarecer bem esta Câmara da necessidade absoluta que o Governo tem de conseguir que estas medidas fiscais, agora propostas, venham a ser aprovadas.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Na medida em que o Sr. Secretário de Estado se reportou à sua inter-

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venção anterior, gostaria de lhe colocar algumas questões desenvolvidas nessa altura.

Antes de mais, gostaria de lhe pedir que, tal como agora forneceu alguns números sobre as alterações, em termos de despesas - e já havia fornecido uns sobre alteração, em termos de receitas -, nos dissesse quais são as receitas previstas por cada uma das propostas de lei que estão presentes a esta Assembleia. Desde o início deste processo que temos vindo a solicitar esses elementos e até agora não nos foram fornecidos. '

Em segundo lugar, gostaria que me informasse qual a razão por que se escolheu, de acordo com os números apontados ontem pelo Sr. Ministro, um valor de 18 milhões de contos para reduzir o défice de 204 milhões. Porquê 18 milhões? Por que não havia mais impostos? Primeiro viram quais os impostos que se podiam criar e depois é que foram fazer as contas, ou fizeram primeiro as contas?
Ponho claramente esta questão porque, por uma mera e simples curiosidade e atendendo às perspectivas da evolução do produto interno bruto, reduzindo os 18 milhões de contos aos 204 que os senhores apontaram, dá 186 milhões de contos, que significa precisamente 8 % do produto interno bruto. Por mera coincidência, 8 % do produto interno bruto, que, por acaso, também aparece no acordo com o FMI: 8 % para 1983.
Por conseguinte, será que o Governo se comprometeu com o Fundo Monetário Internacional a ter um défice de 8 % do PIB e depois disse: para termos este défice precisamos de arranjar 18 milhões de contos, mas agora onde é que vamos arranjar 18 milhões de contos?

Vai para aqui, vai para aqui, vai para aqui ...! Era o que estava mais à mão, aquilo que era mais rápido de receber, etc., etc.
Por último, Sr. Secretário de Estado, julgo que quando falou nas razões do crescimento da dívida se esqueceu de um aspecto importantíssimo, que é o problema do aumento constante dos juros a pagar pelo Estado, não pelo aumento da dívida em termos de despesas que foram efectuadas pelo Estado, mas pelo aumento das taxas de juro. Pergunto: o que pensa o Governo fazer para tentar resolver esse problema?
Se o Governo não conseguir fazer nada - em termos de aumento constante das taxas de juro a que o Governo paga a dívida dos empréstimos que tem -, e a continuar neste ritmo, daqui a 2 ou 3 anos estaremos na seguinte situação: para manter determinado nível de dívida, em relação ao produto interno bruto, é necessário anular toda e qualquer outra despesa. As receitas serão para pagar parte da dívida, para os juros, e para mais nada.
Parece-me que este esquema é impossível de prolongar por muito tempo e gostaria de saber o que é que o Governo pretende fazer nesse campo.
Por último, pergunto ao Sr. Secretário de Estado 0 que é que está a ser feito em termos de se tentar controlar, eliminar, o contrabando. Qual a influência do crescimento do contrabando na redução previsível de 10 milhões de contos para o imposto de transacções?
Já agora, Sr. Secretário de Estado, relacionado com esta questão de contrabando, gostaria que explicasse ou que confirmasse aquilo que foi anunciado pelos jornais há uns tempos atrás e que é o seguinte: o Sr. Secretário de Estado fez uma visita surpresa - por acaso a televisão estava lá - a um posto fronteiriço para assistir a uma fiscalização dos camiões TIR e verifica-se que os camiões TIR, nesse dia, também por mero acaso, resolvem ficar todos do lado de lá da fronteira, do lado espanhol, a aguardar o dia seguinte, em que o Sr. Secretário de Estado já lá não estava.
Gostaria, pois, que me esclarecesse sobre esta ocorrência.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sra. Deputada Ilda Figueiredo.

A Sra. Ilda Figueiredo (PCP): - O Sr. Secretário de Estado disse haver desvios desfavoráveis quanto às despesas. Gostaria que nos desse algumas informações sobre se essas despesas já foram realizadas, se já foram concretizadas e, inclusivamente, pagas. Para quando, então, a revisão orçamental que inclua esta situação de forma a ter cobertura legal? Gostaria que informasse a Assembleia desta situação que, como bem sabe, é bastante grave. Gostaria ainda que nos esclarecesse sobre os desvios desfavoráveis das despesas no que se refere aos subsídios para empresas públicas, que espécie de subsídios são estes e se não tem em conta, no número que nos deu, o corte de investimentos que o Governo fez para o sector empresarial do Estado, creio que de 11 milhões de contos - pelo menos foi o que li nos jornais. Será que o Governo cortou 11 milhões de contos e agora precisa de mais 8 milhões? O que é que se passa? Gostaria que nos desse um esclarecimento sobre esta situação.
Também em relação aos desvios desfavoráveis nas despesas, seria bom que nos dissesse algo mais sobre os números que indicou da segurança social e do próprio Serviço Nacional de Saúde.
Em relação aos impostos, tanto o Sr. Secretário de Estado como, ontem, o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, Almeida Santos, nada disseram sobre o montante de cada um desses impostos, apesar de, por diversas vezes, termos solicitado informação. Inclusivamente cada proposta de lei devia indicar o montante que o Governo pensa vir a receber com cada um desses impostos. Fizemos alguns cálculos, aliás, ontem referimos alguns números e hoje certamente iremos continuar a apontar outros; no entanto, como o número global ontem apresentado pelo Sr. Ministro Almeida Santos não coincide com os números e com as contas que fizemos no seu montante global, e como o Sr. Ministro Almeida Santos quando aqui falou ontem no imposto de saída para o estrangeiro disse que o seu montante seria muito elevado, não consigo entender e por isso gostaria que o Sr. Secretário de Estado desse já uma informação sobre isto. Sendo de 2,8 % o aumento do imposto profissional, aumento esse que os trabalhadores terão de suportar durante 10 meses sobre os seus rendimentos, se tal imposto vier a ser aprovado e indo 0 seu montante para cerca de 17 milhões de contos, como é que então esse imposto da saúde é muito elevado?
Gostaria, pois, que o Sr. Secretário de Estado nos desse uma informação sobre isso porque há aqui algumas imprecisões bastante graves que não nos permitem entender o que é que se passa em relação às intenções do Governo sobre a manutenção ou não do

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imposto de saída para o estrangeiro e sobre o montante global efectivo que o Governo pretende recolher com estes impostos tão gravosos para o povo português.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Secretário de Estado, o debate em curso coloca dois tipos de questões: um primeiro grupo ligado com a situação orçamental do País e um outro relacionado com os meios necessários para enfrentar essa situação. Cingir-me-ei a este segundo aspecto: o dos meios.
Nós acusámos o Governo - e sustentamos isso ainda hoje- de seguir um processo inconstitucional para rever o orçamento do Estado em vigor.
Ora, ontem foi aqui lida pelo Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares aquilo a que ele chamou uma «pequena compilação de leis - creio que nos últimos tempos foram aprovadas e que são manifestamente retroactivas - dizia -, compilação que, segundo ele, serviria também para dar exemplos de criação de impostos fora do orçamento». E concluía, «que nunca ninguém defendeu, que soubesse, que só no orçamento se podia criar impostos».
Na altura objectámos e importava hoje colocar o Sr. Secretário de Estado também perante os exemplos que foram então aduzidos. E esses exemplos são infelizes, como certamente reconhecerá.
O primeiro exemplo é o do artigo 27.º do Decreto-lei n.º 75-A/78, de 26 de Abril, que cria adicionais sobre vários impostos. Esse decreto-lei não está fora do orçamento, Sr. Secretário de Estado - como certamente se lembra -, porque é o próprio decreto orçamental, a execução da Lei n.º 20/78.
O segundo exemplo dado aqui ontem - e mal! é o do Decreto-Lei n.º 201-A/79, de 30 de junho, que cria um imposto extraordinário sabre os rendimentos colectáveis sujeitos a contribuição industrial e predial. Trata-se realmente de um adicional, e o decreto-lei citado é, mais uma vez, como certamente também se lembra, o decreto orçamental, a execução da lei do OGE desse ano, a Lei n.º 21-A/79.
O terceiro exemplo é o do Decreto-Lei n.º 183-A/80, de 9 de lanho, que cria também um adicional sobre o imposto complementar, secção A, e que, ao contrário do que foi dito, nem é retroactivo nem está fora do orçamento. O decreto-lei referido é o próprio decreto orçamental - mais uma vez, já é azar! de 1980, no artigo 32 º, a execução da Lei n.º 8-A/80, de 26 de Maio.
O quarto exemplo é tão infeliz como os anteriores. O Decreto-Lei n.º 374/81, de 31 de Dezembro, que cria um imposto extraordinário sobre as despesas de representação, deslocação e outras despesas das empresas. Como também se lembra é um decreto orçamental, mais uma vez, de 1981, a execução da Lei n.º 40/81, de 31 de Dezembro.
Sendo assim e sabendo perfeitamente o Sr. Secretário de Estado que a não inscrição das receitas ocasiona a insusceptibilidade da sua cobrança, pergunto-lhe por que é que o Governo, sabendo de tudo isto, insistiu em percorrer um caminho que pode criar dificuldades terríveis às nossas finanças e que não é solúvel através do processo ontem aqui anunciado, ou seja, uma revisão posterior: impostos primeiro, revisão depois. E um procedimento que não é conhecido no nosso direita orçamental, embora o Governo, que tem tanta imaginação, possa inovar muito. Infelizmente não há cobertura constitucional para esse procedimento! ...
Por isso pergunto por que é que o Governo insistiu num expediente destes, que pode acarretar situações de litígio com o fisco, em que jogam, como o Sr. Secretário de Estado sabe, desigualdades muito grandes, em que os contribuintes não estão em posição igual, em que os contribuintes que têm o acesso a meios de defesa se defendem obviamente melhor do que aqueles outros, designadamente os que são atingidos pela retenção na fonte. Por que é que o Governo enveredou por esta via, que é inconstitucional, e ainda por cima se arrisca a ser ineficaz?
Esta era a pergunta que fizemos ontem, a qual não vimos respondida. Gostaríamos, pois, de ouvir a sua opinião sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sra. Deputada Zita Seabra.

A Sra. Zita Seabra (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, têmo-lo ouvido referir que um dos défices no orçamento é no Ministério dos Assuntos Sociais, seja no Serviço Nacional de Saúde - assim chamado -, seja no sector da segurança social. Gostaríamos de ter mais alguns elementos sobre isto.
E sabido que este ano não houve alterações substanciais em matéria de serviços de saúde: não houve benefícios adicionais para a população. P sabido que o próprio aumento que houve para os trabalhadores da Saúde estava previsto no próprio orçamento. Então porquê este buraco de mais de 4 milhões de contos no Ministério dos Assuntos Sociais? Creio, Sr. Secretário de Estado, que sabemos a razão disso. Essa razão está em quando b Governo nos pede alternativas para tapar os buracos do défice. Tem aí um excelente exemplo de quais são as alternativas do PCP, porque neste caso se trata claramente de uma questão de prioridade política.
O que mais aumentou as despesas públicas foi o pagamento às convenções privadas, nomeadamente raios X e análises - e não só! -, o pagamento dos medicamentos e os lucros fabulosos que as multinacionais continuam, sem haver por parte do Estado nenhum controle, sem haver nenhuma medida, a vir buscar diariamente ao nosso país.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Pelos nossos cálculos, só no ano passado anda à volta de 20 milhões de contos a verba que saiu do Ministério dos Assuntos Sociais para pagar medicamentos. E possível, sem haver degradação nos serviços públicos, até pelo contrário, reduzir substancialmente essa verba se tomarmos medidas que países bem mais ricos do que o nosso estão a tomar. Temos o exemplo da Inglaterra, que introduziu o sistema da unidose e do concurso público para os hospitais na compra de medicamentos em Janeiro, exactamente para a inflação anual não atingir essa compra - dou apenas estes 2 exemplos porque não tenho muito tempo.
Pelo contrário, nós continuamos, nesse campo, na lei da selva total: enquanto as multinacionais vêm buscar ao nosso país o dinheiro que querem, os tra-

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balhadores portugueses lá terão de pagar os impostos que aí vêm. O ano passado foram cerca de 20 milhões e até hoje não vimos nenhuma medida tomada nesse campo, nem por parte do anterior Governo nem por parte do actual. Continuamos, pois, com a situação de, quando precisamos de comprar 4 pastilhas, termos de comprar 60. E é o Estado que, através da comparticipação que faz, paga; ao fim e ao cabo, somos todos nós que continuamos a deixar sair rios de dinheiros dos cofres do Estado.

Há uma política alternativa a esse buraco de 4 milhões de contos no Ministério dos Assuntos Sociais se houvesse vontade política de servir o povo e se não houvesse vontade política de estar ao serviço das grandes convenções, dos radiologistas, dos analistas e das multinacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas eu gostaria de obter esses números no concreto, para saber exactamente onde foram gastos esses 4 milhões de contos, uma vez que não se vêem medidas que tenham sido tomadas que motivem o aumento das despesas, a não ser no campo concreto que refen.
Para encurtar, porque tenho pouco tempo, diria que os K's foram aumentados em todos os sentidos. Foram aumentados nos pagamentos das radiologias e análises ao sector privado e foi aumentado o número de Ws que, por análise, E estabelecido para o pagamento de um serviço público de saúde ao sector privado.
No campo da segurança social, o Sr. Secretário de Estado - ou Sr. Ministro em exercício- diz que há um défice de 2,6 milhões de contos. Mas, Sr. Ministro em exercício, ou, antes, Sr. Secretário de Estado, também não houve durante este ano nenhum aumento dos benefícios sociais no campo da segurança social. O aumento das reformas foi feito o ano passado. Então o que é que há? Uma diminuição das receitas na segurança social, isto é, um aumento da dívida do patronato na cobrança das suas prestações? Um aumento do desemprego, e portanto ha menos trabalhadores a descontar para a Previdência?
E sabido que o orçamento da segurança social tem receitas próprias, receitas essas que advêm no fundamental das cobranças aos trabalhadores e entidades patronais. Sc não vimos nenhum aumento dos benefícios, se os reformados não foram aumentados, se os outros benefícios sociais para os trabalhadores não foram mexidos durante este ano, o que há é um aumento das despesas, e, por outro lado, uma diminuição da cobrança de receitas ao patronato. Em quê e em que sector?
Sr. Secretário de Estado, há um aumento maior da divida do patronato? Que medidas estão a ser tomadas nesse sentido? Também aí há alternativas. E uma questão clara e nítida de opção política por parte deste governo. Simplesmente este governo, em vez de enfrentar as multinacionais e os seus lucros, as convenções dos radiologistas e analistas, as convenções das clinicas privadas, em vez de enfrentar o patronato que foge ao pagamento das dívidas à Previdência - o patronato que cada vez mais e se serve do dinheiro da Previdência para o seu autofinanciamento -,lança um imposto sobre o 13 º mês dos trabalhadores, que, esses sim, é que vão pagar as consequências desta crise, vão descontar para os lucros das multinacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Uma voz do CDS: - Tanta ignorância!

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, camaradas meus já lhe fizeram perguntas de natureza mudo geral. Aliás, eu próprio, hoje, quando o Sr. Secretário de Estado interveio, tive ocasião de fazer algumas perguntas de natureza muito geral.
Queria agora fazer-lhe uma pergunta de natureza muito concreta e que se prende com interesses e dúvidas das pessoas que pertencem ao círculo eleitoral por que fui eleito, que me acabam de ser comunicadas. Refiro-me à proposta de lei n.º 40/III, que cria o chamado imposto de saída.
Como os Srs. Membros do Governo sabem, este imposto está a provocar grande inquietação e grande efervescência nas zonas fronteiriças, o que, aliás, se compreende dada a natureza do que está escrito na proposta de lei do. Governo.
Acabo de receber notícias de Vila Real de Santo António de que há grande inquietação na vila e que os comerciantes sentem-se gravemente ameaçados. Inclusive, a autarquia já teve ocasião de reunir e considera que o comércio será gravemente atingido, assim como o turismo e até a exportação de marisco. Este imposto, ainda que de algum ponto de vista fosse benéfico, teria efeitos contraditórios porque também iria agir, agravando-a, sobre a própria balança de transacções correntes, porque, apesar de tudo, o marisco que se exporta não é assim tão-pouco. Entretanto, fala-se lá também de retaliações da parte das autoridades espanholas.
Quero, pois, perguntar ao Sr. Secretário de Estado e aos Srs. Membros do Governo se este imposto se aplica às regiões fronteiriças e. de que forma, se e Governo avaliou o que é a vida nessas regiões e de que forma é que essa vida normal e corrente vai ser perturbada, profundamente perturbada, se um imposto como este entrar em vigor.
Era, pois, esta a pergunta que queria deixar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, as palavras de V. Exa. fazem-me crer que o Governa tem, acima de tudo, uma perspectiva de gestão meramente contabilística do orçamento. Aliás, nas suas palavras há, de certo modo, uma renúncia à discussão da despesa pública.
Sobre este aspecto, aliás, vou reflectir mais adiante numa intervenção que irei fazer e limito-me a este comentário. Neste momento gostaria de fazer ao Sr. Secretário de Estado 4 simples perguntas.
Em primeiro lugar: dos 8 milhões de contos que referiu relativamente às empresas públicas, quais são as empresas públicas em causal
Em segundo lugar e no que se refere aos 2,6 milhões de contos em défice na segurança social, gostaria de fazer 2 perguntas muito concretas: primeira, se

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esse défice contempla já a continuação da política de actualização das pensões que, como sabe, nos governos da Aliança Democrática foi operada em Dezembro de cada ano; segunda, se esse défice tem a sua origem na diminuição de receitas, portanto de cobranças para a segurança social. Faço esta pergunta porque recordo que em 8 de ]unho, quando saí da Secretaria de Estado da Segurança Social, o aumento das receitas no período de Janeiro a Maio de 1983, comparado com o período homólogo de 1982, era de 23 %, exactamente o previsto no orçamento. Dá a sensação de que, eventualmente, terá havido uma diminuição, bastante brusca e súbita, das receitas para a segurança social.
Em terceiro lugar, gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado se houve um procedimento análogo ao do ano passado no que se refere ao duodécimo de Dezembro. Recordo que o duodécimo de Dezembro, designadamente para gastos mais supérfluos ou menos essenciais, foi cortado e suspenso de maneira a produzir uma diminuição das despesas finais da conta geral do Estado.
Em último lugar, e talvez apenas como sintoma da política de certo modo incoerente no tratamento da despesa pública por parte do Governo, gostaria de ter um comentário do Sr. Secretário de Estado relativamente a um despacho no Diário da República, 2.º série, de hoje mesmo, 22 de Setembro, do Sr. Ministro do Equipamento Social, que requisite, ao abrigo de determinada legislação, que me escuso de ler, à Sojornal um técnico que «auferirá - e passo a citar o vencimento correspondente à letra C (assessor) dos quadros do funcionalismo público, sendo-lhe ainda atribuída a importância mensal de 54 000$ a titulo de ajudas de custo».

Vozes do CDS: - Eh!

Uma voz do CDS: - Isto nem lembra ao diabo!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Em primeiro lugar e no que respeita ao esclarecimento e elucidação que pretendeu fazer a esta Assembleia em matéria de crescimento da despesa, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento referiu concretamente o sector da saúde. Perguntar-lhe-ia que influência é que teve nesta contribuição do sector da saúde para o défice a abolição das taxas moderadoras, que teve lugar no inicio do exercício do governo PS/PSD.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, e no que respeita às transferências pelas empresas publicas, repetiria a pergunta feita pelo meu colega de bancada Bagão Félix e acrescentaria mais: que empresas e com que finalidades? Despesas de investimento ou despesas de exploração corrente?
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, no que respeita à receita, pergunto-lhe que medidas é que foram delineadas e implementadas com a diminuição da receita no que respeita ao imposto de transacções, designadamente para evitar as fraudes crescentes no domínio do imposto de transacções.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - No que respeite às questões levantadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, passarei a indicar, relativamente a cada uma das propostas de lei em discussão, aquilo que o Governo pensa que pode vir a ser arrecadado.
Em relação ao imposto do selo, admite-se que é possível arrecadar, em 3 meses, 3 milhões de contos; em relação ao imposto sobre automóveis, barcos e aeronaves, 200 000 contos; em relação ao imposto sobre bares, boîtes ou night-clubs, 200 000 contos; em relação à taxa de salda, 1 milhão de contos; em relação ao imposto especial de. jogo, 200 000 contos; em relação à sisa, 300 000 contos; em relação ao imposto extraordinário sobre os rendimentos, 12,5 milhões de contos.

Risos do PCP.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Paga Zé!

O Orador: - A outra questão que foi levantada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira tinha a ver com 0 objectivo que o Governo tem de que o défice do Orçamento do Estada venha a representar uma determinada percentagem do PIB. E de facto verdade que temos em mente reduzir o défice no Orçamento do Estado para 8 % do PIB, em 1983, e para 6,2 %6,3 %, em 1984. Isso é de facto verdade.
No que respeita a medidas tomadas para fazer face ao contrabando, o que posso dizer ao Sr. Deputado Octávio Teixeira é que têm vindo a ser tomadas mais recentemente e com algum êxito. Devo dizer que na área, quer dos contentores, quer dos TIRs temos ultimamente alcançado resultados.
Referiu uma situação concreta num tipo de fiscalização que se tentou lançar. Posso a esse respeito esclarecê-lo que a Radiotelevisão Portuguesa tinha pedido concretamente ao Governo que quando houvesse uma operação de combate ao contrabando pudesse acompanhar a operação. A Radiotelevisão Portuguesa foi avisada nessa noite, quase diria de madrugada, de que ia haver uma operação e que estivesse disponível, se a quisesse acompanhar. Não sabia para onde ia, não sabia exactamente que tipo de operação é que ia fazer.
E mais: posso dizer ao Sr. Deputado que eu próprio, quando me apresentei no Comando-Geral da Guarda Fiscal, às 6 horas e 30 minutos da manhã, não sabia exactamente se ia para Norte se para Sul. O que pode explicar o facto é que o primeiro TIR que foi interceptado, já cerca das 7 horas e 30 minutos, 8 horas da manhã, era um TIR que tinha rádio. Admito, como hipótese, que tenha feito alguma comunicação. O que lhe posso também dizer é que os 2 TIRs que foram apanhados imediatamente a seguir não tinham rádio. É a hipótese que posso encontrar. De facto não consigo encontrar nenhuma outra.
A Sra. Deputada Ilda Figueiredo referiu-se fundamentalmente à revisão orçamental e perguntou se as despesas já tinham ou não sido feitas e se tinham ou não cobertura legal. É verdade que algumas despesas foram feitas, mas sob a forma de antecipação de duodécimos, os de Dezembro e de Novembro, o que significa, portanto, que, se não vier a ser tomada alguma

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medida nesta área, se não for dado reforço, os problemas surgem em Dezembro ou em Novembro.

A dotação orçamental, como um todo, não foi excedida; assistiu-se, isso sim, nalguns tipos, designadamente na área da saúde, a uma antecipação de duodécimos.

No que respeita às empresas públicas, concretamente no caso da QUIMIGAL, posso adiantar que já foi dado, sob a forma de uma operação de tesouraria, um subsídio, mas que tem de ser regularizada até ao final do ano, ao abrigo da alínea h) do artigo 164 º da Constituição, de resto, do limite que foi fixado pela Assembleia da República. Ao abrigo da alínea h) do artigo 164 º da Constituição há, de facto, um limite para a realização de operações de tesouraria, e com efeito já à Quimigal, concretamente, foi feita uma operação de tesouraria que tem de vir a ser regularizada por força do reforço que lhe vier a ser dado.

A situação põe-se também na área dos transportes, designadamente na área da Companhia Portuguesa dos Caminhos de Ferro e, eventualmente, na área da CNP e da TAP. Uma parte desses subsídios destina-se, em última análise, a habilitar estas empresas a honrar compromissos de ordem externa, que se não vierem a ser honrados são de molde a comprometer seriamente a credibilidade da República, que não pode, de modo nenhum, vir a ser afectada, como bem compreenderá.

No que concerne às questões levantadas quanto ao Serviço Nacional de Saúde e quanto à segurança social, o que posso avançar neste momento é que, em relação ao Serviço Nacional de Saúde, o reforço que se pretende tem de algum modo a ver com o facto de a elevação das taxas e quotizações do Fundo de Desemprego, que deveriam ter sido praticadas a partir de 1 de Janeiro de 1983, só entrarem em vigor no mês de ]unho de 1983, se a memória não me falha. Isto significa, portanto, que as transferências que estavam previstas do Gabinete de Gestão do Fundo de Desemprego para o Serviço Nacional de Saúde perderam-se. Perderam-se, na prática, todas as transferências respeitantes à maior parte do 1 º semestre do ano. Daí que o Serviço Nacional de Saúde tenha tido necessidade de antecipar duodécimos para poder honrar os seus compromissos. Daí este pedido de reforço para colmatar as deficiências que há fatalmente no mês de Dezembro.
No que concerne à segurança social, como sabe o orçamento da segurança social é aprovado pela Assembleia - trata-se de um orçamento autónomo do Orçamento Geral do Estado-, mas, tanto quanto estou informado, julgo que houve uma pequena quebra, uma pequena quebra talvez de um ponto, um ponto e pico, no ritmo de cobranças de receitas. Suponho que o aumento das cobranças situa-se entre os 21 % e os 22 % e teria sido orçado os 23 %. Gostaria que tomasse esta informação com alguma reserva, mas, tanto quanto julgo saber, foi isto que se passou. O ritmo de cobranças está a ser ligeiramente menor: um ponto, um ponto e meio, relativamente àquilo que estava previsto.
No que concerne à intervenção avançada pelo Sr. Deputado José Magalhães, posso avançar que o Governo de facto tem necessidade de apresentar à Assembleia da República um orçamento suplementar. Simplesmente, para que possa efectivamente apresentar esse orçamento suplementar, tem absoluta necessidade de contar com receitas. Se agora não tomasse a medida de, com prioridade e urgência, solicitar à Assembleia da República a aprovação de um pacote de medidas na área da fiscalidade - e repare que o imposto do selo, a sisa, etc., são impostos em que há interesse em que comecem a ser cobrados o mais rapidamente possível -, o Governo, até finais de Agosto ou princípios de Setembro, não tinha materialmente hipótese de preparar a revisão orçamental e, simultaneamente, depois, conseguir preparar as coisas de modo a que estes impostos começassem a partir de 1 de Outubro.
Pode o Sr. Deputado ficar certo de que até finais de Outubro terá nesta Assembleia um orçamento complementar do orçamento provisório aprovado pela Lei n.º 2/83.
No entanto, penso que as explicações que aqui foram dadas quanto às aplicações que vão ser dadas ao produto destes impostos que o Governo pretende que a Assembleia venha a criar ficarão de algum modo satisfeitas ao saber o destino que vai ser dado a estas receitas.
Suponho que as questões levantadas pela Sra. Deputada Zita Seabra já estarão satisfeitas, pelo menos parcialmente, na área da segurança social, naquilo que já foi avançado relativamente às questões expostas pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
O Sr. Deputado Carlos Brito referiu-se à questão de o imposto de saída estar a levantar problemas em algumas zonas fronteiriças. Ora, o Governo tem neste momento consciência disso e está aberto a aceitar - e nesse sentido já temos dialogado com alguns grupos parlamentares - propostas alternativas nesta área. Assim, se as entradas e saídas que se fizessem, por exemplo, num prazo de 72 horas ficassem isentas deste imposto, suponho que isso daria satisfação e permitiria evitar o tipo de inconvenientes que se apontaram nesta Câmara.
Relativamente às questões apontadas pelo Sr. Deputado Bagão Félix a propósito dos subsídios a empresas públicas, suponho já ter respondido por aquilo que avancei anteriormente, assim como o que concerne ao período de reforço que tem a ver com a segurança social.
Em relação à actualização de pensões, devo dizer que esta matéria está neste momento em estudo, mas, oportunamente, o Governo tomará posição em relação a ela.
Finalmente, o Sr. Deputado Nogueira de Brito voltou a levantar a questão das empresas públicas, que penso, de algum modo, já estar respondida.
Levantou também o problema da taxa moderadora, mas, tanto quanto é possível, a informação que temos do Ministério das Finanças e do Plano é a de que a alteração da taxa moderadora, nos termos em que foi feita, tem um efeito, digamos, risível, em termos da despesa pública.
Referiu-se ainda ao problema do imposto de transacções, mas o que neste momento posso citar é que a taxa do aumento de receitas do imposto de transacções em 1982 foi da ordem dos 16 %, se a memória não me falha. Até finais de Julho de 1983 a taxa era da ordem dos 24,6 % ou dos 24,8 %, portanto, cerca de 25 %.
No governo anterior, designadamente através do Decreto-Lei n.º 399/82, foram tomadas medidas bastante fortes no sentido de aliviar evasões na área do imposto de transacções. Ora, suponho que parte do

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resultado das medidas então tomadas se começou a fazer sentir ao longo da cobrança de 1983.
Desculpem-me o termo, Srs. Deputados, mas creio ser extremamente violento que perante uma situação de evasão fiscal a fiscalização tenha a possibilidade legal de, imediatamente, sem uma ordem de um juiz, poder apreender um conjunto de bens que seja de molde a garantir o pagamento do imposto e das multas que sejam aplicadas. Penso, pois, que ir mais longe do que isto é já uma medida suficientemente forte para criar um forte desincentivo aos próprios fiscais. Para além disso têm vindo a ser tomadas outras medidas. Tem-se intensificado a fiscalização e, eventualmente, estamos a pensar noutro tipo de medidas.
Contudo, pensamos que neste momento será muito difícil alterar mais o imposto de transacções, porque, se tudo correr de harmonia com o Programa do Governo, em 1 de Janeiro de 1985 esse imposto será substituído pelo imposto de valor acrescentado.
Ainda nesta área do imposto de transacções poderei adiantar que algumas medidas foram de certo modo tomadas para aliviar a evasão. Refiro-me, por exemplo, às que foram tomadas no sentido de fazer recuar para as alfândegas a cobrança do imposto de transacções, um pouco contra a sua filosofia, no caso das bebidas espirituosas - whisky, vodka -, no caso do café, dos electrodomésticos, etc. Portanto, algumas dessa medidas foram tomadas com êxito, segundo supomos, porque começou a notar-se um crescimento da receita do imposto de transacções.
Consideramos que há evasão, sentimos que é necessário, combatê-la, estamos fortemente decididos a combatê-la e a empregar todos os meios para o fazer, mas, apesar de tudo, supomos que neste momento será realmente aceitável uma taxa de 25 %.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, o meu protesto tem vários sentidos. O primeiro deles relaciona-se com o facto de ser necessário estar - e permitam-me a expressão- a «sacar», como se saca uma rolha, para ir tirando número atrás de número. Se estivéssemos aqui uma semana com este sistema talvez ficássemos esclarecidos sobre as questões numéricas.
O segundo protesto que desejo formular é em relação a uma informação ontem prestada nesta Assembleia pelo Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, Almeida Santos. Quando um camarada meu referiu o valor previsível de cobrança resultante da imposição dos rendimentos sujeitos a imposto profissional, o Sr. Ministro disse:

Ei tanto! Alias, nem é essa a verba principal onde nós pensamos ir buscar receitas. Há outras em que prevemos receitas superiores.

Ora, embora não esteja discriminado o total de receitas que incidem sobre os rendimentos, temos a certeza de que os 12,5 milhões de contos são essencialmente previstos para o imposto profissional. Não vimos nenhuma outra verba que se aproxime sequer desta.

O terceiro sentido do meu protesto é o seguinte: mais uma vez é referida a questão da apresentação pelo Governo do Orçamento Geral do Estado para 1984 no dia 17 de Outubro, por que o dia 15 calha num dia de fim-de-semana, dizendo que, finalmente, há um governo que vai cumprir os prazos constitucionais.
Mas, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, como é que um governo pode prever vir a apresentar no dia 17 de Outubro um orçamento a esta Assembleia sem que haja uma lei de enquadramento do orçamento? Afinal, vai apresentar um orçamento e não sabe que orçamento deve apresentar? Ou é o Governo que decide por si próprio qual deve ser a lei de enquadramento que posteriormente os deputados hão-de aprovar nesta Assembleia?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, se assim o desejar.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Deputado Octávio Teixeira, se o imposto de saída for aplicado tal como vem previsto na proposta do Governo, é o imposto de saída que poderá render 18 milhões de contos - este é o aumento que se estima para as saídas das fronteiras portuguesas. Contudo, é evidente que é difícil de dizer neste momento a composição, porque é um imposto em que se previ uma taxa para adultos e uma taxa para menores.
No entanto, se ele fosse aplicado totalmente como está na proposta de lei do Governo, e partindo do princípio que são predominantemente adultos, este é um imposto que pode efectivamente render 17 ou 18 milhões de contos por ano.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, mas então o Governo apresenta uma proposta de lei e quando prevê a receita previsível parte do
princípio de que não vai ser cumprida? Isso não pode ser!

O Orador: - Sr. Deputado, não se trata de nada disso, mas sim de fazer uma estimativa prudente. Quando estamos a 2 ou 3 meses do final do ano não é agradável agarrar numa estimativa desse tipo. Fomos muito prudentes ao fazer a estimativa, até porque partimos do princípio de que o grande movimento à saída das fronteiras se processa durante os primeiros 9 meses do ano.
Não é um imposto que se possa dizer que se destina uniformemente ao longo do ano. Portanto, o Governo quis ser prudente na sua estimativa do que poderia arrecadar deste tipo de imposto. Assim, considera que numa base anual poderá dar uns 17 ou 18 milhões de contos.

A Sra. Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

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O Orador: - Faça favor.

A Sra. Ilda (Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, ontem o Sr. Ministro Almeida Santos afirmou aqui - aliás, numa questão que lhe coloquei sobre este assunto - que se este imposto não estava referido na proposta de lei, deveria estar porque essa era a ideia do Governo, e que este imposto era muito limitado para não pôr em causa o princípio da livre circulação de pessoas, nomeadamente quanto à questão da integração de Portugal na CEE.
Ora, face à resposta agora dada pelo Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber se, afinal, o estudo que se fez sobre o assunto foi tendo em conta a continuação deste imposto para o próximo ano - daí a sua base anual -, ou foi, como disse ontem o Sr. Ministro Almeida Santos, pensando apenas nestes 3 meses e num espaço muito limitado de tempo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sra. Deputada, este imposto - eventualmente como outros impostos que temos, como, por exemplo, a taxa de importação -, é um imposto que, de facto, com a adesão à CEE, terá de desaparecer. No entanto, o Governo pensa que ele vigorará apenas durante o período de emergência da economia.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): Então são 3 milhões de contos!

O Orador. - O período de emergência é de 18 meses, ou seja, pelo menos durante o resto do ano de 1983 e o ano de 1984.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu-se igualmente à lei do enquadramento. Ora, nós temos neste momento em vigor uma lei do enquadramento e o Governo pensa retocá-la, alterá-la. Mas, de algum modo, o que o Governo se comprometeu é a apresentar à Assembleia da República o Orçamento para 1984 nos termos da Constituição, tal como a lei determina, e isso será apresentado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Tem que haver uma nova lei!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por esta interrupção, mas V. Exa. consentiu-me e ela parece-me ser positiva neste momento, pois a questão que colocámos é óbvia e não obtivemos resposta.
Houve uma alteração constitucional, o Orçamento do Governo perde substanciais poderes em matéria orçamental e a Assembleia vê acrescidos os seus. Ora, a proposta de lei do orçamento do Estado deixa de ser o documento que era anteriormente e passa a ser acrescentado larguissimamente. Importa até medir em que dimensão é que esse alargamento se faz. Esta é, pois, uma questão fundamental. O texto que o Governo vai apresentar tem a ver com os textos anteriores como o pequeníssimo tem a ver com o grande. É um texto totalmente diferente, larguíssimo.
Portanto, precisamos de discutir em primeiro lugar a revisão da Lei do Enquadramento, para o Governo, depois, poder conformar o seu trabalho à exigência que a Assembleia lhe formule. A não ser que o Governo já entenda o seguinte: vamos obrigar a Assembleia a calçar sapato n.º 34, e não mais do que isso, logo mandar-lhe-ei já para esse formato que imagino um documento assim modulado. No entanto, nós não concebemos que isso seja possível.
Nesse sentido, até nos intrigou a referência do Sr. Ministro Almeida Santos de que o Governo cumpriria pela primeira vez esse seu dever de apresentar atempadamente a proposta. E isto, porque não está definido que proposta é que o Governo vai apresentar. E profundamente intrigante.

O Orador: - Sr. Deputado, o que eu lhe posso garantir é que o Governo vai apresentar a proposta até ao dia 17 de Outubro, proposta essa que esteja de acordo com os preceitos constitucionais. Assim, esta Câmara terá que se pronunciar sobre isso, a menos que ela se proponha a que o Governo não cumpra os prazos e, nessa altura, terá que assumir as suas responsabilidades.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Apesar das grandes dificuldades que persistem no saneamento das finanças públicas e das medidas económicas que se impõem, o Programa do IX Governo Constitucional era, à partida, particularmente modesto e defensivo na definição das grandes linhas da política orçamental e fiscal que se propunha a seguir.
Tal facto fazia desde logo antever que o Governo, neste campo de acção e para além das generalidades expressas no seu Programa, não assumia uma política fiscal coerente e global, antes se pressentindo que iria agir ao saber dos momentos e numa visão estritamente contabilística de «tapa-buracos».
Não será, pois, surpreendente que, perante dificuldades orçamentais o Governo reaja, inventando impostos (diga-se de passagem, com pouca imaginação) que atinjam os milhões de contos necessários àquilo que o Governo considera necessário para colmatar parcialmente os défices.

É assim que ao longo destes primeiros 100 dias de governo, longe das promessas eleitorais e escondendo-se no generalismo do seu Programa, o Governo acciona a tributação retroactiva e inconstitucional dos lucros, cria condições para sobrecarregar as empresas, já de si depauperadas, com a incongruente e injusta taxa municipal de transportes e, finalmente, envia à Assembleia da República um conjunto de propostas fiscais que irão agravar as condições de vida de muitos portugueses e a viabilidade já precária de muitas empresas.
Para além dos aspectos jurídico-constitucionais já focados aqui pelo meu colega de bancada António Xavier aquando da discussão da impugnabilidade das referidas propostas governamentais, o CDS não pode

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23 DE SETEMBRO DE 1983

deixar de referir outros aspectos essenciais que justificam a sua frontal discordância.

As propostas do Governo são tecnicamente insólitas e isentas de ética fiscal. Em primeiro lugar, acentua-se claramente o divórcio entre a política fiscal e orçamental do Governo. Dá a sensação que só há um caminho para a contenção do défice do Estado: aumentar cada vez mais a carga fiscal, ignorando-se completamente as despesas públicas.

O Governo não explica ao País - e só agora o faz de uma maneira apressada - as despesas que excederam as previsões orçamentais ou as receitas que tiveram uma execução inferior à prevista.

Apresentando as propostas completamente desligadas da discussão das despesas do Estado, o Governo tenta evitar uma discussão global da política orçamental, o que nos leva a admitir que para o Executivo as despesas são um dado do problema e não uma variável sobre a qual há que agir. Em contrapartida, mesmo durante estes 3 meses, assistiu-se à criação de novos serviços públicos quase todos desnecessários, ou injustificados, ou, pelo menos, pouco oportunos no tempo presente (por exemplo: a passagem de 3 Secretarias de Estado para o Porto, a criação do Ministério da Saúde, com todos os serviços que arrasta necessariamente, a criação - ainda que só no papel - da Alta Autoridade contra a corrupção, a implementação da Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos, etc.).

O Governo renuncia assim e claramente à discussão da despesa pública. Os Portugueses e, em particular, os contribuintes mais sacrificados continuarão até à exaustão a financiar um Estado macrocéfalo, que crescentemente se multiplica e invade funções que muitas vezes a sociedade civil melhor desenvolve.

A situação geral da economia do nosso pais, Srs. Deputados, impõe muito mais e prioritariamente a necessidade de racionalizar e reduzir despesas para aliviar os impostos em vez de sistematicamente se aumentarem indiscriminadamente os impostos para financiar o crescimento vegetativo das despesas e a assunção de novos e injustificados encargos pelo Estado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Gradar: - A austeridade passa, a nosso ver, de modo indiscutível pela cedência de terreno por parte do Estado na sociedade e na economia.
1: difícil justificar o rigor quando o Estado passa mais ou menos incólume e quando se procura muito mais aumentar as receitas do que pôr em causa as despesas públicas.

Vozes do C(r)«DS: - Muito bem!

O Orador: - E também difícil justificar a austeridade quando não se discute a gratuitidade universal de certos bens e serviços que, não distinguindo ricos e pobres, obriga a colectividade a transferir para aqueles a utilização de recursos sociais a um preço inferior ao custo que esses mesmos recursos representam para a sociedade.
Igualmente, não se compreende a desarticulação entre as medidas propostas ao Parlamento e aspectos essenciais da política geral, o que também evidencia a incoerência global da política fiscal deste governo.

Enquanto se aprova recentemente, num dos últimos Conselhos de Ministros, um conjunto de diplomas relativos ao turismo, diminuem-se as receitas a favor do fundo de turismo.

Enquanto se diz querer relançar a indústria da construção civil e promover a dinamização da procura e oferta de habitação, agrava-se a sisa.
Enquanto se anunciam as excelentes relações com a Espanha e se reafirma a profissão de fé na Comunidade Económica Europeia, cria-se uma taxa inibidora da livre circulação das pessoas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Enquanto se ignora o enquadramento fiscal da função pública em termos globais e justos, promove-se, desde já, um imposto extraordinário sobre os funcionários públicos.
Enquanto se anulam taxas moderadoras na saúde e se desacelera a política de firmeza na cobrança das contribuições para a segurança social, agravam-se os impostos sobre os rendimentos do trabalho. Mas também as propostas fiscais, pondo de parte a parcela populista de algumas delas (designadamente as relacionadas com os chamados sinais exteriores de vida, mas que poucas receitas como acabámos de ver, irão dar ao erário público), enfermam de graves distorções em termos do universo abrangido, distorcendo, a nosso ver, os mecanismos da solidariedade de que o Governo tanto fala. E que são sempre os mesmos rendimentos das mesmas pessoas, designadamente o trabalho por conta de outrem, a constituir a principal parcela do sacrifício exigido pelo Executivo, em vez de se dinamizar com mais determinação e com mais coerência o combate à evasão e fraude fiscais, de maneira a que os que não pagam impostos comecem a pagar para os que pagam comecem a pagar menos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, nem sequer se cria um espírito mobilizador que pudesse proporcionar uma adesão dos Portugueses ao combate à crise. Bem pelo contrário, os novos impostos serão, apenas, encarados com um roubo ou uma rapina do Estado, como um factor de injustiça social e também como um rude golpe na solidariedade enfaticamente definida pelo Governo com um dos pilares do seu programa político. Perde, assim, sentido uma das orientações que o Governo traçou no seu Programa é que passo a citar: «defender em especial os direitos dos que trabalham».
De igual modo o Governo parece ignorar que a nossa carga fiscal atingiu já limites insuportáveis e incompatíveis com as necessidades sócio-económicas do nosso pais.
E não se procura argumentar, sequer, que o nosso coeficiente fiscal ainda é dos mais baixos do continente europeu. É que não nos podemos esquecer dos factores determinantes do nosso nível de tributação, como seja o baixo nível de desenvolvimento económico, o deficiente grau de abertura da economia ao exterior, a desequilibrada composição do produto interno bruto e, acima de tudo, o baixíssimo grau de tributação do sector primário da economia.
Dai que os cidadãos que normalmente são tributados desenvolvam um esforço fiscal maior, sendo, em conse-

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quência, também bastante menor o excesso de rendimento disponível por habitante após a satisfação das necessidades de subsistência para tributação ou outros fins.

Por sua vez as taxas marginais de tributação, ou seja, o quociente entre as variações absolutas das receitas fiscais e do produto interno bruto, e que fornece, aliás, uma ideia da proporção do aumento do produto que é transferido para o sector público através da tributação, vai, assim, aumentar fortemente, de modo a financiar apenas um estado mais gastador, mais ineficiente, mais improdutivo, por um lado, e a retirar o estímulo à iniciativa e ao progresso por parte do sector privado, por outro. Com este novo agravamento fiscal, o Governo acaba de contrariar frontalmente uma das traves mestras que inscreveu no seu Programa: a defesa da moralidade e o combate imediato e prioritário à fraude e sobre os quais afirmou que se se não sabe onde acaba que ao menos se saiba onde começais. A fraude e a evasão começam muitas vezes também pelos excessos de impostos e pela carga fiscal excessiva.

A serem aprovadas estas propostas, estão criadas mais algumas condições para a evasão e fraudes fiscais, através da crescente clandestinização da nossa economia e da nossa sociedade.

Perante elevadas cargas fiscais, está suficientemente provado o princípio de que o imposto come sempre o imposto, na medida em que faz diminuir as actividades sobre o qual incide, pelo que bem seria mais adequado e justo procurar aumentar as receitas fiscais pelo desagravamento de certos impostos, como bem fez a Aliança Democrática no que se refere ao imposto complementar.

O aumento brutal dos impostos é muito mais um convite ao seu não pagamento do que à sua liquidação.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Finalmente, gostaria de me referir a um dos aspectos mais preocupantes e graves que estão subjacentes às propostas governamentais. Nenhuma visibilidade de esperança se prescruta para além das medidas gravosas que vêm sistematicamente a tomar-se e a de que o aumento dos impostos é o último exemplo. Dá a sensação que, apenas, se administra a ideia de austeridade pela austeridade, quase uma austeridade conventual, como um mero exercício tecnocrático e contábil. Não se procura, com convicção, atacar as verdadeiras causas estruturais da crise. Aplicar um antibiótico apenas pela observação dos sintomas sem cuidar das causas da doença pode produzir algumas melhoras a curto prazo, mas não evita certamente a recaída.
Em Portugal é indiscutível que na origem das dificuldades por que passa o País estão fundamentalmente razões de ordem estrutural, pelo que o ataque à crise terá de passar por medidas de estrutura e modificativas, das quais a não menos importante tem a ver com o peso excessivo do Estado na vida económica e social do País.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isto o CDS repudia frontalmente este ataque fiscal do Governo porque não tem sentido ético, porque é impeditivo do progresso e inibidor da iniciativa, porque fomenta a clandestinidade e a fraude, porque separa o fosso entre o Estado e o cidadão, desmobilizando-o para o combate à crise, porque é factor de renúncia da discussão da despesa pública. É tempo de nos consciencializarmos colectivamente que a austeridade e o rigor não são apenas e prioritariamente, Srs. Deputados, uma factura pedida pelo Estado ao cidadão indefeso.

E, acima de tudo, uma exigência da sociedade para com o Estado.

Aplausos do CDS

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em boa verdade deveria ter posto à votação desta Câmara um requerimento, formulado pelo PS e pelo PSD, que traduz o acordo que foi obtido na reunião dos grupos parlamentares e que nos permitiu estar a trabalhar até esta hora, dado que previa a prorrogação da sessão até às 20 horas e 30 minutos.

Contudo, embora eu o tenha anunciado tardiamente, creio que ele deverá ser votado.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade

Vamos, portanto, Srs. Deputados, encerrar a sessão.

Amanhã ela terá início às 10 horas, com a continuação da discussão e votação dos diplomas que estão a ser debatidos.

A sessão, de acordo com o que foi decidido pelos grupos parlamentares, prolongar-se-á até à votação final destes diplomas.

Entretanto, devo anunciar que deu entrada na Mesa, e foi admitido, o pedido de sujeição a ratificação n.º 55/II, do Sr. Deputado Silva Graça e outros, do PCP, sobre o Decreto-Lei n.º 341/83, de 21 de julho, que determina o modelo orçamental e contabilístico das autarquias locais.

Srs. Deputados, resta-me solicitar-lhes pontualidade amanhã, a fim de não termos de prolongar os nossos trabalhos pelo dia fora.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 35 minutos.

Declaração de voto do deputado António Gonzalez (Indep.), publicada ao abrigo do n.º 3 do artigo 124º do Regimento.

O deputado do Movimento Ecologista Português (Partido «Os Verdes») votou favoravelmente todos os votos de protestos apresentados ao Plenário da Assembleia da República.
Em relação ao caso do jumbo sul-coreano, apesar de termos dado o nosso voto favorável (justificado pela morte de seres humanos inocentes), salientamos que continuam a existir sérias dúvidas quanto às responsabilidades da administração Reagan no acidente. Estranha-se, nomeadamente, que, apesar dos sofisticados sistemas de voo e de controle aéreo actualmente existentes (radar, satélite e navegação), o desvio do avião tenha sido tão grande. Tão responsável é quem carrega no gatilho, como quem prepara a encenação e utiliza civis como cobertura para

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actos que visam obter informações de carácter estratégico-militar.
Quanto ao caso de Timor-Leste, onde morrem civis indefesos mês após mês, é repugnante pensar que existem países que protegem a Indonésia na prática de genocídio e impedem a acção internacional contra ela. O mesmo se poderá dizer à repressão contra o povo negro sul-africano.
Assim, e finalizando o nosso voto contra tais factos, a nossa condenação total vai não só contra as consequências, mas sim contra a causa que as provoca, ou seja, o espírito belicista que advoga soluções armamentistas para a resolução dos problemas mundiais.
A corrida aos armamentos, o equilíbrio (desequilíbrio) do terror, a paz controlada sob a sombra dos canhões ou dos mísseis, gerará incidentes sobre incidentes.

A Redactora, Ana Maria Marques da Cruz.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Fernando José da Costa.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
José Ângelo Ferreira Correia.

Partido Comunista Português (PCP):

Francisco Miguel Duarte.
José Manuel Santos Magalhães.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Alberto Manuel Avelino.
António Cândido Miranda Macedo.
António Jorge Mammerickx Trindade.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Narciso Rodrigues Miranda.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Nelson Pereira Ramos.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Adérito Manuel Soares Campos.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
Cecília Pita Catarino.
Fernando José Alves Figueiredo.
Jorge Nélio P. Ferraz Mendonça.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Mariana Santos Calhau Perdigão.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jaime dos Santos Serra.

Centro Democrático Social (CDS):

António Gomes de Pinho.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
João António de Morais Silva Leitão.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Tomás Rebelo Espírito Santo.

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