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24 DE SETEMBRO DE1983

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Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se o problema se pode considerar geral, não quer dizer que não implique da nossa parte uma tomada de posição. O que precisamos, neste momento, é de reflectir sobre aquilo que pode e deve ser o papel do Estado em Portugal, no Portugal de hoje, com os nossos recursos, com as nossas condições e capacidades. Temos que pensar que, no tempo moderno, no tempo que é o nosso e um pouco por toda n parte, o Estado herdou numerosas tarefas, as mais heterogéneas, tornando-se às vezes difícil saber onde começa, onde acaba, até onde pára; foi submergido pelo seu próprio crescimento incontrolado e por isso a sua acção se dilui e a sua capacidade de decisão se esvai.
Creio que há cada vez menos comunidades de solidariedade diferentes do Estado: a família entrou em crise ou se retraiu, as pequenas empresas foram absorvidas pelos grandes grupos, os meios rurais foram-se desertificando, sem que os novos espaços urbanos assumissem as suas funções. E de tudo isto nós somos herdeiros, tudo isto temos de enfrentar.
E por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a grande interrogação que este debate nos coloca, pelo menos em começo, é a de saber que tipo de Estado queremos, um Estado que, como pretendem alguns, se reduza ao conjunto liberal do aparelho que nos protege das invasões do inimigo, dos acidentes de estrada, dos assaltos e dos roubos, ou, pelo contrário, um Estado capaz de garantir a interiorização de valores e de modelos, harmonizado da vida associativa, fruto de convergência de iniciativas comunitárias e, ao mesmo tempo, garantia da sua liberdade de experimentar e de criar. Um Estado criador, também ele, de modelos culturais e de projectos, capaz de fornecer objectivos e de galvanizar energias cívicas.
Este é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o desafio que enfrentamos. E não é indiferente para nenhum de nós que seja precisamente o problema do Estado o que se coloca, neste momento, com mais acuidade aqueles que se encontram nos sectores ideológicos do socialismo democrático e da social-democracia. É por isso que, perante estas propostas de lei, faremos uma apreciação caso a caso, tomando posição sobre cada uma delas, porque consideramos que o problema global com que nos defrontamos ultrapassa em muito o destes aspectos em discussão.
Não queríamos deixar de situar este debate no terreno que é propriamente o seu, de modo que esta análise não deixe de ser feita e para que fique clarificada a nossa posição, a de um pequeno grupo que tem consciência dos desafios que se colocam a uma coligação de que não fazemos parte, mas que, muito antes do seu início oficial, apoiámos e sempre procurámos que se concretizasse.

Vozes da ASDI: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: De forma inédita na história orçamental do País um Governo
apresenta à Assembleia da República propostas de lei com incidência directa na alteração do orçamento, sem que para tanto apresente uma proposta de lei de revisão orçamental, como o exigem as mais elementares regras constitucionais e orçamentais.
O orçamento elaborado pela AD, na perspectiva da política económica e orçamental de um Governo de direita, continua a satisfazer, ao menos na generalidade, o Governo liderado pelo PS. As alterações avulsas que o Governo de Mário Soares lhe vem introduzindo, ao arrepio da Constituição da República, não lhe alteram a filosofia, antes aprofundam as suas orientações mais gravosas: redução das despesas de incidência social e agravamento da injustiça fiscal, de qualquer modo sempre em prejuízo das classes trabalhadoras e dos estratos populacionais mais desfavorecidos.
O Governo tonta justificar a apresentação das propostas de lei em debate com a profundidade da crise económica e financeira do País. O Governo critica os deputados da oposição por não concederem o seu assentimento - activo ou passivo - à rápida votação das propostas, de qualquer forma sem informação, sem debate. A propalada crise económica e financeira vem servindo ao Governo PS/PSD de argumento para aumentos brutais dos preços de bens e serviços de primeira necessidade, para o aumento dos despedimentos e do desemprego, para a redução drástica dos salários reais, para a estagnação e recessão económica. Mas crise económica e financeira que o Governo e a maioria governamental se recusaram a discutir em toda a profundidade e complexidade no debate do Programa do Governo e que continuam a recusar agora, com a obstrução à inclusão na agenda de trabalhos desta Assembleia da interpelação apresentada pelo PCP.

Vozes do PCP. - Muito bem!

O Orador:- Anteontem o Sr. Ministro de Estado, aludindo à não apresentação de uma adequada proposta de revisão orçamental, fez uma importante revelação: o Governo não apresentou tal proposta porque «não está em condições» de o fazer
É de pasmar! O Governo quer alterar o orçamento das despesas, propõe a criação de novos impostos e o agravamento de outros, para obter receitas que diz ter quantificadas, e não tem «condições» para alterar os quadros anexos ao Orçamento Geral do Estado? E intrigante! A aceitarmos tal desculpa, seríamos forçosamente levados a concluir que, quando propõe alterações de despesas, o Governo não faz a mínima ideia dos ministérios em que tais alterações se vão produzir, nem das classes funcionais que irão ser afectadas. Que quando propõe, como agora, um pacote fiscal, não teve a mínima ideia do volume de receitas que dele adviriam se fosse levado à prática. Que, afinal, o Governo não teria ideia certa de qual é o défice orçamental previsível para 1983. É um absurdo. Tal desculpa, porque de mera desculpa de mau pagador se trata, não pode ser aceite. O próprio Ministro Almeida Santos o mostrou, ao afirmar que o défice orçamental actualmente previsto é da ordem dos 204 milhões de contos - mera desculpa, como igualmente o confirma o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Não, Sr. Ministro e Srs. Deputados! A não apresentação de uma proposta de revisão orçamental, tal como a recusa do debate sobre a situação económica