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I Série - Número 48

Sexta-feira, 18 de Novembro de 1983

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE NOVEMBRO DE 1983

Presidente: Exmo. Sr. José Rodrigues Vitoriano

Secretários: Exmos. Srs.

Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 31, 34, 35, 36, 37, 38 e 39 do Diário.
Deu-se conta do expediente da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado João Paulo Oliveira (UEDS), criticou a actuação do Governo no sector da comunicação social, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) e João Amaral (PCP) e a protestos feitos pelos Srs. Deputados José Vitorino e Silva Marques (PSD).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Dias Lourenço (PCP) depois de ter criticado a política do Governo, referiu-se à situação dos trabalhadores da Metalúrgica Duarte Ferreira.

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 93/III, do CDS -Lei de Bases da Segurança Social-, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social (Amândio de Azevedo) e da Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Leonor Beleza), os Srs. Deputados Bagão Félix (CDS), - que fez a apresentação do projecto-, Zita Seabra (PCP), Morais Leitão e Gomes de Pinho (CDS), César Oliveira (UEDS), Luís Barbosa (CDS), Carlos Brito (PCP), Marques Mendes (PSD), Álvaro Brasileiro (PCP), Carlos Lage (PS), Narana Coissoró e Nogueira de Brito (CDS), Vidigal Amaro (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), João Amaral (PCP) e Handel de Oliveira (PS).

O Sr. Presidente, encerrou a sessão eram 23 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
Aníbal Coelho da Costa.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José dos Santos Meira.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.

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Carlos Justino Luís Cordeiro.
Custódio das Neves Lopes Ramos.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo.
Ferdinando Lourenço de Gouveia.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco José Fernandes Leal.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João do Nascimento Gama Guerra
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José António Borja S. dos Reis Borges.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Filipe Pessoa Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Luísa Modas Daniel.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
César Augusto Vila Franca.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Ferreira Campos.
José Augusto dos Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.

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Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Comes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Zita Maria de Seabra Roseira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João António de Morais Silva Leitão.
João Carlos Dias M. Coutinho de Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte de Góes.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Tomás Rebelo Espírito Santo.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

ntónio César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
João Paulo Oliveira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os Diários n.ºs 31, 34, 35, 36, 37, 38 e 39, respeitantes às reuniões plenárias de 23 de Setembro e 17, 18, 20, 21, 24 e 25 de Outubro, e n.ºs 32 e 33, respeitantes às actas das reuniões da Comissão Permanente de 6 e 13 de Outubro findo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não será talvez, até pelo facto de neste momento no Plenário não haver deputados em número suficiente, a melhor altura para colocar a questão que quero levantar. No entanto, como há muito tempo que gostaria de a colocar, faço-o neste momento: é que eu entendo que a aprovação dos Diários da Assembleia da República não cabe, tal como tem acontecido até agora, no expediente e, portanto, no período de antes da ordem do dia, mas na primeira parte do período da ordem do dia, tal como o Regimento prevê, ou seja, naquela parte onde são discutidas e deliberadas todas as questões que não cabem na segunda parte da ordem do dia.
Gostaria, pois, que esta ideia ficasse registada, para além de me parecer que neste momento não há condições para um debate na Assembleia sobre esta ou qualquer outra questão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, não serei eu que lhe direi que não tem razão. Só que até hoje a aprovação dos Diários sempre se fez no período de antes da ordem do dia. Penso, no entanto, que isto pode e deve alterar-se, pelo que transmitirei a sua observação ao Sr. Presidente da Assembleia da República - isto para além de ficar registada - para que, eventualmente, sejam tomadas medidas no sentido de a aprovação dos Diários ser feita na primeira parte da ordem do dia, de acordo com a sua sugestão.
Não havendo mais observações, consideram-se aprovados.
Vai ser lido o expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente

Exposição

De reclusos do Estabelecimento Prisional Regional de Leiria que, tendo tomado conhecimento através dos meios de comunicação social, de que vai ser apresentado um novo projecto de lei de amnistia, solicitam a aprovação do mesmo, de forma a que possam ser também beneficiados.

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II SERIE NUMERO 48

Da comissão de trabalhadores da MESSA, a enviar cópia de uma decisão tomada em plenário de trabalhadores realizado em 2 do corrente, na qual dão nota da manutenção e agravamento dos problemas da empresa.
Da comissão sindical da empresa do Banco Borges & Irmãos, zona norte, a remeter cópia do voto de protesto relativamente ao imposto extraordinário de 2,8 % sobre os rendimentos sujeitos a imposto profissional, desde Janeiro a Setembro de 1983 inclusive.
Da Câmara Municipal de Guimarães solicitando que, antes de aprovada na especialidade, a proposta de lei quadro da criação de municípios seja distribuída pelas autarquias do país, a fim de ser analisada e criticada.
Da Assembleia Municipal de Loures, a enviar uma moção relativa à situação dos vidreiros da Marinha Grande, aos quais manifesta a sua solidariedade.
Da Junta de Freguesia de Vimieiro a enviar um documento relativo aos projectos de decreto-lei de finanças locais e de competências em matéria de investimentos.
Da Assembleia de Freguesia de Fermentões, concelho de Guimarães, enviando uma moção, na qual se manifesta contra a criação do concelho de Vizela.
Da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional, solicitando a ratificação de convenções da OIT.
Da Junta de Freguesia da Damaia, concelho da Amadora, a enviar uma moção na qual se manifesta contra os Decretos-Leis nº 330/81 e 392/82, sobre arrendamentos comerciais, cuja revogação solicitam.

Da Associação Industrial de Águeda, organismo intersectorial representativo de 300 empresas daquela região, alertando para a grave situação em que se encontra grande número de pequenas e médias empresas em virtude da acumulação de dívidas a essas empresas por parte do Estado, autarquias, organismos oficiais e similares.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes: na reunião do dia 10 de Novembro de 1983, ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; aos Ministérios da Agricultura, Florestas e Alimentação e do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Gomes de Oliveira; aos Ministérios da Educação e do Equipamento Social, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Manuel Fontes Orvalho; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado José Vidigal; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Barral; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelos Srs. Deputados Margarida Tengarrinha e Carlos Brito; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Abílio Curto, Manuel Laranjeira Vaz e Margarida Marques, respectivamente; ao Governo, no total de 309, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; na reunião de 14 de Novembro de 1983, ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação e à Secretaria de Estado do Planeamento, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Luís Monteiro; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado João de AImeida Eliseu; na reunião de 15 de Novembro de 1983,ao Ministério do Comércio e Turismo, formulado pelo Sr. Deputado César Oliveira; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado José de Almeida Valente: ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e Rocha de Almeida, respectivamente; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Mota, e ao Governo e aos Ministérios do Mar e do Trabalho e Segurança Social, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado António Rebelo de Sousa.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Joaquim Santos e Jorge Lemos, na sessão de 23 de Junho; António Lacerda, na sessão de 12 de julho; Bento Elísio de Azevedó, na sessão de 14 de julho; Magalhães Mota, nas sessões de 15 de Julho, 14 e 16 de Setembro e nas reuniões da Comissão Permanente dos dias 27 de Julho e 8 de Setembro; Carlos Espadinha, nas sessões de 16 e 23 de Setembro; José da Cunha e Sá, na sessão de 20 de Setembro; José Tengarrinha, Raul de Castro e João Corregedor da Fonseca, na sessão de 22 de Setembro; Anselmo Aníbal, na sessão de 8 de Agosto; Carlos Brito, Joaquim Miranda e Margarida Tengarrinha, na sessão de 4 de Julho; Magalhães Mota, na sessão de 14 de Setembro e na reunião da Comissão Permanente do dia 8 de Setembro, e José Tengarrinha, Raul de Castro e João Corregedor da Fonseca, na sessão de 22 de Setembro.

Tomou, entretanto, lugar na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se a assistir à reunião plenária, numa das galerias, uma turma do 10 º ano do ensino complementar do Colégio O Novo Académico, acompanhada da respectiva professora. Estes alunos estão aqui presentes para ver como funcionam os nossos trabalhos.

Aplausos do PS e do PSD.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo de Oliveira.

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 6 meses passados sobre a posse do IX Governo, é oportuno apreciar a política seguida na comunicação social. Oportuno e urgente, dada a situação, em alguns casos já dramáticos, e em todos eles grave, dos meios dë . informação estatizados, e a consequente degradação que o exercício da profissão de jornalista atingiu em Portugal.
Existirá, antes do mais, uma política de comunicação social? Nós dizemos que não. E dizemos também que o facto de ela não existir é mais grave do que a existência de uma política porventura errada. A sua ausência traduz-se no improviso, na gestão conjuntural, no ecletismo, e desemboca em situações degradadas, imorais, antidemocráticas e destruidoras.
Como chegar a conclusões tão severas? Os exemplos estão à vista, e outros, parece, se avizinham. No entanto, o Governo tem compromissos programáticos a honrar; e vai sendo tempo de o Partido Socialista, maioritário nesta Câmara e no Governo, lutar pelas medidas que propôs ao eleitorado e pelas expectativas que nele legitimamente criou.

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Nesta ordem de ideias, é paradigmático o caso da ANOP. Pouparei os Srs. Deputados à reprodução das violentas e justas críticas lançadas nesta Câmara e fora dela, pela oposição, em particular o PS contra o último Governo da AD, por motivo desse espantoso monumento à prepotência, à ilegalidade, à imoralidade, ao cinismo e à desfaçatez que foi a tentativa da extinção da ANOP; trata-se de passado recente na memória de todos. Cuidemos de saber em que ponto vai o trágico folhetim.

Vai o Governo na terceira ideia para resolver o caso, nenhuma delas contemplando a viabilização da agência, conforme, aliás, o PS se propusera e a moral exigia. Gorada a proposta de se manterem as duas agências, a ANOP e a NP, e também a da fusão, por recusa da última, trabalha agora o Governo na criação de uma terceira. Entretanto, sucederam-se factos tão insuportáveis como a dependência que o Governo estabeleceu, para os trabalhadores da ANOP, entre a aceitação da fusão e o pagamento de salários em atraso; como a sucessiva prorrogação de prazos concedidos à NP para aceitação da fusão, numa tentativa óbvia de salvar uma empresa com a qual os seus inventores almejavam manipular a informação e que nasceu rodeada de graves irregularidades, patentes num parecer da Procuradoria-Geral da República. Vem a propósito estranhar e condenar a circunstância de o director-geral da informação, que exorbitou dos seus poderes na assinatura do contrato entre o Estado e a NP, continuar no desempenho das mesmas funções, como que sugerindo que a impunidade está bem e recomenda-se.

O Sr. César Oliveira (UEDS): -Muito bem

O Orador: -Hoje, o Governo propõe-se criar a Portugal Press, absorvendo todos os trabalhadores da NP e lançando no desemprego grande parte dos da ANOP, cujos salários estão novamente atrasados e que não foi contemplado no orçamento suplementar.

O meu partido opõe-se a esta pretensa solução. A solução do caso ANOP consiste, como temos dito, na sua viabilização, com a salvaguarda de interesses legítimos, entretanto criados na NP.

A sucessiva substituição de projectos, o prejuízo, em termos de informação, que tal indefinição vem acarretando, designadamente na quebra do fluxo noticioso dos países africanos de expressão oficial portuguesa e das regiões autónomas, a degradação das condições de trabalho com o inevitável corolário de traumatismos psicológicos graves, mesmo fatais, os sucessivos bloqueios levantados ao cabal desempenho da missão cometida à agência estatizada, não abonam, convenhamos, a existência de uma política de comunicação social, salvo se por tal se entender o privilégio para a indecisão nociva, a incapacidade de enfrentar o obseuro jogo de interesses privados em que a NP se enreda, a demissão da defesa do sector público. Demissão, aliás, bem patente na escandalosa prática adoptada pelos órgãos da informação do Estado de indirectamente financiarem jornais privados -através da prestação de serviços eternamente por pagar- os quais, de modo igualmente escandaloso, obtêm na banca créditos de todos desproporcionados com o seu património que, muitas vezes, se resume a meia dúzia de mesas, cadeiras e máquinas de escrever.

Com igual severidade, temos de qualificar a atitude governamental perante a EPNC e a EPDP. Num caso, o Governo ataca forte e feio declarando a empresa erra situação económica difícil; no outro, já hesita entre assumir o ónus político de medida idêntica e a imposição aos gestores de uma reestruturação - se é possível reestruturar isoladamente os órgãos de comunicação social do Estado -, ao mesmo tempo que não facilita apoio de tesouraria. Estão, por exemplo, seriamente comprometidos os salários deste mês, no Diário Popular. Em ambos os casos, o mesmo denominador: a degradação acelerada das situações, com prejuízos óbvios para os trabalhadores e para o País.

O Sr. César Oliveira (UEDS): -Muito bem!

O Orador: - Eis 3 exemplos proeminentes de um quadro onde abundam gestões caóticas, onde os órgãos de comunicação social se transformaram em agências de emprego partidário, sobretudo no sector de serviços, onde as ópticas de gestão são impróprias do objecto gerido, indo, quantas vezes, a prioridade do investimento para a alcatifa em prejuízo da reportagem.

Dir-se-á que aos sucessivos Governos posteriores ao 25 de Abril se podem assacar as mesmas críticas. É verdade; mas ao actual Governo não se pode consentir que persista no trilhar de caminhos comprovadamente lesivos do desenvolvimento democrático do País. O Governo tem de assumir a realidade insofismável que é a dos custos sociais da informação, e não pode abrigar-se no sofisma de que a independência dos órgãos pertencentes ao Estado implica o deixá-los entregues à sua sorte, porque o Governo não é o Estado, e mal vaio Executivo que ao menos não se dispõe a resistir à tentação de buscar, em troca da viabilização dos jornais, alguma forma de vassalagem.

Reestruturar os órgãos de comunicação social, criar condições para a sua gestão equilibrada e racional - desígnio incompatível com a procura de gestores como entre vizinhos se pergunta por uma mulher-a-dias ou segundo critérios preferencialmente partidários, e também com a manutenção dos que se excedem em incompetência - é uma coisa, e urgente; submetê-los ao fetichismo do equilíbrio financeiro, é negar-lhes a sua peculiar relevância social, sempre reconhecida em comoventes palavras, é impedi-los de desempenhar a sua missão, é degradar as condições profissionais e de vida dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é só, porém, no domínio puramente empresarial que a ausência de uma política de comunicação social nos suscita as mais fundas preocupações e nos leva a reclamar uma radical mudança; no prolongamento da indefinição reinante, estamos assistindo ao espectáculo indecoroso de serem os núcleos de base dos partidos governamentais a decidir da orientação editorial e de cargos de responsabilidade. Os últimos sucessos na RDP -onde, aliás, não existe objectivamente conselho de gerência - e na RTP, são prova concludente do delírio de partidarização que tem caracterizado os comportamentos governamentais nos últimos anos e que. o actual Governo, em vez de combater, pelo menos consente.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Que tal esquema se traduza na manipulação informativa, não espanta; que o Governo não suspeite de que o controle, por este meio obtido, da comunicação social significa, para a opinião pública, que o Governo é fraco, é incompreensível; que um ministro telefone para as redacções a reclamar repórteres para os seus actos propagandísticos e se queixe ao superior do jornalista quando não fica contente, é inadmissível.

O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Muito bem!

O Orador: - Os normativos constitucionais e o próprio Programa do Governo erguem-se, indignados, contra tal estado de coisas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que fica dito, conjugado com o baixo nível de salários, dá origem a reflexos de autodefesa que agravam a degradação profissional dos jornalistas. Se a estes se deve exigir o cumprimento rigoroso dos seus deveres deontológicos, não se pode estranhar que, perante a promoção da incompetência e o aplauso aos serventuários com a implícita sugestão correlativa de que é do lado do poder que se defende o emprego, não se pode estranhar - dizia -, condenando-se embora, que existam jornalistas corruptos, nem que em tais condições proliferem os duplos empregos incompatíveis, acoitados em fundações, em agências publicitárias, em gabinetes de empresa, na recuperação de um quadro que se desejou definitivamente banido com o 25 de Abril.

O Sr. César de Oliveira(UEDS): -Muito bem

O Orador: - A comunicação social do Estado eucontra-se, por ausência de uma correcta política sujeita aos princípios constitucionais - o «programa dos programas», como se lê no Programa do Governo- em fase de apodrecimento. Situação perigosa que deve ser travada e invertida, mas que nada indicia o venha a ser.
O Governo diz reger-se, em matéria de informação, pela noção de interesse público, noção que é subjectiva, quantas vezes medida pela do interesse privado, sempre fluida e pranhe de ignomínias que a História regista. Nós preferimos outra noção, cujo conteúdo real não se compadece com estrangulamentos financeiros dos órgãos de comunicação social nem com os decorrentes atropelos ao direito de informar e ser informado. O que está em causa é, sempre, em última análise, a liberdade. A noção que preferimos foi, aliás, defendida nesta Câmara pelo Sr. Ministro Almeida Santos, por estas palavras:

Quanto a isto de liberdades, ou são mesmo liberdades ou, então, não se compreende que possa haver excepções.

Corremos o risco de que as excepções, afinal se transformem em regra.
No seu programa, o Governo sublinha o papel relevante do sector público da comunicação social. O meu partido apreciaria que o Governo provasse, com coerência e vontade política, que se revê, realmente nesse princípio.

Aplausos da UEDS, do PCP, do MDP/CDE e dos Srs. Deputados do PS Raúl Rego e Acácio Barreiros.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado João Paulo de Oliveira, ouvi atentamente a sua importante comunicação que diz respeito a um dos mais graves problemas com que nos debatemos. Sabemos que ainda há dias o Sr. Secretário de Estado-Adjunto do Ministro de Estado Anselmo Rodrigues disse, na Comissão de Assuntos Constitucionais, que a política de informação não podia ser dissociada da política de emprego. Sendo assim, o Governo prevê para os órgãos de comunicação social o desemprego.
Sr. Deputado, a propósito da Lei de Imprensa, sabemos que a proposta governamental, que está agora a ser tornada pública, prevê, por exemplo, «limitar os poderes dos conselhos de redacção nos órgãos de comunicação social estatizados». Sabemos que no regime anterior ao 25 de Abril os conselhos de redacção eram proibidos; contudo, depois do 25 de Abril, a velha aspiração dos jornalistas foi concretizada. Gostaria de saber qual é, pois, a sua opinião sobre esta limitação que o Governo pretende impor novamente.
Ainda em relação à Lei de Imprensa, ela ataca claramente o sigilo dos jornalistas que até agora era salvaguardado, nomeadamente no que diz respeito à quebra de sigilo nas informações necessárias à averiguação e punição de crimes, que, não se sabe muito bem quais são.
Também gostava que me dissesse, em relação ao sigilo, que opinião tem sobre um célebre decreto sobre a criação daquele órgão da Alta Autoridade que corta aos jornalistas a possibilidade de manter o sigilo que até agora era salvaguardado.

Em relação a um órgão importante e preocupante - o Conselho de Comunicação Social -, gostava de lhe fazer 2 perguntas. Que diz V. Exª do facto de o Conselho de Comunicação Social, que já devia estar em funcionamento há vários meses, ainda não ter a sua composição concluída, apesar de já se terem ultrapassado vários prazos? Que opinião tem V. Exª sobre a composição deste órgão? Acha ou não que o Conselho de Comunicação Social vai ser um miniparlamento - uma acusação que normalmente era feita aos conselhos de informação - onde a maioria pode pôr e dispor?

Quanto à Radiodifusão Portuguesa, o estatuto previsto pelo Governo, e que continua a ser muito escondido, consagra a sua dependência perante o Governo através da nomeação dos membros do conselho geral e do conselho de gerência. Também se prevê para o estatuto da RDP que a orgânica e os seus próprios regulamentos internos têm de ser aprovados pelo Ministro da tutela. Não acha V. Ex º que estas decisões esvaziam de conteúdo os conceitos de independência e de serviço público, sendo este último conceito internacionalmente consagrado?

Quanto à Radiotelevisão Portuguesa, gostava de lhe fazer 2 perguntas. Primeira, para já não falar da intromissão censória do presidente do conselho de administração a propósito da transmissão de um filme, o que é que V. Ex.ª me diz sobre um inquérito lançado recentemente a uma equipa de jornalistas pelo facto de ter noticiado sobre o general Garcia dos Santos, apontando também, para reforço da notícia, a

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manchette de um jornal diário? Gostava de saber a sua opinião a este respeito.
Segunda, que opinião forma quando há um Ministro, como o Ministro da Educação, Or. Seabra, que exige que a televisão transmita totalmente uma longa entrevista dada por ele próprio, impedindo assim que o jornalista efectuasse o seu trabalho jornalístico?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Paulo de Oliveira, há mais oradores inscritos. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): -Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): - Agradeço as perguntas colocadas pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Quanto à Lei de Imprensa, o meu partido recebeu há momentos o anteprojecto da Lei de Imprensa e por isso não estou nas melhores condições para me pronunciar sobre o seu conteúdo. No entanto, reportando-me aos pontos que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca focou, parece-me que podem ser respondidos com base em questões de princípio.
Assim, quanto à redução dos poderes dos conselhos de redacção, é óbvio que considero que qualquer redução dos poderes desses conselhos é lesiva dos direitos dos jornalistas e sobretudo é lesiva da acção que os órgãos de comunicação social devem ter enquanto elementos fundamentais da democratização do País.
O mesmo se pode dizer da questão do sigilo profissional. Ao que sei, há restrições previstas no anteprojecto para o sigilo profissional dos jornalistas. É óbvio que o direito dos jornalistas à informação terá de ter os seus limites, mas nunca pode ser limitado de modo a que os prive de entrar em domínios que a opinião pública tem o direito de conhecer.
O mesmo se passa com o acesso às fontes. Temo que as restrições ao acesso às fontes signifiquem um desejo de impedir também a opinião pública de saber .º que realmente se passa neste país.
Pelas razões que há pouco apontei, precisamente as de que ainda não conheço em profundidade o anteprojecto relativo à Lei de Imprensa, lamento não poder dar-lhe uma opinião mais fundamentada sobre ele.
Quanto ao Conselho de Comunicação Social, é óbvio que ele já devia estar em funcionamento. Aliás, temo que ao Conselho de Comunicação Social esteja reservada a «sorte» que está sendo reservado ao Conselho de Imprensa, que prega no deserto. Neste país, o Conselho de Imprensa é um órgão decorativo, que produz documentos do máximo interesse, que é, de certo, um garante moral do funcionamento da imprensa neste país, mas a que os poderes públicos - se me permitem a expressão - «não ligam patavina».
Quanto à RDP, a sua situação é caótica: não há, objectivamente, conselho de gerência em funções e a questão que me pôs da possibilidade de os regulamentos internos da Radiodifusão Portuguesa virem a ter de ser homologados pelo Ministro da tutela, parece-me claramente lesiva da independência de um órgão de informação.
Quanto à RTP. relativamente a um inquérito contra jornalistas que deram notícia sobre o caso Garcia dos Santos, lembro-me de outros, como por exemplo, o inquérito levantado contra os jornalistas que fizeram a entrevista a propósito do caso PRP. São sempre tentativas de intimidar os jornalistas e de ocultar da opinião pública a realidade do País.
O caso do Sr. Ministro Seabra, conforme o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca disse, que faz exigências aos jornalistas para a cobertura dos actos públicos em que participa, parece-me inadmissível. Acho que o Sr. Ministro Seabra não tem sequer cobertura do Programa do Governo para tomar atitudes tão pouco educadas, pelo menos. Penso que seria altura, à semelhança do que o Sr. Ministro Seabra faz ralhando com os jornalistas, de o Sr. Primeiro-Ministro ralhar com o Sr. Ministro Seabra.

O Sr. Presidente: - Certamente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - É para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado João Paulo de Oliveira acabou de fazer uma intervenção sobre um sector extremamente importante numa sociedade e num regime democráticos. Não me irei reportar ao conteúdo da sua intervenção, mas penso que, pelo bom nome e dignidade que são devidos, não só a esta Assembleia mas também a todos os órgãos de soberania que resultam de eleição e em função de processos democráticos constitucional e legalmente previstos, não posso deixar de apresentar o meu protesto em relação a expressões - que penso que deviam ser definitivamente banidas em locais como aquele em que nos encontramos-, tais como, «acções imorais, antidemocráticas» e cheias de «cinismo e desfaçatez».

Vozes do PCP: - Ah!

O Orador: - Se esse é o vocabulário da vossa escola, não é o da nossa escola democrática, Srs. Deputados.
Não está em causa o que foi dito; não sou especialista na matéria e por isso não me pronuncio sobre ela, mas, muito honestamente, penso que esta linguagem ...
Protestos do Sr. Deputado Lopes Cardoso.
Estou a ver que o Sr. Deputado Lopes Cardoso está a protestar mas normalmente não utiliza este tipo de linguagem. Congratulo-me por isso e protesto pelo facto de o seu colega a ter utilizado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo de Oliveira.

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): - V. Ex.ª desculpará, Sr. Deputado José Vitorino, mas, em questões de respeito pelo bom nome e dignidade dos órgãos de soberania, não será V. Ex.ª quem me dá lições.

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2020 I SERIE - NÚMERO 48

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado insurge-se contra as expressões que usei. V. Ex.ª devia insurgir-se contra os actos que suscitaram as expressões que usei.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Eu chamei as coisas pelos seus nomes.

Aplausos do Sr. Deputado César Oliveira.

Insurja-se V. Ex.ª contra os actos antidemocráticos ...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - .... contra os actos imorais, contra os actos destruidores da comunicação social do Estado e nessa altura estaremos perfeitamente de acordo.
V. Ex.ª nunca poderá querer que eu classifique actos desta natureza com palavras brandas que provavelmente serão aquelas que mais aprecia, mas eu, por uma questão de rigor, costumo chamar as coisas pelos nomes que elas têm.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - O que é que ele aprecia? Não aprecia nada! Ele sabe lá apreciar alguma coisa!...

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

Neste momento, o microfone usado pelo Sr. Deputado do PSD Silva Marques não funciona, pelo que o mesmo tem necessidade de utilizar um outro que se encontra na bancada do CDS.

Uma voz do PCP: - Já perdeu o piu!

O Sr. Silva Marques (PSD): - De qualquer modo, é preferível estar com piu, à direita, do que sem piu, à esquerda!

Risos do PSD e do CDS.

Sr. Deputado João Paulo de Oliveira, tenho a impressão de que exagerou quando classificou de «acto de prepotência», entre outros adjectivos, a decisão do anterior Governo em extinguir a ANOP. Independentemente da análise que possamos fazer dessa decisão, julgo que ela foi sobretudo um acto falhado e suspeito que seja rigoroso de classificar de «prepotência» uma operação desta natureza.
Já quanto à apreciação sociológica, digamos assim, que faz da problemática que abordou, não direi que a sua intervenção terá pecado por exagero, mas por unilateralismo, uma vez que disse que a NP está afundada na rede dos interesses. Julgo que, se quisermos abordar o problema de forma rigorosa e não unilateral, será elementar considerar que a rede dos interesses é genérica, independentemente do caso concreto.
Um terceiro aspecto: o Sr. Deputado reclamou e, a meu ver, bem, quanto a situações de corte de salários, e também de ausência de salários, em certas empresas de comunicação social. Julgo que é um problema importantíssimo - até porque toca com o pão de cada um - simplesmente, se quisermos abordar o assunto de forma corajosa, devemos generalizar a questão à comunicação social e - eu diria - às empresas públicas intervencionadas, de uma forma geral. V. Ex." não o fez e, a meu ver, fazê-lo teria sido um contributo positivo, quer em termos gerais quer, sobretudo, em termos concretos. Seria extremamente mau que se viessem a privilegiar certas empresas públicas de comunicação social, onde o salário não falta - se é que não aumenta! -, em detrimento de outras que sofrem cortes, quando o que está em causa é uma questão social gravíssima que é - repito - o uão de cada um.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo de Oliveira.

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Silva Marques, não posso louvar a originalidade da intervenção de V. Ex.ª Aliás, suspeito que talvez seja por isso que é censurado no órgão oficial do seu partido! Veja-se a sua queixa quanto aos artigos que. não consegue ver publicados.
Realmente, contestar hoje, há já uns meses de distância, que a tentativa de extinção da ANOP, tentativa falhada - mas isso é um problema de incapacidade do partido em que V. Ex.ª está inserido, eu nada tenho a ver com isso -, parece-me já não ter grande razão de ser. O caso da ANOP está manifestamente escalpelizado, diagnosticado. Nós sabemos o que é que esteve por detrás da tentativa de extinção da ANOP, sabemos dos modos ínvios -diria mesmo, Srs. Deputados -, indecorosos como se tentou chegar a essa situação, e diria também dos modos ínvios como tem sido artificialmente prolongada até hoje. Sobre a questão da ANOP, lamento não poder dizer-lhe mais do que isto.
Quanto ao facto de a minha intervenção ter pecado por unilateralismo, admito que ela tenha sido unilateral, mas, como certamente verificou, limitei-me a fazer uma intervenção sobre a comunicação social, e não falei de outras empresas públicas. Mas, partindo mesmo do pressuposto de que teria admitido na minha intervenção outros casos relativos à comunicação social, devo dizer que falei daqueles em que as situações são extremamente graves. Há órgãos de comunicação social onde esses problemas aparentemente não existem ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Silva Marques pega no microfone avariado.
Não há dúvida de que o microfone está incompatibilizado com V. Ex.ª!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Mas eu adapto-me às situações.

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18 DE NOVEMBRO DE 1983

O Orador: - Eu sei, Sr. Deputado. Eu sei

Risos.

O Sr. Silva Marques (PSD): - O Sr. Deputado considera que é apenas extremamente grave uma situação de baixa de salário? Não considera que uma situação de eventual alta ou, em termos relativos, excessivamente alta de salários também não é, mesmo do ponto de vista social, extremamente grave?

O Orador: - O Sr. Deputado põe-me um problema académico. Põe-me o problema da alta de salários. Não sei como enfrentaria um problema desses. O que neste momento me preocupa é o problema de baixa de salários, com as consequências que um problema destes tem. É que, se houver uma alta de salários, eu poderei, por exemplo, comprar regularmente revistas que me informam sobre a situação no Mundo, que é uma coisa que eu não posso fazer agora na minha qualidade de trabalhador de um jornal, de jornalista, porque não tenho dinheiro para isso.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe o favor de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, mas parece-me que esta questão é importante. Se houver uma situação de alta de salários, significa que os jornalistas portugueses podem desempenhar muito melhor a sua missão com uma tranquilidade psicológica que neste momento não têm porque, enquanto estão a escrever as noticias sobre o atraso de salários de outras empresas, estão muitas vezes a pensar na sua própria situação.
O Sr. Deputado concordará que, para quem tem um trabalho intelectual, estar a trabalhar em condições de uma insegurança absoluta de emprego, não é o mais favorável. Isso repercute-se na qualidade dos órgãos de informação, e quero crer que o Sr. Deputado concorda comigo se eu disser que a qualidade dos órgãos de informação tem uma repercussão directa na qualidade de um pais. Não há um país democrático sem órgãos de informação democráticos e, para existirem órgãos de informação democráticos, é necessário que eles funcionem com o mínimo de regra e de condições para desempenharem a sua missão que, aliás, está expressa na Constituição e reproduzida no Programa do Governo de que V. Ex.ª é apoiante.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP),. - Sr. Deputado João Paulo de Oliveira, ouvimos com muita atenção e com o máximo interesse a intervenção que produziu por ela reflectir, no essencial, de uma forma - a nosso ver correcta, os problemas que se colocam hoje na comunicação social. Daí o aplauso que manifestámos e dai, também, poder dizer que por detrás do deputado da UEDS esteve o jornalista preocupado com as situações concretas que se vivem hoje.
O pedido de esclarecimento que lhe queria fazer refere-se à situação concerta de manipulação que, para além das questões que levantou, ressalta de toda a actuação governamental na comunicação social.
Ontem, por exemplo, no telejornal um dito comentador - digo «dito» porque não é um comentador

aquele que se apresenta como o único detentor da verdade e com a certeza de que ninguém o contesta chegou à televisão e disse que «a lei de delimitação de sectores era boa porque favorecia a concorrência, melhorando, por isso, os serviços nos bancos, e porque dava um estatuto de maioridade aos empresários portugueses». Só se esqueceu de dizer que a lei era boa porque favorecia a constituição de monopólios!
E evidente que este comentador tem o direito de comentar nos termos em que entender a abertura da banca ao capital privado, o que não lhe pode é ser reconhecido o direito de, por uma operação prévia de manipulação, ele ser para milhões e milhões de portugueses a verdade absoluta.
Esse comentador foi mais longe ... foi tão longe que, porta-voz de interesses que ninguém saberá quais são ou talvez saibam, foi dizer que «a lei deveria ser regulamentada em certos termos sob pena de ser hipócrita». Foi o que ele disse dirigindo-se, naturalmente, aos deputados da maioria.
É este, Sr. Deputado João Paulo de Oliveira, um exemplo clássico da forma como a função de comentador e a existência de uma direcção de manipulação da comunicação social podem ser usadas contra quem lhe dá cobertura.
O que eu lhe pergunto, Sr. Deputado, é o seguinte: como é que, no quadro das questões que colocou, entende situações como esta?
Em relação à ANOP gostava de lhe dizer o seguinte: temos por liquido -supomos que o País também e muito particularmente os trabalhadores da ANOP -, que o problema dos salários para os trabalhadores da ANOP está resolvido depois de ter sido aprovado na Assembleia da República o orçamento suplementar. O compromisso foi aqui assumido e sustentado pelas bancadas da maioria em termos inequívocos. Não concorda comigo?

O Sr. Presidente: - Se assim o entender, tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado João Paulo de Oliveira.

O Sr. João Paulo de Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado João Amaral, muito obrigado pelo aplauso à minha comunicação. Permitirá que amenamente interprete esse seu aplauso como uma certa forma de autocrítica, aliás em sintonia com a autocrítica feita pelo Secretário-Geral do Partido Comunista Português, há cerca de 2 ou 3 anos numa reunião, mais ou menos restrita, realizada na Faculdade de Letras, que reconheceu os erros cometidos pelo Partido Comunista Português na comunicação social.
Em relação à manipulação do telejornal ... bom, as manipulações do telejornal, Sr. Deputado João Amaral, são uma coisa que existe com uma frequência tão inaudita que já faz parte do dia-a-dia dos espectadores da televisão. Devo dizer, por exemplo, que não tenho ideia de alguma vez o telejornal, em qualquer das suas edições, ter feito sequer alusão a qualquer comunicado dos órgãos do meu partido.
Vejo que o Sr. Deputado João Amaral contesta, tal como eu, a pretensão do comentador do telejornal de ter a verdade absoluta. Acho óptimo que acreditemos que a verdade absoluta não existe na posse de nenhum partido.

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2022 I SÉRIE -NÚMERO 48

Perguntou-me como é que eu entendo situações como estas. Bom, posso responder de uma maneira muito sintética: entendo mal!
Quanto à questão da ANOP, o Sr. Deputado diz-me que a maioria assumiu aqui o compromisso de desbloquear a questão dos salários em atraso na ANOP. Folgo muito com isso!
Perguntou-me ainda como interpretar esta promessa. Disse na minha intervenção, que o Programa do Governo tem lindas palavras acerca da comunicação social mas que, até hoje, para meu pesar e certamente para pesar de todos os cidadãos, essas belas palavras não encontraram ainda uma tradução na prática. Espero que o compromisso da maioria, em desbloquear a questão dos salários para a ANOP, encontre na prática a tradução que os belos princípios do Programa do Governo até hoje não encontraram e que eu temo, pelo caminho que as coisas tomam, não venham a encontrar.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Dias Lourenço.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco mais de l mês centenas de milhares de trabalhadores em vários pontos do nosso país vieram à rua numa grande acção de protesto contra a política social do actual Governo.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Não se deu por isso!

O Orador: - Outras manifestações e acções se têm multiplicado por toda a parte, nas ruas, nas empresas, à porta dos ministérios, em frente mesmo desta Assembleia da República. Com toda a propriedade, aliás, visto que a este Órgão de Soberania cabem responsabilidades de primeiro plano na solução dos problemas que afectam o povo e o País.
Vimos ainda por essa altura como a maioria parlamentar da actual coligação governante, a que logicamente se associou o CDS, se demitiu dessas responsabilidades, recusando votar o projecto de lei do grupo parlamentar do PCP para o pagamento dos salários em atraso, um projecto de inegável carácter de emergência, que apresentava soluções viáveis e socialmente justas para este gravíssimo problema. Um problema que entretanto aumentou de gravidade visto que nenhuma medida foi tomada pelo Governo para o resolver.
Não sabemos se os Srs. Deputados da maioria foram até ao alto das escadarias de acesso a esta Assembleia ou até, sem saírem deste Plenário, se dignaram olhar para as caras dos trabalhadores que nesse dia aqui vieram. Em muitas os sinais de miséria eram evidentes!
Hoje o problema é naturalmente mais grave. Mais trabalhadores atingidos ou sob a ameaça do não recebimento dos salários. Mais 1 mês sem recursos a somar ao dia em que aqui se concentraram. Mais 1 mês que em milhares de lares não entrou o salário de um aluguer de braços que entretanto criou novos acréscimos de mais-valia para os bolsos do patronato.
O Governo prepara-se agora para aplicar as disposições que a sua maioria -apenas dos deputados dos dois partidos da coligação, significativamente isolados - fez aqui aprovar na terça-feira. O roubo - para nós é um roubo- dos 28% do 13.º mês ficou consumado com a cobertura de uma injusta lei e são broas envenenadas as que os trabalhadores terão este ano, por decisão da maioria governante, no seu jantar de Natal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mais envenenada ainda para os cerca de meio milhão de desempregados, a maior parte sem receber subsídio de desemprego, número que nas frias previsões do Governo poderá ainda subir até ao fim deste ano de 1983, conforme foi dito pelo próprio Primeiro-Ministro, de mais 100000 trabalhadores.
E é profundamente insultuosa, para quem tenha um mínimo de patriotismo, a imposição do Banco Mundial, referida pelo Sr. Secretário de Estado do Trabalho a dirigentes sindicais, de despedimentos em massa de trabalhadores no sector público na materialização dos acordos com o FMI.
Compreende-se como esta política, que justamente classificamos de autêntica guerra social contra as classes e camadas mais desfavorecidas, enche de indignação os trabalhadores e daqui queremos afirmar a nossa solidariedade e apoio à jornada nacional de luta hoje convocada pelo movimento sindical unitário contra a política do Governo.
Dizemos exactamente classes e camadas mais desfavorecidas porque não são apenas os assalariados industriais e agrícolas, os' reformados e pensionistas e os deficientes, os atingidos pela política anti-social do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O encontro de há dias de mais de 1000 pequenos e médios comerciantes e, com destaque particular, o encontro do último fim de semana em Coimbra de mais de 7000 pequenos e médios agricultores, uns e outros debatendo a política de falência e de ruína deste governo PS/PSD, mostra que muitas centenas de milhares de portugueses de diversas condições sociais reclamam uma nova política que tem implícita a exigência de um novo governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, o objectivo principal desta minha intervenção é, como deputado do distrito de Santarém, trazer a esta Assembleia, e por esta via ao Governo, a situação particularmente grave dos trabalhadores da Metalúrgica Duarte Ferreira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação da Metalúrgica Duarte Ferreira, com a empresa-mãe no Tramagal e sucursais no Porto e em Lisboa, assim como a dos seus trabalhadores tem sido trazida a este Plenário da Assembleia da República pelos deputados do Grupo Parlamentar do PCP, que, além disso» têm enviado, no âmbito das prerrogativas regimentais, vários requerimentos ao Governo e cujas respostas têm sido em geral insatisfatórias.
Está mais uma vez a MDF - uma das empresas metalúrgicas melhor apetrechadas do País - numa situação de imprevisíveis consequências para os seus

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18 NOVEMBRO DE 1983

2500 trabalhadores e respectivas famílias e na iminência de decisões extremamente graves por parte da administração da empresa.
A situação actual é a seguinte:
A Administração da MDF não pagou ainda o subsídio de férias de 1983 a 82 % dos trabalhadores.
Desde Abril os salários têm sido pagos com grandes atrasos, mas do salário de Setembro somente foram pagas uma primeira prestação de 5000$ em 21 de Outubro, uma segunda prestação igualmente de 5000$ nos primeiros dias de Novembro e falara agora em pagar (hoje) uma terceira prestação de 5000$.
Concretamente os trabalhadores receberam apenas 15 000$ no mês de Setembro, que para todos está ainda por pagar, e estão desde então sem receber quaisquer outras quantias.
Além disso foram-lhes suprimidas algumas importantes regalias cuja supressão lhes agrava ainda mais a difícil situação. Em 6 de Outubro foram suprimidos: o complemento do subsídio de doença; o prémio de assiduidade; o fundo de assistência para eventuais necessidades; o pagamento legal do tempo de greve.
A administração passou desde há tempos a exigir a polivalência da prestação de trabalho mais qualificado sem alteração das respectivas remunerações e categorias.
Medidas de outra ordem foram comunicadas em meados de julho aos trabalhadores, designadamente a intenção de reduzir de 200 000 contos anuais a massa salarial, correspondente ao despedimento de 700 a 800 trabalhadores.
Além destas anomalias e medidas financeiras a administração da empresa é devedora de 90 a 100 contos em média a cada trabalhador, correspondentes à anterior fase intervencionada, durante a qual, após o abandono da MDF pelos administradores, foi feito um notável esforço de viabilização e recuperação da empresa pelos trabalhadores, coroado de êxito.
No dia 2 deste mês, numa reunião conjunta da comissão de trabalhadores da MDF e da administração, foi por esta comunicada a impossibilidade de resolver a situação actual da empresa e colocadas 3 alternativas:
A primeira: que o Governo dê à MDF condições
de sobrevivência;
A seguda: que o Governo demita a actual administração
e nomeie outra;
A terceira: que seja decretada a falência da empresa.

No último dia 15 estava convocada uma assembleia geral dos accionistas da MDF de que se previam consequências das mais graves para o futuro da empresa e da situação dos trabalhadores.
E voz corrente que iria sair desta assembleia geral uma declaração de falência depois da análise da situação social e da situação económica e financeira da MDF. Não conhecemos ainda a decisão tomada.
Isto significa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se aproximam momentos decisivos para a existência de 2500 trabalhadores e suas famílias e decisões que afectam a própria economia nacional, uma situação que não pode ser indiferente ao Governo e a esta própria Assembleia da República.

Não podem deixar de ser aqui evocadas algumas das causas principais da situação neste momento criada à MDF. Envolve a responsabilidade dos governantes anteriores que a desintervencionaram, de outros que nos últimos meses -desde o ano passado- se têm recusado a tomar medidas atinentes a resolução dos problemas sociais, económicos e financeiros da empresa e naturalmente a responsabilidade da actual administração.
E uma verdade consabida que a recusa do Governo a abrir uma linha de crédito com a República Popular de Angola, destinada a financiar o chamado «Projecto Malange» - de cujos dossiers os Ministros de tutela foram recebedores-, não somente impede a viabilização da empresa como fecha a possibilidade de entrada de divisas no País num valor aproximado de 6 milhões de contos.
Por outro lado, tendo sido aberto concurso para o fornecimento de 300 viaturas tácticas ao Exército português, a que a MDF concorreu com suas excepcionais possibilidades tecnológicas e a incorporação, na ordem de 55 % a 65 %, de produtos e trabalho nacional, mas cujo projecto de encomenda chegou a ser encarado dar à empresa holandesa DAF, o que, embora em melhores condições de preço, não teria para o País os mesmos benefícios económicos e sociais.
A aceitação pelo Exército português das viaturas tácticas cujas qualidades foram testadas por altas patentes militares portuguesas, incluindo o próprio Presidente da República - abrirlho-ia possibilidades de colocação em Angola e Moçambique e até em alguns países árabes.
Mas não só: a viatura da MDF poderia ser adquirida pelas corporações de bombeiros portugueses. Embora mais cara 1000 contos que as dos concorrentes estrangeiros tem uma envergadura superior a quaisquer outras que se projecta importar e é mais adequada aos fins em vista.
As responsabilidades da administração da MDF são também elevadas. Má gestão, inépcia, gastos supérfluos -em contradição com a situação financeira da empresa-, compromissos financeiros na formação de novas empresas que sairiam em grande parte do próprio activo da MDF, cujas dívidas, por falta de pagamento de juros, ascendem actualmente a 6 milhões de contos.
A atitude demissionista dos actuais administradores depois de terem assumido as responsabilidades da intervenção estatal, é altamente censurável.
E contudo ao Governo que cabem as maiores responsabilidades pela não aprovação do contrato de viabilização da MDF.
O governo PS/PSD, empenhado na guerra social contra os trabalhadores na sua política de recuperação capitalista, pode encarar com a sua comprovada indiferença e incúria a situação da MDF. Pode mesmo fazer humor com a situação vizinha da miséria dos seus 2500 trabalhadores como fez há alguns dias por ocasião da discussão da proposta de lei de emergência do PCP nesta Assembleia para pagamento dos salários em atraso para 125 000 trabalhadores. Mas isso não o ilibará das acusações que aqui lhe são feitas de não providenciar, como pode e deve, na superação da grave situação da MDF, isso não o ilibará das

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responsabilidades pelo que possa vir a acontecer aos seus 2500 trabalhadores e às suas famílias.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o período da ordem do dia da nossa sessão de hoje respeita à apreciação do projecto de lei nº 93/III, apresentado pelo CDS, referente à Lei de Bases da Segurança Social.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?
o
O Sr. Presidente: - Faça .favor, Sr. Deputado.

O Sr. Malato Correia (PSD): -Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PSD, ao abrigo das disposições regimentais, pede a interrupção da sessão por um período de 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, está concedido visto ser um direito regimental do seu grupo parlamentar.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão até às 17 horas e 5 minutos.

Eram 16 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: -Está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 20 minutos.

Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social ( Amândio de Azevedo) e a Sr.ª Secretário de Estado da Segurança Social (Leonor Beleza).

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Após a revisão constitucional de 1982 ficou expressamente consagrada na nossa lei fundamental a competência própria da Assembleia da República para legislar sobre as bases do sistema de segurança social, conforme preceitua o seu artigo 168 º
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS apresentou há 5 meses o projecto de lei n.º 93/111, relativo à lei quadro da segurança social que agora vai ser discutido e votado nesta Câmara.
Porquê uma Lei de Bases da Segurança Social?
Durante muitos anos e de muitos quadrantes tem-se usado e abusado do termo «justiça social».
A promoção de eficiência e de equidade na afectação de recursos, tarefas supremas de qualquer Estado com preocupações e objectivos sociais, tem dado lugar em Portugal mais a discriminações e a ineficiência do que a justiça e a solidariedade.
A sociedade portuguesa está, com efeito, cheia de discriminações injustas.

Discriminação do Estado contra o cidadão quando aquele gasta muito mais do que recebe e, ao financiar-se, cria o chamado imposto de inflação.
Discriminação das empresas inviáveis contra as viáveis através da generalização de bonificações, viabilizações e outras distorções da concorrência.
Discriminação dos empregados contra os desempregados, gozando aqueles de leis laborais excessivamente rígidas que prejudicam o investimento e impedem, em consequência, o emprego dos últimos.
Discriminação contra os que pagam impostos a taxas exorbitantes em benefício daqueles que pouco ou nada pagam por beneficiar das deficiências da administração fiscal.
Discriminação dos que beneficiam dos subsídios a produtos embora pudessem pagar o seu custo real contra os que nem os produtos subsidiados podem tantas vezes adquirir.
Discriminações, mais distorções, mais iniquidades, tudo feito em nome da justiça social, mas tudo a fazer perder cada vez mais o sentido da solidariedade real que é indispensável a qualquer sociedade, a qualquer empresa, a qualquer família, a qualquer comunidade humana.
Assiste-se até a exemplos chocantes.
Algumas classes privilegiadas manifestam-se na rua por um Serviço Nacional de Saúde gratuito e universal, mas não abdicam dos serviços convencionados de saúde de melhor qualidade que especialmente existem para si próprias.
Outras manifestam-se e proclamam pensões de reforma generalizadamente dignas, garantes da sobrevivência da terceira idade, mas não abdicam dos direitos classistas que lhes permitem a reforma pelo último ordenado e sempre actualizada como se estivessem no activo.
Outros defendem as nacionalizações, combatem a concorrência e querem manter os monopólios do Estado, escamoteando a defesa implícita dos privilégios pessoais ou de classe que os monopólios lhes garantem.
E por isso, na falta da solidariedade social que os diversos corporativismos geram, há milhões de portugueses que sofrem.
Sofrem os titulares de rendimentos certos, tantas vezes produto de toda uma vida poupada, com a inflação que os titulares de rendimentos actualizáveis fundamentalmente causam.
Sofrem os pequenos empresários e os trabalhadores .deles dependentes a quem o Estado não assegura a irresponsabilidade das empresas públicas e a quem os sindicatos não poupam as acções exercidas em transmissão de tácticas políticas.
Sofrem os que poupam em relação aos que consomem, porque a poupança continua a ser tributariamente punida e o consumo não deixa de ser estimulado.
E é esta a situação basicamente distorcida que, sem exagero, caracteriza o drama que actualmente domina a vida social portuguesa.
De tanto intervir, a respeito de tudo e de nada, o Estado causa distorções, determina ineficiências, afecta a equidade na distribuição dos recursos nacionais.
E, no entanto, o Estado dispõe de instrumentos por excelência para fomentar a solidariedade.
Com efeito, esta só existe, verdadeiramente, numa sociedade que fomente e proteja as instituições que

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pressupõem comunhão humana e colaboração de esforços.
Solidariedade só existe verdadeiramente quando o Estado instila a colaboração e fomenta a protecção a instituições em que a relação humana mais se vivência.
Tais instituições sociais, são, em primeiro lugar, a família, fonte da formação e do desenvolvimento equilibrado da personalidade, são, em segundo lugar, as empresas, fonte da realização da dignidade humana que só através do trabalho se alcança e, em terceiro lugar as instituições do sistema de segurança social integrado, garantes de uma rápida e eficiente repartição de recursos e garantes de mínimos de sobrevivência em todas as situações de carência.
Da família e das empresas temos tratado noutras ocasiões e sempre o CDS se levantou em defesa da sua promoção, em combater tudo quanto tem sido proposto visando a sua destruição. Hoje é a vez da segurança social. É a vez de dizer bem alto que, na situação de crise social em que o País está mergulhado, é urgente e é essencial que se consolide e promova o sistema de segurança social, através de uma lei de bases que seja espelho da acrescida solidariedade que é fundamental à sociedade portuguesa.
Lei de bases normativamente necessária, tecnicamente oportuna, politicamente adequada e, sobretudo imperativa do ponto de vista social.
É necessária do ponto de vista normativo porque permitirá proceder à reavaliação do disperso e até por vezes incongruente património legislativo existente, e, como tal, traçar os fundamentos e as vias normativas básicas que devem presidir ao desenvolvimento da segurança social portuguesa.
É tecnicamente oportuna porque tendo sido já concretizadas etapas significativas na generalização e integração dos regimes de segurança social e ratificados ou em vias de ratificação o Código Europeu e a Convenção Europeia de Segurança Social importa, agora, dar passos consolidados na concepção de um sistema similar aos existentes na Europa Ocidental.
É politicamente adequada porque, no momento em que tanto se faz apelo à necessidade de modificações estruturais no nosso país, mas poucas vezes se consegue ultrapassar a discussão dos pequenos problemas a margem dos verdadeiros anseios e necessidades da maioria dos portugueses, importa avançar firmemente para a institucionalização de uma segurança social com pleno estatuto de maioridade política e social e como instrumento privilegiado da realização da solidariedade e da justiça social.
É socialmente imperativa porque em nome de inalienáveis razões de justiça social apoiadas no respeito pela dignidade de cada português como pessoa humana, como membro da família e como sujeito activo de grupos sociais e sócio-profissionais, se devem clara e coerentemente explicitar as coordenadas fundamentais sobre o âmbito do sistema de segurança social, as eventualidades protegidas, as prestações concedidas, os métodos ou técnicas de protecção social e os sistemas de financiamento, bem como a relação e grau de envolvimento do Estado e da sociedade no sistema global de segurança social.
O projecto de lei agora em discussão procura, dentro de razoáveis limites, dar respostas às situações de estrutura sem a obsessão da conjuntura.

Tendo como base o normativo constitucional, nomeadamente o seu artigo 63 º e levando em conta a realidade existente, designadamente a nível orgânico e do conjunto das prestações sociais, o projecto de lei ora em discussão surge como corolário lógico dos princípios que informaram o desenvolvimento da nossa segurança social, desde 1980 e não como uma qualquer lei alheada da realidade concreta do nosso país.
Está-se em presença de um texto suficientemente flexível que pode vir a contribuir para uma melhor e mais eficiente gestão política e administrativa do sector, para uma clarificação desejável e justa dos direitos, garantias, e deveres dos beneficiários, contribuintes ou utilizadores, em suma, para uma crescente transparência na relação entre o Estado e os cidadãos.
Estamos em crer, aliás, que os princípios orientadores do projecto de lei n.º 93/111 poderão, em grande medida, ser consensuais, se a análise do seu conteúdo se fizer desapaixonadamente e fora de interesses de conjuntura ou oportunidade políticas. E assim cremos, porque se procuram traduzir em objectivos essenciais de qualquer comunidade política e social: o bem-estar e segurança dos cidadãos, a igualdade de oportunidades e a redistribuição justa da riqueza, informados pelos valores fundamentais que devem reger os sistemas de protecção social: a pessoa humana, a solidariedade e a justiça social.
Embora sendo breve, importaria, neste momento, fazer um esboço histórico da nossa segurança social, bem como um diagnóstico sucinto da sua situação actual, de modo a enquadrar este projecto lei.
Exceptuando os aspectos orgânicos e a evolução dos regimes não contributivos, pode-se afirmar que, ainda hoje, uma parte apreciável da estrutura da nossa segurança social continua a ser regida pela Lei n.º 2115, de 18 de Junho de 1962. Apesar da relevância social desta reforma da Previdência que optou claramente pelo método do seguro social obrigatório, separando as necessidades a cobrir pela assistência social dos riscos que devem ser cobertos pela técnica do seguro; certo é que se manteve o peso de princípios, orientações e práticas que mergulham fundas raízes no quadro histórico do corporativismo da Constituição de 1933.
Também o aparelho normativo elaborado a coberto da Lei nº 2115, e de outras leis aprovadas ao longo dos anos 60, se foi pulverizando, desactualizando e dispersando, facto gerador de inequívocas dificuldades para os serviços e instituições, mas sobretudo para o claro e eficiente conhecimento e vencimento pelos interessados dos seus direitos.
Importa igualmente notar que, se a reforma iniciada em 1962, comportava potencialidades que foram aproveitadas para um crescente alargamento da população abrangida pela previdência social e para a cobertura de maior número de eventualidades, não é menos verdade que os efeitos de uma evidente «crise de crescimento» viriam a determinar fortes distorções técnicas, financeiras e institucionais.
Depois do 25 de Abril a coerência global do sistema ficou ainda mais comprometida, com a descapitalização descontrolada, com a manifesta acção casuística encetada, com a força das conveniências políticas do momento, com o excesso da ideia consumista e garantista para todos os riscos sociais, e com os abusos que esta mesma ideia permitiu.

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Do lado da assistência social, longo foi também o caminho que esta, entre nós percorreu até a aprovação do estatuto da saúde e assistência estabelecido pela Lei nº 2120, e finalmente à reorganização dos serviços determinada pelo decreto-lei nº 413/71.
Se é certo que com estes últimos dois diplomas ç pela primeira vez, as preocupações de coordenação e integração sectoriais são evidentes, o problema da relação entre os sectores da saúde e assistência, por um lado, e a previdência social, por outro lado, nunca foi de forma alguma pacífico entre nós, mantendo-se como questão em aberto durante largo período.
Embora tendo sido oficialmente aceite nas vésperas do 25 de Abril, a expressão «segurança social» foi finalmente adoptada pela Constituição da República Portuguesa de 1976.
Simultaneamente foi consagrada a criação do Serviço Nacional de Saúde, o que afastando um conceito amplo de segurança social em que se integrasse o direito de protecção da saúde haveria de determinar a separação orgânica daquelas duas áreas sociais.
Uma análise profunda dos preceitos constitucionais levar-nos-ia a concluir que se proeurou traduzir na nossa lei fundamental o direito à segurança social através de um compromisso entre uma concepção laboralista e uma concepção assistencialista, não transparecendo, também, com total clareza a opção por uma concepção lata ou restrita.
E não se diga que a questão é de menor importância, porque a opção por uma concepção restrita coloca o acento tónico na segurança económica, isto é, no exclusivismo das prestações pecuniárias, ao passo que a segurança social em sentido lato permite abarcar, além daquelas prestações, o vasto quadrante da acção social, traduzido em serviços e equipamentos sociais específicos.
E um facto que a prática das actuações no sector nos últimos 10 anos indicia claramente a opção por uma concepção ampla de segurança social. Tal prática porém, não se tem apoiado num quadro legal e institucional de referência capaz de, com coerência e rigor, proporcionar as coordenadas balizadoras que devem nortear a prossecução dos fins do sistema de segurança social.
Não se nega que o Decreto-Lei nº549/77, de 31 de Dezembro, de autoria do I Governo Constitucional, tenha procurado ser um elemento importante na clarificação dos fins do sistema da segurança social. No entanto, o facto de ter sido concebido à margem de uma Lei de Bases da Segurança Social e as orientações que presidiram à sua elaboração (iniciada mesmo antes de aprovada a Constituição de 1976), além de reflectirem um condicionalismo conjuntural, apontaram exclusivamente para preocupações de natureza orgânica e frustraram a expectativa de, em simultâneo, se elaborarem e aprovarem outros diplomas referentes às bases fundamentais dos riscos a proteger, às prestações a garantir, às entidades gestoras e ao financiamento do sistema.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porquê esta Lei de Bases da Segurança Social?
Em primeiro lugar, importa dizer que o texto em discussão foi orientado por uma preocupação de impedir a sua transformação num documento conjuntura
lista revogável ou modificável facilmente.

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Daí que o projecto de lei não se apresente, contrariamente ao que acontece com muitas leis quadros em outros sectores, com vincadas ou excessivas preocupações de natureza orgânica e administrativa.
Reconhecendo a Constituição o direito de todos os portugueses à segurança social através de um sistema unificado e descentralizado, torna-se imperioso definir as suas traves mestras centradas na ideia do direito à segurança social e no posicionamento do Estado e da sociedade relativamente à sua prossecução.
Tentou-se adoptar um conceito de segurança social que se adaptasse o melhor possível à letra e espírito da Constituição e que, além disso, fosse suficientemente operacional para servir de base à futura regulamentação da lei. Houve igualmente a preocupação de o adoptar aos instrumentos internacionais mais relevantes, afastando-se as soluções artificiosas e originais que normalmente se traduzem em sucessivas acumulações de erros.
Tornou-se, também, indispensável que a concepção adoptada do direito à segurança social, fosse completada por outras modalidades de acção social, tendencialmente personalizadas, destinadas a proteger as crianças, os jovens, os deficientes, e os idosos, a satisfazer as carências das famílias, a promover a integração social e a desenvolver a acção social comunitária.
O sistema de segurança social basear-se-á como refere o artigo 2 º do projecto de lei, nos princípios da unidade, universalidade, igualdade, eficácia, descentralização, garantia judiciária, solidariedade e participação.
Unidade que exige a coordenação dos regimes compreendidos no sistema com vista à sua unificação.
Universalidade que se concretiza pelo progressivo alargamento do campo de aplicação do sistema.
Igualdade consistindo na eliminação de quaisquer discriminações.
Eficácia traduzida na concessão oportuna de prestações pecuniárias e prestações em espécie, para adequada prevenção e reparação das eventualidades legalmente previstas e promoção de condições dignas de vida.
Descentralização manifestada pela autonomia das instituições.
Garantia judiciária que conferirá aos interessados o acesso aos tribunais para fazer valer o seu direito às prestações.
Solidariedade na responsabilização da colectividade pela realização dos fins do sistema e envolvimento do Estado no seu financiamento.
Participação através da responsabilização dos interessados no planeamento e gestão do sistema e no acompanhamento e avaliação do seu funcionamento.
Em estrita relação com estes princípios consagra-se definitivamente neste projecto a existência de dois regimes de segurança social: um contributivo e outro não contributivo.
O regime contributivo ou regime geral de segurança social deverá abranger toda a população activa incluindo os trabalhadores independentes enquanto o regime não contributivo se destinará a realizar a protecção nas situações de carência social não cobertas efectivamente pelo regime geral.
Este, o regime geral, deve ser concebido com uma fase desenvolvida do actual regime geral de previdência e deverá, no futuro, fundir-se com os regimes de protecção social da função pública num regime unitário

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rio. O seu objectivo deverá coincidir com as eventualidades correspondentes à Convenção nº 102 da OIT
e também ao Código Europeu de Segurança Social, o que levará naturalmente à integração da protecção nos acidentes de trabalho e no desemprego, no sistema de segurança social, obviamente com a ponderação exigida pelos condicionalismos históricos das entidades actualmente gestoras. O facto de se tomarem como modelo deste regime aqueles instrumentos internacionais visa contribuir não só para o processo da nossa integração europeia e adopção de critérios que permitam o aperfeiçoamento do nosso sistema de segurança social, bem como para a defesa dos nossos trabalhadores emigrantes.
Quanto às prestações do regime não contributivo elas tanto poderão ser concedidas sob condição de recursos, como, eventualmente, numa base universal. O que caracterizará, portanto, este regime é o facto de a atribuição das suas prestações não depender de condições prévias de tempo de trabalho ou de pagamento de quotizações.

Através do regime não contributivo, a financiar por subvenções do Estado será possível garantir aos indivíduos e às famílias um rendimento mínimo desde que se encontrem em situação de manifesta carência económica.

Pensamos mesmo que o sistema poderá evoluir em relação a certas prestações no sentido da sua universalização. Não se teve, no entanto, qualquer dúvida em consagrar prestações de cariz assistencial, uma vez que temos de colocar na primeira linha de preocupação social as pessoas e as famílias economicamente carecidas.
Entendemos que a igualdade de oportunidades no acesso aos bens sociais e a igualdade marginal de sacrifícios não devem ser sufocadas pela imposição da uniformidade e do igualitarismo na pobreza a que nos conduziria o excesso de uma visão demogarantista, ou seja o de distribuir os escassos recursos a toda a população indiferenciadamente.
Devemos, corajosamente, aceitar que o excesso do «tudo para todos» tem, por toda a parte, conduzido a uma mera transferência no seio da classe média poupando os ricos e não beneficiando proporcionalmente os pobres, tem caído num excesso de regulamentos e normas degradando a qualidade dos serviços prestados, tem, enfim, permitido toda a espécie de abusos, desperdícios, contraprodutividades, sobreconsumos dos bens e serviços sociais.
Em nossa opinião, a justiça social constrói-se mais através da universalidade social, ou seja afectando os recursos prioritariamente a protecção dos estratos sociais mais desfavorecidos.
A realização progressiva da universalidade deve passar, assim, pelo alargamento do campo de aplicação pessoal dos regimes contributivos, pela afectação do regime não contributivo aos mais desfavorecidos, e pelo objectivo de combinar harmoniosa e equilibradamente os dois referidos regimes.
Em suma proeurou-se conjugar na máxima convergência possível a solidariedade interprofissional inerente ao regime contributivo e a solidariedade social inerente ao regime não contributivo, de modo a realizar uma efectiva e justa solidariedade nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: útil se torna recordar, aqui, mais dois ou três aspectos de importância

do projecto lei e dos quais apenas destaco por falta de tempo: o financiamento do sistema, o papel da iniciativa particular e as garantias de actualização das prestações sociais.

Quanto ao suporte financeiro do sistema, são evidentes as suas distorções e as injustiças relativas que provoca. De facto, a passagem do regime de capitalização para um regime de repartição, a criação do Serviço Nacional de Saúde já financiado não pelas contribuições mas pelo Orçamento do Estado, bem como o desenvolvimento dos regimes não contributivos ou fracamente contributivos (como é o caso do regime dos rurais) não foram acompanhados das necessárias alterações dos sistemas de financiamento dos diversos regimes. Daí que as receitas ou contribuições cobradas no regime geral e pagas pelos empregadores e pelos trabalhadores tenham vindo, quase integralmente, a suportar os défices de todos os restantes regimes de protecção social. Para citar um número basta dizer que no Orçamento deste ano, 59 milhões de contos do regime geral são canalizados para colmatar os défices financeiros do regime dos rurais (37,5 milhões de contos), da pensão social (12,8 milhões de contos) e das modalidades de acção social (8,7 milhões de contos), perfazendo, como disse, 59 milhões de contos, o que representa um enorme e desajustado esforço de solidariedade pedido aos contribuintes e beneficiários daquele regime.

Este esforço de solidariedade tende a configurar um verdadeiro «imposto» pago à segurança social, para financiamento de funções, que não são desta, mas do Estado. Na verdade, se parece aceitável uma redistribuição intersectorial de rendimentos, a sua viabilidade torna-se duvidosa pelas suas dimensões, as quais só poderão implicar ou conduzir a gravíssimas distorções sociais e económicas, pelo ónus que este verdadeiro imposto significa para as empresas e para os trabalhadores atingidos.

Não se afigura, assim, curial que o regime não contributivo continue a ser financiado por receitas provenientes das contribuições, devendo, conforme prevê o projecto e estipula a Constituição, ser suportado pelo Estado. E embora se, compreenda que, face às dificuldades orçamentais do Estado, este principio deva ter adequado faseamento de modo a não comprometer objectivos básicos da política económica e financeira, entende-se como inquestionável o próprio principio em si.

Este projecto de lei de bases da segurança social consagra também a obrigatoriedade da actualização das prestações sociais e a revalorização dos salários que servem de base de cálculo das pensões e de outras prestações pecuniárias de modo a preservar o poder aquisitivo das diversas prestações e a defender, com maior justiça social, as condições de vida nos nossos reformados, deficientes e de outros sectores desfavorecidos da população portuguesa.
Importa, aqui, justamente recordar que se trata da consolidação de um política iniciada com coerência e vontade políticas pelo VI Governo Constitucional e prosseguida pelos governos seguintes, a qual permitiu que se invertesse o processo de degradação dos já de si baixos proventos dos titulares de rendimentos fixos. Surge, pois, como imperioso, garantir na lei a adopção desta prática que permitiu que no triénio de

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1980-1982, apesar de todas as dificuldades, as reforce do regime geral tivessem aumentado 99,2 %, a pensão dos rurais 152 %, a pensão social 144 %, o abono de família 160 % e os diversos subsídios, entre o mínimo de 200 %, para o subsídio de casamento, e o máximo de 620 %, para o relativo aos deficientes.

Também a acção social, enquanto parte personalizada na luta contra as dificuldades económicas, sociais e humanas, constitui parcela importante na economia do projecto de lei.
E, aliás, neste campo particular que se manifesta e apresenta em toda a sua dimensão o papel e a importância das instituições particulares de solidariedade social, como um pilar fundamental da expressão da iniciativa centrada na liberdade de criação, na liberdade de definição de objectivos e na liberdade de adesão.
Não se trata de um slogan a convicção que se tem sobre o papel da iniciativa particular no domínio da protecção social. Trata-se de uma forte convicção construída na constatação da força e vitalidade das Misericórdias e mutualidades como uma forma adequada de expressão de direito à igualdade de oportunidades que não, de um cego igualitarismo na mediocridade, da solidariedade livre e voluntária que não de solidariedade impessoal imposta por um Estado cobrador de mais e mais impostos, da criatividade humanizada que não do excesso das burocracias sociais inibidoras.
Se o impulso proporcionado pelo VI, VII e VIII Governos Constitucionais, na dinamização das livres iniciativas particulares neste campo de acção foi o factor decisivo do reforço do papel das instituições particulares no texto constitucional e no florescimento de iniciativas por todo o País, não está ainda totalmente aproveitado o potencial de intervenção destas instituições como expressão da solidariedade natural do povo português.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está o Grupo Parlamentar do CDS consciente que não será a simples aprovação deste projecto que irá resolver todos os problemas dos Portugueses em matéria de segurança social. Sendo esta uma instituição fundamentalmente a jusante da economia, está desde logo condicionada pela sua evolução conjuntural e estrutural pelo que, do ponto de vista quantitativo não se pode exigir uma segurança social bastante evoluída com um sistema económico débil, titubeante e pouco eficiente.
No entanto, em termos qualitativos estamos em condições de plena adequação aos sistemas vigentes nos países mais evoluídos.
Daí que este projecto tenha procurado ser um projecto realista, equilibrado e um factor de esperança.
Não se consagraram radicalismos que ignorassem a realidade existente ou que conduzissem a um reforço do Estado-Providência.
Eliminou-se o «segurismo exagerado» que vinha da Lei n.º 2115, mas não se consagrou o garantismo total, inibidor da responsabilidade e das iniciativas próprias.
Preferiram-se as medidas de efectiva protecção dos mais carenciados, repudiando-se a solução dos subsídios ou gratuitidades universais que apenas beneficiam os mais ricos.
Tentou-se, sem demagogia, consagrar o equilíbrio entre o desejável e o possível, entre a preocupação social e a afirmação individual, entre a satisfação dos

deveres sociais e a exigência dos deveres colectivos, entre a justiça e a solidariedade.
Repudiou-se a visão economicista da política social como mero apêndice da economia, insensível às prioridades no combate contra as carências sociais, mas também a visão de uma segurança social sem limites financeiros e suportada pela ilusão do papel-moeda ou dos impostos dissimulados.
Igualmente se afastou uma segurança social que, por assumida exclusivamente pelos poderes públicos, definhasse o sentido de responsabilidade, enfraquecesse a coesão familiar, regulamentasse e tornasse asfixiante a vida das pessoas e despersonalizasse as relações sociais na comunidade e no trabalho.

É que o homem como destinatário da segurança social, Srs. Deputados, é também o seu limite.

Em suma, assumiu-se uma segurança social como esforço colectivo dos cidadãos, das suas organizações e do Estado.

Vou terminar com a convicção de que este projecto será objecto de profundo debate, de modo a prestigiar este Parlamento e a contribuir para um melhor esclarecimento dos Portugueses em matéria que a todos nos diz respeito.
Melhorar o bem-estar e a qualidade de vida dos cidadãos portugueses, promover a justiça social ajudando os mais desprotegidos e criando condições para uma efectiva igualdade de oportunidades, delinear as linhas fundamentais de protecção da família, fortalecer a sociedade civil pelo estímulo de solidariedade entre os Portugueses, contribuir para a moralização e transparência da vida social, foram os objectivos essenciais que nortearam este projecto de lei.

Não enjeitando a necessidade de introduzir alterações na especialidade que possam melhorar o seu articulado, penso que este projecto de lei tem condições globais para ser apreciado e votado positivamente por esta Câmara, de modo a acelerar-se decisivamente s dignificação da segurança social que tem vindo desde há alguns anos a ser prosseguida.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para pedir esclarecimentos.

A SrªZita Seabra (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Bagão Félix: Ouvi a sua intervenção e gostaria de lhe colocar algumas questões. A primeira é esta: o que é que este projecto de lei, se viesse a ser aprovado pela Assembleia da República, vinha mudar à situação hoje existente na segurança social? Creio que quando olhamos, lemos e estudamos o projecto de lei que o CDS nos apresenta, a primeira ideia que ressalta a quem o leia, é esta: o que é que este projecto contém de inovador, o que é que contém que venha mexer com a situação existente?
Era então Ministro dos Assuntos Sociais o Deputado Luís Barbosa, primeiro subscritor do projecto de lei, quando declarou numa entrevista que o seu Governo - o Governo da altura- não iria fazer uma Lei de Bases da Segurança Social, mas sim um decreto-lei arrumando a legislação em vigor. Creio que ele tinha razão quando fez esta afirmação. Este projecto de lei é, antes de mais, uma tentativa de arruma-

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ção da legislação em vigor, mantendo o status quo existente, sem mudar nada do fundamental.
A segunda questão que lhe gostaria de colocar, e terei oportunidade de explicar-lhe mais longamente na intervenção que vou fazer, é esta: o Sr. Deputado falou na sua intervenção, onde tentou ir mais longe do que aquilo que está escrito no texto da lei - o texto do projecto de lei que nos apresentam é bastante mais limitado do que as declarações que o Sr. Deputado fez, talvez porque está agora numa postura diferente, quando o projecto foi elaborado era Secretário de Estado e agora é um deputado da oposição.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Srª Deputada gostaria que me desse alguns exemplos para poder fundamentar a minha resposta.

A Oradora: - Dar-lhos-ei longamente na intervenção que vou fazer logo a seguir e cuja inscrição está na Mesa, dado que agora só disponho de 3 minutos para lhe fazer perguntas.
Diria então o seguinte: o Sr. Deputado disse, por exemplo, que este projecto de lei visaria proteger camadas sociais e regimes de segurança social já existentes e que se encontram em situação de desfavor em relação a outros regimes que são mais favoráveis. Isto é o contrário do que o CDS fez quando esteve no Governo, o inverso da política que o Sr. Secretário de Estado seguiu quando teve durante 3 anos a responsabilidade desta pasta.
Compreendo o tom cauteloso que o Sr. Deputado usou; é porque para aferir o que está contido neste texto, nós não temos só as palavras que aqui pronunciou, temos também a prática do seu Governo durante mais de 3 anos, em que o CDS foi responsável pela pasta da segurança social. E enquanto foi Governo, o CDS, por exemplo, em relação ao regime especial dos rurais afastou-os mais ainda do regime geral de segurança social. Poderemos demonstrar isso com números, e vamos fazê-lo.
O mesmo foi feito em relação aos pensionistas da pensão social, isto é, o CDS teve uma prática governativa inversa àquela que acabou de anunciar.
O Sr. Deputado referiu, por exemplo, que um dos princípios fundamentais seria que as contribuições provindas do regime geral deixassem de financiar os défices dos regimes não contributivos e deu mesmo um exemplo do Orçamento de 1983, creio que de 54 milhões de contos. Ora esse Orçamento é da sua responsabilidade. Mais, é que olhando para os vários orçamentos que foram da sua responsabilidade o que poderemos verificar é que há uma tendência inversa daquela que o Sr. Deputado acaba por teorizar, que seria a positiva, e com a qual eu estou de acordo, ao contrário da sua prática enquanto esteve no Governo.
Outras questões haveria para colocar e teremos oportunidade de o fazer em próxima intervenção, mas creio que o fundamental, que importa colher deste debate, são estas duas perguntas que lhe faço.
Este texto não contém nada de inovador em relação à situação existente. Este texto não contém nada de inovador em relação à prática que o CDS teve quando foi governo, em que não fez nada daquilo que o Sr. Deputado acaba de teorizar quando agora falou, daquela Tribuna.

Vozes do PCP: -Muito bem! Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bagão Félix, o Sr. Ministro do Trabalho também se inscreveu para pedir esclarecimentos. V. Ex.º deseja responder imediatamente ou no fim?

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Prefiro responder já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem V. Exª a palavra.

O Sr. Bagão Félix (CDS). - Srª Deputada Zita Seabra, julgo que V. Exª produziu uma intervenção em si mesma contraditória ao afirmar, primeiro, que nada é inovador no projecto de lei e, depois, que aquilo que nós estamos aqui a dizer, e que está no projecto de lei, não foi nada daquilo que foi feito na prática governativa dos últimos três anos. Afinal, há de facto alguma coisa de inovador.

O Sr. Lucas Pires (CDS): -Muito bem!

O Orador: - De qualquer maneira e relativamente ao que há de inovador no projecto de lei de bases da segurança social, posso apontar-lhe alguns casos concretos, até porque penso que temos de discutir esta matéria pela positiva e não através de argumentos do tipo «quem fez mais, ou quem fez menos», embora eu tenha autoridade moral e política, como ex-Secretário de Estado, para considerar que fizemos aquilo que nenhum Governo anterior tinha feito até essa altura.

Vozes do CDS: -Muito bem!

O Orador: -Quanto às questões concretas, devo dizer que, por exemplo, em relação ao financiamento, o projecto de lei apresenta uma medida nova, uma medida que, acima de tudo, vai tirar um pesado ónus que incide sobre as empresas e sobre os trabalhadores do regime geral e que poderá possibilitar formas de melhorar as suas próprias pensões, reformas e prestações sociais.
Por outro lado, relativamente á segurança social, penso que a questão dos acidentes de trabalho é tratada de forma inovadora, assim como a prestação de desemprego. O mesmo se passa quanto à obrigatoriedade das prestações sociais, dos abonos, dos subsídios e das pensões. E é de facto inovadora, porque neste momento as prestações sociais estão dependentes do livre arbítrio dos governos. Foi por essa razão que entre 1974 e 1980 não houve aumentos, ao contrário do que se verificou entre 1980 e 1983, porque os Governos deste período tiveram mais consideração social pelos estratos mais desfavorecidos da população portuguesa.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Diz a Srª Deputada Zita Seabra que o meu discurso é menos limitado - se bem entendi do que o texto do projecto de lei. Pedi-lhe alguns exemplos, mas a Sr.ª Deputada não mos deu. Provavelmente irá fazê-lo na sua intervenção e então terei, talvez, oportunidade de a questionar melhor sobre esta sua afirmação. .
Por outro lado, falou-me também na questão - foi este o exemplo que me deu e, portanto, é nele que me vou basear - do regime dos rurais e no regime não

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contributivo. Sr.ª Deputada, sempre defendi que estes regimes fossem financiados e subvencionados pelo Estado - e pode ver os meus textos, os meus discursos, as minhas palavras, as minhas intervenções, desde o dia 10 de Janeiro de 1980 -, pelo que não estou a ter agora, como deputado, uma actuação diferente daquela que tinha como Secretário de Estado. Não sou irresponsável nesse sentido.
Efectivamente, o que acontece é que este sistema foi iniciado em 1981 com uma contribuição ainda que mínima, passou depois para l milhão de contos no Orçamento Geral do Estado de 1982 e foi aumentada para 5 milhões em 1983, tendo ainda agora sido reforçada por este Governo. Se notar bem, Sr.ª Deputada, eu referi no meu discurso que o princípio, em si, é inquestionável, mas a sua aplicação prática tem de ser faseada, atendendo à hierarquização das prioridades sociais no nosso país.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Bagão Félix, dou-lhe um exemplo daquilo que afirmei. V. Ex.ª disse no discurso que «agora o CDS pugnava pela aproximação dos regimes especiais e pela sua integração no regime geral». Ora, isso consta da lei de bases, como, aliás, constou de todos os programas de governo da AD até ao último, mas a verdade é que nenhum passo foi dado nesse sentido, antes pelo contrário. Sr. Deputado, com discursos não se vai lá, mas sim com a adopção de medidas práticas.
E dou-lhe um exemplo concreto em números: em 1979 a diferença entre as pensões médias do regime geral e as pensões dos regimes rurais era de 2170$, em 1980 era de 2280$, em 1981 era de 2630$ e em 1982 de 3010$. Isto é, há um afastamento entre os dois regimes, com uma degradação real da situação do regime dos rurais, que já era mais desfavorecido. Esta diferença atingiu, pois, quase os 40 % durante o período em que o Sr. Deputado Bagão Félix foi Secretário de Estado.
Ora, não é, na verdade, com um discurso que se altera esta situação, é com a prática governativa. E quando o Sr. Deputado Bagão Félix esteve no Governo e podia ter alterado esta situação, isto é, podia ter aproximado os dois regimes, podia ter melhorado o regime dos rurais cuja situação é realmente insuportável, a verdade é que fez exactamente o contrário, ou seja, afastou esses dois regimes.
Mas outros exemplos irei dar aquando da minha intervenção, relativamente ao aspecto que acabo de referir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix, para contraprotestar.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Bem, de facto, não posso deixar passar em branco a afirmação da Sr.ª Deputada Zita Seabra, porque ela veio manipular os números ao referir apenas o diferencial absoluto. Mas os números estão aqui, todos os podem obter e basta verificá-los.
A verdade é que a pensão do regime geral aumentou 99,2 % nos 3 anos de 1980 a 1982, a pensão do regime rural aumentou 152 % e a pensão social aumentou 144 %.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - E a diferença entre elas? Por aí é que se pode aferir!

O Orador: - Sr.ª Deputada, essa é uma análise ...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Com certeza, Sr.ª Deputada, mas antes devo dizer-lhe que essa é uma questão de matemática!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Pode ser uma questão de matemática. É evidente que se V. Ex.ª compara percentagens tem esse resultado, porque a pensão dos rurais era mais baixa e, portanto, a diferença entre elas aumentou. É isso que eu lhe pretendi demonstrar e o Sr. Deputado com esse número não demonstra o contrário.

O Orador: - Acho que estas questões têm de ser analisadas em termos de aumentos relativos, em termos de política social. Se a Sr.ª Deputada não entende assim, creio que haverá condições, nomeadamente através da álgebra, de resolver melhor o problema.

Risos gerais.

A Sr.ª Deputada veio dizer que eu, como Secretário de Estado - ou o Governo em que me integrava, obviamente -, durante 3 anos não produzi nada de benéfico para estas classes sociais mais desfavorecidas, apesar de lhe ter dado aqui exemplos do contrário. Mas para os exemplos ficarem mais claros, devo dizer que este aumento da pensão dos rurais foi de 152 % nestes 3 anos, sem contrapartida de maior esforço dos beneficiários - e isso é importante -, além de se ter verificado um aumento da capacidade de recuperação financeira da segurança social através da moralização do sistema de segurança social, combatendo as fraudes e os abusos - coisa que o Partido Comunista não faz.

O Sr. João Amaral (PCP): - Os patrões estão desse lado!

O Orador: - Não me interrompa agora, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Eu não interrompo, só quis dizer que os patrões estão desse lado!

O Orador: - Para além do que disse é importante comparar quanto é que foram aumentadas as pensões dos rurais entre 1974 e 1980, num período que o Partido Comunista prefere ao período dos governos da Aliança Democrática. Quanto é que foram aumentadas nesse período, Sr.º Deputada? Zero! Ë esta a resposta que tem de dar.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, também para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Bagão Félix.

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O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social (Amândio de Azevedo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Ministério do Trabalho e Segurança Social considera muito importante que haja oportunidade para um debate sobre a segurança social nesta Assembleia. E creio que uma clara demonstração da importância que este Governo atribui à segurança social, está patente no recente aumento das pensões, que vai efectivar-se a partir de Dezembro, e que significou, num ano de crise que todos conhecem, um contributo especial e suplementar do Orçamento do Estado de nada menos do que 6 milhões de contos. Compreende-se assim que o Ministério do Trabalho e Segurança Social reconheça a vantagem de se dar mais um passo na melhoria do sistema de segurança social, nomeadamente através da aprovação de uma Lei de Bases da Segurança Social.
Mas daqui parto eu para fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Bagão Félix ! Esta importância que o Governo atribui à segurança social leva, naturalmente, a concluir que é seu dever dar o contributo máximo para que esta lei de bases corresponda aos interesses do país e, naturalmente, que apresente nesta Assembleia uma proposta de lei, isto é, a sua visão própria acerca deste problema. O Governo está em funções há 5 meses e na sua escala de urgências não pareceu que devesse dedicar uma atenção de prioridade absoluta à elaboração de uma lei de bases; pareceu mais urgente a elaboração, naturalmente, do orçamento da segurança social, do aumento de pensões, da resolução de problemas pontuais, que têm sido resolvidos e que têm carácter de muita urgência. Mas pensa, por outro lado, que poderá apresentar uma Lei de Bases da Segurança Social, a esta Assembleia, dentro do prazo de 2 meses.
Sendo assim, pergunto se não seria melhor para todos, sobretudo melhor para o País, que o CDS, renunciando ao seu direito de discutir e de fazer votar hoje o projecto de lei de bases da segurança social, aceitasse o adiamento deste debate para uma altura em que ele pudesse ser feito conjuntamente, isto é, com o seu projecto de lei e com a proposta de lei de bases da segurança social, que o Governo tenciona apresentar, como disse, num prazo de 2 meses.
Pela parte do Governo, gostaria que efectivamente esta proposta fosse aceite pelo CDS, porque assim, seguramente, seria possível que desta Assembleia saísse um texto - uma lei de bases mais conforme com os interesses do país e, naturalmente, permitindo que nesse debate o Governo assumisse em plenitude e esta Assembleia também - as suas responsabilidades.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Morais Leitão deseja usar da palavra para responder ao Sr. Ministro?

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Sr. Presidente, creio que a questão do Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social é dirigida ao Grupo Parlamentar do CDS. E como eu deduzo das palavras do Sr. Ministro do Trabalho que o Governo tem a ideia de, dentro de 2 meses, apresentar uma proposta de lei de bases da segurança social e que, por outro lado, formulou um pedido ao CDS no sentido de se considerar a hipótese de adiamento deste debate - e, portanto, suponho que é adiar o debate e não renunciar ao pro

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jecto de lei -, a minha bancada pedia um quarto de hora de suspensão dos trabalhos para poder reunir, reflectir e deliberar sobre este assunto.

O Sr. Presidente:.- Srs. Deputados, não fizemos ainda o intervalo regimental. Portanto, fá-lo-iamos agora e os trabalhos recomeçariam às 18 horas e 40 minutos.
Está suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho , (CDS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, peço a interrupção da sessão por 15 minutos.

O Sr. Presidente: -Está concedida. Retomaremos os nossos trabalhos às 19 horas e 25 minutos.

Eram 19 horas e 6 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

Deu entrada na Mesa um requerimento, apresentado pelo CDS, cujo texto é o seguinte:
O Grupo Parlamentar do CDS, ao abrigo das normas regimentais aplicáveis, vem requerer a prorrogação dos trabalhos da presente sessão até à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 93/111.

Vamos votar o requerimento que acabei de ler.

Submetido d votação, foi aprovado com votos a favor do PS, do PSD, do PCP, do CDS e da ASDI, votos contra dos Srs. Deputados Manuel Alegre e Marcelo Curto do PS e as abstenções da UEDS, registando-se a ausência do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: -Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estive presente na Sala desde a interrupção e estava possuído da maior expectativa, sentia-me mesmo partícipe numa história de mistério que agora teve um desfecho que já podia ter tido há uma boa meia hora.
A razão da nossa abstenção deve-se ao facto de ela servir para protestar contra a falta de consideração para com os deputados desta Assembleia, já que nos fizeram estar aqui muitos minutos à espera de uma decisão que, de facto, já poderia ter sido tomada, visto que os deputados do partido requerente estão na Sala há três quartos de hora, pelo menos, e portanto já podiam ter anunciado esta decisão há bastante tempo.

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De facto, nada justifica que estejamos aqui há pelo menos três quartos de hora para depois acabarmos por votar um requerimento que já há muito podia ter sido apresentado!
A nossa abstenção significa, apenas, o nosso protesto pela pouca consideração demonstrada pelos deputados desta. Assembleia em relação a esta matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração de voto, a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o requerimento de prolongamento dos trabalhos, porque pensamos que é inadmissível a atitude que o Governo tomou nesta questão. Isto é, não podem admitir que o Governo sabendo há mais de 1 mês- que esta matéria está agendada para discussão em Plenário - e está pendente para discussão praticamente desde o início dos trabalhos da Assembleia da República -, que tenha vindo hoje à Comissão de Saúde e Segurança Social discutir assuntos relacionados com a segurança social - nomeadamente o seu orçamento para o ano que vem - e não tenha tido o mínimo de respeito para com os deputados e para com a Assembleia da República anunciando aí que o Sr. Ministro iria fazer a proposta que acabou de fazer, que agora é feita já a meio de um - debate, já com intervenções produzidas, no sentido de que esse debate seja adiado para daqui a uns meses.
Creio que isto é, na verdade, um desrespeito para com a Assembleia da República. Temos acusado o Governo de governamentalizar a Assembleia da República, mas creio que este é um exemplo por demais escandaloso, porque já não se trata apenas da governamentalização da ordem de trabalhos que é discutida na reunião de líderes - em que só se agenda aquilo que o Governo quer -, mas é também uma intervenção no próprio debate, nas competências que esta Assembleia exerce de acordo com o seu Regimento. O que o Governo agora faz é pressão, é chantagem e tenta fazer adiar um debate e uma votação de um projecto de lei perfeitamente normal e regimental, que está agendado há mais de 1 mês!
Parece-nos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este comportamento do Governo é verdadeiramente inaceitável!

Aplausos do PCP.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª não pode fazer qualquer declaração de voto.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Deixo ao cuidado do Sr. Presidente a ponderação do meu pedido de palavra, que tem a seguinte justificação: a Sr.ª Deputada Zita Seabra na sua declaração de voto fez afirmações de crítica ao Governo e o Governo, justamente porque não está aqui na atitude que a Sr. Deputada enunciou, pretende, por respeito para com a Assembleia, dar explicações sobre essas críticas.

Se a Assembleia assim o entender, muito bem. Caso contrário, o Governo aceitará a deliberação da Assembleia.
Não peço para fazer um protesto, porque penso que essa não é a figura regimental apropriada. Todavia, gostaria de usar da palavra e, se não houver outro recurso, o Sr. Presidente pode perguntar ao Plenário se, indo além do Regimento, ele concede ou não ao Governo o direito de dizer aquilo que entende sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, nesta fase estamos apenas a fazer as declarações de voto em relação à votação do requerimento de prolongamento da sessão.
Naturalmente que o Sr. Ministro, depois dos trabalhos serem retomados, pode fazer uma intervenção em que responda à Sr.ª Deputada Zita Seabra, mas neste momento não pode, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Sr. Presidente, permita-me que lhe diga que se trata de declarações de voto relativas a uma votação em que o Governo não intervém, também não me parece ser este momento adequado para serem feitas críticas ao Governo aqui presente.

Vozes de protesto do PCP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais declarações de voto, vamos continuar os nossos trabalhos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para uma intervenção.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS usou dos seus direitos regimentais para marcar 2 dias do Plenário da Assembleia da República -agora marcou um- para discussão e votação do seu projecto de Lei de Bases da Segurança Social.
Têm esse direito e creio que ninguém o pode nem vai contestar!
Mas analisar as razões que levaram o CDS a fazê-lo, e a fazê-lo agora, é também um direito dos outros grupos parlamentares.

Porquê este projecto de lei hoje?
Elaborado quando o CDS tinha a responsabilidade da segurança social no Governo, este texto foi retomado como projecto de lei pelo seu grupo parlamentar e agora agendado, usando o direito de marcação da ordem do dia. Tudo certo, tudo normal, excepto, como já referi, a intervenção do Governo!
Mas porquê este projecto de lei hoje? Qual a razão de ser de tanta pressa? Que mudaria no País e em que sentido se o projecto de lei fosse aprovado?
A razão de ser fundamental de tanta pressa parece fácil de perceber. A bancada do CDS ainda não encontrou uma linha segura de acção parlamentar. Hesita entre uma cordata oposição de palmada amiga nas costas do Governo e a incapacidade de desenvolver uma acção própria específica.
Mas compreendemos! O CDS perdeu 16 deputados, foi abandonado pelo seu presidente histórico, mas, sobretudo, o CDS é julgado ainda hoje pelos Portugueses através da sua prática governativa (e o CDS foi o partido que mais anos esteve no Governo) e não pelos discursos parlamentares dos seus actuais 30 deputados.

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É pois lógico que olhando para as iniciativas legislativas do CDS, tenham escolhido esta. O CDS entregou até hoje na Mesa da Assembleia da República 21 projectos de lei; o PC P entregou 971
Mas escolheram mal, Srs. Deputados! Se algo se pode dizer deste texto é que se trata de uma lei de bases que nada modifica, que legisla sobre o que está, do que já existe, que pura e simplesmente costura e soma as leis e decretos - em vigor, num diploma único a que chama lei de bases. Não é pois de um projecto de lei de bases da segurança social que se trata, que viesse dar cumprimento aos princípios constitucionais e que perspectivasse o futuro, mas sim, acima de tudo o mero exercício legislativo que tenta somar e arrumar - e o faz mal - a legislação já existente, que nem sequer era muita. Mas o CDS faz isso de tal forma vaga e imprecisa que este projecto mais parece um artigo sobre a segurança social existente de um texto legal inovador.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas é bom esclarecer que nós, comunistas, não temos nada contra o facto de que em determinada área ou secretaria de estado se «arrume» a casa em termos legislativos e mesmo até que se lhe chame pomposamente «lei de bases». Mas neste caso o que o CDS faz é renascer leis anteriores ao 25 de Abril e aos conceitos delas emanados, tentando transformá-las em leis da República em vez de desenvolver os conceitos constitucionais e partir da realidade nacional actual, para que o Estado disponha dos mecanismos legais para proteger os portugueses que sentem na pele as consequências da crise económica e da prática dos últimos Governos.

O Sr. António Mota (PCP):-Muito bem!

A Oradora: - O primeiro aspecto que ressalta deste texto é pois que não contém nenhuma alteração de fundo, nada de realmente inovador, nada que se traduza no benefício real para os Portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em matéria de organização dos sistemas de protecção social dos cidadãos há, digamos, dois conceitos básicos fundamentais: o de previdência, em vigor durante o regime fascista, e o de segurança social, consagrado no artigo 63.º da Constituição.
A Previdência faz depender o direito da contribuição paga e do seu valor e não da necessidade da pessoa e igualmente desconhece a solidariedade social. Foi assim durante o fascismo e a previdência dava lucros. Chega-se ao ponto de milhares e milhares de trabalhadores não serem abrangidos por nenhum sistema ou pura e simplesmente, no fim da vida, verificarem que o patrão não os tinha inscrito ou os inscrevera tão tardiamente que os deixavam sem direito a reforma.
Mas para os cidadãos carenciados e desprotegidos restava a caridade institucionalizada na «sopa dos pobres» ou provinda dos actos de «bondade» dos chás canasta das senhoras de sociedade que tinham muita pena dos pobrezinhos ...
Segurança social, consagrada nos seus princípios fundamentais no artigo 63.º da Constituição, é algo de bem diferente, parte de uma filosofia oposta.
Os cidadãos têm direitos e têm-nos em situação de carência. Vale a pena relembrar o artigo 63.º da Constituição no seu n.º 2:

O sistema da segurança social protegerá os cidadãos na doença, na velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego, e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.

É pois dos princípios constitucionais que uma lei de bases deveria partir e que na presente conjuntura político-económica para a qual os sucessivos Governos, juntamente com o FMI, têm atirado o País, seria particularmente importante fazê-lo. Na verdade, com o aumento do desemprego e dos despedimentos, com os salários em atraso, a escassez de primeiro emprego, perante as dificuldades crescentes dos trabalhadores e das suas famílias, seria necessário, através da segurança social, tomar medidas sérias, no imediato, de redistribuição mais justa da riqueza nacional para atender às necessidades básicas e proteger os direitos das classes e camadas mais necessitadas.
Porém, nada disso é feito. Aponta-se, como aliás já existe, para uma solução mista, que se radica em razões históricas mas que no entender do Grupo Parlamentar do PCP é urgente mudar. Mas para isso esta lei não poderia partir do CDS, o partido que defende exactamente os interesses daqueles que são contra a justiça social, contra os trabalhadores, dos tais que devem milhões à Previdência.
Seria necessário para concretizar uma mudança positiva na segurança social que o projecto de lei de bases partisse entre outros dos seguintes princípios básicos fundamentais:

1) Participação dos trabalhadores na definição da política de segurança social e directamente na gestão dos seus organismos a todos os níveis;
2) Alteração dos esquemas de financiamento com a participação do Estado na cobertura do regime não contributivo, na acção social e nos défices do regime reduzidamente contributivos (regime dos rurais e dos independentes);
3) Redefinição dos direitos sociais que não existem ou que estão hoje reduzidos a quase nada, como é o caso do subsídio a famílias em situação de completa carência, que não existe, ao do apoio à maternidade, que é extremamente insuficiente;
4) Intensificação da construção pelo Estado de equipamento social de apoio à família nomeadamente lar, creches, centros de ocupação dos tempos livres;
5) A indexação das pensões de reforma que impeça a constante perca do poder de compra dos reformados e pensionistas;
6) A integração dos chamados regimes especiais no regime geral pois não se pode entender que homens e mulheres que trabalharam uma vida inteira no campo tenham uma pensão de reforma e direitos sociais muito mais baixos e reduzidos que os outros.

O Sr. António Mota (PCP): - Muito bem!

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A Oradora: - O projecto de lei em apreço não muda, porém, no seu fundamental, estas questões. E quando procura criar qualquer comando que altere minimamente o já existente, é tão vago que se fica pela enunciação simples de uma intenção ou remete simplesmente para legislação posterior para a qual não estabelece nem prazos nem limites.
Basta ilustrar esta afirmação com dois exemplos significativos de duas questões fundamentais que são política de segurança social: a indexação das reformas e o regime dos trabalhadores rurais.
Vejamos a primeira. Todos os Governos até hoje - e particularmente aqueles de que o CDS fez parte - propõem no seu programa a indexação das pensões de reforma mas nenhum o fez! O projecto de lei usa um subterfúgio e propõe assim como solução o que não o é: cito «Os montantes das prestações pecuniárias do regime geral são graduados com referência, entre outros elementos, aos salários ou rendimentos do trabalho, reais ou presumidos, sobre que incidem as contribuições para o regime geral». Isto é o mesmo que não dizer nada!
No entanto, a reivindicação dos reformados, do movimento sindical unitário e a legislação que seria minimamente justa, seria que se indexasse o valor das pensões de reforma ao salário mínimo nacional (55 % do seu valor) pois este já é concebido em termos de garantir o mínimo de subsistência. Embora Portugal não tenha ainda ratificado a Convenção da OIT que o estabelece, ratificou porém o protocolo adicional ao código europeu, que não está a ser cumprido nem o viria a ser através do projecto de lei do CDS.
Quanto ao regime dos trabalhadores do campo, dos camponeses, igualmente todos os programas do Governo e propostas da campanha eleitoral propõem a integração das pensões do chamado regime especial dos trabalhadores rurais no regime geral. Este projecto de lei, em vez de o fazer, cria um esquema (na base 59) que aponta para a manutenção da situação presente como aliás a epígrafe o demonstra: «subsistência transitória de regimes especiais. Até quando se mantém esse transitório? Prazos e datas, tudo está omisso! E os Governos, como o actual do PS e do PSD lá vão distanciando cada vez mais os regimes, dizendo sempre belas palavras sobre os camponeses deste país.
Mas, antes de analisarmos mais de perto alguns aspectos do projecto de lei é necessário conhecer o que o CDS fez como responsável por esta Secretaria de Estado, que o foi desde o governo de Sá Carneiro.
O CDS, então na AD, serviu-se escandalosamente da segurança social para, na véspera das eleições, enganar os portugueses com umas benesses sociais.

O Sr. António Mota (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Vejamos os números: as pensões médias anuais do regime geral aumentaram cerca de 18,8 % em 1980, 19,6 % em 1981 e 15,7 % em 1982. Estes aumentos resultam não só da actualização mas também da entrada em funções das novas reformas calculadas com base em salários menos desactualizados. Nesses mesmos anos o custo de vida aumentou 16,6 % em 1980 - isto é, neste ano, em que houve eleições, os reformados recuperaram poder de compra -, 20% em 1981 - e neste ano já perderam poder de compra - e 22,4 % em 1982. Consequentemente, mesmo entrando em linha de conta com os aumentos provenientes das novas pensões, os reformados do regime geral perderam seriamente poder de compra enquanto o CDS fez parte do governo, na Secretaria de Estado da Segurança Social. O mesmo se passa com o chamado regime especial como iremos demonstrar numa intervenção que sobre essa matéria faremos.
Mas ainda como responsável pelo governo o CDS revogou o decreto-lei de esquema mínimo de segurança social do governo de Maria de Lurdes Pintassilgo e reduziu-lhe o âmbito.
Inscreveu em todos os programas de governo que integraria na segurança social os acidentes de trabalho - como, aliás, referiu o Sr. Deputado que falou - mas nunca o fez. Aumentou os períodos de garantia das pensões e reformas de invalidez e sobrevivência, que ficaram assim superiores aos mínimos definidos na Convenção n.º 102 da OIT que Portugal ratificou.
Afastou os representantes dos trabalhadores, os vogais sindicais, dos organismos de gestão da segurança social e remeteu-nos para a participação em meros organismos consultivos, em estatuto de igualdade com os representantes do patronato e de estruturas privadas da segurança social.
Promoveu o financiamento das IPSS com verbas provenientes das contribuições dos trabalhadores e deixou aumentar escandalosamente as dívidas das entidades patronais à segurança social. Vejamos os números: em 31 de Dezembro de 1979 a dívida era de 31,3 milhões de contos, em 1980 era de 33,5 milhões de contos, em 1981 era já de 38,9 milhões de contos e em 1982 - isto é, nos últimos 6 meses de gestão do CDS na segurança social - chega a 52,7 milhões de contos e em 30 de Junho deste ano ultrapassa já esse número. Isto significa que a dívida aumenta em número, mas também se verifica um acréscimo anual dessa mesma dívida: 1980 é de 2,2 milhões de contos, 1981 de 5,4 milhões de contos, 1982 de 11,8 milhões de contos, 1983 de 9,3 milhões de contos em 6 meses, sublinho 6 meses. Isto traduz-se num imenso salto verificado nos últimos 6 meses de gestão AD em que praticamente atinge no 1.º semestre deste ano o montante de todo o ano anterior. Ë bom, porém, salientar que o PS e o PSD não só não estão a alterar minimamente esta situação como estão mesmo a deixá-la agravar ainda mais.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O actual Governo consente impunemente que o patronato se sirva do dinheiro descontado aos trabalhadores como forma de autofinanciamento e hoje Portugal vive uma situação verdadeiramente subversiva e de desrespeito pela ordem democrática em que o patronato não paga à Previdência, não paga salários, não cumpre legislação sobre os direitos sociais dos trabalhadores, não paga ao Fundo de Desemprego e nada, mas nada, lhe acontece!

Vozes do PCP: - É uma vergonha!

A Oradora: - E nós, deputados comunistas, encontramos cada vez mais casos, do norte ao sul do País, de empresas em que os trabalhadores nos dizem: eles

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devem à Previdência mas acabam de comprar um novo Mercedes, eles devem à Previdência mas foram passar férias ao Japão, eles devem à Previdência mas jogam todas as noites no casino ...
O Governo actual, no seguimento dos anteriores, vem deixando mês a mês piorar a situação e, como único remédio para cobrir o défice da segurança social, apresenta-se na Assembleia a lançar novos impostos ... sobre os trabalhadores ...

Vozes do PCP: - E um roubo!

A Oradora: - Mas o CDS, como responsável por esta Secretaria de Estado, fez mais: não só deixou aumentar a dívida como nos últimos meses deixou baixar a verba entrada por conta dos juros de mora, o que não pode deixar de significar que há, ou houve, amnistias. Assim, em 1979, receberam-se 424 800 contos: em 1980, foram 210 000 contos; em 1981, foram 363 000 1980, foram 210 000 contos; em 1981, foram 363 600 contos, mas no 1 º semestre receberam-se 100 contos.
Além disso, foi com o CDS no governo que aumentaram ainda mais as diferenças existentes entre o regime geral de segurança social e o chamado regime especial dos rurais e não foram nunca actualizadas as pensões superiores à mínima por doença profissional. E o CDS abriu um novo estilo em matéria de propaganda governamental fazendo difundir na comunicação social os direitos sociais dos portugueses, gastando milhares de contos a anunciar aumentos das pensões de reforma que se processam automaticamente pelos serviços, e pura e simplesmente não divulgou nunca direitos que os cidadãos desconhecem ter e que por isso não os requereml '

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Isto é, o CDS serviu-se pura e simplesmente do aparelho de Estado e dos dinheiros públicos, que não abundam, para propaganda governamental. Nisto foi de pronto seguido pelo actual Governo que igualmente fez já publicar em todos os jornais e noutros meios de comunicação social os recentes aumentos decretados e que o computador vai processar.
E pois, porque o CDS teve esta prática governamental que este projecto de lei é o que é: vago, impreciso, não alterando nada da realidade hoje existente.
Vale a pena, porém, acrescentar mais dois ou três pormenores de uma leitura mais de perto do articulado. O projecto enferma de uma visão governamentalista quanto ao cumprimento das normas constitucionais da segurança social ao atribuir ao Governo a competência para a definição e execução da política de segurança social e não têm conta que nesse processo intervêm obrigatoriamente a Assembleia da República, tanto no plano legislativo como no uso das suas competências políticas.
No caso dos acidentes de trabalho - um aspecto fundamental da política de segurança social - fica-se pelas vagas intensões.
No entanto, a protecção dos riscos de trabalho deve ser objecto de legislação específica e urgente, tanto na prevenção como na reparação, integrando-se neste conceito a reabilitação médica e profissional, a colocação ou a recolocação profissional. Esta protecção só será possível e conseguida com a institucionalização

do seguro social dos acidentados do trabalho e doentes profissionais que substitua a actual Lei n.º 2127, e que defina uma política nacional de prevenção dos riscos profissionais. O CDS não engloba isto no seu projecto
O projecto, por outro lado, não define os valores mínimos nem máximos para as prestações substitutivas de salários, nem as formas de financiamento da acção social. Numerosas disposições revelam-se incompletas ou incorrectas. Apontamos a título de exemplo o nº 2 da base xxi relativa às contribuições em dívida (de resto o único, repito o único ponto em que o assunto é abordado) que incompreensivelmente está incluído no capítulo sobre a garantia do direito às prestações. Ou será que o CDS pretende que se regresse à legislação dos anos 40, segundo a qual se penalizavam os trabalhadores por os patrões reterem as contribuições? Tanto mais que na base VII, nº 1, não se responsabiliza expressamente as entidades patronais pela inscrição dos trabalhadores ao seu serviço.
A base x mistura no mesmo saco os trabalhadores por conta de outrém e os independentes, o que faz pressupor que os interessados podem requerer determinados direitos. Passarão, por exemplo, os independentes a ter direito ao subsídio de desemprego?
A base v«i é no mínimo estranha. Quererá verdadeiramente dizer que existe uma inscrição facultativa, no âmbito do regime geral? E quem a financia? Serão as verbas provenientes das contribuições dos trabalhadores por conta de outrém?
Outros aspectos poderiam ser referidos, mas tememos que a demasiada pormenorização das opiniões do Grupo Parlamentar do PCP levem a esconder o fundamental da nossa posição: este projecto de lei não traria uma única melhoria da situação em que se encontram os beneficiários da segurança social. Seria a consagração de um novo diploma, numa lei da República da presente situação, que no entendimento dos comunistas tem de ser mudada, não só olhando para o presente, mas sobretudo para o futuro.

Vozes do PCP: -Muito bem!

A Oradora: - Com a política presente do Governo do PS/PSD e os acordos celebrados com o FMI prevêm-se ainda restrições aos já magros direitos sociais dos trabalhadores portugueses. Esta política conduz ao aumento do desemprego, aos salários em atraso, à degradação das condições de vida do povo, à perda do poder de compra dos reformados e pensionistas, à baixa de construção de equipamento social de apoio à infância e à velhice. Se continuar, acentuar-se-ão as desigualdades sociais e a fome que hoje já bate à porta de tantas famílias agravar-se-á. E sintoma bem nítido disso mesmo o facto de várias Misericórdias terem feito renascer a sopa dos pobres, que alimentou muitas pessoas, durante o fascismo, para nossa vergonha! E não é só à porta da Misericórdia que batem! Há dias, o Sr. Bispo de Setúbal referia, com preocupação, que cada vez um maior número de cidadãos estava a recorrer às igrejas para pedir comida ...
E pois urgente equacionar o sistema de segurança social. Este texto do CDS não é sequer, quanto a nós, um aceitável ponto de partida para se trabalhar.
Como diz a cantiga «para melhor está bem, está bem, para pior já basta assim»!

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Morais Leitão e Luís Barbosa.
Para o efeito, tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Morais Leitão.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, é sempre com uma certa admiração que. a vejo intervir em matéria de segurança social. Não enjeito, pois, o brilho das suas intervenções; até me parece que na que acabou de fazer, apesar das críticas virulentas que teceu, reconheceu a utilidade, a importância e a prioridade deste projecto de lei do CDS.
É claro que o Partido Comunista tem necessidade de se apresentar como o campeão dos oprimidos, da luta de classes, do miserabilismo nacional - já estamos habituados a isso -, mas não há dúvida de que, pelo menos pelo facto de não ter definido desde já, como é costume, o sentido de voto do seu partido, reconhece a importância duma Lei de Bases da Segurança Social. Gostaria que confirmasse esta impressão que colhi do seu discurso.
A principal acusação que V. Ex.ª faz ao nosso projecto de lei é a de que ele «não traz nada de novo em benefício dos mais desfavorecidos». Assim, pedir-lhe-ia que me citasse quais as normas legais em que actualmente estão garantidas, previstas ou impostas algumas questões, que, aliás, o projecto de lei largamente aborda. Em primeiro lugar, a actualização periódica das pensões e prestações sociais. Onde está? Em parte nenhuma. Neste projecto está!
Outra questão: a revalorização periódica da base salarial das pensões. Onde está? Em parte nenhuma. Talvez V. Ex.ª saiba! ...
Ainda outras questões: contribuição do Orçamento Geral do Estado para o financiamento do sistema não contributivo - também não me parece que esteja em parte alguma!; integração do regime de acidentes de trabalho na segurança social- o Partido Comunista foi o grande campeão da defesa desta tese e não ouvi que a referenciasse, tese que me parece bem justificada; criação, no contexto da segurança social, de um verdadeiro seguro de desemprego - também não vejo que isso esteja nalgum lado; consagração das instituições privadas de solidariedade social como elemento integrante do sistema de segurança social, aliás imposto pela Constituição- é indispensável que uma lei quadro o consolide; finalmente, a participação, não apenas numa visão laborista da segurança social e dos representantes dos contribuintes, mas de todos os utentes na sua gestão.
V. Ex.ª acusou o Governo anterior de ter impedido essa participação. Creio que conhece a figura dos Conselhos Regionais de Segurança Social, que constituem uma forma correcta no sentido de se criar, gradualmente, uma participação efectiva de todos os utentes, porque para ser «segurança social» não pode apenas viver de patrões e empregados; como sabe, tem de viver de todos os interessados à volta dessas prestações sociais.
Ficar-lhe-ia muito grato, Sr.ª Deputada, pelos esclarecimentos ou pela integração que prestasse a estas minhas lacunas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, ouvi-a com atenção e irei colocar-lhe uma questão muito simples.
A Sr.ª Deputada falou de que seria necessário aumentarem-se os benefícios dos beneficiários da segurança social, e eis um tema sobre o qual estamos todos de acordo. Só gostava de lhe pedir que me esclarecesse onde é que vai buscar os recursos para aumentar esses benefícios, dado que as receitas da segurança social não se conseguem esticar muito mais; apesar de toda a diatribe desenvolvida em relação às dívidas à segurança social, não tenho nenhuma dúvida de que elas se vão agravar nos anos mais próximos, pelo menos em 1984 vai ser assim.
O esquema que surgiu em 1975 está hoje completamente invertido. Nessa altura apresentavam-se aos bancos folhas de salários para se obter financiamentos de modo a que aqueles pudessem ser pagos, e os bancos davam esses financiamentos até sem saberem bem como eram dados. No momento actual isso passa-se exactamente ao invés: primeiro estão o crédito e os juros a pagar aos bancos, depois os fornecedores, depois os trabalhadores e no fim a segurança social.
É esta a realidade! Se uma empresa não entrar nela pára, pura e simplesmente, e a partir daí não há nem salários para os trabalhadores - mesmo que sejam atrasados - nem contribuições para a segurança social, nem produção, nem empresa viva.
Portanto, dado que o Orçamento da Segurança Social não vai ter recursos para isso, como não parece ser viável aumentar as contribuições para a segurança social para além do limite em que já estão, pergunto se os vamos sacar do Orçamento do Estado e, nesse caso, onde vamos cortar. Será que ainda vamos aumentar mais os impostos?
Fico por aqui, porque penso que tudo o resto são comentários que, enfim, pretendem obter um certo efeito político, mas que, não tendo em conta a realidade dos números sobre os quais a segurança social terá de trabalhar, não parece poderem conduzir a grande coisa a não ser a um ou outro título nos jornais, se estes estiverem dispostos a puxar por essas ideias.
As verdades relativas às necessidades dos reformados, das populações rurais, são verdades absolutas, indiscutíveis. Tenho delas uma percepção perfeitamente clara, pois andei por esse «mundo» dos reformados, dos inválidos e tomei contacto com elas de perto. O problema que está em causa é o de saber como é que vamos aplicar os recursos do Estado, se para este lado se para o outro.
Como Ministro dos Assuntos Sociais que fui durante cerca de ano e meio, várias vezes chamei a atenção de que havia uma clara distorção na distribuição desses recursos. O Estado não pode continuar a ser entidade patronal, a ser capitalista, a utilizar os seus recursos para funcionamento, e mesmo assim mau, das empresas públicas e, por outro lado, a atender às suas necessidades sociais. Esta opção tem de ser resolvida. A partir daí, se calhar, o Orçamento do Estado poderá contribuir mais para a segurança social, o que aliás é vulgar noutros países da Europa. Então, talvez isso possa vir a trazer algumas melhorias nítidas para esses cidadãos que são, com certeza, os mais desfavorecidos de todos nós.

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Essa opção tem de ser feita. De contrário, estamos a falar no vago, em algo que será desejável, mas que não se transforma em realidade.

O Sr. Presidente: -Tem a plavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra para responder.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): -Começando por me referir ao Sr. Deputado Morais Leitão, direi que consideramos ser de grande utilidade a discussão de uma lei de bases e nomeadamente deste projecto ou de qualquer outro que viesse colocar na Assembleia da República a questão geral da segurança social. E tanto é assim que desde o início encarámos com toda a seriedade este debate e nos preparámos para ele. Todo o meu grupo parlamentar o fez, temos duas intervenções programadas, exactamente porque levámos a sério a importância que este debate tinha, o que, aliás, contrasta flagrantemente com a postura com que o Governo aqui se apresenta, em que só a meio do debate é que vem dizer que ainda não tem a sua proposta de lei pronta -só daqui a 2 meses é que vai estar-, que ainda não está preparado para discutir este assunto e que daqui a 2 meses estará.

Irei agora reportar-me à questão que me colocou sobre o que é que há e o que é que não há de novo. Quando o Sr. Deputado refere a actualização periódica das pensões de reforma, dir-lhe-ei que isso consta aqui apenas como enunciado genérico; o que aqui está não obriga a nada, não fala da periodicidade nem sequer estabelece a sua anualidade ou indexação. O que seria realmente inovador - e aí,. usando uma expressão comum, tiraria o meu chapéu ao CDS - era se o CDS as indexasse ao salário mínimo nacional, como acontece em todos os países com um esquema mínimo de segurança social. É que o salário mínimo já está pensado e concebido em termos da subsistência mínima de um cidadão,

Bom, isso não consta do projecto de lei. Mas o Sr. Deputado também pode dizer: «mas também não deixa de estar! » Pois não, mas o que é certo é que não está, e uma lei não é um enunciado genérico de princípios, porque para isso já temos o Programa do Governo. Aliás, os quatro pontos que o Sr. Deputado referiu constam de todos os programas de todos os Governos, estão em todos os discursos que são feitos sobre segurança social.

Ora, o que se pretende e o que seria importante fazer-se numa lei de bases era consagrar-se isso de forma a não haver qualquer espécie de fuga ao cumprimento desse mesmo princípio, que toda a gente diz que faz mas não faz.

O mesmo se poderá dizer em relação à questão dos acidentes de trabalho. Há anos, até, foi aqui apresentado um projecto de lei do PSD sobre isso e nessa altura todos os partidos estiveram de acordo que era importante, mas até hoje não se escreveu nenhuma linha sobre isso.
Ora bem, este projecto de lei não estabelece nem prazos, nem limites, nem datas, nem nada; fica-se pela enunciação vaga do princípio. É por isso que eu digo que ele não contém modificações substanciais.
De resto, nós, no nosso grupo parlamentar, fizemos um exercício comparativo entre a legislação existente e o projecto de lei em apreço e parece-nos que, em termos de saber quais são os aspectos inovadores, isto

é, quais são os mecanismos que ficam realmente estabelecidos na lei como inovadores, não encontrámos, senão, princípios genéricos - inclusive os que V. Ex.ª referiu -, que até já estão estabelecidos na Constituição.

Mas para lhe dar exemplos concretos de aspectos efectivamente inovadores, mas que são maus princípios, refiro-lhe: na base VIII, a inscrição facultativa e, na base XIX, a substituição de prestações pecuniárias por prestações em espécie.

Quanto à questão da participação, devo dizer que de facto não foi da responsabilidade do CDS a criação desses centros regionais e organismos consultivos, já vinha de trás do governo PS/CDS. Mas o que é facto é que o CDS não alterou isso enquanto esteve no governo e essa participação hoje não existe nos termos, inclusive, em que é feita noutros países com sistemas de segurança social idênticos ao nosso e que os senhores constantemente invocam como modelos.

É que hoje em Portugal os trabalhadores não têm controle efectivo do dinheiro que entregam para a segurança social e que .mensalmente lhes é descontado no seu vencimento. E, como sabemos, isso é extremamente importante, porque, quer no Orçamento Geral do Estado cujas alterações discutimos na passada segunda-feira, quer nos anteriores, aparece-nos dinheiro que sai dos bolsos dos trabalhadores, que elas descontam mensalmente nas suas contribuições, para a segurança social, e que é desviado para a acção social ou para outros fins que compete clara e inequivocamente ao Orçamento Geral do Estado financiar.

Portanto, Sr. Deputado Morais Leitão, a questão é esta: neste projecto de lei, em termos de criação de normas legais que sejam inovadoras e que no imediato alterem o sistema, essas normas no fundamental não existem. Existe a enunciação vaga do principio, como já existia antes, desde há muitos anos para cá. Dai que o projecto de lei não adiante nada.
Quanto ao Sr. Deputado Luís Barbosa, penso que a sua intervenção é contraditória com a intervenção do Sr. Deputado Bagão Félix. Não sei se o Sr. Deputado estava presente quando ele falou, mas tenho a impressão de que não disseram bem a mesma coisa. Eu também não sei se são as duas «linhas» diferentes do CDS que aqui, em termos de segurança social, se chocam ou se, enfim, é apenas uma desatenção do Sr. Deputado Luís Barbosa, que se esqueceu que agora já não está no Governo - pelo menos aparentemente - mas na oposição. Portanto, essas coisas agora são mais maleáveis e o Sr. Deputado Bagão Félix, quanto a mim, fez esse papel muito bem.
O que este Sr. Deputado disse, e eu dou-lhe razão a ele e não ao Sr. Deputado Luís Barbosa, aqui apoio essa «linha» do CDS ...

Risos do PCP.

... foi que o Orçamento Geral do Estado tem de financiar os regimes não contríbutivos ou pouco contributivos da segurança social e outros aspectos que não podem ser os trabalhadores no activo a financiar com os seus descontas para a segurança social.

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Este foi o discurso feito há pouco na tribuna pelo CDS. E o Sr. Deputado não me pergunte a mim onde é que vai buscar o dinheiro, pergunte ao seu colega de partido Bagão Félix, talvez ele lhe explique ...
Pegando na questão, para nós é fundamental o financiamento do Orçamento do Estado, princípio que vem estabelecido na Constituição e que se verifica, como o Sr. Deputado referiu e com razão, em todos os outros países da Europa. A segurança social não se autofinancia e, portanto, esse princípio observa-se em todos esses países.
O que não pode suceder é o esquema que se está a observar hoje e que o actual Governo vai acentuar para o ano que vem: é que o orçamento da segurança social tem um défice cada vez maior, porque os patrões não pagam à Previdência - e as contribuições estão a baixar de uma forma extremamente perigosa - e depois vai-se buscar o dinheiro que falta na segurança social - porque, repito, os patrões não pagam e ninguém lhes pode exigir- lançando, como o Governo acabou de fazer aqui anteontem na revisão orçamental, um imposto de 2,8 % sobre os trabalhadores, os mesmos que já descontam para a segurança social.
Este é um princípio extremamente grave que quanto a nós é necessário alterar, porque não é assim que chegamos à justiça social - aliás este caminho só nos levará à injustiça social.
Com isto creio, Srs. Deputados, ter respondido às questões que me colocaram.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Julgo que para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, de facto, embora não goste muito de usar essa figura regimental, parece-me que é a única de que disponho.
Gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Zita Seabra que realmente a Lei de Bases da Segurança Social foi bastante discutida entre mim e o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social, de modo que é um projecto conjunto e não de duas «linhas» diferentes.
Além disto, gostaria ainda de lhe dizer que V. Ex.ª não respondeu de facto à minha questão, que é também do ex-Sr. Secretário de Estado da Segurança Social. É que efectivamente é preciso saber, dos recursos que o Orçamento Geral do Estado hoje tem, o que é que se vai cortar, revertendo por essa via novas receitas para a segurança social.
Pela minha parte, dentro do modelo de sociedade que defendo, sei onde devo cortar: é realmente num conjunto de subsídios e aumentos de capital a empresas públicas que considero perfeitamente inaceitáveis.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - E as indemnizações?

O Orador: - Mas, a verdade se diga, também no governo anterior - e inclusivamente na revisão constitucional aqui feita - o CDS não conseguiu fazer prevalecer os seus pontos de vista.
Eu já aqui disse que o problema das empresas públicas se há-de resolver por redução ao absurdo e julgo que estamos lá. O que é pena é que os nossos reformados tenham de suportar uma parte importante desse absurdo. E aqui é que o Partido Comunista entra
numa enorme contradição: é que, defendendo as duas coisas, está realmente a prejudicar aqueles que são os mais desfavorecidos de todos nós.
Neste aspecto devo dizer-lhe que a minha opinião não é diferente estando o Governo ou na oposição, porque para mim mudar de camisa quando se está no governo ou na oposição parece-me mal como maneira de estar na política e, portanto, prefiro ter a mesma opinião nas duas posições, o que obviamente não me impede de criticar o Governo quando entendo que o devo fazer.
Mas neste caso concreto o que está em causa parece-me mais amplo do que a acção deste Governo. É um problema que, ao fim e ao cabo, tem que ver com a própria Constituição que nos rege e que está a provocar estrangulamentos que são insuportáveis para os nossos reformados.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já tinha dito, acredito perfeitamente que o Sr. Deputado Luís Barbosa e o Sr. Deputado Bagão Félix estavam de acordo quando estavam no governo, em que um era Ministro e o outro Secretário de Estado. O que me parece é que enquanto o Sr. Deputado Bagão Félix no seu discurso percebeu que agora estão, pelo menos minimamente, na oposição o Sr. Deputado Luís Barbosa ainda não entendeu isso completamente. Daí resulta a discrepância das atitudes e da posição. Aliás, o seu lapso ao chamar ainda ao Sr. Deputado Bagão Félix Secretário de Estado é bem revelador disso.
Mas quanto à questão concreta de saber onde é que se vai buscar a verba do Orçamento do Estado para financiar a segurança social, podia remeter-lha Sr. Deputado, porque ou isso está no projecto de lei apresentado pelo CDS ou não está. E se não está, então ele não contém o tal aspecto inovador no campo do financiamento que há pouco os Srs. Deputados Morais Leitão e Bagão Félix referiram. E aquilo que o Sr. Deputado Bagão Félix disse sobre os regimes . não contributivos não está lá. Mas supondo que, enfim, está lá, o Sr. Deputado Luís Barbosa diz «vamos buscar ao capital das empresas nacionalizadas»! Mas eu respondo-lhe, também como exemplo, Sr. Deputado: vamos antes buscar às indemnizações aos capitalistas - só este ano são 13 milhões de contos previstos.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Não chega.

A Oradora: - É um exemplo. Talvez isso seja uma fonte de financiamento melhor e mais moralizadora do que ir buscar dinheiro às empresas nacionalizadas, remetendo mais trabalhadores para o desemprego ou para a situação de salários em atraso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Eu sei muito bem que o que o Sr. Deputado pretende é que se siga o exemplo da Lisnave e que, rapidamente, a Lisnave possa estar, nas mãos dos Mellos.

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Mas não misturemos a segurança social com isso tudo, Sr. Deputado, porque esta questão é de princípio, de fundo. Estando o País a viver uma crise económica como a que está a viver, havendo tantos trabalhadores com o salário em atraso, tantos trabalhadores no desemprego, famílias a passar fome hoje em muitas zonas do País, as reformas a não chegarem para a subsistência mínima, isto tem de ser encarado como uma prioridade do Estado - e é-o em qualquer Estado democrático. Se o actual Governo fosse um Governo democrático, este era um dos campos onde não iria fazer restrições para não serem os sectores e as camadas mais desprotegidas da população a pagar as consequências da crise.
Portanto, pode não haver dinheiro para outros sectores, mas para a área da segurança social ele deve ser garantido, porque esse é um princípio básico de justiça social de um Estado democrático. E eu repito que é preciso garantir este mínimo de prestação e de direitos dos portugueses à segurança social.
Se não qual é a alternativa, Sr. Deputado? A «sopa dos pobres» como hoje já muitas Misericórdias tiveram que fazer? Não é, não, Sr. Deputado!
Portanto, para o PCP esta é e tem de ser uma das prioridades orçamentais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições ...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, a Assembleia aprovou há pouco a continuação dos trabalhos até à votação, na generalidade, do projecto de lei em discussão. Ora, gostaria de saber qual é o entendimento da Mesa acerca do limite no tempo desse prolongamento da sessão: será que vamos ficar aqui até à meia-noite, duas da manhã, três da manhã, quatro da manhã? ... Não há interrupção para jantar? O que é que a V. Ex.ª se oferece dizer sobre o assunto?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o entendimento da Mesa é precisamente esse, o de actuar de acordo com o requerimento que foi aprovado, ou seja, continuar até à votação na generalidade.
Mas é evidente que se houver um requerimento ou uma sugestão no sentido de se interromper a sessão para jantar, naturalmente que se fará o intervalo.
No entanto, neste momento não há inscrições e parece-me que talvez estejamos em condições de fazer, desde já, a votação, caso nenhum Sr. Deputado se inscreva.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, ao abrigo das disposições regimentais, requeiro a suspensão da sessão por 5 minutos.

O Sr. Presidente: - O pedido é regimental, pelo que declaro suspensa a sessão por 5 minutos.

Eram 20 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 20 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Morais Leitão.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS deve à Câmara uma resposta clara sobre a pergunta que o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social há pouco nos fez. Vou tentar ser claro nessa resposta.
Ficou bem demonstrado dos termos deste debate que existe na Câmara, expressa e implicitamente, o reconhecimento do carácter estrutural, prioritário de uma Lei de Bases da Segurança Social.
Apresentámos um projecto de lei vão já decorridos 5 meses. O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social afirmou-nos, em termos de pergunta, que nas suas prioridades não tinha havido tempo nem disponibilidade para lhe dar a mesma prioridade a esta matéria, pelo que nos perguntou se o CDS não poderia renunciar à continuação do debate até que, no prazo de 2 meses, o Governo, pelo seu desejo de participação activa nesta discussão importante, apresentasse uma proposta de lei, que seria discutida conjuntamente com o nosso projecto de lei.
Tentámos claramente compreender, não apenas na vontade do Governo, mas na própria vontade da maioria desta Câmara, se alguma divergência de fundo existia sobre a filosofia deste diploma ou se, pelo contrário, o reconhecimento da sua natureza estrutural e do seu carácter prioritário não permitiriam uma afirmação política de princípio que hoje, como noutras ocasiões, só prestigiaria esta Câmara se aprovasse na generalidade diplomas, eles próprios, reveladores de consensos alargados e inerentes à sua natureza estrutural e prioritária.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Não ouvimos da parte da maioria essa garantia, que se traduziria -como noutras ocasiões tem sucedido- na aprovação na generalidade deste projecto de lei em conjunto com a aprovação da proposta de lei que o Governo vier a apresentar. Ora, este facto, a meu ver, não permite responder afirmativamente à pergunta do Governo e não permite que renunciemos ao nosso direito inalienável de também nós escolhermos as nossas prioridades nesta Câmara.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Seria com o maior gosto - e será eventualmente- que participaremos em todos os debates que determinem para o nosso país uma Lei de Bases da Segurança Social votada, se não por unanimidade, pelo menos pela larga maioria desta Câmara. Mas não podemos renunciar ao direito que o meu colega de bancada, Sr. Deputado Bagão Félix, aqui afirmou: Srs! Deputados, este é o momento em que à crise económica esta Câmara tem de dar uma resposta de solidariedade, tem de se deixar de direitos de autoria, tem ter a humildade de olhar para um projecto de lei e apontar onde estão as divergências de fundo. Da

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própria bancada do PCP vieram críticas legítimas e aplicáveis na especialidade, mas também, palavras de apoio à justeza e à necessidade de uma Lei de Bases da Segurança Social.
Estamos dispostos a discutir todos os diplomas. Demos 5 meses para abrir essa discussão. Logo, não é legítimo pedir-se-nos mais, sem uma garantia de que o nosso projecto de lei merece o apoio de princípio desta Câmara.
Repito, Srs. Deputados, que não é só com gestão orçamental, nem apenas com aumentos de pensões, nem com actos avulsos que se consolida e promove o sistema de segurança social. É também com uma afirmação clara de que, reconhecendo -como todos reconhecemos- a situação de crise em que vivemos, o Estado tem de se munir, não apenas de aparelhos financeiros e de instrumentos de boa vontade, mas também de instrumentos de base, como este projecto de lei, que a Constituição impõe e são essenciais à consolidação dos direitos dos utentes e dos beneficiários da segurança social.
Neste sentido, mais uma vez - e para fechar a nossa intervenção neste debate - chamo a atenção desta Câmara para o fundamental que há em à luta de classes opotrnos a colaboração, ao ódio opormos a comunhão, às lutas por vezes fratricidas fortalecermos as instituições que são, por essência, vitais ao superamento da crise, como sejam a família, as empresas e que é, da parte do Estado, o sistema de Segurança Social.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não resisto em invocar aqui as palavras do meu colega, Sr. Deputado Luís Barbosa, quando chamou a atenção para as incapacidades de resolução da crise em que estamos caindo, enquanto as prioridades dos fracos recursos de que dispomos não puderem claramente ser definidos. Parece-me que numa altura em que nos vai ser presente a esta Câmara o Orçamento e as Grandes Opções do Plano, com o rigor, a rigidez e a dureza que as caracteriza, tal como caracteriza a própria situação económica, era uma resposta tempestiva, oportuna e válida desta Câmara a aprovação de uma lei de bases que traz no plano legislativo inovações substanciais ao nosso sistema de segurança social.
Foi nesse sentido que apresentámos este projecto de lei, é nesse sentido que o votaremos e será nesse sentido que continuaremos a votar toda e qualquer iniciativa que nesta matéria venha ou volte a ser apresentada a esta Câmara.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: -Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.

O Sr. Ministro elo Trabalho e Segurança Social: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que o Governo deve à Câmara uma explicação sobre a sua posição neste debate e sobre a situação da pergunta que foi dirigida ao Sr. Deputado Bagão Félix.
Será extremamente difícil dizer a este Governo que ele não actua com a máxima consideração por este Parlamento. Creio que será igualmente difícil - se

não mais difícil ainda- fazer essa acusação ao Ministro do Trabalho e Segurança Social, que sempre tem estado presente nos debates desta Assembleia, mesmo em discussão de diplomas que não são da sua iniciativa.
Portanto, não vejo que haja qualquer fundamento para as afirmações da Sr.ª Deputada Zita Seabra, numa declaração de voto, uma vez que o Governo se limitou - e passo a um segundo aspecto que gostaria ficasse bem claro - a fazer uma sugestão, podia dizer um pedido, ao CDS no sentido de aceitar que este debate fosse adiado por algum tempo, até que o Governo concretizasse a sua intenção de apresentar nesta Assembleia uma proposta de lei sobre esta matéria.

Tenho a consciência de que o CDS tem o direito de fazer uma marcação do período da ordem do dia e, portanto, de requerer que seja feita a discussão e a votação deste diploma. Não o contesto. Mas precisamente por lhe reconhecer esse direito, é que lhe pedi que renunciasse a ele.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Porquê?

O Orador: - Eu não fiz nenhuma proposta à Assembleia; fiz um pedido ou uma sugestão ao CDS. É evidente que um pedido não pode ser considerado como uma imposição, nem como uma pressão. O CDS está no seu legítimo direito de não aceitar a sugestão que lhe foi feita e de exigir que esta Assembleia se pronuncie hoje sobre o seu projecto de lei.
Mas creio que ninguém estranhará que o Governo tenha, também ele, alguns direitos.
O CDS sabe que um projecto de lei de bases da segurança social é um diploma complexo que demora tempo a trabalhar e a preparar. E tanto assim é que este projecto de lei que o CDS hoje apresenta, começou a ser preparado em 25 de Julho de 1980, quando era Secretário de Estado da Segurança Social o Sr. Deputado Bagão Felix. Daí resultou uma proposta de lei, e este projecto de lei do CDS, na sua essência, corresponde à proposta de lei do governo da Aliança Democrática.
O Governo demonstra, assim, uma grande consideração pelo Parlamento e até pela iniciativa do CDS, dispondo-se a alterar, inclusive, os seus planos de trabalho e propondo-se a apresentar uma proposta de lei no prazo de 2 meses - só 2 meses! O Governo propõe-se reflectir profundamente sobre a proposta de lei de bases e apresentá-la na Assembleia, dentro de 2 meses.
Não tenho problema nenhum em dizer -gosto de falar claro- que o Governo até agora não reflectiu profundamente sobre esta matéria. O Governo teve conhecimento há 3 semanas de que o CDS havia marcado este projecto de lei para a ordem do dia de hoje e pediu àquele partido que considerasse sobre o facto de o Governo não poder estar preparado para fazer a discussão nesta data, tendo até havido conversações com o CDS no sentido do debate ser adiado. Mas não há problema nenhum, o CDS entende que no seu esquema é prioritário fazer hoje o debate e o Governo entende, legitimamente, que hoje não está preparado para fazer o debate. Digo-o com toda a franqueza.

Risos do PCP.

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E não pode ser exigido ao Governo que, não estando preparado e não tendo reflectido suficientemente sobre esta matéria - o Governo quer actuar honestamente-, diga se está substancialmente de acordo com o projecto de lei ou se está em desacordo. O Governo não pode fazer promessa nenhuma, a não ser a que fez de que, num desejo de colaboração, está disposto a fazer um forcing, a alterar até o seu' programa de trabalho, e apresentar aqui uma proposta de lei no prazo de 2 meses.
Penso que isto é honestidade parlamentar e governamental, consideração pelo Parlamento e consideração pelo Grupo Parlamentar do CDS. Esta é a posição do Governo e o CDS fará o que entender.
Continuo a pensar que é bom para o Parlamento e para o Governo que esta matéria da Lei de Bases da Segurança Social possa ser discutida e votada no momento em que o Governo e todos os grupos parlamentares possam dar, nesse sentido, a sua máxima colaboração.
A urgência de uma lei de bases, entendamo-nos, não é, em termos relativos, tão grande como se pode deixar de supor, porque as novidades desta lei de bases, Sr. Deputado Morais Leitão, não impedem o Governo de estar a trabalhar, desde já - e o Governo já o afirmou publicamente-, na conversão do subsídio de desemprego em seguro de desemprego, assim como não impede o Governo de ter, desde já e pela primeira vez com resultados práticos, proclamado o princípio de que o Orçamento do Estado deve cobrir as despesas com o regime não contributivo das pensões de segurança social. Nunca como este ano se foi tão longe, nem se irá no próximo ano, nessa cobertura.
Já há pouco referi que o Orçamento do Estado cobriu com 6 milhões de contos o aumento das pensões a efectuar em Dezembro, indo assim ao encontro de uma prática de aumento anual das pensões no mês de Dezembro, que não está consagrada na lei, mas que o Governo assumiu.
Portanto, está-se já a fazer o que se deve, independentemente da aprovação de uma Lei de Bases de Segurança Social, a qual é desejável para que todo este esquema evolua com base num conjunto de princípios bem assentes e de um sistema coordenado e harmónico da segurança social.
Estou de acordo com a. existência de uma Lei de Bases da Segurança Social, mas não estarei de acordo quanto ao facto de ser disso que depende, afinal de contas, a resolução concreta dos problemas das pessoas que estão à espera da protecção da segurança social.
Por exemplo, ainda hoje - e nem no projecto de lei isso é resolvido - não podemos dizer em que medida e por que forma é possível integrar na segurança social o regime dos acidentes de trabalho. Teoricamente pode fazer-se esta afirmação, mas na prática é necessário desenvolver estudos, ver quais as consequências que derivam daqui e que possibilidades tem o Governo em implementar este princípio. Creio que isto está previsto, mas não para aplicação imediata, evidentemente.

O Sr. Bagão Félix (CDS): -Está lá a dizer que é faseado!

O Orador: - Isso só vem ao encontro do que digo. Está dito no projecto de lei que é faseado, mas per

gunto se é importante, neste momento, dizer-se que isso é uma coisa a fazer mas não se sabe ainda quando. Onde é que está a urgência?
Portanto, creio que a posição do Governo é limpida, clara e de manifesta colaboração quer com o Parlamento quer, em particular, com o partido que teve a iniciativa da apresentação do projecto de lei de bases da segurança social. Agora, o que não se pode pretender é que, necessariamente, todos os grupos parlamentares e o Governo tenham que se enquadrar na escala de prioridades do CDS. O mesmo direito que tem o CDS de definir as suas prioridades também o tem o Governo.
Creio que não é difícil compreender que, ao cabo de 4 meses de funções de governo, em que se fez a discussão do Programa do Governo, a elaboração do Orçamento do Estado, a resolução de toda uma série de problemas, em que muita legislação já foi promulgada, etc., ninguém poderá acusar o Ministério do Trabalho e Segurança Social de ter estado de braços cruzados e não ter enfrentado os problemas prioritários, dos quais depende, efectivamente, a satisfação das necessidades e a resolução de problemas do povo português.
Podemos divergir nessa matéria, mas penso que é muito mais sério tomar a posição que aqui tomei do que estar, eventualmente, a inventar críticas a um projecto de lei no sentido de aconselhar a maioria a votar contra. Penso ser preferível tomar a posição honesta e clara ele dizer que, neste momento e por razões de oportunidade, o Governo não está preparado e em condições de participar activamente, como desejava, neste debate.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª` Zita Seabra (PCP): - Realmente, cada um bate palmas ao que quer. Isto, diziam aqui de trás e é verdade. Neste caso, batem palmas à ignorância, mas é lá com os Srs. Deputados.

Risos.

O Sr. Hãndel de Oliveira (PS): - É melhor bater palmas à miséria atrevida!? ...

A Oradora: - O Sr. Ministro não apresentou um único argumento, uma única crítica, no sentido de saber porque é que o Governo, uma vez que os partidos governamentais estão calados, discorda deste projecto de lei e em que é que discorda. Isto é, o Sr. Ministro não apresentou um único argumento que nos convença de que este projecto de lei não pode ser uma base de trabalho para os deputados desta casa.
Não é o Governo que vai trabalhar neste projecto, mas sim os deputados. Tantos deputados quantos entenderem ser necessário, em sede de especialidade, alterar, corrigir ou até fazer uma lei completamente diferente e nova.
O Sr. Ministro não invocou um único argumento a não ser que o Governo, nesta matéria, não sabe nada.
O que é que estão a fazer no Governo há S meses?
Digo-lhe, Sr. Ministro, que estou aqui há muitos' anos e nunca assisti a uma cena destas, em que um

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Ministro e um Secretário de Estado chegam aqui e dizem: meus senhores, nesta área governativa nós não sabemos nada, não estamos sequer em condições de discutir ou de criticar, fazer propostas de emenda nem sequer de fazer baixar este projecto de lei ã comissão e depois em sede de comissão trabalhar sobre ele.
Isto não é uma prova de grandeza, Sr. Ministro. Isto é extremamente inquietante. Para quem tem a responsabilidade governativa desta área, vir aqui demonstrar uma ignorância completa e total não é uma prova de grandeza. Aparecer aqui «descalço» não é uma prova de grandeza, é antes uma grande inquietação para todos nós.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - A quem estão entregues os destinos deste país?
E sob a responsabilidade desta pasta estão milhões de portugueses, nos quais se encontram algumas das camadas que, exactamente, mais necessitam de uma clarificação dós governantes que têm a responsabilidade destas questões.
É na verdade lamentável, Sr. Ministro, que o Governo chegue aqui e tenha essa atitude, depois de ter tomado posse há 5 meses. E mais: é lamentável que o Governo diga isso e que os deputados da maioria fiquem calados, o que é também um atestado de ignorância a esses partidos. É-lhes dito: meus senhores, vocês não são capazes de, em comissão, fazer uma lei, porque o Governo ainda não estudou e vocês estão aí para fazer o que o Governo manda.
Creio, Srs. Deputados, que isto é o exemplo mais típico e mais tradicional de várias coisas: da incompetência do Governo -nas mãos de quem está entregue o destino deste país! ... - e também do desrespeito total pela Assembleia, pelos deputados desta Casa e pelos próprios deputados que apoiam o Governo, que levam assim um atestado de incompetência e que, ainda por cima, batem palmas.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Ia exactamente perguntar se isto era um pedido de esclarecimento. Apesar de me ter sido passado um atestado de ignorância por parte da Sr.ª Deputada Zita Seabra, vou fazer um esforço para considerar que ela me fez um pedido de esclarecimento.
Tenho muita pena, mas como não sou uma pessoa que goste de dizer o contrário daquilo que pensa, gostaria de prestar uma homenagem à sua fulgurante inteligência por ver ignorância onde ela não existe e para ter os ouvidos surdos a tudo aquilo que aqui foi dito. Se não, não faria as perguntas que fez.
A Sr.º Deputada entende que qualquer pessoa que não esteja preparada, num determinado momento, para apresentar aqui uma proposta de lei sobre a Lei de Bases de Segurança Social não percebe nada da matéria.

A Sr.ªZita Seabra (PCP): - Não é qualquer pessoa, é um Ministro!

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O Orador: - A Sr.ª Deputada entende que quem está no Governo tem a obrigação de, num determinado momento, poder assumir posições de fundo sobre todas as matérias respeítantes ao departamento do Governo onde está inserido.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - É óbvio!

O Orador: - Não é óbvio, Sr. Deputada. Acabei de dizer há pouco que uma Lei de Bases de Segurança Social é uma matéria complexa. E uma pessoa responsável sabe que é necessário tempo para tomar opções decisivas, definitivas e com seriedade sobre matérias desta natureza.
Creio que o Ministério do Trabalho tem dado provas de fazer as coisas com seriedade, até porque tem submetido à discussão pública os diplomas que tem estado a preparar, e de ter uma posição clara sobre as decisões que toma. Mas não gosta de tomar opções nem decisões sem ter feito os estudos devidos e sem ter feito as auscultações também devidas. Não é, portanto, num prazo curto e em acumulação com outras responsabilidades que se podem tomar posições definitivas sobre esta matéria.
Lamento que a Sr.º Deputada não se limite a exercer o seu direito de opinião e de divergência, que toda a gente lhe reconhece, mas invada o campo da ofensa em relação a quem nunca a ofendeu, nem a si nem a ninguém da sua bancada. Lamento-o profundamente. A Sr.ª Deputada pode formular a sua opinião sem chamar aos outros ignorantes e pode manifestar as suas opiniões sem desrespeitar as pessoas que têm uma opinião diferente da sua.
Infelizmente, estamos habituados a que certas pessoas, quando alguém ousa ter opiniões diferentes das suas, que elas entendem ser as correctas, considerem isso ignorância ou coisa do género.
Sr.ª Deputada, gostaria que os debates entre a sua bancada e o Governo. e a minha pessoa decorressem num outro nível, não invadissem terrenos desta natureza e que se processassem dentro do respeito mútuo, que creio as pessoas merecem, uma às outras.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra,

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Realmente, choradinho de Ministro não me comove - digo-lhe com toda a franqueza. É coisa que não me comove, porque gostaria muito mais de travar este debate a outro nível. E na nossa bancada procurámos fazê-lo, no sentido de discutir com o Sr. Ministro e com o Governo, tal como com os outros partidos governamentais, não só estas questões, mas outras, ou seja, soluções, problemas e questões concretas da segurança social. Era isso que gostaríamos de estar a discutir.
O objectivo fundamental da intervenção do PCP neste debate foi trazer aqui os números, as soluções, aquilo que achava mal e que o achava certo. Era isso que eu gostaria de ver aqui da parte do Governo e foi isso que o Governo não fez.
O Governo apareceu aqui na posição de adiar, como já adiaram o pedido de interpelação apresentado pelo PCP, a questão de Vizela e debate da lei sobre o aborto. Adiam tudo!

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Neste caso o adiamento é grave, porque para além de demonstrar que o Governo não está em condições de discutir as questões, com a atitude que toma não resolve um único problema e não dá uma contribuição mínima para a resolução de problemas fundamentais dos portugueses no campo da segurança social. Quanto a nós, era isso que deveríamos estar aqui a discutir e foi esse o sentido da nossa intervenção.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro deseja responder já?

O Sr. Ministro do Trabalho e segurança Social: Não me apercebi de que tenha sido feito um protesto, pelo que não vejo que haja razões para contraprotestar.

Risos do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço apalavra para pedir um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos leito (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Nas suas alegações o Sr. Ministro fez algumas considerações que suscitam um problema sério de natureza institucional.
Tem-se falado aqui frequentemente, nestas últimas reuniões da Assembleia da República, de governamentalização, de governamentalizar.
Hoje mesmo a palavra veio já mais do que uma vez à discussão.
Mas eu creio que raramente temos tido exemplos de uma mentalidade tão governamentalizante como aquela que o Sr. Ministro revelou na sua intervenção.
Todo o problema é este: quem marca o ritmo da vida parlamentar?

O Sr. Ministro acaba de confessar que tomou conhecimento da marcação do CDS há 3 semanas. Como sabe, os grupos parlamentares estão regimentalmente obrigados a fazer as marcações com 15 dias de antecedência - e naturalmente isto conta mais para os grupos parlamentares que não fazem parte do Governo -, isto é, o Regimento, a Assembleia da República entendeu até agora que o prazo de 15 dias era o suficiente para os diferentes intervenientes na cena parlamentar se prepararam para intervir nos debates.
Portanto, neste caso, o CDS entendeu que em relação a uma questão importante lhe cabia a ele marcar o ritmo e fazer a marcação. E não a fez só 15 dias antes, mas sim 3 semanas, como aliás, é, geralmente, do comportamento dos grupos parlamentares.
Então não eram 3 semanas tempo bastante para o Governo se preparar? Esta não é uma matéria virgem, Sr. Ministro. Há estudos feitos, a Assembleia da República tem tido pendentes projectos de lei que têm a ver com estas matérias, há uma reflexão de base em todos os partidos, há, seguramente, uma reflexão de base no PSD e no PS, h5 trabalhos no seu Ministério, há estudos, como o Sr. Ministro até revelou conhecer e citou alguns deles.
Então como é que isto se justifica?
O Governo quer ter tudo na mão?
Isso é bom para as instituições?
A vida parlamentar é o Governo ter controle de tudo o que aqui se passa e só abrir a mão quando entende que sim senhora pode abrir, quando retira
vantagens disso? A oposição democrática não tem nada para contribuir, senão fazer ligeiras críticas às propostas do Governo?

Risos do PS e do PSD.

E isso que se entende?
Bem, Sr. Ministro, entendo que é grave toda esta concepção de funcionamento da Assembleia da República que se-pode colher da- sua intervenção.
E mais uma vez lhe pergunto: quem marca o ritmo da vida parlamentar? E o Governo?
Eu também não digo que são os grupos parlamentares da oposição, mas há direitos que o Regimento e a Constituição conferem aos grupas parlamentares. Eu digo que o ritmo é marcado pelos diferentes intervenientes na vida parlamentar e não só pelo Governo.
Ora, a verdade é que o Governo, em relação a uma figura relativamente à qual não tem instrumento paca impedir que seja exercida, não se preparou em tempo para este debate e veio aqui à última hora fazer um apelo para que este se não realize.
Isto, Sr. Ministro, não é um comportamento democrático. Isto, Sr. Ministro, não é uma compreensão do que é o funcionamento da Assembleia da República.
E termino voltando a perguntar: quem marca o ritmo?

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social Sr. Presidente, peço a palavra para responder.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Com certeza que não me fiz entender.
Creio que deixei bem claro que o CDS tem todo 0 direito de marcar o seu debate, mas creio que corresponde também ao Governo considerar que o debate não é oportuno e que, pela sua parte, não deseja, travá-lo neste momento e deseja apresentar uma proposta de lei.
O Governo tem plena legitimidade para isto, Sr. Deputado Carlos Brito.
Felizmente ocupei as bancadas parlamentares durante tempo suficiente para me poder lembrar que a sua bancada tomou atitudes muito semelhantes àquelas que agora estou a tomar.
Cada grupo parlamentar julga, não sb de fundo, mas também de oportunidade.

Projectos apresentados por partidos, nomeadamente em marcação, conduziram umas vezes à discussão quando havia consenso nesse sentido - como viram pela votação conclusiva de há pouco - e outras vezes não conduziram, porque outros grupos parlamentares não colaboraram e entenderam que não era o seu momento apropriado.
No fundo há direitos de todos, Sr. Deputado Carlos Brito.

A democracia é assim mesmo.
O CDS tem o direito de fazer a marcação e tem o direito de requerer a votação.
Ninguém lho contesta: faz a marcação e faz a votação.
Mas quem é que pode recusar ao Governo o direito de dizer que pretende apresentar sobre esta matéria uma proposta de lei e que considera mais útil

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para a Assembleia e para o País que este projecto de lei seja discutido em conjunto com essa proposta de lei.
O Governo não foi mais longe. A Assembleia faz o que entender e os Srs. Deputados votam como quiserem.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Vá lá! ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: Queria dizer que a vida institucional não é propriamente um clube de amigos, em que um expressa uma determinada opinião ou vontade e o outro diz: «tem lá paciência, hoje não me convém».

Risos do PCP.

Não, isto funciona com regras.
Funciona com regras que estão escritas na Constituição, no Regimento, e essas regras é que comandam.
E quem está de acordo com essas regras é a oposição - e isto é para os risinhos dos deputados do PS -, a oposição democrática, a oposição democraticamente exercida, mesmo quando a gente possa ter dúvidas dos sentimentos democráticos de quem exerce essa oposição.
Isso é que é democrático.

Aplausos do PCP.

Risos do PS e do PSD.

Quer dizer, o exercício das regras, o respeito pelas regras da Constituição, do Regimento - no caso do funcionamento da Assembleia da República - e da lei é que é democrático.
E é a isto que o Governo se tem de subordinar.
Ora, o Governo, neste caso, não perdia o comboio porque nós não estamos no fim do processo, Sr. Ministro. E eu permito-me dizer isto, porque até sei que o Sr. Ministro sabe muito bem estas coisas, pois estivemos juntos na Comissão da Revisão Constitucional quando se discutiu o funcionamento da Assembleia da República e V. Ex.ª participou activamente nesses trabalhos.
Por isso tem menos desculpa.
De facto, isto não é o fim do processo: é o princípio, já que se trata de uma votação na generalidade. Este projecto de lei pode ser complementado, modificado.
Então porque é que o Governo tem tanto medo de perder o comboio? É uma questão de prestígio? Mas o Governo pode participar nos debates da comissão. O Sr. Ministro e a Sr.ª Secretária de Estado podem participar em todas as reuniões da comissão e dar as vossas opiniões, os vossos contributos e informação; os deputados da coligação governamental podem estar instruídos pelo Governo com todas as propostas que quiserem fazer.
Porque é que o Governo trava a passagem deste projecto?
Nós não estamos a defender esta proposta do CDS.

Uma voz do PSD: - Até parece!

O Orador: - Estamos a defender o funcionamento regular -para evitar a palavra «democrático» que parece fazer impressão a alguns Srs. Deputados - da Assembleia da República.
É isso que defendemos e ponha-se termo a esta questão.
E volto a perguntar-lhe, Sr. Ministro, já que não me respondeu: quem marca o ritmo?
Essa é que é a questão!
Quem marca o ritmo de acordo com as regras, isto é, de acordo com a Constituição, de acordo com o Regimento e de acordo com a lei.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: - Sr. Presidente, peço a palavra para responder.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: - Sr. Deputado Carlos Brito, estou sensibilizado pela sua tentativa de me aconselhar na atitude que devo tomar perante este debate.
Creio que já fui bem claro. Respeito as regras totalmente.
Conheço-as e não só as regimentais como também as da Constituição.
Não me obrigue a dizê-lo pela terceira vez.
Mas permita-me, se isso não lhe custa muito, que mantenha a minha opinião e o meu pedido de que este debate não seja concluído hoje e seja adiado até ao momento em que o Governo apresente a sua proposta de lei.
Creio que é um pedido legítimo que mantenho e não vou mais longe do que isto.
Não me compete ir mais longe.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Marques Mendes (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pedi a palavra para dizer algo que tem a ver com a afirmação da Sr.ª Deputada Zita Seabra, que afirmou que as bancadas da maioria, nas quais a minha bancada se inclui, bateu palmas à ignorância.
Queria protestar e dizer à Sr.ª Deputada que não batemos palmas à ignorância. Batemos, antes, palmas à sinceridade, porque poucas vezes, talvez, aqui tenha vindo um membro do Governo dizer, muito sincera e lealmente, que não estava preparado para intervir no debate e justificar porquê.
Justificou que considerava que esta matéria, segundo os estudos que entendia estarem a ser feitos, não tinha aquela prioridade primeira, digamos assim.
Ora, isto não é ignorância.
Isto é algo mais que isso.

Risos do PCP e do CDS.

É algo mais no bom sentido, Srs. Deputados. E acho muito curioso que neste debate, embora o projecto pertença ao CDS, seja o PCP quem o tenha

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vindo a advogar e a defender. São eles que parece estarem interessados.
Ora, este projecto de lei do CDS, faço-lhe esta justiça, não precisava de uma defesa tão mal feita - há que reconhecê-lo - como foi a do PCP e do seu deputado Carlos Brito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Queria, aqui, com muita seriedade e com muita sinceridade dizer que estamos perante um projecto de lei que não interessa nem ao Governo, nem à Assembleia da República, mas interessa, em primeiro lugar, e a ela se destina, a uma grande maioria do povo português. Este é um projecto de Lei de Bases da Segurança Social e eu tenho, para mim, e para a minha bancada, a convicção de que para além de ritos processuais, para além de outros interesses, sejam eles quais forem, deveríamos pôr acima de tudo o interesse nacional neste debate.
Não estou a comentar o projecto de lei do CDS.

Uma voz do CDS: - Nós estamos preparados!

O Orador: - Isso agora é uma questão a discutir.
Mas se governo vem dizer que pretende fazer estudos, permitir-me-ia perguntar o seguinte: O CDS, pela boca do Sr. Deputado Morais Leitão, disse, e bem, que apresentaram aqui este projecto há 5 meses. Mas, se não fosse indiscrição, podem-me dizer quantos meses levaram a elaborá-lo? Será que foi elaborado no prazo de 1 mês ou 2 meses, ou terá levado muito tempo?
Uma matéria desta natureza não é apenas uma matéria exclusivamente de princípios.
Contende necessariamente com exames, com estudos para que seja realmente uma lei de bases devidamente cuidada.
Estou convicto de que uma proposta do Governo aqui apresentada em termos que podem ser já muito mais avançados através de estudos que possam existir, em colaboração com o projecto de lei do CDS, só poderia vir a prestigiar o Parlamento, só poderia contribuir efectivamente para encontrarmos a solução eficaz.
E não são inéditas soluções deste género. Portanto, porque creio firmemente que o CDS está plenamente interessado em que desta Assembleia saia uma lei desta natureza, que tem a ver com tantos e tantos milhões de portugueses, penso que vale bem a pena debatermos em conjunto o projecto de lei do CDS, a proposta do Governo e, quem sabe, outro qualquer projecto, pois admito que neste intervalo também o PCP, por exemplo, possa apresentar um outro projecto, dado o afã com que tem advogado a votação deste projecto do CDS.
Por isso é este o apelo que faço.
Não é só o Governo, não é só a maioria, não é só o Parlamento que estão em causa, mas é, sobretudo, o povo português, porque esta lei é vital, é fundamental.
Ora, essa prioridade que o CDS entendeu existir não deve prejudicar, efectivamente, o verdadeiro sentido, os verdadeiros objectivos e aquilo que pretendemos com uma lei desta natureza.

Aplausos do PSD.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): -Sobre segurança social não disse nada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Morais Leitão, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Morais Leitão (CDS):-Sr. Deputado Marques Mendes, como sabe, respeito profundamente a sua bancada e não gostaria que nas entrelinhas isto surgisse, como parece, como uma teimosia do CDS. lá expliquei claramente, a meu ver, as razões da apresentação aqui hoje deste projecto de lei. Parece-me, pois, que tínhamos o direito de saber a opinião da sua bancada quanto ao fundo da questão.
Isto porque nós, ao votarmos negativamente o projecto de lei, estamos a inviabilizar a possibilidade de o tal povo português, de que o Sr. Deputado fala e que reconhece que precisa da lei - ter a lei nesta sessão legislativa.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O CDS já declarou que não compreende como é que se lhe pode estar a pedir que adie este debate, quando os próprios autores do pedido dizem que, na generalidade, como disse o Sr. Deputado Carlos Brito, nada têm a opor e estão de acordo com o presente projecto de lei.
Somos os primeiros a admitir que na comissão competente, em debate de especialidade, a maioria une as suas prerrogativas e altere ou modifique o articulado, ou que inclusivamente se venha a votar na generalidade a proposta de lei que o Governo anunciou ir apresentar no prazo de 2 meses.
O que não nos é possível admitir é que nos venham pedir que suspendamos o debate de um projecto de lei sem ouvir das bancadas da maioria qual é a sua posição quanto ao fundo da questão. E se posso aceitar que o Sr. Ministro do Trabalho tenha tido outras prioridades, salvo o devido respeito não posso aceitar que as bancadas da maioria em 3 semanas não tenham uma posição quanto ao fundo do nosso projecto de lei.
Era isso que gostava de ouvir da vossa parte e era isso que devia condicionar a nossa decisão. Assim, nestes termos, estando a jogar apenas com prioridades, estamos realmente a impedir o povo português de ter a lei nesta sessão legislativa.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Era esse esclarecimento que eu gostava de ouvir da sua parte.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, há ainda um outro pedido de esclarecimento. Prefere responder imediatamente ou no fim?

O Sr. Marques Mendes (PSD): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem agora a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Deputado Marques Mendes, a sua intervenção deixou-me um pouco confuso e eu explico porquê.

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Este diploma que está actualmente em apreciação é praticamente igual, com pequenas alterações, a um que foi aprovado em Conselho de Ministros do Governo anterior. Pergunto se o PSD, que presidia a esse Governo, aprovou este projecto de lei de ânimo leve ...

Risos do PCP.

... de tal maneira que sente agora profunda necessidade de o reestruturar durante muito mais tempo.

Uma voz do PCP: - Não foi este, foi o do Balsemão!

O Orador: - Eu não coloco esta questão para criai qualquer impasse ou para fazer uma pequena charla à volta desta questão.
Penso que sobre esta matéria, como já foi dito na Assembleia, os partidos têm que ter ideias, independentemente da posição de cada um dos governantes que naturalmente gostará de imprimir o seu próprio cunho pessoal aos diplomas que são apresentados.
Mas isso não está em causa. O que, ao fim e ao cabo, no projecto de lei que o CDS apresenta agora como solução para este pequeno diferendo de opiniões, está em causa é que realmente este diploma venha a ser aprovado na generalidade e discutido ao longo do período que se vai seguir. E não posso crer que nessa aprovação na generalidade haja uma tão grande diferença no que respeita ao programa dos partidos - tendo em conta que o mesmo PSD que presidia ao Governo anterior em Conselho de Ministros aprovou por unanimidade este projecto de lei- levantando-se agora a questão de repensar todo o projecto de uma ponta à outra e mesmo de querer apresentar uma nova proposta.
Deixa-me, portanto, esta questão um pouco confuso. Aliás, também ouvi aqui na Assembleia falar várias vezes de inovação. E a propósito de tudo e de nada sentimos a necessidade de inovar. Eu, pessoalmente, considero-me uma pessoa muito inovadora, não sei se bem se mal. De qualquer maneira, acho que este país inova de mais e faz de menos. Seria talvez melhor que procurássemos encontrar um ritmo de inovação razoável adaptada às nossas necessidades, sem procurar enormes inovações que, de facto, nunca chegam a passar da letra da lei.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes, para responder, se assim o entender.

O Sr. Marques Mendes (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Deputado Morais Leitão fez-me uma objecção - porque não se tratou propriamente de um pedido de esclarecimento - ao referir que se se votasse na generalidade o projecto de lei baixaria à comissão onde poderia demorar dois meses ou mais, isto é, o tempo que fosse necessário para ser refundido, reformulado, podendo até resultar num diploma totalmente diferente.
O Sr. Deputado Morais Leitão, presto-lhe imensa justiça - e até pela muita consideração e estima que tenho por si -, mas isso é uma contradição relativamente àquilo que acabou de dizer. Porque se V. Ex.ª aceita que esse projecto de lei seja trabalhado na comissão durante 2, 3, 4 meses, etc., então o interesse do povo português não será lesado com o adiamento. E não se trata, de forma nenhuma, de perder o direito da marcação, mas apenas de adiar a votação para, perante dois diplomas, se analisar com mais profundidade esta matéria, inclusivamente na generalidade. Um debate na generalidade também tem o seu interesse e é extremamente importante porque ainda que haja divergências, ainda que haja diferenças fundamentais, os dois diplomas podem ser mesmo assim, aprovados.
Ora, se os Srs. Deputados estão dispostos a aceitar 2, 3, 4 meses de adiamento da discussão na especialidade, não compreendo porque é que não podemos esperar dois meses no máximo, segundo foi dito, para apreciarmos conjuntamente os dois diplomas, ou até mais um outro qualquer que eventualmente possa surgir.
Portanto, não é por este adiamento que se impede o povo português de poder ter a Lei de Bases da Segurança Social nesta sessão legislativa. Mais: estou plenamente convicto de que este adiamento de dois meses poderá ser extremamente benéfico para se conseguir uma lei de bases mais eficaz, mais consensual do que aquela que, porventura, pudesse sair de um trabalho meramente de comissão.
Quanto ao Sr. Deputado Luís Barbosa, lamento que tenha vindo dizer que está um pouco confuso, na medida em que diz que este projecto de lei é aquele que teria sido aprovado num Conselho de Ministros do anterior governo da Aliança Democrática. Bem, se se trata de um diploma de um governo de coligação de que o meu partido fazia parte, então tenho a dizer que confuso estou eu, é que, nesse caso, o CDS apropriou-se de algo que era de dois partidos ...

Aplausos do PSD.

... numa circunstância de um determinado acordo de um governo de coligação.
Mas também devo dizer ao Sr. Deputado Luís Barbosa, relativamente a uma Lei de Bases da Segurança Social ou a uma outra qualquer lei, que a vida não é estática, a vida é dinâmica. Ora, porque razão não pode esta maioria ter já sobre esta matéria ideias mais ambiciosas que possam resolver problemas? ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma cambalhota! ...

Vozes do CDS: - Quais?

O Orador: - Eu posso citar, a título de exemplo, o caso dos acidentes de trabalho, que já aqui foi referido e que é uma matéria extremamente importante.

Vozes do CDS: - Mais, mais!

O Orador: - Como diz, Sr. Deputado? Eu aceito interrupções.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Nós utilizaremos os nossos direitos regimentais para protestar!

Orador: - Mas eu penso que não se trata de protestar. É que eu não digo que é para um lado ou que é para o outro, mas que se trata de uma matéria a ponderar - aliás, esta e muitas outras.

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A conclusão a que chego perante estes pedidos de esclarecimento -e lamento dizê-lo- é a de que o problema está no facto de se exercer o direito de fazer a marcação e exigir a votação, que é regimental e que ninguém pôs nem porá jamais em dúvida. Não é esse direito que está em causa, mas sim conseguirmos fazer neste Parlamento uma lei capaz, que possa obter um consenso capaz de servir, mas servir eficazmente, o povo português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Morais Leitão tem a palavra para um protesto.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso deixar de protestar contra a intervenção do Sr. Deputado Marques Mendes.
Em primeiro lugar, os direitos de co-autoria que reivindicou e que tantas palmas mereceram da sua bancada levam-me a referir-lhe que nunca, nesta Câmara foi acusado o deputado António Arnaut, após ter saído do Governo e de aqui ter apresentado a Lei do Serviço Nacional ele Saúde, de ter roubado essa lei ao CDS; nunca foi acusado o deputado Rui Machete de, quando saiu do Governo, ter apresentado nesta Câmara o projecto de lei sobre acidentes de trabalho, que tinha sido aprovada no anterior Governo, ou de ter roubado essa lei a outros partidos que faziam parte do Governo. Não me parece que seja moralmente e politicamente aceitável criticar pessoas que foram membros de Governo no Ministério dos Assuntos Sociais, e que tiveram particular responsabilidade na elaboração da política seguida nesta pasta, de após terem saído do Governo, pronta que estivesse a lei, apresentá-la com um projecto de lei.
Por isso, Sr. Deputado, protesto contra essa ligeira insinuação, que mereceu tantos aplausos, porque ela não é a tábua salvadora da questão que eu lhe pus.
Quanto à questão de porque é que o CDS está disposto a trabalhar mais tempo na Comissão e não está disposto a aguardar pela proposta de lei para debate no Plenário na generalidade, respondo-lhe com simplicidade: porque o CDS, no uso dos seus legítimos direitos, requereu esta discussão. E tem legitimidade - e isso ainda não foi respondido - de perguntar à maioria: porque é que discordam desta lei? E se discordam desta lei, quais as razões? E, se não discordam, porque não a votam na generalidade? Porque se a maioria aqui dissesse claramente que não tem divergências de fundo e que está disposta a votar na generalidade esta lei, o CDS propunha rapidamente que se aguardasse a proposta de lei do Governo. O que nós não podemos é aceitar este convite - salvo devido respeito - sub-reptício, que o é, e quanto ao fundo da questão nada dizem. Pelo contrário dizem: «ressalvamos o direito de chumbar o projecto na generalidade, mas vamos para a frente com a proposta do Governo, e pedimos que vocês parem com o debate». Isto não é politicamente uma proposta aceitável, Sr. Deputado. Eu gostava - e por isso faço este protesto - de ainda o ouvir sobre a matéria de fundo, porque, essa sim, interessa ao povo português.
E permita-me chamar-lhe a atenção para o artigo 170 º da Constituição, do qual resulta que se este projecto for rejeitado nesta sessão legislativa, não haverá mais proposta de lei. Eu vejo o Sr. Ministro a dizer que não, mas há decisões da Comissão Constitucional e há interpretações nesse sentido. Se este projecto for rejeitado, os senhores não podem, nesta sessão legislativa, apresentar nova proposta de lei. Dirão que sim, que não violam a Constituição, que eventualmente a Constituição não tem esta interpretação. Esta é a nossa interpretação e, por isso, mantemos a posição que desde o início referimos. Peço ao Sr. Deputado Marques Mendes o favor político de nos dizer qual é, quanto ao fundo, a posição da maioria.

O Sr. Presidente: - Deseja responder, Sr. Deputado Marques Mendes?

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Desejo sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra, para um contraprotesto.

O Sr. Marques Mendes (PSD): -Quero dizer ao Sr. Deputado Morais Leitão que, com certeza, não compreendeu bem. Não fui eu que levantei o problema, não fui eu que acusei o CDS de trazer aqui uma lei. O problema foi levantado pelo Sr. Deputado Luís Barbosa - não foi por mim, na minha intervenção. Eu apenas respondi que, se assim é, então tinha desgosto.
Por outro lado, também não percebi como é que o Sr. Deputado diz que o projecto do Serviço Nacional de Saúde, que foi trazido aqui pelo Sr. António Arnaut, ex-deputado desta Câmara, é um projecto do CDS. Talvez fosse um lapsus linguae - admito -, mas afirmou e, efectivamente, não é verdade, porque esse projecto é totalmente diferente.

Vozes do CDS: - O CDS estava no Governo!

O Orador: - Sr. Deputado Morais Leitão, quereria - e legitimamente, admito (é o seu critério) - interpretar o artigo 170' da Constituição com sentido que lhe atribuiu. O Parecer nrº 16/80 da Comissão Constitucional não é assim tão claro como isso, isto é, de dizer que não pode ser apresentado uma proposta de lei. O problema é que não seja outro igual. Mas se o Governo diz que tem estudos que apontam para um maior avanço, não é o mesmo projecto, mas é um problema de interpretação, e eu não entro nessa discussão.
Quanto ao problema de votar ou não votar, Sr. Deputado, volto à mesma questão. Se o que importa é obter uma lei capaz, se eu lhe disse que inclusivamente haveria toda a vantagem para este Parlamento que perante a Comissão aparecessem votados na generalidade um, dois, ou três, mas depois de um debate profundo sobre todos eles - que todos eles com certeza têm os seus méritos, que todos eles têm os seus pontos de vista -, eu tenho impressão que uma vez que o CDS está disposto na Comissão demorar 2, 3, 4 meses ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, agradecia que terminasse a sua intervenção, porque já se esgotou o seu tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Orador: - Não é sub-repticia, de forma nenhuma - e o Sr. Deputado Morais Leitão sabe perfeitamente que não é-, esta chamada de atenção - não quero que use a palavra apelo - para realmente todos nós prestarmos um bom serviço ao País. Efectivamente, não é com mais uma proposta do Governo e com o projecto do CDS, é com mais projectos que porventura possam aparecer. Isso é que era importante, porque cada um terá o seu ponto de vista e será de um debate sobre todos eles, sobre os pontos de vista nele perfilhados, que nós poderemos sair daqui enriquecidos e engrandecidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira, para uma intervenção.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu, lendo a «Informação na hora», reparei que estava agendado para hoje a apreciação do projecto de lei n.º 93/III, iniciativa legislativa do CDS. Francamente, estou presente neste debate para me esclarecer sobre o debate da matéria.em questão. Não quero fazer futurologia, mas parece-me que o CDS, certamente, na próxima segunda-feira, num assunto tão importante - salvaguardas as devidas distâncias em relação a esta matéria -, não vai declarar que não está preparado para discutir o Orçamento Geral do Estado.

Risos do CDS.

Portanto, parece que não vai ocorrer isso.
De qualquer modo, quer-me parecer que a nossa posição, minha e do meu camarada, que estamos a assistir a este debate, seria a de ouvir as razões invocadas pelo CDS, pelos diferentes partidos, no sentido de no final orientarmos a nossa opção de voto, visto não sermos obrigados a ser especialistas em matéria de segurança social. É que, de facto, as opções de voto dos deputados terão de basear-se - é pelo menos assim que vem nalguns manuais, creio eu, ou que pelo menos resulta também do bom senso- sobre as razões invocadas por uma e por outra parte em relação a uma matéria em questão.

Ora, até aqui só ouvi duas intervenções sobre esta matéria: a do Sr. Deputado Bagão Félix, que introduziu o debate, e a da Sr.ª Deputada Zita Seabra, que discutiu o diploma e também a do Sr. Deputado Morais Leitão, embora com menor pompa-passo a expressão.

Risos do CDS.

De facto, estamos aqui há uma data de tempo, perdemos aqui uma tarde inteira - e eu já percebi porque é que perdemos, depois deste desaguisado de agora -,perdemos aqui duas, três, quatro horas a discutir o pedido do Sr. Ministro ao CDS para retirar o seu projecto de lei e agendá-lo futuramente. Ora, isso que temos estado aqui a fazer e,,é isto que de facto, desprestigia a Assembleia da República, é isto que, aos olhos da opinião pública, desprestigia os deputados.
É contra isto que quero erguer o mais veemente protesto que possa fazer aqui usando da palavra. Isto não pode continuar. Não pode continuar o abastardamento
do trabalho parlamentar por este processo, que a mim me repugna profundamente e que julgo que a todos os democratas portugueses deve repugnar.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não apoiado!

O Orador: - O CDS tem o pleno direito de apresentar uma iniciativa legislativa, tem o direito de votar, tem o direito de a ouvir e exigir, até, que outros grupos parlamentares se pronunciem sobre ela. O que não pode continuar é este jogo, que parece que é o jogo do cão, do gato e do rato, em que estamos a desprestigiarmo-nos a nós próprios. E eu não quero pactuar com este desprestígio.
O CDS tem o direito e o dever de exigir que as suas posições sejam discutidas aqui e como me parece que na segunda-feira, ao CDS não passará pela cabeça vir dizer que não está preparado para discutir o Orçamento do Estado, também tem o direito de exigir que os outros deputados tomem uma opção fundada sobre a matéria que foi discutida.
Não houve aqui debate nenhum sobre o projecto de lei do CDS; houve um debate entre o Sr. Deputado Bagão Félix e a Srª Deputada Zita Seabra, e mais nada. Isto é mistificação do que deve ser um verdadeiro trabalho parlamentar. Isto é aquilo que pode deitar a perder a democracia portuguesa.

Aplausos da UEDS, do PCP, do CDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: é a situação dos reformados rurais, e ao seu regime de Previdência que a minha intervenção se refere.
Para analisarmos concretamente o que propõe o projecto de lei do CDS, é indispensável ter presente a realidade que os agricultores têm vivido nestes úl. timos anos, e é bom trazer aqui alguns exemplos.
No Encontro Nacional da Agricultura, realizado em Coimbra no dia 13 de Novembro de 1983, dizia uma camponesa do Norte, de cara seca e enrugada pela dureza do trabalho do campo: «dizem que os agricultores são o principal da Nação, mas afinal o que somos é os escravos da Nação».
Com estas simples palavras, esta camponesa teve o aplauso de milhares de outros camponeses nesse grande Encontro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São cerca de 600 000 os agricultores com estatuto de autênticos escravos. Não têm horário de trabalho, nem férias. O que têm é trabalho duro, de costas vergadas ao sol e à chuva, ao calor e ao frio e sem recompensa que se veja.
É uma vida de privações e insegurança.
Um agricultor chega ao tempo de fazer as suas sementeiras e não se sabe por quanto vai vender os seus produtos.
Está sujeito às más condições climatéricas que poderão destruir as suas culturas, sem ter um seguro agrícola que o defenda eficazmente.
Um agricultor, produtor de carne bovina, suína, frango e vacas leiteiras, quer tratar os seu animais convenientemente, a fim de poder tirar maiores rendimentos, e sente-se impossibilitado de o fazer em vir-

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tude das rações e medicamentos estarem ao preço que estão, e lhe faltar o apoio técnico e sanitário.
Apesar de tudo, persiste em produzir. Mas, depois, tem de lutar com a falta de escoamento e de preços compensadores.
No fim, pouco mais lhe resta que uma profunda revolta. Revolta que combate a desilusão.
Com todas estas e outras desilusões, um agricultor perde a paciência e perde a saúde.
Vê todo o seu esforço perdido, nunca teve férias e, em tempo delas, teve de andar a tratar das suas culturas para, no fim do ano, em muitos casos, ir pagar as rendas àqueles que passaram as férias, a que ele não teve direito, nas praias, nas termas, nos casinos e noutros locais requintados.
E se as forças faltam?
E se a saúda se perde?
Que assistência médico-social lhe é assegurada? E, quando o peso da idade ou da doença já pesa mais que a enxada, resta-lhe a reforma.
Mas que reforma, Sr. Presidente e Srs. Deputados?
São 4000$ de reforma por velhice, de 2600$ apenas por invalidez para um agricultor que seja sócio da Casa do Povo. Algum dos Srs. se imagina a sobreviver com estas reformas?
Quanta injustiça para quem produz o nosso pão de cada dia! Com uma situação destas, será que os filhos dos camponeses ficam estimulados para seguir as mesmas pegadas dos seus pais, quando os vêem cheios de privações e revoltados?
E dizia o Sr. Primeiro-Ministro, em 27 de Março de 1983, numa carta enviada aos agricultores:

Impõe-se tornar efectiva a segurança social dos agricultores, e os que trabalham a terra não devem continuar a ser considerados trabalhadores de segunda. Dizia ainda que as reformas de velhice e invalidez, os subsídios de doença e abono de família, bem como a assistência médica, não devem discriminar os que vivem nos campos dos que vivem da cidade.

Que enorme distância vai das palavras aos actos!

Uma voz do PCP: -Muito bem!

O Orador: - Aquando dos últimos aumentos das pensões, mais uma vez os rurais foram discriminados em relação aos outros trabalhadores. Assim, os rurais receberam um aumento de 17,65 %, enquanto os outros reformados beneficiaram de 20,7 %. Com uma taxa de inflação de 25 %, os reformados rurais viram mais uma vez diminuídas as suas já precárias condições de vida, em acelerada degradação, sobretudo a partir de 1980.
Com efeito, a partir desta data, a reforma dos rurais tem-se afastado cada vez mais do regime geral. A evolução das diferenças entre as pensões médias mensais do regime especial dos rurais em relação às do regime geral demonstraram o que acabamos de afirmar: em 1979, a diferença era de 2170$; em 1980, passou para 2280$ em 1981, já era de 2630$; e atingia a diferença de 3010$.
Isto significa que a diferença entre as pensões médias mensais dos dois regimes se alargou, entre 1979 e 1982, na ordem dos 40 %.
E eis-nos chegados, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao momento de analisarmnc n projecto de lei do CDS.

Análise que não pode ser desligada do facto de este mesmo CDS, enquanto parceiro no Governo da coligação AD, ter sido responsável pelo referido agravamento das condições de vida dos reformados rurais, e pelo crescente desequilíbrio entre as pensões do regime especial e do regime geral.
Talvez por isto mesmo, e apesar de agora se querer assumir como oposição, o CDS, com este projecto de lei, não consegue adiantar nada, em termos de eficácia, em relação à situação dos reformados rurais.
Com este projecto de lei, não se perspectivam quaisquer alterações à actual situação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: é preciso que esta situação se modifique, para bem dos rurais, e que o regime de previdência das Casas do Povo passe a integrar-se no regime geral de segurança social, de modo a que os camponeses beneficiem das conquistas sociais, já há muito alcançadas por outros trabalhadores, devendo porém ser consultados através das suas organizações de classe representativas, levando em conta as medidas a tomar.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidenic: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage, para uma intervenção.

O Sr. Carlos Lage (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgávamos, ingenuamente, que iríamos ter uma tarde parlamentar calma e uma resolução breve deste assunto. Enganámo-nos!
Tivemos o Sr. Deputado César Oliveira exaltado, falando inclusive nos direitos do CDS de ver votado o seu projecto- direitos que não estão em causa, visto que o projecto vai ser votado. Tivemos até uma intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito, de que algumas surpresas agradáveis ressaltaram: considerou, até, que o CDS era um partido democrático. Fez progressos que nós registamos, mas, logo a seguir, emendou a mão, porque a sua crença estava em causa. Só que consideramos um pouco chocante que o Sr. Deputado Carlos Brito e o seu partido passem constantemente o tempo a dar atestados de não democracia ao PS e a outros partidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Afinal esta tarde não foi tão calma como nós julgávamos, e ,o jantar, mais uma vez, foi atrasado - nós pensávamos até que poderíamos jantar mais cedo ...

Risos do PCP.

Isso deve-se a factores que não vale a pena estar a explicitar perante o Plenário, como é evidente.
Sobre o projecto de lei do CDS, nós temos a dizer o seguinte: tem alguns méritos, evidentemente.

Risos do PCP.

Simplesmente, esse projecto do CDS tem também orientações e limitações. Tem opções naturalmente controversas, e penso que o actual Governo e o PS têm todo o direito de perante uma iniciativa que, afinal de contas, é do Governo anterior, numa matéria tão complexa e tão importante, ter a sua própria capacidade de pensar e de formular a sua própria política nesse terreno. Por isso, não há qualquer surpresa na atitude, quer do Sr. Minóstro, quer do Grupo Parlamentár do PS, quanto a esta matéria.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós, à falta do texto corrector que o Governo ou a maioria apresentarão nesta Assembleia, à falta de uma iniciativa da própria maioria, não poderíamos votar favoravelmente a proposta do CDS. Poderíamos sim encarar positivamente a proposta do CDS se, simultaneamente, estivesse em discussão uma iniciativa do Governo.

Protestos do PCP.

É que desta maneira, nós teríamos que votar contra uma iniciativa do Governo, da maioria. Não se surpreendam! Entre o Governo e a maioria existe solidariedade política e solidariedade parlamentar, de forma que essa surpresa não tem qualquer justificação.

Aplausos do PS e do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a intenção de conseguir um vasto consenso nesta matéria, como já disse, considerávamos como desejável que o CDS não insistisse na votação hoje, pois, noutras circunstâncias, isto é, com uma iniciativa da maioria em discussão simultânea, encarávamos positivamente a iniciativa do CDS, e, nesse contexto - insisto, nesse contexto, isoladamente não -, seria susceptível do nosso voto de aprovação. Até porque a aprovação, neste momento, na generalidade, da iniciativa do CDS nos impediria de apresentar outra iniciativa e ficaríamos a braços com essa iniciativa, exclusivamente.
Na medida em que se malogrou a possibilidade de baixar à Comissão, não restava outra hipótese ao PS senão exercer um voto em função do projecto isolado do CDS, que não reúne, como já disse, as condições necessárias, por si mesmo, para justificar o nosso voto a favor. O Grupo Parlamentar do PS não se sentiu condicionado pela posição do Governo, visto que perante o projecto, isoladamente, formularia um voto contra.
Evidentemente não fizemos as intervenções que faríamos no debate, pois a nossa expectativa, como já disse, era de que o projecto baixasse à Comissão e, neste momento, já não se justificariam essas intervenções. Aliás, o PS nem tão-pouco estava orientado para esse debate, pois tinha quase uma certeza antecipada, ou melhor, previa que o projecto baixaria à Comissão. Portanto, o nosso silêncio não tem qualquer outra razão que não seja esta.
Temos a certeza de que o projecto de lei de bases da segurança social vai ser apresentado pelo Governo ou pela maioria, temos a certeza de que dentro de alguns meses teremos uma lei de bases da segurança social e, por conseguinte, a situação não é dramática.
A iniciativa do CDS vai malograr-se, o que temos alguma pena que aconteça, mas se a atitude do CDS tivesse sido outra, tivesse existido aqui um compromisso nesta matéria - que é perfeitamente normal, que não haja surpresas relativamente a compromissos que se estabelecem em democracia -, a situação não seria aquela com que nos confrontamos.
Na sequência desta rápida intervenção apenas podemos referir mais uma vez que vamos votar contra. Mas este voto contra não significa uma atitude negativa perante o CDS, significa apenas a necessidade de defendermos e salvaguardarmos a nossa própria política.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. César. Oliveira (UEDS): - Para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Carlos Lage, tivemos aqui esta tarde muitas coisas, entre as quais a minha exaltação, de que peço desculpa à Câmara. Mas o que não tivemos, repito, foi um debate político, extensivo a toda a Câmara, da iniciativa legislativa do CDS.
Evidentemente que admito, na prática política, a celebração de compromissos entre diferentes forças políticas para resolver problemas e, inclusive, para resolver debates parlamentares. Mas o que se exige são compromissos que não degradem o trabalho do Plenário, que não contribuam para o desprestígio das instituições democráticas em Portugal e, nomeadamente, do Parlamento, isto é, que se façam compromissos suficientemente bem feitos para que a sua projecção não venha a indignificar o nosso trabalho neste Plenário!

Vozes do MDP/CDE - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, há mais oradores inscritos. V. Ex.ª prefere responder já ou no fim?

O Sr. Carlos Lage (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ficámos a saber que a maioria estava hoje preparada para discutir este nosso projecto de lei, mas que não o fez por razões estranhas ao Regimento, razões estranhas à praxe parlamentar, por quaisquer razões que ainda não conseguimos investigar.
Ê que o Sr. Deputado Carlos Lage veio-nos dizer que o nosso projecto tem partes meritórias e partes limitativas. Isto quer dizer que o PS estudou profundamente o nosso projecto e depois deste estudo profundo que fez, remeteu-se ao silêncio e mostrou que o nosso projecto nem sequer merecia a discussão, porque aquele estudo aturado que ele fez levou a uma única conclusão: não vale a pena discutir o projecto do CDS!
Não vamos referir o resultado das nossas investigações, esperamos que o Governo nos traga o corrector - porque o PS agora precisa de corrector, da varinha, do pauzinho do Governo- para depois dizer qual ê u nossa posição. Aí é que nós levantaremos o véu das vossas profundas meditações!
Sr. Deputado Carlos Lage, não estamos aqui a brincar, estamos a falar de coisas sérias! Pergunto-lhe claramente quais são as bases do nosso projecto que são meritórias e quais são as que têm limitações? Vamos discutir os méritos e as limitações!
Desafio-o para, pelo menos, dizer quais são, concretamente, os aspectos meritórios e quais são os aspec-

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tos limitativos do nosso projecto em função destas bases!
Quanto à solidariedade, ninguém duvida que ela exista. O que nós lamentamos é que havendo tanta institucionalização, tantas conversas entre as direcções dos Grupos Parlamentares do PS e do PSD, tantas reuniões entre o Governo e os grupos parlamentares - de que os jornais todos os dias não dão notícias -, o PS, que estudou profundamente este problema, ao contrário do PSD que não teve tempo, não tenha concertado uma acção com o PSD e com o Governo, pondo à disposição do PSD e do Governo os seus vastos conhecimentos, a sua investigação para trazer aqui uma solução da maioria a respeito do nosso projecto.
Faça favor de responder, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Depois de ouvir a profunda intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage, penso que há uma conclusão a tirar: o Partido Socialista estudou profundamente esta questão, fez uma intervenção de fundo, ao contrário do que fez o PSD que, pela voz do Sr. Deputado Marques Mendes, demons. trou que nem sequer tinha lido o projecto de lei ... Isto é, o PSD chega aqui e nem sequer se tinha apercebido que o projecto de lei que aqui está em discussão é o mesmo que o seu partido já tinha aprovado.
Isto é lamentável, mas o Sr. Deputado disse-o, o que é louvável.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Eu?! ...

A Oradora: - E nem sequer se tinha apercebido que este projecto de lei corresponde à proposta que o Governo tinha posto a debate público, o que já é grave.
Enfim, o Partido Socialista tem uma atitude bem mais correcta e construtiva: estudou o assunto e chegou à conclusão de que o projecto tem mér!,tos e tem deméritos. E eu fiquei cheia de curiosidade de saber quais, mas vou colocar uma pergunta mais restrita do que a que o Sr. Deputado Narana Coissoró colocou, exactamente para que de uma análise tão profunda saia qualquer coisa.
Só lhe peço isto, Sr. Deputado: indique três méritos e três deméritos do projecto de lei do CDS.

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage para responder.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Evidentemente que não vou responder à ironia com ironia. Algumas questões que aqui foram levantadas não vêm a talhe de foice a esta hora.

Risos.

Não me parece que a minha intervenção tivesse qualquer intenção de ser profunda-não digo como o Sr. Ministro, que teve a frontalsdade de dizer que ainda vai estudar essa matéria. Não sou, pois, conhecedor desse assunto ao ponto de fazer intervenções profundas.

Risos do PCP.

Limitei-me a explicitar qual a situação e porque é que o Partido Socialista, numa perspectiva política, na perspectiva da situação com que nos defrontamos, fez o que fez e por que é que vai votar como vai votar.
Quando o Sr. Deputado César Oliveira defende a dignidade do Parlamento conta sempre com o meu apoio, mas quando isso se torna numa retórica um tanto empolada e se faz de maneira tão enfática, talvez que por vezes se consigam objectivos contrários aos que se pretendem. Tenho o direito de fazer este juízo.
Sr. Deputado Narana Coissoró, como lhe disse, o Partido Socialista tem deputados que conhecem a matéria da segurnça social ...
Vozes do PCP: -Mas não estão cá l

O Orador: - O Partido Socialista não preparou intervenções para este debate, pelas razões que já lhe disse e que são óbvias: é que a expectativa do Partido Social!sta, bem como a do PSD, a do Governo e assim como a própria expectativa do CDS era no sentido de que o desfecho fosse outro e de que este debate decorresse de outra maneira. Por isso comecei por afirmar que este debate estava recheado de algumas surpresas. A razão é, pois, simples e transparente e daí que os deputados socialistas não tenham vindo a este debate.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra pediu-me que apontasse três méritos e três deméritos deste projecto de lei. Sn a Deputada, não,estamos na escola primária ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Antes estivéssemos! Lá não há baldas!

O Orador: - ..., estamos no Plenário da Assembleia da República!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes para formular um protesto em relação às palavras há pouco proferidas pela Sr.ª Deputada Zita Seabra.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr.ª Deputada, uso a figura do protesto, mas quero apenas lamentar que tenha estado desatenta quando há pouco usei da palavra.
Eu não disse que ignorava, mas sim que não tinha suscitado o problema de o projecto de 1e6 em causa ter sido consequência de uma proposta do Governo da Aliança Democrática, de que o meu partido fez parte, e que quem tinha suscitado o problema havia sido o Sr. Deputado Luís Barbosa. Também não disse que não tinha lido o projecto de lei. Antes pelo contrário, o que eu d!sse foi que não tinha sucitado esse problema porque o conhecia perfeitamente.
A Sr.ª Deputada, talvez por deficiência de audição ou por qualquer outra razão, não interpretou bem as minhas palavras.

O Sr. António Macedo (PS): - E agora?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

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A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Diário da Assembleia da Repúbica falará por si ao confirmar que o Sr. Deputado Marques Mendes teve conhecimento disso pela boca do Sr. Deputado Luís Barbosa.
Mas, Sr. Deputado, esperaria que, depois do estudo que fez do projecto de lei, dissesse até quais são as diferenças entre o projecto inicial do Governo e este que agora aqui foi apresentado. Realmente não fez nenhuma referência a isso. Bem, não lhe estou a fazer nenhum processo de intenções nem a avaliar, digamos, o nível de preparação que os deputados da maioria têm desse projecto de lei! Penso até que uma das conclusões a tirar deste debate é a de que os partidos da maioria e o Governo levam «trabalhos para casa, vão estudar o assunto.
Creio, pois, que em matéria de escola primária era bom que acelerassem esse «trabalho de casa» e que seria bom que não aparecessem aqui outra vez a fazer a figura que hoje fizeram.

Aplausos do PCP.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Queria apenas dizer à Sr.2 Deputada Zita Seabra que quanto a escola primária já por lá passei há muitos anos, infelizmente há muitos mais anos do que a Sr.ª Deputada.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é notório!

O Orador: - E creio não precisar de lá voltar!
Mas a Sr .ª Deputada terá ocasião de verificar no Diário da Assembleia da República aquilo que eu disse.
Quanto a diferenças dos 2 projectos poder-lhe-ia apontar algumas: por exemplo, o aspecto do financiamento. Isso mostra que eu li este projecto de lei. Não li, Sr.ª Deputada?

Risos.

Inclusivamente ficou em aberto uma questão que não foi respondida. É que eu disse uma coisa a que ninguém respondeu: quanto tempo terá demorado a elaboração deste projecto de lei?
Trata-se de uma matéria que, como tive ocasião de dizer, é difícil, com imensos problemas. E a Sr.ª Deputada sabe muito bem que não é uma matéria tão simples de forma a que se pega numa caneta e se rabisca um projecto de lei desta natureza.
O PCP tem apresentado muitos projectos relativos a tantas outras matérias, mas que eu saiba sobre esta ainda não apresentou nenhum porque reconhece e sabe que esta é uma matéria muito difícil que requer muitos estudos.
Infelizmente - há que dizê-lo- os grupos parlamentares e a Assembleia, em si, até não dispõem muitas vezes de elementos bastantes que lhes permitam debruçarem-se atentamente sobre um determinado assunto de forma a elaborar um projecto.
Como aqui foi dito pelo Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, o Governo tem em curso estudos que lhe permitirão apresentar um projecto mais arrojado. Daí a razão das referências que há pouco fiz.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É inacreditável! ...

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a continuar o debate, como resulta de deliberação da Câmara, e o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, que nos acompanhou aqui, interessadamente, durante uma parte da tarde, foi-se embora, o que lamentamos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Foi estudar!

O Orador: - Apreciamos a presença simpática da Sr.ª Secretária de Estado, mas interessava-nos mais a responsabilidade do Sr. Ministro do ponto de vista político e de funcionamento da Câmara. Lamentamos, pois, que se tenha ido embora.
Realmente, hoje passou-se aqui qualquer coisa de estranho. O CDS apresentou um projecto de lei, justificou a necessidade da sua apresentação, ninguém, na generalidade, se revelou contra ele e afinal a maioria promete-nos votar contra, por razões meramente formais.
Nós aceitávamos adiar a discussão, mas em troca queríamos que as pessoas, sinceramente, declarassem e formalizassem aquilo que acabaram por revelar pontualmente aqui e ali durante o debate: que, na generalidade, nada tinham a opor ao projecto de lei porque ele tinha méritos e deméritos.
É claro que daí resultariam grandes vantagens e é sobre elas que me vou pronunciar, caindo no risco de repetir o que os meus colegas de bancada já disseram.
E ao Sr. Deputado Marques Mendes, meu amigo, queria recordar que há da sua parte uma questão de aritmética que está um pouco má. É que 2 meses para discutirmos outra vez na generalidade o projecto de lei e a proposta de lei e depois os tais 2, 3 ou 4 meses para, na especialidade, os apreciarmos na Comissão são, de facto, espaços de tempo que se devem somar um ao outro e que, no conjunto, fazem um espaço maior do que os tais 2 ou 3 meses de comissão a partir de hoje.
Como já disse, a justificação da apresentação do projecto de lei já aqui foi salientada no essencial. Sublinharei, no entanto, uma justificação que me parece particularmente importante: a ausência, em termos de definição legislativa e política, de uma explanação sistemática e coerente dos normativos contidos na Constituição da República neste domínio da segurança social. Refiro-me, obviamente, ao direito à segurança social consagrado no seu artigo 63 º
Acontece, na verdade, que a profissão de normas entretanto publicadas sobre temas variados da segurança social não contribuiu para definir com clareza o modo como se pensa dar cumprimento à incumbência cometida ao Estado de organizar, coordenar e subsidiar um sistema unificado e descentralizado com vista a assegurar aos portugueses o direito à segurança social, conforme se afirma na Constituição.

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No que respeita à definição das eventualidades cobertas, das pessoas abrangidas, do esquema das prestações praticado nos diversos regimes contributivos, pode dizer-se que no essencial se mantém em vigor o disposto na Lei n.º 2115, de 18 de ]unho de 1962, e diplomas que na sequência dos anos a vieram a regulamentar e completar.
Já não é assim ou pelo menos já não é tanto assim no tocante aos regimes chamados não contributivos, que na sequência do 25 de Abril de 1974, conheceram um significativo alargamento com a publicação do Decreto-Lei nrº 170/80, de 29 de Maio.
Falta, porém, dar sequência a tal alargamento, articulando devidamente regimes não contriutivos com regimes contributivos, esclarecendo o estatuto dos beneficiários de ambos os regimes e definindo claramente um sistema de financiamento capaz de completar tanto um como outro.
Por outro lado e no que à matéria da definição orgânica do suporte administrativo do sistema se refere, também, alguma coisa se fez com relevante significado e aí,-pode-mesmo dizer-se, com alcance definitivo.
Refiro-me à estrutura posta de pé a partir de 1980 na sequência do disposto no Decreto-Lei nrº 549/77, de 31 de Dezembro, criando um serviço público encarregado de gerir todo o sistema de segurança social na base dos princípios da descentralização e da participação, embora definida em termos parcelares.
Porém, no que se refere ao suporte administrativo do sistema, algo se torna também necessário fazer principalmente após alargamento à segurança social das atribuições do Ministério do Trabalho, alargamento com o qual foram introduzidas assimetrias e confusões orgânicas que convém desfazer, aplicando por outro lado, de modo esclarecido, o disposto no nrº 1 do já referido artigo 63 º da Constituição da República na sua projecção no domínio da organização.
Segue-se, portanto, que em matéria de segurança social, como infelizmente em tantas outras algo há a fazei para que as normas constitucionais ultrapassem o quadro puramente normativo e se traduzam em realidades significativos para todos os portugueses.
É pois, indiscutível a necessidade do presente projecto, assim como o seu próprio alcance e eficácia.
Não quero, porém, deixar de salientar 3 aspectos do projecto que me parecem da maior relevância e que lhe emprestam natureza verdadeiramente inovadora, ao contrário do que aqui já foi dito com bastante leviandade.
É o caso do sistema de financiamento nele previsto em termos de grande realismo que permite esconjurar definitivamente os fantasmas do sistema de segurança da I República e que vai permitir também libertar para os sistemas contributivos o produto das contribuições de empresas e trabalhadores que ficarão agora consignadas apenas ao financiamento desses sistemas, vinculando as contribuições do Orçamento Geral do Estado aos sistemas não contributivos.
Trata-se de inovação do maior alcance. Também do maior alcance - e permito-me salientá-lo com particular ênfase- é a jurisdicionalização dos direitos de todas as pessoas abrangidas, quer pelos regimes contributivos quer pelos não contributivos. Assim nascerá com efeito o direito à segurança social encabeçado em todo e qualquer um dos portugueses.

Finalmente, apesar de tudo o que foi dito, permito-me salientar o grande alcance da garantia de actualização das prestações diferidas. Também aqui estamos perante normas destinadas a ter repercussões e alcance imediato.
Foi por tudo isto, Srs. Deputados, que o CDS se bateu para obter desta Câmara o compromisso da sua adesão na generalidade a este projecto de lei, que no campo da política social permitiria suavizar para os portugueses os rigores da política económica com os quais temos sido defrontados.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Era nesse sentido que pretendíamos não um voto mas um compromisso. Assim vamo-nos sujeitar a um voto e praza Deus que vença a interpretação dos que pensam que pode voltar aqui uma proposta de lei sobre este tema, porque isso é o que nós queremos, isto é, não inutilizar durante a presente sessão legislativa a possibilidade de lançar as bases gerais do nosso sistema de segurança social.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, meu amigo, na parte aritmética que V. Ex.ª referiu - e o meu pedido de esclarecimento tem apenas a ver com isso-, V. Ex.ª errou, porque aquilo que o Sr. Deputado Morais Leitão disse, foi que o CDS não se importava de depois esperar 2 meses em Comissão para que aparecesse a tal proposta de lei. Portanto, isso levaria sempre ao mesmo período de tempo que eu refen. E eu estou convencido de que fazendo já, na generalidade, o debate conjunto do projecto e da proposta de lei os tais mais 3 meses de discussão em sede de especialidade não seriam necessários. Creio até que, então, bastariam poucas semanas para se chegar a um acordo.
Penso, pois, que pela tese apresentada pelo Governo conseguiríamos ter uma lei em prazo muito mais curto. Partilha V. Ex.ª da minha opinião?

O Sr. Presidente: - Uma vez que o Sr. Deputado Nogueira de Brito manifestou o desejo de responder no fim a todos os pedidos de esclarecimento que lhe forem solicitados, tem agora a palavra a Srª Deputada Zita Seabra.

A Srª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, far-lhe-ei 2 breves pedidos de esclarecimento, que penso que permitirão clarificar melhor algumas das questões que não são transparentes no texto do projecto em apreço.
Disse o Sr. Deputado na intervenção que acabámos de ouvir que a receita proveniente das contribuições passaria a ser afectada ao regime contributivo, chamando-lhe assim, da segurança social. Ora uma das questões que no campo do financiamento é equívoca neste projecto, e que de resto eu já tinha colocado na minha intervenção, é a acção social. Está ela ou não englobada nesse capítulo? É ela ou não, de acordo com este articulado, igualmente financiada a partir da receita provindo das contribuições?

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Parece-me que esse era um ponto importante a ser aqui esclarecido.
Em segundo lugar, creio que o Sr. Deputado me deu razão quando caracterizei este projecto de lei do CDS como um projecto que acima de tudo legisla sobre o que já existe e que faz uma certa mistura entre aquilo que herdámos do regime fascista em matéria de previdência e aquilo que está consagrado na nossa Constituição sobre segurança social, tal como acontece na realidade hoje presente. E referiu com louvor o espírito, que ainda se reflecte no projecto de lei do CDS, com que foram criadas as Leis nº 2115 e 2120, referentes à Previdência e à assistência social. De facto, creio que na verdade este projecto de lei - e esta é uma das principais críticas que lhe fazemos - enferma ainda de muito do espírito dessas leis, sobrepondo-se ao espírito do texto constitucional. Aliás, parece-me que isso também transpareceu da sua intervenção.

O Sr. Presidente: -- Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.

A Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Leonor Beleza): -Sr. Presidente, solicitei a palavra não para um pedido de esclarecimento mas para um protesto.
É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-me indispensável manifestar aqui a minha total estranheza e o meu protesto pelo facto de o Sr. Deputado Nogueira de Brito se ter permitido qualificar a presença aqui de um Secretário de Estado, num momento em que 5 discutida uma matéria da área da sua competência, de «simpática».
Eu só posso entender essa expressão como dirigida a um Secretário de Estado que neste caso é uma Secretária de Estado e assim uma certa desvalorização para com o titular desse cargo.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, quero colocar-lhe duas questões muito breves e concretas.
Assim, e no que respeita à base iv, gostava de saber em que regime é que se poderão incluir determinadas categorias profissionais, designadamente os independentes, os artistas, os jogadores, o clero, etc.É com inscrição facultativa ou integram-se na acção social?
A outra questão relaciona-se com a base v. Será que o regime geral de segurança social não deve ser também estendido às pensões de viuvez e de orfandade, questão em que o projecto de lei é omisso?

O Sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito para responder aos esclarecimentos que lhe foram solicitados, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lage, que a solicitou para interpelar a Mesa.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, gostaria que V. Ex.ª definisse ou trocasse impressões com os grupos parlamentares sobre o estabelecimento de uma hora limite para este debate, porque de outra forma corremos o risco de ele se prolongar indefinidamente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, na verdade eu comungo do mesmo desejo de que o debate termine o mais cedo possível, simplesmente o requerimento aprovado há pouco pela Câmara era no sentido de que a sessão se prolongasse até à votação, na generalidade, do diploma em apreço.
Neste momento - e é uma informação que presto à Câmara - existem 4 pedidos de esclarecimento e um protesto a que o Sr. Deputado Nogueira de Brito irá responder e uma inscrição para intervenção de um partido que ainda não interveio no debate, o MDP/CDE, e que tem todo o direito de o fazer.
Suponho que depois de realizadas essas intervenções estaremos chegados ao fim do debate. Mas não se trata de uma certeza, é apenas uma suposição e um desejo.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Para responder e contraprotestar, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, para contraprotestar porque realmente a Sr.ª Secretária de Estado fez uma referência sobre o sentido da minha expressão «simpatia». Com ela eu não quis, de maneira nenhuma, desvalorizar o exercício por uma senhora do cargo de Secretário de Estado ou de qualquer outro cargo político e pensei que à Sr.ª Secretária de Estado nem tal passasse pela cabeça. Ao contrário, pensei que tomasse a minha expressão exactamente no sentido que ela tinha e que era realmente uma expressão de simpatia. Eu diria que a sua resposta é que foi menos simpática, Sr.ª Secretária de Estado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E foi também menos simpático a ausência do Sr. Ministro, mas isso é outro assunto.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): -Tem muitos afazeres no Ministério.

Risos.

O Orador: - Passando agora a responder aos pedidos de esclarecimento, direi ao Sr. Deputado Marques Mendes que de facto não foi essa a nossa interpretação da intervenção do Deputado Morais Leitão, que terá dito que na comissão poderíamos estar à espera durante 2 ou 3 meses, ou até mais tempo.

Quanto aos esclarecimentos de fundo solicitados pela bancada do Partido Comunista Português, direi que, no que respeita à acção social, as suas modalidades são definidas no projecto de lei como subsistências de aspectos assistenciais no regime da segurança. Portanto, enquanto se vincula o Orçamento do Estado a subsidiar os regimes não contributivos, que, esses sim, perdem carácter assistencial para se transformarem em verdadeiros aspectos de segurança social, no que respeita à acção social essa mantém carácter assistencial e faz-se programaticamente ao Estado, isto é, incumbe-se o Estado de contribuir para o seu financiamento. Mas essa contribuição estará dependente das possibilidades ou não de contribuição.
Quanto ao mais, Sr.ª Deputada Zita Seabra, quanto ao mais não há qualquer conexão com este projecto de lei. Ou antes, há algumas conexões porque, em

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meu entender, a Lei nª 2115, estabeleceu e estruturou aspectos fundamentais do nosso regime de previdência.
Mas nós com este projecto de lei ultrapassámos o seguro social, assim como a Constituição o ultrapassou. Mas a Constituição ultrapassou-o na letra da lei e nós, com este projecto de lei, pretendemos passar da letra da lei para os próprios actos no sentido de dar conteúdo aos direitos dos cidadãos à segurança social.
Este projecto de lei é um projecto de estrutura e de. estatuto da segurança social e, nesse sentido, ultrapassa todas as leis aprovadas antes de 25 de Abril de 1974.
Não estamos perante formas de seguro social mais ou menos generalizado, mas estamos perante uma forma de segurança expressa, designadamente no que se refere aos regimes não contributivos, ou seja, claramente perante um regime de segurança. Portanto, aí há uma diferença capital e nítida. E só o passaremos a estar perante formas de seguro social através da jurisdição dos direitos das pessoas abrangidas pelos regimes não contributivos que é, precisamente, consagrada nesta lei.
Quanto ao Sr. Deputado Vidigal Amaro, que me fez perguntas sobre o tipo de regime em que estão abrangidos alguns estratos ou algumas categorias profissionais, respondo que seguramente não estão abrangidas pelas modalidades da acção social, mas serão equiparados ao regime geral contributivo. Dessas equiparações graduais, em relação a todas as categorias que mencionou, algumas são de datas anteriores ao 25 de Abril de 1974, e outras datam da prática de governos da Aliança Democrática. É claro, portanto, que se trata de pessoas a abranger pelo regime geral contributivo.

O Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se não quisemos roubar tempo à Câmara foi principalmente pelo incidente que se verificou com a maioria.
No entanto, desde que finalmente se está a debater este projecto de lei e já que, pelo menos, o partido maioritário - ficámos a sabê-lo pela voz do Sr. Deputado Carlos Lage - sempre estudou em profundidade o projecto de lei, decidimos deixar aqui algumas dúvidas perante a análise que fizemos ao projecto de lei apresentado pelo CDS. Assim, gostaríamos que os Srs. Deputados do CDS, no caso de quererem, nos prestassem esclarecimentos às dúvidas que passo a expor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Existindo, por um lado, a Constituição e, por outro, diversas leis e decretos-lei que versam a matéria da segurança social, interessaria que a Lei de Bases da Segurança Social concretizasse o que consta do artigo 63 º da Constituição, sem atingir o nível de pormenor da legislação publicada sobre o assunto.
Não é isso que acontece com a proposta do CDS, na nossa opinião, como claramente se pode concluir do teor da sua base II, nomeadamente, porque nada concretiza relativamente à Constituição. Não se diz o que se entende por segurança social, o que é que tal designação abrange ou em que consiste o sistema de segurança social na sua base III, limitando-se a dizer como se processará tal sistema e deixando para o Governo a definição e a execução da política de segurança social, na sua base ». Não seria de esclarecer

esta situação, ou seja, definir claramente o que se entende por segurança social?
Um aspecto que consideramos positivo do vosso projecto de lei, Srs. Deputados, é o facto de se dividir em dois regimes de segurança social, ou seja, o geral, de natureza contributiva e o não contributivo. É a base IV. No entanto, a uniformização do regime geral é deixado no vago, uma vez que se diz que o regime especial de previdência dos trabalhadores rurais, tema já bem levantado aqui pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, bem como o de protecção social da função pública, na sua base LX, se mantém e que serão gradualmente integrados no regime geral. Mas o que não se diz é quando estará tal processo concluído. Gostaríamos de ser esclarecidos quanto a esta matéria. Por outro lado, não acha o CDS que se deveriam acertar as outras regalias sociais para se poder considerar completamente correcta esta atitude de uniformização?
Também poderemos considerar positivo o facto de se prever, na base L, que o financiamento do regime não contributivo é integralmente realizado através do Orçamento do Estado, visto que o regime não contributivo visa atingir «o cidadão» e não «o trabalhador», como no caso do regime geral contributivo.
Contudo, não acha o CDS que isso dificilmente poderá vir a ser aceite, num contexto de restrições de toda a ordem a nível orçamental, as quais se estão a registar a toda a hora no nosso país?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia maior silêncio.

O Orador: - Sr. Presidente, nomeadamente nas bancadas da maioria há mais interesse na chicana política do que em debater os assuntos em profundidade.
Estarei aqui o tempo que for necessário até acabar de formular os pedidos de esclarecimento que entendo dever fazer aos deputados que apresentaram este projecto de lei.
Na base XLIII, nº 2, classifica-se a não canalização das contribuições para o organismo respectivo, como abuso de confiança.

Contudo, parece-nos indefensável o apoio ao não pagamento das dívidas às instituições de segurança social. A menos que se possa propor - e gostava também de saber a opinião dos autores do projecto de lei - um esquema alternativo, em que o Estado ou a Banca assumam uma posição supletiva, pagando às instituições de segurança social e ficando na posição de credores, relativamente às entidades que deveriam ter efectuado tal pagamento.

A Constituição, no seu artigo 63 º parece separar segurança social de saúde a que se refere no artigo 64 º, mas diz no nº 4 do artigo 63 º que « o sistema de segurança social protegerá os cidadãos na doença ... ». Parece, pois que não se trata só de completar o vencimento em caso de doença, mas também de assegurar os direitos à . saúde, cuja satisfação competirá, então, ao Serviço Nacional de Saúde.
No entanto, Sr. Deputado, esta proposta apenas contempla «prestações pecuniárias ou em espécie, relativas às eventualidades de doença ... (base x)», gostaria de saber se não seria possível ir um pouco mais longe. No n.º 1 do titulo I, as opções fundamentais da introdução ou exposição de motivos, diz-se que este «projecto sobre as bases de segurança social não

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é dominado por preocupações de ordem organizativa». Em conformidade, afirma-se na base XXXVIII, n.º 1, que «a estrutura orgânica e a estrutura participativa do sistema de segurança social são definidas na lei». Julgamos que numa lei destas não se pode, legitimamente, assumir esta posição, até porque o aspecto organizativo pode, na prática, inviabilizar a aplicação da lei, pelo menos em termos correctos - que se deseja serem correctos.
Seja como for, consideramos, no MDP/CDE, que é sempre preferível ter uma lei de Bases da Segurança Social, mesmo menos correcta e menos boa a não ter nenhuma, quando, ainda por cima, a legislação em vigor está, em muitos aspectos, claramente ultrapassada.
No entanto, este projecto de lei em alguns aspectos é pouco concreto, reflecte pouco «diálogo», digamos assim, com a realidade e não define, amiúde, os elementos envolvidos. Por isso, Srs. Deputados, e para terminar vou pedir, se não se importara, mais 3 esclarecimentos: Na base XVI, n.º 1, diz-se que «as pensões do regime geral e do regime não contributivo são periodicamente revistos», mas não se adianta mais nada sobre a periodicidade, nem sequer se define o que é uma pensão. Não seria de esclarecer claramente este n.º 1 da base XVI?
Também nos parece que seria oportuno definir claramente o que é abono de família, matéria esta que parece ter ficado um pouco em branco no vosso projecto de lei.
Finalmente, na base XXIX diz-se «as pensões do regime não contributivo são estabelecidas com referência ao montante das remunerações mínimas garantidas», mas não se estabelece ao menos um limite mínimo para tal «referência»?
Não será perigoso, Srs. Deputados, deixar ao arbítrio de quem decide posteriormente a definição dos mínimos destas pensões?
Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Gostaria, realmente, de ser esclarecido sobre estes assuntos, e se o debate se proporcionar teremos mais algumas dúvidas a colocar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

Sr. Bagão Félix (CDS): - Gostaria de começar por agradecer as perguntas que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca faz - aliás, penso que era nesse sentido e nessa perspectiva que o debate se deveria ter desenvolvido - e dizer-lhe que estamos abertos para, efectivamente, debater na especialidade todas essas questões.
Há uma pergunta que levantou com muita acuidade e que merece da nossa parte uma grande ponderação.
Não sei se consegui apanhar todas as suas perguntas mas o Sr. Deputado depois me dirá se fui relativamente exaustivo.
A primeira questão que levantou refere-se ao artigo 63.º da Constituição e, de certo modo, a uma segunda pergunta que estava ligada ao regime contributivo e ao regime não contributivo.
A nossa opinião é que no projecto de Lei de Bases da Segurança Social conseguimos, efectivamente, seguir e cumprir a ... e o espírito do artigo 63.º da Constituição. Se reparar bem o artigo 63.º da Constituição é constituído por quatro partes.
Na primeira, expressa-se um direito programático social extremamente importante, em que se diz que todos têm direito à segurança social. É um direito programático mas que depois tem de ser definido no plano jurídico. E foi isso que a lei procurou fazer, ou seja, transpor do plano programático para o plano jurídico através da confluência de 2 regimes de segurança social e das modalidades da acção social.
O n.º 2 deste artigo refere-se às obrigações do Estado organizar, coordenar e subsidiar. Creio que a mais importante delas é a subsidiação. Já nos referimos ao aspecto de financiamento, mas como o debate vai longo penso que talvez pudesse ficar por aqui.
O terceiro ponto deste artigo refere-se ao papel e à importância das instituições particulares de solidariedade social. Creio que a minha intervenção no início deste debate foi também elucidativa sobre as razões que motivaram o CDS em incluir esse ponto, nos termos em que foram apresentados, no projecto de lei. O quarto pronto refere-se à protecção nas nove eventualidades clássicas da segurança social.
Não foi por acaso, aliás, que disse, na minha intervenção inicial, que este artigo 63.º da Constituição, de certo modo, tentava confluir, através de uma perspectiva universal e programática do direito à segurança social, a perspectiva laboralista e a perspectiva assistencialista, respectivamente nos n.ºs 3.º e 4.º deste artigo 63.º Isto é, aí há a definição de segurança social laboral ou laboralista no sentido de poder substituir-se à perda de rendimentos dos segurados ou de compensar acrescidas despesas como encargos familiares. E com isto, Sr. Deputado, respondo a outra pergunta que fez e sobre o abono de família.
É evidente que não estão aqui definidas as prestações, pois nós preferimos definir as eventualidades que, aliás, estão previstas na Convenção n.º 102 da OIT e que, como sabe, são classicamente nove. Enfim, podia apontar-lhas todas, mas existe uma que se chama «encargos familiares», e onde obviamente se inclui o abono de família, onde se inclui o subsídio de nascimento, o subsídio de aleitação, etc., etc.
É evidente que o sistema de segurança social pode e deve evoluir, como nalguns países já foi feito, no sentido de aumentar mais eventualidades ao sistema de segurança social como, por exemplo, despesas de formação, assistência judiciária, despesas em termos de habitação social, etc.
A lei não coarcta isso, não impede isso, e é suficientemente flexível para permitir isso no futuro. Procurámos ser cautelosos para não entrarmos em sonhos que neste momento são impraticáveis e inexequíveis.
Quanto à questão que levantou sobre o financiamento do Estado, fui claro na minha própria intervenção ao dizer que estamos conscientes que isto não pode ser feito de um dia para o outro, mas a admissão clara do princípio numa lei de bases da segurança social é, já em si, um factor que pode proporcionar um maior desenvolvimento deste objectivo.
Terá de ser feito faseadamente, terá de ser feito de qualquer maneira e por isso é que disse que o princípio em si era mesmo inquestionável.
De qualquer maneira penso que os passos que já foram dados, embora não satisfatórios, nos últimos orçamentos, permitem dizer que estamos, efectivamente, nesse caminho.

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Quanto à questão das dívidas à Segurança Social penso que a questão que levantou é extremamente interessante e importante. É talvez uma questão plenamente técnica, embora tenha subjacente, como é óbvio, uma visão política do problema. De qualquer maneira é evidente que esta questão não se pode pôr ou não se pode enquadrar numa carta, digamos, numa lei quadro do sistema de segurança social e é evidente que teremos que reconhecer que compete aos governos a execução concreta, sem prejuízo de alguns princípios fundamentais, como aqueles que V. Ex.ª referiu, ou seja, o abuso de confiança, a fiscalização do sistema de segurança social, a criação de sistemas que permitam uma moralização, em todos os sentidos, deste sistema.
Disse V. Exª. que o projecto de lei preocupa-se pouco com aspectos organizativos.
Sr. Deputado, devo dizer-lhe, sobre isto, que a organização do sistema de segurança social, que estava explicitada no Decreto-Lei nº 549/77, da autoria do I Governo Constitucional, que também citei na minha intervenção e que tem defeitos e virtudes, que tem aspectos a prosseguir e outros a discutir, esteve 2 ou 3 anos sem ter sido praticada.
E, finalmente, em 1980, foi impulsionada e implementada com todos os defeitos, repito, mas também algumas virtudes que tinha, designadamente a nível de regionalização, dos centros regionais de segurança social.
Ora bem, foi exactamente pegando nessa experiência, que pensámos que não tinha suficiente dignidade para este projecto de lei por este está, de facto, visto numa perspectiva mais de consideração do que é o direito à segurança social, que entendemos que esta matéria não deveria pertencer-lhe,
De qualquer maneira, na especialidade, penso que é de discutir e, pessoalmente, aceito perfeitamente que se incluam alguns pontos sobre este aspecto.
Se não o fizemos foi exactamente para não dar ao projecto de lei aquilo a que chamei na minha intervenção inicial de um carácter excessivamente conjunturalista que pode ser modificável ou revogável segundo a vontade de cada governo que entretanto se vai formando.
Quanto à base que V. Exª. referiu relativamente à actualização das prestações sociais, a palavra que está lá explicitada, é «periodicamente».
O Sr: Deputado levanta bem a questão, em meu entender.
De facto, talvez pudesse estar mais explicitada qual a periodicidade.
É evidente que esta expressão «periodicidade» pode-nos levar a dizer que até pode ser superior a 1 ano ou, em contrapartida, inferior a 1 ano se por qualquer razão entrarmos num sistema de indexação ou noutro qualquer (estou a falar apenas ao plano teórico do problema).
De qualquer maneira parece-me que em sede de comissão e de especialidade a situação pode ser perfeitamente clarificada e eu próprio aceito, como um dos proponentes deste projecto - e o CDS aceitará isso -, que, de facto, tal se possa modificar no sentido de ficar mais clarificado o conceito de periodicidade.

De qualquer maneira penso que é importante aqui ficar clarificado um aspecto que talvez tenha passado um pouco à margem desta discussão, embora creia tê-lo referido na minha intervenção, que diz respeito ao facto de haver duas questões na valorização das

prestações sociais: a indexação, ou seja a revisão periódica das prestações sociais das pessoas que já delas usufruem, portanto, dos pensionistas, dos reformados (por exemplo); e outra questão essencial é a valorização das prestações dos reformados, isto é, daqueles que amanhã irão ser reformados.
E aí penso, pegando, aliás, numa pergunta que a Sr.ª Deputada Zita Seabra me fez no seguimento da minha intervenção, que o aspecto mais fundamental e talvez um dos mais inovatórios deste projecto de lei, é obrigar à revalorização dos salários para efeito do cálculo das pensões.
Isto significa na prática, Srs. Deputados, que, actualmente, uma pensão é calculada com base numa média complicada (não interessa agora) que normalmente incide sobre os salários nominais dos últimos cinco anos.
Isto significa que, na prática, o reformado tem desde logo a sua pensão desvalorizada porque é recebida ou porque é calculada em termos nominais.
Ora bem, com a revalorização dos salários que está subjacente a este projecto de lei do CDS acontecia que, efectivamente, os salários de há 5 anos tomados para a média salarial para efeito de cálculo de pensão seriam revalorizados pelas taxas de inflação e, portanto, a situação inicial das prestações sociais não seria, desde logo, comida pelo custo de vida e pela inflação.
Aliás, nós em 1982, salvo erro, num dos Governos em que participei, tentámos já um principio deste género, embora não tenhamos ido tão longe, quando aumentámos de 2 % para 2,2 % (que significa um acréscimo de 10 %) a contribuição de cada ano de descontos para efeito de cálculo das pensões.
Pensamos que isto é importante e deve ser prosseguido e no fundo a preocupação foi já um pequeno passo para este objectivo que nos parece extremamente importante e adequado.

Uma voz do CDS: -Muito bem

O Orador: - Finalmente, falou-me o Sr. Deputado, pelo menos das perguntas de que me recordo, da indexação, do regime não contributivo.
A indexação, de certo modo, está aqui condicionada, em termos de variáveis de cálculo, ao salário mínimo. É um aspecto importante que até agora não existe, pois não há qualquer ligação obrigatória, legal, entre a pensão mínima do regime não contributivo, que é a pensão mais baixa do sistema de segurança social, e o salário mínimo.
Este é também, evidentemente, um assunto a ponderar na comissão. Aliás, já existiu qualquer coisa desse tipo nos primeiros anos a seguir ao 25 de Abril e penso que é um assunto a que estamos perfeitamente abertos a discutir na especialidade e parece-me, portanto, correcta e fundamentada a pergunta do Sr. Deputado.
Muito obrigado.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Bagão Félix, ouvi atentamente as suas respostas, há, no entanto, algumas questões que - creio eu - não foram respondidas.

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Primeiro, na base III - tal como já referi - há 9 artigos mas nada se diz acerca do que é a segurança social, deixando ao Governo a liberdade de definir e executar a política de segurança social.
julgamos que, por mera medida cautelar, estes preceitos deveriam constar da lei e, por isso, pergunto-lhe se não quer ir um pouco mais longe nesta base III e colocar-lhe qualquer coisa que defina claramente o que é a segurança social e a política que deve ser seguida no âmbito dessa segurança social.
Segundo, no respeitante à uniformização do regime geral e ao regime especial para os trabalhadores rurais - que são problemas que preocupam seriamente muitos milhares de trabalhadores deste país - gostava de saber se não se podia ir um pouco mais longe neste aspecto.
Finalmente, há um ponto um pouco melindroso - agora que se fala tanto em austeridade para uns e não para outros - relacionado com as dívidas às instituições de segurança social. Gostava de saber a sua opinião acerca deste problema. Sabemos que classifica de «abusos de confiança» as fugas, mas nada disse acerca da existência de certas dívidas à segurança social.
Acha ou não que poderíamos encontrar um esquema que introduzisse mecanismos de modo que a banca ou o Estado se assumissem como verdadeiros credores dessas dívidas, intervindo depois sobre as empresas de modo a que nunca faltassem à segurança social as verbas necessárias para o cumprimento de uma lei desta natureza?

O Sr. Presidente: - Se assim o entender, tem a palavra para responder, o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. pagão Félix (CDS): - Sr. Deputado João Corregedor, peço-lhe, desculpa, de facto, não consegui «apanhar» estas três perguntas na sua intervenção inicial, tenho, no entanto, muito gosto em responder.
Não está definido, digamos, em termos literários, o que é segurança social mas é evidente que a economia do projecto de lei procura consubstanciar a definição de segurança social a quatro pontos - para citar os mais importantes - fundamentais: o que é o direito à segurança social; o que é o direito judicial e administrativamente exigível pelos cidadãos perante as instituições de segurança social; o que é o sistema de segurança social (factor que nos podia levar a uma longa discussão no sentido de se analisar o sistema numa perspectiva orgânica ou de prestações concedidas) e, finalmente, quais as eventualidades cobertas pelos regimes de segurança social, isto é, qual é o substrato concreto dos regimes de segurança social.
Ora bem, é neste conjunto que se forma, em nosso entender, na economia do projecto o conceito de segurança social, facto que, aliás, tive oportunidade de explanar na exposição inicial que produzi. De qualquer modo penso que, de modo semelhante à base i, que é introdutória e de apresentação do projecto de lei, se poderá acrescentar/aditar uma segunda base que traduza as preocupações do Sr. Deputado.
Quanto à questão da uniformização do regime geral, o projecto de lei diz que o regime dos trabalhadores rurais passará a integrar - assim como outros regimes, por exemplo, o dos trabalhadores independentes, o do clero, o dos profissionais de futebol, o dos ferroviários, etc., há uma série de regimes que andam dis-

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persos -, embora tenha uma estrutura estrito senso, semelhante ao regime geral visto não estar nele incluído. O nosso projecto de lei prevê essa integração com todas as consequências a nível de benefícios e, é evidente, algumas consequências a nível contributivo.
Ter-se-ia que, penso eu, de fazer as necessárias adaptações ... isto é uma opinião visto que compete ao Governo definir a integração no sentido das prestações concedidas, dos direitos e dos deveres. O objectivo é, de qualquer modo, aquele que o Sr. Deputado salientou, isto é, não considerar a existência de sectores da população activa portuguesa marginalizados em relação a outros sectores.

Terceira e última questão: dívidas à Previdência.

F uma questão velha, a sua sugestão - embora de outra forma- foi um procedimento que utilizámos no desempenho das funções de Secretário de Estado da Segurança Social relativamente, por exemplo, ao desconto de letras no sistema bancário o que, na prática, conduziria à mesma situação que referiu.

Como última reflexão deixaria aqui o seguinte ponto: a questão das dívidas à Previdência tem de ser prosseguida sem tréguas, é um objectivo essencial visto que são jurídica e socialmente privilegiadas e, por isso, devem estar no primeiro plano das preocupações. É evidente, também, que algumas empresas têm manifestas dificuldades, mas penso, Sr. Deputado, que uma das grandes razões -como os impostos - que motivam o não cumprimento pontual, nalguns casos, do pagamento das contribuições à segurança social, deriva da falta de transparência do sistema, isto é, por exemplo, entre 1974 e 1980 não se assistiu à actualização das prestações sociais deixando, obviamente, de haver a apetência, o convite, o incitamento, o factor preventivo, para que os cidadãos, a colectividade, se sintam responsabilizados pelo pagamento.

Aplausos do CDS.

O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. (Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Bagão Félix, sob a forma de protesto, gostava de lhe dizer o seguinte: muito obrigado pelos seus esclarecimentos.
Espero que em comissão se possa tentar arranjar uma definição para o que é segurança social, não será bem uma definição literária, como disse V. Ex.", mas sim, como deve saber, algo mais.
Esperamos que um debate destes se possa realizar em comissão visto ser um assunto demasiado sério que merece toda a seriedade no seu tratamento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, está encerrado o debate. Vamos passar à votação na generalidade do projecto de lei n.º 93/III.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do CDS, votos contra do PS, do PSD e da ASDI e abstenções do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

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18 DE NOVEMBRO DE 1983 2059

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço à Mesa a contagem dos votos por grupos e agrupamentos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, Sr. Deputado, temos de proceder a segundo escrutínio.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a verificação de quórum.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com a contagem dos votos por grupos e agrupamentos parlamentares chegamos à conclusão da existência ou não de quórum.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não é a mesma coisa! Primeiro faz-se a verificação de quórum porque ele pode não existir.

Protestos do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já se votou! Se tinha dúvidas levantava-as antes!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Se não houver quórum não há votação!

Protestos do PCP e do CDS.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não pode usar da palavra!

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, pedi uma verificação prévia de quórum. Se não existir quórum na Sala não se pode votar.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É evidente! Protestos do PCP..

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, contando os votos não chegamos à conclusão se há ou não quórum?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não pode falar!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Carlos Brito, não me importa que esteja a bracejar, vou falar!

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nos estamos a votar!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, não se pode fazer uma votação quando é pedida a contagem prévia do quórum. É evidente que, se não há quórum numa sala, não se pode votar e se há alguma votação feita sem quórum ela não é válida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Isto é claro e decorre de uma interpretação simples do Regimento!

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, este problema da existência ou não de quórum devia ter sido colocado antes do início da votação. Estamos no meio de uma votação que não pode ser interrompida.
O que o Sr. Presidente, no fim da votação, poderá dizer é que o número de votos não satisfaz o quorum e que, por isso, a votação não teve efeito jurídico. Não se pode é interromper uma votação.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A Mesa vai proceder à votação por grupos e agrupamentos parlamentares do projecto de lei n.º 93/III.

Procedeu-se à votação do projecto de lei n.º 93/III, que obteve o seguinte resultado: 22 votos a favor do CDS; 70 votos contra, sendo 36 do PS, 32 do PSD e 2 da ASDI, e 27 abstenções, sendo 21 do PCP, 3 do MDP/CDE, 2 da UEDS e 1 do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o total de votos é de 119. Não há quórum, a votação que acabámos de realizar não tem efeito.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na medida em que hoje não se votou, melhor, não há quórum e a votação não teve validade, amanhã e primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos deve consistir na votação do projecto de lei do CDS. É uma situação que decorre da fixação, pelo CDS, da ordem de trabalhos. É um processo que não pode ficar incompleto e, por isso, amanhã o primeiro ponto da ordem dos trabalhos deve ser a repetição da votação.

O Sr. Presidente: - O primeiro ponto da ordem do dia.

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2060 I SERIE - NÚMERO 48

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Salvo o devido respeito, entendo que a opinião do nosso colega, Sr. Deputado Carlos Lage, não pode ser aceite. E isto, por uma razão muitíssimo simples: é que não podem ser transportados de hoje para amanhã os assuntos da ordem do dia que estavam fixados para hoje. Ora, a discussão e votação deste projecto de lei estavam fixados na ordem do dia de hoje e a partir do momento em que não houve quorum suficiente não se pôde fazer a votação. Assim, teremos que aguardar a discussão e votação deste diploma para qualquer outro dia - talvez para daqui a dois meses - quando o Sr. Ministro do Trabalho e da Segurança Social nos apresentar a sua proposta de lei. Nessa altura, discutiremos o nosso projecto de lei.
Aliás, não é a primeira vez que isto sucede, porque senão haveria uma fraude à lei: a maioria - tal como fez hoje - faltava ao debate, batia-se em retirada e então provocava constantemente uma votação para o dia seguinte. Ora, isso não pode ser porque a maioria tem que estar presente aquando das votações, e quando é derrotada, porque se bate em retirada, tem que suportar os custos políticos.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A interpretação do Sr. Deputado Narana Coissoró é o inverso do direito de fixação de uma ordem de trabalhos. Isto é: se a fixação de uma ordem de trabalhos não pudesse ter o desfecho normal, que é a votação, podia acontecer o contrário daquilo que disse o Sr. Deputado Narana Coissoró, ou seja, uma maioria que estivesse numa situação qualquer em que não houvesse vontade em votar, bastava o esvaziamento do quórum para retirar ao autor do diploma a possibilidade de o ver votado. Por conseguinte, a votação é uma garantia para os partidos que fixam uma ordem de trabalhos.
Ora, isso é exactamente o contrário do que disse o Sr. Deputado Narana Coissoró. Penso que se a interpretação do Sr. Deputado do CDS for adoptada, tal facto será um precedente grave para os partidos que fixem ordens de trabalho.
Assim, como esta é a interpretação legítima e como um processo de votação não pode ser interrompido, naturalmente que este assunto se concluirá amanhã. Caso o CDS não queira que ele amanhã seja concluído, interpreto esse facto como sendo uma desistência por parte do CDS e um adiar sine ale relativamente à votação do projecto de lei - logo, ao contrário da argumentação produzida pelo CDS no curso do debate. E não há maneira de fugir a isto.
Assim, ou o CDS aceita - o que é normal - que se faça amanhã a votação, ou então ficará adiada sine die. Caso assim seja, só posso interpretar esse facto como sendo uma atitude deliberada do CDS em não querer que se vote amanhã o seu projecto de lei, atitude essa com a qual até me posso congratular
- e congratulo-me -, mas essa responsabilidade é unicamente do CDS e não dos partidos da maioria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não estamos de acordo com o que o Sr. Deputado Carlos Lage acabou de dizer, tanto mais que já hoje houve uma conferência de líderes parlamentares e já foi marcada a ordem de trabalhos para amanhã. A não ser que vamos novamente lá para dentro com o Sr. Presidente para fazer uma nova reunião de líderes parlamentares e reformular a marcação da ordem de trabalhos para amanhã.
Portanto, das duas, uma; ou prosseguimos o debate - o que terei muito gosto, pois tenho mais algumas perguntas a formular aos autores do projecto de lei - até que apareçam mais alguns deputados para haver quórum para se proceder à votação, ou então ficar-se-á a aguardar por outro novo debate a que se seguirá a votação. E talvez nessa altura o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social já tenha tido a possibilidade de ler o projecto de lei apresentado pelo CDS, o projecto da AD que é praticamente igual a este que foi apresentado, talvez mesmo apresente uma proposta de lei e lá para Janeiro ou Fevereiro, e então se possa travar aqui um debate sério que a maioria hoje recusou. O que não devemos é agora estarmos a entrar nessa chicana política, pois não estamos interessados nisso. Apesar de a luta não ser nossa, como a ordem de trabalhos para amanhã já está definida, não damos o consenso a que esta se altere.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As interpretações do Sr. Deputado Carlos Lage são unicamente as dele e não são necessariamente as da Câmara, pelo menos por enquanto.
Também quero dizer que a argumentação do Sr. Deputado Carlos Lage nos chocou a todos e foi - desculpe que lhe diga, Sr. Deputado - imoral do ponto de vista do funcionamento do Parlamento. V. Ex.ª veio aqui dizer que é um direito de quem marca a ordem do dia ver votado o assunto que marcou previamente. Até pôs uma ênfase especial nesse «direito». No entanto, foram VV. Ex.ªs os que nos retiraram a possibilidade de o exercer porque não estão presentes em número suficiente para fazer aqui a votação.

Aplausos do CDS.

A nossa interpretação, Sr. Deputado Carlos Lage, é outra completamente diferente: é a de que temos direito de voltar a discutir e a votar esta matéria. Concluímos a ordem de trabalhos, mas, porém, verificou-se que não houve quorum para se proceder à votação. Assim, voltaremos a discutir o nosso projecto de lei quando entendermos e, juntamente com os líderes dos diversos grupos parlamentares, voltaremos a agendá-lo novamente.

Vozes do CDS: - Muito bem!

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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18 DE NOVEMBRO DE 1983

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para nós qualquer solução serve desde que se acabe com uma situação que a ninguém prestigia, que salvaguarde os direitos do CDS e que se respeite o Regimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Creio que a interpretação que o Sr. Deputado Nogueira de Brito fez não é digna da sua capacidade jurídica. Fez, naturalmente, uma argumentação política que eu entendo, mas sob o ponto de vista jurídico não tem razão absolutamente nenhuma.
Quando se faz a fixação de uma ordem de trabalhos e de um projecto, o partido que faz a fixação tem direito que haja uma votação e essa votação só é susceptível de não se realizar se ele próprio desistir ou requerer que não se faça a votação.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ou não haja quorum!

O Orador: - Invocar a inexistência de quorum hoje não serve, porque todos são responsáveis pela falta de quorum. Todos têm faltas, o debate prolongou-se até horas que ninguém esperava e por conseguinte, esse argumento não é um argumento válido.

Protestos do CDS.

É evidente que há um processo em curso, houve uma discussão, passou-se à votação e agora perante a ausência de quorum é evidente que o processo para ficar completo tem de prosseguir. Nenhuma ordem de trabalhos, sob o ponto de vista constitucional e regimental, pode vir a interromper esse processo em curso até ao seu desfecho. Esta é indiscutivelmente a doutrina e não quero fazer aqui uma argumentação mais detalhada.
Por conseguinte, se não querem criar um precedente inconveniente, a única interpretação válida é esta: ou amanhã se completa este processo votando, porque hoje não houve quorum, ou então só podemos interpretar que o CDS desiste da votação do seu projecto.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não!

O Orador: - Não há outra interpretação e aquela com que nós ficamos politicamente é que o CDS desistiu da votação que pode fazer amanhã.

Uma voz do PS: - Muito bem!

Uma voz do PCP: - E se vocês tirarem o quorum outra vez!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esta sessão corre o risco de eternizar-se. O Sr. Deputado Narana Coissoró tem a palavra.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, é para dizer que estritamente neste momento existe o

2061

o quorum para discutir embora não exista o quorum para votar.
Nós estamos dispostos a discutir este assunto até porque o nosso colega Corregedor da Fonseca quer-nos pôr mais problemas, talvez nós possamos dar mais respostas até a maioria arranjar os seus deputados para podermos votar. E a maioria que tome a responsabilidade encerrar os trabalhos sem arranjar os seus deputados - como muitas vezes o fazem, porque muitas vezes estão lá fora ou estão a jantar e podem mandá-los chamar - e nós tomamos a responsabilidade de continuar este debate até a maioria estar preparada para votar.

Uma voz do PS: - Vamos contabilizar as vossas faltas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral tem a palavra.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente: era para me pronunciar também sobre esta questão. O artigo 71 º do Regimento confere um direito aos Grupos Parlamentares de fixarem a ordem do dia de 1, 2, 3, 4 reuniões plenárias. E isto não é a única interpretação válida é a leitura do que diz o artigo do Regimento. No exercício desse direito, o grupo que fez a fixação de uma ordem do dia tem o direito de requerer a votação até ao termo da reunião plenária. Foi o que fez o CDS no caso presente. Os partidos têm, evidentemente, todos eles a obrigação de dar o quorum de funcionamento e, uns partidos deram-no e outros não o deram.
Neste momento a situação concreta que se verifica, é a seguinte: o CDS exerceu os seus direitos e exerceu-os dentro do quadro definido pelo artigo 71 º Agora não se pode pôr o CDS a exercer estes direitos, criar-lhe a obrigação de desistir de um outro direito que ele ainda não requereu, nem neste momento, ainda colocou. Não se pode obrigar o CDS a dizer: «O senhor tem que desistir». Não tem um dever negativo de dizer que não quer requerer a votação para amanhã. Se quiser requerer, requer, se quiser não requerer: é com o CDS e só com o CDS. Esta é a nossa opinião sobre a matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Handel de Oliveira, tem a palavra.

O Sr. Hãndel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Narana Coissoró, mais uma vez surpreende-nos a todos. É a pessoa escolhida para em nome do CDS falar aqui em quem dá e tira quorum. É uma má escolha da parte do CDS porque, efectivamente, o Sr. Deputado Narana Coissoró raras vezes aqui tem estado, aparece aqui espontaneamente.

Aplausos do PS e do PSD.

Para além de ter aparecido de surpresa nesta Assembleia, o Sr. Deputado Narana Coissoró revelou também uma distracção muito grande porque não verificou que o Sr. Presidente deu por encerrado o debate e portanto não tem qualquer oportunidade o seu requerimento de continuar o debate até que haja quorum.

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2062 I SÉRIE-NÚMERO 48

Sr. Deputado Narana Coissoró aconselho-o a ser mais ponderado quando fala.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: eu creio que temos que chegar ao fim disto. O Sr. Deputado Narana Coissoró quer intervir invocando o direito de defesa.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Era simplesmente para dizer que quando não há argumentos dizem-se tolices.

Protestos do PS.

E o Partido Socialista já nos mostrou hoje que está farto de dizer tolices.
Se eu tenho faltado a esta Assembleia é em serviço desta Assembleia. Eu saí desta Assembleia para ir para a União Inter-Parlamentar, tal como o Dr. Raul Rego, faltei os mesmos dias e noutros dias tem havido uma coincidência de funcionamento deste Plenário com o conselho de imprensa, onde sou vogal. Por isso, como estão outros deputados aqui e como não estão outros deputados do CDS no conselho de imprensa, tenho de estar lá e não aqui. De modo que para a outra vez é favor pensar primeiro o que diz em vez de fazer estas figuras tristes.
Quanto ao problema do encerramento do debate, se o encerramento do debate está transitado em julgado; também esta transitado em julgado a votação. Portanto não se pode ressuscitar uma votação que transitou em julgado. De modo que agora para reaver, recomeçar ou renovar esta votação, era preciso seguir ab initio outro processo de discussão e depois a votação.
Não se pode agarrar numa parte apenas do Regimento e dizer:«está encerrado o debate, não há mais debate, está encerrada a votação mas há-de haver outra votação porque o Dr. Carlos Lage que é jurista abalizado, assim o pretende». Isto para nós não serve, o que é bom para o pato é bom para a pata. O que é bom para o Partido Socialista, pode não ser bom para o CDS, e o contrário. Portanto, nós sabemos a nossa interpretação e o Sr. Presidente, se faz favor, terá que decidir por si como encara esse problema.

O Sr. Presidente: - Quando chegar o momento, a Mesa definirá a sua posição. Entretanto, há deputados inscritos a quem tenho de dar a palavra.
O Sr. Händel de Oliveira deseja responder?

O Sr. Händel de Oliveira (PS):- Muito rapidamente, é para dizer que aceito as explicações do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não as dei a si, mas à Câmara!

O Orador: - Naturalmente que a Câmara também as aceita pois tem compreensão suficiente para aceitar as explicações do Sr. Deputado Narana Coissoró na parte que diz respeito à sua ausência. O que o Sr. Deputado não conseguiu foi explicar a sua distorção no que diz respeito ao encerramento do debate, assim como à intervenção do meu camarada Carlos Lage quanto ao adiamento da votação do projecto de lei. Uma coisa é encerramento do debate declarado pelo Sr. Presidente; outra é a votação que não chegou a existir na medida em que não é legítima uma votação quando não há quorum. Deste modo, a proposta do meu camarada Carlos Lage mantém-se pertinente. Como não houve quórum para se votar não houve votação.
Quanto ao debate ele realizou-se, quem quis intervir, fê-lo; quem não o fez foi porque não quis ou porque não pôde. A questão que agora se põe é a de que a votação está encerrada.
Se o Sr. Deputado Narana Coissoró quiser inscreva-se e ponha questões que eu saberei responder.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma curtíssima intervenção na medida em que penso que a estas horas...

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado não pode fazer nenhuma intervenção. Neste momento, estamos apenas a tratar de uma questão processual.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Seguramente, Sr. Presidente.
Uso da palavra, em primeiro lugar, para esclarecer os Srs. Deputados da maioria que os responsáveis pela não existência de quorum são os partidos da maioria e hão os da oposição.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Isso que fique muito claro porque, enquanto o CDS tem aqui 65% dos seus deputados, O PS e o PSD têm cerca de 35%. Não se pode escamatear essa realidade e é muito feio que o tentem fazer agora.
Sr. Presidente, nós pensamos que a solução deste problema é da responsabilidade da Mesa. Deferimos essa responsabilidade à Mesa, confiamos, nas suas decisões entendemos que é de todo inútil o prosseguimento deste debate.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, muito rapidamente, uso da palavra para tentar dar uma solução a esta questão. É que se a Mesa tomar uma decisão, seja ela qual for, ficamos na impossibilidade de recorrer, para o Plenário porque não há quorum para a votação.
Proponho, pois, a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que acabe com esta situação e convoque para amanhã da parte da manhã uma conferência de líderes parlamentares a fim de que este problema seja resolvido. Seja qual for a decisão que tome, os deputados não podem recorrer para o Plenário. Qualquer grupo parlamentar, que está no seu pleno direito de recorrer da decisão da Mesa, não pode fazer precisamente por não haver quorum.
Penso, pois, que o melhor será convocar uma reunião de líderes para amanhã da parte da manhã, e acabávamos assim - e perdoem-me a expressão - este triste espectáculo.

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18 DE NOVEMBRO DE 1983 2063

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peco-lhe o favor de ser breve nas suas considerações para acabarmos este serão que já vai tão longo.
Tem a palavra, Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, aconteceu o seguinte: o debate terminou, o partido que fixou a ordem de trabalhos requereu a votação do projecto de lei e a votação a que se procedeu não foi válida porque não havia quórum. Na minha opinião, o partido que requereu a votação do diploma fê-lo interpretando o Regimento. Afigura-se-me que só há uma solução: a de o partido que fixou a ordem do dia requerer a votação amanhã ou quando entender ...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... sem que isso implique nova perda de dia.

Aplausos do PCP, do CDS e do MDP/CDE.

Creio que isso é o que ressalta do Regimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O debate foi encerrado, falta o elemento fundamental do processo, isto é, a votação, e isso tem de ser feito. Penso, portanto, que o partido que fixou a ordem do dia tem de dizer em que dia quer que a votação seja feita.
A minha bancada não se opõe a que haja uma conferência de líderes; penso, contudo, que a sugestão que avancei é a solução.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, e evidente que a interpretação que se pode e deve dar deste incidente é a seguinte: a sessão foi interrompida na medida em que não se chegou a votar ...

Vozes do PCP: - A sessão não foi nada interrompida!

O Orador: - ..., pois a votação não foi válida porque não havia quórum. A sessão está interrompida ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Mas a sessão não está interrompida, ela está a funcionar!

O Orador: - ..., ela prossegue, como é evidente, amanhã ...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Se a sessão está interrompida, como é que está a falar?!

Orador: - A sessão prossegue amanhã.

A questão que ponho aos deputados do Grupo Parlamentar do CDS, e essa é que é a questão fundamental, é a seguinte: querem ou não que se vote o projecto de lei amanhã?
É a esta pergunta que têm de responder.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou consultar os restantes membros da Mesa,

Pausa.

Srs. Deputados, a posição da Mesa, por unanimidade, é a seguinte: considera o debate encerrado, competindo agora ao CDS requerer a votação na sessão de amanhã ou quando entender.

Aplausos do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do Sr. Deputado do PSD Bento Gonçalves.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage é a decisão da Mesa. O Plenário pode ...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Quero recorrer da decisão da Mesa.

O Sr. Presidente: - Mas não há quórum, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Por isso mesmo. Amanhã, a primeira coisa que posso fazer é recorrer da decisão, de hoje, da Mesa. Prova-se assim aquilo que eu tinha dito.

O Sr. Presidente: - Exactamente.
Srs. Deputados, há ainda uns diplomas que entraram na Mesa e que os tenho de anunciar.
Entraram na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 52/III, relativa à integração no domínio público do Estado dos recursos geológicos genericamente designados por depósitos minerais, recursos hidro-minerais e recursos geotérmicos, que baixou à 9.ª Comissão; e os projectos de lei n.º 244/III, do PS, sobre a criação da freguesia de Santa Joana, no concelho de Aveiro, e n.º 245/III, do PSD, alteração do nome da freguesia de São Jorge, no concelho da Feira, que baixaram à 10.ª Comissão.
A próxima reunião plenária terá lugar, amanhã, com período de antes da ordem do dia, tendo como período da ordem do dia a votação de um requerimento da Comissão de Administração Interna e Poder Local sobre a proposta de lei quadro da criação de municípios.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado, desculpe mas o período da ordem do dia não é apenas esse; tem também a apreciação do recurso que interpus da decisão da Mesa ...

O Sr. Presidente: - isso será discutido na primeira parte da ordem do dia.
Está encerrada a sessão.

O Orador: - A sessão prossegue amanhã.

Eram 23 horas e 35 minutos.

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2064 I SÉRIE - NÚMERO 48
Entraram durante a sessão os seguintes Srs: Deputados:

Partido Socialista (PS):

Manuel Alfredo Tito de Morais.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Rui Monteiro Picciochi.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique António Madureira.
João Lopes Porto.
José Augusto Gama.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Manuel Augusto Lopes de Lemos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António Gonçalves Janeiro.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Joaquim Gomes.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Manuel Laranjeira Vaz.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes.
Cecília Pita Catarino
Domingos Duarte Lima.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
José António Valério do Couto.
José Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Victor Pereira Crespo.

Partido Comunista Português (PCP):

Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Os Redactores de 1.ª classe: Noémia Molheira - José Diogo.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e mandatos enviado à Mesa para publicação:

Em reunião realizada no dia 17 de Novembro de 1983, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:

Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por Henrique António da Conceição Madureira (esta substituição é pedida para os dias 17 e 18 de Novembro corrente, inclusive);
José Vieira de Carvalho (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Augusto Lopes Lemos (esta substituição é pedida para o dia 17 de Novembro corrente, inclusive);
Horácio Alves Marçal (círculo eleitoral de Aveiro), por Carlos Sousa Nunes da Silva (esta substituição é pedida para o dia 18 de Novembro corrente, inclusive).

2) Solicitada, pelo Movimento Democrático Português:

João Cerveira Corregedor, da Fonseca (círculo eleitoral de Setúbal) por José Carlos Queiroz Pinheiro Henriques (esta substituição é pedida para os dias 21 a 30 de Novembro corrente, inclusive):

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificaram-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos. deputados presentes.
A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - José Maria Roque Lino (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Manuel António de Almeida de A. Vasconcelos (CDS) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS).

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