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I SÉRIE - NÚMERO 58 2626

ordens de razões. Em primeiro lugar, porque foi assim, simetricamente - e vamos ver porquê -, que foi definido o estatuto dos magistrados, que era uma parte essencial do estatuto judiciário e que aparece agora modificado. O Governo terá todas as condições para dar uma visão de conjunto e proceder à análise recíproca da interacção necessária entre os normativos que foram aplicados aos Magistrados Judiciais, Juízes e Delegados do Ministério Público e os normativos que devem ser aplicados ao estatuto de advogado.
Opor-me-ia determinantemente a qualquer espécie de autorização legislativa se o Regimento e a Constituição não permitissem, como permitem, um controle, sob a forma de um instituto de ratificação, da forma como o Governo usou ou não usou dessa autorização legislativa.
Dizer-se, como se disse, que a concessão de uma simples autorização legislativa é passar um cheque em branco ao Governo é, pura e simplesmente, esquecer os normativos constitucionais. Por esta ordem de razões - unidade sistemática, acesso directo às fontes, conhecimento genérico da actividade legijerante e possibilidade do uso do instituto de ratificação - não tenho qualquer espécie de dúvida - faço-o com absoluta e inteira convicção - em votar, quando for caso disso, o pedido do Governo de autorização legislativa.
Em segundo lugar, a questão que se põe é saber se é urgente ou não esse pedido de autorização legislativa feito pelo Governo. Penso que é absolutamente urgente, e é-o pelas mesmas razões que os Srs. Deputados do PCP consideraram que não era urgente.
Estivemos aqui autenticamente num diálogo de surdos ou, se preferem, num diálogo de iniciados. Falou-se em sensibilidades da Ordem dos Advogados, em tendências da Ordem dos Advogados e noutras coisas do estilo. Parece que a Ordem dos Advogados é a única organização com características um pouco sindicais em que o PCP admite a existência de um direito de tendência! Simplesmente, o que se passa é que o vazio legislativo em relação a esta matéria não só não garantia a independência do Governo perante o acto eleitoral que se avizinha, como, pior do que isso, esse vazio legislativo permitia, esse sim, que às tendências e ao debate livre em termos sindicais das questões dos advogados, que transcende em muito o debate político, se substituísse aquela tendência a que, numa linguagem vernácula, Rafael Bordalo Pinheiro chamaria a das «moscas varejeiras» ou a que nós poderíamos chamar a dos pescadores de águas turvas. E essa é que importa afastar.
A definição de regras claras de jogo deve ser a forma de garantir a independência da Ordem dos Advogados. Dir-se-á: mas os advogados foram ouvidos sobre esta matéria? Bom, creio que o Sr. Ministro da justiça esteve há pouco a pregar aos peixes porque afirmou - e eu vou repetir porque é do meu conhecimento que este anteprojecto não só foi publicado em separata no Boletim da Ordem dos Advogados como houve um largo período em que todos os colegas podiam, absolutamente, manifestar as suas sugestões sobre as matérias. E só no fim desse largo período é que foi feita uma redacção final por uma comissão especialmente mandatada. O facto de ser uma direcção cessante a terminar esse trabalho quer dizer, só, que esse trabalho teve cerca de três anos de execução.
E uma direcção cessante só deixa de ter legitimidade para actuar quando é substituída democraticamente por outra direcção. Foi assim que me ensinaram e é assim que funcionam habitualmente as regras da democracia.

De resto, se por acaso se verificar que uma nova orientação prevalece entre os advogados portugueses eles terão oportunidade de corrigir, de propor ou modificar as correcções que considerarem convenientes. Nesse debate que foi travado na Ordem dos Advogados ninguém responsavelmente - e quando eu digo «ninguém responsavelmente» estou a pensar em advogados de todas as tendências, com exclusão dos punidos, dos suspensos, dos gatunos ou dos excluídos da Ordem por actos manifestos contra o património - se pronunciou contra o princípio de que o estatuto dos advogados devia ser estabelecido na base de um diálogo entre o Governo e os próprios advogados.

É que um advogado, tal como eu e todos entendemos, não é um profissional como outro qualquer que vende a sua força de trabalho a quem mais paga. É um profissional que tem de fazer um juízo de valor sobre se a causa a que é chamado a actuar é justa ou não e que deve recusar esse patrocínio se a causa for injusta. É um profissional que está obrigado a guardar segredo profissional e é um profissional que actua não como parte exterior ao Tribunal, mas como parte integrante ao Tribunal.

Só naqueles países sobre os quais o Sr. Deputado José Manuel Mendes não quer discutir e que há pouco citei - o que me valeu o qualificativo de cavernícola - é que o advogado é, efectivamente, um advogado que actua fora do Tribunal e perante ele, ou seja, perante aquilo que na União Soviética e na Alemanha Nazi se chamavam os juízos do povo. A terminologia é a mesma. Aí o advogado actua com salamaleques, atento, venerador e obrigado. Só aí e em nenhuma outra parte do mundo!

Dito isto, e chamando a atenção para os pontos que acabam de ser referidos, pode perguntar-se: é o projecto que a Ordem dos Advogados apresenta e que o Governo nos facultou como base de trabalho, sobre o qual se vai debruçar, o melhor? Não tem esse projecto omissões, erros e coisas que merecem ser corrigidas? Quero dizer aos Srs. Deputados que esse projecto tem omissões, erros e coisas que merecem ser corrigidas e que mal andariam as autoridades deste país - a Assembleia da República e o Governo, ou seja, quem tem competência para se pronunciar sobre esta matéria, e depois, no acto da promulgação, o Sr. Presidente da República, mas é outro caso - se, por acaso, se demitissem da função de disciplinar o exercício da profissão do advogado. Simplesmente, esse projecto, que mereceu o consenso dos advogados portugueses, e que foi amplamente discutido, vale aquilo que vale, isto é, uma grande, uma óptima, uma excelente base de trabalho que V. Ex.ª Sr. Ministro, terá de corrigir nalguns pontos. Devo dizer-lhe que este Parlamento aguarda de si a confirmação das palavras que há pouco deixou em suspenso, ou seja que o Governo vai corrigir esse projecto nalguns pontos, os quais merecem a crítica de muitos de nós.

Dito isto e definida a necessidade de autorização legislativa, definida a necessidade de um processo de urgência e definida a necessidade de um estatuto, definido pelos advogados, em colaboração com os órgãos de Governo deste país e não contra os órgãos de Governo deste país, importa ter duas palavras mais