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Num pano já velho alguém escreveu: «Com o Governo do Mário/Nem nos pagam o salário!» As palavras serão esbatidas pelo tempo. Mas as marcas e o julgamento político ficarão na memória dos homens.
É um libelo acusatório daqueles que por vezes desesperam, mas que rejeitam viver num país de homens com fome e com medo. Eles sabem que a resolução dos seus problemas, dos grandes problemas nacionais só são possíveis com outra política e com outro governo. Esta política de dois pesos e duas medidas, este governo sem horizonte não servem as aspirações populares, mas como responsáveis, devem ser obrigados a discutir e encontrar as soluções para esta situação dos salários em atraso.
Este é o valor desta interpelação.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O drama dos salários em atraso é a questão mais saliente e escandalosa de uma situação económico-social fortemente recessiva e de uma política de autêntica rapina e delapidação das estruturas produtivas e riquezas nacionais em benefício de uns quantos grupos económicos e das multinacionais enquanto prossegue a deterioração das condições de vida de centenas de milhar de trabalhadores, em muitos casos para níveis inferiores aos mínimos de subsistência.
O escândalo dos salários em atraso desenvolve-se no quadro de aprofundamento de uma política restritiva e monetarista com aumento do desemprego para números incomportáveis e queda vertiginosa dos rendimentos reais.
Lado a lado com o não pagamento de salários subsiste o agravamento da carga fiscal, o galopar diário dos preços e a subsequente redução dos salários reais, contraindo drasticamente o consumo popular e o mercado interno, com consequências desastrosas no plano económico e social.
Em certas regiões de empresas com salários em atraso os pequenos comerciantes encontram-se numa situação de desespero tornando-se mais rapidamente aliados dos trabalhadores em luta pela remuneração do seu trabalho.
Já no fim do ano, e na sequência do famigerado imposto de 28 % sobre o 13.º mês, os comerciantes viram as vendas tradicionais da época sofrerem quebras na ordem dos 30 % a 40 % o que, por sua vez, se reflecte numa quebra de encomendas à indústria nacional, diminuindo a utilização da capacidade produtiva instalada com sérias consequências no desemprego!

O Sr. João Amaral (PCP): - É um escândalo!

A Oradora: - Não se compreende como é possível o Ministro do Trabalho não ter em conta que a política económica assumida pelo governo PS/PSD de quebras no investimento e na produção e de contracção da procura à custa da redução de consumos populares, partia já atrás de níveis de desemprego muito elevados (cerca de meio milhão) como demonstram dados recentemente tornados públicos pelo INE. Como pode ser

I SÉRIE - NÚMERO 76

escamoteada a gravidade de uma situação em que um milhão de trabalhadores se encontrava à procura de emprego por estar, ou no desemprego, ou numa situação de trabalho incerto e inseguro (contratos a prazo), ou ainda porque recebia salários muito baixos? É inadmissível não reconhecer que neste momento mais de 1 milhão de trabalhadores está à procura de emprego e que, seguramente, a maior parte se encontra no desemprego, ou numa situação equiparada, por não pagamento de salários!
Quando se sabe que os rendimentos disponíveis da população continuam a baixar, que os salários reais da maioria dos trabalhadores sofreram num só ano quebras superiores a 13 %, que o índice de preços no consumidor entre Dezembro de 1983, relativamente a igual período do ano anterior, subiu 34 %, que a média de vigência das tabelas salariais rondou os 13/14 meses e os aumentos salariais raramente ultrapassaram os 20 %, tem de se concluir que mesmo os trabalhadores sem salários em atraso estão com um nível de vida muito deteriorado. Por outro lado, muitas empresas, embora mantendo aparentemente os salários em dia, não cumprem as tabelas salariais, não pagam retroactivos e ou subsídios e complementos salariais.

Encontram todo o apoio numa política de acumulação e centralização capitalista, cega, indiferente e insensível à autêntica tragédia de milhares de famílias a passar fome responsável por um nunca mais acabar de aumentos de preços, derivados em grande parte da febre liberalizadora do Governo que, através do Ministro do Comércio, procede a um completo desmantelamento dos chamados organismos de coordenação económica e das empresas públicas de importação de cereais, ramas de açúcar e oleaginosas para entregar de mão beijada às multinacionais e a 3 ou 4 grupos industriais um comércio altamente rendoso envolvendo cerca de 160 milhões de contos por ano.
Sucedem-se os aumentos de preços dos bens alimentares de primeira necessidade: desde o pão, ao açúcar, passando pelos óleos alimentares, massas e farinhas, seguindo-se a carne, os ovos e o leite. O aumento brutal de 36 % dos preços dos bens alimentares ultrapassam a própria subida média do índice de preços e é muito superior ao aumento dos rendimentos disponíveis. Esta situação particularmente grave dado o peso das despesas com a alimentação no orçamento familiar dos trabalhadores leva à degradação da alimentação, contribui para a diminuição do rendimento escolar das crianças, para o aumento dos acidentes de trabalho, o aparecimento de doenças e a expansão de outras como é o caso da tuberculose, que de novo volta a atingir imensos trabalhadores.
Não é necessário evidenciar que a situação se tende a agravar. Por que fome existe, Srs. Deputados! Por que a possibilidade de alimentar os filhos é a angústia diária de milhares de famílias! É incompreensível que nesta situação se vá entregar a importação de cereais e oleaginosas a empresas industriais aliadas a multinacionais do comércio alimentar, facilitando ainda mais o aumento dos preços.
E como se pode entender que o Governo acabe com os subsídios e indemnizações compensatórias aos bens alimentares e serviços públicos essenciais, enquanto prevê atribuir este ano em benesses e incentivos ao capital privado mais de 55 milhões de contos?
Como se pode aceitar que cerca de 150 000 trabalhadores continuem com salários em atraso quando o