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DIÁRIO da Assembleia da República

I Série - Número 77

Quarta-feira, 22 de Fevereiro de 1984

III L E G I S L A T U R A 1ªSESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE FEVEREIRO DE 1984

Presidentes: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes

José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, de requerimentos apresentados e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE) referiu-se às próximas eleições presidenciais e ao X Encontro dos Professores Universitários Brasileiros de Literatura Portuguesa. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Acácio Barreiros (PS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Lopes Cardoso (UEDS), referindo-se à situação da ANOP, responsabilizou o Governo pelo futuro daquela agência noticiosa. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento e a um protesto dos Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP) e Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Anselmo Aníbal (PCP) referiu-se à importância fundamental da organização e gestão da Administração Pública, bem como ao seu conteúdo funcional, que aponta para o serviço das populações.
O Sr. Deputado Vidigal Amaro (PCP). referindo-se ao Hospital de S. José, apelou para as entidades competentes no sentido de estas porem termo às situações degradantes que diariamente ali se vivem.
O Sr. Deputado Fradinho Lopes (PS) referiu-se à crise de lanifícios, que tem vindo a agravar-se de ano para ano, abordando especialmente o problema na região da Covilhã.
O Sr. Deputado Montalvão Machado (PSD), referindo-se às anunciadas mudanças estruturais de programas na RTP e na RDP, criticou o facto de os emissores regionais do Porto e de Coimbra deixarem de transmitir a nível nacional.
O Sr. Deputado Abreu Lima (CDS) criticou a metodologia usada pelo Governo para proceder à consulta das autarquias sobre a revisão da Lei n.º 79/77, sobre o regime autónomo da tutela sobre as autarquias e sobre as associações de municípios.

Ordem do dia - Iniciou-se a discussão na generalidade do projecto de lei n.º 26/III, apresentado pelo MDP/CDE, sobre crédito em espécie à agricultura, tendo intervindo, a diverso

título, os Srs. Deputados Corregedor da Fonseca e Raul de Castro (MDP/CDE), Soares Cruz (CDS), António Costa (PS), Lopes Cardoso (UEDS), Gaspar Pacheco (PSD), Cunha e Sá (PS) e Marques Mendes (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Temos quórum, pela que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros. Agostinho de Jesus Domingues. Alberto Manuel Avelino. Alexandre Monteiro António. Almerindo da Silva Marques. Amadeu Augusto Pires. Américo Albino da Silva Salteiro. Aníbal Coelho da Costa. António Cândido Miranda Macedo. António da Costa. António Domingues de Azevedo. António Frederico Vieira de Moura. António Gonçalves Janeiro. António José Santos Meira. Avelino Feliciano Martins Rodrigues. Beatriz Almeida Cal Brandão. Bento Gonçalves da Cruz. Carlos Augusto Coelho Pires.

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Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Augusto Sé Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja S. dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barroso Mota.
José da Cunha e Sá.
José Joaquim Pita Guerreiro.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria Angelo Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barrai.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barras.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Orneias Ourique Mendes
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso
Fernando Manuel Cardoso Ferreira
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Manuel Pires das Neves.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Vítor Manuel Ascensão Mota.

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Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro. António Anselmo Aníbal. António Guilherme Branco Gonzalez. António José de Almeida Silva Graça. António José Monteiro Vidigal Amaro. António da Silva Mota. Belchior Alves Pereira. Carlos Alberto da Costa Espadinha. Carlos Alberto Gomes Carvalhas. Carlos Alfredo de Brito. Custódio Jacinto Gingão. Domingos Abrantes Ferreira. Francisco Manuel Costa Fernandes. Francisco Miguel Duarte. Georgete de Oliveira Ferreira. Jerónimo Carvalho de Sousa. João Carlos Abrantes. Joaquim António Miranda da Silva. Jorge Manuel Abreu de Lemos. Jorge Manuel Lampreia Patrício. José Manuel Maia Nunes de Almeida. José Manuel Santos Magalhães. José Rodrigues Vitoriano. Lino Carvalho de Lima. Manuel Gaspar Cardoso Martins. Manuel Rogério de Sousa Brito. Maria Luísa Mesquita Cachado. Maria Margarida Tengarrinha. Maria Ilda Costa Figueiredo. Maria Odete Santos. Octávio Augusto Teixeira. Paulo Simões Areosa Feio. Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira. Alexandre Carvalho Reigoto. Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares. António Gomes de Pinho. António José de Castro Bagão Félix. Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira. Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca. Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia. Francisco António Lucas Pires. Francisco Manuel de Menezes Falcão. Henrique Manuel Soares Cruz. Hernâni Torres Moutinho. Horácio Alves Marçal. Henrique Pereira de Moraes. João Carlos Dias M. Coutinho Lencastre. João Gomes de Abreu Lima. José Luís Nogueira de Brito. José Miguel Anacoreta Correia. Luís Filipe Paes Beiroco. Manuel Jorge Forte de Goes. Manuel Tomás Rodrigues Queiró. Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Fernandes de Morais e Castro. Helena Cidade Moura. João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira. António Poppe Lopes Cardoso. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota. Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho. Rúben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de ser lido o resumo do expediente, comunico à Câmara que se encontram nas galerias a assistir à sessão plenária 50 alunos da Escola Secundária D. João de Castro, em Lisboa.
Vai agora ser lido um resumo do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Da Comissão Instaladora da Reserva Natural da Ria Formosa, a enviar uma moção solicitando ao Governo que reveja a sua posição de molde que a Universidade do Algarve possa vir a ser dotada, a curto prazo, de condições que lhe permitam funcionar em prol dos objectivos para que foi criada.
Do Sindicato Livre dos Pescadores (Secção de Viana do Castelo), a remeter cópia da moção aprovada pelos pescadores daquela localidade, na qual se manifestam contra a integração do seguro de acidentes de trabalho no esquema geral da segurança social.
Da Comissão Instaladora da Reserva Natural da Ria Formosa, a enviar o teor de uma moção, na qual solicita ao Governo a suspensão de actividades militares na área dos Hagares e do Farol, por as considerar incompatíveis com as características da zona em causa.

Petições

N.º 6/III, de Virgínia Rodrigues da Silva e outros (Federação Nacional dos Professores), reivindicando aumento salarial e um orçamento da educação que permita manter viva a perspectiva constitucional da democratização da escola e de todo o sistema educativo.
N.º 7/III, de José Manuel da Costa Duarte e outros (Sociedade Portuguesa de Naturalogia), solicitando que seja oficializada a prática da medicina natural e criados cursos oficiais de naturopatia nas nossas faculdades.
N.º 8/III, de Manuel Correia Lopes (CGTP-lntersindical), solicitando que o projecto de decreto-lei sobre o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública e a participação na elaboração da legislação do trabalho por parte dos trabalhadores sejam sujeitos a apreciação da competente Comissão da Assembleia da República.

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N.º 9/III, de Manuel Júdice Halpern e outros (Movimento de Defesa da Vida), apelando aos senhores deputados no sentido de reflectirem no que respeita à questão do aborto.
N.º 10/III, de Luís Meliciano Pinto, expondo que «o decurso do prazo estabelecido para a satisfação das contribuições devidas às instituições de previdência faz incorrer o devedor em mora e acarreta-lhe a obrigação de pagar os respectivos juros».

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa nas últimas reuniões plenárias os requerimentos seguintes:

Na sessão de 9 de Fevereiro, ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Cachado, Jorge Lemos e Jorge Patrício; à Secretaria de Estado da Emigração, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Custódio Gingão; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação e à Secretaria de Estado da Administração Pública, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso; a diversos ministérios, no total de 5, formulados pelos Srs. Deputados Gaspar Martins e Francisco Manuel Fernandes; ao Ministério das Finanças e do Plano e à Secretaria de Estado do Tesouro, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; a diversos ministérios, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Jaime Ramos e outros; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Avelino Rodrigues e Rodrigues de Barros.
Na sessão de 10 de Fevereiro, ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; aos Ministérios da Saúde e do Equipamento Social, no total de 3, formulados pelos Srs. Deputados Gaspar Martins e Manuel Fernandes; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Jorge Goes; ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelos Srs. Deputados Horácio Marçal, Ilda Figueiredo e António Mota.
Na sessão de 14 de Fevereiro, ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados José Vitorino e Lopes Cardoso; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Lopes; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Jaime Ramos e outros.
Na sessão de 16 de Fevereiro, ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Silvino Sequeira, João Abrantes, Jaime Ramos, Luís Monteiro, Jorge Lemos e outros; a diversos ministérios, no total de 4, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Educação, no total de 2, formulados pelos Srs. Deputados Helena Cidade Moura e João Corregedor da Fonseca; às Secretarias de Estado das Florestas e do Ensino Superior, no total de 2, formulados pelos Srs. Deputados António da Costa e Cunha e Sá; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Alves e outros; ao Ministério da Justiça, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado

José Magalhães e outros; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Duarte Lima; ao Governo e a diversos ministérios, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca; ao Ministério do Equipamento Social, no total de 5, formulados pelos Srs. Deputados Gaspar Martins e Manuel Fernandes; ao Ministério do Trabalho, no total de 656, formulados por diversos senhores deputados do Partido Comunista.

O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados: Tomás Espírito Santo, na sessão de 12 de Julho; Anacoreta Correia e Rodrigues Queiró, na sessão de 25 de Outubro; Jorge Lemos, na sessão de 3 de Novembro; Manuel Fontes Orvalho, na sessão de 10 de Novembro; Silvino Sequeira, na sessão de 23 de Novembro; Magalhães Mota, na sessão de 10 de Novembro e na reunião da Comissão Permanente do dia 8 de Setembro.

Entretanto, tomou lugar na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino).

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em encontro nacional, o MDP/CDE reflectiu sobre a degradação da nossa vida económica, a deterioração crescente do tecido social, a fragilidade dos valores culturais do poder político e a instabilidade permanente das crises partidárias que atentam contra o equilíbrio da vida democrática.
O MDP/CDE interpretou, à luz desta realidade, a tentativa de fazer nascer o empenhamento dos portugueses nas eleições presidenciais de 1985, e concluiu estarmos, mais uma vez, perante um fenómeno de fuga, dada a gravidade dos problemas, que cabe sobretudo ao Governo resolver.
Terminada que foi a vigência do Conselho da Revolução e revista que foi a Constituição pelo acordo entre as forças agora no poder, restam fracas hipóteses portadoras de slogans suficientemente publicitários que conduzam à alienação; a eleição do Presidente da República aparece assim como um último refúgio.
Perante tal situação, o Movimento Democrático Português resolveu retomar a proposta, formulada antes das eleições de 25 de Abril de 1983, de um governo de consenso democrático onde, em programa mínimo, o País se dinamizasse em torno dos grandes problemas da recuperação da vida portuguesa, tanto a nível económico, como social, como político, como cultural.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decorre neste momento em Lisboa o X Encontro dos Professores Universitários Brasileiros de Literatura Portuguesa. É causa de regozijo para nós que professores universitários de outro país venham a Portugal debater entre si métodos pedagógicos de motivação e de ensino de uma literatura, escrita na mesma língua, mas representativa de um país diferente.
O Brasil é tradicionalmente para Portugal aquele espaço amplo e aberto onde os intelectuais portugueses

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ganharam uma dimensão que os estritos limites do País lhes negava.
Difícil será explicar a vitalidade entusiástica, a dialética apaixonada dos sermões do padre António Vieira sem o cenário exuberante do Brasil, a ânsia libertadora de uma pátria que nasce.
Eça de Queirós enviava a correspondência de Fradique Mendes, as suas crónicas e as suas cartas de Inglaterra, os seus ecos de Paris, para a Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, antes mesmo de as enviar para os jornais portugueses.
A Relíquia nasceu em folhetim também num jornal brasileiro. E os «Fastos da peregrinação de sua magestade o imperador do Brasil pelo reino de Portugal», crónica humorística publicada na Farpas, foi na mesma altura, 1872, clandestinamente publicada no Recife.
Imensos e variados elos tornam quase impossível separar as duas literaturas unidas, não só pela mesma língua, mas por uma evolução conjunta, como se um inconsciente colectivo ligasse os dois povos.
Ninguém poderá dissociar o nome de Ferreira de Castro da selva brasileira, e Jorge Amado, profundamente embrenhado na problemática e na existência do seu povo, é sentido em Portugal como português.
E por muito alienantes e distanciadas da problemática brasileira que as telenovelas sejam consideradas, elas são amadas cá e lá e com a canção são hoje terreno comum aos dois povos.
Ninguém melhor que Chico Buarque entendeu o «cheirinho a alecrim» da nossa Revolução de Abril.
Mais do que um património histórico estático comum, um potencial de vida colectiva se projecta no futuro.
Perante tão grandiosa existência dos povos que usam a língua portuguesa, mais sensível no Brasil, onde quase 2 séculos da pátria livre marcaram já profundamente um património literário, é grande a responsabilidade do Estado português.
Em 1980, quando do IV Centenário de Camões, fizemos nesse sentido numerosas e insistentes intervenções nesta Assembleia. Logo no início do ano, em Janeiro de 1980, afirmámos que a língua portuguesa deverá ser considerada, não como um feudo do país que a gerou, mas sim um bem da cultura universal, vínculo de solidariedade entre povos irmãos, pertença de todos aqueles que a usam como meio de expressão.
Dissemos também nessa altura que o alargamento do nosso património linguístico daria uma nova dimensão à nossa cultura e abriria, para lá da vocação atlântica, a verdade da nossa vocação indica e pacífica, bem mais de acordo com a história do nosso povo.
Como símbolo da nossa língua, entendida nesta dimensão, surgia nesse ano a figura de Camões e, nesse sentido, sugerimos ao Governo que, nesse mesmo ano, fizesse coincidir com o centenário de Camões um ano de alfabetização em língua portuguesa. Insistimos e explicamos mais detalhadamente a nossa sugestão. No I Centenário de Camões, depois do 25 de Abril, depois da elevação de Portugal à dignidade de país não colonial, retomado o nosso sentido universalista pela criação de nações livres, pensávamos que se deveria encontrar o sentido dessa dignidade e dessa liberdade. Neste sentido universalista entendíamos que se deveria celebrar o IV Centenário da Morte de Camões como data de arranque para um grande movimento de valorização da língua portuguesa.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar da arrogância com que o Governo de então, orgulhoso da sua maioria, olhava a oposição e de nos ter sido dito, aqui mesmo. na Assembleia, com ar displicente, que o centenário de Camões seria devidamente comemorado, o Governo de então não teve capacidade, nem cultural nem política, para assumir a imagem de Camões, desligada do mito da raça e do império. De facto, o Governo não era o País, e iniciativas partiram das associações populares, das autarquias e de alguns partidos políticos. O MDP/CDE guardou mesmo o seu escassíssimo tempo de antena para, em Dezembro de 1980, consagrar um programa na televisão a Luís de Camões e à língua portuguesa, na consciência de que é prioridade política consciencializar o problema da nossa língua no novo espaço que a descolonização lhe criou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta incapacidade governamental, altamente significativa em si, é já hoje um símbolo. De facto, o Estado ainda não assumiu a língua portuguesa como uma riqueza nacional. Riqueza única, porque a língua não se esgota, apenas se multiplica, quando assumida como riqueza que é!
Neste momento, encontra-se bloqueado o esforço para se alfabetizar em Portugal, diminuiu a verba para a efectivação da escolaridade de 6 anos, considerou-se ser irrelevante a escola pré-primária.
O ensino do Português no estrangeiro está caótico, os professores não têm estatuto definido, têm os salários desactualizados, estão pedagogicamente desamparados.
O ensino do Português em países estrangeiros de língua oficial portuguesa põe problemas específicos de ensino e de aprendizagem. Não há um esforço em Portugal para preparar professores cooperantes bem apetrechados de forma a poderem ser úteis social e tecnicamente. O ensino da língua portuguesa em países que escolheram a nossa língua está abandonado à sua sorte. Uma acção massiva e uma profunda investigação se impõem.
A língua é uma riqueza tão importante que a França está neste momento a preparar tecnicamente operários portugueses residentes em França, para os enviar para Angola, a fim de para lá trabalharem.
Depois da pimenta e das especiarias, também a nossa língua é agora moeda de troca para aqueles que enriquecem à nossa custa.
Os governos insensíveis aos valores culturais são algozes da história e da dignidade nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobretudo não se caia na tentação fácil de desculpar toda esta atroz insensibilidade pelas reduzidas verbas entregues ao Ministério da Educação, a célebre austeridade.
Felizmente que o dinheiro não explica tudo e, mesmo que explicasse, havia sempre possibilidade de observar que, num país à procura de investimento, se desinveste de uma forma acelerada e altamente ruinosa num único bem universal que possuímos: a nossa língua, a nossa cultura.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os professores de literatura portuguesa que se encontram reunidos em Portugal e os seus colegas que ficaram no Brasil lutam, neste momento, contra uma decisão do Conselho Federal do Estado, segundo a qual, nas licenciaturas em Letras, a cadeira de literatura portuguesa passaria a ser optativa.
Em 1971, uma disposição semelhante retirou do ensino secundário o ensino da literatura portuguesa,

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que hoje é apenas estudada como raiz da literatura brasileira. A verdade é que nessa altura bastava a indicação de um livro português no ano vestibular, de qualquer liceu, mesmo no interior, para que se esgotasse de imediato a edição.
Este segundo golpe, agora vibrado contra a cultura, o livro e a literatura portuguesa, diminuirá, mesmo que não vá avante, de momento, o interesse pela nossa cultura como oferta de mercado de trabalho que se tornou mais insegura, pelo simples facto de ter sido posta em causa.
A depreciação educativa dos últimos governos vai tendo os seus ecos. É por isso tempo de perguntarmos quais os valores culturais que este Governo defende, mais precisamente, deveremos questionar este Governo sobre quais as suas intenções políticas e que escolhas faz de imediato sobre o ensino do Português em Portugal e fora de Portugal.
Editados sem planeamento, sem interesse e sem amor, Os Lusíadas, de Camões, jazem empilhados nos consulados, símbolo de como a AD comemorou o IV Centenário de Camões. Será que este Governo vai continuar a enterrar, em caro caixão de chumbo, a política educativa e, neste caso concreto, a defesa e valorização da nossa língua?
Perguntas temíveis dada a actuação do Ministro da Educação, o grau de deterioração interna e a nuvem sombria que se projecta já no exterior.
O respeito pela nossa língua, que por toda a parte espalhámos, é um direito do povo, é uma riqueza nacional, é um marco da nossa dignidade que abre um campo vasto à nossa recuperação económica e social.
A política de porta fechada a espreitar pelas frestas da casa em ruínas fará que, a breve trecho, tal como no tempo do fascismo, nos envergonhemos de ser portugueses. Portugal já é hoje aos olhos de todo o mundo um país de falência adormecida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ontem foi frequentemente citado pelos professores brasileiros, a que prestamos aqui a nossa homenagem, a frase de Fernando Pessoa: «A língua é a minha Pátria.»
É neste espaço linguístico que teremos de entender a responsabilidade histórica, reforçada agora pela Revolução de Abril.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, embora essa não fosse a preocupação principal da sua intervenção, V. Ex.ª referiu-se no início às conclusões do encontro nacional do MDP/CDE. É, pois, em relação a essa primeira parte da sua intervenção que gostaria de lhe pedir alguns esclarecimentos.
Tanto quanto tomei conhecimento através da imprensa, esse encontro destinava-se, antes de mais, a traçar o perfil de um candidato presidencial apoiável pelo MDP/CDE, mas também criticava o Governo e defendia uma proposta alternativa do governo ao actual Governo de coligação.
Sr.ª Deputada, será que, conforme foi traduzido por certa imprensa, o perfil do candidato presidencial apoiável, digamos assim, pelo MDP/CDE seria o de

um continuador do general Ramalho Eanes, na impossibilidade de este se recandidatar?
Quanto à proposta alternativa de governo, no encontro, naturalmente o MDP/CDE considerou a proposta alternativa de governo apresentada pelo PCP.
Será que a proposta alternativa de governo apresentada pelo MDP/CDE é diferente da proposta do PCP? Se sim, em que é que consiste a diferença?
Conforme pude ler em certa imprensa, falava-se também de uma necessidade de empenhamento do Presidente da República numa alternativa governamental. Será que o MDP/CDE entende que a alternativa é a de voltar a um governo de iniciativa presidencial?
Eram estas as perguntas às quais gostava que a Sr.ª Deputada me respondesse.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Começo por agradecer as perguntas feitas pelo Sr. Deputado Acácio Barreiros.
Em primeiro lugar, devo dizer que a imprensa está extremamente mobilizada para as notícias sobre as eleições presidenciais, o que nos parece um mau sintoma.
Como já foi dito pelo secretariado nacional do nosso partido, pensamos que o candidato presidencial deve poder continuar uma via que neste momento foi interrompida pelo Governo AD, via essa de recuperação do País e da nossa economia, um candidato que dê possibilidade de um funcionamento democrático das instituições, que se coloque portanto numa posição suprapartidária. Foi isso que ficou definido. Também ficou assente que considerávamos esta manobra das presidenciais uma manobra de desvio das atenções para os grandes problemas nacionais.
O País trabalha com dificuldade e a «fofocagem» política vai alimentando, com o futebol, essa falta de capacidade para resolver os problemas.
Quanto à proposta de governo alternativo ao actual, ela foi feita pelo Partido Comunista, no seu congresso, sob o nome de «Salvação Nacional». Não sei se a proposta do Partido Comunista corresponde exactamente à nossa, que foi feita antes, quando das eleições legislativas. Nessa altura fomos bastante claros: considerávamos os democratas incluídos nos partidos aqui, nesta Assembleia da República, representados e fora dela e falámos até de franjas do PSD, o que na altura impressionou, para mal, certa esquerda mais radical.
Quanto à alternativa de governo, cabe ao Presidente da República, sempre que há impasses nas instituições, desbloquear a situação. Mas pensamos também que esta Assembleia, tal como está constituída, tem capacidade para encontrar novas soluções de governo, sem haver necessidade de o Sr. Presidente da República intervir. Consideramos, no entanto, que ele terá esse direito.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde que, em 1982, o Governo da

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AD, pela mão do então Secretário de Estado José Alfaia, desencadeou a sua ofensiva contra a ANOP, as ilegalidades, as prepotências, as arbitrariedades, as imoralidades que se acumularam em torno deste problema ultrapassaram tudo quanto era nessa altura legítimo esperar-se. A tal ponto que hoje é difícil conhecer-se onde começa o compadrio e onde acaba a irresponsabilidade, onde termina a incompetência e surgem as acções menos próprias e menos claras.

Do que foi a tentativa de extinção da agência noticiosa ANOP, do que foi a criação da NP e as condições, no mínimo, pouco transparentes em que o Estado celebrou com esta agência um contrato que o ligou a ela, ao arrepio dos mais elementares princípios da moralidade pública, tive eu próprio ocasião de, longamente, me pronunciar na anterior legislatura.

O combate que então travei juntamente com outros deputados, juntamente com outros partidos, designadamente com o Partido Socialista, se não impediu que a agência Notícias de Portugal viesse a ser constituída da forma pouco clara e pouco transparente que já referi, possibilitou pelo menos pôr cobro às tentativas de extinção da agência noticiosa ANOP.

Depois de tudo o que nessa altura se passou, era lícito esperar que, com a tomada de posse do novo Governo - Governo no qual ao Partido Socialista cabe o quinhão maior das responsabilidades -, se tivesse rapidamente caminhado para uma clarificação da situação da agência ANOP, para uma clarificação do seu futuro, para uma clarificação das condições em que deve funcionar.
Infelizmente, decorridos todos estes meses, forçoso é reconhecer que tal não aconteceu.
O futuro e as condições de funcionamento da agência ANOP continuam por definir e ela continua a ser como que uma selva onde o arbítrio e a incompetência parecem ser as qualidades maiores daqueles a quem cabe a responsabilidade da sua gestão, e a instabilidade e a insegurança a única retribuição segura com que podem contar todos aqueles que nessa agência trabalham.
Creio que disso são exemplo, mais do que flagrante, os últimos acontecimentos de que foi palco a ANOP e que exigem por parte do Governo uma muito rápida e clara tomada deposição, sob pena de que, legitima mente, se possa considerar esse mesmo Governo cúmplice de todas as ilegalidades que se verificam nesta momento na agência noticiosa ANOP.
Muito rapidamente, porque o tempo não sobra para mais, vale a pena recordar quais são esses factos.
Em 24 de Janeiro último, o conselho de gerência demitiu o director de informação, e fê-lo com o fundamento nos seguintes factos: porque todos os sectores desta agência vão passar por uma extensa e intensa reestruturação; porque se torna indispensável a elaboração de um novo cronograma; porque eventualmente o sector mais afectado será o da informação. Por todas estas razões, exonera-se das suas funções o director da informação.
Da pobreza dos argumentos talvez não haja muito a acrescentar. No entanto, dir-se-á que a gerência da ANOP tem razões que a razão desconhece, que se trata de uma acto de gestão normal.
Até aí tudo bem. Estava tudo bem se tal acto não viesse ferido de múltiplas ilegalidades, a primeira das quais é o facto de se demitir o director da informação

sem se designar o seu substituto, criando-se, assim um vazio.
Em segundo lugar, sem que se tivesse cumprido o preceito do artigo 5.º da lei que criou o Conselho da Comunicação Social, que obrigava à audição prévia do conselho de informação para a ANOP, que, nos termos dessa lei, substitui nas suas competências o Conselho da Comunicação Social, enquanto este órgão não entrar em funcionamento.

Demitido o director de informação por estas razões pouco transparentes e nestas condições de ilegalidade, é nomeado poucos dias depois, a 2 de Fevereiro, um director da informação interino. E de novo sem que se respeitem as disposições constantes da lei de imprensa que obrigam ouvir o parecer vinculativo do conselho de redacção.
Em 8 de Fevereiro é demitido o chefe de redacção da ANOP. E de novo em perfeita ilegalidade, na medida em que também se não ouve o conselho de redacção, quando o conselho de gerência a tal estava obrigado pelo clausulado do contrato colectivo de trabalho.
Além de tudo isto, ocorre ainda que todas estas medidas são tomadas pelo conselho de gerência exorbitando das suas próprias competências, já que anteriormente, em 30 de Janeiro, o secretário de estado de tutela da Agência limitara claramente os poderes do actual conselho de gerência à gestão dos assuntos correntes.
Também o comportamento do conselho de gerência perante toda esta série de ilegalidades vale a pena ser aqui trazido. Que acontece perante o vazio ilegal criado pela demissão do director de informação, sem designação de substituto? Após mais de 2 semanas, salvo erro 3 semanas depois, o conselho de gerência apercebe-se disso e fez uma nota - espantem-se, Srs. Deputados - dizendo assim: demitimos no dia 24 de Janeiro o director de informação, mas essa demissão só toma efeito a partir do dia 2 de Fevereiro, dia em que designámos o director de informação interino.
15to passou-se mais de 3 semanas depois da nota que demitia o director de informação.
Também a posteriori pretendeu o conselho de gerência suprir a falta de consulta ao conselho de informação para a ANOP: consultou-o depois de ter praticado todos os actos que referi.
O conselho de informação para a ANOP deu um parecer desfavorável à demissão do director de informação. Pouco importa! O conselho de gerência passou por cima do parecer do conselho de informação.
E continua! O conselho de gerência tem um tal conceito, um tal respeito pelas suas obrigações que, decidindo finalmente nomear definitivamente um director de informação, caiu no ridículo de solicitar ao conselho de redacção uma opinião sobre três nomes. E teve que aceitar a resposta do conselho de redacção, chamando-lhe a atenção para o facto de ele, conselho de redacção, não ter de se pronunciar sobre três nomes. Com efeito, a lei obrigava - e parecia que o conselho de gerência ignorava tal - à indicação concreta do nome sobre o qual o conselho de redacção deveria pronunciar-se.
Tudo isto parece serem questões menores e sem importância. Mas não são. São questões importantes porque por detrás delas estão razões políticas.

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Por que é que se demite o director de informação? Por que é que se demite o chefe de redacção? Porque tanto o director de informação, como o chefe de redacção, como os trabalhadores da ANOP, se vinham opondo claramente a toda uma série de ilegalidades cometidas pelo conselho de gerência e que iam claramente num destes sentidos: ou do desmantelamento da empresa, porque o conselho de gerência não se teria esquecido de que tinha sido empossado pelo Dr. João Alfaia com esse objectivo, ou no sentido da politização da agência.

Foi assim que denunciaram a tentativa feita pelo conselho de gerência de solicitar aos presidentes das câmaras que indicassem quem deveria ser o correspondente da ANOP nos vários concelhos. 15to é politicamente inacreditável!

E o mesmo conselho de gerência que, perante uma situação de grave crise económica, decide enviar a Maputo um técnico. E pasmem, Srs. Deputados, nas razões aduzidas. Assim, decide nomear o director técnico, Sr. Santos Gomes, para se deslocar rapidamente a Maputo a fim de estudar no local os principais problemas pendentes. E sabem, Srs. Deputados, quais eram alguns dos principais problemas pendentes e que justificavam a ida de um técnico a Maputo? Eram estes: a admissão de um segundo empregado administrativo e a situação actual do património, muito em especial a situação da viatura automóvel - e estou a dizer no singular, viatura automóvel. Penso que só estes dois apontamentos dão bem ideia da dimensão profissional daqueles que actualmente gerem a ANOP. São os mesmos que, ao arrepio das suas competências claramente delimitadas no último despacho do Secretário de Estado, decidem encerrar a delegação da ANOP em Faro, ao mesmo tempo que propõem criar correspondentes, não só em Maputo e Luanda, mas em todas as cidades do interior de Angola, do interior de Moçambique, nas cidades da Alemanha, nas cidades de França, e por aí fora!

Srs. Deputados, muito mais poderia acrescentar. O tempo não mo permite. Terminaria apenas, como disse há pouco, lançando daqui um apelo ao Governo para que ponha cobro à situação que se vive na ANOP, para que demita de imediato este conselho de gerência, para que o substitua, se necessário, por uma comissão administrativa interina.

Se o não fizer, não se queixe depois o Governo se vier a ser olhado como cúmplice da arbitrariedade, da incompetência e da irresponsabilidade que continua a reinar na ANOP.

Aplausos da UEDS e do MDP/CDE.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, para que efeito está a pedir a palavra?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, ouvi com toda a atenção a intervenção que produziu.
Queria manifestar-lhe, em nome da minha bancada, a concordância com a radiografia que fez sobre o que actualmente se passa na ANOP. Mas gostaria de ver respondidas, por parte da sua bancada, algumas questões que me parecem importantes para se compreender todo o problema.

Na sua intervenção, o Sr. Deputado não referiu uma peça do processo que me parece fundamental. Não referiu o facto de o Governo, em Conselho de Ministros, em Dezembro passado, ter decidido manter em funcionamento duas agências, a ANOP e a NP, mantendo - como se diz na resolução do Conselho de Ministros - uma coexistência concorrencial.

Sr. Deputado Lopes Cardoso, considera que todos os problemas que aqui veio trazer permitem ao Governo poder afirmar que existe uma concorrência leal entre as duas empresas?
Outra questão, Sr. Deputado: em sede de discussão do Orçamento do Estado, foram propostas pelo meu partido, pelo seu partido e, inclusivamente, por partidos da maioria inscrições de verbas no Orçamento que dessem cumprimento à lei dos estatutos da ANOP.
Por sugestão do Governo, a maioria retirou a proposta enquanto as da oposição foram rejeitadas. Argumentava na altura o Governo que a verba seria entregue de qualquer modo. Não era, pois, necessário estar a criar uma rubrica especial.
Estamos em Março - ou quase em Março - e, até hoje, a ANOP continua sem saber que orçamento pode ter para o ano de 1984.
Uma terceira questão, Sr. Deputado Lopes Cardoso: o Governo anunciou, também, na resolução a que já aludi que iria dotar a ANOP de novos estatutos. E pôs em consulta pública esses estatutos. Curiosamente, sendo a ANOP uma empresa pública e não pretendendo o Governo alterar-lhe o estatuto, verifica-se - e não é preciso um jurista nem um economista exímio para o fazer - que os estatutos propostos nem sequer correspondem ao estatuto legal das empresas públicas. Tal foi o entendimento unânime do Conselho de Informação para a ANOP, tal foi o entendimento do conjunto de pareceres pedidos sobre o projecto de estatutos.

Sr. Deputado Lopes Cardoso, tudo isto importará ter em atenção porque, não sendo de subestimar pequenas guerras que hoje existem dentro da ANOP, considero que já ultrapassámos o conjuntivo, isto é, quando disse que o Governo se pode vir a tornar cúmplice. Penso que se não houvesse um objectivo determinado e declarado, ou seja, o de conseguir o mesmo objectivo pretendido em 1982 pelo Secretário de Estado Alfaia, tudo quanto se está a passar seria incompreensível. Se não fosse assim, o que se está a passar na ANOP já teria sido resolvido: já teria sido resolvido o problema do Orçamento. E a outra agência não tem falta de dinheiro!
Como também já teria sido resolvido o conjunto de ilegalidades praticadas pelo conselho de gerência.
Para finalizar, a última questão que lhe coloco, Sr. Deputado Lopes Cardoso, é esta: considera ou não que a manutenção do estado de coisas que se vive actualmente na ANOP está a encaminhar a empresa para, a curto prazo - não por via legal, mas por

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via administrativa -, ter de ser extinta? Não será esse o objectivo, ainda que não declarado nem afirmado claramente, que o actual Governo tem procurado prosseguir até hoje?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, deseja responder já ou só no final?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, uma vez que há mais pedidos de esclarecimento, respondo no final.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Lopes Cardoso, ouvi atentamente a sua intervenção, que aplaudi, pois, na generalidade, estou de acordo com tudo o que disse.
A propósito da sua intervenção, pergunto a V. Ex.ª que opinião formula perante a actuação dos partidos da maioria que até agora têm impedido o funcionamento do Conselho de Comunicação Social, uma vez que já decorreram vários meses e ainda não se procedeu à eleição dos membros que faltam para preencher o respectivo elenco.
Uma outra questão, Sr. Deputado, é a seguinte: não acha que o Governo deve dar posse imediata ao elemento representativo dos trabalhadores eleito, de acordo com a lei, para o conselho de gerência?
O Sr. Deputado não acha que manter em funções este conselho de gerência da ANOP pode acabar por conduzir a uma situação tão grave que acabará por fazer paralisar a agência? Talvez seja essa a finalidade que preside ao tipo de actuação que V. Ex.ª acabou de relatar!
Ainda uma outra pergunta, Sr. Deputado: que diz ao facto de o Governo ainda não ter distribuído as verbas necessárias à manutenção da ANOP? E, já agora, que diz ao facto de o Secretário de Estado Adjunto, Dr. Anselmo Rodrigues, se recusar sistematicamente a deslocar-se a esta Assembleia da República quando os conselhos de informação solicitam a sua presença a fim de obterem informações sobre a política de informação deste Governo?
Finalmente, V. Ex.ª referiu um episódio relacionado com Maputo. Eu estive lá há pouco tempo, acompanhado de outros senhores deputados, e verifiquei que não existe uma boa informação - atempada e correcta - sobre o que se passa em Portugal, o mesmo acontecendo com as informações procedentes de Moçambique. E creio que actualmente tais informações são bastante importantes.
Acontece que as informações que temos não nos chegam pela ANOP, mas por outras agências internacionais.
Sentimos que as autoridades moçambicanas não hostilizam a ANOP, e a ANOP mantém o escritório fechado.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se não seria caso para urgentemente se enviar e manter, quer em Maputo quer em Luanda, correspondentes da ANOP, exactamente numa altura em que tão necessário se torna manter boas relações com toda a África.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento formulados, o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Lemos: De facto, não me referi ao primeiro aspecto que focou, nem a muitos outros. Muita coisa ficou por dizer. 15to é um romance que se arrasta há muito tempo, com muitos capítulos. Por isso, é impossível abordá-los todos em 10 minutos.
Seguramente o Sr. Deputado sabe, tão bem como esta Câmara, qual é a nossa posição em relação às duas agências e à criação da Notícias de Portugal.
Na última legislatura, tivemos ocasião de definir aqui, claramente, a nossa posição. Tivemos também ocasião de denunciar tudo quanto estava por detrás da criação da agência Notícias de Portugal e da tentativa de extinção da ANOP, na interpelação que conduzimos ao então Governo AD.
Para nós também é evidente que a tal existência concorrencial entre as duas agências não passa de uma ficção. E é tanto maior ficção quanto mais reduzidas são as condições de funcionamento que o Governo dá à ANOP e quanto maiores são as dificuldades criadas ao desenvolvimento da ANOP. Diremos que, a haver concorrência, estaríamos perante um caso de concorrência desleal, com clara protecção - ainda que por via indirecta - do Governo à Notícias de Portugal. E digo protecção, na medida em que dificulta claramente o funcionamento da agência ANOP, teoricamente sua concorrente.

Penso que nessa matéria a nossa posição é clara e já aqui foi expressa múltiplas vezes.

Quanto ao Orçamento, estamos de acordo. Apoiámos a vossa proposta de inscrição no Orçamento e apresentámos mesmo uma proposta de inscrição no Orçamento. O Governo deu garantias de que tal era desnecessário. É verdade que o problema dos salários tem vindo a ser desbloqueado, mas penso que não é processo de funcionamento de nenhuma empresa. 15to é, desbloqueiam-se as verbas, dia a dia, quando a corda está na garganta dos trabalhadores.

É, pelo menos, preocupante que não exista ainda, neste momento, um orçamento para o funcionamento da ANOP em 1984.

Será objecto do Governo conduzir por via indirecta, no fundo sem ter a coragem de afrontar claramente o problema - coragem a que há que render a devida homenagem ao Governo AD que, por parte do Sr. Secretário de Estado Alfaia, a tomou - de extinguir a ANOP? A política do Governo será um processo indirecto de atingir a extinção da ANOP? Penso que há cada vez mais razões para se acreditar que é esse o caminho. Ao contrário do Sr. Deputado, talvez eu ainda dê um certo benefício de dúvida. Mas, pela nossa parte, a dúvida vai sendo cada vez menor.
E também lhe posso dizer, objectiva e concretamente, que se continuar a ser este o procedimento do Governo - quer o Governo diga que quer, quer diga que não quer - conduzirá à extinção da ANOP, sem sequer assumir com ombridade e clareza a responsabilidade desse acto político.
E conduzirá à extinção da agência na pior das condições sob todos os pontos de vista.

Quanto à questão de saber qual é a minha opinião sobre os partidos da maioria pelo facto de não designarem os representantes para o Conselho da Comunicação Social, penso, Sr. Deputado, que é lamentável que isso aconteça. E não só em relação ao Conselho

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da Comunicação Social! Considero que é lamentável que continuemos sem vice-presidente do Conselho Nacional do Plano, considero que é lamentável que, ao fim de todo este tempo, a Assembleia não tenha ainda designado o seu representante para o Conselho de Defesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tudo isso é, de facto, lamentável. Mas, ainda há em mim uma certa dose de optimismo.
De facto, a última reunião dos presidentes dos grupos parlamentares fixou uma data para essas eleições. Espero, portanto, que a muito breve prazo essa lacuna esteja preenchida.
Mas atenção: a inexistência do Conselho de Comunicação Social não é desculpa para as ilegalidades praticadas pelo conselho de gerência, porque estão em funcionamento os conselhos de informação, que, nas respectivas áreas e de acordo com a lei que criou o Conselho da Comunicação Social, substituem o referido Conselho de Comunicação Social.
Também é evidente que entendo - e essa tem sido a nossa luta - que deve ser dada posse ao representante dos trabalhadores no conselho de gerência, da ANOP, como também nos conselhos de gerência de muitas empresas públicas onde essa designação e essa posse, ao arrepio daquilo que está na lei, continua a não ser dada.
E mal vai o País e mal vai a sociedade portuguesa quando é o próprio Governo a dar o exemplo de não respeitar e de não cumprir a lei.
Pelo menos a partir daí falta-lhe muita autoridade moral para exigir dos cidadãos o cumprimento da lei, já que é ele próprio a dar o exemplo de a não respeitar.
Já não tenho muito tempo, mas vou responder ainda ao Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.
É evidente - e eu disse-o no final da minha intervenção - que é urgente, imperioso, que o Governo demita este conselho de gerência. E disse também que, se o Governo o não fizer, tornará perfeitamente legítimo o entendimento daqueles que vêem nessa atitude uma cumplicidade por parte do Governo, não só com a actuação deste conselho de gerência mas, no fundo, com uma actuação que parece ir de acordo com o mandato que recebeu.
Preste-se uma homenagem a este conselho de gerência, que foi empossado pelo Sr. Secretário de Estado José Alfaia com um mandato claro: o de extinguir a agência. E tem procurado, dentro dos meios de que vai dispondo - legais ou ilegais -, cumprir esse mandato.
Outra deveria ser a atitude deste Governo. Penso que neste aspecto é mais criticável o Governo, que não assume os compromissos que assumiu em relação ao seu Programa, que o conselho de gerência, que, ao fim e ao cabo, está a assumir os compromissos que assumiu quando foi empossado com determinado objectivo.
Quanto ao facto de S. Ex.ª o Sr. Secretário de Estado não se deslocar à Assembleia a solicitação dos conselhos de informação da ANOP, penso que é lamentável.

Mas também devo dizer-lhe que, apesar de tudo, correndo embora o risco de ser acusado por alguns de vacilante, é talvez um dos poucos aspectos - e

digo, talvez, lamentando - em que o cumprimento deste Governo em relação ao dos governos anteriores - e pelo facto do comportamento do Governo na generalidade - apresenta algumas modificações.
Tem sido claramente maior a participação e a colaboração do Governo na actividade desta Assembleia do que o foi durante os governos AD.
Do meu ponto de vista há tão poucas bolas brancas a colocar na uma em favor do Governo que não hesito em conceder-lhe, pelo menos, essa bola branca. Penso que nesse capítulo melhorámos e avançámos alguma coisa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino tinha-se inscrito. Para que efeito deseja usar da palavra?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, uso da palavra só no sentido de esclarecer o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca que a eleição dos membros do Conselho Superior de Comunicação Social está em princípio agendada para o dia 1 do próximo mês. Digo isto para que não se elaborem aqui equívocos.

O Sr. João Amaral (PCP): - Em princípio ou definitivamente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito se tinha inscrito, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca?

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): É para formular um ligeiro protesto em relação às palavras proferidas pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Lopes Cardoso, agradeço as respostas que me deu e só queria pedir, caso fosse oportuno, que me respondesse à questão sobre Maputo e Luanda.

O Sr. Presidente: - Se desejar responder, tem a palavra, Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Agradeço ao Sr. Deputado ter feito o protesto que fez porque me dá oportunidade de responder à pergunta que havia ficado em claro por falta de tempo.
Em minha opinião era fundamental que, tanto em Maputo como em Luanda, tivéssemos correspondentes e, indo mais longe, delegações da agência ANOP.
15to não tem nada a ver com a referência que fiz à ideia peregrina de o seu actual conselho de gerência disseminar correspondentes, escolhidos pelos órgãos locais e - isto ainda é mais espantoso em termos de independência política - pelas terras que se espalham por todo o Moçambique e por toda a Angola. Este é o bom caminho para, de facto, não se ter coisa nenhuma.
Quanto à existência das delegações em Maputo e Luanda, obviamente que penso que isso seria bastante importante para o estreitar de relações entre Portugal e esses dois países.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

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O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém nesta Assembleia da República negará a importância fundamental à organização e gestão da Administração Pública, no viver dos variados ministérios e órgãos, no seu conteúdo funcional, que aponta para o serviço das populações. Ninguém negará que o desmuniciamento global do aparelho de Estado que existia no 24 de Abril demonstrava claramente, por um lado, que o Estado, no fascismo, era serventuário dos grandes interesses e fortunas e que, por outro, não investia nem gastava nas áreas de equipamento social e de serviço das populações. A rede escolar tinha a densidade que se conhecia, os cuidados médicos não chegavam onde deviam, as autarquias eram extensões do Ministério do Interior, servindo-se alguns delas.

A política de diminuição dos gastos públicos, eleita como uma das prioridades pelo actual Governo, no quadro do receituário clássico fmiesco e em perfeita sintonia subserviente com tal quadro, recupera esta ideia nodal do 24 de Abril: é preciso, para o actual Governo, gastar menos com a máquina do Estado, deflacionar em tempos de inflação os custos do consumo público nas áreas básicas ao serviço das populações, gastando menos em valores reais em equipamento escolar, sanitário, urbano, etc. Aos macroanalistas não interessará o facto, preocupados como estão com o FMI, de as crianças apanharem frio ou suarem as estopinhas em salas sem condições ou dos centros hospitalares não terem equipamento nem quadros. Basta-lhes, para populações inteiras, uma receita, que é esta: apenas o direito à sobrevivência em penúria e em falta de qualidade de vida. Conhecemos os mentores dessa política e sabemos como eles desvalorizam a função pública e os trabalhadores da função pública. Sabemos que são herdeiros do administrativismo marcelista e que para eles os trabalhadores da função pública foram e devem continuar a ser penalizados, em termos remuneratórios e em velocidade de carreira, em termos da responsabilização funcional, em termos de condições de trabalho.
O actual Governo, na sequência dos Governos PSD/CDS, dos governos que tiveram como responsáveis da função pública Eusébio Marques de Carvalho e Menéres Pimentel, entendeu como orientação fundamental neste campo agravar, num agravamento sem precedentes, a instabilidade das relações de trabalho na função pública. A criação de tal instabilidade de vínculos faz parte de um receituário expedito e grosseiro para promover as situações de mal-estar. O diploma que visa a constituição de excedentes é um diploma típico a esse respeito. Propicia e promove a instabilização da vida em cada órgão da função pública que, por simples despacho conjunto, no decorrer de simples «medidas de racionalização global ou parcial das estruturas e dos quadros ou efectivos dos organismos», pode vir a ser alterado, sendo o conjunto dos seus quadros posto em situação de excedentários. Poder-se-á louvar tal diploma pela sua indefinição, pela sua ínfundamentação? Repare-se, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que o mesmo Governo que fala dos excedentes com esse ar de cátedra confessa, pela Resolução n.º 8/84, dias antes, não ter «um conhecimento objectivo dos seus recursos humanos» e que «não obstante terem sido já iniciadas algumas operações piloto nalguns departamentos» se tratava de uma operação de conhecimento que demoraria tempo, ex-

tremamente complexa e morosa que era. Mais: o Governo implementa o sistema dos excedentes porque certamente ouviu dizer, porque acha que deve haver, porque o FMI lhe soprou que há.

Aplausos do PCP.

Mas o Governo confessa que não sabe às quantas anda em termos de função pública, como em outros domínios, que dados tem, quais são os recursos humanos do aparelho de Estado.
A infundamentação do processo de constituição dos excedentes não qualifica os seus autores senão como gestores expeditos e avulsos. São gestores herdeiros e continuadores da famosa «conveniência de serviço» ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... que mostrou a sua face delitual e arbitrária, ainda em recente debate nesta Assembleia. O decreto dos excedentes promove a instabilização, promove a gestão avulsa, permite a gestão persecutória e facilita a feitura de processos disciplinares mediante a figura, rapidamente assumida da chamada insubordinação grave, que é base, no novo Estatuto Disciplinar, para processos disciplinares sumários e penas agravadas. Aliás, tal Estatuto Disciplinar - o n.º 24/84 - de que solicitámos a ratificação, agrava as penalizações disciplinares no geral, inclui como termos de deveres gerais dos trabalhadores conceitos de definição tão movediça e arbitrária, como «lealdade» e «sigilo», mantém a marginalização das associações sindicais, limita o número de testemunhas em processo, cria processos de meras averiguações, atipifica as penas expulsivas, dando-lhes indefinição geral, isto é, sendo um instrumento intimidatório.
Os excedentes que forem «encontrados» são «convidados» à desvinculação da função pública, à aposentação voluntária, à licença sem vencimento. É um típico conjunto de medidas para se poder dizer, posteriormente, a um qualquer FMI, que o aparelho de Estado diminuiu em número, independentemente da qualidade dos recursos humanos que se perdem. É um típico convite ao salve-se quem poder e quiser. As medidas assim preconizadas coagem as estruturas fundamentais do funcionamento da Administração Pública, coagem os trabalhadores, numa filosofia que, sendo made in AD, é continuada e assumida desastradamente pelo PS em todo o pacote de 3 de Fevereiro último.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São conhecidas e estão diagnosticadas grande número das causas que provocaram o desordenamento territorial do País, nas suas linhas mais fundamentais, e também a macrocefalia das grandes metrópoles e a lisboetizaçâo da administração central. Perante os critérios de uma configurada gestão «territorial» dos recursos humanos como aquela que, agora, continua a da AD em 1982, todos se perguntam se tais medidas são as necessárias e as correctas ou apenas se caracterizam por lesar os trabalhadores, por forçar mobilidades em regime e sob critérios que não podem deixar de ser denunciados. Entre as medidas da mobilidade destaca-se pelo seu descaramento a da afectação colectiva que

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determina que «quando a realização dos trabalhos ou projectos for considerada de interesse público, a afectação colectiva pode fazer-se para empresa do sector privado». 15to retrata claramente, preto no branco, o assumir da Administração como serventuária de interesses privados, forçando os trabalhadores da função pública a situações funcionais que não previram e a que não estão obrigados. Por outro lado voltam a enumerar-se, sem se definirem, as chamadas zonas de reduzida, média e extrema periferia, buscando uma classificação de periferia. O Governo, que fez o que fez em sede do Orçamento em relação ao financiamento às autarquias locais, defraudando-as em milhões de contos, aparece agora, com falsos rebates, a anunciar que tem em particular cuidado as zonas, que não define, de média e extrema periferia, propondo-se apoiar a transferência para lá de quadros, dirigentes e de quadros técnicos. Mesmo o observador desprevenido desconfiará deste intervencionismo potencial, desta tentativa de mão forte no viver autárquico. Aliás, as autarquias passam a ser obrigadas a consultar previamente o serviço de colocação de excedentes, podendo tais excedentes ser integrados em lugares de ingresso ou de acesso nos quadros das autarquias locais, mediante um processo sumário e com dispensa de concurso. Facilitam-se as comissões de serviço de excedentes para lugares das autarquias, e tudo isto em nome de uma mobilidade que, sendo muitas vezes forçada para os trabalhadores, o é também para os órgãos, que vêem diminuídas as suas capacidades de escolha e de intervenção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Haverá, em técnica de gestão global de recursos humanos, algum rasgo de génio no conjunto do tecido administrativista que aqui e agora nos ocupam nesta Assembleia da República? Não o há, é triste reconhecê-lo. Perante o conjunto de problemas que existe, a posição do Governo é a de encontrar de novo as figuras que o defunto governo da AD tinha encontrado. Não há nenhuma medida global complementar das já emblematicamente definidas, visando o aperfeiçoamento profissional do conjunto dos quadros e trabalhadores. A formação é uma constante da vida; aqui neste pacote nem sequer é referida. A reconversão profissional é referida em 4 linhas, não havendo uma mínima análise das metodologias de utilização e de motivação para a implementar e promover. A reclassificação funcional é apenas sumariada. As estruturas organizacionais continuam a ser tratadas dentro do quadro do administrativismo mais bolorento e sem a procura de um perfil mais ajustado à organização geral do Estado definida constitucionalmente. Os procedimentos que se anunciam não têm nenhum sinal de eficácia e de decisão: sucedem-se referências a auditorias de gestão, de que se vinca um perfil de carácter impositivo, sem determinação de qualquer envolvência, a que a formação do conjunto dos quadros e trabalhadores poderia dar azo.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: Afirmou o Governo, com alguma irresponsabilidade, que se inflectira e alterara a prática negocial. Sublinhou-se que fora publicado o decreto da negociação, o n.º 45-A/84. Mas tem sido sublinhado que a própria feitura desse decreto é um excelente exemplo de como o Governo não faz prática negocial e de como age unilateralmente. O diploma da negociação não foi negociado. Os direitos de negociação e participação são irrelevantemente abordados, mesmo na óptica do direito comparado

mais elementar. Não será realmente de relevar que a discussão da massa salarial é limitada à verificação das variações percentuais que cabem aos quantitativos das várias prestações remuneratórias? Alguém chamará ou poderá chamar negociação àquilo que se acaba de fazer com a actualização nominal da massa salarial na função pública, em termos tais que diminuem o poder de compra por parte dos trabalhadores, que agravam as suas condições de vida, que banalizam o trabalho público?

Aplausos do PCP.

Poder-se-á considerar que é legítimo excluir da negociação e até da simplesmente chamada participação as matérias relativas a competências, a atribuições, à política de funcionamento da Administração Pública, como é expresso no artigo 12.º desse Decreto n.º 45-A/84?
Termino sublinhando que o conjunto dos diplomas referidos constitui um instrumento de gestão de feição inquietante do aparelho do Estado, intrometendo-se na administração local. Não vai resolver nenhum dos graves problemas de gestão da máquina do Estado que afectam os cidadãos e os seus trabalhadores. Vem sim agravar a precariedade de emprego de milhares de trabalhadores da função pública e aumentar a instabilidade das relações de trabalho, impondo uma mobilidade forçada. Tudo isto foi decidido por forma unilateral, perfilando-se ao mesmo tempo, sobre a função pública, um estatuto disciplinar repressivo e intimidatório. O Grupo Parlamentar do PCP chamou à ratificação este conjunto de textos legislativos e pensa que se impõe um continuado esclarecimento público, uma firme atitude de denúncia das malfeitorias. Estamos aqui a fazê-lo. Fá-lo-emos lá fora também, em todas as circunstâncias.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.
Ficam inscritos, para pedir esclarecimentos ao orador que acabou de intervir, os Srs. Deputados Helena Cidade Moura e Manuel Pereira.

Pausa.

Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento subscrito pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros do PCP, solicitando o prolongamento do período de antes da ordem do dia, que ponho de imediato à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No âmbito das actividades do Grupo Parlamentar do PCP, eu e o meu camarada de bancada Carlos Carvalhas visitámos, há cerca de 2 semanas, o Hospital de S. José. É sobre esta visita que trago ao conhecimento da Câmara e através dela ao conhecimento do Governo os casos que por lá se passam.
Como os Srs. Deputados sabem, o Hospital de S. José é uma das unidades que compõem os chamados Hospitais Civis de Lisboa, e é esse que aqui

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quero hoje abordar. Não vou falar do Banco do Hospital de S. José, porque ele constitui uma outra unidade dos hospitais de Lisboa.

Nessa visita, fomos recebidos pelo presidente do conselho de gerência, que manifestou a máxima abertura e disponibilidade, dialogou connosco e acompanhou-nos durante toda essa manhã.

Desde logo se põe - e foi posto pelo presidente do conselho de gerência - o problema da gestão do hospital: o conselho de gerência não tem autonomia financeira nem de gestão de pessoal, pois tudo está centralizado na comissão coordenadora dos Hospitais Civis de Lisboa. Assim, por exemplo, passam-se meses para que um vidro que se parta seja colocado.

Um outro problema que se põe é que as leis de gestão hospitalares não estão a ser cumpridas; nesta altura, os conselhos gerais não funcionam; a participação das populações, nomeadamente das autarquias - que deviam constituir esses conselhos gerais -, não existe, não funciona. Tudo isto leva, pois, a que as coisas não possam andar bem.
Quem passou por esse hospital - como eu, que fiz lá o meu internato há 10 anos - constata agora que, evidentemente, as instalações melhoraram, e também é bom que isso de diga. Verifica-se, por exemplo, que o serviço 2 - onde fiz o meu internato - está completamente diferente; existem agora as unidades de emergência médica e cirúrgica; há um novo serviço de reabilitação; estão a ser feitas obras na Maternidade de Santa Bárbara. Tudo isto são passos positivos. Mas resolve alguma coisa?
Quando eu e o meu camarada Carlos Carvalhas, juntamente com o presidente da comissão instaladora, passávamos pelo serviço 2 - um serviço novo, acabado de estrear -, encontrámos uma maca coberta. Às duas por três o presidente da comissão instaladora resolveu destapar a maca; pensávamos que era um cadáver, mas não era; era um cidadão em estado moribundo, em estado agónico, que tinha sido transferido para aquele serviço, mas que se encontrava no corredor completamente abandonado. 15to foi verificado por nós, in loco, e pelo presidente da comissão instaladora, que teve de chamar alguém de serviço para tratar este doente.
Este é um exemplo entre muitos do que se passa diariamente nos hospitais. E depois pergunta-se: mas de quem é a culpa? É do médico? Ninguém o informou de que estava ali o doente nem ninguém informou o enfermeiro. O problema é que quando se procura saber quem é o responsável ninguém tem culpa.
Evidentemente que há serviços que continuam a ter péssimas instalações e não se admite que hoje, em pleno século xx, existam alguns, como o serviço 3 ou o serviço 6, que comportam um aglomerado de doentes; aquilo não é uma enfermaria, é um aglomerado de doentes de diversas especialidades - cirurgia maxilofacial, ortopedia, cirurgia -, onde as camas estão todas misturadas e onde os médicos não conseguem entrar.
Os apoios também não funcionam. Senão vejamos: no serviço de radiologia estão a instalar um TAC - uma unidade moderna de Raios X. Mas dizia-me o presidente da comissão instaladora:

15to para mim é motivo de satisfação, mas maior satisfação teria se pusessem o Raio X do estômago a funcionar porque há 6 meses que não funciona.

Portanto, há 6 meses que o Raio X do Hospital de S. José não «faz» um estômago! 15to é escandaloso!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Também há graves problemas com a farmácia, o laboratório, a cozinha e a lavandaria.
Em relação a esta última, duas palavras: o serviço de lavandaria tem de se mandar para o privado. Quem compara este serviço do Hospital de S. José com o do Hospital de Santa Maria vê que o que se passa em relação ao primeiro é inadmissível. Hoje, as roupas do Hospital de S. José são postas no privado para lavar porque o seu serviço de lavandaria não dá resposta.
Bom, quanto à cozinha era bom que os Srs. Deputados a visitassem: o chão, em vez de ser liso para se poder limpar, está cheio de buracos; é uma porcaria. Os ratos passeiam e convivem diariamente dentro daquilo. Todos os dias isto é denunciado, mas os ratos continuam a conviver dentro da cozinha do Hospital de S. José.
E o transporte da alimentação para os doentes? É feito em baldes ou panelas que correm o hospital inteiro até chegar a uma enfermaria onde a comida é despejada em pratos de alumínio, fria e com um aspecto ...! Os Srs. Deputados deviam tentar comer uma refeição daquelas para ver se eram capazes.
Este problema resolvia-se de uma maneira simples: a comida saía da cozinha em refeições individuais, bem acondicionada, para que chegasse ainda quente aos doentes. 15to resolvia-se, pois, facilmente, se houvesse uma boa organização dos serviços. Mas não há, e continua-se a viver como no século passado, como no tempo das misericórdias.
Uma palavra final em relação ao problema do pessoal que lá trabalha. Muita gente diz que não trabalha, que chega atrasada ao serviço, que falta. Mas que condições tem esse pessoal?
Diziam os médicos, os enfermeiros, o pessoal de serviço, que muitos deles têm de deixar o carro fora do Hospital porque dentro não há parque, e é no carro que deixam as roupas e onde vestem a bata porque nem os médicos têm vestiários. Já aconteceu muitos carros de médicos serem assaltados, tendo-lhes sido roubados os casacos e as carteiras.
Assim, Srs. Deputados, não se pode fazer boa medicina. Assim não se podem responsabilizar só os médicos, porque onde não há nem vestiários nem salas de reuniões os médicos não podem trabalhar bem.
E evidente que o Hospital continua a funcionar 3 horas por dia. Também não é funcionando esse tempo que um hospital central de Lisboa - o Hospital de S. José - pode prestar os serviços necessários à população.
Termino, deixando um alerta bem grande à Câmara e ao Governo: que estes problemas - pequenos problemas pelos quais a crise não pode ser responsável - sejam resolvidos.
Estes são problemas derivados de má gestão, de desorganização dos serviços, que cumpre ao Governo resolver.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado Malato Correia?

O Sr. Malato Correia (PSD): - Era para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas no prolongamento do período de antes da ordem do dia só lhe posso conceder a palavra para uma intervenção.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Como a minha bancada vai proferir uma outra intervenção, reservo o meu pedido de esclarecimento para a próxima oportunidade.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado, fica inscrito.
Também para um intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fradinho Lopes.

O Sr. Fradinho Lopes (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: A crise dos lanifícios, há muito instalada, tem vindo a agravar-se de ano para ano, afectando em especial as populações de alguns aglomerados encravados na serra da Estrela, designadamente a cidade da Covilhã e as vilas de Tortosendo, Seia, Gouveia e Manteigas.
Só na região da Covilhã, encerraram nos últimos 10 anos mais de 50 empresas de lanifícios, quase todas elas de reduzida dimensão. E cerca de 30 correm agora o risco de encerramento a curto e médio prazos. As que não entraram ainda em desagregação, para lá caminham. Unidades relativamente bem apetrechadas e de média dimensão estão a ser seriamente afectadas. A Ernesto Cruz, após uma dura e longa agonia, acaba de lançar no desemprego os 400 trabalhadores que ainda mantinha ao serviço.
Tem sido perceptível a preocupação das associações sindicais de evitarem, nos últimos tempos, qualquer agitação laboral que possa complicar a situação existente. Mas a previsível e receada falência de muitas empresas, aliada a outros factores conjunturais adversos, poderá gerar, localmente, convulsões económicas e sociais muito graves, porquanto, dependendo os restantes sectores de actividade industrial e comercial dos lanifícios, se estes ruírem, aqueles cairão logo a seguir.
Os baixos salários pagos aos operários têxteis, muitos dos quais possuem elevada especialização profissional (é o caso dos tecelões), permitiram nos últimos tempos um sensível aumento das exportações, existindo nas empresas uma aparente e enganadora tranquilidade motivada pelo aceleramento da produção. Mas tudo leva a crer que esta conjuntura transitoriamente favorável apenas representará um mero adiamento da derrocada final generalizada a que a indústria de lanifícios da Covilhã estará condenada se medidas urgentes e adequadas não forem tomadas. Derrocada da qual escaparão provavelmente uma meia dúzia de empresas melhor estruturadas.
Ao longo dos últimos anos, muitos dos trabalhadores desempregados conseguiram colocação noutras empresas. Mas as circunstâncias presentes são diversas. Tudo se conjuga para que o único caminho para quem perder o emprego seja o desemprego. E se este tem

sido minorado através da percepção do subsídio de desemprego, na prática cumulável, todos nós o sabemos, com o produto dos chamados biscates, com o aguardado e drástico aumento do número de desempregados em Portugal, que, segundo alguns, poderá rondar o milhão, não será ousado prever que não só os biscates escassearão, como o próprio valor real daquele subsídio, já agora insuficiente, regredirá.

Além disso, ainda está por verificar o resultado prático, naquela região, de uma eventual aplicação formal do chamado lay off. Não só não temos a ingenuidade de acreditar que os trabalhadores cujos contratos de trabalho forem suspensos manterão a garantia de regressar aos seus postos de trabalho decorrido o prazo fixado, como não cremos, de modo algum, que a generalidade das empresas, uma vez suspensos os contratos de trabalho, fique em condições de assegurar a sua quota-parte da compensação salarial devida a cada trabalhador, acrescida do pontual pagamento das contribuições para a segurança social referentes à totalidade da remuneração normal devida...

É esta a perspectiva sombria e preocupante que pesa directamente sobre os 7000 trabalhadores laneiros da região da Covilhã e, por tabela, sobre os restantes.

As entidades locais responsáveis têm vindo, desde há muito, a desenvolver esforços no sentido de atingir a meta da diversificação da actividade industrial. Procuraram afastar os riscos gravosos resultantes da existência de uma situação de monoindústria em decadência e tentaram o estabelecimento de novas indústrias. Mas sem êxito. Com tristeza e algum desespero se tem constatado que na Covilhã nenhum investidor arrisca um tostão. A atestar essa preocupante realidade lá está o moderno parque industrial vazio, continuando a aguardar, ano após ano, que acabe por surgir o milagre.
Pensamos que a reconversão salvadora não passará de uma miragem enquanto os potenciais investidores encontrarem noutras paragens melhores condições para aplicação dos seus capitais. Eles ignorarão esta região do interior enquanto as comunicações ferroviárias, rodoviárias e postais forem deficientes e caras.

Se alguma coisa se tem feito na introdução de melhorias em determinados troços de estrada, em contrapartida os comboios continuam cada vez mais lentos. E, curiosamente, no trajecto de Lisboa para a Covilhã, eles reduzem a sua velocidade para metade a partir de Castelo Branco. Uma média de 60 km/hora até à capital do distrito e 30 km/hora desta até à Covilhã ... É o resultado do incumprimento, por parte da CP, dos seus planos de modernização da via a partir da Castelo Branco, como se daí para diante tudo o resto fosse paisagem.

Sem que tal signifique que as entidades locais devam desistir dos seus esforços no sentido de diversificação da actividade industrial na região da Covilhã, haverá que segurar o edifício dos lanifícios, velho de séculos, porque é fundamentalmente deste que vivem as populações.
Contrariamente ao que alguns poderão pensar, a agressiva concorrência dos novos países que nos últimos anos surgiram no mercado dos têxteis não afectará a potencial capacidade de exportação do subsector dos lanifícios portugueses, porque este é um campo onde se exige uma elevada especialização que muitas

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das nossas empresas possuem. Teremos uma indústria de lanifícios eficiente e competitiva se a conseguirmos reorganizar. E essa reorganização torna-se cada vez mais imperiosa, reclamando a tomada de medidas adequadas e urgentes antes que seja tarde demais. Medidas essas que deverão passar, cremos: pela abertura de linhas de crédito bonificado e especialmente controlado às empresas viáveis que careçam de modernizar os seus equipamentos, ampliar a sua dimensão, melhorar a sua competitividade; pela dificultação da importação de tecidos que a nossa indústria laneira poderá fabricar, pondo-se termo à situação absurda de importarmos o dobro daquilo que exportamos; pela criação, na cidade da Covilhã, do há muito reivindicado posto alfandegário que permita àquela região interior libertar-se de uma burocracia aduaneira emperrante e dispendiosa existente nos portos de Lisboa e Leixões; pela construção e funcionamento efectivo do programado Centro de Formação Profissional da Covilhã, por forma a conseguir-se não só um aperfeiçoamento técnico em profissões onde este é reclamado, como ainda uma correcta reconversão profissional dos desempregados, por forma a melhorar as suas oportunidades de regresso à vida activa;
Paralelamente a estas e outras medidas que as circunstâncias imponham é de exigir às entidades governamentais que não permitam o esvaziamento não compensado dos serviços públicos existentes, sendo especialmente recomendável que em relação ao Centro Regional de Segurança Social haja particular cuidado na escolha dos seus gestores, tal como recentes incidentes aconselham.

Aplausos do PS e da ASDI.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Era para pedir que me inscrevessem para um pedido de esclarecimento em relação à intervenção que acabou de ser produzida pelo Sr. Deputado Fradinho Lopes.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, fica inscrito.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Queria também ficar inscrito para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Fradinho Lopes.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A imprensa, e de um modo geral to

dos os órgãos de comunicação social, vêm falando, desde há tempos, em mudanças estruturais de programas, quer da RTP, quer da RDP.
Hoje, o mais lido e o mais popular jornal de todos os jornais do Porto, o Jornal de Notícias, encabeça o sector afirmando:
RDP - novo programa chama-se «Centralizar» e «o Norte desaparece do mapa de Lisboa».

Tudo isto é motivo de legítima e profunda preocupação para as gentes do Norte, às quais me orgulho de pertencer.
Por isso, aqui estou.
Segundo parece, a nova direcção de programas decidiu acabar com toda a produção e realização próprias das emissoras regionais do Porto e de Coimbra. Esta atitude surge numa altura em que parece, também, estar em marcha atrás um plano idêntico, há tempos enunciado, para a RTP. Quer dizer, o Norte passará a ficar calado a nível de intervenção própria e específica na RDP e na RTP.
Poderá acontecer que assim seja, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Mas, ainda que o seja, muito se enganarão os que pensam que o Norte se cala só porque lhe fecham a rádio e a televisão. A voz do Norte e a das suas gentes tem força para se fazer ouvir sem esses meios de comunicação social e até para além deles.
No Norte não somos mudos, não costumamos ficar calados quando alguém nos quer retirar o uso da nossa palavra. Emiti-la-emos por todos os meios ao nosso alcance, com a voz alta dos que sabem quanto valem, o que querem e o que representam.
A nova filosofia de programas ditada pela direcção na RDP é centralizar em Lisboa o «centro nevrálgico». A partir de agora o que importará para as regiões é apenas «alimentar» os programas nacionais, acabando com a produção própria.
E, como será evidente, é o «centro nevrálgico», Lisboa, que vai escolher desse «alimento» fornecido pelas regiões aquilo que vai para o ar, para os ouvidos e para os olhos dos portugueses. Vai-se, mais uma vez, centralizar em vez de descentralizar. Vai-se, mais uma vez, a meu ver, errar em vez de acertar.
Não sou, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um especialista de radiotelevisão. Limito-me a ver e ouvir, tantas vezes com desgosto e algumas, poucas, com agrado. Mas não posso deixar de me recordar de uma frase, que hoje, no mesmo Jornal de Notícias, escreve o nosso muito querido amigo e companheiro de Hemiciclo, Raul Rego, a quem, mais uma vez - e não certamente a última quero deixar aqui a minha homenagem de um democrata para outro democrata. Na crónica «Contra ventos e marés», hoje intitulada «O País e o Terreiro do Paço», afirma o seguinte:
... mas o Terreiro do Paço, sinónimo de «centro nevrálgico» da vida portuguesa, está tanto ou mais só na corte que não o Rei para o decidir sem consultar ninguém, ontem como hoje.

Obrigado, Sr. Deputado Raul Rego. Mais uma vez V. Ex.ª tem razão. E como V. Ex.ª diz, o Terreiro do Paço vai-se desfazendo, os poderes vão sendo distribuídos conforme as regras democráticas entre os órgãos de soberania e as autarquias, mas não tenham

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Dúvidas, pois sem descentralização não haverá nunca democracia.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Porque assim é, porque assim pode, pelo menos, parecer ser, a meu ver, aqui fica uma palavra de aviso à RDP e à RTP. O Norte não acatará facilmente o retorno ao início da descentralização. Não será a RDP e a RTP, centralizadas agora no tal «centro nevrálgico» lisboeta, quem fará com que os homens, as mulheres e os jovens da minha terra se limitem a «alimentar» Lisboa e tenham, em seguida, que comer o que esta apenas lhes quiser dar.
Nós só comemos o que queremos e não tudo aquilo que Lisboa nos quiser dar por direito ou por esmola.

Aplausos do PSD, do CDS, da ASDI e de alguns deputados do PS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, era para ficar inscrito para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, queria fazer também um pedido de inscrição para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, também queria pedir para ficar inscrito para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Armando de Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Armando de Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, era também para pedir para me inscrever para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ficam então inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Montalvão Machado os Srs. Deputados Jorge Lemos, Corregedor da Fonseca, Nogueira de Brito e Armando de Oliveira.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma intervenção.

I SÉRIE - NÚMERO 77

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria aproveitar este prolongamento do período de antes da ordem do dia para manifestar aqui um desgosto, uma pena que não é uma figura regimental, mas é uma dor de alma que sinto e que julgo ter a obrigação de transmitir e manifestar.

Trata-se de um facto que se passou na última semana e que me parece importante e grave.
As câmaras municipais do distrito de Viana do Castelo foram convocadas pelo Sr. Governador Civil para se reunirem no Governo Civil no dia 10 às 3 horas da tarde para se pronunciarem sobre a revisão da Lei n.º 79/77, sobre o regime autónomo da tutela sobre as autarquias e sobre as associações de municípios. Além disso, fixa-se que as respostas devem dar entrada no Ministério da Administração Interna até ao dia 16.

Não percebo, não chego a entender o que é que o Sr. Ministro da Administração Interna pretende ao reunir os presidentes das câmaras num governo civil para se pronunciarem sobre aquilo que ele sugere que se apresente em Conselho de Ministros para alterar ou para rever a Lei n.º 79/77, para estabelecer um regime autónomo de tutela sobre as câmaras municipais e para legislar sobre a associação de municípios.

Penso que o que deveria ser correcto, que o que deveria estar certo era ouvir as câmaras municipais e não os presidentes das câmaras.
Os presidentes das câmaras representam as câmaras, mas quem tem de ser ouvida é a autarquia. É verdade e é certo que eu quis ouvir os meus colegas, quis ouvir a opinião da minha câmara sobre as propostas de alteração e de revisão destes diplomas inerentes ao poder local e não consegui porque não tive tempo. Não me foi dada essa possibilidade. Gostava de saber porque é que é ouvido um presidente de uma câmara municipal sobre uma revisão da lei fundamental da competência das câmaras, sobre a tutela administrativa - da qual já não vou discutir o seu conteúdo, altamente preocupante - e porque é que não se ouve uma assembleia municipal, que é o órgão autárquico local por excelência, que é o órgão que fiscaliza a câmara, que é o órgão que tem na Lei n.º 79/77 uma série de regulamentações, uma série de atribuições, uma série de competências e uma série de faculdades para poder conferir, para poder acompanhar, para poder corrigir e para poder fiscalizar as câmaras municipais.
Porque é que não são ouvidas as assembleias municipais? Porque é que, ao abrigo dessa autorização legislativa que foi pedida em Junho, nesta Assembleia, que foi dada por lei em Setembro, só se vem agora ouvir as autarquias, a 3 semanas da extinção do prazo da lei, sem tempo, sem prazo, sem utilidade?
Não me parece que isto esteja certo. Não me parece que isto seja coerente. Não me parece que isto seja respeitar as autarquias locais. Não me parece que isto seja descentralizar e dar ao poder local aquela competência e dignidade que deve ter.
Por outro lado, não me posso conformar em que as opiniões que as autarquias têm que dar sejam dadas ao governo civil e em discussão com os outros presidentes das câmaras, só por eles convocadas expressamente para isso num órgão que é prolongamento da administração central.

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Essas opiniões deviam ser dadas nos seus concelhos, dentro dos seus órgãos e não desta forma e por esta maneira.
Todos nós sabemos e não podemos esquecer que o poder local é carinhoso a todos os partidos políticos e temos que nos lembrar que estamos nas câmaras pelos nossos partidos políticos, na generalidade, e que com eles temos determinadas obrigações, ainda que não sejamos seus serventuários.
Mas é certo que todos os partidos têm os seus institutos próprios para tratar do poder local, têm as suas revistas próprias e específicas para tratar dos problemas do poder local. É lógico, é correcto que os autarcas terão que ter tempo para ouvir os seus partidos e para consultar os seus institutos específicos no sentido de ouvir o que sobre esses assuntos se tem dito.
Não me parece que é assim à sobreposse, de repente, que estas coisas se têm que manifestar e que se solicitar às autarquias com um prazo marcado para darem entrada no Terreiro do Paço 5 dias depois.
Era esta manifestação, era esta pena, era este desgosto que queria deixar aqui nesta Câmara, pois não me posso conformar.

O Sr. Alberto Avelino (PS):- Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, era para pedir que me inscrevessem para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Abreu Lima.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, iríamos agora entrar no período da ordem do dia. No entanto faltam 16 minutos para as 17 horas e 30 minutos e como, desde logo, o partido apresentante do projecto de lei que iremos discutir tem 30 minutos para o apresentar, ultrapassaríamos largamente a hora prevista para a interrupção.
Se estivessem de acordo, suspendia agora os trabalhos para recomeçarmos às 17 horas e 45 minutos, e convocava para uma reunião os presidentes dos grupos parlamentares.

Pausa.

Como não há objecções, está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 15 minutos.

Após o intervalo assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando do Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia, de que consta a discussão do projecto de lei n.º 261/III, apresentado pelo MDP/CDE, sobre o crédito em espécie à agricultura.

Para proceder à sua apresentação tem a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, lamentamos que a discussão do projecto de lei que agendámos para hoje comece tão tardiamente, uma vez que a sessão deveria ter recomeçado às 17 horas e 45 minutos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A falta de apoio às populações rurais e aos agricultores portugueses, as políticas prevalecentes desde há décadas para o sector agrícola - considerado secundário no processo de desenvolvimento económico nacional, susceptível de evolução positiva por mero arrastamento do sector industrial, e não carente, portanto, de medidas específicas de estruturação e dinamização - e a falta de uma visão estratégica de salvaguarda de um mínimo de independência nacional arrastam a agricultura portuguesa para uma iniludível situação de degradação económica e de mal-estar social.

Essa situação é de tal modo evidente que todas as forças políticas representativas a reconhecem. Traduz-se, nomeadamente, por falta de produtos no consumidor ou produtos a preços exorbitantes para o poder aquisitivo da maioria da população; falta de matérias-primas nacionais, de origem agrícola, para a indústria; crescente dependência externa em produtos agrícolas e alimentares e aumento imparável da saída de divisas; proliferação de intermediários nos circuitos comerciais, muitos dos quais dispensáveis; despromoção social do agricultor e do trabalhador rural, com a consequente saída dos mais jovens e desincentivação dos mais aptos; abandono de extensas áreas com aptidão agrícola e florestal e degradação das zonas rurais; imobilismo do aparelho do Estado e dos organismos de coordenação económica em relação ao sector.

O MDP está, porém, ciente de que as dificuldades não se resolvem com a enunciação de carências e atrasos, nem com as habituais declarações de intenções de mudança, quantas vezes tonitroantes na forma mas inaplicáveis, contraditórias ou vazias de conteúdo prático.

Por tal facto, um programa agrícola coerente deve assentar num conjunto articulado de medidas a tomar, visando a adesão dos próprios agricultores e tendo em conta a especificidade de cada região do País, com relevo para as suas estruturas de minifúndio e latifúndio, numa opção política clara quanto às acções a desenvolver em relação àqueles produtos que, por absolutamente essenciais ao consumo, são geradores de dependências externas ou pelo seu peso na economia nacional são considerados estratégicos e, ainda, numa proposta de enquadramento orgânico para o sector agrícola e vida rural.

É, pois, num quadro de equidade social, de dignidade democrática e de eficácia técnica que se deverão inscrever as medidas enunciadas.

Contrariamente, por exemplo, à política anunciada pelo Governo para a agricultura, que fala de empresas agrícolas «bem dimensionadas», «economicamente viáveis» (leia-se de nível europeu), nada dizendo que respeite àquelas que efectivamente temos em Portugal e que, numa percentagem entre 80 % a 90 %, fogem

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aos padrões governamentais. No entanto, estas pequenas explorações dão trabalho a uma elevada percentagem dos nossos activos, proporcionam o sustento às famílias rurais, contribuem com mais de 60 % para o produto agrícola bruto e para o abastecimento público em produtos essenciais como o leite, a fruta, a batata, o azeite e o vinho. Consideramos que nenhuma política agrícola deverá ignorar esta vasta camada de agricultores, sendo a partir deles e com eles que ela tem de ser construída.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É cada vez mais amplo o grupo daqueles que se apercebem de que uma política agrícola só é eficaz se partir do conhecimento profundo da agricultura a que pretende dirigir-se, do como e do porquê das técnicas utilizadas e dos produtos obtidos e se conseguir envolver interessadamente os agricultores no levantamento da situação, no diagnóstico e nas soluções preconizadas, as quais deverão ter sempre em conta a realidade e responder a problemas sentidos.
Para um país em crise geral e em crise profunda no sector agrícola, como Portugal, uma política que pretenda efectivamente atingir resultados que o lancem no caminho do desenvolvimento só o conseguirá se olhar com realismo as explorações agrícolas de que o País dispõe, considerando-as como ponto de partida e sujeito das acções a empreender; se empenhar os agricultores e suas famílias nas medidas a adoptar, através do diálogo, da participação e de respostas eficazes para os seus problemas; se dispuser de serviços que, junto e do lado dos agricultores, numa atitude pedagógica e através da sua educação permanente, os capacitem para enfrentar uma agricultura cada vez mais exigente tecnologicamente, para se organizarem e tomarem em mão uma parcela cada vez maior da comercialização dos factores de produção e dos produtos agrícolas e para participarem activamente no planeamento regional e nacional. Esta missão caberia a um verdadeiro serviço de extensão rural, cuja filosofia de actuação deveria ser, precisamente, a anteriormente exposta; se puder contar com uma investigação agrária que saiba debruçar-se sobre os problemas reais sentidos, que lhes sejam transmitidos pela extensão rural, cujas soluções se adaptem às situações reais das explorações e dos agricultores e contribuam para a melhoria do bem-estar destes e do abastecimento do País; se dispuser de organismos que planeiem a produção e organizem a distribuição e comercialização dos factores de produção e dos produtos agrícolas que, actuando supletivamente às organizações associativas dos agricultores, tomem iniciativas a nível nacional e regional, como seja a criação e valorização de infra-estruturas; organismos que estabeleçam formas de cooperação internacional de que resultem acordos comerciais de longa duração com outros Estados cujas economias possuam traços de complementaridade com a portuguesa, permitindo assim o lançamento com segurança de produções para o mercado externo; se dispuser de organismos de crédito e seguros que coloquem os interesses dos agricultores e da comunidade acima dos seus e saibam e queiram adaptar o crédito às características das explorações e dos agricultores.
É, pois, neste quadro que se inscreve a medida proposta pelo MDP/CDE de criação do crédito em espécie à agricultura, que esperamos venha a merecer

a aprovação dos Srs. Deputados, uma vez que é unanimemente reconhecido que esta se encontra descapitalizada, factor que em larga medida a afecta, contribuindo para o seu baixo nível de produtividade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O crédito agrícola não é utilizado pela maioria dos agricultores portugueses, beneficiando sistematicamente um pequeno estrato de empresários já familiarizados com a monetarização da economia e com o relacionamento com as entidades de crédito. Esta afirmação pode ser demonstrada através de números do IFADAP, que indicam ter sido concedido, durante os anos de 1980 a Abril de 1983, crédito de investimento com bonificação a 8819 agricultores, no montante de cerca de 8 milhões de contos e que, no mesmo período, foi concedido crédito de curto prazo (de campanha) a 104 547 agricultores no valor de 65 milhões de contos.
No primeiro caso verifica-se que, em 3 anos, dos cerca de 800 000 agricultores - segundo o inquérito agrícola do INE de 1968 - só cerca de 1 % beneficiaram de crédito de investimento e, no segundo caso, no mesmo período de tempo, só 13 % utilizaram crédito de campanha. É evidente que estas percentagens baixam ainda significativamente se as considerarmos ano a ano. Por exemplo, tomando o ano de 1982, o mais favorável, teremos as percentagens de 0,4 % e 4 %, respectivamente para os créditos de investimento e de campanha, devendo ainda ser tomado em atenção que muitos dos utilizadores recorreram ao crédito de campanha todos os anos.
Uma análise da distribuição regional do crédito de campanha vem reforçar a nossa afirmação sobre a qualidade dos beneficiários do crédito. Assim, verifica-se que, naquele mesmo período de tempo, 48,6 %
daquele crédito foi para a Região do Ribatejo e Oeste, cabendo ao sector pecuário desta região 38,6 % do seu montante. Destes dados e do reconhecimento pelo próprio Ministério de que a maior parte do crédito agrícola tinha ido parar ao Ribatejo e Oeste e à pecuária sem terra - normalmente aviários e criação de porcos -, fácil se torna deduzir que os beneficiários deste crédito nada têm em comum com a esmagadora maioria dos agricultores portugueses, que não possuem o à-vontade e a facilidade de acesso às entidades creditícias nem a elas são bem-vindos.
Mais uma constatação deste facto se tira da análise do crédito bancário utilizado nos primeiros 9 meses de 1979 na Região de Entre Douro e Minho que apresenta a seguinte distribuição percentual: cooperativas 31,9 %; produtores individuais 22,7 %, e sociedades não cooperativas 45,4 %.
Para compreendermos o porquê do afastamento da esmagadora maioria dos agricultores portugueses do crédito, devemos procurar as causas nas características do próprio crédito, na vocação - ou melhor, falta de vocação - das entidades creditícias para este tipo de crédito e de clientes e, finalmente, nas características das próprias explorações e dos agricultores que nelas trabalham.
Fixemo-nos neste último grupo de razões e procuremos caracterizar as nossas explorações agrícolas, seguindo dados do INE relativos ao inquérito de 1968:

77,7 % das explorações agrícolas tinham área inferior a 4 ha, existindo 8 distritos em que aquela percentagem oscilava entre 81,5 % e 92,8 % e com uma área média de 2,20 ha.

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Perante estes dados impõe-se uma pergunta: são explorações deste nível de áreas os clientes preferenciais das nossas instituições de crédito, tradicionalmente viradas e motivadas para projectos com elevados montantes de investimento e seguras garantias hipotecárias?

Srs. Deputados, cerca de 36 % das explorações agrícolas do continente são explorações sob a forma de arrendamento, parceria ou formas mistas. Nova pergunta retorna imprescindível: estão estes agricultores em condições de recorrer às actuais modalidades de crédito, face à instabilidade que lhes é criada por uma lei do arrendamento pouco favorável e, mesmo assim, raras vezes cumprida?
Cerca de 84,9 % das explorações agrícolas são do tipo familiar, coincidindo também com este grupo as de menores dimensões e as de arrendamento, parceria ou mistas.

Sabendo-se que as explorações agrícolas familiares têm uma lógica própria de funcionamento, onde se terá que considerar o binómio família-exploração, no qual as receitas originadas na exploração constituem um rendimento indivisível; sabendo-se também que, numa situação de baixos rendimentos, existe no seio do binómio família-exploração uma forte competitividade entre as despesas necessárias à família e os gastos com o processo produtivo na exploração agrícola e que poderá afectar este em maior ou menor grau; podemos concluir aqui também pela necessidade de um crédito com características adequadas a estas explorações.

Verifica-se que 45 % dos agricultores têm mais de 55 anos de idade, sendo de 69 % aquela percentagem se considerarmos a idade acima dos 45 anos.
Obviamente que agricultores envelhecidos, sem filhos interessados em sucederem-lhes na direcção das explorações, com economias débeis, não têm apetência por crédito de médio e longo prazo, caro e burocratizado, que lhes cria pesados compromissos.
No que respeita ao grau de instrução, 44,7 % dos agricultores não sabiam ler nem escrever; 55,3
sabiam ler e escrever e 0,7 % tinham curso secundário.
Agricultores iletrados ou pouco letrados não são atraídos por formas de crédito envolvendo muita papelada, muitas contas e contactos com pessoas e ambientes a que estão pouco ou nada habituados, como são as agências bancárias.
Acrescentamos a esta caracterização e constatação de que são precisamente estas explorações com maior representatividade as que mais contribuem para o produto agrícola bruto (PAB) - 63,4 % do PAB eram devidos às explorações agrícolas com menos de 20 ha - e que são também estas as que melhor respondem aos incentivos, quando adequados às suas estruturas e às características sócio-culturais dos agricultores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo em atenção o que atrás dissemos e:

Considerando que os actuais sistemas de crédito não atingem a maioria das nossas explorações agrícolas, nomeadamente as pequenas e médias, ou seja, as mais representativas;
Considerando que são as pequenas e médias explorações as que mais contribuem para o pro-

duto agrícola bruto, dado o seu maior nível de intensificação;
Considerando que num processo de intensificação a partir de baixos níveis de produtividade, que é o nosso caso, são as tecnologias biológicas as que se revelam menos caras, com maior impacte no aumento da produtividade e mais adequadas ao nosso contexto estrutural e sócio-cultural;
Considerando que é o crédito de curto prazo (campanha) em espécie, sob a forma de fertilizantes e correctivos dos solos, sementes e propágulos, rações, animais, etc., o que se apresenta mais adequado a fomentar a utilização das tecnologias biológicas;
Considerando que, se for aliada ao fornecimento do crédito em espécie a preocupação da adequação a cada caso dos materiais distribuídos, conseguir-se-á não só beneficiar com o crédito uma mais vasta faixa de agricultores, como também melhorar a tecnologia por estes empregue nas suas explorações agrícolas;
Considerando ainda que, aliados ao acanhamento e incapacidade cultural dos agricultores para abordar os estabelecimentos de crédito e cumprir os trâmites burocráticos exigidos, existem ainda no meio rural preconceitos face ao pedido de dinheiro emprestado (endividamento), que é considerado desprestigiante e como tal a evitar, o que não acontece se esse empréstimo tiver a forma de um adiantamento em espécie a pagar quando das colheitas - é o tradicional gastar fiado:

podemos concluir que, se quisermos aumentar a produção agrícola de que necessitamos urgente e desesperadamente, temos que criar condições de produção à maioria dos nossos agricultores.
Uma dessas condições é a existência de um crédito adequado às suas características, as quais apontam para um crédito do tipo campanha e a fornecer em espécie de acordo com a nossa proposta legislativa, que se consubstancia no projecto de lei n.º 261/III, cujos objectivos o meu colega de bancada Raul de Castro continuará a explicar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Soares Cruz, António Costa, Lopes Cardoso, Gaspar Pacheco, Bento Gonçalves, Cunha e Sá e Vasco Miguel.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Dá-me licença Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, acontece que está inscrito em seguida o Sr. Deputado Raúl de Castro para prosseguir a minha explanação inicial até esgotar os 30 minutos a que temos direito. Creio, assim, que os pedidos de esclarecimento poderiam ser feitos após essa explicação do Sr. Deputado Raúl de Castro ainda acerca do nosso projecto de lei.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª tem realmente 30 minutos para proceder à apresentação do projecto de lei, período este que não foi esgotado, e segundo o consenso estabelecido esse tempo seria dividido por V. Ex.ª e pelo Sr. Deputado Raúl de Castro.
Se os Srs. Deputados não vêem qualquer inconveniente quanto a este procedimento, os pedidos de esclarecimento seriam feitos depois de o Sr. Deputado Raúl de Castro completar a apresentação do projecto de lei em discussão.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, pretendia que me informasse qual é a minha posição na ordem das inscrições.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vilhena de Carvalho é o primeiro que figura na ordem das inscrições, após a apresentação do projecto de lei.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Bom, Sr. Presidente, penso que efectivamente o projecto de lei já foi apresentado.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, acontece que fui informado pela Mesa de que, por consenso estabelecido, a apresentação deste projecto de lei seria feita por dois Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do MDP/CDE, respectivamente o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca e o Sr. Deputado Raúl de Castro.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Perguntaria então ao Sr. Presidente: entre quem foi estabelecido esse consenso?

O Sr. Presidente: - Bom, Sr. Deputado, segundo me informa o Sr. Secretário da Mesa, foi uma solicitação feita ao Sr. Presidente, a que ele teria acedido.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Então, trata-se de uma cedência do Sr. Presidente, e não de um consenso; pelo menos o consenso não foi obtido junto de quem - segundo me parece - o poderia dar, visto que se trata claramente de alterar uma norma regimental.

1
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem toda a razão quanto à palavra usada, tratou-se talvez de um equívoco da minha parte, uma vez que, segundo o esclarecimento que agora me prestaram, teria sido uma cedência do Sr. Presidente.
Não queria, no entanto, fazer juízos acerca desta cedência, no sentido de saber se ela foi ou não feita segundo a norma regimental, mas presumo que se trata de um incidente que não terá importância de maior.

Por isso, se o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho não se opuser, prosseguiríamos concedendo a palavra ao Sr. Deputado Raúl de Castro, a fim de não perdermos mais tempo, e depois os Srs. Deputados teriam então oportunidade de fazer os pedidos de esclarecimento que entendessem, a que se seguiria a intervenção do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Castro.

O Sr. Raúl de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o número das pequenas explorações agrícolas, segundo as estatísticas oficiais, é de cerca de 80 % do total, desempenhando um papel bastante expressivo na formação do produto agrícola bruto (PAB). Por outro lado, o tipo de culturas realizado nessas explorações tem actualmente, e por um período mais ou menos longo, um significado importante não só para a economia agrícola nacional como também para a satisfação das necessidades alimentares da população.
Com efeito, essas explorações produzem fundamentalmente batata, leite, legumes, fruta e ainda azeite e vinho, cuja produção em globo corresponde a 100 %
(ou mais) do PAB. Esta constitui uma razão de peso para que se não deva subestimar a pequena e média produção agrícola do País. Portugal vive sob este aspecto numa posição de grande dependência em relação ao estrangeiro, com uma balança comercial de produtos agrícolas altamente deficitária, excedendo os
50 %.

aumento da produção agrícola constitui uma necessidade do País, não só por razões da economia, como da população geral. Sem excluir o papel que sobre este aspecto podem desempenhar as novas formações económicas que no sector agrícola tiveram lugar após o 25 de Abril, nomeadamente as unidades colectivas de produção (UCP) e cooperativas agrícolas (CA) da chamada zona da Reforma Agrária, como, aliás, o têm sobejamente demonstrado. Além disso, estas formações garantem o consumo dos agregados familiares e garantem-lhes o trabalho que nenhum outro sector pode assegurar no momento actual de enorme crise em que se vive.
Daí que, «consumir estrangeiro» significa saída de divisas que todos nós teremos de pagar, significa também no caso em foco um futuro sem perspectivas para milhares e milhares de produtores agrícolas, um horizonte sombrio para outras tantas famílias portuguesas. Portugal não precisa de estar em tão grande dependência em relação ao exterior.
Independentemente de um novo posicionamento na actual divisão internacional do trabalho, de que pode resultar para todos os sectores da economia, incluindo, portanto, o da agricultura, um tipo de relações comerciais reciprocamente vantajosas, Portugal tem capacidades para produzir mais e melhor no sector agrícola, nomeadamente produtos de primeira necessidade e com vantagens económico-financeiras significativas.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Carece-se apenas de vontade política para abrir a porta a quem tem ainda reais possibilidades para responder a este imperativo nacional, ou seja, à pequena e média produção. Não são muitas as exigências para a dinamização desta área social da nossa agricultura.

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O projecto de lei sobre crédito e espécie à agricultura é um instrumento que visa ultrapassar a inoperância dos sistemas de crédito agrícola em vigor, dada a sua pouca generalizada utilização. E é um instrumento de defesa da produção, e, portanto, da economia portuguesa, através do apoio, real e efectivo, aos pequenos agricultores, com explorações agrícolas até 4 ha, que representam mais de três partes do número total dos agricultores.
Assim se procura desbloquear o recurso ao crédito por parte, sobretudo, dos pequenos e médios agricultores, através de um sistema acessível e expedito, consubstanciado no presente projecto de lei.
Todavia, ao criar este novo sistema de crédito, e ao procurar ocorrer às graves dificuldades que enfrentam os pequenos agricultores, o MDP/CDE não deixou de propor, neste seu projecto de lei, medidas que assegurem não só a reposição dos empréstimos, mas que também impeçam o desvirtuamento abusivo das suas finalidades. Tal resulta, por um lado, do estabelecimento quer do prazo máximo dos empréstimos, quer do prazo de pagamento, articulado com as datas das colheitas e as características específicas de cada actividade, e, por outro lado, da intervenção dos Serviços Regionais da Agricultura do MAFA no levantamento dos factores locais relacionados com o crédito, e, finalmente, do estabelecimento de sanções para prevenir e desencorajar tentativas de recurso fraudulento ao crédito em espécie à agricultura.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os dias, nos órgãos da comunicação social, e até em muitas intervenções regionais, de tantos dos Srs. Deputados das diversas bancadas, se fala e se lamenta a grave situação da agricultura e dos agricultores no nosso País.
Entre ser apenas mais uma voz neste muro de lamentações, ou propor medidas que possam contribuir para melhorar a situação crítica da agricultura, indo ao encontro dos problemas concretos dos agricultores, o MDP/CDE optou pela segunda solução, por entender que não basta lamentar, é preciso fazer alguma coisa pelos agricultores e pela agricultura portuguesa.
Naturalmente receptivos a todas as propostas de aperfeiçoamento deste projecto de lei, desde que não ponham em causa, como é evidente, os seus objectivos fundamentais, o MDP/CDE oferece a todos os Srs. Deputados a oportunidade de demonstrarem, na prática, que não têm só palavras, mais ou menos sentidas, sobre a situação da agricultura, votando este projecto de lei, que representa uma iniciativa concreta, útil e importante em defesa dos agricultores e da agricultura no nosso país.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. 5aares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, antes de mais, queria aproveitar esta oportunidade para me inscrever para uma intervenção sobre esta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, Sr. Deputado Raul de Castro: Vou levantar alguns problemas, não fazendo questão de qual dos Srs. Deputados do MDP/CDE me vai responder, uma vez que, se bem entendi, a interven-

ção inicial foi repartida, e neste caso julgo que a interpelação tem cabimento para qualquer das duas intervenções ouvidas.
Começaria por perguntar se VV. Ex.as não acham que há uma certa similitude entre o projecto de lei que agora apresentam e o «de triste memória» Crédito Agrícola de Emergência? Não acham que ela deixou sequelas suficientemente graves, para agora - diria quase que de uma forma menos cuidada surgir - aqui um projecto de lei que contempla rigorosamente a mesma doutrina que foi seguida com o Crédito Agrícola de Emergência?
Por outro lado, os Srs. Deputados, enfim, com algum cuidado, remetem para os Serviços de Extensão Rural e para os serviços oficiais alguma forma de tutela sobre a política a seguir neste diploma. Pergunto: estão VV. Ex.as conscientes da capacidade de resposta hoje existentes nos Serviços de Extensão Rural? Sabem das dificuldades que estes serviços têm, nesta altura, em responderem minimamente que seja às exigências dos agricultores e da lavoura portuguesa?

Porque não pensarmos que os serviços, como primeiro passo a dar, possam de alguma forma elucidar os agricultores do trabalho que, no domínio do crédito, lhes pode ser prestado pelas caixas de crédito agrícola? Porque não aflorar num projecto deste teor, ainda que minimamente, o bom serviço que as caixas de crédito agrícola podem prestar - e que prestam, efectivamente - à agricultura?
Por outro lado, ao debruçarmo-nos sobre o texto apresentado, verificamos que é referido o reembolso a 80 dias. Não acham, VV. Ex.as, que esta hipótese tira sérias oportunidades de melhor preço ao agricultor, cortando-lhe a hipótese de armazenar os seus produtos à espera de melhor preço? Não será de alguma forma um condicionamento no mercado livre?
Referem os Srs. Deputados noutro passo uma penalização em relação aos fornecedores. Efectivamente, o fornecedor pode ser um elemento activo no desvio do crédito, mas será eventualmente injusto se, por acaso, ele está fora do circuito e lhe é aplicada com rigor a penalização.
Por outro lado, gostaria de saber se pensaram que um projecto deste tipo trará algum agravamento para as contas do Estado, nomeadamente ao contemplar uma bonificação. Quem vai pagar esta bonificação? Articularam, VV. Ex.as, esta hipótese com o preceito constitucional que impede a Assembleia da República de agravar as despesas do Estado?
Por fim, e muito concretamente em relação à intervenção do Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, gostaria de lhe pedir, dentro da convivência parlamentar e do que ela nos pode permitir, que repensasse uma afirmação que fez da tribuna, ao referir que «a pecuária sem terra tem muito pouco a ver com os pequenos agricultores».

V. Ex.ª terá que ter presente que uma das formas de os pequenos agricultores poderem, de alguma forma, fazer face às suas despesas, foi procurarem tornar cada vez mais rentável a pouca terra de que dispunham e, por isso mesmo, recorreram a este tipo de exploração.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Corregedor da Fonseca pretende responder já a este pedido de esclarecimento?

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O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Preferia responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Igualmente para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria também de dizer, antes de mais, que me vou referir às intervenções dos dois Srs. Deputados do MDP/CDE que apresentaram o projecto de lei.

Participo e comungo das preocupações a que o projecto agora apresentado procura responder: aumento do produto agrícola e acesso ao crédito pelos pequenos e médios agricultores.

Ficam-me, no entanto, algumas dúvidas, uma delas já exposta pelo Sr. Deputado Soares Cruz, que me antecedeu. É que, efectivamente, as instituições de crédito, grosso modo, retiram o lucro da diferença entre o preço a que pagamos capitais depositados e aquele porque os emprestam, daí que a bonificação tenha de ser suportada pelo Orçamento do Estado.
A pergunta que gostaria de fazer é, no fundo, a mesma que já foi feita pelo Sr. Deputado do CDS: como conseguem conciliar a bonificação como preceito do artigo 170.º, n.º 2, da Constituição, ou seja, com a chamada «lei travão»? Não nos podemos esquecer, Srs. Deputados, que este projecto de lei não é para entrar em vigor para o ano, mas, ao contrário, tem um prazo de 90 dias para ser regulamentado.

Uma segunda questão, que gostaria de levantar, prende-se com o facto de o projecto de lei apresentado dizer que tem em vista a adequação dos materiais a empregar e a melhoria da tecnologia. No entanto, no seu artigo 7.º, as normas técnicas indicadas - que são, aliás, as únicas referidas - afiguram-se-nos orientadas pela necessidade de determinar os limites do crédito. Estarei enganado?
Entendem, VV. Ex.as, que, sem um objectivo mais elevado, a vida dos pequenos agricultores - e refiro-me mesmo aos mais pequenos - pode melhorar pelo recurso ao crédito, quando as explorações vão desde os produtos hortícolas aos cereais, aos animais para a ajuda das fainas agrícolas e também para o equilíbrio do orçamento familiar. Consideram os Srs. Deputados que, sem crédito assistido, é possível obter resultados económica e socialmente significativos?
Sendo o crédito desburocratizado em teoria mais acessível e não existindo os objectivos nacionais justificativos que o projecto de lei apresentado indica - e que significariam, no nosso entender, selectividade do crédito e da assistência técnica - afigura-se-nos que a política agrícola e financeira do Governo pode ser substancialmente alterada, se o presente projecto vier a ser aprovado. A bancada de VV. Ex.as não pode ter essas preocupações, mas nós deste lado receamos que os objectivos do programa do Governo não sejam atingidos.
Preocupa-nos, efectivamente, que o custo das bonificações não tenha um alcance tão evidente como parece transparecer das palavras dos Srs. Deputados.
Finalmente, o recurso fraudulento ao crédito é penalmente punido e, no caso de conluio, o utilizador do crédito e o fornecedor ficam sujeitos a medidas re-

pressivas. Não ficámos a saber se VV. Ex.as prevêem a fiscalização pelos serviços competentes ou se entendem que se deve esperar por uma denúncia.
Se o objectivo for apenas a fiscalização, então afigura-se-nos que o crédito é demasiado caro. No segundo caso, receio que se possam alcançar objectivos absolutamente contrários aos propósitos que são os de desenvolver os recursos agrícolas.
Assim, eu gostaria de saber a vossa opinião, atendendo a que com certeza o crédito bonificado é efectivamente mais barato do que o depósito a prazo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também eu dirijo as minhas perguntas aos dois Srs. Deputados apresentantes.
A primeira questão que coloco é a de saber se os Srs. Deputados não entendem - e a mim isso parece-me algo evidente - que o crédito, sendo um instrumento fundamental de política agrícola, é apenas um instrumento, sendo por isso mesmo difícil esperar resultados positivos da sua aplicação se ela for desacompanhada e desintegrada de uma política global, isto é, de uma assistência capaz, de transformações estruturais que viabilizem a modernização da nossa agricultura, para citar apenas dois exemplos.
E, no fundo, não é em grande parte o facto de o crédito agrícola no nosso país ser implementado e utilizado à revelia de qualquer política agrícola global - que é coisa que este país não conhece de há muitos anos para cá! ... - que explica não só a ineficácia de todos os esquemas de crédito implementados mas até os próprios desvios na sua utilização?
Parece ser um propósito fundamental deste projecto de lei - propósito que comungo - o responder às necessidades de crédito dos pequenos agricultores. E aqui a questão que gostaria de lhes colocar é a de saber se não se justificaria nesse caso definir muito claramente o universo que tem acesso a este sistema de crédito, isto é, definir um plafond por regiões de área máxima, de dimensão máxima, de agricultor que tem acesso a esse crédito, sob pena de que também este crédito, se vier a ser aprovado, acabe por ser desviado não para os pequenos agricultores mas para a pecuária industrializada, intensiva, que tem sido uma das fontes de consumo do crédito, propiciando o desenvolvimento de uma actividade ruinosa para este país, porque tem sido feita em detrimento da exploração dos recursos naturais - é uma actividade que assenta essencialmente em recursos importados -, e até para as grandes explorações agrícolas. Portanto, consideram ou não, que seria útil introduzir uma limitação e uma definição claras do universo com acesso a este tipo de crédito?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gaspar Pacheco.

O Sr. Gaspar Pacheco (PSD): - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, ouvi com atenção a sua apresentação do projecto de lei e ficaram-me algumas dúvidas, uma das quais resultou do facto de V. Ex.ª ter dito que o crédito é burocratizado e caro. Quanto

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a ser caro, concordo plenamente com V. Ex.ª, mas já não percebo em que é que o seu projecto de lei vem desburocratizar o crédito, dado que no texto do diploma se diz que é o agricultor que tem de preencher um papel ou um impresso de que constem a sua identificação, a área agrícola da exploração e das culturas que vai fazer. Ora isso é precisamente o que se faz hoje para o crédito de campanha e nesta altura o crédito de campanha demora para o agricultor uma semana e, se for necessário, o fornecedor do MAFA é atendido no prazo aproximado de 1 mês -para os casos da suinicultura e da avicultura.
Unia outra questão surge do facto de eu não perceber como é que V. Ex.ª pretende punir o fornecedor dos produtos ao agricultor. Não vejo aqui expresso o modo de fazer essa punição. É que o fornecedor, quando entrega o produto, não sabe para que é que ele vai servir.
Uma outra pergunta que lhe quero colocar é esta: os agricultores que ainda devem ao crédito agrícola de emergência ou ao crédito de campanha também são contemplados com este crédito ou não?
Por último, como o Sr. Deputado Raul de Castro disse que só explorações até 4 ha é que eram contempladas, fiquei na dúvida se são mesmo só essas ou se são todas as explorações, e gostaria de ser esclarecido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá.

O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com atenção as intervenções dos Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e Raul de Castro e surgiram-me algumas questões. A primeira é a seguinte: sabendo-se que actualmente cerca de 30 % do crédito de campanha se destina ao financiamento das chamadas actividades de pecuária intensiva sem terra ou industrial, logo desenvolvidas fora do contexto das explorações agrícolas tradicionais, será oportuno introduzir uma nova linha de crédito num sistema que todos reconhecem carecer de urgentes e profundas remodelações, quer no chamado crédito de campanha quer no chamado crédito de investimento?
Em segundo lugar, gostaria de saber se os serviços regionais de extensão rural sediados nas zonas agrárias, que se agrupam em concelhos, estarão ou não vocacionados para as acções fiscalizadoras e burocráticas inerentes ao projecto de lei, designadamente nas alíneas c) e d) do artigo 7.º
Uma outra questão, que, aliás, já foi abordada pelo Sr. Deputado Soares Cruz, prende-se com os meios indispensáveis à implementação das actividades de apoio a cargo dos serviços regionais, a nível periférico e local, insertas no artigo 7.º do projecto de lei. Sabendo-se que uma parte substancial dos concelhos das zonas agrárias não dispõem de quaisquer meios humanos. E posso dar aqui como exemplo o caso da Beira Litoral, em que 22,8 % dos concelhos da Direcção Regional da Beira Litoral - os concelhos de Murtosa, Alvaiázere, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos, Góis, Lousã e Pampilhosa da Serra - não dispõem de qualquer funcionário. O mesmo se verifica em Entre Douro e Minho e, com maior percentagem, em Trás-os-Montes e na Beira Interior.
Por outro lado, 21 % dos concelhos da Beira Litoral - Oliveira do Bairro, São João da Madeira,

Sever do Vouga, Vale de Cambra, Ansião, Arganil, Miranda do Corvo, Pedrógão Grande, Vila Nova de Poiares, Carregal do Sal, Mortágua e São Pedro do Sul - dispõem apenas de um funcionário.
Conhecidas que são as restrições de admissão de pessoal, pergunto: com a carência dos meios humanos mencionados e a impossibilidade de novas admissões, seria exequível o projecto de lei apresentado pelo MDP/CDE?

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Ouvi com toda a atenção as intervenções produzidas pelos apresentantes do projecto. Não há dúvida - esta é uma verdade indiscutível - de que a nossa agricultura padece de enfermidades que urge curar, mas duvido que este projecto seja efectivamente um curativo, para não dizer já algo mais do que isso.
Diz-se - e disseram VV. Ex.as - que a inoperância dos actuais sistemas de crédito tem dificultado o desenvolvimento da agricultura. Neste sentido permitam-me perguntar se não entendem que é preferível, sendo tais sistemas inoperantes, rever e unificar esses sistemas de crédito e se não será mais perigoso, tornando-os até mais inoperantes, introduzir um outro sistema, que, ao fim e ao cabo, tem algo de semelhante com alguns dos existentes.
Por exemplo, fala-se - e falaram VV. Ex.as, nas intervenções de apresentação, como aliás se fala no preâmbulo do projecto ora em apreço, insistindo-se muito em percentagens, etc. - em pequenas e médias empresas agrícolas. No entanto, ao longo do articulado do projecto, não há a mínima referência a pequenas ou médias empresas agrícolas e não se fixa, ao contrário do que me pareceu depreender da intervenção do Sr. Deputado Raul Castro, qualquer limite às áreas dessas explorações. Portanto, depreende-se que se pretende consignar este crédito tanto para as pequenas e médias empresas agrícolas como para as grandes, isto é, para quaisquer empresas agrícolas. Pergunto-lhe, pois, se é esta a ideia correcta.
Finalmente, perante a alínea a) do artigo 7.º do projecto, quando se diz que compete aos serviços regionais do Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação «a elaboração de normas técnicas, para cada zona de características homogéneas, ...», permitam-me perguntar se a regulamentação da concessão deste crédito seria diversificada de zona para zona, isto é, se haveria uma regulamentação específica para cada região a cargo do Governo, e não de âmbito geral. E em que consistiriam essas normas técnicas, na medida em que se exige muito menos quando se impõe ao agricultor a elaboração do tal impresso, que aqui já foi referido?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo-os que para a discussão na generalidade deste diploma estão

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inscritos seis Srs. Deputados, a fim de produzir intervenções, e o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, para responder às perguntas formuladas.
Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, antes de mais nada gostava de saber qual o tempo de que disponho para responder às questões formuladas, uma vez que são numerosas. Creio que disponho de 3 minutos para cada questão formulada.

O Sr. Presidente: - Dispõe de 18 minutos, Sr. Deputado.

O Sr. Corregedor da (Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho algo a dizer a propósito das perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Soares Cruz, quando nos fala da similitude com o Crédito Agrícola de Emergência - e não foi apenas o Sr. Deputado Soares Cruz que levantou esse problema. É evidente, Sr. Deputado, que poderemos referir alguns aspectos do Crédito Agrícola de Emergência. Apesar de tudo o que aconteceu com este crédito, somos da opinião de que foi o que melhor funcionou dentro deste país. Como o Sr. Deputado sabe, as características iniciais do Crédito Agrícola de Emergência consistiam em ele ser um crédito de campanha, facultado em natureza através das entidades intermediárias, e ser destinado à aquisição, pelos agricultores, de factores de produção.
Assim, inicialmente, destinava-se à aquisição de fertilizantes, correctivos, pequenos equipamentos, etc. Depois, em 1975-1976, houve, através de sucessivos despachos, um alargamento e o crédito passou também a ser destinado à aquisição de animais, pagamento de combustíveis lubrificantes, pequenas reparações em máquinas agrícolas e seguros. Além disso, nessa altura, foi igualmente dada a possibilidade a entidades intermediárias de utilizarem o crédito como fundo de maneio.
A respeito ainda deste crédito, ele estendeu-se ao pagamento de salários - no VI Governo Provisório e, mais tarde, em 1977 - e criou-se a possibilidade de financiar as campanhas das cooperativas complementares de produção agrícola, etc.
É claro que nos lembramos que, como V. Ex.ª sabe, as operações efectuadas com os produtores, ao abrigo desse crédito, eram realizadas na base da confiança pessoal, sem contrapartida de garantias reais. Como sabe, um aval do Estado cobria as operações e a taxa de juro era muito baixa, constituindo uma taxa bonificada na base de um redesconto, facilitada a taxa preferencial.
É evidente que há razões para o descrédito do Crédito Agrícola de Emergência, a que V. Ex.ª fez referência. E também temos algumas razões para apontar - nomeadamente de carácter político - que não têm muito a ver com este nosso projecto: a oposição às transformações políticas saídas do 25 de Abril e a rejeição das medidas que as pudessem consolidar; a desconfiança do Norte e do Centro perante o poder central; a contradição entre a decisão de liquidar os grémios de lavoura com o revigoramento económico e funcional que o papel das entidades intermediárias

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na concessão do crédito lhes conferia; a integração nas comissões liquidatárias dos grémios de opositores a esta política ou de pessoas sem disponibilidades profissionais ou temporais; a destruição de algumas singularidades do Crédito Agrícola de Emergência, como seja o alargamento a todos os agricultores ao pagamento de salários e ao fundo de maneio de cooperativas.
E também há outras razões - estas de carácter económico - que criaram um certo descrédito e que V. Ex.ª referiu. Algumas cooperativas e ex-grémios encaminhavam os pequenos agricultores para o Crédito Agrícola de Emergência e cediam os factores de produção, a maioria das vezes sem juro, a prazo mais ou menos longo, aos maiores agricultores e - utilizando uma frase que gosto pouco de usar, mas que espelha a verdade - a certos caciques locais.
Há também um outro factor económico que criou esse descrédito: o seu alargamento às cooperativas complementares de produção, donde resultou, pelo menos em alguns casos, a duplicação do crédito aos sócios, como agricultores, e à cooperativa a que estavam associados, como unidade económica autónoma.
Finalmente, como factor económico, recorde-se também a extensão de funções creditícias a entidades não vocacionadas nem preparadas para isso, como seja o crédito em dinheiro, etc.
Quando o Sr. Deputado fala no problema da pecuária sem terra, temos alguma coisa a dizer na questão da suinicultura. Nos últimos 4 anos ficaram arruinados ou desistiram da produção os pequenos produtores e donos de pequenas pocilgas e aumentaram, sim, os grandes produtores de suínos em circuito fechado, nomeadamente em Rio Maior, Montijo, etc.

Ora, foram esses grandes suinicultores em circuito fechado que receberam a parte choruda dos créditos, os cerca de 17 % do total do crédito concedido à pecuária.

Em relação a este aspecto dos animais, costumo dizer que existem linhas de montagem em Portugal. Há, por um lado, as linhas de montagem de automóveis e, por outro lado, as linhas de montagem de frangos. Nós não comemos frangos, mas sim dólares, porque andamos a comprar as rações, porque em vez de procedermos à engorda desses animais - e o nosso projecto pode resolver isso - andamos a comprar lá fora aquilo que podemos e devemos produzir cá. Aliás, como deve saber, um projecto desta natureza pode, calma e serenamente, atingir os pequenos e médios agricultores e a esse respeito irei dar já uma resposta ao Sr. Deputado António Costa.
O Sr. Deputado Soares Cruz referiu-se também à questão da penalização aos fornecedores. Sr. Deputado, o nosso projecto aí está, e nele prevemos a punição aos fornecedores para evitar, realmente, certas fraudes. Quer-me parecer, contudo, que este projecto de lei que apresentamos é muito menos susceptível de criar situações de fraude do que outros sistemas de crédito existentes. E, quanto a isto, seria bom que verificássemos - e aqui remeto-o para as afirmações do Sr. Deputado Cunha e Sá - o que se está a passar com o crédito do IFADAP.
Pergunta também o Sr. Deputado como é que o agricultor pode depois resolver o problema. Sr. Deputado, o pequeno agricultor não armazena, pois vende imediatamente e pode ao fim de 3 meses pagar a sua

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dívida. Como sabe, o pequeno agricultor não se dedica à pecuária sem terra - isto voltando um pouco atrás.
Quanto às Caixas de Crédito Agrícola Mútuo que V. Ex.ª referiu, é evidente que nós defendemos essas caixas, mas isso não invalida a justeza da nossa posição.
Quanto à questão do agravamento das contas do Estado, tenho a impressão de que não estamos a criar essa situação, até porque há muito dinheiro parado, mal aplicado, e o actual sistema de crédito deve ser revisto.
É evidente que estou de acordo com o Sr. Deputado Cunha e Sá, quando diz que deveremos talvez alterar o sistema do crédito agrícola. Mas acontece, Sr. Deputado Cunha e Sá, que assim nunca mais lá chegaremos. 15to porque para arranjar uma lei de bases que reveja todo o sistema de crédito agrícola não é fácil. Recordo, por exemplo, que ligado ao IFADAP há qualquer coisa como quinhentos e tal despachos, decretos-leis, etc.
Quanto às bonificações não poderem entrar no Orçamento do Estado, será o Governo a definir isso na sua política de crédito. E evidente que, se este projecto for aprovado, o Governo terá a possibilidade, através de regulamentação, de contemplar essa situação, sem que entremos em briga com a Constituição.
No que diz respeito ao sistema global de crédito, e aqui respondo ao Sr. Deputado Cunha e Sá, importa saber, antes de mais nada, se este crédito vai ou não implementar a produção. Em nossa opinião, o IFADAP não satisfaz na sua plenitude os agricultores, como, aliás, já disse. O IFADAP não está, de momento, a responder às necessidades e queria recordar que são 800 000 os agricultores deste país e que apenas 1 %
utilizaram, ao longo dos últimos 3 anos, o crédito de investimento e apenas 13 % o crédito de campanha.
É verdade que, Sr. Deputado, existe o problema da falta de escoamento e existe outro tipo de problemas. Mas, quando apresentámos este projecto, também não o fizemos de forma inocente. O Sr. Deputado Raul de Castro, na sua explanação, falou já nas questões que se colocam aos pequenos agricultores. É evidente que este projecto é destinado a todos aqueles que trabalham a terra.
Acontece, contudo, que os pequenos agricultores não são muito sensíveis aos créditos bancários. Recordo, por exemplo, um encontro que houve anteontem em Santarém - o 4.º Encontro das Organizações da Lavoura e dos Agricultores do Ribatejo - onde se afirmou «que todo o crédito deve ser simples, sem grandes papeladas, embora se reconheça nalguns casos a necessidade do aval técnico, mas nunca se podendo tornar em burocracia autêntica, que leva o agricultor a desistir do crédito». E isso tem acontecido. O Sr. Deputado Soares Cruz está a sorrir-se, mas certamente já tem conhecimento disto, pois passou-se na sua terra.
Houve um Sr. Deputado que, a este propósito, levantou a questão do crédito burocratizado. Mas no nosso projecto prevê-se que o impresso seja bastante simples e que possa ser preenchido com ajuda do técnico, ao passo que para o crédito actual se exige um verdadeiro estudo económico. Mas talvez não seja de apreciarmos, agora, as dificuldades que estão a ser criadas constantemente com a atribuição do crédito do IFADAP e de outros tipos de crédito.

É evidente que os agricultores poderão recorrer a outros tipos de crédito, desde que não sejam para o mesmo fim. Se os agricultores recorrerem a este crédito em espécie não podem recorrer a outro, pois não podemos aceitar qualquer tipo de sobreposição.
Quanto a uma pergunta do Sr. Deputado Marques Mendes, não está escrito, no projecto de lei, de maneira nenhuma, que o crédito é só para explorações até 4 ha. Referi várias vezes que existem em Portugal 808 700 explorações agrícolas, das quais seiscentas e vinte e tal mil são inferiores a 4 ha. Deverá ser a nível da regulamentação que se fará essa precisão. O Governo determinará se o crédito é para áreas regadas ou se é para outro tipo de áreas, qual o plafond que pode ou não atribuir para este tipo de crédito.
O Sr. Deputado António Costa diz que, se este projecto de lei for aplicado, vamos pagar um preço muito mais elevado. Não é essa a nossa opinião. É claro que, se houver um crédito em espécie à agricultura, isto é, se este projecto for aprovado, e em que o agricultor não tenha de utilizar aquela burocracia hoje existente para recorrer ao crédito, o agricultor preencherá uma ficha simples, que ficará nos serviços do Ministério, o que também facilitará o cadastro do País neste campo, que estará também, com certeza, por fazer.
É claro que os agricultores, utilizando o crédito, vão proporcionar uma maior e mais rápida produção neste país, impedindo importações de certos produtos e bens alimentares que são uma verdadeira sangria das nossas divisas. Por exemplo, no que respeita à importação de produtos alimentares, em 1977 importaram-se 33 milhões de contos; em 1980, 60 milhões de contos; em 1981, 81 milhões de contos; em 1982, cerca de 100 milhões de contos, e até Setembro de 1983 as importações ultrapassaram 83 milhões de contos. Ora, se este ritmo se mantiver, em fins de Dezembro atingiremos qualquer coisa como 110 milhões de contos em importações. E isto tudo em termos de divisas.
Em relação à nossa dependência externa em alguns bens alimentares essenciais, devo dizer que em 1982 a percentagem era de 100 % para o açúcar, 90 % para as oleaginosas e 74% para os cereais. Em 1970, o défice da balança comercial agrícola era de 580 000 contos, em 1977, 7 anos depois, passou para 21 milhões de contos, ou seja, 35 vezes mais, e em 1980 era de 52 milhões de contos, isto é, 90 vezes mais. É claro que créditos que facilitem o trabalho das pequenas explorações agrícolas e dos pequenos agricultores poderão, em certa medida, vir a minorar esta dependência externa que nós temos perante o estrangeiro.
O Sr. Deputado António Costa também perguntou se os pequenos agricultores podem melhorar o recurso ao crédito e fez outro tipo de considerações relacionadas com as dificuldades no orçamento familiar. A este respeito, Sr. Deputado, poderia remetê-lo para um estudo, recentemente feito pela Fundação Gulbenkian, que mostra como foi o aproveitamento verificado entre Douro e Minho, em que, depois de ter sido aplicada uma política realista, temos a duplicação do leite em Trás-os-Montes.
Quando o Sr. Deputado se refere ao recurso fraudulento ao crédito, devo dizer que isso é um problema de regulamentação. Contudo, quando nos dizem que não há técnicos capazes de vigiar este projecto de lei,

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quero relembrar muito rapidamente que há técnicos e há muito pessoal ligado ao Ministério da Agricultura que está completamente parado. E cito alguns exemplos: desde a criação do Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas pelo então Ministro Basílio Horta que se encontram direcções-gerais e institutos sem leis orgânicas - nomeadamente o Instituto Nacional de investigação Agronómica, Extensão Rural, a Direcção-Geral de Agricultura e a Direcção-Geral de Protecção de Produção Agrícola - e agora, desde a vigência do actual Governo, foi criado o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, que também se encontra sem lei orgânica.

Por outro lado, o Governo, que, a nível do Ministério da Agricultura, possui órgãos próprios para a concertação e diálogo entre o sector público e os interesses económicos e sociais no domínio da agricultura - que são o Conselho Nacional da Agricultura e os conselhos regionais de agricultura, onde estão representadas várias organizações de âmbito nacional, congregando os interesses patronais sindicais -, prefere passar esta tarefa à Associação Dinamizadora de Regionalização de Agricultura. Portanto, quer-nos parecer que o Ministério terá toda a conveniência em proceder à sua reorganização porque depois se tornará fácil estabelecer uma fiscalização sobre este projecto de lei.

O Sr. Deputado Lopes Cardoso referiu a necessidade de transformações globais e pergunta se, no fundo, no nosso país o crédito agrícola não é implementado à revelia, o que explica a ineficácia dos créditos. A este propósito, devo dizer-lhe que no nosso projecto de lei falamos na necessidade de uma política global - até já estou inscrito para produzir uma segunda intervenção onde irei intervir nesse sentido.
Quando o Sr. Deputado pergunta se não seria preferível definir o universo desse sistema de crédito, o plafond por regiões, a área máxima, etc., devo dizer-lhe que já demos uma resposta sucinta quanto a esse aspecto e até temos um novo texto para lermos sobre esse tema.
Sr. Deputado Gaspar Martins, quanto ao crédito burocratizado e quanto aos 4 ha, já respondi.
Em relação à pergunta formulada pelo Sr. Deputado Cunha e Sá, creio que ele pretende indicar-nos que, se houvesse uma alteração das linhas de crédito e uma reestruturação global, poderíamos aproveitar essa reestruturação e impedir o nascimento de mais uma linha de crédito como esta. No entanto, não é bem essa a nossa opinião, Sr. Deputado. Estamos de acordo em que se reestruture todo esse sistema de crédito, mas isso levará muito tempo, talvez anos, e a verdade é que a nossa agricultura e, nomeadamente, os pequenos exploradores da terra não podem estar tanto tempo à espera.
Quando pergunta se os serviços de extensão rural estarão ou não vocacionados para a fiscalização, remeto-o para a necessidade de o Ministério da Agricultura Florestas e Alimentação ,proceder à revisão das suas leis orgânicas e pôr a funcionar todas as suas direcções, porque dentro do Ministério há muita gente que está parada, sem saber o que fazer.
De momento não vou acrescentar mais nada, creio que respondi sucintamente a todas as questões que me foram colocadas e mais tarde produziremos outras intervenções onde explicaremos mais claramente as nossas posições sobre a defesa deste projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, devo estranhar de algum modo a boa vontade manifestada no que diz respeito à intervenção que prometeu, porque dispomos apenas de 10 minutos até à hora regimental de encerrarmos os nossos trabalhos.
A verdade é que estão ainda inscritos seis Srs. Deputados para produzirem intervenções, presumo que o Sr. Deputado Marques Mendes ainda pretende usar da palavra para um protesto e, entretanto, estamos confrontados com a situação de chegarmos às 20 horas e a discussão ter de terminar.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, quando forem 20 horas pediremos o prolongamento da sessão, tanto mais que ela recomeçou, após o intervalo, quase 1 hora mais tarde e nós ainda temos intervenções para produzir sobre este projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Então, nesse caso, vou dar agora a palavra ao Sr. Deputado Marques Mendes, para um protesto.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, não vou protestar pelo facto de algumas das perguntas que lhe foram colocadas ficarem sem resposta, pois está no critério de V. Ex.ª responder ou não.
Também não vou discutir os números que V. Ex.ª apresentou quanto a montantes em contos sobre os custos das importações, sobre os défices, etc. No entanto - e esse é o meu protesto -, gostaria que, em vez de se falar em escudos, se falasse em quantidades importadas, que se dissesse se elas aumentaram ou não e, tendo em conta que essas importações são normalmente pagas em dólares, gostaria de saber se a subida do dólar não teve influência.
15so é que era importante, porque pôr o problema só em escudos ou couves - como se queira - será um pouco vago para ficarmos devidamente esclarecidos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Marques Mendes, se porventura deixei escapar algumas respostas - por exemplo, ao Sr. Deputado Lopes Cardoso não respondi, e penso fazê-lo na minha próxima intervenção - não foi, evidentemente, de propósito. Se ao longo do projecto não referi outros aspectos, foi porque já expliquei o sentido do nosso projecto.
Quando falo em rever e verificar o sistema de crédito, já expliquei também claramente a nossa posição sobre o assunto.
Quanto ao problema dos números, Sr. Deputado, não vimos aqui trazer números vagos e que não estejam fundamentados. Os números que apontei estão no Plano de Mudança da Agricultura, no anteprojecto do Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas de Junho do ano passado. Temos também outro tipo de informações que podemos dar ao Sr. Deputado, se tiver a paciência de nos ouvir.
É evidente que, em termos de valores, informamos qual a espiral em milhões de contos de alimentos

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que estamos a importar e que em 10 anos é qualquer coisa como 90 vezes mais e temos também aqui alguns quadros devidamente fundamentados - estão no Insti- tuto Nacional de Estatística e nos boletins mensais do comércio externo -, quer em animais vivos, quer em carne, em leite e lacticínios, quer em produtos hortícolas, cereais, sementes, açúcares e oleaginosas. Possuímos ainda números muito claros, que será fastidioso referir agora, referentes aos anos entre 1980 e 1983 - e é caso raro termos um órgão do Estado capaz de nos dar números sobre 1983 -, mas vou mandar imediatamente fazer fotocópias, que o Sr. Deputado, senão se importa, poderá consultar e a partir desse momento, se pretender novo esclarecimento, estou à sua disposição.

O Sr. Presidente: - Teria agora a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, mas, entretanto, temos apenas 8 minutos até à hora regimental. Se não virem inconveniente, ponho à consideração da Assembleia um requerimento, subscrito por vários Srs. Deputados, que pede o prolongamento nos termos que vou referir. Se, porventura, o requerimento for votado favoravelmente, darei então a palavra ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, que poderá dispor do tempo conveniente para a sua intervenção.
O requerimento apresentado à Mesa é do seguinte teor:
Ao abrigo das disposições regimentais, os deputados abaixo assinados requerem o prolongamento da reunião para prosseguimento do debate, com intervenção de todos os grupos e agrupamentos que o queiram fazer até à realização da votação do projecto de lei em discussão.

Se não há inscrições, vamos votar.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, é para dar um esclarecimento à Câmara. Concordo que a parte do período da ordem do dia começou com atraso e não nos repugna aceder a um prolongamento dos trabalhos, mas acontece que temos uma reunião marcada do grupo parlamentar e não podemos aceitar o prolongamento para além das 20 horas e 30 minutos.
Se o requerimento se circunscrever até esse limite, daremos o nosso voto favorável; se for sem limite, lamentamos, mas não podemos votar favoravelmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, igualmente para se pronunciar sobre este requerimento, o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Munes (PS): - Sr. Presidente, ouvimos o que foi dito pelo PSD, estamos colocados, na Assembleia, perante um dado de facto, porque se o PSD tem uma reunião do seu grupo parlamentar não pode estar vinculado a estar presente mais do que o tempo que ficou definido.
Neste caso votaremos com o PSD, porque não faria sentido fazer uma reunião sem um grupo parlamentar.
Aceitamos pois, e só, o prolongamento até às 20 horas e 30 minutos.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, dá-me licença? É para interpelar a Mesa no sentido de sermos informados sobre quais os grupos e agrupamentos parlamentares que ainda não intervieram. Quanto a nós, prescindimos da nossa segunda intervenção.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, ainda não houve qualquer intervenção por parte dos grupos ou agrupamentos parlamentares, salvo a do MDP/CDE.
Estão ainda inscritos os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho, Rogério de Brito, João Almeida Eliseu, Corregedor da Fonseca, Bento Gonçalves e Lopes Cruz.

A Oradora: - Sendo assim há que pôr o problema em reunião de líderes, visto o PSD não poder votar a favor do requerimento.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr.ª Deputada, mas não ouvi a última parte do que V. Ex.ª disse.

A Oradora:- Desde que o PSD não pode prolongar a reunião para além das 20 horas e 30 minutos, parece-nos mais correcto retirar o requerimento e recorrer depois a novo agendamento, através da conferencia de líderes. É que não gostaríamos de pedir a votação sem que os grupos e agrupamentos se pronunciassem acerca de um projecto de tão grande importância.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada entende, portanto, que deve ser retirado o requerimento?

A Oradora: - Pela nossa parte achamos correcto que assim seja, desde que nos seja permitido o agendamento numa nova ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, eu não posso prometer isso, porque depende exclusivamente da manifestação que se venha a apurar, depois, na reunião de líderes. Não me posso comprometer no resultado dessa reunião.
V. Ex.ª terá agora que manter ou retirar o documento.

A Oradora: - Com certeza, Sr. Presidente.
De qualquer maneira, como V. Ex.ª pode comprovar, o requerimento não foi subscrito unicamente por nós, pelo que julgo por bem que os outros partidos que o assinaram se possam pronunciar também.

O Sr. Soares Crua (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, tenho muito respeito pelos compromissos assumidos pelos grupos parlamentares com assento nesta Assembleia. No entanto, não posso deixar de lastimar que, por sistema, os assuntos respeitantes à agricultura sejam subestimados. Parece que somos um parente pobre da política portuguesa. Somos, efectivamente, quem contribui para algo de muito importante na estrutura económica do País.
Gostaria de chamar a atenção do grupo parlamentar do MDP/CDE para o facto de, ao retirar o requeri-

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mento, adiar a análise deste projecto - que no seu dizer é tão importante - para as calendas gregas, porquanto não se sabe quando teremos oportunidade de o discutir.

Nesse sentido, e apesar de não ter sido convidado para subscrever o requerimento, estou na disposição de consentir que a sessão seja prolongada até à discussão final do presente projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, parece-me que carece um pouco de sentido prolongarmos a reunião apenas por mais meia hora, uma vez que isso não permitirá, de facto, a conclusão do debate. Penso que a solução mais adequada, pela importância de que a questão se reveste, seria, no fundo, aquela que foi sugerida pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

Penso, também, que é fácil saber neste momento se há ou não consenso entre todos os grupos e agrupamentos parlamentares no sentido de que esta questão seja rapidamente agendada de novo. Pela nossa parte damos o nosso acordo a esse agendamento e pensamos que essa seria a melhor das soluções.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Srs. Deputados, nós temos de cumprir as regras, e as regras são as seguintes: ponto 1, são 20 horas - afinal eu já estou a violar as regras porque a sessão ainda não foi prolongada e se as regras fossem mesmo rígidas o Sr. Presidente interrompia-me e declarava a sessão encerrada.

O Sr. Presidente: - Não o faria, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Também contava com isso e, assim, estou a usar da palavra.

Ponto 2, o MDP/CDE pode desejar que o assunto seja votado hoje. Para isso, nós não temos dúvida nenhuma em prolongar a sessão até às 20 horas e 30 minutos, atendendo ao que foi dito pelo PSD, pois não fará sentido que uma questão destas seja votada na ausência forçada de um grupo parlamentar. Nesse sentido, e como faríamos em relação ao PSD, ao CDS, ao PCP, ou a qualquer outro grupo parlamentar aqui presente, nós não votaremos o prolongamento para além das disponibilidades desse grupo parlamentar.

A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura propõe retirar o seu requerimento. Muito bem. Nós só garantiremos que o agendamento deste assunto se fará, nos termos gerais de qualquer outro assunto, ou seja, o assunto irá a reunião dos grupos parlamentares e aí será agendado, sem preconceito negativo ou positivo, de acordo com as disponibilidades existentes. É isto, portanto, que temos a dizer sobre este assunto.

Se o MDP/CDE entender manter o seu requerimento nós votaremos contra e se o MDP/CDE entender retirar o seu requerimento este assunto será agendado na reunião dos líderes, de acordo com as disponibilidades de agendamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O PCP também subscreveu o requerimento para o prolongamento da sessão. Por uma questão de respeito mútuo e porque tem havido várias sessões anteriores a esta em que se têm prolongado os trabalhos sempre com a anuência dos diferentes grupos parlamentares, parece-me que se justificaria a boa vontade do PSD no sentido - já não digo até às 20 horas e 30 minutos - de se prolongar a sessão até às 21 horas ou 21 horas e 15 minutos, o que certamente já daria para que todos interviessem. Ainda se pode pôr a questão, no caso de haver mais do que uma intervenção por grupo parlamentar - da nossa parte não há, mas não sei se haverá da parte do PSD, porque não fixei os nomes -, da participação ficar reduzida, apenas, a uma intervenção.
Penso que até às 21 horas e 15 minutos já seria possível concluir-se o debate e a votação, o que resultaria em benefício do próprio projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Variadíssimas vezes temos dado anuência ao prolongamento da sessão, mas já não é a primeira vez que outros grupos parlamentares levantam exactamente o mesmo problema, ou seja, o de não poderem estar presentes para além das 20 horas e 30 minutos por terem reuniões dos seus grupos parlamentares. E devo recordar que o nosso grupo parlamentar reúne habitualmente à quinta-feira à noite. Simplesmente, na próxima quinta-feira temos uma interpelação que ocorrerá de manhã, à tarde e à noite e por essa razão esta reunião foi marcada na semana passada.
Acontece que com as intervenções que V. Ex.ª anunciou e os pedidos de esclarecimento que necessariamente irão surgir, não é numa hora e meia que terminaremos a sessão. Sejamos razoáveis! Salvo erro, faltam ainda 6 intervenções, que foram anunciadas, e, numa média de 10 minutos cada uma, com os pedidos de esclarecimento, estaremos aqui até cerca das 11 horas. Ora, não é lógico que se vá jantar a essa hora para depois se fazer a reunião do nosso grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Tem apalavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Era para anunciar à Câmara que retiramos o requerimento. Vamos, depois, contar com a boa vontade dos líderes parlamentares para um agendamento próximo, visto que nesta sessão nós somos extremamente prejudicados pela forma como se arrastou o período de antes da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, a princípio pensei que era essa a sua manifestação de vontade. Depois houve uma certa hesitação da minha parte, na medida em que V. Ex.ª me chamou a atenção para o facto de o requerimento não ser, exclusivamente, da responsabilidade dos deputados do MDP/CDE. Mas a posição agora assumida por V. Ex.ª leva-me a crer que os

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restantes subscritores estão de acordo com a Sr.ª Deputada. Está, portanto, retirado o requerimento.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - É só para dizer que não queremos ser mais papistas que o Papa e que damos como boa a solução encontrada. Manifestamos, no entanto, a nossa total disponibilidade para, dentro das nossas próprias limitações, no que respeita à marcação da ordem de trabalhos, na primeira oportunidade aceder ao pedido do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário da Mesa vai anunciar os diplomas que entraram na Mesa.

O Sr. Secretário da Mesa (Leonel Fadigas): - Deram entrada na Mesa os seguintes projectos de lei: n.º 285/III, apresentado pelo Sr. Deputado Manuel Gomes Sequeira, do PS, sobre a criação da freguesia de Malaquejo, no concelho de Rio Maior, que foi admitido e baixa à 10.ª Comissão, e 286/III, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre medidas de emergência para pagamento dos salários em atraso, garantia dos direitos dos trabalhadores, salvaguarda de funcionamento e recuperação das respectivas empresas, que não foi admitido.
Sobre este projecto de lei o Sr. Presidente exarou o seguinte despacho: «Por entender que este projecto de lei viola o n.º 3 do artigo 170.º da Constituição e melhor interpretação, como pode ver-se em Vital Moreira e Gomes Canotilho, na sua Constituição Anotada e, por exemplo, no Parecer n.º 16/80, de 22 de Maio, da Comissão Constitucional, e por violar também o artigo 130.º do Regimento, dou despacho de não admissão. Comunique-se ao primeiro signatário, nos termos do artigo 136.º do Regimento. Está assinado: Tito de Morais, 20 de Fevereiro de 1984.

O Sr. João Amaral (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Amaral (PCP): - É para anunciar ao Sr. Presidente e à Mesa que vamos interpor recurso do despacho de não admissão do nosso projecto de lei relativo à questão do programa de emergência para o pagamento dos salários em atraso, salvaguarda do funcionamento das empresas e defesa dos direitos dos trabalhadores. Esperamos que esse recurso, nos termos regimentais, seja brevemente discutido.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.

O Secretário da Mesa (Leonel Fadigas): - Como vinha anunciando, deram igualmente entrada na Mesa os seguintes projectos de lei: n.º 287/III, apresentado pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso e outros, da UEDS, sobre o ensino de Religião e Moral, que foi admitido e baixa à 4.ª Comissão, 288/III, apresentado pelo Sr. Deputado Soares da Cruz e outros, do CDS, sobre alterações à Lei de Bases da Reforma Agrária, que foi admitido e baixa à 6.ª Comissão, e 289/III, apresentado pelo Sr. Deputado Armando de Oliveira e outros,

do CDS, sobre electrificação agrícola, que foi admitido e baixa à 6.ª Comissão.
Deu ainda entrada na Mesa a ratificação n.º 73/III,, da iniciativa do Sr. Deputado Nogueira de Brito e outros, do CDS, sobre o Decreto-Lei n.º 29/84, de 20 de Janeiro, que introduz alterações ao Decreto-Lei n.º 260/78, de 8 de Abril, que estabelece as bases gerais das empresas públicas.

O Sr. Presidente: - A próxima reunião terá lugar às 10 horas do dia 23, com a seguinte ordem de trabalhos: interpelação ao Governo n.º 3/III, requerida pelo CDS, para abertura de um debate de política geral centrado predominantemente sobre a deterioração das condições de vida da população e o agravamento descontrolado da crise económica e social.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):

António Jorge Duarte Rebelo de Sousa. José Manuel Torres Couto. Leonel de Sousa Fadigas.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

João Domingos Abreu Salgado. Joaquim dos Santos Pereira Costa. José Ângelo Ferreira Correia. José Vargas Bulcão. Manuel António Araújo dos Santos. Manuel Filipe Correia de Jesus. Mário Martins Adegas.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral. João António Torrinhas Paulo. Manuel Correia Lopes.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique António Conceição Madureira.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Camboa. Bento Elísio de Azevedo. João Joaquim Gomes. José Carlos Pinto Basto Torres. Manuel Laranjeira Vaz. Maria Margarida Ferreira Marques. Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia. Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo. Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

João Maurício Fernandes Salgueiro. José Augusto Santos Silva Marques. Manuel da Costa Andrade.

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Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço. Joaquim Gomes dos Santos. José Manuel Antunes Mendes. Mariana Grou Lanita. Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida. João Lopes Porto. José António de Morais Sarmento Moniz. José Augusto Gama. José Vieira de Carvalho. Luís Eduardo da Silva Barbosa. Manuel António de Almeida Vasconcelos.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Declaração de voto do deputado independente António Gon-
zalez. enviada à Mesa para publicação e relativa à votação
final global dos projectos de lei n.ºs 265/III, 267/III e 273/III,
que teve lugar na sessão plenária de 14 de Fevereiro.

«Os Verdes» votaram a favor dos projectos de lei da maternidade e paternidade, da educação sexual e planeamento familiar e da interrupção voluntária da gravidez, embora conscientes das limitações impostas por razões políticas inaceitáveis.
O dia de hoje representa um importantíssimo marco na vida das mulheres portuguesas. A lei agora aprovada de legalização da interrupção voluntária da gravidez vem romper decisivamente com tabus há muito existentes. É também um importante passo para a desdramatização deste problema social, permitindo conhecer, discutir e solucionar as suas causas. Daí a importância da aprovação em simultâneo dos dois projectos que o precedem.
Nenhuma mulher será obrigada a praticar uma interrupção de gravidez, seja qual for o caso. A aceitação, ou não, de vir a ter um filho não desejado está intimamente ligada a opções de ordem filosófica, moral, religiosa e cultural.
Parece-nos uma atitude totalitária pretender coarctar a liberdade de uns em nome das convicções morais de outros.
Somos pela defesa da vida. Da vida de qualidade com um mínimo de condições.
O planeamento familiar e a educação sexual passam agora a ter consagração legal e, como a sua prática é obrigatória, todas as normas limitativas de consultas de planeamento familiar, nomeadamente aquelas que proibiam o acesso de jovens, estão revogadas.
Cabe ao Governo regulamentar agora a lei aprovada. E que o faça rapidamente, sob pena de ficar cúmplice de situações dramáticas e extremas.
O projecto da maternidade e paternidade é por sua vez uma confirmação da importância social da maternidade e um avanço significativo nas concepções acerca

I SÉRIE - NÚMERO 77

do papel do homem/pai. Este passa a ser um agente activo, quer durante o período de gravidez, quer nos momentos posteriores. É colocado ao lado da mulher, responsabilizado e incentivado no sentido de a apoiar e acompanhar durante momentos decisivos para a vida do casal, da criança e da sociedade.
A liberdade do homem não deve continuar a ser como até aqui, pela fuga às responsabilidades, pela cobardia e pela hipocrisia, lavando as mãos como Pilatos.
Resta-nos lutar para que:

Seja criado um sistema de planeamento familiar que abranja as mais vastas áreas da nossa população;
A educação sexual seja um facto;
Haja o mínimo de casos em que seja necessário recorrer a esse último recurso, que é a interrupção voluntária da gravidez.

Vamos todos lutar pelo amor e não pelo ódio.

O Deputado Independente, António Gonzalez.

Rectificações

Ao «Diário» n.º 59, de 6 de Janeiro de 1984
(intervenção da deputada do MDP/CDE Helena Cidade Moura)

Na p. 2637, col. 1.ª, 1. 27 a 30, onde se lê «A Oradora: - Não, não é a norma das sondagens, Sr. Deputado!
Retomando aquilo que estava a referir, devo dizer que espero que o Governo ... » deve ler-se «A Oradora: - Não, não é a norma das sondagens, Sr. Deputado! Poderia explicar-lhe qual é, mas não vale a pena,
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): É, talvez uma questão de educação.
A Oradora: - De qualquer maneira, Sr. Deputado, espero que o Governo ... ».

Ao «Diário» n.º 68, de 27 de Janeiro de 1984

1 - Intervenção da deputada do PS Conceição Quintas

Na p. 3024, col. 1.ª, 1. 48, onde se lê «gastos consecutivos» deve ler-se «partos consecutivos».

2-Intervenção do deputado do PSD Marques Mendes

Na p. 3061, col. 1.ª, os dois parágrafos compreendidos entre as 1. 38 e 56 (o primeiro começando por «Mas para além destas interrogações» e o segundo acabando em «passar o respectivo atestado») devem ser inseridos antes da 1. 12 da col. 2 ª, a seguir ao parágrafo que termina em «ao que cientificamente nos é apresentado».

Os Redactores: Carlos Pinto da Cruz - Cacilda Nordeste.

PREÇO DESTE NÚMERO 75$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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