O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

9 DE MARÇO DE 1984 3627

O Sr. Presidente: - Faça lavor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Luisa Cachado (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há algumas dezenas de anos afirmava Maria Lamas «As mulheres do meu País são mas milenárias de erros milenários e apesar de tudo continuam a ser as obreiras da vida.
Hoje, 1984, as palavras de Maria lamas assumem a mesma e dura verdade, a mesma e dura actualidade.
Hoje o tempo urge, é tempo de descoberta, de redescoberta de nós próprias, é tempo de procura e conquista.
Falar da mulher portuguesa é ainda aqui e agora sinónimo de discriminação, marginalização, mas é também símbolo de luta sem tréguas pela emancipação, pela igualdade e pelo pão.
A pluralidade de estatutos que a mulher assume na sociedade, independentemente da quase inexistência de estruturas sociais de apoio constitui o perfil desejado mas duramente conquistado ao longo dos tempos.
25 de Abril de 1974 foi um marco importante na vida da mulher, foi a possibilidade de inscrever em diplomas legais as razões de muitos e muitos anos de luta.
A Constituição da República Portuguesa repudia todas as discriminações sociais em função do sexo, dignificando a mulher.
A lei aprovada por esta Câmara em Fevereiro último, de exclusão da ilicitude em alguns casos de interrupção voluntária da gravidez é um exemplo da pertinência da luta das mulheres portuguesas e da necessária resposta legislativa, mesmo quando receosa.
No entanto, embora a consagração legislativa dos direitos da mulher constitua um instrumento poderoso e indesmentível a experiência diz-nos que não é ainda bastante que a lei estabeleça os direitos das mulheres na sociedade, na família e no trabalho.
Muitas vezes o que constitui um direito na realidade, um facto.
A praxe diária conta-nos da mulher que se submete ao desemprego em nome da crise, de mulher que se utiliza como objecto publicitário quase sempre degradante da sua imagem, da mulher que se reduz à fada do lar nos textos e imagens de muitos dos livros adoptados no nosso ensino, da mulher que se remunera de forma inferior pelo simples facto de o ser.
A Sr.º Ilda Figueiredo (PCP) - Muito bem!
A Oradora: - É urgente vencer tabus, preconceitos, conseguindo a concretização dos direitos que na lei já são reconhecidos.
É urgente que os conteúdos programáticos do ensino veiculem princípios de igualdade e dignidade que permitam à criança de hoje e ao homem e à mulher de amanhã uma visão verdadeira e séria do ser humano.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É urgente que a sociedade assuma como seus os problemas específicos da mulher porque ao fazê-lo reforçará a democracia, dignificará Abril.
A mulher compete ser o agente da sua própria emancipação, contra ventos e marés retrógrados e saudosistas.
Participando na construção do seu país que quer livre e democrático, ela construir-se-á mulher.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado José Luís Nunes pede a palavra para que efeito?
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Acabo de ouvir a apresentação de voto feita pela Sr" Deputada Luísa Cachado e sobre essa intervenção, em concreto, nada tenho a dizer. Quanto ao resto, porém, o mesmo não acontece. Este voto foi apresentado com assinaturas conjuntas de deputados do PCP, do PS e do PSD. Não se discutiu entre os deputados subscritores quem se encarregaria da apresentação e se esta seria efectivada, mas para um grande grupo de personagens a intervenção da Sr' Deputada Luísa Cachado tem um conjunto de afirmações extremamente controversas, não correspondendo ao conteúdo essencial das pessoas que entenderam votar esse documento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A intervenção justifica-se plenamente como intervenção do PCP e vincula apenas a Sr:' Deputada e o partido em que se encontra filiada.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do voto de saudação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados ...
O Sr. Jorge Lemos (PCP) - Na falta de elemento feminino ...
O Orador: - Tem alguma questão a colocar, Sr. Deputado? Se tem, terei muito gosto em responder-lhe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente este voto de saudação. Movem-nos, porém, razões que quase se opõem às enunciadas na apresentação feita pela Sr. Deputada do PCP.
Na realidade, não encaramos a luta em defesa do estatuto e dos direitos da mulher como uma luta classista, como projecção da luta de classes, mas sim numa outra perspectiva-a democrata cristã. Para nós, a luta pela dignificação da mulher insere-se na perspectiva global da luta pela dignificação da pessoa humana.
É nesse sentido que consideramos o voto e é nesse sentido que consideramos que a legislação recentemente aprovada nesta Assembleia sobre o aborto, e eufemisticamente chamada de interrupção voluntária da gravidez, ao atentar contra o direito à vida-primeiro direito da pessoa humana não liberta a mulher e não a dignifica, antes pelo contrário.
É, pois, este o sentido do nosso voto.