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I Série-Número 82
Sexta-feira, 9 de Março de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE MARÇO DE 1984

Presidente: Exmo. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas

Reinaldo Alberto Ramos Gomes

José Manuel Maia Nunes de Almeida

Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.

Assinalando a passagem do Dia Internacional da Mulher, proferiram declaração política os Srs. Deputados Ilda Figueiredo (PCP), Lemos Damião (PSD) e Rosa Maria Albernaz (PS), tendo os 2 primeiros respondido, respectivamente, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rocha de Almeida (PSD) e Igrejas Caeiro (PS).

Ainda a propósito da comemoração dessa data, a Sr. Deputada Luísa Cachado (PCP) apresentou um voto de saudação, também subscrito por deputados do PS e do PSD, que foi aprovado, tendo proferido declaração de voto os Srs. Deputados Nogueira da Brito (CDS) e Lemos Damião (PSD).

Foi também aprovado um voto de pesar pela morte do poeta Pedro Homem de Melo, apresentado pelo PS e pelo PSD. Usaram da palavra, em declaração de voto, os Srs. Deputados Frederico de Moura (PS), Ilda Figueiredo (PCP), Lemos Damião (PSD) e Nogueira de Brito (CDS).

O Sr. Deputado Sottomayor Cardia (PS) referiu-se a uma recente declaração proferida pelo Cardeal-Patriarca de Lisboa.

O Sr. Deputado José Vitorino (PSD) condenou acções levadas a cabo pela Marinha na Ria Formosa, no Algarve.

O Sr. Deputado Armando Oliveira (CDS) deu conta à Assembleia de uma circular confidencial do Governo que não isenta os emigrantes do pagamento «do imposto extraordinário de 2,8 %», contra a qual se insurgiu.

Ordem do dia. - Prosseguiu o debate sobre a constituição de uma comissão de inquérito à EPAC, no qual intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretario de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino), os Srs. Deputados António Taborda (MDP/CDE), Joaquim Miranda (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Rogério de Brito (PCP), Fernando Condesso (PSD), Carlos Lage (PS), Basílio Horta e Nogueira de Brito (CDS).

Aprovada que foi a realização do inquérito e a criação da respectiva comissão, foi também aprovada uma proposta de resolução relativa à constituição dessa comissão.

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
Aníbal Coelho da Costa. António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António José dos Santos Meira.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Bento Elísio de Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Luís Filipe Garcias.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.

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Fernando Henriques Lopes.
Fernando Tomás dos Santos Ferreira.
Francisco Augusto Sá Moras Rodrígues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra
João Luís Duarte Fernandes.
João Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja S. dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Bastos Torres.
José Joaquim Pita Guerreiro.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lírio.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo fito de Morais.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramo.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Goma Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Abílio Costa.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.

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António Guilherme Branco Gonzalez.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Paz Paulo Bicho.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Amando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
David José Duarte Ribeiro.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Henrique Paulo das Neves Sondo.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias M. Coutinho de Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Luis Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Helena Cidade Moura.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
António Monteiro Taborda.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.

Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

Ruben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra para declarações políticas, vai ser lido o expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente

Abaixo-assinado

De trabalhadores do Centro Regional de Segurança Social de Bragança, reclamando contra a requisição de um chefe de secção proveniente da Casa do Povo daquela localidade, por considerarem que a mesma é ilegal, visto não haver vaga correspondente e a havê-la, ter o próprio Centro candidatos aprovados em concurso há menos de 1 ano, aptos a desempenharem tal função.

Carta

De Joaquim Maria Guerreiro que, como aposentado da Guarda Nacional Republicana, solicita seja feita uma rectificação ao Estatuto Militar daquela Corporação, para que o seu artigo 36.º, que contempla os da sua situação, surta efeitos na mesma data do Estatuto e não a partir de 1987, como prevê.

Ofícios

Do Conselho de Imprensa dando conhecimento da sua posição sobre o anteprojecto da Lei de Radiodifusão, que o Ministro lhe remeteu, solicitando os comentários e as sugestões que o Conselho entendesse dever fazer-lhe.
Da Assembleia Municipal de Marco de Canaveses a enviar uma proposta sobre a regionalização das serviços de saúde e solicitando sejam consideradas as posições tomadas por aqueles órgão autárquico.
Da Coordenadora dos Gestores do Sector Empresarial do Estado a enviar as conclusões de uma reunião de gestores realizada em 21 de Fevereiro último.
Da Assembleia Municipal de Pampilhosa da Serra e da Câmara Municipal de Mira, a remeterem moções nas quais repudiam a decisão de fazer tributas em imposto profissional, complementar e fundo de desemprego o valor das senhas de presenças pagas ou atribuídas aos membros das assembleias municipais e assembleias de freguesia.
Da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional a enviar cópia de um ofício dirigido ao Sr. Ministro do Trabalho sobre "Critérios a observar pela Administração Pública no controle ao despedimento colectivo".

Telegrama

De trabalhadores da EPAC- Delegação de Bragança, que, impossibilitados de assistir ao inquérito

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parlamentar sobre a liberalização do comércio dos cereais, pedem a revogação do Decreto-Lei n.º 67/84, em defesa da economia nacional.
O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos: no dia 1 de Março de 1984, ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Gomes de Pinho, Bento de Azevedo e outros, respectivamente; à Secretaria de Estado das Florestas, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Gouveia; aos Ministérios da Indústria e Energia e do Trabalho (2), formulados pelos Srs. Deputados Antunes da Silva e Pereira Lopes; à Câmara Municipal de Vila Real, formulado pelos Srs. Deputados Daniel Bastos, Abílio Guedes e João Teixeira; aos Ministérios da Saúde e do Equipamento Social (2), formulados pelo Sr. Deputado António Costa; ao Governo e ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação (2), formulado pelo Deputado César Oliveira; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Nunes da Silva; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos.
No dia 2 de Março de 1984, ao Governo e à Secretaria de Estado das Pescas (3) formulados pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha; à Secretaria de Estado do Tesouro (2), formulados pelos Srs. Deputados Octávio Teixeira e Zita Seabra; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulados pelo Sr. Deputado César Oliveira.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, nas sessões de 16 de Setembro, 3, 5 e 13 de janeiro e na reunião da Comissão Permanente do dia 8 de Setembro; Fernando Cardoso Ferreira, na sessão de 23 de Setembro; Luís Monteiro e outros, na sessão de 24 de Outubro; Jorge Lemos e Custódio Gingão, na sessão de 3 de Novembro; José Sarmento Moniz e João Abrantes, na sessão de 17 de Novembro, respectivamente; João Almeida Eliseu, na sessão de 22 de Novembro; Pereira de Sousa, na sessão de 23 de Novembro; Hernâni Moutinho, na sessão de 24 de Novembro; Vilhena de Carvalho, Anselmo Aníbal e João Salgado, na sessão de 20 de Outubro; João Abrantes, na sessão de 12 de Janeiro.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr' Deputada lida Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por todo o País, nas fábricas e nos campos, nas escolas e nos escritórios, no trabalho ou na procura de um emprego, as mulheres vivem o dia 8 de Março de uma forma intensa no balanço da luta travada e no traçar de novos rumos a prosseguir no amanhã.
Já não é tempo de lamentações, de conformismos, de aceitação passiva das discriminações e da subalternidade. Em casa e no emprego, na vida cívica, nas actividades sindicais ou políticas, na cultura ou na arte, as mulheres lutam pelo lugar a que têm direito, pela participação activa, pela realização profissional e pessoal, como trabalhadoras, cidadãs e mães que desejam assegurar o futuro dos filhos e contribuir para a construção de unia sociedade melhor.
O Grupo Parlamentar do PCP associa-se a esta jornada do 8 de Março de balanço das vitórias conseguidas, de reflexão e análise dos obstáculos a ultrapassar e definição dos objectivos de luta futura.
A crescente participação das mulheres na luta pela democracia e pela paz, pela melhoria das condições de vida e de trabalho, contra o aumento dos preços e o desemprego, contra as discriminações de todo o tipo de que são vítimas tornou-se uma realidade nos campos e nas fábricas, nos escritórios e nas ruas.
O 25 de Abril é um marco fundamental na emancipação da mulher, um virar de página na caminhada para a igualdade na relação homem e mulher.
Desde a legislação avançada no que toca à condição feminina, da consagração dos princípios constitucionais da igualdade de direitos, da obrigação do Estado de proteger a paternidade e a maternidade, nomeadamente garantindo às mães a usa realização profissional e a sua participação na vida cívica do País, até às recentes leis aprovadas nesta Assembleia de protecção e defesa da maternidade, de planeamento familiar e educação sexual e legalização em certas condições da interrupção voluntária da gravidez foi todo um longo caminho percorrido e só possível com as inúmeras lutas empreendidas por milhares e milhares de mulheres apoiadas pelas forças progressistas na luta contra o obscurantismo, os tabus, a subalternidade e a inferiorização da mulher na sociedade.
As recentes vitórias de aprovação nesta Assembleia da República de leis progressistas, em que o PCP desempenhou um papel fundamental, sendo porta-voz das aspirações e lutas das mulheres, dão-nos a certeza de que novas vitórias vão ser possíveis.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - No entanto, muito há ainda para caminhar. E desde logo porque aos avanços no aspecto formal, no campo legislativo, não correspondem a idênticos avanços na vida, no quotidiano das mulheres.
Depois, porque a política de descalabro económico, de agravamento das condições sociais atinge duramente as mulheres. Dos mais de 500 000 desempregados seguramente cerca de 400 000 são mulheres. Em mais de 1 milhão de pessoas à procura de emprego seguramente mais de 700 000 são mulheres, ou por estarem no desemprego ou por se encontrarem com contratos a prazo e ou com salários muito baixos e sentirem insegurança no emprego,
Dos 150 000 trabalhadores com salários em atraso um grande número são mulheres. Na indústria, como na agricultura e nos serviços as quebras na produção e os cortes no investimento acompanhadas de falências e encerramento de empresas privadas, de desmantelamento de UCPs e cooperativas agrícolas e de empresas nacionalizadas conduziram a uma diminuição no emprego e a um agravamento do desemprego que atinge especialmente as mulheres, sempre as primeiras a despedir e as últimas a empregar. Porque são mães, porque têm filhos, porque são contratadas a prazo, porque o lugar da mulher é em casa junto dos tachos e das panelas, a coser meias, a cuidar dos filhos, a lavar a roupa do marido.
Em tempo de crise económica quando o objectivo da política governamental é a reconstituição dos privilégios e das fortunas de alguns, dos grupos económi-

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cos, dos monopólios, as forças da direita retomam toda a glorificação do trabalho doméstico para tentar reduzir artificialmente a taxa de desemprego, através da retirada voluntária da mulher do mercado de trabalho. Assim, o Governo não teria de se preocupar com o desemprego. Afinal as mulheres queriam regressar ao «doce lar». já nem era preciso construir creches, infantários e escolas pré-primárias, já não era necessário professores e educadores porque as mães em casa tomavam conta dos filhos.

E por muito espantoso que pareça são estes os princípios propagandeados diariamente por órgãos de comunicação social, nomeadamente pela RTP, e por governantes, nomeadamente pelo Ministro da Educação.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E uma vergonha!

A Oradora: - Só que é tempo perdido! Por todo o lado a luta das mulheres prossegue inseparável da luta dos trabalhadores e do povo, contra o desemprego, contra o agravamento do custo de vida, contra as discriminações.

Aplausos do PCP.

No entanto o agravamento do desemprego, a intensificação da repressão patronal, das discriminações salariais e da instabilidade no emprego, o atraso no pagamento de salários, estão a atingir cada vez mais mulheres que, em muitos casos são obrigadas a despedir-se por não poderem suportar os custos de transporte, da alimentação fora de casa, das amas e das creches.

E no entanto continuam à procura de um emprego porque aspiram à sua realização profissional, porque precisam de um trabalho devidamente remunerado que lhes assegure a estabilidade económica na família, porque querem participar activamente nos diferentes aspectos económicos, sociais e políticos da vida do País.

E as estatísticas e a realidade aí estão a confirmá-lo. Cerca de 40 % da população activa são mulheres, mesmo que desempregadas. Nas lutas da reforma agrária, do vestuário e têxtil, das conservas, do material eléctrico, do comércio, aí estão as mulheres a exigir emprego e garantia de trabalho e salários, a impedir o encerramento das fábricas.

Nas feiras, nas lojas e supermercados, sozinhas ou em grupo protestam contra esta política de agravamento diário dos preços, sobretudo dos bens alimentares que durante 1983 sofreram o maior aumento de sempre tendo atingido 36 % no final do ano em relação a igual período do ano anterior.

Desde o açúcar, à farinha e massas alimentícias, passando pelas batatas que chegaram a atingir 57$/kg, até aos transportes públicos, às rendas de casa, ao gás e electricidade, para não falar na carne de bovinos praticamente impedida de entrar na casa de centenas de milhares de famílias, até ao peixe, ao leite e ao pão, tudo aumenta!

Quando os salários reais baixam brutalmente, quando os preços dos bens alimentares sobem em espiral e o magro orçamento familiar é absorvido pelas despesas com alimentação, depois de acabar com a carne, de reduzir o peixe e as batatas, pouco mais resta do que o pão. Até o pão o Governo promete aumentar para

o dobro. Só num ano já aumentou 36,6 %! Agora, para aumentar os lucros das grandes empresas e dos especuladores e enquanto prossegue a fúria liberalizadora do Governo, o desmantelamento dos antigos organismos de coordenação económica e de empresas públicas, o fim do controle dos preços e dos subsídios aos bens essenciais, é anunciado o aumento do pão, para mais de 80$/kg. Mas não pode ser! O pão é a base de alimentação das famílias de menores recursos. Não pode aumentar!

Nesta situação insuportável de fome e de miséria é cada vez maior o número de mulheres nas manifestações de rua contra o aumento do custo de vida, pela defesa de um autêntico cabaz de compras.

O Sr. João Amaral (PCP):- Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quase 10 anos após Abril, neste dia 8 de Março, é necessário recordar que o princípio da igualdade de direitos consagrados na Constituição e na lei e defendida formalmente pelo Governo não pode continuar a ser diariamente posta em causa nos órgãos de comunicação social, nos manuais escolares, na prática governamental e patronal.

Se é certo que só um governo diferente, com uma política de desenvolvimento económico e social virada para a criação de empregos e satisfação das necessidades básicas da população, pode garantir a igualdade de oportunidades no acesso ao emprego, na formação profissional, na promoção e nas remunerações salariais, é necessário pôr em prática logo que promulgada a legislação recentemente aprovada na Assembleia da República. E preciso que a maternidade seja de facto protegida, que a mulher trabalhadora não continue a ser penalizada por ser mãe, que não se retirem direitos já anteriormente consagrados como é o caso do período de 2 horas por dia para aleitação (e não para amamentação como pretendem os deputados do PS/PSD com as alterações introduzidas na lei da maternidade), que não se fale de igualdade de direitos apenas quando se pretende aumentar a idade de reforma para 65 anos ou se trata do serviço militar, como faz o Governo.

E urgente que a educação sexual volte aos programas escolares de forma a garantir que a escola contribua para o desenvolvimento dos jovens e para a superação das discriminações em razão do sexo e da divisão tradicional de funções entre as mulheres e os homens.

É urgente fazer cumprir as leis aprovadas que garantem o acesso de todos ao planeamento familiar, incluindo aos jovens. E imprescindível que se concretizem as melhorias no que respeita à protecção da saúde materno-infantil e que se melhore a protecção da mulher trabalhadora, em especial da mãe trabalhadora, para garantir a sua realização profissional e assegurar o futuro dos filhos.

A garantia constitucional da paternidade maternidade e o direito à realização profissional e participação na vida cívica, social e política têm de ser asseguradas pelo Estado, nomeadamente pela aplicação imediata das leis aprovadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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A Oradora: - As recentes lutas e vitórias dão-nos a certeza, ao saudarmos as mulheres neste 8 de Março, que novas vitórias se seguirão no caminho da emancipação da mulher e na concretização das suas aspirações, anseios e direitos fundamentais.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, ouvia-a com toda a atenção, tanto mais que o meu partido e a minha bancada, por intervenção que irá fazer de seguida, quer manifestar de alguma forma o sentir que hoje a todos nos afecta no tocante à problemática da mulher em Portugal, e falo mais concretamente da mulher trabalhadora.
Ouvi na parte final da sua intervenção uma referência à aprovação que teve lugar nesta Assembleia, em comissão, de matéria referente à protecção da maternidade e paternidade. Quero dizer, só para que fique registado, que a posição do Partido Social-Democrata quanto a esse aspecto teve pura e simplesmente como base aquilo que afirmámos aos seus camaradas elementos da Comissão de Saúde, Segurança Social e Família: é que à custa de tanto querermos proteger a mulher na sua maternidade, talvez acabemos por lhe criar problemas no seu próprio emprego.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, mais do que pedir esclarecimentos, quero deixar registado que o meu partido está convicto de que da lei que saiu para protecção da maternidade e da paternidade constam medidas justas e equitativas para que a mulher trabalhadora fique com defesas suficientes para que amanhã possam vir a haver mais mulheres empregadas.
E que, muitas vezes, porque muito queremos proteger desprotegemos, e se o projecto de lei do Partido Comunista bem como aquilo que defendeu na Comissão no tocante à maternidade e à paternidade fizessem vencimento, não tenho dúvidas de que a mulher portuguesa, a mulher trabalhadora, ficaria ainda em mais grave risco de ser despedida ou, o que seria muito mais grave, acabaria por não ter possibilidade de angariar emprego.
Finalmente, apenas para ser submisso à figura regimental, pergunto-lhe se não entende que muitas das vezes, por tanto carinho e por tanto querermos defender a mulher, acabamos por não defender o essencial, que é exactamente a possibilidade de a mulher ter acesso aos locais de trabalho, e afinal acabamos por dar a possibilidade às entidades empregadoras de obstar ao seu emprego precisamente pela protecção que nós aqui, no Parlamento, lhes damos através da lei da maternidade e da paternidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, não há mais deputados inscritos para pedirem esclarecimentos, pelo que tem a palavra para responder, se desejar.
A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Rocha de Almeida, do que se trata de facto é de pôr em prática os direitos constitucionais da mulher trabalhadora, os direitos de protecção e defesa da maternidade e da paternidade. E mesmo quando aqui, na Assembleia da República, se discutiu o projecto de lei sobre a protecção e defesa da maternidade, foi disso que se falou.
Mas a questão concreta que referi foi o caso da aleitação, expressão que foi retirada. E referi-o porque se tratava de um direito que as mulheres trabalhadoras tinham visto consagrado há muito: as mães, através do Decreto-Lei n f 49 408, tinham direito a um período de 2 horas por dia durante o primeiro ano de vida do filho para aleitação. É um direito já consagrado que agora foi retirado, e foi contra isso que me insurgi. Foi substituída a expressão «aleitação» por «amamentação» e nós lamentamos e protestamos contra a retirada dos direitos da mulher, da mãe trabalhadora que essa substituição representa.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr." Deputada, tanto eu como a minha bancada conhecíamos isso, simplesmente a filosofia que presidiu a esta discussão séria sobre a protecção da maternidade vislumbrou e teve em conta esses aspectos.
Aliás, a Sr.ª Deputada também estará de acordo comigo em que são sempre os abusos que acabam por trazer situações graves como, por exemplo, a de que as 2 horas para aleitação passaram a ser 2 horas usadas consecutivamente. Foi por isso que o meu partido defendeu o direito às 2 horas mas não consecutivas. Não sei se reparou que foi essa a defesa que fizemos em Comissão.
A Oradora: - Sr. Deputado, mas a questão é só esta: é necessário fazer cumprir a legislação existente de protecção e defesa da mulher trabalhadora.
Se o Sr. Deputado estivesse um pouco atento à realidade do que se passa lá fora verificaria que hoje estão a ser postos em causa todos os direitos que a mulher trabalhadora conquistou ao longo dos tempos e mesmo aqueles que a lei consagra.
Hoje as discriminações aumentam novamente nas fábricas, nas empresas, nos escritórios. Por todo o lado a mulher volta a ser muito discriminada e é esta a situação a que é preciso pôr cobro.
Nós protestamos contra a retirada desse direito porque vem no seguimento de todo esse ataque aos direitos fundamentais da mãe trabalhadora. E por isso que nós neste dia 8 de Março exigimos que se ponha fim às discriminações e que o Governo ponha em prática tudo aquilo que aqui foi aprovado sobre a protecção e a defesa da maternidade, sobre os direitos da mulher trabalhadora consagrados constitucionalmente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputados lemos Damião.

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O Sr. Lemos Damião (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consagrado o dia 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher" não podia o Partido Social-Democrata silenciar a sua voz, dada a enorme simpatia que desfruta no seio das mulheres portuguesas, que, de uma forma clara e inequívoca, se identificam com o seu programa e com as coordenadas políticas que defende.
A testemunhá-lo está o facto de sermos o único partido político que no seu seio não faz discriminações, em matéria de sexo, quando se trata de indicar nomes para a Constituição da Comissão da Condição Feminina.
Por tal facto, eis- nos com uma representação de 5 elementos, no seio da referida Comissão, do sexo masculino, participantes, colaborantes, receptivos e sensíveis aos problemas que versam predominantemente a temática "Mulher".
Porém, não podemos desta tribuna, de uma forma peremptória, deixar de dizer que ainda hoje, volvidos vários anos depois de a Declaração Universal dos Direitos do Homem haver consignado de uma forma inequívoca a igualdade de direitos e obrigações para os homens e mulheres, não se cumprir tal desiderato.
E tudo isto também depois de a maioria dos Estados democráticos consignarem nas suas constituições igualdade entre os sexos.
Então, perguntar-se-á: será necessário consagrar um dia como o "Dia Mundial da Mulher", quando não existe um "Dia Mundial do Homem"?

Risos do PS, do PCP e da UEDS.

Não constituirá esta dicotomia a consagração de desigualdade de tratamento?
Não será esta uma primeira conclusão de que efectivamente continua a existir uma diferenciação, apesar das normas jurídicas existentes na nossa sociedade? Continuará a subsistir uma desigualdade de facto?
Seja como for, os constituintes de 1976 abriram largas perspectivas para que as mulheres portuguesas tivessem estatuto de cidadania igual ao dos homens, eliminando diversos preconceitos aberrantes, que, a pouco e pouco, o legislador ordinário, designadamente no Código Civil, proeurou contemplar.
Porém, apesar destes passos significativos, somos forçados a reconhecer que a sociedade portuguesa está ainda longe, infelizmente, de consagrar a efectiva igualdade de acordo com a natureza diversa do homem e da mulher.
E, ainda bem que se reconhece que são diferentes, para se aceitar que existem para se completarem.
Por isso aceitamos que enquanto não se der a sua emancipação total, enquanto não forem eliminadas as discriminações a que a mulher no quotidiano ainda está sujeita, devemos aceitar que se celebre o "Dia da Mulher".
Aceitamo-lo independentemente de o considerarmos obsoleto, pois, para nós, lembrarmos os seus direitos num só dia é muito pouco, quando verificamos que todos os dias lhes são exigidos cumprimentos infindáveis de obrigações.
A mulher pertence não só um dia mas todos os dias; não só um ano, mas toda a vida. A sua vida!
Falar na problemática da mulher neste dia só tem justificação numa perspectiva dinâmica, comparando o presente com o passado e apresentando todo o rol de desigualdade que continua a subsistir.
Todos sabemos que ainda não vão longe os tempos em que os manuais escolares sobrevalorizavam o homem, fazendo figuras carismáticas, como guerreiros, políticos, santos, etc., realçando a imagem masculina 4 vezes mais que a feminina.
Ainda hoje um capítulo onde se continua a demonstrar a grande adequação das imagens aos estereótipos é o das actividades humanas. As ilustrações de actividades colocam a mulher em grande desvantagem no desporto, em exclusividade nas actividades domésticas e pouco representada tio mundo do trabalho.
Também no campo dos valores que se procura inculcar através do texto o homem sai favorecido, o mesmo sucede no campo das possibilidades de realização profissional e de êxito na comunidade.
Pare, pois, poder concluir-se que, pela sua ferina e pelo seu conteúdo, os manuais transmitem estereótipos que começam por predispor a criança. nu escola, a aceitar genericamente, aquilo que são por tradição os papéis específicos dos homens e: das mulheres e a assumi-los e desenvolvê-los conforme se trate de crianças do sexo masculino ou feminino.
A escola, neste caso, em lugar de ministrar uma educação problematizadora e consciencializadora da vida da sociedade e dos seus mecanismos, transforma-se em justificadora dessa mesma realidade, corporizando e consagrando as desigualdades existentes no campo das relações homem-mulher.
Neste aspecto, creio que este tipo de problemas ainda não foi suficientemente desenvolvido, pouco abordado entre nós, quase nunca debatido nesta Câmara.
Realce-se o esforço da Comissão de Condição Feminina, que, apesar de ainda debater tais ternas numa fase embrionária, procura inverter as medidas adoptadas até agora, dando passos firmes e significativos que a curto prazo fortificarão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ano após ano tem a Assembleia da República produzido vários diplomas que têm dado total satisfação à justa luta das mulheres portuguesas.
Volvidas longas décadas de fanatismo e cegueira política, poucos terão sido os países que neste domínio tenham dado passos tão firmes e tão significativos.
Por isso permitam-me que saúde todas as mulheres portuguesas que desde a fundação constituíram a pedra basilar da nossa soberania.
Creio mesmo não exagerar se disser que se não fossem as mulheres não existiria a nossa Pátria,
É indesmentível que historicamente as grandes alterações sociais da vida portuguesa têm o cunho feminino.
Foi a Mumadona, a Maria da Fonte, a Deuladeu Martins, a Brites de Moura, a Luisa de Gusmão e tantas outras que nos domínios da bravura, da arte e das letras se tornaram imortais. velas as que eu hoje escolhi para saudar foram as simples e modestas mulheres portuguesas, que no campo, na fábrica, em casa, nas escolas, etc., etc., lutam quotidianamente para fazer face as agruras da vida e à dureza das dificuldades. Aquelas anónimas esquecidas dos jornais e das revistas que não sabem o que é qualidade de vida, justiça social, igualdade de tratamento, relacionamento democrático, etc., etc.
Aquelas analfabetas e oprimidas criaturas que continuam vítimas de um futuro que não tiveram e de um

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presente que é passado; aquelas que, compenetradas no cumprimento das suas tarefas, classificadas de rurais, sentem com agudeza o aumento do custo de vida, sem que alguém lhes inflacione os seus parcos rendimentos; aquelas que espelham o sofrimento de uma vida que não é vida, de uma habitação que não possuem, de um saneamento básico que não existe, de uma torneira que não deita água, de um interruptor que não dá luz, etc., etc., aquelas que não têm cuidados de protecção pré-natal, possibilidades de ver os seus filhos nas creches ou jardins-de-infância, em escolas condignas, em centros de animação de tempos livres, de um lar de terceira idade que as acolha; aquelas que não têm possibilidade de se reciclarem, de se profissionalizarem, de terem estabilidade de emprego, de terem o próprio emprego, de verem o seu trabalho dignificado, de falta de um ambiente cultural que as promova, etc., etc.; aquelas que, sendo viúvas e mães solteiras, não têm o mínimo indispensável para o seu sustento e o dos seus filhos; aquelas que trabalham e não recebem, que vivem á míngua dos familiares, dos amigos e da caridade; aquelas que os algozes consideram «coisa» sua, objecto de prazer; aquelas que uma sociedade corrompida explora, deflora e despreza, alimentando o submundo da droga e da prostituição; e, finalmente, aquelas que lutam pelo direito à vida, à sua autodeterminação, à sua liberdade, aquelas que lutam por viver em democracia.
Aqui, o meu pensamento vai para as mulheres timorenses em especial, e para todas aquelas de qualquer parte do mundo onde não se praticam os mais elementares direitos do homem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Olhando o mundo em relance, verifica-se que, se às mulheres portuguesas ainda falta tanto, o que se passa por esse mundo é um cataclismo.
E por isso que todos nós nos devemos empenhar em dizer ao mundo oprimido e subjugado que a luta só termina quando a conquista é certa.
Exemplo para os povos que em nós revêem a sua história terá de ser a consolidação da democracia em Portugal. Mas a democracia nas suas principais componentes: política, económica e social.
Mas será que estamos a caminhar nesse sentido quando vemos que a produtividade é menor, o desemprego alastra e o nível de vida se deteriora?
Como é possível atender a este cancro nacional se não colocarmos o homem e a mulher em pleno pé de igualdade, cooresponsabilizando-os, motivando-os para a batalha da produção.
E no campo da economia doméstica que faz o todo da economia nacional?
Quem amealha, quem poupa, quem economiza?
Será que ainda não nos apercebemos do valor e da força da mulher?
Sem que pretenda medir forças fazemos votos para que, no futuro, as mulheres sejam cada vez mais iguais e mais fortes.
Por certo, se assim for, o mundo será melhor.
Aplausos do PSD, da ASDI e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Igreja Caeiro.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Deputado Lemos Damião, gostava de saber qual é o preciso significado da afirmação que produziu de que o seu «partido é o único que não faz discriminação de sexos».
Por outro lado, está V. Ex.ª realmente determinado em elaborar um projecto de lei no sentido de se criar o «Dia Nacional do Homem» como primeiro passo para a universalidade do «Dia Mundial do Homem»?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Deputado Igrejas Caeiro, não tive por objectivo principal sobrevalorizar o meu partido.
Nós, e V. Ex.ª tal como eu, estamos num governo de coligação e portanto estamos com o estatuto de igualdade plena.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Deputado, quer então dizer com isso que nos dá também a nós a possibilidade de não fazermos discriminação?
O Orador: - Claro, Sr. Deputado.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Então já somos dois!
O Orador: - Não há discriminação, Sr. Deputado, e eu vou demonstrar porquê.
Fiz apenas esta alusão e V. Ex.ª poderá reler o meu texto- única e exclusivamente para dizer que o Partido Social-Democrata, tendo na sua bancada deputados e deputadas, homens e mulheres, optou por indicar como membros da Comissão da Condição Feminina 5 homens, dando a esta Comissão um tratamento especial para que de uma vez por todas ela fosse o espelho vivo de que o desigual tratamento entre homens e mulheres tinha sido banido da sociedade portuguesa.
E que nós tínhamos a possibilidade de indicar mulheres e indicámos homens, e eu achei por bem realçar esse facto.
Portanto, não tive outros objectivos.
Quanto a propor-me um «Dia Mundial do Homem», Sr. Deputado Igrejas Caeiro, enquanto houver o «Dia Mundial da Mulher», pelos mesmos motivos não me repugna nada que haja o «Dia Mundial do Homem», isto se V. Ex.ª estiver disposto a comigo subscrever esse texto que podemos aqui apresentar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Comigo não, Sr. Deputado, mas com uma mulher que é para, realmente, o pedido ser feito em nome do mundo.
Risos.
O Orador: - Não vemos dificuldade nenhuma nisso, Sr. Deputado.
No entanto, V. Ex.ª sabe que o objectivo da minha intervenção neste dia, que é de facto um dia sério, é o de, como V. Ex.ª, manifestar um carinho especial pelas mulheres portuguesas, particularmente por aque-

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Ias que ainda hoje clamam pela autodeterminação da sua pátria e refiro-me às mulheres timorenses, que hoje não têm sequer o direito a ser consideradas mulheres, aquelas mulheres a quem roubam da sua própria barriga os próprios filhos.

Aplausos do PSD e do PS.

E a essas mulheres que eu, com um sentimento profundo, quero aqui testemunhar o meu apreço.

Digo-lhe até, Sr. Deputado, que nos fica muito bem fazermos mea culpa e dizermos que efectivamente não temos feito o que está ao nosso alcance para podermos dizer ao mundo que é uma aberração aquilo que se pratica em Timor-Leste. Aliás, creio bem que esta Assembleia da República se tem demitido das suas responsabilidades na medida em que a 5 de Janeiro deste ano tomou posse a Comissão Eventual para Apreciação da Situação em Timor-Leste e até hoje, volvidos mais de 2 meses, ela ainda nem sequer reuniu.

já agora faço aqui um apelo ao Sr. Presidente da Assembleia da República que accione os mecanismos necessários para que a Comissão que referi comece a reunir a partir da próxima 4.ª feira.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra a Sr' Deputada Rosa Maria Albernaz.

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Celebrar um Dia Internacional da Mulher continuará a ser por quanto ainda? Uma necessidade. Significa, portanto, que a sua plena emancipação face ao homem não está ainda alcançada. O «Dia Internacional da Mulher» comporta, assim, a memória da sua luta emancipadora e proporciona um momento de reflexão aos homens e às mulheres sobre o caminho a percorrer.

Não é por acaso que os marcos históricos da libertação da mulher se situam no século XIX. Só à medida que a burguesia foi assumindo o seu estatuto de classe social dominante é que os princípios de igualdade, liberdade e fraternidade se foram interiorizando na consciência das pessoas. Enquanto a fruição de privilégios por uma maioria era aceite como normal, cabendo às elites de sangue a supremacia sobre as maiorias, o domínio do homem sobre a mulher, longe de ser contestado, era acolhido quase como pertencendo ao direito natural. Mas a libertação da mulher face ao homem, proclamada teoricamente com os princípios da grande revolução burguesa - a Revolução Francesa, traça o próprio caminho a partir do século XIX.

Não é tão pouco por acaso que é desse mesmo século XIX a greve de Chicago, como alto momento histórico que projectou no tempo a luta da mulher pela igualdade de direitos. Era o dia 8 de Março de 18517, como todos sabemos. Mulheres, vítimas da mesma situação de opressão e de desigualdade, revoltam-se contra a tirania na justa reivindicação dos seus direitos. Foram esmagadas, mas o seu grito e o seu sangue semearam a coragem e a solidariedade em milhares de outras mulheres contemporâneas e de gerações vindouras.

A primeira luta colectiva da história das mulheres vinha assim das mulheres operárias. Foram as trabalhadoras das fábricas que pelas próprias condições e
situação de trabalho, experimentavam a força da sua união. Não admira, por isso, que tenha sido acentuado, com resquícios ainda vigentes, o carácter obreirista da luta feminina. Mas, nesse momento histórico que hoje evocamos, as mulheres de Chicago não tinham razões de luta qualitativamente diferentes das dos homens.

Apenas o grau de injustiça era maior. Não caindo, pois, num certo «obreirismo» outrora triunfante, importa acentuar que foi no trabalho e pelo trabalho que a mulher acordou para a sua própria libertação. Foi em luta por iguais salários, pela redução do horário de trabalho e pelo acesso a todos os escalões de promoção laboral e social, que as mulheres de Chicago iniciaram a difícil caminhada para a liberdade.

Longo foi, entretanto, o caminho percorrido, não apenas pelas mulheres das fábricas mas ainda pelas camponesas, pelas donas de casa, pelas administrativas, pelas intelectuais, por todas as mulheres. Se, antes, as situações de opressão se revelam mais sensíveis nas relações de trabalho, a mulher continua a ser vítima de sujeição, por formas mais subtis de injusto domínio sobre ela exercido. Vai a mulher ascendendo progressivamente a iguais direitos laborais em relação ao homem. No entanto, a igualdade de oportunidades está longe de verificar-se. E neste ponto que cabe um momento sério de reflexão. Reflexão não de mulheres entre mulheres, ou de mulheres para homens, mas de mulheres e de homens, a corpo inteiro, como companheiros de uma existência única e una.

Se tiveram a sua explicação e legitimação histórica, feminismos exacerbados, como contraponto, do masculinismo redutor da mulher, ser feminista, hoje, e apenas exigir a garantia de igualdade na diferença específica de cada sexo. Há, felizmente para a beleza harmoniosa da própria raça humana, profundas diferenças entre o homem e a mulher, mas nenhuma dessas diferenças é a causa de inferioridade de um sexo relativamente ao outro. Diferenças traduzidas em inferioridade resultam não da condição feminina mas da defeituosa educação das mulheres preceituada pelos conceitos de uma sociedade de homens. A menina que brincava com bonecas, enquanto o rapaz corria e saltava, não tinha a mesma oportunidade de ganhar robustez. Este é um exemplo, só um entre muitos, de uma educação desigual e interiormente conduzida, às vezes, para o papel subalterno e resignado da mulher.

E importante que todos aceitemos a igualdade da mulher e do homem. Um homem civilizado não se atreve a proclamar o contrário. Trata-se de uma primeira vitória para a mulher esse reconhecimento.

Só no século XX esta ideia se generalizou em Portugal. Qualquer leitor de Camilo Castelo Branco ou mesmo de Eça de Queirós constata o avanço verificado no espaço de um século. E curioso verificar como um escritor progressista como Eça de Queirós revela todo o seu machismo no tratamento da personagem Luísa, do Primo Basílio, da Amélia, do Crime do Padre Amaro. Nem admira: o romancista é ele próprio um produto da mentalidade de uma época que ele, nesse aspecto, não foi capaz de ultrapassar.

Aceitação teórica -dizíamos- da igualdade da mulher e do homem. E a prática? Onde está a real

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igualdade já não diremos no trabalho exterior à casa (embora também aí as desigualdades, em muitos casos, sejam notórias) mas na vida familiar? A maioria das mulheres trabalhadoras, de qualquer ramo de actividade, faz um horário profissional igual ao do homem, mas aguenta depois sozinha as lides domésticas e a ocupação com os filhos e outros familiares. Esta discriminação foi e continua a ser feita ao nível da educação recebida. Quantos casais não continuam hoje a educar assim os filhos!

Por isso, entre a proclamação dos princípios, e a sua aplicação, a distância é grande. Falta a muitos homens a sensibilidade para interiorizar autênticos comportamentos de igualdade da mulher. Já nem vale a pena falar na situação da mulher exclusivamente dona de casa, cujo trabalho o companheiro nem sempre valoriza como tarefa social de igual estatuto ao do seu trabalho profissional masculino remunerado.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos no século xx e colhemos os benefícios da cultura e civilização ocidental, às quais nós mulheres também demos e damos o nosso contributo.

Neste momento histórico e com estas coordenadas culturais, a reivindicação da mulher é, acima de tudo, a reivindicação da diferença humana relativamente ao homem. A própria ciência não desvendou ainda todas as diferenças que separam os 2 sexos, mas o homem e a mulher podem hoje compreender-se melhor naquilo que os separa por educação e naquilo que os opõe por deformações da própria sociedade.

Mas pergunta-se: o homem e a mulher conhecem-se? Esse grau de conhecimento é suficiente para encontrarem vias de entendimento, de complemento, de solidariedade? Ou, pelo contrário, homem e mulher não passarão de 2 estranhos, sem possibilidade de partilha e comunhão da existência comum? Parafraseando Sócrates, poderíamos dizer: «Homem e mulher, conhecei-vos um ao outro.» E aceitai-vos tal como sois, acrescentaríamos nós.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se trata só de conhecer e de reconhecer a diferença.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Importa que o homem e a mulher exaltem a diferença, no que ela comporta, da riqueza humana diversa de si própria. Importa que anulem as diferenças criadas pelos preconceitos, pela deseducação, pela opressão de um sexo sobre o outro. A recusa do passado, segue-se a promessa do futuro; à recusa da mulher oprimida, a proposta da verdadeira mulher; à missão limitada do passado, uma nova missão; ao destino mareado desde o berço, a escolha do próprio destino; à relação opressora, a relação da igualdade. Enfim o pleno desenvolvimento da sua personalidade.

Aplausos do PS, do PCP e da ASDI.

Mulher, falando da libertação das mulheres, na comemoração de mais um «Dia Internacional das Mulheres», mas dirigindo-me igualmente a homens e mulheres, termino a minha evocação com as palavras de um dos nossos maiores poetas de sempre, ele próprio incansável na luta pela libertação dos seres humanos Miguel Torga, no Diário XIII, recentemente publicado:

A Mulher! Não me canso de exaltar, o que o homem é a seu lado! Um Adão inocente, um 13dipo perplexo, um Otelo cego. Flor emblemática da Criação, perfumada de fertilidade, só ela sabe pecar sem remorsos, propiciar sem glória, entender sem lógica e sofrer paradigmaticamente, já que foi sempre a Antígona heróica da grande tragédia da vida. Dona do mundo e depositária do futuro, nunca o quis parecer sequer. Gentilmente, deixou essa presença ao companheiro, que depois de tantos milénios de convívio continua a revolucionar os tempos, sem perceber que é Ela, Ela a Mulher, o cordão umbilical da História.

Aplausos do PS.

Ser mulher hoje, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é afirmar a supremacia da vida sobre a rotina, é corporizar a esperança em actos que acrescentem à vida o ânimo, a vontade e a coragem de nos assumirmos como bloco criador.

Aplausos do PS, do PSD, da ASDI e de alguns deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um voto de saudação assinado por Srs. Deputados do PCP, do PS e do PSD e que, por consenso, vai ser lido para, posteriormente, ser votado.

Foi lido. G o seguinte:

Considerando que hoje, 8 de Março, se comemora internacionalmente o dia da Mulher;

Considerando que este dia é, por todo o País, motivo não só de festa mas também de reflexão e consciencialização face aos problemas sociais;

Considerando que as razões da jornada de 8 de Março de 1877 das operárias têxteis de Nova Iorque são ainda hoje pertinentes factores de marginalização e discriminação da mulher;

Considerando justa e necessária a forma actuante e participante da mulher na luta por uma sociedade mais justa, de direitos e deveres igualmente assumidos, os deputados abaixo-assinados do PCP, do PS e do PSD propõem que a Assembleia da República aprove o seguinte voto de saudação:

A Assembleia da República saúde hoje, dia 8 de Março, a mulher portuguesa, tantas e tantas vezes ignorada e esquecida mas cada vez mais consciente da sua inadiável presença, de corpo inteiro, na construção do seu país, onde é tempo de justiça, igualdade e paz.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Luísa Cachado pede a palavra, para que efeito?

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP):- Sr. Presidente, pedi a palavra para proceder à apresentação prévia do voto que acabou de ser lido pela Mesa.

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O Sr. Presidente: - Faça lavor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Luisa Cachado (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há algumas dezenas de anos afirmava Maria Lamas «As mulheres do meu País são mas milenárias de erros milenários e apesar de tudo continuam a ser as obreiras da vida.
Hoje, 1984, as palavras de Maria lamas assumem a mesma e dura verdade, a mesma e dura actualidade.
Hoje o tempo urge, é tempo de descoberta, de redescoberta de nós próprias, é tempo de procura e conquista.
Falar da mulher portuguesa é ainda aqui e agora sinónimo de discriminação, marginalização, mas é também símbolo de luta sem tréguas pela emancipação, pela igualdade e pelo pão.
A pluralidade de estatutos que a mulher assume na sociedade, independentemente da quase inexistência de estruturas sociais de apoio constitui o perfil desejado mas duramente conquistado ao longo dos tempos.
25 de Abril de 1974 foi um marco importante na vida da mulher, foi a possibilidade de inscrever em diplomas legais as razões de muitos e muitos anos de luta.
A Constituição da República Portuguesa repudia todas as discriminações sociais em função do sexo, dignificando a mulher.
A lei aprovada por esta Câmara em Fevereiro último, de exclusão da ilicitude em alguns casos de interrupção voluntária da gravidez é um exemplo da pertinência da luta das mulheres portuguesas e da necessária resposta legislativa, mesmo quando receosa.
No entanto, embora a consagração legislativa dos direitos da mulher constitua um instrumento poderoso e indesmentível a experiência diz-nos que não é ainda bastante que a lei estabeleça os direitos das mulheres na sociedade, na família e no trabalho.
Muitas vezes o que constitui um direito na realidade, um facto.
A praxe diária conta-nos da mulher que se submete ao desemprego em nome da crise, de mulher que se utiliza como objecto publicitário quase sempre degradante da sua imagem, da mulher que se reduz à fada do lar nos textos e imagens de muitos dos livros adoptados no nosso ensino, da mulher que se remunera de forma inferior pelo simples facto de o ser.
A Sr.º Ilda Figueiredo (PCP) - Muito bem!
A Oradora: - É urgente vencer tabus, preconceitos, conseguindo a concretização dos direitos que na lei já são reconhecidos.
É urgente que os conteúdos programáticos do ensino veiculem princípios de igualdade e dignidade que permitam à criança de hoje e ao homem e à mulher de amanhã uma visão verdadeira e séria do ser humano.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É urgente que a sociedade assuma como seus os problemas específicos da mulher porque ao fazê-lo reforçará a democracia, dignificará Abril.
A mulher compete ser o agente da sua própria emancipação, contra ventos e marés retrógrados e saudosistas.
Participando na construção do seu país que quer livre e democrático, ela construir-se-á mulher.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - 0 Sr. Deputado José Luís Nunes pede a palavra para que efeito?
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Acabo de ouvir a apresentação de voto feita pela Sr" Deputada Luísa Cachado e sobre essa intervenção, em concreto, nada tenho a dizer. Quanto ao resto, porém, o mesmo não acontece. Este voto foi apresentado com assinaturas conjuntas de deputados do PCP, do PS e do PSD. Não se discutiu entre os deputados subscritores quem se encarregaria da apresentação e se esta seria efectivada, mas para um grande grupo de personagens a intervenção da Sr' Deputada Luísa Cachado tem um conjunto de afirmações extremamente controversas, não correspondendo ao conteúdo essencial das pessoas que entenderam votar esse documento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A intervenção justifica-se plenamente como intervenção do PCP e vincula apenas a Sr:' Deputada e o partido em que se encontra filiada.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do voto de saudação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados ...
O Sr. Jorge Lemos (PCP) - Na falta de elemento feminino ...
O Orador: - Tem alguma questão a colocar, Sr. Deputado? Se tem, terei muito gosto em responder-lhe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente este voto de saudação. Movem-nos, porém, razões que quase se opõem às enunciadas na apresentação feita pela Sr. Deputada do PCP.
Na realidade, não encaramos a luta em defesa do estatuto e dos direitos da mulher como uma luta classista, como projecção da luta de classes, mas sim numa outra perspectiva-a democrata cristã. Para nós, a luta pela dignificação da mulher insere-se na perspectiva global da luta pela dignificação da pessoa humana.
É nesse sentido que consideramos o voto e é nesse sentido que consideramos que a legislação recentemente aprovada nesta Assembleia sobre o aborto, e eufemisticamente chamada de interrupção voluntária da gravidez, ao atentar contra o direito à vida-primeiro direito da pessoa humana não liberta a mulher e não a dignifica, antes pelo contrário.
É, pois, este o sentido do nosso voto.

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Vozes do CDS: - Muito bem!

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD ao subscrever o texto que lhe foi proposto pelo PS fê-lo nos exactos termos expressos nesse mesmo documento. Diz o povo da minha terra que «por vezes a cara não teta a ver com a careta. Ora, a nossa subscrição foi da «cara» e não da «careta» embora tenhamos muita estima, consideração e simpatia pela Sr a Deputada Luísa Cachado.
A apresentação do voto é uma intervenção sua e, como disse muito bem o Sr. Deputado José Luís Nunes, não é uma apresentação em nome dos subscritores do voto.
O PSD apenas subscreveu o texto que lhe foi presente, e votámo-lo favoravelmente pelas razões que na minha intervenção muito claramente deixei transparecer para a Câmara.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o voto em questão foi apresentado pelo PCP e dado que outros grupos parlamentares desejaram subscrevê-lo não manifestámos qualquer oposição a que o fizessem.
Quanto à apresentação é um facto ter sido feita à medida do nosso próprio entendimento do voto. Obviamente que como tal terá de ser considerada.
O Sr. Presidente, naturalmente, entendê-la-á como a nossa posição sobre o conteúdo do voto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando um voto, mesmo que da iniciativa de um qualquer partido, é subscrito por deputados de outros partidos passa a ser de todos os que o subscreveram. Esta constitui a única forma de voltarmos a subscrever qualquer voto com o PCP que, pelos vistos, tem um entendimento diferente.
Quando o PCP apresenta um voto que é subscrito por outros partidos este passa a ser de todos. Da mesma forma, quando apresentamos um voto que, posteriormente, é subscrito por deputados de outros partidos ele deixa de ser apenas nosso passando a ser de todos.
Não se coloca em causa a intervenção da Sr.ª Deputada Luísa Cachado, chama-se, porém, a atenção para esta realidade: não subscrevemos votos apresentados por outros partidos. Trata-se de uma lição para o futuro. E bom que este entendimento fique muito claro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que o assunto está suficientemente esclarecido. No entanto, parece que o Sr. Deputado João Amaral assim o não entende.
O Sr. Deputado pretende a palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, estou inteiramente de acordo com o que acabou de ser dito pelo Sr. Deputado José Luís Nunes.
O sentido da minha intervenção e foi isso que eu perguntei ao Sr. Presidente foi justamente o de questionar aquilo que me parecia irregular na intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião quando fala de um voto apresentado pelo Partido Socialista.
Quanto ao sentido do voto, ele é o voto conjunto dos deputados que o subscreveram e quanto à interpretação que cada um dos grupos parlamentares faz do seu conteúdo, naturalmente que o Sr. Deputado José Luís Nunes e o Sr. Presidente estarão de acordo em que cada um dos partidos, na intervenção e na declaração de voto que façam, poderá dar-lhe o respectivo sentido.
O que eu perguntava ara com que sentido é que o Grupo Parlamentar do CDS votou esse voto. E o seu próprio sentido tem todo o direito de o fazer, no entanto votou-o favoravelmente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que a posição de todos os grupos parlamentares está suficientemente esclarecida para que não continuemos a esclarecer ainda. mais o que já está perfeitamente claro.
O voto foi subscrito por 3 grupos parlamentares, foi aprovado por unanimidade, e cada um deles, na sua intervenção inicial ou nas declarações de voto que depois produziu, esclareceu o ponto de vista do próprio grupo parlamentar, o que não tem nada a ver com o texto que foi aprovado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Há um texto que foi subscrito por 3 grupos parlamentares e aprovado por unanimidade. Porém, aquilo que cada grupo parlamentar pensa sobre ele foi aqui exposto.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, a interpelação que pretendo fazer à Mesa é no sentido de saber se esta não faz jurisprudência, a pedido do Sr. Deputado José Luís Nunes, sobre matéria da subscrição de votos em comum. E que não ficámos entendidos: o Sr. Deputado José Luís Nunes entende que os votos se tornam comuns, e o Sr. Deputado João Amaral entende que os votos continuam separados quanto ao seu sentido.
No fundo, tomamos esta pequena discussão como uma declaração de arrependimento tardia do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata por terem subscrito o «presente envenenado» do Partido Comunista.

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A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Não é nada disso, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esse é o seu ponto de vista.
Creio, porém, que o assunto está terminado.
Deu também entrada na Mesa um voto de pesar, subscrito por deputados do PS e do PSD, que vai ser lido.
É o seguinte:
Voto de pesar
Faleceu, recentemente, o poeta Pedro Homem de Melo.
B indiscutível que a literatura portuguesa sofreu uma perda que não pode ser estranha a esta Assembleia, não apenas pela qualidade da sua poesia mas, também pelo que a sua personalidade representou como sentinela atenta da nossa compleição específica como povo.
Na verdade, a poesia de Pedro Homem de Melo insere-se, harmoniosamente, na nossa tradição lírica e na sequência de uma tradição que, desde os cancioneiros, tem mareado a nossa expressão poética.
O empobrecimento que representa para a literatura portuguesa o desaparecimento do Poeta Pedro Homem de Melo não pode, em nossa opinião, deixar de merecer da Assembleia da República um voto de profundo pesar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este voto de pesar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Frederico de Moura.
O Sr. Frederico de Moura (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria quase inútil uma declaração de voto para justificar um voto de pesar pelo falecimento do poeta Pedro Homem de Melo. As suas qualidades poéticas, o seu interesse pela compleição do povo português justificam por si qualquer necessidade de declaração de voto.
Nestas circunstâncias, a minha declaração de voto limita-se a dizer que o Partido Socialista votou em consciência e convictamente a favor deste voto de pesar pela morte do grande poeta que foi Pedro Homem de Melo.
Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP também se associa ao pesar e à homenagem devida a Pedro Homem de Melo, homem que, pesem embora as diferenças de opinião, foi poeta e proeurou divulgar valores culturais, humanos e universais do povo português, da sua vida, dos seus costumes, dos seus cantares. Daí o nosso voto favorável.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.
O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentarmos na Mesa da Assembleia da República um voto de pesar pelo falecimento de Pedro Homem de Melo, conjuntamente com o Partido Socialista, fizêmo-lo com profundo sentido e, por tal motivo, votámos favoravelmente.
Pedro Homem de Melo era um poeta, era um homem que cultivava a beleza.
Homenageamos, por isso, o poeta popular que deixou na sua poesia os seus versos em nome da liberdade. O seu amor ao povo português, ao Porto, a Afife, a Coimbra e a Lisboa, são indesmentíveis testemunhos da sua sensibilidade.
De salientar a homenagem que a Assembleia Municipal do Porto lhe prestou concedendo-lhe a medalha de ouro da cidade.
Hoje, é o dia da Assembleia da República lhe prestar a sua homenagem a título póstumo.
Falta, porém, o povo pagar-lhe com a sua espontaneidade, com toda a sua singeleza, a homenagem que lhe deve. Fá-lo-á certamente, porque o povo sabe ser grato a quem o escolheu como amigo e confidente para cenário e companhia, para paixão e entrega. O povo não esquecerá através das vozes fadistas como Amália Rodrigues e Teresa Tarouca as suas letras de poemas que ficarão para todo o sempre ligados à cultura e à música portuguesa.
Que o continuem a cantar, porque homens como Pedro Homem de Melo não se choram.
A grandeza da sua alma, levaram-no a ter um lugar de destaque na Rádio Televisão Portuguesa, a ser considerado um grande impulsionador do folclore nacional.
Morreu o homem, ficou a obra.
Ficou para sempre a imagem e a obra do poeta que clamava «Povo, povo, eu te pertenço!».
Lúcido como era e sensível aos problemas da terra, este homem, que por vezes se deixava fascinar pela morte, descreveu assim os cemitérios «onde os esqueletos dormem sem sonhos, têm o frio que a esperança não consola».
E a voz do poeta diz:
Eu sou devedor à terra, A terra me está devendo. A terra paga-me a vida, Eu pago a terra, morrendo.
Adeus, Pedro Homem de Melo. Adeus, poeta. Viverás eternamente entre nós. Paz à tua alma!...
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos conscientemente a favor deste voto de pesar aliás, como acontece em relação

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a qualquer votação que fazemos e fizemo-lo porque o poeta Pedro Homem de Melo soube, como nenhum outro, interpretar e entender as qualidades e as virtudes do povo português. Foram, pois, essas qualidades e essas virtudes que ele cantou, e, com a sua arte, elevou-as a um valor universal.

Temos pena que os poetas desta Assembleia não tenham hoje cantado a morte de Pedro Homem de Meto. Nós fazemo-lo com o voto de pesar a que nos associamos. Lamentamos esta morte e consideramos que o panorama cultural português está hoje mais pobre.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento subscrito por deputados do PS e do PSD requerendo o prolongamento do período de antes da ordem do dia, que vai ser votado.

Submetido à votação. foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomei conhecimento de uma declaração proferida anteontem por S. E. o Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa. Julgo haver indício seguro de que a mesma se conexiona, embora indirectamente, com um diploma aprovado nesta Assembleia e se refere de um modo geral a instituições políticas do Estado. Neste contexto, recordo nesta tribuna que as acções ficam com quem as pratica e que é na vida que se vai conhecendo o modo como é exercida a autoridade, acima da qual permanecem as instituições.

Aplausos do PS, do MDP/CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Pedi a palavra neste prolongamento do período de antes da ordem do dia para dar testemunho da visita de deputados de várias forças políticas representadas nesta Assembleia, autarcas, pescadores e outras forças vivas realizaram no passado fim de semana na parte importante da ria Formosa, no Algarve, a propósito da acção aí levada a cabo por forcas da Marinha.

Mal ficaria com a minha consciência se não trouxesse ao conhecimento desta Assembleia e do País o aspecto profundamente desolador que constitui o derrube de vedações, a destruição de pátios e de casas em vias de construção. Para além disso, também queria aqui deixar o meu testemunho em relação ao estado de pânico, de medo e de revolta que caracterizava as populações ali residentes e outras que, embora aí não residindo de forma permanente, ali têm as suas construções para fins diversos.

Caracterizaria este problema, destacando duas situações de certo modo distintas: uma a das casas de pescadores propriamente ditas, seja para habitação própria, seja para apetrechos de pesca ou para espera das marés adequadas para exercerem a sua actividade:

outra situação é a das casas de veraneio que aí foram construídas.

Em relação à primeira destas situações, naturalmente que nada justifica e terá mesmo de se considerar intolerável - que quem quer que seja atente contra a sua existência e estabilidade.

Relativamente à situação das casas de veraneio, elas, de facto, são ilegais, mas não são clandestinas, como dizia um autarca que connosco efectuou essa visita. São ilegais, porque o terreno onde estão é do domínio público marítimo, mas não são clandestinas porque foram construídas à vista de toda a gente e com a conivência de todos.

Também são de referir dois casos particularmente graves que feriram a nossa sensibilidade.

Um respeita à existência há já alguns anos de uma ponte, na ilha do Farol, entretanto destruída, tendo sido construída em sua substituição uma nova ponte em cimento, à qual têm apenas acesso as embarcações da Marinha de Guerra. Inclusivamente os barcos de carreira, mesmo no Verão, não podem fazer escala nessa ponte, de modo que aqueles que ali vivem têm de sair na ilha da Culatra e deslocar-se até aí, numa distância de centenas de metros a pé.

15to é no mínimo intolerável, até porque a frequência com que essa ponte é utilizada pelas referidas embarcações da Marinha é estimada em uma ou duas vezes por mês. Não pode, portanto, continuar a verificar-se esta situação.

Também na ilha do Farol, onde há, ou pelo menos havia, a intenção de derrubar algumas construções, se, verifica que uma parte já está desafectada, mas outra não. Por isso, não se poderia nunca incorrer nessa situação surrealista que seria a de considerar que uma parte da ilha atentava contra a ecologia e contra a estabilidade e outra parte, perfeitamente confiante, não contribuía de modo nenhum para que houvesse qualquer perigo.

Da nossa parte, Partido Social-Democrata, sempre clamámos para que o problema fosse estudado, o ordenamento fosse feito e para que se aprofundassem as análises dos movimentos das areias, da deslocação das dunas e das ilhas. Até lá. nada se deve construir e nada se deve destruir e todas as decisões a tomar devem ter em consideração em primeiro lugar os direitos dos pescadores, salvaguardando sempre as suas construções e ainda as demais construções que ainda ninguém demonstrou que põem em causa a estabilidade das ilhas.

O que não faria sentido era começar por derrubar as casas e depois então estudar a fundo o problema.

A bem da estabilidade, da serenidade e da própria actividade piscatória que ali se desenvolve, será bom que primeiro se estude e que, entretanto, não se lance em pânico as populações residentes e muitas vezes autóctones.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando de Oliveira.

O Sr. Armando de Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: E bem conhecida do povo português

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e desta Câmara a posição que o CDS sempre assumiu em defesa dos interesses dos emigrantes, assim como também é conhecida desta Câmara e do povo português a nossa posição em relação ao já célebre imposto extraordinário dos 2,8 %.
O facto, porém, de o CDS sempre defender os interesses dos emigrantes e de estar em desacordo com este imposto, não quer dizer, de maneira alguma, que possa concordar com a atitude que o Governo tomou, através de uma circular confidencial, alterando o espírito e o que estava consignado no decreto que criou esse imposto extraordinário.
Para que este facto fique bem esclarecido, para que a Câmara tome conhecimento dele para que, de uma vez para sempre, se acabe com estas circulares confidenciais que não sabemos para quem são dirigidas - pois se são confidenciais ninguém deve tomar conhecimento delas «fora de portas» e o facto é que ela tem essa finalidade para alguém tomar conhecimento vou passar a lê-la, para que esta Assembleia tome atenção à maneira como o Governo desrespeita as deliberações aqui tomadas, desvirtuando todo o espírito que aqui preceituamos na lei, apesar de discordarmos muitas vezes dela, como é o caso relativamente ao imposto dos 2,8 %.
É n seguinte:
Ofício Circular n.º 1311.
Confidencial.
Muito urgente.
Exmos. Srs. Directores Distritais de Finanças, Chefes das Repartições de Finanças.
A Lei n.º 37/83, de 21 de Outubro, foi articulada prevendo que, no caso da liquidação do imposto extraordinário pelas repartições de finanças-rendimentos sujeitos a contribuição predial e, eventualmente, em imposto de capitais, secção Aos contribuintes receberiam os respectivos avisos em tempo útil para realizarem o pagamento no prazo nela prescrito.
Não atendeu à posição dos emigrantes que, residiram no estrangeiro e, consequentemente, com dificuldades de comunicação, agravadas pela quadra do Natal, se viram impossibilitados do cumprimento das suas obrigações fiscais.
Justo é, portanto, que se atenda à sua situação, o que se fará nos termos seguintes:
1) Os contribuintes emigrantes que não tenham satisfeito o imposto extraordinário no prazo fixo do artigo 4.º, n.º 1, poderão, comprovada, essa qualidade, como adiante se indica, realizar o pagamento, sem imposição dos encargos e juros referidos no artigo 6.º, até 31 de janeiro de 1984, e, bem assim, durante os períodos das operações preliminares de relaxe sem que, também seja devida neste caso, a respectiva taxa.
2) Se a não fizerem, recebidas que sejam as certidões de relaxe na repartição de finanças, o respectivo chefe mandará, como é usual instaurar os processos executivos que aguardarão sem quaisquer diligências até 31 de Março seguinte.
3) Se, durante esse período o contribuinte pretender realizar o pagamento da dívida, deverá provar a sua qualidade de emigrante, o que poderá fazer nos termos do n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 75-C/77, de 28 de Fevereiro, isto é, com a apresentação da carteira de residente no estrangeiro, da carteira de trabalho ou de qualquer outro documento pelo qual o chefe de repartição de finanças se possa assegurar que é, na realidade, emigrante e reside no estrangeiro há mais de 6 meses.
Feita a prova, será processada guia para pagamento do imposto simples, averbando-se nela as referências das presentes instruções: pagamento nos termos de ...
4) Posteriormente a 31 de Março de 1984, os processos executivos correrão normais termos.
Estas instruções foram aprovadas por despacho conjunto de SS. Ex.ªs os Secretários de Estado do Orçamento e do Tesouro de 5 de janeiro de 1984, tendo sido enviada fotocópia à Direcção-Geral do Tesouro, para os devidos efeitos.
Com os melhores cumprimentos.
Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, 11 de Janeiro de 1984.
Bem, Srs. Deputados, que leis é que nos regem? Como é que nós estamos? Foi aprovada uma lei que dizia que em 22 de Dezembro terminava o prazo para pagamento deste imposto sem sobrecarga de juros, aumentando depois estes, decorridos tal prazo, em 50 %.
Ora, o Governo altera por um despacho ou por uma circular confidencial e pergunto a mim mesmo que tipos de «confidenciais» é que vamos ter dentro em pouco, pois se por agora são dactilografas, depois serão por telex e depois até, talvez, via rádio, para serem mais «confidenciais» e urgentes. Se elas são confidenciais, a quem chegam? Agora, não percebo como é possível em termos constitucionais o Governo dizer isto. Consta-me também que já em relação ao imposto do gasóleo estamos em situação idêntica.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, no nosso entender, julgo não ser necessário estarmos aqui a aprovar leis, a discutir, a fazer grandes noitadas, para depois o Governo, apenas através de um despacho conjunto deste ou daquele seu secretário de Estado, vir alterar tudo aquilo que aqui foi feito.
Gostaríamos de saber como é que isto corre e protestamos, não em relação aos emigrantes, mas relativamente a este procedimento, porque efectivamente se houve um emigrante que teve conhecimento desta circular sendo ela confidencial, outros não tiveram.
O CDS protesta veementemente contra este procedimento do Governo. Não sei mesmo se e permitam-me esta observação pessoal num país em que haja respeito pelo respectivo Parlamento um Sr. Minis-

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tro ou um Sr. Secretário de Estado que tomem estas posições não mereceriam ser substituídos, pelo menos a título de penalidade pelo menor respeito para com a Assembleia da República.

Aplausos do CDS.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia, designadamente no ponto 2.1 da agenda que é a continuação da discussão sobre a constituição de uma Comissão de Inquérito à EPAC.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que bem se pode chamar o escândalo do desmembramento da EPAC começou a ensaiar os primeiros passos com os Governos da AI). Por isso, já em 1981 esta Assembleia o debateu e aprovou até um inquérito, da iniciativa do PS e dos seus anteriores aliados da FRS. E já então o MDP/CDE, em conjunto com o PCP, requereu também um inquérito, salientando que a própria opinião pública encarou o caso EPAC e AGA, aqui debatidos, como assumindo foros de escândalo nacional, pelos fumos de corrupção que pareciam soprar nas áreas governamentais!
Pela nossa parte registámos então a coincidência de posições e a concordância de acções, no tempo, entre o Governo, os grandes moageiros nacionais e algumas multinacionais que controlam o mercado mundial» e reafirmámos a suspeita de que no esvaziamento da EPAC e da AGA correspondiam à plena satisfação de interesses ilegítimos de potentados económicos nacionais e estrangeiros, indiciando claras pressões sobre as áreas do aparelho de Estado que estudam, fundamentam e propõem as posições governamentais nesta matéria».
Muitos foram os factos e situações anormais, indicadores de irregularidades, que ficaram e continuam sem esclarecimento.
Por sua vez, o PS, pela voz autorizada do seu deputado Carlos Lage, afirmou então, na sessão de 28 de Outubro de 1981: a... a primeira razão por nós invocada é a presunção de que grupos de interesses, designadamente dos grandes moageiros, desempenharam papel de relevo na decisão governamental de liberalização do comércio de cereais que no ano passado ascendeu a um valor de 40 milhões de contos e de aproximadamente 50 milhões de contos segundo as previsões deste ano, ...». E, mais adiante, acentuava o Sr. Deputado do PS Carlos Lage: a0 Governo, em rigor, pretendeu oferecer uma área altamente lucrativa aos industriais moageiros nacionais e às multinacionais a eles associados Luis Dreyffus, francesa. Nabisco e Continental, norte-americanas.»
Já em relação à abertura da banca e dos seguros à iniciativa privada, os Srs. Deputados do PS foram confrontados com as claras e intransigentes posições contrárias, por eles assumidas quando estavam em oposição ã AD.
E então, como agora, há sempre umas explicações que se apresentam, mas que não conseguem iludir esta triste realidade: o PS insurgia-se contra o desmantelamento da EPAC mas, aliado no Governo com o PSD, mudou de opinião, e fez publicar o Decreto-Lei n " 67/84, de 24 de Fevereiro, que veio «oferecer uma área altamente lucrativa aos industriais moageiros nacionais e às multinacionais», como denunciava em 1981 o seu deputado Carlos Lage, na medida em que retira à EPAC o direito exclusivo de compras de trigo no mercado interno.
Para quem não mudou de opinião, como acontece com o MDP/CDE porque os factos são os mesmos, em 1981 e em 1984, o escândalo do desmembramento da EPAC continua a impor a rápida realização de um inquérito Parlamentar.
Na verdade, a invocada "harmonização do actual sistema com o praticado na CEE», logo referida no início do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 67/84, foi até infirmada pelo Sr. Ministro do Comércio e Turismo recentemente no programa 1.º Página, da TV, considerando não determinante o argumento de integração na CEE. Por outro lado, no preâmbulo do mesmo decreto-lei, refere-se que foi ouvida a Comissão de trabalhadores e os trabalhadores da EPAC, cujos postos de trabalho são colocados em perigo com esta liberalização, são 1800- mas o que não se diz é que a Comissão de Trabalhadores se pronunciou contra esta terceira tentativa de desmantelamento da EPAC.
Acresce que este desmantelamento não tem outro alcance que não seja conduzir, a breve prazo, ao total controle do mercado de cereais pelas poderosas empresas que dominam o mercado mundial, e implicar as mais profundas e graves consequências, não só para os 1800 trabalhadores da EPAC, mas para o consumidor, para a indústria e para a administração pública.
A partir da liberalização do mercado interno do trigo, o pão mais barato, de 56$ o quilograma passará para 90$ ou mais, o mesmo acontecendo com a carne, o leite e os ovos, que dependem estritamente do milho e dos cereais secundários.
A indústria teria de entregar-se a 2 tipos de intermediários, a operarem com lucros, vindo a ser vítima do chamado cambão entre os 5 gigantes do cereal, as multinacionais do ramo.
Quanto à administração pública, veria transferidos para o Orçamento do Estado as despesas da EPAC e dos prejuízos decorrentes da diferença de preços de garantia e de venda do trigo nacional.
Estas são apenas algumas das graves consequências do desmantelamento da EPAC. B, por isso, mais do que nebuloso, é um processo obseuro este que visa destruir a EYAC.
E, por isso também, é urgente e inadiável o inquérito parlamentar ao caso da EPAC.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino): - Sr. Presidente. Srs. Deputados. Debate-se hoje nesta Assembleia a proposta de

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renovação do inquérito parlamentar decidido em Outubro de 1981 sobre o processo de liberalização do comércio de cereais, ramas de açúcar e oleaginosas, renovação suscitada pelos Grupos Parlamentares do PCP e do MDP/CDE.

O inquérito em causa foi requerido pelo PS, pela ASDI e pela UEDS na anterior Legislatura, em Junho de 1981, tendo sido aprovada por unanimidade em Outubro do mesmo ano a sua realização.

Hoje visa-se com a iniciativa presente retomar os trabalhos que na anterior Legislatura decorreram por alguns meses (desde janeiro de 1982 até Junho de 1982), alargando, contudo, o seu âmbito a actos ulteriores, alguns da responsabilidade do actual Governo.

Sr. Presidente, Sr e Srs. Deputados: O Governo participa neste debate, como é aliás sua prerrogativa constitucional e obrigação ético-política, para exprimir um duplo tipo de considerações: por um lado, não está em causa neste momento projectarmo-nos numa apreciação da decisão política de fundo, isto é, do sentido político da deliberação de, em conformidade com o regime da liberdade de circulação de mercadorias vigente nas Comunidades Europeias a que se pretende aderir, extinguir o monopólio estadual de comercialização dos cereais e proceder à liberalização do respectivo mercado. Outros mecanismos regimentais podem viabilizar melhor e com mais propriedade um tal debate que hoje não tem manifestamente cabimento; por outro lado, o Governo gostaria de exprimir perante a Câmara o profundo respeito que lhe merece o instituto dos inquéritos parlamentares e a dignidade e responsabilidade de que se devem revestir, na medida em que constituem importantes elementos no relacionamento normal entre órgãos de soberania.

Os inquéritos parlamentares são, no nosso entendimento, instrumentos fundamentais no quadro do exercício das competências de fiscalização e controle parlamentar sobre a acção do executivo e da administração pública. Por esta forma efectiva-se também a responsabilidade política e institucional do Governo perante o Parlamento. E por isso também sempre está o Governo disposto a não se furtar àqueles instrumentos de efectivação da responsabilidade política que a Câmara entenda necessários e oportuna.

Os inquéritos parlamentares surgem assim enquadrados numa função de controle dotada de importantes prerrogativas, quer de natureza legal quer de natureza constitucional, prerrogativas que foram significativamente reforçadas após a revisão constitucional de 1982, nos termos dos artigos 159, alínea e), e 181.º, n.ºs 4 e 5, da Lei Fundamental.

Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Versando o pedido de inquérito sobre factos passados, anteriores em muito à existência deste governo, e outros já atinentes à gestão do IX Governo Constitucional, acha o Governo que o inquérito, se aprovado como pensamos que acontecerá, deve ser entendido como uma apreciação dos actos e dos processos seguidos para concretização de uma decisão política, mas não como forma de, por uma via inidónea, contestar a decisão política de liberalização do comércio dos cereais, porque essa, a decisão política de fundo, é insindicável nesta sede. Outros mecanismos parlamentares existem para esse efeito e a eles o Governo responderá gostosamente com a mesma abertura de espírito com que encara o pedido de inquérito parlamentar. Mas a destrinça entre os 2 planos parece-nos útil e necessária, porque ela é, em si mesma, clarificadora de intenções e processos, que é no fundo o desiedrato que se pretende obter com o próprio inquérito parlamentar.

Não cabe aqui hoje debater a filosofia política da liberalização, nem os seus princípios que constam do Decreto-Lei n.º 67/84, cuja ratificação, decerto, não deixará de ser pedida por esta Câmara.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Lá foi!

O Orador: - O Governo permite-se, contudo, sugerir à Câmara que a Assembleia evite o protelamento ou o arrastamento de uma decisão conclusiva sobre o inquérito que ora vai ser decidido, naturalmente sem prejuízo da análise ponderada e exaustiva dos factos que relevam para a finalidade do inquérito. A Assembleia da República fixará a metodologia a seguir e o prazo que entender, mas nesse quadro não pode ignorar que um inquérito deste tipo lança sobre serviços, departamentos e até pessoas suspeições que não podem arrastar-se indefinidamente sob pena de projectar insegurança e instabilidade na gestão.

A revisão elevou à dignidade de preceito constitucional as garantias de usufruto de poderes típicos das autoridades judiciais por parte das comissões de inquérito e consagrou uma dicotomia entre inquéritos parlamentares cuja realização fica dependente de deliberação maioritária da Assembleia e inquéritos cuja efectivação decorre da natureza potestativa do direito que assiste a um quinto dos deputados em efectividade de funções, nos termos constantes do n.º 4 do artigo 181.º e que representa uma garantia adicional que a revisão constitucional consagrou em termos de protecção dos direitos das minorias no Parlamento.

Este novo tipo de inquéritos parlamentares já foi no passado utilizado quando da constituição da comissão eventual de inquérito ao acidente de Camarate.

Desta feita os proponentes do inquérito sobre que nos debruçamos optaram pelo mecanismo tradicional do inquérito dependente de deliberação maioritária da Assembleia. Cabe, pois, à Câmara, e só a ela, decidir. O Governo, por seu turno, submete-se à vossa decisão soberana e, nada tendo a obstar à realização do inquérito, nem no que toca a actos de anteriores governos, nem sobretudo no que se refere aos seus próprios actos, desde já exprime e assegura à Assembleia e à comissão que vier a ser formada que prestará toda a sua melhor cooperação para o esclarecimento dos factos que os Srs. Deputados pretendem ver dissecados sobre a liberalização do comércio de cereais. Disponibilidade e colaboração que constituem obrigações constitucionais que sobre o Governo impendem. Mas também porque essa é a intenção do Governo, a de promover e colaborar em tudo o que possa contribuir para a clareza dos processos e para a transparência da nossa vida pública, doa a quem doer.

G Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Da forma como decorreram os trabalhos e da capacidade de obter conclusões seguras sobre a matéria deste inquérito depende a eficácia e a imagem pública do próprio mecanismo dos inquéritos parlamentares e em última instância depende também o próprio prestígio da acção parlamentar.

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Para a dignificação e operacionalização dos inquéritos parlamentares, para a dignificação do Parlamento é para a condução de um diálogo democrático autêntico e real podem os Srs. Deputados contar sempre com o apoio e disponibilidade do IX Governo Constitucional.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, gostaria de referir que da intervenção de V. Ex.ª ressalta a ideia de que há uma destrinça profunda entre os métodos seguidos para obter a prossecução de determinados fins e a política que tem subjacente esses mesmos fins. Mas não iremos questionar essa questão no seu fundamental.
Gostaria, de qualquer forma, de lhe pôr a seguinte questão: se debatermos e averiguarmos, com profundidade e seriedade, toda esta questão, particularmente os métodos que têm sido utilizados pela administração e pelo governo em relação a esta problemática, é ou não verdade que podemos também chegar a conclusões como esta: a quem serve, ao fim e ao cabo, esta liberalização do comércio de cereais, que tem vindo a ser seguida com uma pressa tal que, de maneira alguma, pode ser justificada?
Por outro lado, aquando do debate e esta é uma questão que não gostaria de deixar passar em claro, em 1981, para a constituição de uma outra comissão de inquérito, penso que todos temos presente e o Sr. Secretário de Estado nessa altura deputado também interveio no debate- que também o Governo da altura veio aqui garantir toda a sua disponibilidade no sentido de que essa comissão de inquérito trabalhasse, chegasse a conclusões, inclusivamente que essas conclusões pudessem ser publicitadas para que a opinião pública pudesse ter acesso a elas.
Neste momento o Sr. Secretário de Estado vem fazer exactamente o mesmo tipo de afirmação. Diz que o Governo está disponível, que entende dar toda a colaboração a esta Assembleia no sentido de que a comissão de inquérito funcione correctamente e chegue a conclusões. Pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado: há mesmo vontade política para que tal aconteça ou, tal como aconteceu anteriormente, a comissão será constituída não para chegar a conclusões, mas pura e simplesmente, como processo para ocultar as razões que têm determinado todos estes métodos, ao fim e ao cabo, toda esta política seguida, quer pelos governos da AD quer agora pelo governo PS/PSD?
O Sr. Presidente: - Para responder, se o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Joaquim Miranda, naturalmente que eu respondo pela posição do IX Governo Constitucional, não posso responder pela posição dos Governos que o antecederam.
Se outros antes de mim demonstraram disponibilidade para o esclarecimento dos casos e se daí resultaram maus efeitos, decerto que o Sr. Deputado não estava á espera que eu viesse agora dizer que por tal facto este
governo estava, neste momento, indisponível para esclarecer o caso.
A posição do Governo, em ternos constitucionais e em termos ético-políticos, só pode ser a da perfeita disponibilidade e de total colaboração para o esclarecimento de todas as situações, e isto porque, no entender do Governo, tão interessados estão no esclarecimento da situação os requerentes deste inquérito parlamentar, como o próprio Governo, o qual, naturalmente, está sob a mira e a apreciação dos Srs. Deputados. É um interesse mútuo, é um interesse bilateral; não é apenas um interesse de quem requer o inquérito parlamentar.
Se o Sr. Deputado entende que a minha afirmação não chega para demonstrar a vontade política do Governo, penso que negar tal vontade só pode ser feito através de um processo de intenções, isto é, da afirmação que haveria má fé da parte do Governo vir aqui afirmar a sua disponibilidade e depois furtar-se a ela. Penso que não. No decurso dos trabalhos da comissão, penso que teremos ocasião de demonstrar que o Governo está empenhado em satisfazer todas as solicitações que a comissão parlamentar de inquérito faça no sentido de um esclarecimento do processo EPAC e naturalmente estará também disponível para discutir a própria questão política de fundo, isto é, o problema da liberalização do comércio dos cereais, em que condições é que vai ser feito, qual é o regime jurídico previsto no Decreto-Lei n.ºs 67/84, cuja ratificação, ao que há pouco, num aparte, me esclareceu um seu colega de bancada, já foi pedida, facto aliás de que nunca duvidei. Nessa altura teremos ocasião de estabelecer aqui o debate devido e necessário sobre o objectivos políticos que presidem à decisão de fundo, que é o da liberalização do comércio dos cereais. Nessa altura teremos ocasião de explicitar os pontos de vista sobre a matéria.
O Sr. Presidente: - Parece que há pouco o Sr. Deputado António Taborda pediu também a palavra para pedir esclarecimentos.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - O Sr. Secretário de Estado referiu a disponibilidade e colaboração do Governo para o inquérito ora requerido; disse mesmo que os inquéritos parlamentares são fundamentais para o controle político dos actos do Governo. Advertiu, contudo, que o Decreto-Lei n º 67/84 não era sindicável, isto é, na óptica do Governo ele não estaria, como é óbvio, no âmbito deste inquérito, disse que havia outros institutos. Por isso referiu o instituto da ratificação, que está em vias de ser implementado. E digo isto porque já assinei esse pedido de ratificação.
Mas dentro desse esquema mental que colocou, gostaria de lhe levantar uma questão. Quando o Governo tomou a decisão política de fazer o Decreto-Lei n.º 67/84, podia ter partido de pressupostos que podem vir a revelar-se neste inquérito como menos correctos. Pergunto-lhe: embora a via do inquérito não seja a via directa para revogar o Decreto-Lei n.º 67/84, mas se por via deste inquérito se chegar à conclusão de que o Governo nesses pressupostos estava errado, estaria ele disposto a revogar por si este diploma?
O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

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O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado António Taborda, quando fiz referência ao Decreto Lei n.º 67/84, disse apenas que ele era insindicável nesta sede de debate, hoje, quando se trata da deliberação da constituição de uma comissão paramentar de inquérito, nunca naturalmente em termos gerais. Há sempre mecanismos susceptíveis de serem accionados, não só através do mecanismo da ratificação. Trata-se de matéria que recai na competência legislativa concorrencial da Assembleia da República e do Governo, e qualquer grupo parlamentar pode tomar a iniciativa de apresentar um projecto de lei que vise revogar o Decreto-Lei n.º 67/84.

No rescaldo de um inquérito parlamentar, se as conclusões forem suficientemente explícitas, impende sobre o Governo, sobre a Câmara e sobre a Administração Pública a obrigação de retirarem as necessárias ilações acerca do sentido das conclusões desse inquérito. O que significa, inevitavelmente, que não me parece ser muito provável que o inquérito parlamentar possa por si só pôr em causa um normativo legislativo. Mas, se eventualmente esse facto se vier a verificar, o Governo, tal como os deputados, terão que retirar as ilações e proceder em conformidade.

Decerto que o Sr. Deputado não irá exigir-me agora que eu faça aqui uma profissão de fé hipotética e diga: «Se se verificarem gravíssimas irregularidades que foram de morte o normativo legislativo, será revogado, de um só acto o Decreto-Lei n.º 67/84.» 15so eu não posso fazer, é um mero juízo hipotético. O que lho posso garantir é que, assim como entendemos que a colaboração ao desenvolvimento da actividade da comissão parlamentar de inquérito por parte do Governo é devido e imposta pelo bom relacionamento entre os 2 órgãos de soberania, também o serão, por maioria de razão, as conclusões e as ilações a retirar do trabalho da comissão parlamentar de inquérito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fazemos agora o intervalo, pelo que suspendo a sessão.

Peço, entretanto, aos presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares o favor de reunirem no meu gabinete.

Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 25 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr, Vice-Presidente José Vitorino,

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso, para uma intervenção.

O Sr. Lopes Cardoso (USDS): - Sr. Presidente, antes de intervir gostaria de colocar uma questão à Mesa, embora saiba que não está ao seu alcance resolvê-la.

Dada a natureza da matéria que estamos a discutir, penso que seria vantajosa a presença do Governo. Q Sr. Secretário de Estado está, neste momento, numa reunião dos líderes dos grupos parlamentares, irias, se a reunião já não demorasse muito, talvez houvesse

vantagem em pedir ao Sr. Secretário de Estado para estar presente.

O Sr. Presidente: - Vou saber, junto do Gabinete do Gabinete do Sr. Presidente, se a reunião ainda estará demorada para dar satisfação ao seu pedido, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS)- Dito isto e para não atrasar mais os trabalhos, vou iniciar a minha intervenção. Não quero que se entenda aquilo que disse como o desejar ter alguma audiência especial para as minhas palavras. Portanto, para irmos ganhando tempo, vou iniciar a minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado está disposto a fazer já a sua intervenção, faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Aquilo que disse foi apenas para chamar a atenção da Mesa, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção será muito rápida e tem, fundamentalmente, o objectivo de explicar aquilo que será o nosso voto.

O nosso voto vai ser favorável ao pedido de inquérito formulado pelo PCP e pelo MDP/CDE, mas pelo menos, do nosso ponto de vista, creio que vale a pena explicar as razões desse voto favorável.

Em primeiro lugar, penso que neste momento há que distinguir muito claramente entre duas questões: uma, o pedido de inquérito; a outra, a matéria contida no decreto-lei que liberalizou o comércio dos cereais. Como não é esta a matéria que está mesmo momento em discussão em Plenário, não me vou pronunciar sobre ela. Não porque hesite em o fazer, pois a nossa posição, nessa matéria, é conhecida desde o início e é frontalmente contrária ao processo de liberalização do comércio de cereais, por razões que tivemos ocasião de expor já neste mesmo hemiciclo e que oportunamente voltaremos a expor.

No entanto, entendemos que a discussão acerca da liberalização do comércio de cereais deverá ser feita no momento em que suba ao Plenário o pedido de sujeição a ratificação do decreto-lei em causa, que já foi apresentado na Mesa. segundo me foi comunicado há pouco, e de que o meu agrupamento parlamentar é um dos subscritores, juntamente com o PCP e com o MDP/CDE.

Em relação ao pedido de inquérito, devo acrescentar que o votaremos favoravelmente porque entendemos que ele tem fundamento no que diz respeito à actuação do governo AD, que foi o objecto do primeiro inquérito. Nessa altura esta Assembleia teve conhecimento de um número suficiente de factos que o justificavam e que, aliás, constavam do pedido de inquérito que a UEDS, juntamente com o PS e com a ASDI, formulou na altura.

Ora, do nosso ponto de vista, o mesmo não acontece na parte que diz respeito à actuação do actual Governo porque, como disse há pouco, penso que há que distinguir entre a bondade ou a maldade do decreto-lei e os meios que eventualmente terão sido utilizados para a sua promulgação. 15to é, a questão que se põe e se há ou não irregularidades em todo o processo.

Em relação ao governo AD, em 1981, em nosso entender, havia indícios suficientes que justificavam

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que se inquirisse se haveria ou não irregularidades. Porém, em relação à actuação deste governo já não poderemos dizer o mesmo, independentemente da nossa discordância quanto ao fundo da questão e, inclusive, independentemente da nossa discordância, do ponto de vista político, quanto ao método utilizado, porque entendemos que tratando-se de matéria de uma tal importância ela deveria ter sido objecto de uma proposta de lei e nunca de um decreto-lei. Mas isto são questões de ordem política que nada têm a ver com um pedido de inquérito ou com irregularidades que, eventualmente, o possam justificar.
Portanto, subscrevemos este pedido de inquérito, apenas porque entendemos que o inquérito que foi interrompido, por contingências várias e inclusivamente pela dissolução desta Assembleia, deve ser retomado e levado até às suas últimas consequências. E isto porque, como já disse e repito, no pedido de inquérito agora formulado não se apresentam, em relação à actuação do actual Governo, fundamental suficientes para o fazer, que por si só justifiquem a abertura de um processo de inquérito nesta matéria.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, o Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares foi contactado no sentido do pedido de V. Ex.ª e comunica que virá logo que possa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito.
O Sr. Rogério Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O grau de independência alimentar de um país pode ser medido pelos índices de auto-
abastecimento em 3 grupos de produções fundamentais e como tal estratégicas -cereais, oleaginosas e açúcar, a partir dos quais, directa ou indirectamente, se obtêm os bens de consumo alimentares básicos tais como o pão, massas, arroz, óleos, manteiga, leite, ovos, carne, açúcar, etc.
Se tivermos presente que a nossa produção agrícola não satisfaz mais de 40 % do consumo interno e que os índices de auto-abastecimento não ultrapassam hoje os 25 % no conjunto dos cereais, 30 % nas oleaginosas e praticamente 0 º.6 no açúcar, poderemos avaliar a situação de profunda dependência face ao estrangeiro em que nos encontramos.
Situação tão mais grave quanto, no seu conjunto, a importação de cereais, oleaginosas e açúcar representa mais de 60% das importações de bens alimentares e mais de 80 % das importações de produtos agrícolas.
Fácil é entender que um tão elevado grau de dependência externa naquele conjunto de produtos comporta ainda enormes riscos no que respeita ao comércio de importações e abastecimento do mercado interno, não só pelo montante das verbas que lhe estão inerentes (hoje, mais de 100 milhões de contas), como pelo domínio directo que uma área tão vital como esta pode exercer ao nível das estruturas produtivas e da própria economia nacional.
Ninguém pode, pois, ignorar que, inevitavelmente, uma tal situação de dependência desperta, desde há muito, a gula dos grandes grupos económicos.
Ovem ousa, nestas condições, negar legitimidade àqueles que exigem que as questões que se prendem
com esta área económica e que visam introduzir-lhe alterações sejam devida,

pública e transparentemente estudadas quanto às suas causas e consequências?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta legitimidade é reforçada quando estão em causa, não apenas alterações pontuais, mas sim uma profunda transformação do regime de importações e abastecimento do mercado, que vai ao ponto, inclusive, de poder ceder a multinacionais o grosso das importações, a transferência para as suas mãos das estruturas de recepção e armazenagem das empresas públicas e o seu consequente desmantelamento e ameaçar a própria viabilidade da produção interna.
E neste contexto que se insere a razão de ser da proposta de constituição de uma nova Comissão de Inquérito ao caso EPAC.
Uma nova Comissão que conclua o inquérito que a anterior mal começou por culpa, fundamentalmente, do PSD e que clarifique a situação agora criada pelo governo PS/PSD. E que, antes como agora, o caso EPAC (tal como aliás os casos da AGA e do IAPO não só não está devidamente, publicamente e transparentemente esclarecido, como continua a estar, todo ele, comprometido por um processo que no mínimo, se terá de considerar obseuro e atentatório dos interesses e da independência nacionais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para que objectivos pode apontar a «denominada» liberalização do comércio do açúcar, das oleaginosas e particularmente, no caso em debate, dos cereais?
Vários têm sido os argumentos utilizados para tentar justificá-la, desde os imperativos da adesão à CEE até à dinamização da produção agrícola nacional. Cabe questionar a solidez de tais argumentos.
Será realmente um imperativo a adesão à CEE?
Em primeiro lugar, a adesão, queiram ou não os seus promotores, continua a não passar de uma eventualidade.
Em segundo lugar, a questão dos chamados monopólios de Estado é, mesmo em termos da CEE, uma questão extremamente polémica e, até por isso mesmo, permissiva às excepções, aliás, frequentes. Mesmo quando as referidas excepções não estão previstas, são reconhecidas as formas mais ou menos encobertas - quando não às claras a que os Estados membros recorrem para ultrapassar as disposições que se opõem aos monopólios estatais.
Muitas são as situações de monopólio nacional de carácter comercial que continuam a subsistir em diversos países, membros da CEE desde 1958. E em nenhum deles, por certo, se verificará existirem razões tão legítimas quanto as que se prendem com a defesa de uma área tão vital e estratégica para a economia e independência nacional como no nosso caso.
E mesmo que assim não fosse mas é o, convém não esquecer, a verdade é que ainda não estamos na CEE e se para lá entrássemos teríamos ainda um longo período de transição para proceder às necessárias adaptações. Adaptações que deveriam resultar, não de uma cega aceitação de regras, que na maioria não são cumpridas pelos actuais membros do Mercado Comum, mas de uma negociação onde os nossos legítimos interesses fossem firmemente defendido salvaguardados.

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Porquê, então, as medidas tomadas?

Poder-se-á conceber que a adesão de Portugal à CEE seja pretendida pelo Governo a qualquer preço?

Será um provincianismo pacóvio que leva os nossos governantes a quererem ser mais «ceeistas» que a CEE?

Será por tal ausência, da parte do Governo, da correcta dimensão de dignidade nacional que deveríamos assumir nas relações internacionais?

Ou será, tão-somente, porque a adesão à CEE constitui, antes do mais, o pretexto para a reconstituição de grupos económicos e para a total submissão da nossa economia ao grande capital nacional e multinacional?!

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Toda esta questão tem que ver não apenas com os seus reflexos na indústria, na Administração Pública e no consumidor o que já em si não é pouco, mas também com a agricultura.

Neste aspecto, a questão que desde logo se coloca tem que ver com a tentativa do Governo de pretender estabelecer uma relação directa entre o incremento da produção e da qualidade e a «liberalização» do comércio dos cereais, como se desta dependesse, de algum modo, aquela!

Esta é mais uma falsa questão que revela, antes de tudo o mais, a pouca, ou nenhuma, seriedade com que o caso tem sido tratado por este governo e por aquele que o antecedeu.

Não é possível, com o mínimo de bom senso, ver no actual sistema de comercialização do trigo um factor inibidor do desenvolvimento da produção, ia produtividade e da qualidade.

A EPAC nada tem que ver com a falta de apoio técnico à produção. Em nada concorre para a falta de uma adequada política de investigação prática, experimentação e divulgação, que permitam uma resposta eficaz às exigências cada vez maiores no que respeita a apuramento, adaptabilidade e produtividade dos cultivares utilizados.

A política de preços, particularmente no que respeita aos factores de produção e à sua desarticulação com os preços de campanha, inviabiliza qualquer base econométrica com um mínimo de estabilidade, indispensável para a racionalização tecnológica da cultura.

Tentar justificar esta situação como uma consequência da rigidez do actual sistema de comercialização para o trigo, é querer escamotear o facto, inquestionável, de que não estando os cereais secundários, tal como muitos outros produtos agrícolas, designadamente o milho, sujeitos ao referido regime, nem por isso deixam de ter os mesmos ou agravados problemas.

A separação entre a economia dos cereais importados e dos provenientes da produção resulta, sobretudo, dos impactos da baixa produtividade da nossa produção e da confrontação entre o seu acentuado défice e os excedentes dos mercados externos. Não se pode pois responsabilizar o regime cerialífero pela artificialidade da formação dos preços. Tão-pouco pela deficiente qualidade-tipo da produção nacional, resultado da fraca qualidade das variedades colocadas à disposição dos produtores!

A solução do problema não está, com toda a certeza, na alteração do regime de comercialização do trigo. Pelo contrário, a alteração imposta pelo Governo pode servir os interesses dos grandes moageiros,

dos grandes agrários a eles ligados, das multinacionais, mas nunca servirá a nossa agricultura e os interesses nacionais!

A ser implementada a liberalização do comércio do trigo, confrontar-nos-erros com algumas situações exemplares. Por exemplo, no que respeita ao sistema de preços e de intervenção, e em consequência dos seus mecanismos, o preço de intervenção tenderá, inevitavelmente, para se situar num limite inferior de preços de mercado. Será entre este limite e um superior, designado preço indicativo, que funcionará como orientador da produção, que se situarão os preços do mercado interno.

Face ao enorme diferencial de produtividade da nossa agricultura e à incapacidade de a produção corresponder, pelo menos a curto e médio prazos, à qualidade tipo exigida, a depreciação do preço de intervenção será desastrosa, arrastando consigo a quebra das já baixas produções. Poucos serão ainda os produtores que virão a ter capacidade para responder às exigências de utilização e capacidade de armazenagem do cereal, quantidades mínimas de entrega, homogeneidade dos lotes, etc.

Os grandes moageiros desinteressar-se-ão ainda mais da produção nacional. Não se evitarão sistemáticas fraudes quanto aos quantitativos de cereal adquiridos à produção por parte dos importadores privados.

Acabará por ser a EPAC a adquirir o cereal nacional que os grandes moageiros não querem. Aquela, como organismo de intervenção, terá de gerir a qualidade inferior enquanto, estes, importam mais, ganhando com a importação e com a qualidade.

A unidade patrimonial da EPAC acabará por ser progressivamente transferida para as mãos dos monopólios, no mínimo, sob a forma de concessão de exploração.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Até hoje o Governo não conseguiu aduzir uma única justificação técnico-económica com um mínimo de racionalização para avançar na denominada liberalização do comércio do trigo, do açúcar e das oleaginosas. E não o conseguiu porque essa justificação técnico-económica racional não existe!

Então, porque avançou com tal medida? Aqui coloca-se a questão de não nos termos situado apenas na problemática das irregularidades que podem estar subjacentes ao caso da liberalização do comércio do trigo, mas também nesta situação que tem que ver com o próprio processo da formulação da proposta da comissão de inquérito.

E que, quando se pergunta porque avança o Governo nesta altura e perante a previsão de consequências verdadeiramente desastrosas para a nossa economia e para a nossa agricultura em particular, ...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia que fizessem um pouco mais de silêncio pois há demasiado barulho no Plenário.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Eu diria que não estou particularmente impressionado com o ruído da sala. Digamos que as coisas merecem a atenção que merecem.

Todos nós sabemos que neste país as comissões de inquérito não andam. As pessoas já tomam tudo o que possa haver em termos de corrupção, e de irregulari-

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dados da Administração Pública cromo um facto banal do quotidiano. Não admira que assim seja, porque o desinteresse do Parlamento traduz, no fim de contas, esta realidade.
Infelizmente, o desinteresse daqui acaba por traduzir-se lá fora e é aquilo que nós verificamos: o descrédito das instituições e da Administração Pública.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Não apoiado!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui reside também, uma vez mais, a razão de formularmos a questão de porque é que o Governo avança com estas medidas, que atentam contra os interesses da economia nacional e da agricultura, no caso particular que estou a abordar.
Perguntaríamos se serão ou não, tão-somente, porque a adesão à CEE constitui e repito, antes do mais, o pretexto para a reconstituição de grupos económicos e para a total submissão da nossa economia ao grande capital e às multinacionais!
O acto política do Governo atesta contra a economia nacional e contra a própria independência do pais. Este facto, par si só, é passível de ser inquirido, até porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os métodos seguidos por este governo e os protagonistas envolvidos são, em grande parte, os mesmos que justificaram o anterior inquérito.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado Rogério de Brito, devo dizer-lhe que subscreveria quase 90 % da sua intervenção, ou seja, aquela parte que, em meu entender, pouco ou nada têm a ver com a discussão que neste momento devia ter lugar neste Plenário. 15to é, subscreveria toda a parte da sua intervenção que põe em causa a matéria contida no decreto-lei que liberaliza o comércio de cereais, que aponta para as gravíssimas consequências dessa liberalização e que tende a demonstrar e esse é também o meu entendimento- que tal política serve em exclusivo o interesse dos grandes moageiros e o interesse das grandes multinacionais.
Só que, em meu entender, não é isto que está em causa neste inquérito. O que seria importante, na parte do inquérito que respeita concretamente à actuação do actual governo, é que tivessem sido avançados elementos no sentido de demonstrar que os métodos foram obseuros.
Pela minha parte, penso que os métodos foram transparentes, embora politicamente condenáveis porque, como disse há pouco, considero que é politicamente condenável que o Governo tenha legislado por decreto-lei em matéria desta importância. E também considero que os métodos usadas por este governo foram, exactamente, os métodos usados pelo governo.
Digo isto porque a bondada ou maldade do decreto em nada tem a ver com os problemas que, eventualmente, conduziram à sua promulgação.
Não é o decreto que está em causa, mas sim a eventualidade de que tenham sido cometidas irregularidades no processo que conduziu à sua promulgação. Essas, em meu entender, na parcela do inquérito que diz respeito a este governo, ficaram não por demonstrar, porque essa será a missão da comissão de inquérito, mas por serem indiciadas com o mínimo de segurança que o justifique nessa parte.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rogério de Brito, não há mais inscrições para pedidos de esclarecimento.
Se deseja responder ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem a palavra.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, estabeleci, efectivamente, uma certa analogia entre os métodos utilizados antes e agora. Fui mesmo mais longe e até disse que boa parte dos protagonistas do processo anterior continuavam a sê-lo neste momento.
Não fiz uma demonstração, exactamente porque nestas coisas há sempre o beneficio da dúvida, peta menos até ao apuramento das responsabilidades, isto é, até que as comissões de inquérito cheguem à conclusão dos seus trabalhos.
No entanto, este mesmo governo terá afirmado, por exemplo, que a Comissão de Trabalhadores da EPAC seria ouvida neste processo e que acompanharia de perto os trabalhos. Prometeu isto e não o fez!
Este mesmo governo, a propósito deste processo EPAC, disse que seria feito um amplo debate público sobre o assunto. Não o fez!
Este mesmo governo para, de algum modo, avalizar a medida política, chamou a CAY, a AMPOC, a AfM e a FPIM.
Pergunta-se: porquê a CAP e não a CNA? Ou, porque não as duas associações? O que E que confere ao Governo o direito de considerar a CAY a expressão preferencial - e neste caso nem é preferencial, pois é única dos agricultores portugueses?
15to tem algo que se diga e temos legitimidade para duvidar da isenção deste método.
Porquê uma associação nacional de produtores de cereais que não tem qualquer expressão, que apenas representa os interesses dos latifundiários que a ela estão associados, e porque não uma associação efectivamente representativa dos milhares de pequenos e médios produtores de cereal?
Outra questão que importaria esclarecer: porquê toda esta selectividade em relação àqueles que até acreditamos que tenham interesse na liberalização do comércio dos cereais? Estranhamente, de todos aqueles que possam ter dúvidas ou pôr em questão as consequências desta liberalização, nenhum deles foi consultado, ouvido, ou pronunciado!
E mais ainda: porque é que tal como aconteceu no governo anterior- este governo chamou para a sua decisão o parecer, por exemplo, de um senhor chamado Pais de Sousa, que já foi administrador da EPAC em simultâneo com as suas funções de assessor da Lusograin que continua a sê-1o? $ exactamente um senhor como este que dá o seu parecer ao Governo sobre a justeza da medida a tomar!
Também aqui há legitimidade para considerarmos que, no mínimo, isto é altamente suspeito. Eu diria mesmo que isto não é próprio de um Estado de Direito democrático nem de um governo democrático,

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que devia pautar toda a sua actuação pela exemplaridade quanto aos métodos utilizados.
Portanto, há mais do que motivos - como julgo que acabei de demonstrar- para que se tenham fortes suspeitas que nos levam a considerar os métodos e as consequências deste projecto semelhantes a todo o outro.
Até poderemos avançar que, provavelmente, o mesmo senhor ex-Ministro da Agricultura, ele próprio um dos elementos visados na própria elaboração da comissão de inquérito ao anterior caso EPAC, participou agora na feitura do parecer para o Governo sobre as medidas a tomar em matéria de liberalização do comércio de trigo.
Portanto, temos mais do que razões para suspeitar de tudo isto e para colocarmos esta actuação exactamente ao nível da outra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: em política não se tomam medidas por acaso. Existem sempre objectivos e o Governo tem de ser responsabilizado, não por uma mera discussão da sua opção política mas pelas causas e consequências subsequentes à tomada de medidas que atentam contra os interesses nacionais e por não ser capaz de dar, perante o país, uma justificação mínima - objectiva, séria e racional- para os actos praticados.
Assim sendo, coloca-se a seguinte questão: é ou não é de inquirir o Governo quanto ao acto por este assumido, que atenta e lesa os interesses da nossa economia e, mais ainda, da nossa própria independência nacional?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: já na anterior legislatura, o meu grupo parlamentar votou a favor da constituição de uma comissão eventual de inquérito com um objectivo idêntico àquele que agora se propõem os autores deste requerimento.
Essa comissão funcionou. Terá tido um trabalho exíguo, mas dissolvida a Assembleia dissolvida ficou a comissão e, por isso, os seus trabalhos não se terão concluído.
Tal como então, a nossa postura neste momento é a mesma: é uma postura que nos leva ao voto favorável, numa abertura a que se analisem comportamentos e se procure, efectivamente, saber da transparência ou não na evolução dos processos, na criação de certas situações e, portanto, na obtenção de uma certa solução.
Um Sr. Deputado, intervindo hoje neste debate, falou no desinteresse deste Parlamento pelas comissões de inquérito.
Não há desinteresse no Parlamento nem há desinteresse da minha bancada pelo trabalho das comissões, mesmo eventuais, como aquela que agora se pretende efectivar.
O mesmo Sr. Deputado referiu o descrédito das instituições e da Administração Pública. O descrédito ficará com aqueles que o quiserem.
,Pela nossa parte, tudo faremos - e temos feito para que esta instituição parlamentar se dignifique e para que a Administração Pública possa ter mecanismos e instrumentos para funcionar da melhor maneira.
Mas há realmente comissões e "comissões". Muitas vezes as oposições pretendem a constituição de comissões- e neste momento em face da revisão do Regimento algumas poderiam ser criadas sem mais, sem este debate, não para alcançarem o objectivo que declaram desde logo, mas para terem um espaço de debate e veicularem, muitas vezes, posições demagógicas. Aliás, o objectivo desta Comissão seria sem dúvida o de analisar comportamentos, irregularidades, ilegalidades até. Mas ouvindo intervenções que aqui se fizeram, diríamos que a sua constituição quase não teria interesse porque a priori se fazem acusações e se entra na análise de fundo do decreto-lei, quando o que está em causa é apenas uma decisão política, que é a liberalização do comércio de cereais, e esse sim é que tem sido o objecto do debate.
Perante opções políticas de fundo, haverá sempre recurso a interpelações, a ratificações dos diplomas quando têm a forma de decreto-lei - neste caso, em relação ao Decreto-Lei n.º 65/84 que dá corpo à Lei ri,' 46/79. Tratar-se-á, conforme bem dizem no texto do preâmbulo os autores do requerimento, de "analisar os comportamentos".
O Governo já disse que pela sua parte nada tem a obstar no que respeita aos actos que agora estão em causa. O nosso grupo parlamentar, em relação aos actos do anterior governo que sustentou, nada tem a objectar. A nossa posição é, efectivamente, a de permitir a análise de comportamentos, de permitir que se faça transparência sempre que qualquer dúvida se possa pôr. E digo "qualquer dúvida" e não "certezas", porque se houvesse certezas não haveria necessidade de inquéritos.

O Sr. Malato Correia (PSD):- Muito bem!

O Orador:- Daremos o nosso voto de apoio a este inquérito, sabendo bem que os governos ao actuar, ao legislar, o fizeram segundo uma certa opção de fundo que respeitamos, mas fizeram-no sempre na consecução dessa opção em termos regulares e legítimos. De qualquer maneira, e perante as oposições, a análise mostrará em termos de veredicto que efectivamente nada se poderá censurar aos governos. Será esse, no fundo, o maior mérito deste inquérito. Esperemos que ele possa ser eficaz e chegar ao seu término.
Vozes do PSD: - Muito bem!
t) Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Fernando Condesso: Tenho de começar por lhe dizer que, pese embora o seu anúncio de que o Partido Social-Democrata votará favoravelmente esta proposta de inquérito, isso não nos tranquiliza. E isto porque o Sr. Deputado começa por dizer que a postura do Partido Social-Democrata, neste momento, é idêntica à postura que teve em 1981.
O que acontece, e penso que é bom termos isso presente, é que se a postura do PSD em 1981 foi a de votar favoravelmente a proposta de inquérito, o que não é menos verdade é que teve na comissão uma actuação completamente contrária a essa votação, isto é, votou favoravelmente a constituição dessa Comissão mas pa-

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realizou-a, na prática, durante a sua vigência. A realidade é esta: O presidente da comissão de inquérito, que era do Partido Social-Democrata, apenas convocou 7 reuniões durante o período em que ela esteve vigente e dessas 7 reuniões apenas 2 ou 3, salvo erro, se destinaram à matéria em causa, pois que as outras se limitaram a questões processuais - digamos mesmo do regimento interno da própria comissão- e isto por culpa exclusiva do presidente da comissão. Lembramos que o PSD, num conjunto de 16 deputados que constituíam essa missão, tinha 5 deputados que raramente lá apareciam. Posso mesmo afirmar que na última reunião convocada pelo respectivo presidente, este não compareceu e apenas 2 deputados da oposição de então, e que é a de agora também, compareceram.
Por outro lado, o Sr. Deputado diz que talvez não merecesse a pena levar por diante a realização deste inquérito.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Eu não disse nada disso!

O Orador: - Colocou essa questão, dizendo que já haveria conclusões antecipadas, pela nossa parte, antes da realização do inquérito. Não há conclusões antecipadas, Sr. Deputado, mas sim indícios extremamente clã" de que existem processos obseuros, situações anómalas, em todo este processo. Ora, não somos só nós que dizemos isto, pois também o disseram, em 1981, os deputados do Partido Socialista, nomeadamente na formulação do inquérito que então pediram a esta Assembleia. E foram extremamente claros quando afirmaram que ainda não tinha sido dada resposta a questões como, por exemplo, de como é que tinha sido constituída e em que bases a Lusogram, pois ainda não havia sequer uma autorização legislativa para o Governo legislar sobre essa matéria e já aquela actuava no próprio mercado, já se dirigia à CP, como tive ocasião de aqui referir em intervenção anterior. Os próprios indícios de interesses pessoais que estariam ligados a todo esse processo foram aventados pelo próprio Partido Socialista, em 1981, assim como as ligações de ex-Ministros com empresas moageiras, com multinacionais. Tudo isto é do domínio da opinião pública.
E evidente, Sr. Deputado, que isto não são conclusões, mas sim indícios extremamente claros de que há em todo este processo situações extremamente anómalas as quais não podem ser consentidas num Estado democrático.
Para terminar gostaria de dizer ao Sr. Deputado que são exactamente essas questões que teremos de aprofundar e analisar e às quais os governos, o de então e o de agora, terão de responder, bem como pelos métodos de que se serviram para levar à conclusão uma política que é sua, mas que em nada está de acordo com os interesses da economia nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condesso, há mais Srs. Deputados inscritos para pedidos de esclarecimento. Deseja responder desde já, ou no final, conjuntamente?
O Sr. Fernando Condesso (PSD):- No final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Condesso: Muito rapidamente e em aditamento ao que já foi formulado pelo meu camarada Joaquim Miranda.
Afirmou o Sr. Deputado que tínhamos assumido aqui posições demagógicas.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Eu não disse isso!
O Orador: - Não disse isso?! Está bem. Mas queria perguntar-lhe o seguinte: se a análise que aqui fizemos as suspeitas que levantámos, podem ser consideradas como demagógicas, porque 'é que não são postas a descoberto?
A outra questão refere-se a ter afirmado que «fazemos desde já acusações». Sr. Deputado, tive permanentemente o cuidado de dizer que existiam motivos que nos levavam a ter razões para suspeitar do processo. Mas o Sr. Deputado considera ou não que é pelo menos touco claro que tenha sido seleccionada como única força representativa da organização dos agricultores portugueses, a CAP e mais nenhuma? Porquê apenas uma associação nacional de produtores de trigo, já que a mesma não tem nada de nacional, visto ser apenas uma associação de grandes latifundiários do Alentejo? E ou não verdade, Sr Deputado, que o Sr. Ministro do Comércio e Turismo tem como assessores técnicos, neste mesmo processo, o Sr. Engenheiro Cardoso e Cunha, comprometido com o anterior processo de liberalização do comércio de cereais, e o Sr. Dr. Pais de Sousa, ex-gestor da EPAC e representante em Portugal da multinacional DREYFUS, para além de inclusivamente, ter criado a empresa LUSOGRAIN, de que é accionista, cujo objecto é a comercialização de cereais? Diga-me se tudo isto é ou não suficiente para levantar suspeitas sobre a forma como todo este processo decorre.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem manter um diálogo dilatório, diria que em relação às acusações ao ex-Membro do Governo e posteriormente nosso deputado, Sr. Cardoso e Cunha, quando saiu do Governo e se levantou a questão do inquérito, ele esteve aqui presente, apoiou a sua realização e pôs-se mesmo à disposição para colaborar nele. Também na altura declarou e os Srs. Deputados ouviram-no bem, que nada tinha a esconder.
No que diz respeito à questão que é posta sobre a comissão e sobre algum expediente para a fazer demorar, rejeito que da nossa parte tivesse havido qualquer intenção de dilatar os seus trabalhos. O que provavelmente aconteceu é que terá funcionado num período em que se acumulavam outros debates par-

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lamentares, de matérias muitíssimo importantes, nos quais participava designadamente o presidente dessa comissão. Aliás, acontece que muitas vezes as comissões não podem funcionar ininterruptamente, porque precisam de matéria de análise para o efeito. De qualquer maneira, Sr. Deputado, aquilo que não se fez por uma dissolução antecipada da Assembleia, poderá ser continuado e feito agora.
Porque penso que não vale a pena manter um diálogo dilatório, dou por terminada a minha intervenção.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo fazer uma rápida intervenção, dando o sentido da nossa votação quanto à criação da comissão parlamentar de inquérito proposta.
Por um lado, votaremos favoravelmente por coerência, visto que nós próprios, juntamente com a ASDI e a UEDS, apresentámos há 3 anos uma proposta de uma comissão parlamentar de inquérito sobre o processo de liberalização do comércio de cereais, ramas de açúcar e oleaginosas. Assim, por coerência não podíamos deixar de votar favoravelmente uma proposta no mesmo sentido, ou seja, que vise repor o funcionamento de uma comissão que leve até ao fim o inquérito que na altura tinha sido decidido.
Por outro lado, o nosso voto favorável será, ainda, por uma razão de princípio. Votaremos sempre favoravelmente no que respeita à criação de comissões parlamentares de inquérito, quando sejam colocadas dúvidas, interrogações ou reservas sobre actos do Governo e da administração. Esse é um princípio fundamental da actuação de um Parlamento num Estado democrático, é o exercício dos seus princípios fiscalizadores. Assim, não podemos deixar de votar favoravelmente quando apareçam propostas nesse sentido.
No entanto, não queremos deixar de assinalar que com esta votação não queremos, de forma nenhuma, avaliar da política governamental neste sector. Não queremos fazer aqui uma apreciação dessa política, porque isso seria totalmente inoportuno e descabido. Neste momento trata-se é de votar uma comissão com o objecto de analisar actos do Governo e da administração que, pela sua menor transparência, possam, eventualmente, levantar suspeitas sobre a dignidade das instituições democráticas. O objectivo da comissão parlamentar de inquérito é, exactamente, o de analisar actos que, aliás, são anteriores à formação do actual governo que o Partido Socialista apoia. Por conseguinte, nem sequer se coloca a questão de a zona de incerteza incidir sobre o comportamento e as acções do actual Executivo.
Nestas matérias consideramos que o mais indesejável é que as dúvidas pairem indefinidamente. Julgo, até, que as comissões parlamentares de inquérito devem não só constituir-se, mas também funcionar com eficácia, porque é preferível ter conclusões, ainda que desagradáveis, do que não ter nenhuma conclusão, sendo sempre possível a especulação e a exploração indefinida de problemas que, pela sua complexidade e alta sensibilidade, não sejam imediatamente perceptíveis, estando sujeitos a uma avaliação equívoca.
O pior que nos poderia acontecer era banalizarem-se as comissões parlamentares de inquérito e esvaziá-las
de sentido e permitir àquelas que requerem a formação dessas comissões levantar especulações e suspeitas sobre o objecto dessas mesmas comissões.
Por isso mesmo, fazemos votos que esta comissão conclua rapidamente as suas investigações.
Não é correcto que num Estado democrático possa existir uma comissão deste tipo durante 2, 3 ou 4 anos. Esta Assembleia deve tomar conhecimento das conclusões do inquérito. Nesse sentido, o Partido Socialista e os seus deputados estarão disponíveis para que os trabalhos da comissão decorram em bom ritmo e bom estilo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sentido do nosso voto favorável à criação desta comissão está Perfeitamente explícito. Por conseguinte, não é legítimo retirar da nossa atitude qualquer outro sentido senão aquele nas minhas palavras.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Tenho a impressão que o Sr. Deputado fez uma afirmação que eu reputo de extremamente periga - embora compreenda que a tenha feito- e que está em contradição com a parte final da sua intervenção.
O Sr. Deputado disse que não se poderia permitir que as comissões de inquérito fossem banalizadas, que se fizessem inquéritos por tudo e por nada. Mas antes fez a tal afirmação que eu considero perigosa, ou seja, que o Partido Socialista votaria todas as comissões de inquérito. Acho que as comissões de inquérito não podem ser votadas por principio, sob pena de cairmos na sua banalização. Se todos tivermos a posição de, por princípio, votar favoravelmente todas as comissões de inquérito, correremos um risco grande da sua banalização. Penso que as comissões de inquérito devem ser votadas caso a caso.
Devo dizer-lhe que, pela minha parte como tive ocasião de dizer na minha intervenção, por princípio, não teríamos votado este pedido de inquérito se ele se referisse, em exclusivo, à actuação do actual governo. Nessa matéria, em nosso entender, não foram avançados indícios suficientes que justificassem o inquérito, porque o que aqui está em causa não é a bondade ou a maldade da política do Governo, mas sim indícios que nos levem a supor da existência ou não de irregularidades praticadas pelo governo.
Votamos favoravelmente, porque o inquérito abrange uma parte em relação à qual continuamos a pensar que há indícios de irregularidades em tudo o que diz respeito ao prosseguimento do inquérito que foi votado por nós e também pelo Sr. Deputado em relação ao Governo em que era Ministro o Sr. Engenheiro Cardoso Cunha.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Serão talvez interpretações diferentes das palavras do Sr. Deputado, mas pareceu-me ouvir que não era admissível que se banalizassem as comissões de inquérito e que por esta via se estivessem sistematicamente a levantar suspei-

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Pergunto-lhe se considera que, no caso presente, estamos a utilizar meramente a comissão de inquérito com o fim de levantar suspeições.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage deseja responder?
V Sr. Carlos Lage (PS): - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Basilio Horta.
O Sr. Basilio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: E apenas uma curta declaração no sentido de dizer que o CDS vai votar favoravelmente a comissão de inquérito agora proposta, por duas ordens de razões.
Em primeiro lugar, por uma questão de coerência, uma vez que votou favoravelmente a primeira comissão de inquérito aqui proposta.
Em segundo lugar, porque entende que é útil que se apurem não apenas as motivações dos actos administrativos, que estão por detrás da liberalização agora posta em forma de lei, como também porque entende ser útil que se discuta o sentido da liberalização. Liberalizar significa concorrer, significa existência de mercado, e uma comissão desta índole não pode ficar indiferente a saber se nos sectores em causa estão criadas as condições para que essa concorrência se verifique.
Quanto à discussão de outras matérias, que poderiam ser abordadas, recusaremos fazê-lo nesta sede, mas sim na sede da comissão de inquérito. E aí que se deve discutir o tema em profunda, é ai que se devem apresentar as posições que devem consubstanciar as posições políticas de cada um dos grupos parlamentares aqui representados e não nesta sede.
O Sr. Presidente:- Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Penso, Sr. Deputado, que continuamos a laborar um equívoco. Creio que a comissão de inquérito não tem que se pronunciar sobre as motivações políticas do Governo, mas sim no sentido de saber se houve ou não irregularidades. Nem sequer, terá que discutir, em profundidade, das consequências, das razões, dos efeitos e das justificações da liberalização do comércio de cereais Poderá ter que discutir isso, eventualmente, como elementos enquadrados naquilo que é o seu objectivo fundamental, ou seja, apreciação da eventual irregularidade. O que não quer dizer que eu não subestime a importância desse debate.
Creio que a sua importância justifica que ele deva ter lugar quando se discutir a ratificação do decreto que liberaliza e que a discussão dessa ratificação pode ser antecedida de uma ampla discussão na comissão adequada. Penso é que devemos procurar utilizar os diferentes instrumentos e institutos que o Regimento nos dá, nos seus verdadeiros limites, sob pena de, a certa altura, andarmos sem saber os limites em que actuamos e numa terrível confusão entre competência, objectivos e matérias que estão a ser discutidas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Concordo com o Sr. Deputado Lopes Cardoso em que não é a comissão de inquérito a sede própria para se discutir da motivação política dos actue do Governo. O que eu disse foi que a comissão era a sede própria para discutir as motivações que levaram a certos actos administrativos. O Sr. Deputado utilizou a expressão irregularidade e eu não a utilizei, porque ela só pode ser utilizada depois da comissão de inquérito ter discutido e apreciado a matéria de facto sobre a qual se tem que pronunciar.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor:

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -.Falei em eventuais irregularidades. Não ousava afirmar a existência de irregularidades, antes de a comissão de inquérito se pronunciar.
O Orador: - Com certeza. E evidente que, nesse sentido, comungo também das suas preocupações.
Mas há também e aí estou em discordância consigo- uma segunda ordem de razões: a comissão de inquérito também não pode deixar de se pronunciar sobre a questão de o Governo dizer que quer liberalizar, sabendo-se, contudo, que a questão de liberalizar tem uma motivação política. No entanto, a comissão de inquérito tem de saber se é possível liberalizar, se é possível em certos sectores haver liberalização, se é possível que o mercado se forme, se é possível que a concorrência se verifique. E isto não pode V. Ex.ªdeixar de analisar numa comissão de inquérito. 15to não tem a ver com a decisão política de liberalizar, mas tem a ver com a possibilidade, que é prévia, de se poder liberalizar, por exemplo, no sector do açúcar. E isso cai, de pleno, sobre a comissão de inquérito. Aí não tenho dúvidas nenhumas que liberalizar não tem a ver com a opção política do Governo, mas sim com os pressupostos que são prévios a qualquer liberalização que se possa fazer.
Na minha óptica, isso é, de pleno, da competência da comissão de inquérito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições.
Está na Mesa uma proposta de resolução, a qual, perlo que já foi distribuída por todos os grupos parlamentares e que vou passar a ler.
O Sr. Joaquim Miranda (PC): - Dá-me licem,4. Sr. Presidente? E para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Independentemente da leitura dessa proposta de resolução que apresentámos, penso que o método correcto será votar primeiro a nossa proposta e do MDP/CDE de inquérito parlamentar e só depois desta votação se fazer a apreciação dessa outra proposta de resolução, que trata da constituição de uma comissão de inquérito.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da constituição de uma comissão de inquérito à EPAC.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lida a proposta de resolução referente à comissão de inquérito à EPAC que tem como primeiro signatário o Sr. Deputado Carlos Brito.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de
Os deputados abaixo-assinados apresentam a seguinte proposta de resolução:
Nos termos e para os efeitos do disposto nos artigo 181.º da Constituição e 221.º do Regimento, a Assembleia da República delibera constituir uma Comissão Eventual encarregada de proceder a inquérito sobre o processo de liberalização do comércio de cereais, ramas de açúcar e oleaginosas, com a seguinte composição:
3 deputados do Grupo Parlamentar do PS.
3 deputados do Grupo Parlamentar do PSD.
2 deputados do Grupo Parlamentar do PCP.
2 deputados do Grupo Parlamentar do CDS.
1 deputado do Grupo Parlamentar do MDP/CDE.
1 deputado do Agrupamento Parlamentar da UEDS.
1 deputado do Agrupamento Parlamentar da ASDI.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo apenas formular uma rápida explicitação dos fundamentos desta nossa proposta.
Penso que as razões que nos determinaram à presente formulação desta composição são evidentes, decorrendo de 3 ordens de razão.
Por um lado, decorre da representação, nesta comissão, de todos os grupos e agrupamentos parlamentares da Assembleia.
Por outro lado, pensamos que esta poderá ser uma comissão em que, tanto quanto possível, é respeitado o princípio da proporcionalidade, correspondente à distribuição dos partidos nesta Assembleia.
Numa outra ordem de razões, tenta-se não criar uma comissão extremamente alargada, que impossibilite uma operacionalidade desejada, assim o penso, por toda a Câmara.
Neste sentido, por estas 3 ordens de razões, propusemos esta composição, embora estejamos abertos a uma outra. Mas pensamos que esta, além de ser a mais correcta, corresponde também ao método e composição seguidas para outras comissões, noutros âmbitos. Pensamos que, com esta comissão, poderemos levar a bom termo o inquérito que agora foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente: Requeremos uma interrupção de 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Está concedida, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.
Eram 19 horas e 37 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 19 horas e 42 minutos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após uma análise sumária da composição desta Comissão, entendemos formular uma proposta de alteração, a fim de repor unta certa proporcionalidade e um maior equilíbrio na composição da comissão.
Neste sentido, propomos que se aumente o número de deputados do Grupo Parlamentar do PS de 3 para 4, ficando os restantes grupos parlamentares com o mesmo número de deputados.
Não vale a pena dar mais explicações sobre o sentido da nossa proposta. Por outro lado, se for necessário, faremos a sua elaboração por escrito.
Acrescentarei também que se o PCP não estiver de acordo, evidentemente que elaboraremos, nós próprios, uma proposta com a composição que propus, já que continuamos a ter uma maioria ampla nesta Assembleia!...
Risos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, requeremos também uma interrupção de 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a sessão por 5 minutos.
Eram 19 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 19 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo pronunciar-me sobre esta proposta do PS.
Começaria por dizer que nunca pensámos que cota a proposta de composição desta Comissão, estávamos a pôr em perigo esta maioria.

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De qualquer maneira, se os partidos do Governo entendem que devem ter nesta Comissão um número de deputados igual ao de todos os outros partidos, não nos oporemos a isso e consideramos, portanto, aceitável esta proposta de alteração do PS.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Carlos Lage, gostaria de saber se a alteração que propõe é uma questão de superstição, no sentido de afastar uma comissão composta por 13 deputados, que poderia ser nefasta ao Governo esperemos que sim, ou se se baseia na ideia de a maioria ter tantos deputados como todos os outros partidos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado:

Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, quanto â primeira parte do seu pedido de esclarecimento, digo-lhe que o CDS não tem, naturalmente, o monopólio da superstição, embora gostasse de o ter.

Risos.

Relativamente à questão da correlação entre maiorias e minorias, não me preocupei com isso. Quem se preocupa é o Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS):- Sr. Deputado Carlos Lage, continuo sem ser esclarecido.

Realmente, já percebi que o Sr. Deputado quer liberalizar a superstição mas, no entanto, não me esclareceu quanto às verdadeiras intenções, porque a declaração de há pouco não foi esclarecimento:

O Sr. Presidente - Para contrapor testar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Nogueira

de Brito, naturalmente que poderemos querer liberalizar a superstição, mas ninguém é obrigado a cair nela.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de resolução, com a alteração introduzida pelo PS, ficando portanto a composição da comissão
escalonada da seguinte forma: 4 deputados do Grupo Parlamentar do PS; 3 deputados do Grupo Parlamentar do PSD; 2 deputados do Grupo Parlamentar do
PCP; 2 deputados do Grupo Parlamentar do CDS, 1 deputado do Grupo Parlamentar do MDP/CDE; 1 deputado do Agrupamento Parlamentar da UEDS; e 1 deputado do Agrupamento Parlamentar da ASDI.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os diplomas entrados na Mesa e admitidos são os seguintes: projecto de lei n º 299/III, da iniciativa do Sr. Deputado Vidigal Amaro do PCP, sobre medidas de garantia do direito dos deficientes i1 habitação, que baixou à 2 º Comissão; ratificação n.º 79/III, da iniciativa do Sr. Deputado Lopes Cardoso e de outros Srs. Deputados da UEDS, do PCP e do MDP/CDE, sobre o Decreto-Lei n.º 67/84, de 24 de Fevereiro, que estabelece novo regime de comercialização de cereais.

Srs. Deputados, a próxima sessão será amanhã e tara início às 10 horas. A ordem do dia é a continuação da ordem do dia da sessão de hoje, não havendo período de antes da ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputado do Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Cecília Pita Catarino. José Manuel Pires das Neves.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alfredo de Brito. Francisco Miguel Duarte. bino Carvalho de Lima. Manuel Correia Lopes. Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social CDS:

Alexandre Carvalho Reigoto.
João Lopes Porto. José Augusto Gama.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Cândido Miranda Macedo.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

António Augusto Lacerda de Queiroz.
Fernando Monteiro do Amaral.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
José Angelo Ferreira Correia.
José Luís de Figueiredo Lopes.
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro Almeida.
Manuel Pereira.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Pedro Paulo Carvalho Silva.

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Partido Comunista Português (PCP):

António José Monteiro Vidigal Amaro.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Paulo Simões Areosa Feio.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos:
Em reunião realizada no dia 8 de Março de 1984, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
1) Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
Guido Orlando de Freitas Rodrigues (círculo eleitoral do Porto), por Serafim de Jesus Silva (esta substituição é pedida para o próximo dia 12 de Março corrente);
José Valério do Couto (círculo eleitoral da Guarda), por José Manuel Henriques Pires das Neves (esta substituição é pedida para os dias 2 a 16 de Março corrente, inclusive);
2) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:,
José Miguel Nunes Anacoreta Correia (círculo eleitoral de Leiria), por David José Leandro Duarte Ribeiro (esta substituição é pedida para os dias 8 a 13 de Março corrente, inclusive);
3) Solicitada pelo Movimento Democrático Português/CDE:
Raul Fernandes de Morais e Castro (círculo eleitoral do Porto), por António Monteiro de Almeida Taborda (esta substituição é pedida por
um período não superior a 6 meses, a partir do passado dia 3 de Março corrente inclusive);
4) Solicitada pelo Agrupamento Parlamentar da União de Esquerda para a Democracia Socialista:
António César Gouveia de Oliveira (círculo eleitoral de Faro), por Dorilo Jaime Seruca Inácio (esta substituição é pedida por um período não superior a 15 dias, a partir do próximo dia 13 de Março corrente, inclusive).
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD).- Secretário, José Manuel Moita Nunes de Almeida (PCP). - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS)- Bento Elísio de Azevedo (PS)- Manuel Fontes Orvalho (PS)José Maria Rogue Lírio (PS) - Luis Silvério Gonçalves Saias (PS) - José Luís Diogo de Azevedo Preza (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD)- Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - João Amónio Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE)- Amónia Poppe Lopes Cardoso (UEDS)- Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Os Redactores: Ana Maria Marques da Cruz - José Diogo.

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