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17 DE MARÇO DE 1984 3765

Tive ocasião de declarar nesta Câmara que o Partido Socialista não impugnaria qualquer espécie de articulado sobre esta matéria em que esta questão essencial não fosse reproduzida.
O Partido Comunista Português dividiu em 4 projectos de lei o projecto ultimamente rejeitado e apresentou-os à Câmara. Sem curar da sistemática interna e dos problemas de interacção ou da própria autonomia dos 4 diplomas, que só poderemos discutir na generalidade e, no caso de serem aprovados, na especialidade, entendeu-se que em relação a 2 deles, e na base destes princípios, nada havia a objectar quanto à sua admissão atempadamente aceite pelo Sr. Presidente.
Em relação aos outros 2 projectos de lei, que agora vêm impugnados, verificou-se que o princípio essencial que motivou a recusa do diploma primitivo se mantém. Isto é, o princípio de o Estado se substituir aos particulares, aos devedores para pagar salários em arraso subrogando-se nos direitos dos credores em relação aos devedores.
Na base deste somatório de fundamentos e razões interpusemos o recurso que agora está em apreciação.

É isto o que tenho a dizer sobre esta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com estes recursos, agora fundamentados, cremos que a Assembleia da República ficou colocada perante um grave problema político e institucional. Creio estar aberto um conflito - aberto está, é visível -, não se sabe nem é possível vislumbrar como é que vai acabar. Preocupam-nos as suas repercussões sobre o prestígio da própria Assembleia da República e sobre a sua imagem junto dos cidadãos, em particular junto dos trabalhadores, escusado seria dizer em particular junto dos trabalhadores com salários em atraso.
Receamos mesmo que se dê da Assembleia a pública imagem de quem está, no fraseado de um Ministro do Governo vigente, a discutir as índias enquanto a nau se afunda. Estamos a fazê-lo demais nestes dias porque pelo país fora alastra, como é sabido, a praga dos salários em atraso.
Há dias, o Governo anunciava a existência de um relatório oficial - que, porventura, pecará apenas por defeito -, no qual se refere que, actualmente, os salários em atraso atingem em Portugal 21,6 milhões de contos, envolvendo 92 299 trabalhadores ao serviço de cerca de 600 empresas. O estudo surge qualificado como exaustivo e vigoroso, vai ser apresentado em breve e especifica ainda que são 317 as empresas onde se verificam atrasos no pagamento de salários enquanto outras têm outro tipo de dívidas para com os trabalhadores.
Obviamente, a distribuição regional destes dados é diversa, varia, e há sectores económicos em que a situação é dramática, em que o ponto de ruptura já terá sido atingido.
Pois bem, foi precisamente para evitar que essa situação acontecesse com as dimensões que hoje atinge, que em Novembro apresentámos o projecto de lei
que esta maioria, fechando ouvidos ao alerta que trouxemos, rejeitou.
A situação alastrou deste então, sem dúvida agravou-se - todos o reconhecem -, a tal ponto que, no termo da interpelação que o PCP aqui fez sobre esta questão, o Governo, que em Novembro não vislumbrava nem uma medida nem uma responsabilidade para dar resposta à situação criada, vislumbrava já nada mais nada menos que 16 medidas de natureza diversa que não concretizou nem explicitou através de propostas formalizadas com os requisitos constitucionais.
Foi precisamente nessa altura que propusemos que a Assembleia da República desse força de lei - apenas isto, força de lei- a algumas das orientações que, na própria análise governamental e na dos deputados das bancadas governamentais, se revelaram imprescindíveis para dar resposta à situação criada.
No nosso projecto as propostas que tínhamos apresentado em Novembro foram ampliadas e reformuladas, foram reenquadradas, e onde primava o avulso procurámos gizar uma arquitectura legal tendente à recuperação das próprias empresas, ao estabelecimento de um faseamento na adopção das medidas, etc.
Tudo isto, Srs. Deputados, tivemos ocasião de ver aqui discutido, ampla e profundamente, há pouco tempo. Portanto, não vale a pena reproduzir o que dito está.
O que sabemos é que a maioria impediu que esse projecto que apresentámos fosse admitido para apreciação de fundo. E, ao fim de longas horas de debate - cujo registo tive ocasião de ler, pois estava ausente do País quando ele se desenrolou -, discutindo o recurso interposto, não se extrai mais do que esta acusação: «O PCP está a apresentar um projecto diferente» - e era reconhecido que o projecto era diferente - «mas filiado no mesmo princípio. Como a maioria discorda desse princípio, logo o projecto não pode ser admitido». E este o raciocínio.
Que princípio é que é esse? Bom, aí há uma diferença de opiniões entre o Governo e alguns deputados governamentais. O Governo diz que o «princípio maldito» é o de que o Estado não deve co-envolver-se ou co-responsabilizar-se na gestão de empresas privadas; a maioria diz, mais sucintamente, que o Estado não deverá substituir-se às empresas no pagamento de salários.
Durante horas foram aqui provadas, de forma concreta e documentada, as numerosas e significativas diferenças de conteúdo preceptivo entre o nosso projecto de Novembro e aquele que apresentámos na sequência da interpelação. Tudo inútil, pois o nosso projecto não foi admitido.
Foi então que, como o Sr. Deputado José Luís Nunes referiu, autonomizámos em quatro projectos de lei o que então constava de capítulos de um só projecto. A maioria impugnou e aqui estamos.
Sendo lamentável esta impugnação ela é, no entanto, clarificadora. E isto porque, espantosamente, a maioria só se opõe agora à admissão de 2 dos 4 projectos, isto é, de 2, das 4 partes, do nosso projecto apresentado no termo da interpelação.
Isto quer dizer, desde logo, que a maioria nada objecta às propostas de intervenção na gestão de empresas com salários em atraso com vista à sua recuperação, o que, segundo o Sr. Ministro Almeida Santos, contraria o princípio «sacrossanto» da não