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4212 I SÉRIE - NÚMERO 99

este facto - a elaboração de um código que estabeleça um regime uniforme para todas as consultas por sufrágio directo e secreto.
Cabe acrescentar aqui que a adopção da técnica legislativa que prevaleceu na elaboração do nosso projecto de lei ou de outra que remeta para legislação já existente (com as necessárias adaptações) o processo das consultas locais é, para nós, neste momento, problema de somenos importância.
Por isso mesmo sobre ele nos não demoraremos.
Também o projecto de lei prevê a necessária apreciação pelo Tribunal Constitucional da constitucionalidade e legalidade das consultas locais. Para essa apreciação se propõe um processo que se considera relativamente expedito, mas ainda aqui nos não parece que residam os aspectos fundamentais do debate que hoje tem lugar.
Ficam como questões, do nosso ponto de vista essenciais, a eficácia das consultas locais (deliberativa ou consultiva) e a competência para desencadear o processo dessas consultas sem que esteja aqui em causa a competência -limitada constitucionalmente- para decidir sobre a sua efectiva realização.
Sobre este último aspecto, a Constituição não deixa margem para dúvidas: a realização (entenda-se, portanto, a decisão sobre essa realização) de consultas locais cabe em exclusivo aos órgãos autárquicos.
E aqui devo adiantar desde já que uma melhor reflexão nos decidiu a apresentar uma proposta de alteração ao nosso projecto de lei, que vai no sentido de conceder aos órgãos executivos das autarquias--tal como o projecto de lei concede já às assembleias - competência para decidirem da realização de consultas locais.
Na verdade, o n.º 3 do artigo 241.º da Constituição atribui essa competência aos órgãos autárquicos em geral e não pode a lei limitá-la a qualquer um deles.
Mas, dito isto, se a decisão quanto à realização de consultas locais cabe, nos termos da Constituição, aos órgãos autárquicos, nada impede que a lei reconheça aos cidadãos, satisfeitas certas condições, o direito de suscitarem das assembleias representativas do poder autárquico (de freguesia, municipais ou regionais) deliberação sobre essa matéria.
Tal é o mecanismo que se propõe no artigo 6.º do projecto de lei n.º 169/III.
Preferível seria, do nosso ponto de vista, que à iniciativa popular fosse atribuída maior eficácia, sendo-lhe reconhecida capacidade para desencadear obrigatoriamente o mecanismo das consultas locais.
A Constituição afasta, contudo, tal hipótese.
Ir ainda mais longe, negando à iniciativa dos cidadãos o simples poder de obrigar as assembleias locais a deliberar sobre as consultas, é, no fundo, transformar, sem equívoco, essas consultas num instrumento colocado tão-só na disponibilidade dos órgãos das autarquias para dele usarem conforme os seus interesses próprios.
E nem se diga que a fórmula proposta é geradora de conflitos susceptíveis de conduzirem a uma situação de instabilidade do poder local.
Em primeiro lugar, porque se conflito existir ou puder existir entre os cidadãos de determinada autarquia e os seus órgãos próprios, esse conflito não se sanará escamoteando-o, mas terá de ser ultrapassado pelo confronto democrático das vontades.
Em segundo lugar, porque, nos termos da Constituição e do projecto de lei que necessariamente a respeita, aos órgãos autárquicos cabe sempre a decisão final sobre a realização das consultas.
Bem mais grave parece ser a instabilidade, não tão rara quanto possa pensar-se, que tem nascido do facto de os executivos autárquicos funcionarem, com frequência, como mini-assembleias de representações partidárias e dos jogos de poder que por essa via se desenvolvem e conduzem pelo simples manipular do «quórum» ou das demissões em «cascata» à sua queda, não raro à revelia da vontade dos cidadãos, como tantas vezes os factos o vêm a posteriori a demonstrar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O mecanismo proposto, que, nos termos da Constituição, limita a competência para decidir da realização de consultas locais aos órgãos autárquicos mas admite que a iniciativa da decisão possa ser suscitada por grupos de cidadãos eleitores, visa impedir que as consultas fiquem apenas na disponibilidade daqueles órgãos, mas que simultaneamente se não transformem - sobretudo numa fase que se entende deve ser de acumular de experiência- em factor incontrolado de instabilidade.
Retirar neste quadro, de significativas cautelas, toda e qualquer iniciativa aos cidadãos será, ao fim e ao cabo, despir de qualquer significado as consultas locais.
Não foi com certeza com esse objectivo, não foi com certeza com o intuito de dar com uma mão o que depois se retiraria com a outra, que a revisão constitucional acolheu a figura das consultas locais.
A opção que a Assembleia finalmente venha a fazer quanto ao modo como pode ser desencadeado o processo conducente a uma tomada de decisão sobre uma eventual consulta local traduzirá o seu entendimento maioritário quanto ao que pode e deve ser desde já a «democracia participativa» e que caminhos se devem percorrer nesse sentido.
Tão importante como essa decisão é para nós também a que vingar quanto à eficácia das consultas locais.
Aqui entenderam os legisladores constituintes de 1982 desnecessárias grandes cautelas, remetendo para a lei ordinária a determinação da eficácia das consultas directas. Fizeram-no decerto por entenderem suficientes as cautelas com que haviam rodeado a competência para deliberar sobre a efectivação dessas consultas.
O articulado constitucional deixou assim a porta aberta a uma de 3 soluções quanto à eficácia das consultas locais: deliberativa, consultiva ou deliberativa ou consultiva, consoante as circunstâncias, cabendo então à lei definir quando e como a eficácia da consulta assumiria uma ou outra natureza.
O entendimento que temos da participação popular, a necessidade que sentimos de impedir que os instrumentos dessa participação se não transformem numa falsa aparência e em instrumentos de logro, mais do que da expressão da vontade popular, inclinar-nos-ia, à partida, para que às consultas fosse reconhecida sempre a eficácia deliberativa.
Na verdade, pode perguntar-se: a não ser assim, que significado terão elas' afinal? A eficácia deliberativa não está intrinsecamente ligada à própria razão de ser da consulta?