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I Série - Número 118 Quarta-feira, 6 de Junho de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE JUNHO DE 1984

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais
Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes do Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.º 91 a 98 do Diário da Assembleia da República.
Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e das respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Bagão Félix (CDS), a propósito da política fiscal e da política de protecção social, considerou que às palavras do Governo não correspondem actuações justas e equitativas, terminando por considerar urgente o inadiável a reforma do sistema económico e social Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento e a protestos dos Srs. Deputados Rocha de Almeida e Almerindo Marques.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Luísa Cachado (PCP) considerou que, da acção incompetente à omissão, a política governamental no sector da educação tem vindo a conduzir o país para o desastre. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Lemos Damião (PSD), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Agostinho Domingues (PS) e Agostinho Branquinho (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Luís Monteiro (PSD), a propósito da comemoração do Dia Mundial do Ambiente, referiu-se a algumas consequências da progressiva desertificação de vastas áreas, apontando como principal causa directa a acção humana.
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE), considerando que o projecto colectivo tem vindo a ser subvertido com violência, considerou persistirem, tanto na estrutura económica, social e cultural como no plano ideológico, relevantes factores de transformação que se expressam na dinâmica social, numa perspectiva da defesa e do aprofundamento da democracia.
Ordem do dia. - Foram apreciadas e aprovadas as contas da Assembleia da República relativas ao ano de 1983, tendo o Sr. Deputado Magalhães Mota (ASDI) produzido uma intervenção.
Após ter anunciado a entrada na Mesa de vários diplomas, o Sr. Presidente declarou encerrada a sessão às 20 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Selteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José Santos Meira.
António Manuel do Carmo Saleiro.
Beatriz Almeida Cai Brandão.
Belmiro Moita da Costa.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luis Cordeiro.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.

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Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Hermínio Martins de Oliveira
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Luís Duarte Fernandes.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja S. dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Bastos Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luis Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barrai.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de Orneias Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Evangelista Rocha de Almeida
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro
Jorge Nélio Ferraz Mendonça.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Fernando Gonçalves Riquito.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva

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Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias M. Coutinho Lencastre
João Gomes de Abreu Lima.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
Helena Cidade Moura.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Estão em aprovação os n.ºs 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97 e 98 do Diário da Assembleia da República, respeitantes às reuniões plenárias de 29 e 30 de Março passado e de 3, 5, 16, 17, 25 e 26 de Abril último.

Pausa.

Não havendo nenhuma oposição, consideram-se aprovados.

Vai ser lido o expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente
Moção

Da Assembleia Municipal de Valpaços repudiando a pretensão da extinção do posto da PSP daquela localidade, por considerar que a mesma reúne as condições necessárias para que o referido posto se mantenha.

Carta

e Abílio Vieira, residente no Porto, solicitando providências para que a legislação da Caixa Nacional de Pensões seja alterada, de molde a que sejam rectificadas algumas pensões para o seu real valor.

Ofício

Da Junta de Freguesia de Pataias manifestando o seu reconhecimento a esta Assembleia pela votação unânime da elevação a vila da povoação de Pataias.
Da Câmara Municipal de Coimbra a enviar, a pedido do Grupo Folclórico Estrelas de Arzila, uma cópia de um colóquio realizado recentemente e subordinado ao tema «Paul de Arzila. Que soluções?».
Da Junta de Freguesia de Medas, a enviar uma exposição assinada pelos presidentes das juntas de freguesia do alto do concelho de Gondomar, na qual solicitam a construção urgente de uma escola do ciclo preparatório na freguesia de Medas.
Da Casa da Beira Alta, no Porto, remetendo as conclusões de um debate sobre a serra da Estrela, realizado naquela localidade, para as quais solicitam a melhor atenção.

Telegrama

De José Luís Machado, informando do regozijo do povo da povoação de Benedita pela sua elevação a vila, solicitando seja transmitido à Assembleia o agradecimento da população.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes:

Dia 29 de Maio de 1984 - ao Governo e a diversos ministérios (14), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Santana Lopes; à Secretaria de Estado das Pescas (2), formulados pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha; a diversos ministérios (2) formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Justiça (2), formulados pelo Sr. Deputado José Magalhães e outros; aos Ministérios do Equipamento Social e da Educação (2), formulados pelo Sr. Deputado Silvino

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Sequeira; à Secretaria de Estado da Energia, formulado pelo Sr. Deputado Gaspar Martins; ao Ministério da Saúde, formulado pelos Srs. Deputados Vidigal Amaro e José Magalhães; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelos Srs. Deputados Lino Paulo, Anselmo Aníbal e Ilda Figueiredo.
Dia 30 de Maio de 1984 - ao Ministério do Equipamento Social e à Secretaria de Estado das Obras Públicas (5), formulados pelo Sr. Deputado Jaime Ramos e outros; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelos Srs. Deputados João Abrantes e Reis Borges; ao Ministério da Justiça, ao Conselho Superior da Magistratura e à Procuradoria-Geral da República (4), formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães e outros; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Guido Rodrigues; ao Ministério das Finanças e do Plano, formulado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Góes; ao Governo e a diversos ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; à Secretaria de Estado das Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Araújo Guedes.
Dia 31 de Maio de 1984 - ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Anacleto Baptista; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelos Srs. Deputados Coelho Pires e Manuel Lopes; aos Ministérios das Finanças e do Plano e do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira; ao Governo e ao Ministério da Justiça (6), formulados pelo Sr. Deputado José Magalhães e outros; à Câmara Municipal do Porto, formulado pelo Sr. Deputado Laranjeira Vaz.
Entretanto, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, nas sessões de 23 de Junho, 14 de Setembro, 13 e 20 de Janeiro, 7 e 16 de Fevereiro e 16 de Abril; Figueiredo Lopes, na sessão de 5 de Julho; António Mota e Carlos Espadinha, na sessão de 21 de Novembro; José Lello, na sessão de 22 de Novembro; Fillol Guimarães, na sessão de 23 de Novembro; Ribeiro Arenga, na sessão de 25 de Novembro; Lacerda de Queiroz, na sessão de 3 de Janeiro; João Abrantes e Anselmo Aníbal, nas sessões de 12 e 19 de Janeiro; Jorge Lemos, nas sessões de 20 de Janeiro e 28 de Fevereiro; Gomes de Pinho, na sessão de 25 de Janeiro; Jorge Góes e Rogério de Brito, na sessão de 3 de Fevereiro; Agostinho Branquinho e outros, na sessão de 9 de Fevereiro; Custódio Gingão, Avelino Rodrigues e Ricardo de Barros, na sessão de 9 de Fevereiro; Ilda Figueiredo, na sessão de 10 de Fevereiro; António da Costa e Cunha e Sá, na sessão de 16 de Fevereiro; Ferdinando Gouveia, na sessão de l de Março; Leonel Fadigas, na sessão de 9 de Março; Santos Correia, na sessão de 16 de Março; António Gonzalez, na sessão de 19 de Março; António Mota e Joaquim Miranda, na sessão de 22 de Março; Fernando Costa, na sessão de 27 de Março; Pedro Alves, na sessão de 16 de Abril, e Octávio Teixeira, na sessão de 17 de Abril.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As grandes opções do Plano para 1984, aprovadas nesta Câmara pela actual maioria, referem no sector dedicado à política de preços e de rendimentos que «embora não seja possível aumentar os rendimentos reais da generalidade da população devido às necessidades de estabilização financeira, o Governo evitará que se agravem as disparidades na distribuição de rendimentos, o que será conseguido através da política fiscal e da segurança social».
No que concerne à política fiscal parece suficientemente provado que, ao contrário do propósito formal do Governo, esta tem sido conduzida nas ópticas estritamente contabilística, administrativa e orçamental, isentas de preocupações de eficácia económica e de equidade social, alimentando em exclusivo uma administração pública desmesurada com tendência para um crescimento automático e vegetativo e um sector do Estado, dito empresarial, apenas produtor de poupança negativa.
E se é certo que o nosso sistema fiscal sofre desde há muito de profundas distorções, bem se pode dizer que durante l ano de vigência este governo se «limitou» a fortalecer o Estado tributário, penalizando, ainda mais. aqueles que constituem a principal parcela do sacrifício, ou seja os trabalhadores por conta de outrem e as empresas rentáveis e de capitais próprios, através de impostos extraordinários; da não actualização de escalões, da taxa municipal de transportes.

O Sr Anacoreta Correia (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Um ano que, pelos vistos, parece ter sido manifestamente escasso para produzir reformas de fundo, mas que foi mais do que suficiente para distorcer e agravar os impostos. Para continuar a alimentar impostos que não redistribuem e não corrigem, mas produzem elevados gastos administrativos. Para continuar a dificultar a melhoria da relação entre capitais próprios e capitais alheios nas empresas. Para aumentar os impostos directos, diminuindo as motivações para o trabalho, para a poupança e para o investimento, desincentivando a assunção do risco e favorecendo a subida em flecha das actividades paralelas e da economia clandestina.
Para, enfim, agravar receitas e taxas que apenas autojustificam a existência de serviços desnecessários e produtores de elevada burocracia.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Mas para além do campo fiscal, alguns aspectos tornam evidentes, no âmbito da política de protecção social, que às palavras do Executivo não correspondem actuações justas e equitativas.
Não se coloca o CDS na posição fácil, demagógica e populista de tudo exigir, sem a consideração serena das dificuldades actuais, designadamente no que se refere ao financiamento dos orçamentos sociais.
Mas porque entendemos a democracia como a expressão pública dos desacordos nas políticas propostas e executadas (o que pressupõe igual responsabilidade e sentido ético por parte das maiorias e das minorias), não podemos deixar de registar alguma inércia social num momento de profunda deterioração das condições de vida dos portugueses.
E se temos consciência de que o social não pode ser desinserido da economia, constituindo esta verdadeira matéria-prima daquele e que nem sempre é possível atingir o desejável, entendemos que o objec-

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tivo de minimizar o desvio entre o desejável e o possível é, nas políticas de protecção social, um imperativo moral e uma exigência de criatividade.
Temos vivido, nos últimos meses, sujeitos aos implacáveis primados da inflação e do desemprego, com uma acentuada inépcia governamental para fazer face aos efeitos nocivos da crise. Assim se têm vindo a corroer o poder de compra dos trabalhadores e dos titulares de rendimentos fixos e as reservas das empresas para investimento, se têm agravado os desequilíbrios 16 as injustiças sociais, se tem dificultado a criação de empregos e se tem desfavorecido o investimento produtivo e estimulado o especulativo.
Num momento em que assistimos à generalizada subida dos preços dos bens essenciais (nem todos nem totalmente justificáveis pela subida do dólar) seria de esperar do Governo o cumprimento do papel que à segurança social cabe como garantia de um rendimento social de compensação, nomeadamente, por encargos familiares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E se é certo que uma política indiscriminada de subsídios aos preços é, em parte, socialmente injusta, porque subsidia consumos e não a pobreza, porque não distingue activos e reformados, nem nacionais e estrangeiros, não se pode deixar de defender a existência de compensações e complementos sociais para as famílias mais carenciadas de modo a dar a expressão real à diferença entre o rendimento individual e o rendimento social dos cidadãos.
Aliás, na discussão do Orçamento para 1984, embora o CDS tenha considerado o Orçamento da Segurança Social como conformista, não deixou de salientar como positivo o propósito do Governo em manter o princípio da actualização anual das prestações e benefícios sociais, no seguimento do concretizado nos últimos 3 anos, de modo a preservar o seu poder aquisitivo, apesar do recuo que tal significava em relação às promessas eleitorais do PS (as tais que o Dr. Mário Soares diz, agora, não ter feito) que propunham a indexação automática.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Verificamos, agora, que, perante todo este condicionalismo social e apesar de o Estado ter aumentado este ano substancialmente a sua contribuição para a segurança social, ainda não foram actualizados os valores do abono de família, dos restantes subsídios familiares e das prestações para os deficientes, um ano já decorrido após a última valorização.
O CDS não pode deixar de elevar a sua voz para exigir o imediato cumprimento deste princípio, que embora ignorado entre 1974 e 1979, vinha sendo integralmente executado desde 1980 e que, afinal, é uma das formas de dar corpo à feliz expressão: «dar e receber contribuir quando se deve, receber quando se precisa», que agora se ouve e lê nos meios da comunicação social.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Mas outros aspectos da política social nos preocupam igualmente. O seguro de desemprego tarda em concretizar-se num momento em que este
atinge já 11 % da população activa; para os salários em atraso, que deixaram de ser um problema particular para ter uma dimensão nacional, não se definem as regras do jogo com coragem e frontalidade; os medicamentos vêem a sua comparticipação alterada, num sentido que embora formalmente correcto, agrava excessivamente alguns dos custos a suportar pelos doentes e exorta, noutros casos, ao excesso de consumo e ao aparecimento de desperdícios sociais.
Não se descentraliza o papel e a responsabilidade dos agentes sociais, congelando-se, por exemplo, a devolução dos hospitais concelhios às misericórdias e preferindo-se em alternativa a «reestruturação» de serviços burocráticos da saúde, geradores, apenas, de mais pessoal e de mais promoções.
Agrava-se a situação financeira da segurança social, em parte devido às dificuldades económicas e empresariais, mas também por laxismo dos serviços.
Agrava-se, inexplicavelmente no contexto das actuais dificuldades, a taxa de mora que pode ir agora até 60,5 % ao ano, mas não se pagam ou deixam-se atrasar os compromissos assumidos pelo Estado em relação às misericórdias e não se actualizam os benefícios sociais, cavando o fosso ético entre o Estado credor e o Estado devedor.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Congela-se a protecção social no desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego ao mesmo tempo que se suspende o programa de ocupação de tempos livres, medida justificada por dificuldades financeiras de um departamento que orçamentou 1,2 milhões de contos para o lay off, até agora sem aplicação.
E no meio de tudo isto, o Sr. Primeiro-Ministro aponta na TV que a ousada e estrutural medida (as palavras são do Primeiro-Ministro) a tomar proximamente é a venda aos inquilinos das casas do Estado e da Previdência, esquecendo, talvez por má informação, que no plano legislativo estas medidas foram já tomadas pelo anterior governo (Decreto-Lei n.º 31/82, de 1 de Fevereiro, e Portaria n.º 419/83, de 11 de Abril).

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em suma, poder-se-á dizer que, no plano social e também económico, a acção do Governo se tem caracterizado por:

a) Um excesso de verbalismo e de gosto de retórica, em detrimento das acções concretas;

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador:

b) Uma miopia dos efeitos sociais da crise, a confundir-se, por vezes, com alguma desumanização e excessivo financismo na consideração dos problemas;
c) Separação académica do ataque à conjuntura e do lançamento de reformas de progresso económico e social;

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d) Cedência aos neocorporativismos de pressão, mais ou menos difusos, favorecendo a segmentação dos interesses;

e) Gestão do consenso como uma realidade abstracta e como um fim em si mesmo, em vez de um instrumento eficaz para obter resultados concretos;

f) Desmobilização dos cidadãos e dos agentes sociais e económicos para as tarefas de combate à crise.

Por tudo isto, para o CDS é urgente e inadiável a reforma do nosso sistema económico e social.
Está visto e provado que o progresso económico proporcionou sempre um progresso social superior ao que permite o estatismo e o igualitarismo. E para que haja progresso económico é imprescindível diminuir o peso do Estado na actividade económica, sem perder de vista o necessário reforço da solidariedade. Solidariedade, Srs. Deputados, alicerçada na sociedade e não exclusivamente imposta pelo Estado. Um sistema afinal que, no plano social, permita um nível de protecção adequado, que contenha fortes incentivos para o trabalho e para o investimento e que tenha um custo burocrático moderado.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Bagão Félix, os Srs. Deputados Rocha de Almeida e Almerindo Marques.
Tem, pois. a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado Bagão Félix, o meu grupo parlamentar entende que de todos os Srs. Deputados aqui presentes V. Ex.ª é, sem sombra de dúvida, a pessoa melhor colocada para intervir, de forma consciente e com razões fundamentadas, sobre os problemas da Segurança Social.
A ninguém passa despercebido o à-vontade com que V. Ex.ª se movimenta neste campo, não tivesse o Sr. Deputado exercido, durante bastante tempo, as funções de Secretário de Estado da Segurança Social!
É por isso, porque V. Ex.ª conhece este campo, que o meu grupo parlamentar não pode deixar passar em claro a tentação em que V. Ex.ª caiu ao vir aqui fazer um exercício entrosado de alguma demagogia.
Queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que o Governo não tem, felizmente, entrado de forma demagógica, em aumentos incontrolados na área da acção social. A crise obriga-o a tomar sentido das responsabilidades e das realidades actuais, crise essa que diminui drasticamente o poder de sobrevivência dos cidadãos.
Disse V. Ex.ª que não se pode distinguir o social da economia. E aqui a economia condiciona gravemente a realidade deste país! A crise, por um lado, deixa os nossos concidadãos com graves problemas de sobrevivência, mas a crise também não permite que o Governo decrete aumentos incontrolados.
No tocante ao abono de família, V. Ex.ª sabe que o seu processamento se está a fazer trimestralmente. Portanto, a colocar-se o problema em termos de Governo, o seu processamento seria somente em Julho e não antes, dado que só nessa altura se voltará a colocar esse problema ao Governo.
Quanto às prestações familiares, o Sr. Deputado Bagão Félix sabe que elas foram aumentadas em Dezembro e que o Governo fez aquilo que o Sr. Deputado, na altura Secretário de Estado, não pôde fazer - não vou aqui questioná-lo sobre isso -, que foi dar um aumento igual para o subsídio de Natal. Foi bastante criticada a atitude do então Governo da AD, mas por razões que V. Ex.ª terá e por razões que na altura defendemos é que isso não aconteceu. Este governo, muito mais em crise do que o de então, fê-lo, isto é, aumentou o subsídio de Natal.
Um outro aspecto que julgo útil referir aqui é o trabalho da comissão parlamentar e a apresentação por parte do Governo - e também por parte do CDS - da elaboração final da Lei da Segurança Social, em que se conseguiu complementar e tomar no seu conjunto uma lei de bases, ou uma lei quadro, que permita aos cidadãos portugueses poderem saber do seu futuro. Dessa forma, os cidadãos passarão a ser dotados de uma lei de bases que, tanto eles como o Governo, sabem que irá em breve existir, uma lei que determina os deveres e as obrigações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Bagão Félix, antes de proceder ao pedido de esclarecimento, faria uma consideração prévia.
De facto, o Governo corre o risco de usar verbalismos, excessos de retórica, excessos de abordagem académica das questões sociais, económicas e políticas. Mas penso que estes excessos podem, naturalmente, verificar-se também por parte das oposições. Gostaria, pois, que o Sr. Deputado fizesse a sua autocrítica com vista a saber se caiu ou não em semelhante erro.
Entretanto, o Sr. Deputado disse que haveria obrigações e eventualmente condições no sentido de se melhorar as prestações sociais ou de actualizá-las em tempo oportuno. E eu pergunto: considerando a situação actual do orçamento da Segurança Social, quais as receitas que iria mobilizar para o efeito, tendo em conta a evolução da economia da sociedade portuguesa? Não sendo possível ajustar as receitas a esses aumentos de despesas, quais as formas alternativas para eventuais coberturas dos défices que isso ocasiona?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Relativamente à questão que o Sr. Deputado Rocha de Almeida me colocou, a primeira consideração que faço é que o Sr. Deputado vem, de certo modo, criticar a actuação dos anteriores governos quando, curiosamente, essa mesma bancada apoiou também a acção do anterior Secretário de Estado. Não sei, pois, qual das duas soluções é que será mais válida.
Entretanto, acusou-me de fazer demagogia, mas logo a seguir disse que no meu discurso referi que o social não é independente do económico, que estão interligados e que não se pode fazer social pela emissão de papel-moeda, que tem de ter um abastecimento no progresso económico.
Bem, essa é a prova real de que não fiz demagogia, de que fui razoável e, fundamentalmente, de que não

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exigi - utilizando a sua expressão - «aumentos incontrolados na área social».
O Sr. Deputado considera um aumento incontrolado na área social exigir a revisão, ao menos pela taxa de inflação, das prestações familiares e do abono de família quando os preços dos bens essenciais aumentam desta maneira? Penso que é razoável e que não é incontrolado.
Gostaria de lhe dizer que, por exemplo, entre 1980 e 1983, o abono de família aumentou 170 % e que as prestações para deficientes aumentaram 600 % Ora bem, não exigia 170 % nem 600 %; exigia a reposição do poder de compra das prestações sociais! Penso que isto não é incontrolado. E se um Sr. Deputado de uma bancada social-democrata considera «aumento incontrolado» o aumento das prestações sociais apenas no sentido de repor o poder de compra, então não sei qual é a sua social-democracia!

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Nas eleições dizem o contrário!

O Orador: - Quanto à questão processual que levantou sobre o abono de família, que está a ser processado trimestralmente, é verdade que o Sr. Secretário de Estado entendeu que o seu processamento deveria ser trimestral. Mas como o aumento do abono de família do ano passado começou a vigorar no dia 1 de Junho de 1983, o deste ano deveria passar a vigorar a partir do dia 1 de Junho de 1984. Ò mês de Junho, de acordo com os novos critérios, é pago em Maio, porque é pago no segundo mês do 2.º trimestre.
Portanto, como o dia 1 de Junho já passou pode é começar a vigorar no dia 1 de Agosto - 3.º trimestre -, eventualmente com efeitos retroactivos. Mas até agora tenho estado a basear-me em factos concretos.
O Sr. Deputado Almerindo Marques acusou a minha intervenção de ser retórica, de conter excesso de verbalismos. Em primeiro lugar, dando isso de barato, penso que é muito mais grave o verbalismo de um governo que tem a responsabilidade directa da administração do País do que o de uma oposição.
Mas o que acontece é que não usei a retórica nem o verbalismo; apenas me limitei, razoavelmente, com base em considerações de dificuldades indiscutíveis que aqui realcei, a procurar superar alguns efeitos da crise social.
Quanto à questão do financiamento, isto é, da cobertura para o aumento do abono de família, tive oportunidade de o dizer na minha intervenção na altura da discussão do Orçamento, até considerámos como positiva a intenção do Governo de actualizar as prestações sociais. Isto, até porque previ que esses valores, ou sejam, 28 % para o abono de família serviriam, mais ou menos, para repor o seu poder real relativamente ao ano anterior.
O Sr. Deputado não tem que me fazer essa pergunta; eu é que tenho de perguntar ao Governo e à actual maioria por que é que não têm os 28 % orçamentados. E não tem porque, certamente, tem havido uma execução incorrecta e deficiente do orçamento da Segurança Social, apesar do maior contributo que o Estado tem para essa área através dos impostos directos dissimulados. Tem havido uma diminuição brutal de receitas, mais elevada do que seria de esperar, e, por outro lado, não tem havido, em nosso entender, um esforço de maior moralização nas prestações sociais, e temos assistido a uma degradação no critério da sua atribuição.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se de novo, para protestar, os Srs. Deputados Rocha de Almeida e Almerindo Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado Bagão Félix, apenas um curto protesto.
Ao criticar actuações dos governos anteriores não estou contra as medidas que os governos anteriores tomaram. No âmbito da acção social e da Segurança Social todas as medidas que se tomam são boas, pelo que merecerão sempre aplauso da minha parte. Limitei-me a referir que este governo tomou medidas que os anteriores não tomaram e que eu louvo.
Quanto aos aumentos incontrolados, queria apenas dizer a V. Ex.ª qual é o meu conceito da palavra «incontrolados». Ê que um trabalhador ou pessoa que ganhe 50 contos ao esbanjar 20 talvez não esteja incontroladamente a gastar o seu salário; mas uma pessoa que só ganha 7 contos e gasta 10 de certeza absoluta que está incontroladamente a gastar.
Hoje, qualquer aumento tem de ser bastante ponderado. Na situação económica em que o País se encontra, o Governo não deveria entrar incontroladamente em aumentos que seriam justos para quem os recebe, mas que seriam uma injustiça no todo do País.

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Palavra de honra que não percebi nada!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage,

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Em primeiro lugar, quero dizer que não fiz qualquer acusação à intervenção do Sr. Deputado Bagão Félix; apenas lhe pedi para ser prudente, não fosse cair nos erros que estava a imputar a outrem.
Em segundo lugar, não reconheço que, neste caso, o Governo tenha praticado os erros que apontou.
Terceiro, em relação à questão de fundo que eu levantei, compreendi a sua conclusão, no sentido de que havia nova intenção de aumento do abono de família que não está ainda feito- e que, simultaneamente, reconhece que houve uma diminuição não esperada de receitas. Ora, não me disse como compatibilizar estas duas situações em formas de alternativas de cobertura dos défices. Apenas acrescenta que lhe parecia que havia uma má utilização de algumas prestações sociais, sobre o que penso não estar muito em desacordo consigo.
Quanto ao resto - receitas, despesas e sua cobertura -, o problema ficou por resolver. Será este, com certeza absoluta, o mesmo problema que o Governo tem!

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O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao protesto do Sr. Deputado Rocha de Almeida, eu registo as palavras que nele proferiu e que me pareceu terem pouco a ver com a lógica da sua primeira intervenção. Portanto, limito-me a registar as suas palavras, com as quais, aliás, estou de acordo.
Quanto ao protesto do Sr. Deputado Almerindo Marques, apenas lhe peço que não me exija aqui que diga como é que se hão-de resolver os problemas. É que eu agora não estou dentro do problema das despesas e, portanto, a única coisa que fiz foi explicar como é que ele foi agravado, estando orçamentado.
De qualquer maneira, deixe-me que registe a sua intervenção de carácter tão conformista como conformista era o orçamento da Segurança Social para este ano.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Cachado.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de quase 1 ano de gestão e perante o término do ano lectivo é evidente como, da acção incompetente à omissão, a política governamental, também no sector da educação, tem vindo a conduzir o País para o desastre. Os portugueses sentem como se torna irrespirável e poluído o futuro do País, porque questionado está o futuro da juventude.
Avesso à planificação, ignorando as mais modestas regras pedagógicas, menosprezando o bom senso, fazendo lei da incompetência autoritária, José Augusto Seabra retalhou e espartilhou o já débil tecido educativo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Comprou e vendeu medidas avulso, inaugurou placas em vez de escolas, decretou e propagandeou o ensino técnico-profissional como exemplo de rigor e austeridade, recusou um ano de actualização salarial a cerca de 900 professores, atropelou a lei, nomeou dezenas de grupos de trabalho como resposta a todos os problemas, dando provas de total ineficácia e incapacidade, pesquisou sanções alimentares e outras para as crianças que de barriga vazia e cabeça cansada não tivessem aproveitamento escolar, defendeu um orçamento de Estado que promulgava a degradação do ensino, a consequente insegurança da comunidade escolar e o obrigatório insucesso e abandono do sistema.
José Augusto Seabra conseguiu voltar contra si todas as estruturas representativas dos estudantes, dos professores, dos encarregados de educação, da opinião pública.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito mal!

A Oradora: - Hoje, ninguém, medianamente inteligente e minimamente responsável, se escusa à denúncia do perigo que corre a educação, nas mãos de tal ministro, no seio de tal Governo.

Aplausos do PCP.

Os deputados que integram a Comissão de Educação são testemunhas das dramáticas situações vividas de norte a sul do País por professores, alunos e encarregados de educação. Desde a não existência de instalações escolares, à degradação de outras, à falta de segurança das escolas, ao não recrutamento de pessoal auxiliar, pondo em causa o funcionamento de serviços fundamentais, como bibliotecas, gimnodesportivos, refeitórios, serviço social, tudo nos foi relatado em atitude de desabafo e apelo face à inoperância e alheamento das instâncias governamentais. Que perspectivas envolvem o início do próximo ano lectivo? Estejamos tranquilos e confiantes, porque em 12 de Abril, numa já célebre, porque anedótica, conferência de imprensa, José Augusto Seabra declarou e passo a citar: «Para resolver os problemas do arranque do próximo ano lectivo foram designados informalmente diversos grupos de trabalho». Estes e muitos outros grupos de trabalho foram os únicos medicamentos receitados durante o encontro com a comunicação social. No sector educativo nada goza de boa saúde, tudo está há muito tempo em observação, sem diagnóstico previsível, a não ser o da deterioração. No entanto, um dos grupos poderá ficar para sempre registado nos anais da história se descobrir a verba de 4 milhões de contos destinada a financiar um plano especial de construções escolares para os ensinos preparatório e secundário e que se perdeu. Segundo o Secretário de Estado Rodrigues da Silva a recuperação dos 4 milhões de contos, nesta data, nada resolverá atempadamente, o plano está irremediavelmente atrasado. Este plano permitiria resolver os problemas dos alunos excedentários em zonas escolares, onde, há já alguns anos, os alunos são obrigados a transferências e deslocações para zonas diferentes das suas residências.
Mas se o Governo é incapaz de vislumbrar a fome e a miséria que reina nos lares de tantas famílias, provavelmente ainda não elaborou, por falta de visão, o diagnóstico escolar e não sabe a quanto são obrigados aqueles que assumem a coragem de educar os seus filhos, luxo constitucional a que cada vez menos têm direito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - No entanto, apesar de todos os sacrifícios, é já impossível esconder a realidade, é já impossível disfarçar a miséria, a fome que habita no seio de muitos portugueses.
Em Abril, um grupo de professores primários da Escola n.º 5 da Baixa da Banheira, situada no Vale da Amoreira, declarava num debate sobre o ensino primário, e passo a citar: «Que fazer, interrogam-se os professores, com crianças que chegam esfomeadas à escola e adormecem na carteira como resultado da falta de alimentação; que fazer quando uma criança desmaia na aula, se leva ao hospital e se fica sujeito a que o seguro escolar queira obrigar os professores a pagar a consulta, só porque o médico não confirmou qualquer doença ou acidente considerado escolar, pois apenas desmaiou com fome como uma criança normal?»

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Vozes do PCP: - É um escândalo!

A Oradora: - Passou a ser normal, neste país, uma criança ter fome e por isso o Governo não o reconhece como facto digno de interesse. Mas a miséria não chega aos lares dos responsáveis por esta política de degradação, de destruição, ela escolhe as casas dos mais desfavorecidos e naturalmente as escolas. Também na Escola Preparatória de Luís António Verney, e durante uma conferência de imprensa, uma professora contava: «Há alguns dias um aluno lavado em lágrimas chorava que lhe tinham roubado o almoço. O seu almoço era um saco de plástico com uns 5 ou 6 papo-secos, sem qualquer conduto, que ele ia comendo durante o dia, acompanhados de goles de água. Chocada com a situação, conduziu o aluno ao conselho directivo, a fim de se encontrar uma solução para aquele caso e para aquele dia. E também para encontrar o autor de tão abusivo acto, Não foi preciso procurar muito. Os elementos do conselho directivo estavam a par da ocorrência. No posto médico tinha dado entrada havia alguns momentos uma criança desfalecida. Não estava doente, pelo menos de mal infeccioso. Tinha fome. Explicou que tivera tanta fome que roubara 2 papo-secos ao seu companheiro. Mas não fora o suficiente, ou se calhar caíra-lhe na fraqueza, não sabia explicar, só sentira que desmaiava ...»

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante factos reais, do País que nós somos e este Parlamento não pode alijar responsabilidades, não pode assistir como espectador passivo à agressão e à violação da sobrevivência de um povo.
Mas o próximo mês de Outubro não vai só fazer-nos menos escolas, menos reparações, mais insucesso, mais abandono por falta de condições económicas e cada vez mais insegurança na comunidade escolar. No início do próximo ano lectivo cerca de 193 000 crianças, do sector primário ao secundário, que até agora recebiam o subsídio do IASE, poderão ser impedidas de frequentar a escola por total irresponsabilidade governamental. São o próprio Secretário de Estado do Ensino Básico e o presidente do IASE que admitem esta hipótese.
O Governo prepara-se para, a partir do próximo ano lectivo, transferir para as autarquias o odioso de uma política educativa e que as restrições económicas empurram para um plano cada vez mais inclinado. É a educação pré-escolar, é o ensino básico na generalidade, são os transportes e as residências escolares, são as actividades complementares de acção educativa, é a educação de base de adultos. Como concretizar todo este amontoado de decisões sem que o Governo, autarquias, professores elaborem em conjunto um programa de regionalização do ensino devidamente quantificado e faseado no tempo como resposta para os múltiplos aspectos que essa regionalização envolve.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Como admitir qualquer transferência de competências sem que a mesma seja acompanhada dos meios financeiros e preveja os necessários apoios técnicos que a administração central, transitoriamente ou não, deverá continuar a prestar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à transferência para as autarquias dos transportes escolares existe mais um grupo de trabalho a estudar a regulamentação da questão e que deveria ter entregue o seu relatório até 31 de Dezembro de 1983, para permitir que os contratos habitualmente feitos com as transportadoras durante o mês de Março se tivessem concretizado. Mas a verdade é que até ao dia 24 de Maio o relatório não estava entregue. Afirma o Secretário de Estado do Ensino Básico que a verba destinada a esse fim, superior a 900 000 contos, foi já confiada às câmaras mas sem a indicação de que se destinava especificamente aos transportes escolares, pelo que, em alguns casos, foi já gasta noutros lados. Além disso, os critérios seguidos pela Secretária de Estado da Administração Autárquica na atribuição de verbas estão totalmente desfasados das realidades educativas. Só assim se entende que Lisboa e Porto, que dispõem de uma rede de transportes urbanos, recebam verbas muito superiores a municípios que deles não dispõem e que dependem, portanto, em absoluto, de verba especial atribuída. A regionalização do ensino viaja num barco sem remos. Ê a radiografia exacta de um governo desgovernado, prestes a encalhar e a afundar-se nas suas próprias águas.
Mas há mais factores de instabilidade. Por exemplo, os cursos técnico-profissionais, segundo o «iluminado» ministro José Augusto Seabra, constituem uma dinâmica que não tem retrocesso e a segunda fase triplicará os cursos existentes. Por outro lado, a Secretária de Estado-Adjunta do Ministro defendeu para os estágios do ensino técnico-profissional, e passo a citar, «que milionários de origem portuguesa na Califórnia colaborem na realização de estágios para este sector». Só não disse provavelmente por «esquecimento»!... como é que os alunos vão conseguir arranjar dinheiro para chegarem à Califórnia. Um governo perdido assume qualquer discurso, empenha-se e vende-se facilmente. E os restantes cursos complementares existentes? Não são do agrado do Sr. Ministro? Não merecem qualquer empenhamento? É que o 12.º ano, via de ensino e via profissionalizante, existe ainda no nosso sistema de ensino.
Muitos dos alunos que se inscreveram na via profissionalizante fiaram-se nas promessas governamentais de que os 33 cursos que constituíam esta via dariam acesso ao ensino superior politécnico. Só que a rede do politécnico não foi instalada como havia sido garantido, e continua, ainda agora, a aguardar vez, enquanto milhares de jovens a quem se criaram expectativas se viram e vêem atirados para um beco sem saída, sem que lhe sejam apontadas possibilidades que não sejam começar o processo de novo. O Governo está disposto através da sua gravosa actuação a declarar a educação como «empresa em situação económica difícil» e a propor o encerramento das escolas, provavelmente em nome da crise e do progresso. Só esta tacanhez explica o inexplicável. Este mês de Maio, já em algumas escolas, docentes, funcionários auxiliares e administrativos não receberam subsídio de alimentação. Quem encontrará o Governo para culpabilizar? Onde está o dinheiro que deveria assegurar este subsídio? Quem gere o esfarelado orçamento de Estado?

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O agravamento das condições de vida do povo português, a instabilidade

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profissional que se alastra, a degradação do ensino e de todos os outros sectores da vida nacional exigem da parte do Parlamento a dignidade necessária e urgente. A cumplicidade e os cheques em branco têm juros muito altos. O fim deste governo e da sua política estão à vista como claramente o povo português o demonstrou na grandiosa concentração realizada no último sábado em Lisboa. A incapacidade, os objectivos destruidores já não podem ser camuflados, nem mesmo com discursos melodramáticos de acentuado cunho repressivo. O povo português exige o fim desta política, a demissão deste governo, a defesa da democracia e nós, Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos de assumir a responsabilidade de sermos portugueses responsáveis.
A paciência tem limites que a razão cauciona.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Luísa Cachado, inscreveram-se os Srs. Deputados Helena Cidade Moura, Lemos Damião, João Corregedor da Fonseca e Agostinho Domingues.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Melena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr.ª Deputada Luísa Cachado: V. Ex.ª disse muita coisa que nos parece justai, que parece justa a todos os deputados membros da Comissão de Educação - julgo isso pelo que me posso aperceber do seu pensamento. Daí que não lhe vá fazer quaisquer pedidos de esclarecimento.
A problemática que V. Ex.ª abordou constitui lutas profissionais, que para nós, que estamos na oposição, são lutas políticas.
De facto, com a falta de trabalho que se verifica a nível central, com a falta de programação e até com uma certa cobertura que se está a fazer da insuficiência do Ministério de Educação, remetendo-se para o Ministério da Administração Interna e sobretudo para as autarquias locais a confusão e a falta de capacidade para a resolução dos problemas, parece-me que, quanto à regionalização de que a Sr.ª Deputada falou, se o grupo de estudos de regionalização desta Assembleia não avançar de forma directa, forte e concreta, nós seremos confrontados com uma regionalização da confusão em vez de uma regionalização da educação.
Mas há um outro problema que ...
Neste momento, verifica-se na Sala um certo burburinho.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o assunto em causa é demasiado sério e toca-nos a todos de tal forma que não se compadece com o barulho que os Srs. Deputados estão a fazer.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr.ª Deputada.
Peço à Câmara um pouco mais de silêncio e um pouco menos de ruído, para que possamos prosseguir os nossos trabalhos.

A Oradora: - Agradeço a sua intervenção, Sr. Presidente.
É que o que está em causa é qualquer coisa de muito grave e que não tem a ver com as nossas opções políticas. O que está em causa é a fome das crianças na escola. E porque isto é um problema extremamente grave eu proponho a toda a Assembleia, a cada um dos Srs. Deputados, que organizemos uma comissão de inquérito séria para saber até que ponto é que a fome está a prejudicar já não só o presente como o futuro de Portugal.

Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, porque a Sr.ª Deputada Luísa Cachado manifestou o desejo de responder no fim a todos os pedidos de esclarecimento, concedo agora a palavra ao Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a ver com o facto de eu ter solicitado a palavra para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Luísa Cachado praticamente logo no início da sua intervenção, já que nessa altura ela produziu uma afirmação que eu gostaria de ver explicitada, e a mesma não me ter sido concedida ainda.
Lamento profundamente que a Mesa não tenha tomado nota do meu pedido de palavra, tanto mais que fiquei com a impressão de que o Sr. Secretário que se senta do lado esquerdo de V. Ex.ª tinha tomado nota da minha pretensão, uma vez que acenou com a cabeça ao ver o meu gesto.
Espero que agora o meu nome passe a constar da lista de deputados que pretendem interpelar a Sr.ª Deputada Luísa Cachado, para a altura que o Sr. Presidente achar conveniente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se de um lapso que fica colmatado. V. Ex.ª encontra-se inscrito em 5.º lugar e por conseguinte não será preterido.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr.ª Deputada Luísa Cachado, é sempre com grande satisfação que nós ouvimos uma intervenção sua sobre política educativa. Simplesmente, parece-me que desta vez V. Ex.ª mudou um tanto ou quanto o seu discurso, na medida em que antigamente se pautava mais pelos «valores democráticos» nas escolas. Hoje V. Ex.ª não se referiu a isso, mas nós continuamos a ver que nas escolas ainda continua a haver liberdade, convivência democrática, pluralismo, o que até há bem pouco tempo era um ponto que o Partido Comunista Português acentuava bastante.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Liberdade com fome não é liberdade, Sr. Deputado.

O Orador: - Mas a Sr.ª Deputada referiu na sua intervenção uma coisa que merece uma pequena reflexão da nossa parte. Trata-se do problema da fome, que V. Ex.ª diz grassar nas escolas. A minha bancada também é sensível a essa questão e V. Ex.ª tem verificado, quando nos encontramos em vários debates só-

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bre o projecto de lei de bases do sistema educativo, que me preocupo de sobremaneira com isso.
Por isso, gostava que V. Ex.ª reflectisse comigo no seguinte: se estamos preocupados com a fome que neste momento algumas crianças começam a sentir, porque será que existe essa situação? Esta é uma questão que nos devemos colocar aqui, no seio da Assembleia.
Sr.ª Deputada, é que se por um lado se exige que o Ministério da Educação e o próprio Governo que neste momento está à frente dos destinos do País resolvam o problema da fome, por outro lado, também temos de responsabilizar outras pessoas que conduziram a esta situação.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É que nós podemos verificar que a fome nas escolas se observa efectivamente nas zonas suburbanas dos grandes centros populacionais, isto é, de Lisboa, do Barreiro, de Setúbal e um pouquinho na zona suburbana do Porto. E porquê, Srs. Deputados? É verdade ou não que era aí que em 1975 e 1976 se comia marisco à «tripa forra»?

Risos do PCP.

É ou não verdade que nessa altura não se dava a mínima noção às crianças e às famílias do que é a gestão dos recursos?

Vozes do PCP: - Que tristeza!

O Orador: - O que de facto existe, Sr.ª Deputada, é um problema de má gestão de recursos que o País (em mas, em qualquer caso, cada família tem de ter noções do que é uma boa gestão dos recursos familiares. E o que é certo é que o não souberam fazer, nomeadamente naquela zona onde o seu partido tinha mais influência e é aí que hoje muitos trabalhadores começam a torcer a orelha, que já começa a não deitar sangue porque a barriga começa a estar colada às costelas.

Protestos do PCP.

O Sr. António Mota (PCP): - E de quem é a culpa? Vocês é que não pagam os salários! Vocês roubam os trabalhadores!

O Orador: - E isso é o resultado da irresponsabilidade ...

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - De vocês!

O Orador: - O Sr. Deputado, parece-me que quando os trabalhadores deixaram de produzir, deixaram de ter forca moral para reivindicar o seu salário. Ë preciso que se diga com toda a frontalidade que quem não produz, quem não tem não pode distribuir. Esta também é uma realidade.

O Sr. João Abrantes (PCP): - E é você professor, que tristeza!

O Orador: - Para terminar, Sr.ª Deputada Luísa Cachado, só lhe quero perguntar se não é verdade que a política educativa não pode ser és um ministério, não pode ser de um qualquer ministro da educação, seja ele bom ou mau. A política de educação de um país tem de ser da responsabilidade dos pais, dos professores e dos alunos e, é claro, também das próprias forças sociais. O que nós temos em Portugal não é só uma crise de alimentação, uma crise económica; é essencialmente uma crise moral, uma crise ética, uma crise de dignidade, uma crise de responsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Mota (PCP): - Tem toda a razão: o seu partido perdeu toda a dignidade!

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, ao contrário do que antes havia manifestado, eu pretendo responder já a estes 2 Srs. Deputados interpelantes, pois receio correr o perigo de, havendo mais oradores inscritos, não conseguir dar-lhes resposta ainda hoje.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente aos 2 pedidos de esclarecimento e partindo do princípio de que o primeiro efectivamente não o era na totalidade, quero distingui-los no tempo, na eriça e na filosofia porque eles distanciam-se.
Quanto às informações se é que assim lhes poderei chamar- que a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura teve a gentileza de dar sobre a minha intervenção, gostaria de dizer-lhe que nós estamos inteiramente de acordo em que uma regionalização - que tem subjacente todas as demagogias e as atitudes confusionistas e irresponsáveis que referi na intervenção - não pode ser uma regionalização do ensino. Ao contrário, tem de obrigatoriamente ser uma regionalização de confusão, que terá como objectivo fundamental isso mesmo: a confusão, que ignora todos aqueles princípios a que a seguir ouvimos o Sr. Deputado Lemos Damião fazer referência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto ao problema da fome que grassa no nosso país, concretamente nas escolas, constato que ele não magoa nem ofende só os ouvidos puritanos do Sr. Primeiro-Ministro, mas também os dos Srs. Deputados. É porque não só não aceitam que a fome seja uma realidade como nem sequer aceitam que ela seja referida nesta Assembleia como um facto real e concreto que se vive nas escolas, que se vive nas ruas deste país, na mendicidade oficializada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Proceder assim e ignorar um facto que existe e que, como facto real e concreto que é, não pode ser ignorado, a não ser que não noa assumamos como responsáveis e como portugueses dentro deste Parlamento, que é responsável pela situação de cumplicidade que se vive em termos governamentais neste país.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à sugestão dada pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura para a formação de uma comissão de inquérito que tenha como objectivo fundamental a análise desta situação, damos-lhe o nosso total acolhimento e apoio, embora chamemos a atenção da Sr.ª Deputada para uma questão, que com certeza é do seu conhecimento, bem como da dos deputados da maioria, e que tem a ver com o objectivo do Ministério e das instâncias governamentais competentes em manterem-se intencionalmente alheios aos problemas das escolas e também ao problema que é a fome.
A provar esta minha afirmação está o facto de, relativamente a todos os requerimentos feitos pelo PCP, a todos os pedidos de audiência para esclarecimento destas situações feitos pela nossa baseada, termos obtido como resposta o silêncio, o não diálogo - o que também já constitui uma prática objectiva e pertinente do Ministério da Educação. De resto, para contrapor ao diálogo, para contrapor à discussão séria e profunda das situações, temos a repressão, que é generalizada e que é, também já, a «batuta excelente» do próprio Ministro da Educação, Dr. José Augusto Seabra, que se serve das crianças para sobre elas abater a fúria da sua própria incapacidade, da incompetência autoritária de uma política indefinida, não só em termos sectoriais de educação, mas na generalidade dos sectores nacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião, começo por dizer, pelo respeito que as pessoas me merecem como tal, que considero que a mesma provavelmente foi proferida não como professor, não como homem, não como cidadão e muito menos como pai -se acaso tem filhos-, mas em nome e em defesa de uma maioria que não tem defesa, Sr. Deputado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. António Mota (PCP): - Está podre!

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não apoiado!

A Oradora: - É uma maioria que está agonizante e não tem defesa. O Sr. Deputado acabou de defender aquilo que não tem defesa.
Mas quero salientar aqui que, tendo eu já participado consigo em algumas reuniões, colóquios e debates sobre o sistema educativo, pude aperceber-me de quão diferente o Sr. Deputado é aí, de como se assume aí com a franqueza e a honestidade indispensáveis aos factos concretos que lhe são apresentados pelos professores, encarregados de educação e alunos da realidade vivida nas nossas escolas. Quão diferente é a posição que aí assume daquela que assume aqui como deputado da maioria nesta Assembleia, Sr. Deputado!
E já agora aproveito para lhe chamar a atenção de que a democracia é, de facto, sinónimo de liberdade. Em qualquer dicionário, mesmo no tempo do fascismo, a democracia estava lá como sinónimo de liberdade. No entanto, para a maioria que apoia este governo, democracia não é sinónimo de liberdade.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Então o que é?

A Oradora: - A democracia é sinónimo de ter liberdade de ter comida ou de ter fome? Para a maioria a democracia é sinónimo de ter liberdade de morrer à fome.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A democracia começou a ser liberdade de poder comer mariscos nalguns locais, nalgumas reuniões de entidades governamentais, nalgumas reuniões parlamentares, nalgumas reuniões de alguns responsáveis políticos ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: -..., e começou naturalmente a ser sinónimo de que a «sardinha dividida por 3» de 1910, de 1920 ou de 1930 provavelmente faria lei, mas isso só se o povo português o deixasse, se os trabalhadores o permitissem. Mas, Srs. Deputados, aí estão perfeitamente enganados. Ë que no sábado passado o povo português demonstrou claramente, sem sombra para dúvidas, que os senhores não conseguirão atingir os objectivos que pretendem, que neste país os senhores não conseguirão fazer lei da fome e da miséria. E isso porque a democracia existe, o 25 de Abril acordou e acordou para não mais adormecer, quer os Srs. Deputados queiram quer não!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, e pela ordem de inscrições, tem agora a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr.ª Deputada Luísa Cachado, V. Ex.ª falou da política - se política se pode chamar!...- do Sr. Ministro Augusto Seabra. Estamos de acordo com o que V. Ex.ª disse e muito mais haveria e há com certeza para dizer. De facto, o Ministério da Educação é um manancial inesgotável de problemas criados pelo próprio Sr. Ministro Augusto Seabra.
No entanto, quero apenas perguntar a V. Ex.ª quais são, na sua opinião, as dificuldades criadas ao País pela ineficaz cobertura de uma rede escolar.
Porque V. Ex.ª referiu uma verba de 4 milhões de contos não aplicada em construções escolares, também gostaria de saber quais são, em seu entender, as consequências directas dessa actuação do Governo e que tipo de factores de instabilidade irá provocar ainda mais ao País.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr.ª Deputada Luisa Cachado, minha colega de ensino e de especialidade, confesso que o início da intervenção de V. Ex.ª me causou alguma preocupação porque pensei que ela se iria centrar fundamentalmente na política do Ministério da Educação e, dominantemente, na pessoa do Sr. Ministro. Como deputado da maioria que tem res-

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ponsabilidades no apoio ao Governo, essa matéria podia preocupar-me.
Porém, a Sr.ª Deputada não deixou de fugir um pouco à questão e trazer à liça problemas que creio serem mais de natureza social. Assim, o primeiro grande problema que gostaria de lhe colocar é o de saber se V. Ex.ª considera que o Ministério da Educação deve privilegiar questões de natureza social ou questões de natureza educativa ou pedagógica.
Como a Sr.ª Deputada, também sou extraordinariamente sensível a todos os problemas sociais. E a questão que coloco é a de saber onde reside a sede privilegiada para o tratamento dessas questões, mesmo daquelas a que todos temos que ser sensíveis, como é o problema das carências alimentares das crianças.
Se me permite, gostaria de lhe dar uma achega quanto às desigualdades sociais em satisfação de problemas da liberdade. Muito gostaria eu, Sr.ª Deputada, que em países privados da liberdade, como é o caso da União Soviética, as desigualdades sociais não existissem.
Repare, Sr.ª Deputada, que não estou a deixar de lhe dar razão quanto às desigualdades sociais no nosso país. Porém, o que me parece lamentável é que hajam flagrantes desigualdades sociais apesar da privação das liberdades fundamentais.
A minha ultimai pergunta e é a última porque não disponho de muito mais tempo- diz respeito aos grandes problemas do Ministério da Educação, que são problemas estruturais de difícil solução a curto prazo, e que são só para citar 2 os problemas das carências no domínio das construções escolares e o da qualificação de professores.
A Sr.ª Deputada e minha colega de ensino deve considerar que o seu partido tem responsabilidades nacionais porque a oposição também as tem - quanto à procura de soluções para os grandes problemas.
Portanto, se V. Ex.ª for capaz de prescindir um pouco do sectarismo que é habitual no Partido Comunista Português e da demagogia que também lhe é peculiar, gostaria que, construtivamente, apontasse algumas soluções de fundo, sérias e construtivas, como professora prestigiada nesse domínio.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Luísa Cachado deseja responder já?
Devo informá-la de que está apenas mais um orador inscrito para formular pedidos de esclarecimento. Portanto, talvez fosse preferível que V. Ex.ª respondesse no final a todos eles.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, prefiro responder já, na medida em que continuo a ter como questão fundamental o tempo, e penso que as questões levantadas são fundamentais, pertinentes e importantes.

O Sr. Presidente - Então faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao conjunto de questões levantadas pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, gostaria de começar por fazer uma curta introdução que esclarecesse um pouco a nossa posição face àquilo que é política.
Nas escolas, após o 25 de Abril, os professores que não queriam tomar posições face à pedagogia, face às novas inovações didácticas, face aos novos conteúdos programáticos, que não queriam assumir a responsabilidade de se viver em liberdade, de se vive? em democracia, de se viver numa escola em termos de questão democrática, estavam habituados a dizer muitas vezes «eu não sou político, eu não assumo políticas».
Ora, isto é já para nós, e penso que para toda a gente, uma posição política. Daí que, seja qual for a actuação ministerial de José Augusto Seabra, mesmo a incompetência ou mesmo a acção concreta em termos autoritários e incompetentes, ela é uma actuação política.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Não é a política desejável, não é a política que as escolas precisam nem a que o nosso sistema educativo necessita, mas é uma actuação política - uma política irresponsável, mas é uma actuação política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Relativamente à falta de rede escolar, à falta de instalações, à não reparação das escolas, gostaria de citar alguns números que talvez. ajudem a clarificar o que vai ser o conturbado início do próximo ano lectivo. Irão faltar dezenas e dezenas de escolas do ensino preparatório e secundário de norte a sul do País, e isto já para não falar da incapacidade financeira que as autarquias terão em construir novas salas de aulas para o sector primário, para não falar que no sector pré-primário o Governo e muito concretamente o Ministro da Educação, como os Srs. Deputados devem ter conhecimento- não está empenhado, tendo o processo congelado, porque para o substituir existem afinal as mulheres no desemprego.
Já não falando no ensino superior, que neste momento é um verdadeiro luxo, isto dar-nos-á uma noção mais ou menos exacta do que vai ser o início do próximo ano lectivo em termos de instalações escolares e reparação daquelas que já estão degradadas. E isto, para não falar em casos pontuais, como são as zonas do Barreiro, de Vila Franca de Xira, da Azambuja e mesmo de algumas situadas no norte deste país, onde a superlotação já permite que, vivendo em democracia e em nome da liberdade após o 25 de Abril, se dêem aulas com 60 alunos numa turma em termos de plenário ou de grande comício político, alunos esses que se sentam no chão ou ficam no corredor ouvindo o que lhes for possível daquilo que os professores dizem dentro das aulas.
Sr. Deputado Agostinho Domingues, creio que para o Partido Socialista seria óptimo que a nossa intervenção há pouco produzida tivesse construído um bode expiatório o que seria o ideal e que esse bode expiatório se tivesse isolado na personagem perfeitamente caótica e hoje já ridícula e anedótica de José Augusto Seabra.
Porém, a nossa intervenção não foi ao encontro dos desejos do Partido Socialista porque a degradação do sector da educação não é um bode expiatório. A degradação do ensino não é um caso pontual da

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degradação governamental, da degradação política, da instabilidade profissional que se alastra, da degradação das condições de vida do povo português.
Não é o aluno que está em más condições na escola. É o pai que tem salários em atraso, é a mãe que está no desemprego, são os transportes que aumentam e a criança não pode ir à escola, é o dinheiro que não chega para comprar a alimentação e o vestuário.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, não pode ser José Augusto Seabra o isolado responsável pelo caótico do Ministério da Educação, embora a sua incompetência e o seu autoritarismo sejam a resposta positiva, a única que ele conseguiu dar à degradação do ensino em Portugal.

Aplausos do PCP.

Quando o Sr. Deputado fala em pertinência do social, do pedagógico ou do educativo no Ministério da Educação, penso que V. Ex.ª deve estar a recuar no tempo, porque me parece perfeitamente impertinente e impossível que em pleno século XX um deputado, simultaneamente professor -estatuto esse que provavelmente não ignora nem recusa -, possa admitir como fácil, ligeira e dicotómica a análise em termos de política educacional, por um lado a social, por um lado a pedagógica, por outro lado a educativa, como se fosse possível compartimentar e agendar separadamente estas 3 questões que não podem ser dissociadas e que se assumem como um todo, tal e qual como o homem, o cidadão e o jovem de hoje, homem de amanhã, se assumirá com um futuro qualificado profissionalmente, como um cidadão competente e responsável poderá agir política, social, educacional e culturalmente. As coisas não se dissociam. Sr. Deputado!
É por pressupostos perfeitamente negativos e destruidores da personalidade humana que assistimos hoje à destruição dos próprios valores humanos, da própria ética, dos próprios conceitos que os Srs. Deputados consideram sagrados da liberdade.
Quanto às referências que o Sr. Deputado fez à União Soviética e às liberdades, recuso-me a responder. E recuso-me a responder como portuguesa, como cidadã, como deputada, como professora e como mãe. Estou em Portugal, estou no Parlamento Português e é aqui que devo defender os interesses dos meus filhos, dos filhos dos trabalhadores deste país, do ensino, do futuro deste país e da liberdade. Não estou no Parlamento Soviético, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP.

De qualquer modo, Srs. Deputados, o meu sectarismo não assume as raias do sectarismo da maioria parlamentar. Daí que eu, colocada nesta bancada, tenha a capacidade de luta e de divergência ainda possível que me permita não defender apenas os interesses daqueles que são os filhos dos trabalhadores comunistas, mas também os dos filhos dos trabalhadores, inclusivamente dos partidos e da maioria de que os Srs. Deputados fazem parte.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - O meu sectarismo não permite a dicotomia sem a inteligência de alguns Srs. Deputados.

Aplausos do PCP.

Quanto às questões de ordem estrutural que o Sr. Deputado Agostinho Domingues levantou, apenas gostaria de dizer que elas não se põem em termos de responsabilidade estrutural. Há medidas pontuais que poderiam e deveriam ser tomadas como pertinentes, urgentes e necessárias, medidas essas que são pela dignificação da própria presença das pessoas como tal.
Quanto à qualificação dos professores, penso que V. Ex.ª, como deputado da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, não ignora o projecto de lei de bases do ensino do Partido Comunista Português, em termos de ensino.
Portanto, V. Ex.ª naturalmente conhecerá como é que nós prevemos a qualificação do corpo docente do ensino em Portugal, como é que prevemos, por exemplo, a formação integral, a formação inicial e a formação contínua. Certamente que o Sr. Deputado já reparou que nesta prespectiva o nosso projecto de lei de bases se distancia grandemente, em termos temporais e em termos de conteúdo, do projecto de lei do Partido Socialista, porque prevê na generalidade uma formação contínua, sem prever face à realidade existente e ao contexto social e educativo que nos envolve, que teremos de ter em atenção os professores que temos face a uma formação em exercício. Temos de ter depois em atenção uma formação integrada, uma formação contínua, não ignorando os professores de diferentes qualificações que neste momento existem no nosso país.

Aplausos do PCP.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª ficará inscrito para o próximo período de antes da ordem do dia, na medida em que há ainda 1 Sr. Deputado que está inscrito para formular pedidos de esclarecimento.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho, para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr.ª Deputada Luísa Cachado, ouvi com atenção a sua intervenção, que, logo no início, me despertou alguma curiosidade e exigiu que formulasse este pedido de esclarecimento.
V. Ex.ª, partindo da análise de uma situação que não duvido que seja real, mas que não é uma situação geral nem uma situação que se viva em todo o nosso país, pegou na parte e tentou analisar o todo, fazendo corresponder essa situação concreta àquela que hoje se vive em Portugal.
Apesar de concordar com V. Ex.ª naquilo que diz respeito à inexistência de um sistema de ensino devidamente actualizado e que corresponde aos anseios da juventude portuguesa e das necessidades do próprio Estado, apesar de concordar com V. Ex.ª em que talvez a situação em que hoje 05 portugueses vivem

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não seja a melhor possível, não conheço - a não ser em alguns casos pontuais situações tão dramáticas como as que a Sr.ª Deputada aqui enunciou.
Aliás, essa é a táctica do PCP e a Sr.ª Deputada, mais uma vez, mostrou como o seu partido age na cena política, que é uma táctica panfletária de pegar num caso, fazer bandeira dele e, portanto, tentar iludir ou tentar tirar daí os dividendos políticos necessários para denegrir o próprio regime democrático e para tentar deitar abaixo os governos democráticos que se vão sucedendo.
Porém, o meu pedido de esclarecimento refere-se, em concreto, a uma frase que a Sr.ª Deputada proferiu, e que é a seguinte: «No sistema de ensino em Portugal tudo está há muito tempo em observação.»
Nesse aspecto devo dizer que concordo com a Sr.ª Deputada, pois há muitos anos, mesmo antes do 25 de Abril, que o nosso sistema de ensino em Portugal está em estado de observação.
Assim, gostaria que a Sr.ª Deputada me dissesse se o partido no qual V. Ex.ª milita e em nome do qual aqui falou não contribuiu também, e até decisivamente, para o agudizar desta situação de observação a que se referiu na sua intervenção.
Era bom que os partidos também tivessem um certo sentimento de autocrítica perante as políticas que seguem e os erros que cometem na sua vida política.
Fico sem perceber aquilo que o partido da Sr.ª Deputada defende no que diz respeito ao ensino técnico-profissional e à regionalização do sistema de ensino. Se não se faz nada, o seu partido e a Sr.ª Deputada dizem: «Não se faz nada, é o IASE, é isto, é aquilo.» Se se vão tomando algumas medidas, ainda que pontuais, mas medidas que são positivas e até podem ter alguns erros, mas, pelo menos, há um sinal de esperança de que algo pode mudar -, os Srs. Deputados vêm dizer: «Cuidado, lá estão eles a fazer uma coisa que é má.» Ora, é isto que não compreendo!
Portanto, gostaria de saber qual a posição do partido da Sr.ª Deputada quanto à existência ou não de um ensino técnico-profissional ou de uma via de ensino que aponte neste sentido, bem como se o PCP é ou não a favor da regionalização do sistema de ensino em Portugal.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Cachado.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de passar a responder às diversas questões colocadas pelo Sr. Deputado Agostinho Branquinho, gostaria de confrontar os Srs. Deputados com uma realidade incontestável neste momento: é que, pelo menos, esta nossa declaração política sobre o caos em que se encontra o sector educativo no nosso país não foi questionada por nenhum dos Srs. Deputados. Todos os Srs. Deputados consideraram que a presença de José Augusto Seabra e de toda a sua actuação não pode ser defensável.
Sr. Deputado Agostinho Branquinho, não sei o que é que os 150 000 trabalhadores com salários em atraso e os 500 000 desempregados diriam se por acaso tivessem a hipótese de encontrar o Sr. Deputado na rua da capital fazendo esta afirmação barata: «A fome neste país é pontual, acontece na escola da Baixa da Banheira, acontece na Escola de Luis António Verney e o Partido Comunista Português, extremamente pessimista, parte de uma questão perfeitamente pontual e generaliza a fome em termos nacionais.» Naturalmente, Sr. Deputado, V. Ex.ª não ficaria muito bem de saúde se fosse ouvido pelos 150000 trabalhadores com salários em arraso e pelos 500 000 desempregados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Nem o Sr. Deputado se arriscaria a fazer lá fora essa afirmação! Porém, arrisca-se a fazê-la aqui no Parlamento. Perante um povo com fome, um povo que vive na miséria, temos de ter mais cuidado com as afirmações que fazemos.
Entendo perfeitamente que o Sr. Deputado não possa assumir o estatuto de compreensão daquilo que é a fome e a miséria. V. Ex.ª fez parte de uma maioria parlamentar que apoia o Governo, que todos nós conhecemos e onde ainda não chegou - nem vai chegar - a fome e a miséria aos lares dos responsáveis por esta política.
Quanto às questões concretas sobre a educação, nomeadamente o técnico-profissional e a regionalização, devo dizer-lhe que sei esclarecer e explicitar alguns aspectos que o Sr. Deputado, provavelmente por distracção, não leu atentamente na nossa intervenção.
Não dizemos nem nunca dissemos que não estamos de acordo com um ensino técnico-profissional. Provavelmente o Sr. Deputado desconhecerá o nosso projecto de lei de bases do sistema educativo. Naturalmente que nunca o leu, porque se o tivesse lido não levantaria esta questão.
Porém, o que o Sr. Deputado não vai conseguir é que alguém minimamente responsável e medianamente inteligente - tal como o dissemos na nossa intervenção- possa defender que, num país onde já existe um ensino complementar nocturno, um ensino complementar diurno de 10.º e 11.º anos, onde existe ainda um 12.º ano, se crie ainda um meio de diversão e de subversão do próprio sistema de ensino, que é o técnico-profissional, sem considerar e sem respeitar minimamente as estruturas já existentes e que ainda não desapareceram do nossos sistema de ensino porque nenhum projecto de lei do sistema educativo foi ainda discutido ou aprovado nesta Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à regionalização, o Sr. Deputado também não ouviu por parte da minha bancada assumir a questionação da regionalização ou da descentralização. Nós assumimos e assumiremos sempre a questionação dos métodos irresponsáveis e confusos que está 'regionalização e que esta descentralização assumiram sem conhecimento de ninguém, sem controle de ninguém, sem discussão e sem diálogo, principalmente por parte dos interessados, que são os autarcas deste país, os professores.

Aplausos do PCP.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, visto estarmos a atingir o termo do período de antes da ordem do

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dia, V. Ex.ª ficará inscrito para o próximo período de antes da ordem do dia, assim como os Srs. Deputados Lemos Damião e Agostinho Domingues.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, também me quero inscrever para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, V. Ex.ª agora não pode formular nenhum protesto. Poderia formulá-lo se se tivesse inscrito logo após a Sr.ª Deputada Luísa Cachado ter respondido ao pedido de esclarecimento de V. Ex.ª Porém, como não o fez na altura, não dispõe de figura regimental para esse efeito.
Srs. Deputados, chegou a hora de fazermos o intervalo regimental. Contudo, visto haver ainda 3 oradores inscritos para formularem declarações políticas, sugiro à Câmara que se faça o intervalo só após elas terem sido produzidas. Assim, após o intervalo, entraríamos de imediato no período da ordem do dia.
Há alguma objecção?

Pausa.

Visto não haver objecção por parte da Câmara, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro para uma declaração política.

O Sr. Luís Monteiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comemora-se hoje mais um Dia Mundial do Ambiente; para muitos, mais um dia do calendário; para outros - entre os quais nos incluímos - um dia para pensar alguns dos problemas prementes que afectam as sociedades dos anos 80 e que, a não serem colmatados, muito impedirão o desenvolvimento harmónico no futuro próximo.
Os povos, e mais concretamente os jovens, começam a ganhar consciência da necessidade de repensar a política de desenvolvimento em que a sociedade industrial os lançou.
Pensar no ambiente em 5 de Junho é já um passo em frente. Não nos podemos limitar, porém, a falar sobre ambiente enquanto se continua, impunemente, a delapidar o nosso património natural e cultural.
A defesa do ambiente não se reduz a aspectos pontuais de protecção de uma ou de outra espécie animal ou vegetal em perigo de extinção, à defesa deste estuário ou daquela reserva; implica, antes de mais, todo um projecto de sociedade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Viver melhor não é viver com mais; é viver diferente. O homem terá de repensar as suas relações com a natureza e com os outros homens. Ê necessário e urgente que se encontre o equilíbrio que foi perdido. Há que fazer uma racionalização do consumo e dos meios de produção industriais e energéticos, há que humanizar as cidades, há que dar voz aos cidadãos.
É nesta linha de pensamento que continuamos a pensar que deve ser equacionada e levada a cabo a regionalização do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para 1984 o tema do Dia do Ambiente é a desertificação. Segundo dados das Nações Unidas, 3,5 biliões de hectares de terreno de cultivo, irrigado ou não, estão afectados pela desertificação é uma área que corresponde aproximadamente à soma das áreas da América do Norte e do Sul.
Citando ainda a mesma fonte, 21 milhões de hectares em cada ano são reduzidos ao estado de quase ou completa inutilidade.
A principal causa directa da desertificação não é a seca, que apenas acentua o problema, mas sim a acção humana, através de sobrepastoreio, práticas agrícolas destrutivas, por muito intensivas, e a desflorestação.
São, segundo o Prof. Mabbert, consideradas 3 categorias de terrenos: de cultivo não irrigados; de cultivo irrigados; e de pastagens.
O exemplo mais grave de desertificação encontra-se no primeiro tipo de terrenos quando densamente povoados.
No caso dos solos irrigados, o perigo de desertificação é também grande, pois pode ocorrer a salinização do solo devido ao alagamento, como se verificou na índia. O tradicional sistema de pastoreio pode tornar-se um caso de degradação das terras quando aberto a intensa exploração comercial, caso recente verificado no Sahel.
Para o caso específico da desflorestação, segundo previsões feitas pelo Conselho para a Qualidade do Ambiente e pela Secretaría de Estado dos Estados Unidos da América, haverá apenas uma área florestal mundial de 1800 milhões de hectares no ano 2020, e a perda maior de florestas será nas zonas tropicais em desenvolvimento. Considera-se a desflorestação como a forma mais dinâmica de desertificação.
Como consequências directas da desflorestação teremos o bem grave desequilíbrio no ciclo Hidrológico: haverá desestabilizados caudais, esgotamento das águas subterrâneas, intensificação das inundações e maior escassez de água nos períodos de seca.
Uma outra consequência relacionada com a perda de florestas, consequente perda de húmus e com a combustão de produtos férteis, é o aumento progressivo da concentração de dióxido de carbono na atmosfera que, por sua vez, se irá reflectir num aumento da temperatura do globo.
Consideremos agora os efeitos que a desertificação terá na agricultura: erosão do solo; perda de nutrientes; compactação dos terrenos; aumento da salinidade, tanto da terra como da água para rega; perda de terrenos agrícolas de grande qualidade para o desenvolvimento urbano; danos provocados nas culturas por maiores níveis de poluição no ar e na água; extinção de variedades vegetais e animais; escassez de água devido à indústria, energia ou desflorestação.
Considerando que, segundo as previsões, a alimentação irá basear-se em maiores pressões sobre os recursos agrícolas e que há a esperar uma aceleração nas perdas causadas pela desertificação, pois populações mais numerosas explorarão mais intensivamente a terra, terão que ser modificadas as directrizes alimentares e agrícolas. A perda de produtividade dos terrenos irá forçar as migrações internas, ou mesmo externas, por parte das populações atingidas.
Calcula-se que a população mundial no ano 2000 aumente dos actuais 850 milhões para 1200 milhões, e a componente rural de 500 para 600 milhões.
O êxodo crescente de populações das áreas desertificadas para os meios urbanos irá levantar muitos outros problemas. Há, pois, necessidade de combater localmente o problema da desertificação (embora em

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muitos casos já não seja possível). Evitá-lo, migrando, não ajuda à sua solução!
Podemos então concluir que a desertificação não é apenas um problema biológico, agrícola ou físico; tem também uma componente social bem marcada. Como dizia o Prof. Mabbert: «... as suas causas estão por trás das regiões directamente atingidas; são consequência de forças políticas e económicas que actuaram ao longo da História e continuam a actuar ...».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A desertificação é um tema bem premente para ser focado no Dia Mundial do Ambiente em Portugal, pois é ilusório pensar que é só um problema do Terceiro Mundo.
No nosso país, casos como a serra algarvia e o Alentejo são já o primeiro passo para a desertificação, que poderá alastrar se não for adoptada uma correcta política de ordenamento do território.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta linha, cremos que o Governo se tem mostrado à altura das suas responsabilidades.
Õ Ministério da Qualidade de Vida e a Secretaria de Estado do Ambiente, em particular, têm, quanto a nós, revelado capacidade no equacionamento dos problemas e firmeza nas medidas que se impõem. Exemplos disso foram as medidas tomadas no sentido de evitar a continuação da degradação escandalosa das zonas litorais.
Independentemente, porém, destas medidas, cremos que os desafios de fundo, que a reflexão deste dia torna mais evidentes, aconselham a que sejamos capazes de definir e fazer respeitar um plano de médio prazo de preservação do ambiente.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito para pedir esclarecimentos no próximo período de antes da ordem do dia o Sr. Deputado Anacoreta Correia.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha declaração política, solicito a V. Ex.ª que a Câmara guarde l minutos de silêncio em homenagem ao jornalista Vítor Coutinho, que acaba de falecer, com 38 anos de idade apenas.
Penso que a Assembleia da República deve muito trabalho à sua inteligência e à sua grande capacidade e honestidade profissional.
Gostaria, ainda, de transmitir o nosso pesar aos seus colegas de trabalho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, conforme o solicitado pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, vamos guardar l minuto de silêncio em memória do jornalista falecido.
Neste momento, a Câmara guarda, de pé, 1 minuto de silêncio.
Tem a palavra, para continuar a sua intervenção, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE entende que o projecto colectivo, que tem o socialismo como meta e a democracia parlamentar e participada como caminho para o atingir, tem vindo a ser subvertido com violência crescente, com terríveis consequências para a vida dos portugueses e para o futuro de Portugal.
A sociedade portuguesa não é hoje já, formalmente, a sociedade em transição para o socialismo consagrada constitucionalmente, quer no plano económico quer no plano social e cultural. Apesar de tudo persistem, tanto na estrutura económica, social e cultural como no plano ideológico, relevantes factores de transformação que se expressam na dinâmica social, numa perspectiva da defesa e do aprofundamento da democracia.
Essa dinâmica tanto toma formas nacionais de manifestação de massas, como a ocorrida no dia 2 de Junho no Terreiro do Paço, como, isoladamente, leva a expressar graficamente nos muros brancos e limpos do País uma linguagem de desespero. Estes factos, porque não são entendíveis pelo actual Governo, tornam-se sintoma de desequilíbrios perigosamente ameaçadores.
É impensável, Srs. Deputados, que o Dr. Mário Soares tenha, e expresse publicamente, reacções perante a linguagem dos muros semelhantes às que levaram à prisão o Manelinho de Évora, quando da; governação espanhola.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo isola-se desta dinâmica transformadora, que é em si sujeito e objecto de uma atitude cultural, que marca a capacidade vital do País e que cada dia mais difere das instituições e do poder.
Neste quadro de bloqueio, tem vindo a confirmar-se, no decorrer deste processo, a tese aprovada no nosso Congresso de 1981 de que a crise dos partidos, resultante de um desajuste entre as orientações imprimidas pelas direcções de alguns deles, os interesses concretos e os valores culturais das suas bases sociais de apoio, tendia a agravar-se, provocando indispensáveis reajustamentos no quadro partidário.
Mais uma vez se confirma, também, pelo expressivo exemplo deste Governo, que a estabilidade política e a sorte dos executivos não é ditada pelas maiorias parlamentares em que se apoiam, na medida em que elas tendem a reproduzir as posições das cúpulas partidárias; facto de que a AD se tornou exemplo clássico!
Neste momento é cedo para fazermos, na sua resultante, igual juízo da actual maioria parlamentar, já que ela tem ainda a possibilidade de demonstrar que a Assembleia da República pode defender os interesses dos eleitores quando estes interesses se erguem frontalmente contra a acção dos executivos!
Agora, o que podemos desde já verificar é que a unidade democrática, que tão espontânea e decididamente se afirmou nas comemorações do X Aniversário do 25 de Abril, é base suficiente para uma alternativa a governos que, paulatinamente e em nome da democracia, vão destruindo o regime democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A estratégia de unidade definida com o objectivo de favorecer a criação do bloco social como suporte de uma alternativa identificada com a ordem democrática pressupõe, nas condições presentes da sociedade portuguesa, segundo as conclusões do nosso Congresso, duas linhas de actuação política complementar: por um lado, uma firme

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rejeição de todo e qualquer governo que agrave os sofrimentos da maioria da população para favorecer os interesses do grande capital nacional e estrangeiro, numa actuação contrária ao projecto do 25 de Abril naquilo que ele contém de procura de justiça social, de alargamento dos direitos fundamentais dos cidadãos e de defesa da independência nacional; por outro lado, uma atitude empenhada na promoção de um consenso democrático que viabilize e concretize a nova política de que o País carece.
O MDP/CDE particularizou, no seu Congresso, a sua orientação estratégica de contribuir para este consenso democrático alargado na definição da política de alianças do partido, no presente momento histórico e no âmbito do conceito de unidade democrática que perfilha. Política de alianças ampla, que tem por meta a convergência das forças democráticas, na sua diversidade e identidade próprias, para que seja dada expressão política à forte vontade nacional que, nesse sentido, se vem afirmando com determinação crescente.
Mas o quadro partidário não oferece, de momento, condições favoráveis à concretização de uma alternativa democrática. A constituição de novos partidos políticos ou a reformulação dos actuais é uma. consequência lógica da análise que vimos fazendo, desde o nosso Congresso em 1981, do desajustamento entre o quadro partidário nacional e a dinâmica social; desajustamento que tem vindo a acentuar-se progressivamente. E hoje já é tão profundo esse desajustamento no espaço que eleitoralmente foi preenchido pelo PS e pelo PSD nas últimas eleições legislativas que se pode concluir pela existência de condições para o rompimento do actual quadro partidário.
O aparecimento de nova ou novas formações políticas identificadas com o 25 de Abril poderá ser inevitável e tornar-se, a curto prazo, um factor indispensável para a democracia, pelas modificações significativas que possivelmente provocaria no comportamento do eleitorado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se são favoráveis as condições para congregar vontades dispersas e diferenciadas, a questão central é, porém, a da possibilidade de dar forma política! operacional a um consenso democrático alargado em torno de uma plataforma política de princípios essenciais.
Como alternativa à actual política sem esperança, sem horizontes e sem real projecto nacional, uma política renovadora e mobilizadora da vontade dos portugueses tem de ser posta em praticai por um governo que assuma como seu programa o essencial dessa plataforma política.
Grande parte dos portugueses está saturada de confrontos partidários secundários e deseja que se chegue a um acordo político alargado do tipo que o MDP/CDE vem propondo. A adesão dos partidos políticos, de reconhecida base democrática, a uma alternativa como a sugerida é um imperativo patriótico que todos os portugueses devem reclamar e colocar como seu dever.
No quadro partidário actual e com a presente composição da Assembleia da República, este imperativo levaria a uma inflexão no comportamento político dos actuais partidos, em especial do PS, que se traduziria na viabilização parlamentar do governo assente naquela plataforma pela não reprovação do seu programa.
No estabelecimento dessa plataforma política, como expressão do largo consenso democrático dos partidos em torno dos grandes problemas nacionais e das aspirações da maioria dos portugueses, poderá e deverá o Presidente da República, no âmbito das suas competências constitucionais, desenvolver uma acção favorável. Apesar da limitação dos seus poderes políticos, após a revisão constitucional, ao Presidente da República, na sua função de garante do funcionamento das instituições democráticas, compete-lhe contribuir, qualquer que seja a configuração do quadro partidário, para a abertura de alternativas que visem evitar bloqueamentos e rupturas no regime e criar estabilidade social.
A estratégia global de unidade dos democratas não diz respeito exclusivamente a nenhum partido; está dependente não só de factores sociais como de factores políticos que tomamos como linhas de força. A orientação estratégica que o MDP/CDE definiu neste Congresso é, assim, apenas um contributo para a estratégia mais geral do campo democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O V Congresso do MDP/CDE, realizado no último fim de semana, concluiu estarem hoje criadas condições particularmente favoráveis a uma aceitação crescente das propostas de convergência e de unidade democrática. Concluiu, ainda, estarmos face a um desafio à nossa grande responsabilidade de portugueses, no sentido de contribuirmos, reforçando-nos, para uma unidade que não seja apenas defensiva, mas seja plataforma de uma nova política que permita repor a esperança num Portugal mais justo, mais livre, mais independente, mais afirmativo no contexto das nações, mais identificado com a sua responsabilidade histórica e mais universalista.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa, ainda para uma declaração política.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vão ter este ano lugar na cidade de Viseu as comemorações do 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões, e das Comunidades Portuguesas.
Portugueses radicados em todo o mundo vão visitar Viseu, muitos deles pela primeira vez. De todo o País os portugueses vão também dirigir-se à cidade de Viriato.
Lá estarão os órgãos de soberania, o Sr. Presidente da República, os Srs. Primeiro-Ministro e Vice-Primeiro-Ministro, ministros e secretários de Estado, altas individualidades da política, das letras e da cultura, membros do corpo diplomático, eu sei lá quem mais! ...
Trajando fato domingueiro, Viseu vai receber todos os que a quiserem visitar, de braços abertos, escancarando as suas portas, mostrando tudo o que tem e também o que vale.
E tem muito e vale muito.
A cidade nasceu à sombra da Sé. A Sé, lá em cima, domina a cidade, como que a dizer aos Viseenses: fui eu que vos dei o ser.
E aquela mãe, a Sé, trouxe-nos o seminário, as muitas igrejas e capelas que vale a pena ver, e também nos deu homens ilustres.
Ali, em Viseu, se fez um santo - S. Teotónio.
Ali governaram bispos como António Alves Martins e também Alexandre Lobo.
A origem da comunidade perde-se no tempo.

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Lá em baixo, o forte octogonal, a Cava de Viriato, fortificação em campo raso, presumivelmente romana, garante-lhe a antiguidade.
E essa antiguidade dá aos Viseenses o direito de reivindicarem para si, como símbolo, Viriato, o caudilho que representa a seiva e a têmpera do homem lusitano. Lá tem o seu monumento.
A Sé, ainda a Sé e o seu clero não permitiram que a nobreza se instalasse significativamente em Viseu. O palácio de Cimo de Vila ou o de Prime e o dos Treixedos são de construção recente.
Apesar disso, o ducado de Viseu pertenceu ao Infante D. Henrique e seu irmão, o que havia de ser o rei D. Duarte, nasceu em Viseu.
Em Viseu, Vasco Fernandes, o Grão-Vasco, montou escola e as suas obras enchem-nos de vaidade, entre elas o famoso quadro de S. Pedro. É ver o magnífico conjunto de pinturas da Escola de Viseu no Palácio dos Três Escalões que fora residência de bispos e seminário e é hoje o Museu Grão-Vasco. Lá está também a Sala Columbano, onde se guardam algumas obras e todos os desenhos e esquissos das suas pinturas, mesmo as que enfeitam este Palácio de S. Bento. Mais adiante, um outro museu, a Casa-Museu Almeida Moreira, do nome do seu doador e primeiro conservador do Museu Grão-Vasco.
Mas não podia faltar a Viseu, nascida à sombra da Sé, o Museu de Arte Sacra ainda há pouco visitado pelos gatunos internacionais que dali levaram peças de elevado valor, duas delas felizmente apreendidas em Milão.
Foi ainda a Sé que nos deu alguns valores musicais, como Lopes Morago, cujas obras a sabedoria e a pertinácia do eminente musicógrafo, ainda vivo, tenente Manuel Joaquim há pouco homenageado, descobriu.
Em Viseu nasceu muito provavelmente João de Barros, o autor das Décadas da Ásia, e também ali nasceu Silva Gaio, que a morte cedo levou.
Ali nasceram Emídio Navarro e ainda Azeredo Perdigão.
Lá nasceu e exerceu a sua profissão o sindicalista Alberto António Sampaio, fundador do periódico A Voz da Oficina.
Em Viseu nasceu a cantora lírica Augusta Cruz.
Ali nasceu, também, Augusto Hilário, celebrado pelo fado que tem o seu nome.
Viseu é a capital da desaparecida província da Beira Alta.
Conheceis a Beira Alta?
É uma fértil província, portuguesa de lei, que vê, a leste, a serra da Estrela com as suas neves; a oeste, o Caramulo com a sua tristeza; ao sul, o Buçaco de gloriosa memória e de mística tradição.
É acidentado o solo, sucedendo-se às pequenas ondulações do terreno as colinas, os cerros e os montes, separados, uns dos outros, por quebradas e valeiros, onde sussurram as águas, caídas das alturas. (Mário de Silva Gaio).
Sempre que me ponho a considerar a fisionomia desta cidade, abstractamente como a imagem de mulher, figura-se-me prazenteira, amável, buliçosa: numa palavra, eminentemente jucunda [...] Para os meus olhos, Viseu é uma cidadezinha activa, dada ao optimismo, um pouco descuidada do destino trágico da vida, satisfeita com a sua mediocridade. Já o casario, apinhado pela escarpa, nos adverte que o vizinho é compadre do vizinho; as ruas do bairro velho são estreitas e estreiteza aqui significa intimidade. A todo o quadrante, o panorama é da mais pródiga e risonha natureza. (Aquilino Ribeiro, prefácio a Viseu. Letras e Letrados Viseenses, de Maximiano de Aragão).
Neste cenário e com esta fisionomia é assim Viseu. Com santos e guerreiros, com reis e bispos, pintores, músicos e cantores, homens de letras e artistas, lutadores cívicos e políticos, comerciantes e agricultores, Viseu é uma cidade com expressão moral própria que lhe é dada pelo seu povo generoso e trabalhador, simultaneamente paciente e valente. Cultivando a boa mesa, a boa cozinha e os bons vinhos, recebendo com alegria, os viseenses assim vão receber os seus hóspedes.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o respeito que os Viseenses têm pelos amigos obriga-nos a. fazer algumas prevenções. Orgulhamo-nos da nossa cidade, mas nem tudo corre bem.
Lá para cima, quando não conseguimos, por falta de posses ou de tempo, receber como gostávamos gente de cerimónia, tudo enfeitado e a brilhar, desculpamo-nos e pedimos que não reparem.
Também nós dizemos: não reparem.
Aos que vêm do norte, diremos que terão de passar pelo vale do Vouga. Terão de ter paciência, de caminhar devagar. O vale do Vouga é bonito, mas é preciso tempo para ser admirado. Nós também queríamos andar depressa, mas não nos deixam. Prometeram-nos a via rápida Aveiro-Viseu-Vilar Formoso. Ela para nós significa o futuro e o progresso e mesmo com todos os auxílios da CEE caminhamos muito devagar para as nossas aspirações.
Se vierem do sul e quiserem passar por Coimbra, Penacova, rumo à Barragem da Aguieira, também terão o vosso calvário, precisam de ter calma. É que o vale do Mondego, nestas paragens, é igualmente muito lindo mas precisa de tempo para ser admirado. Depois de Penacova é mais fácil o percurso, mas quando entrarem na zona da Barragem da Aguieira devem a certa altura tomar a estrada velha porque a ponte de Almaça aluiu e está há bastante tempo por consertar. Passámos hoje pela ponte de Oliveira do Mondego e também ali há aluimentos significativos e recentes.
A nós parece-nos que deve ser o maldito do rio Mondego que prega destas partidas; já fez o mesmo à ponte da Figueira da Foz!

Risos do PS, do PSD e do CDS.

Depois, o melhor é ir por Nelas. Mas se quiserem ir por Santa Comba Dão, ou passar pelo Vimieiro, mesmo atrás da casa do falecido Dr. Salazar, encontrarão uma ponte, uma obra de arte, como se diz na gíria, que ali está plantada há 5 anos, sem préstimo, inútil. Até parece que brincamos às pontes!
E se forem pelo Buçaco ...
Se forem pelo Buçaco terão de suportar aquelas curvas. E que curvas! ... E não se esqueçam de tomar a estrada velha quando chegarem a Adiça. O troço de estrada Adiça-Naia está pronto e pode ser-se ten-

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tado a passar por lá. Mas não caiam nessa! Falta construir 6 pontes, 3 de 100 a 150 metros e 3 de 10 metros.
Prometeram-nos o itinerário principal n.º 5, Viseu-Figueira da Foz. Outro elemento fundamental para o progresso da região. Como precisamos dele! ...
Ao chegar a Viseu, se penetrar pela estrada de circunvalação, no cruzamento com a estrada de Mangualde, tem de ter cuidado. Parece que passou por ali um tornado. Há 2 anos que, depois das demolições, assim está. Também nos prometeram continuar a circunvalação. E é necessário tão pouco dinheiro e o esforço financeiro da Câmara para conseguir as expropriações foi tanto!
Não tivemos ainda tempo de construir acessos condignos à nossa casa.
Estão prometidos por gente séria. A gente confia; somos assim meio crédulos, meio simplórios!
Ao chegar a Viseu, não estranhará que queiramos sair da mediocridade de que fala o nosso Aquilino. Notará um desejo evidente de progresso. O comércio que foi a alavanca do progresso de Viseu mantém o seu lugar de destaque. A produção agrícola, com excepção do vinho e da maçã, que é excedentária, abastece as necessidades locais. A área urbana aumenta. Em Coimbrões, arredores de Viseu, vão em bom ritmo as obras do parque industrial, com auxílio da CEE. Já sei que lerão dificuldade em compreender que as vias de comunicação estejam ainda tão atrasadas. Mas não reparem.
Viseu é um marcado pólo do desenvolvimento do interior em que todos acreditamos, Viseenses estudiosos. Mas o interior é assim, tem de crescer como pode, sem ordenamento, aproveitando o que primeiro lhe chega, com alguma esperteza serrana e habilidade. O interior ainda não tem força reivindicativa. Os planos de governo não têm tido em consideração os interesses do interior. O ordenamento do território não aparece, a descentralização é por enquanto conversa fiada.
No ensino, chegou a Universidade Católica, com o curso de Humanidades, e foi para os Viseenses, cansados de esperar, uma dádiva do céu. Depois, veio a Escola Superior de Educação. Mesmo sem estatuto definido e um pouco de improvisação, vai funcionando em termos de se lhe augurar bom futuro.
Falta a Escola Superior de Tecnologia, que devia funcionar no próximo ano lectivo, mas nem sequer tem ainda nomeada a comissão instaladora. A distracção dos nossos governantes é neste domínio evidente. Os planos mesmo legalmente estabelecidos não se cumprem. Teremos que juntar à força da lei outros argumentos mais convincentes, ao que parece.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ide a Viseu, que todos nós gostamos de os receber.
E se outras deficiências encontrarem os nossos visitantes, e encontram por certo, só fazemos votos para que os nossos governantes tenham tempo e nelas reparem e tenham vontade de as corrigir.
Assim seja.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos à hora do intervalo, pelo que declaro suspensa a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Reinaldo Gomes (PSD): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar, peço a suspensão dos trabalhos por 30 minutos.

O Sr. Presidente: - É um direito regimental do Grupo Parlamentar do PSD. Está concedida a interrupção por 30 minutos.

Retomaremos os trabalhos às 19 horas e 20 minutos.

Eram 18 horas e 51 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Vamos reiniciar a sessão, embora com um considerável atraso. Ponho mesmo a questão de saber se este atraso não compromete o cumprimento da ordem de trabalhos de hoje.
Srs. Deputados, a primeira parte do período da ordem do dia consiste na apreciação e votação das contas da Assembleia da República.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, creio que ainda não estão reunidas as condições para que iniciemos os trabalhos. Designadamente, há um grupo parlamentar que não tem presente quase nenhum Sr. Deputado e duvido até de que haja quórum de funcionamento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, os Srs. Deputados do PSD estão neste momento a chegar e penso que podemos fazer um esforço no sentido de que os outros Srs. Deputados regressem à Sala.
De qualquer modo, peço ao Sr. Deputado Guido Rodrigues o favor de se dirigir ao seu grupo parlamentar a fim de os Srs. Deputados do PSD retomarem os seus lugares na Sala.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente. Julgo que dentro de poucos minutos estarão reunidas as condições para que a reunião se inicie com os meus colegas que, entretanto, regressarão.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no seguinte sentido: estão a aproximar-se as 20 horas e creio que seria positivo para os Srs. Deputados o terem alguma ideia da organização dos nossos trabalhos.

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Da parte do meu grupo parlamentar, gostava de afirmar ao Sr. Presidente o nosso empenhamento em que se possa cumprir a ordem do dia e que estamos na disponibilidade de trabalhar hoje à noite para que a agenda possa ser esgotada. Caso não haja disponibilidade da Assembleia nesse sentido, consideramos que não deverão ser prejudicadas outras matérias que já estão fixadas por marcação dos partidos.
O nosso entendimento é, portanto, o de que, se não for possível cumprir a ordem do dia de hoje, terá de ser visto em conferência dos grupos e agrupamentos parlamentares o melhor momento para esta matéria voltar a constar da agenda, sem prejuízo das marcações já efectuadas pelos partidos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos prolongar a sessão de hoje até se concluir a ordem de trabalhos, que tem uma primeira e uma segunda parte. Esta última consiste na discussão e votação na especialidade e votação final global de uma autorização legislativa do Governo? Caso haja a intenção de prolongar a sessão ...

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, e para lembrar a V. Ex.ª que o Partido Socialista não pode estar disponível, dado que tem marcada para esta noite uma reunião da sua Comissão Política na qual vão participar inúmeros deputados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos confrontados com uma situação muito difícil, ou seja, o prolongamento da sessão depara com algumas objecções do Grupo Parlamentar Socialista, por ter, hoje à noite, uma reunião da sua Comissão Política.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede a palavra para se pronunciar sobre esta questão?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sim, Sr. Presidente.
Pela nossa parte também só estaremos disponíveis até às 20 horas e 30 minutos.
Estamos, também, de acordo com a posição de que não devem ser prejudicadas nem as marcações nem o agendamento de trabalhos já calendarizados, pelo que as matérias que não possam ser esgotadas hoje devem ser agendadas para depois de 15 de Junho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr, Anacoreta Correia (CDS): - A posição do CDS, nesta matéria, é exactamente igual à posição da ASDI: não estamos disponíveis para além das 20 horas e 30 minutos, para prosseguimento dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, pediu a palavra também para se pronunciar sobre esta questão do método a seguir com os nossos trabalhos?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sim, Sr. Presidente, Concordamos que a sessão se prolongue até às 20 horas e 30 minutos. No entanto, já não estamos de acordo quanto ao aspecto de se prolongar para depois do dia 15 do corrente a votação na especialidade e a votação final global da proposta de lei n.º 63/III, embora entendamos que não se devem prejudicar os agendamentos, designadamente os dos próximos dias. Como sabem, esta proposta do Governo é urgente e, por isso, haverá que enquadrá-la nos nossos trabalhos até essa data ou, se possível, votá-la ainda hoje.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, parece-me que existe concordância para prolongar a sessão até às 20 horas e 30 minutos. Aguardo que chegue à Mesa um requerimento nesse sentido.
Por outro lado, também me parece que há uma certa concordância em que esta proposta de autorização legislativa do Governo, caso não seja hoje concluída a sua discussão, como é previsível, seja agendada para uma próxima ordem de trabalhos, mediante deliberação da conferência de líderes parlamentares.
Sr. Deputado Jorge Lemos, é ainda sobre esta matéria que quer usar da palavra?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Era sim, Sr. Presidente.

Creio que está adquirido que as marcações dos partidos se mantêm - saudamos esse facto.
Do nosso lado, Sr. Presidente, entendíamos que não seria compreensível que entrássemos na análise concreta da proposta de autorização legislativa, pois trata-se de uma matéria que ainda vai levar algum tempo. Isto porque, pelo que sou informado pela minha bancada, haverá, inclusivamente, problemas melindrosos decorrentes da sua discussão. Ora, estar a espartilhar a sua discussão, iniciando-a hoje para a concluir em data a fixar, não nos parece o mais correcto.
Poderíamos esgotar os pontos relativos à apreciação das contas da Assembleia e às autorizações a conceder aos Srs. Deputados e à hora regimental acabávamos os nossos trabalhos. Depois, em conferência, veríamos o melhor dia para agendar a proposta de lei do Governo, tendo em conta a observação pertinente do Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lacão deseja também pronunciar-se sobre esta matéria?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sim, Sr. Presidente.
É para dar a nossa concordância à sugestão que acaba de ser feita pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, ou seja, esgotarmos a primeira parte da ordem do dia e depois procurar-se-á marcar, através da conferência dos líderes, este pedido de autorização legislativa do Governo.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então passar imediatamente à apreciação das contas da Assembleia da República relativas a 1983.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que as contas da Assembleia da República merecem por parte desta Assembleia e deste Plenário um debate como não tem sido possível efectuar em anos anteriores. Cremos que isso se impõe por muitas e numerosas razões.
Em primeiro lugar, entendemos que a Assembleia da República é um lugar de transparência democrática. Mal iríamos se as contas da própria Assembleia fossem aprovadas sem discussão, mais ou menos silenciosamente, sem que nenhuma intervenção sobre elas se debruçasse. As contas da Assembleia da República são contas públicas, nada a Assembleia da República tem a esconder quanto às suas contas, elas merecem, portanto, não ser deixadas na sombra.
A ideia de que a democracia tem custos é outra ideia que resulta da apresentação destas contas. Só a consideração de que a democracia tem custos implica também a certeza assumida de que são inclusivamente preferíveis as hesitações do que impor arbitrária e ditatorialmente qualquer linha política e, portanto, que ela conduza a um beco sem saída. Somos pela discussão, somos pelo debate, também, das contas da Assembleia da República.
Pensamos que, finalmente, as contas da Assembleia da República devem ser um modelo de clareza, um modelo de transparência - e repito a palavra transparência - em relação ao modo habitual de prestação de contas públicas.
Em segundo lugar - e esse é um aspecto a realçar -, a Assembleia da República pode hoje discutir as contas de 1983. Está nisso em substancial vantagem em relação às contas do Estado, que estão por encerrar, que estão por debater há longos anos. Mas, e infelizmente o digo, essa clareza não é total e bom seria que ela existisse e que também as contas da Assembleia da República mostrassem a utilidade e o destino dos sacrifícios dos nossos concidadãos, que estão em causa sempre que se discutem despesas públicas.
Ora a verdade é que, para além do relatório e da conta de gerência que nos foram presentes, há 24 volumes de documentos de despesas que agrupam 3040 documentos.
Não é possível, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pensar que o Plenário da Assembleia ou qualquer dos deputados presentes possa ter apreciado estes 3040 documentos.
Estamos, pois, necessariamente, a fazer uma votação que é uma votação em confiança.
Não temos, pela nossa parte, nenhuma dúvida de que esses documentos correspondem a todas as regras jurídicas de contabilidade, mas o que nos parecia indispensável era que, para além disto, soubéssemos da eficiência dessas despesas.
As contas da Assembleia da República não são sujeitas à apreciação do Tribunal de Contas. Isso acontece por força da sua Lei Orgânica, mas pensamos que não se deve continuar a dispensar o parecer do Tribunal de Contas.
Uma futura modificação da Lei Orgânica da Assembleia da República deve exigir esse parecer. As contas da Assembleia são tão contas públicas como quaisquer outras.
Em terceiro lugar, por força do mecanismo de autorizações e delegações de despesa, acontece que o artigo 14.º da Lei Orgânica da Assembleia da República atribuiu competências de aprovação de despesas ao próprio Plenário da Assembleia.
Ora é evidente que o Plenário não tem condições para autorizar as despesas e, como tal, acaba sempre por ter que as delegar, mas essas delegações nem sequer constam da conta que nos foi presente.
O resultado de tudo isto é que o conselho administrativo acaba por assumir poderes latíssimos de fixação de despesas por conta da Assembleia da República, que vimos aqui depois aprovar por antes não as termos controlado.
Ora nessas contas não aparecem só despesas da Assembleia da República e algumas delas são matéria que bem merecia apreciação.
Temos assim, por exemplo, o facto de o Conselho Nacional de Alfabetização ter gasto mais de 3000 contos durante o ano de 1983.
Seria importante para nós, Assembleia da República - de quem depende o Conselho Nacional de Alfabetização -, sabermos exactamente qual foi a eficácia destas despesas. De facto, a Assembleia da República nunca pôde conhecer qualquer relatório deste Conselho Nacional de Alfabetização.
Os conselhos de informação fizeram a Assembleia da República despender 38 000 contos, dos quais 33 000 contos em deslocações. Isto aconteceu porque boa parte dos membros dos conselhos de informação não residiam em Lisboa e eram forçados a fazer deslocações de um e mais dias para reuniões, na maior parte das vezes muito curtas.
O conselho administrativo propõe-nos ainda que a Assembleia da República não cumpra o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 265/78, de 30 de Agosto, quanto a despesas de anos económicos findos.
Reconhecemos naturalmente que terá havido dificuldades que terão impedido que se tenham pago essas despesas a tempo e horas, mas pensamos que é, pelo menos, estranho que seja a Assembleia da República a assumir a responsabilidade de não cumprimento de uma lei de enquadramento das despesas públicas.
Quanto a outras despesas verificadas, julgamos que também seria necessária uma maior discriminação.
É, por exemplo, o caso da verba despendida com portes do correio, telexes, telefones e telegramas. Essa verba é praticamente de 10 000 contos - mais rigorosamente, 9722 contos.
Seria importante conhecer a sua distribuição. Qual é a percentagem que cabe aos serviços? Qual é a percentagem que cabe aos vários grupos e agrupamentos parlamentares? Qual é a parte destas despesas que são despesas próprias dos deputados na comunicação com o seu eleitorado?
A verba mais avultada, a seguir às próprias despesas de funcionamento da Assembleia da República (362 000 contos), diz respeito à subvenção aos partidos políticos (316 000 contos).
Pensamos que em democracia é indispensável que os partidos políticos sejam financiados e possam exercer a sua acção, que é indispensável para o próprio exercício da democracia, mas julgamos que talvez devêssemos reflectir sobre este problema e saber se

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deverá ser ou não a Assembleia da República a financiar a actividade dos partidos políticos, apesar de estes terem expressão parlamentar.
Outra verba que para nós não é de fácil compreensão é aquela que diz respeito a visitas de delegações ou missões estrangeiras ao País a convite da Assembleia da República e que totaliza 9780 contos.
Atendendo a que as contas não discriminam o número de delegações que nos visitaram nem os seus componentes, parece-nos que esta verba é extremamente elevada, já que, quando uma assembleia convida, as despesas de deslocação até ao país convidante são por conta dos próprios parlamentos convidados. Esta verba extremamente avultada refere-se, quando muito, a alojamento e a despesas de instalação dentro do próprio País, o que, para convidados, parece, com certeza, um pouco excessivo.
Gostaria ainda de salientar uma verba que é pequena, mas representa, de algum modo, aquilo que há pouco anunciava, ou seja, de como o Plenário nem sempre conhece as despesas que são autorizadas. Penso que se tal verba nos tivesse sido submetida, todos estaríamos de acordo e que, provavelmente, a consideraríamos até como uma importância diminuta, mas a verdade é que só pelas contas se conhece que a Assembleia da República contribuiu para as vítimas das inundações com 1000 contos. Creio que todos teríamos aprovado esta despesa e até, provavelmente, considerado que ela é reduzida e que a Assembleia da República talvez pudesse contribuir em maior parte - mas a verdade é aquela que acabo de anunciar.
As obras de beneficiação do Palácio de S. Bento custaram 39 899 contos. Aqui, teremos de nos interrogar sobre a verdadeira eficácia e utilidade destas obras. Conhecemos melhorias concretas, que foram efectivadas e que estão à vista de todos, mas temos de nos interrogar sobre se as várias soluções parciais com que nos vamos defrontando evitam uma realidade, que é a dificuldade que este edifício tem para permitir o funcionamento de um parlamento moderno, com todos os seus serviços e actividades.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, permita-me esta interrupção, mas chegámos às 20 horas e ainda não deu entrada na Mesa o requerimento de prolongamento da sessão. O Sr. Deputado pode continuar a sua intervenção e a Mesa continuará a aguardar o requerimento, que é indispensável para podermos prosseguir os nossos trabalhos.
Faz favor de continuar, Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Orador: - Como dizia, gostaria de salientar que, em relação a essas obras, deveremos interrogar-nos seriamente se esses vários remendos substituem instalações condignas para uma Assembleia da República e se não deverá ter chegado o tempo em que teremos de enfrentar, de uma vez por todas, com clareza e frontalidade, o problema das instalações deste Parlamento, e não através de sucessivas alterações, que acabará por custar, somado aos 39 899 contos deste ano, tanto como um Parlamento novo construído de raiz.
Sabendo todas as dificuldades de apoio com que contamos na Assembleia, importa salientar que a verba despendida com a biblioteca e publicações foi apenas, em números redondos, de 155 contos; os números falam por si, na sua pobreza e naquilo que é o apoio de que podemos dispor.
É justo salientar aqui que os serviços de documentação da Assembleia, recentemente criados, têm aí exercido um esforço muito sério, do qual já todos pudemos certamente beneficiar, pelo que uma palavra de apreço não será aqui demasiada.
Finalmente, temos, em todas estas contas, a necessidade - séria, segundo pensamos- de que elas sejam cada vez mais discriminadas. Precisamos de saber exactamente em que gastamos os vários somatórios desta despesa. Não nos basta a confusão de rubricas. Quando se fala em deslocações de deputados, é preciso saber se são deslocações no País ou no estrangeiro, se são para contactos com o eleitorado ou para regresso às suas residências, etc. É preciso que tudo isso seja discriminado de forma clara e transparente.
Esse é o nosso desejo, esse é o voto que formulamos e, por isso, ficamos por esta manifestação de exigência.
Não vamos votar favoravelmente as contas tal como nos foram apresentadas, mas também pensamos, porque lemos confiança nos serviços e porque pensamos que estão rigorosamente certas na sua expressão, que não estaria certo que votássemos contra o processo, tal como nos é apresentado. A nosso ver, o processo é insuficiente, mas ser insuficiente não significa que esteja errado ou que mereça sequer um mínimo de suspeição.
Por isso, a nossa posição será de abstenção em relação às contas da Assembleia da República, deixando aqui, para que fiquem exaradas, as nossas preocupações e o nosso desejo de que a Assembleia da República possa prestar contas ao povo português, para que contas lhe sejam tomadas e para que nesta Casa, que deve ser um modelo de transparência repito mais uma vez -, as contas sejam feitas também com toda a clareza, com toda a simplicidade e de modo que todos saibam em que são gastos os dinheiros da República.

Aplausos dos Srs. Deputados Lacerda de Queirós, do PSD, e Luís Beiroco., do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrou na Mesa um requerimento, cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Fernando Condesso, que vai ser lido de imediato.

Foi lido. É o seguinte:

Nos termos regimentais, requere-se o prolongamento da reunião de hoje até às 20 horas e 30 minutos, para completar a primeira parte do período da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há mais algum Sr. Deputado que se deseje inscrever para intervir neste debate sobre as contas da Assembleia da República?

Pausa.

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Não havendo mais inscrições, vamos passar imediatamente à votação da resolução de aprovação das contas da Assembleia da República no ano de 1983.

Submetida à votação, foi aprovada com os votos a favor do PS, do PSD, do PCP, do CDS e da UEDS e as abstenções do MDP/CDE, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão na Mesa 2 pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, que vão ser lidos.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - O primeiro parecer é do seguinte teor:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 479 (processo n.º 995, de 11 de Abril corrente, do 1.º Juízo Correccional do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa), enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, comunico a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar deliberou emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Lacão Costa a depor como testemunha no processo em referência.
Conforme desejo manifestado, o Sr. Deputado comparecerá pessoalmente para depor.
Com os melhores cumprimentos.

O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está na Mesa um outro parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que vai ser lido.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - É o seguinte o texto do parecer:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 295, de 30 de Abril último, da delegação da Procuradoria da República na Comarca de Cabeceiras de Basto, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, comunico a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar deliberou emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Gaspar Miranda Teixeira a depor como testemunha no processo nele referenciado.
Com os melhores cumprimentos.

O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai dar-se conta dos documentos entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa 2 votos: um voto de congratulação e protesto referido ao Dia Mundial do Ambiente, da iniciativa do Sr. Deputado Independente António Gonzalez do partido Os Verdes, e um outro voto, da iniciativa do Partido Comunista Português, assinalando o Dia Mundial do Ambiente e saudando de forma particular as iniciativas que o poder local, as associações de defesa do ambiente e as organizações populares estão a realizar visando a defesa do ambiente e pronunciando-se pela necessidade de medidas concretas e de uma política que defenda efectivamente o ambiente e a qualidade de vida das populações.
Deram ainda entrada na Mesa os seguintes projectos de lei: n.º 360/III, da iniciativa do Sr. Deputado Paulo Barrai, do Partido Socialista - Criação da freguesia de Nossa Senhora de Guadalupe, no concelho de Évora -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; n.º 361/III, da iniciativa do Sr. Deputado Paulo Barrai, do Partido Socialista - Criação da freguesia de Canaviais, no concelho de Évora -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; n.º 362/III, da iniciativa do Sr. Deputado José Luís Nunes e de outros Srs. Deputados de vários partidos Estatuto dos Membros do Conselho de Estado -, que foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; n.º 363/III, da iniciativa do Sr. Deputado Malato Correia e outros do Partido Social-Democrata - Lei da Caça -, que foi admitido e baixou à 6.ª Comissão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário referiu há pouco a entrada na Mesa de um projecto de lei relativo ao Estatuto dos Conselheiros de Estado.
Gostava de ouvir novamente o nome dos subscritores desse projecto, pois creio que ouvi apenas o nome do Sr. Deputado José Luís Nunes e creio que se trata de um projecto de lei comum a vários grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Penso que o Sr. Deputado Jorge Lemos tem razão, o diploma está subscrito por deputados de todos os grupos e agrupamentos parlamentares. Naturalmente que o Sr. Secretário tem apenas o nome do primeiro subscritor, mas a interpelação do Sr. Deputado Jorge Lemos permitiu-nos clarificar esse ponto.
Passando à ordem de trabalhos de amanhã, informo os Srs. Deputados que será totalmente preenchida com a discussão da moção de confiança ao Governo; a sessão terá início às 10 horas.

Declaro encerrada a sessão.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Eram 20 horas e 10 minutos.

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Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Joel Maria da Silva Ferro.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cipriano Rodrigues Martins.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Oliveira Mendes Santos.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Victor Manuel Ascensão Mota.

Partido Comunista Português (PCP):

António Guilherme Branco Gonzalez.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
João António Torrinhas Paulo.
Lino Paz Paulo Bicho.
Paulo Simões Areosa Feio.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
João Lopes Porto.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Henrique Paulo Neves Sondo.
João António de Morais Silva Leitão.
Joaquim Rocha dos Santos.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Bento Elísio de Azevedo.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
José António Valério do Couto.
José Augusto Ferreira Campos.
José Vargas Bulcão.
Manuel Pereira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Telmo Silva Barbosa.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Francisco António Lucas Pires.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos enviado à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 5 de Junho de 1984, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitada pelo Partido Socialista:

Amadeu Augusto Pires (círculo eleitoral de Bragança) por Armando Augusto Martins Vara (esta substituição é pedida por 1 dia 4 de Junho corrente);

2) Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (círculo eleitoral do Porto) por Joaquim Dias Carneiro (esta substituição é pedido por 1 dia 4 de Junho corrente);
João Maurício Fernando Salgueiro (círculo eleitoral de Braga) por Telmo Silva Barbosa (esta substituição é pedida para os dias 4 a 15 de Junho corrente, inclusive);
César Augusto Vila Franca (círculo eleitoral de Castelo Branco) por José Pereira Lopes (esta substituição é pedida para os dias l a 30 de Junho corrente, inclusive);
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida (círculo eleitoral de Santarém) por Mário de Oliveira Mendes dos Santos (esta substituição é feita devido ao pedido de renúncia ao mandato de deputado, a partir do passado dia 1 de Junho corrente, inclusive);
Leonel Santa Rita Pires (círculo eleitoral de Lisboa) por Luís António Pires Baptista (esta substituição é pedida para os dias 6 a 8 de Junho corrente, inclusive);
José Pereira Lopes (círculo eleitoral de Castelo Branco) por Vítor Manuel da Ascensão Mota (esta substituição é pedida para os dias 5 a 7 de Junho corrente, inclusive);
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas (círculo eleitoral de Aveiro) por José Augusto Ferreira de Campos (esta substituição é pedida para os dias 4 a 8 de Junho corrente, inclusive);
Pedro Augusto Cunha Pinto (círculo eleitoral de Lisboa) por Garcia dos Santos Marques de Freitas (esta substituição é pedida para os dias 6 a 8 de Junho corrente, inclusive);
Manuel da Costa Andrade (círculo eleitoral de Coimbra) por Cipriano Rodrigues Martins (esta substituição é pedida para os dias 5 a 8 de Junho corrente, inclusive);
3) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

José António de Morais Sarmento Moniz (círculo eleitoral de Viseu) por João da Silva Mendes Morgado (esta substituição é pedida para os dias 6 a 8 de Junho corrente, inclusive);

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5006 I SÉRIE - NÚMERO 118

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos reputados presentes.

A Comissão: O Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, António Machado Lourenço (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Arménio dos Santos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Luís Filipe Paes Beiroco (CDS) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Votos enviados à Mesa para publicação
1 - Voto de congratulação

Comemora-se a 5 de Junho o Dia Mundial do Ambiente.
O quadro em que esta comemoração decorre no nosso país é preocupante.
De facto, verificamos que:

Não existe uma política de solos que impeça a degradação e utilização para fins urbanísticos ilegais de solos de uso agrícola protegido;
Não existe uma efectiva protecção das zonas florestais, nem uma política de implementação de novas coberturas botânicas para grandes zonas do território nacional, hoje em avançado estado de desertificação.
Não existem medidas, e as limitadas medidas existentes não são normalmente utilizadas no sentido de obstar à contaminação por poluentes industriais da rede fluvial nacional, a qual apresenta já situações impeditivas da vida e desenvolvimento dos sistemas ecológicos que lhe são próprios;
Não existe uma política de águas que defina efectivas medidas de protecção aos recursos aquíferos nacionais, os quais sofrem, em especial nas grandes áreas metropolitanas, contaminações provocadas pela infiltração dos mais diversos resíduos sólidos ou líquidos; Não existe uma efectiva vontade no sentido de salvaguardar os espaços naturais essenciais para a utilização lúdica das populações, assim como não existe uma vontade de salvaguardar os restantes espaços culturais que, ao nível do património edificado, traduzam a actividade do homem em afirmação face à natureza que o rodeia.
Nestes termos, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português propõem o seguinte voto de congratulação:

A Assembleia da República ao assinalar o Dia Mundial do Ambiente saúde de forma particular as iniciativas que o poder local, as associações de defesa do ambiente e as organizações populares estão a realizar visando a defesa do ambiente e pronuncia-se pela necessidade de medidas concretas e de uma política que defenda efectivamente o ambiente e a qualidade de vida das populações.
A Assembleia da República reconhece também neste dia o trabalho abnegado das associações de bombeiros que, ano após ano, impedem que maiores prejuízos advenham de incêndios, provocados quer por acções criminosas quer por falta de vigilância e limpeza das nossas florestas.

Assembleia da República, 5 de Junho de 1984. - Os Deputados do PCP, João Abrantes - Anselmo Aníbal - Ilda Figueiredo - Belchior Pereira.

2 - Voto de congratulação e protesto

O Movimento Ecologista Português - Partido «Os Verdes» - neste dia 5 de Junho, Dia Internacional do Ambiente, propõe a esta Assembleia, legítima representante do povo português, um voto de congratulação e protesto do seguinte teor:

Considerando que a Assembleia da República está consciente de que a sobrevivência da humanidade dependerá de que cada comunidade, de per si, e em colaboração com todas as outras, souber fazer, não só para preservar a paz mas igualmente para proteger o meio ambiente no qual teve lugar a nossa evolução e do qual tão intimamente depende a nossa vida;
Considerando que é essa consciência que hoje irmana todos os povos do mundo, habitantes deste ainda belo planeta, que é a nossa terra, que nos devolverá os cuidados que com ela tivermos ou que nos retribuirá o mau uso dos seus recursos naturais.
Esta Câmara congratula-se com os esforços e os resultados positivos do combate às diversas formas de poluição levado a cabo por autarcas, em colaboração com associações e federações ecologistas, de protecção do património cultural e natural, portado-

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rés de uma nova corrente de pensamento, que defende uma gestão do nosso território, mais harmoniosa e equilibrada, e uma nova mentalidade esta mais participativa e cooperante que está a ser moldada em muitos estabelecimentos de ensino, assim como através da acção de um número cada vez maior de jornalistas e profissionais dos órgãos de comunicação social que furam a muralha da competitividade egoísta, da propaganda estupidificante e massificadora e dos embolorados preconceitos sociais.

Mas, por outro lado, esta Assembleia protesta perante a falta de meios de que em geral dispõem todas as estruturas ligadas ao estudo e à vigilância das áreas mais sensíveis do corpo físico do nosso país.

Assembleia da República, 5 de Junho de 1984. - O Deputado Independente, António Gonzalez.

Os Redactores: Carlos Pinto da Cruz - Cacilda Nordeste.

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