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12 DE JULHO DE 1984 5949

Cismei na eventualidade de um ministro deste Governo reconhecer que já existem escutas telefónicas e de ser levado a concluir que, se elas existem, o que há a fazer é legalizá-las.
Posto este cismar, pensei se a solução seria, afinal, legalizar aquilo que é um atentado contra os direitos as liberdades e as garantias dos cidadãos ou se seria combater essa mesma ilegalidade.
Cismei na possibilidade de um qualquer comandante ou chefe de secção, com uma vasta formação sociológica e de investigador ..., ter poderes para executar buscas domiciliárias ou para fazer detenções preventivas e fui levado a concluir que isto era capaz de ser extremamente grave.
Cismei também, na sequência das acções desenvolvidas há poucos dias e que levaram à prisão algumas dezenas de indivíduos acusados de estarem ligados ao terrorismo, na eventualidade de haver um ministro deste Governo que tivesse ficado apopléctico pelo facto de não ter sido preso nenhum membro do PCP.
Cismei em tudo isto e conclui que se estes factos se tivessem passado seria extremamente grave e retiraria toda a isenção de que o Governo pretende vestir esta proposta de lei.
Sr. Ministro, será que cismei apenas, ou será que tudo isto é um facto?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É um pesadelo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra e Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna e meu caro camarada Eduardo Pereira: a clareza e a frontalidade são virtudes políticas, e eu permito-me saudar á clareza e a frontalidade com que o Ministro da Administração Interna defendeu na sua globalidade uma lei em relação à qual eu já manifestei a minha total discordância.
Permito-me também discordar do sentido político da intervenção do Sr. Deputado, e meu prezado amigo, Silva Marques que visou individualizar e singularizar a responsabilidade política do Primeiro-Ministro por uma lei pela qual são responsáveis o Governo, que no seu conjunto a apresenta, e os deputados que a favor dela votarem nesta Casa.

Aplausos de alguns deputados do PS e dos deputados Luis Beiroco (CDS), César Oliveira (UEDS) e Magalhães Mota (ASDI).

Sr. Ministro, ninguém põe em causa a necessidade de uma lei que permita combater a criminalidade e o terrorismo.
Sabe-se que a força da democracia é também a sua fragilidade e que a dificuldade está em conciliar a defesa da democracia com a adopção de disposições que, permitindo combater com eficácia o terrorismo, não tragam consigo o risco de perversão dos valores democráticos.
Em meu entender esta proposta de lei, tal como está formulada e foi apresentada a esta Assembleia, não conseguiu essa conciliação.
Ela contém certas disposições que entendo serem inconstitucionais, outras que são contrárias ao estado de direito e ainda outras contrárias à filosofia e à tradição do Partido Socialista.
Mas o aspecto mais saliente, e porventura mais grave, é o que resulta do conceito de segurança interna, baseado em disposições do artigo 1. º conjugado com o n.º 3 do artigo 11. º, e que atribuem às forças armadas a responsabilidade pela segurança interna em determinadas situações.
Sabe-se que a Constituição só o permite em estado de sítio ou estado de emergência e mesmo assim subordinadas à condução e direcção do poder político democrático e do executivo.
Já aqui foi afirmado pelo meu camarada Sottomayor Cardia que tal conceito aponta no sentido da militarização do poder, e sabe-se que a bandeira do Partido Socialista e deste governo foi e é, segundo penso, a de contribuir para a consolidação em Portugal de uma democracia civilista.
Já aqui se falou de lapso, de cilada e de armadilha. É um ponto fundamental de filosofia política que entra em contradição total com os princípios que presidem à formação deste governo e com a filosofia política dos partidos que o apoiam e, no caso da minha bancada, com a filosofia política, os princípios, a tradição é o combate do Partido Socialista.
E tenho de perguntar ao Ministro da Administração Interna, não ao meu camarada Eduardo Pereira mas neste caso ao Ministro da Administração Interna, se se trata de lapso, de cilada ou se o Governo assume a responsabilidade deste conceito de segurança interna e da filosofia que nele está implícito.

Os Srs. Margarida Marques (PS), Luís Beiroco (CDS) e César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª solicitou a palavra para que efeito?

O Sr. Silva Marques.(PSD): - Para um protesto relativamente às declarações do Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Para esse efeito não lhe posso dar a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, se não é pertinente a figura do protesto - e eu julgo que sim - invocarei o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Nessas circunstâncias, tem a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Manuel Alegre, se pelo facto de eu ter preconizado que perante esta lei deveria haver a intervenção do Primeiro-Ministro, pelas razões que expus, V. Ex.ª me atribui uma intenção de individualização, então dir-lhe-ei que o facto de o Primeiro-Ministro não ter defendido esta lei, conduziu a uma defesa individualizada e pior, porque se há indivíduos de grande elevação - como é o caso -, e portanto nesse aspecto não há degradação da imagem das instituições, com a sectorização de uma questão que é global, a imagem do Estado e das instituições sofre prejuízo.