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19 DE JULHO DE 1984 6067

Sr. Deputado. Sabe! Isso tem-se manifestado e está a manifestar-se; tem uma concepção, por exemplo, de autonomia regional que não é contrária à Constituição e que se compadece com ela. O (tomo açorianos pode não ser culto, mas é sincero, diz o Sr. Deputado. E reafirma: bruto, mas sincero; é só verdade!
O homo açorianos aparece-nos aqui descrito como aquele que pensa que aborto, nem pensar! Filhos ilegítimos, pois claro se nascidos dentro do casamento, mas fora do casamento, maldição! O honro açorianos, tal como o Sr. Deputado o retrata, é bem capaz de em caso de adultério, pum! Divórcio, nem pensar!
É este retrato do homo açorianos? É isto que se pretende impor como retrato dos açorianos que temos, no século XX, espalhados por comunidades em muitos países, obrigados a fugir da sua terra por razões de má gestão da sua própria economia, sem os seus problemas resolvidos, mas lutando por transformá-los? É este o retrato do homo açorianos do século XX?
O Sr. Deputado, nem pensar! Não nos vai impingir essa imagem nem do Estado democrático, nem de homens nem de mulheres, que têm sido muito pouco falados. Esse retrato do pomo açorianus tem como contraponto o retrato da mulher açoriana, desenhada da mesma forma trogloditesca? Não acredito, não conheço isso e estranho muito que o Sr. Deputado, que anda por lá, venha trazer a esta Câmara, esse retrato. Mas apesar de tudo, é sintomático e explica tudo. Com este retrato, o Sr. Deputado só poderia produzir esses argumentos na defesa dessa causa, que é péssima, com o resultado, que esperamos nós, seja excelente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Paulo, se pretende responder já, tem a palavra.

O Sr. Pedro Paulo (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, em primeiro lugar, devo dizer que, lá nos Açores, também nos habituámos a tratar as pessoas com alguma consideração, independentemente das sua ideias e, por isso, refuto e não posso deixar de protestar contra a classificação de troglodítica em relação às minhas palavras e à minha posição.
Disse V. Ex.ª, ao falar da concepção de Estado democrático, que eu defendia um Estado confessional. Sr. Deputado, nada mais erróneo, pois isso é uma distorção daquilo que eu disse. Defendo um Estado em que todas as parcelas territoriais desse Estado possam exprimir democrática e livremente as suas opções e em que sejamos livres de manifestar a nossa fé, as nossas crenças e de afirmar a nossa identidade cultural, onde quer que seja.
Agora, dizer que nós pretendemos, de uma forma jesuítica, criar leis que asfixiem a liberdade...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não disse jesuítica, não especifiquei!

O Orador: - Mas disse uma coisa parecida.
Queria, pois, dizer que não pretendemos criar leis que asfixiem a liberdade de consciência dos cidadãos - não é isso que está dito na minha intervenção. O que está dito é que a matriz cultural do povo açoriano é essencialmente de raiz religiosa e que isso o leva a ter uma determinada posição perante a vida e perante a morte, gosta de ver as ideias que professa traduzidas no plano social e no plano legal gosta de ver uma sociedade legalmente conformada pelos valores em que acredita. Isso não quer dizer que esfole, que mate, perante o adultério - isso acontece em todos os lados do mundo e mesmo nas sociedades mais avançadas há ainda quem mate por adultério. Mas isso não significa que ele estabeleça ou venha reclamar a diferença entre filhos nascidos dentro do casamento e filhos nascidos fora do casamento, embora defenda, intransigentemente, o casamento como modelo de constituição da família.
Penso que o Sr. Deputado, independentemente das posições políticas ou filosóficas que possa ter nessa matéria, e que eu respeito, tentou utilizar um método algo sofístico para tentar distorcer, perante a Câmara, o conteúdo das minhas posições.
Estes ensinamentos da retórica já vêm da Grécia e, portanto, não trouxeram nada de novo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Vêm da pré-história!

O Orador: - Quanto ao honro açorianos, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que me sinto açoriano, portanto, considero uma ofensa à minha qualidade de açoriano que o Sr. Deputado diga que não sou minimamente capaz ou que estou a distorcer, com as mais diversas intenções, o sentimento que penso existir na alma açoriana. O homo açorianos e a qualificação é sua, porque eu não meti latim pelo meio- é um homem essencialmente religioso e está dito.
Não pretendo fixar uma doutrina que o defina. É que, como representante do povo açoriano, tenho o dever de veicular nesta Câmara as posições maioritárias, expressas através dos seus representantes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Tem o direito e o dever. Quanto mais falar, melhor!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, se pretende protestar, tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Pedro Paulo, a Câmara tem ouvidos e actas. Portanto, quanto à questão do < troglodítico», não acrescentarei absolutamente mais nada.
Colocou, realmente, duas questões importantes, mas creio que as colocou mal e, por isso, protesto.
Primeiro, a questão do respeito pelas crenças. Vamos entender-nos. Se queremos garantir o respeito pelas crenças todas e até pela absoluta falta de crenças, então a lei que temos que aprovar é uma que nada imponha a ninguém e que permita a cada pessoa autodeterminar-se de acordo com as suas crenças ou com a falta de crenças. Não podemos é criar uma malha constrangedora da consciência que obrigue, por exemplo, mulheres açorianas a irem ter com a família ao Canadá ou aos Estados Unidos ou a virem aqui ao continente, num instante, para abortarem. Isto quanto às que podem, pois o Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, como é difícil vir ao continente e como estão caras as passagens e como se tem feito tão pouco para que não sejam tão caras como são. Isto é, o Sr. Deputado, em nome da liberdade de consciência, não pode esmagar a liberdade de consciência e a posição que está a defender conduz a isso e não a outra coisa. Não tem coerência e daí o meu primeiro protesto.
Em segundo lugar, quanto à questão da matriz cultural, eu sei que é difícil definir matrizes culturais. Estava a ouvi-lo e estava a lembrar-me, por exemplo, da maneira como a Natália Correia define a matriz cultural açoriana e, como realmente, me parece que essa definição é mais lúcida e mais ligada à realidade cultural dos Açores, tal e qual ela existe - multifacetada e muito rica -, do que aquela que acaba de referir aqui. É que a definição da Natália Correia compagina-se melhor, ,tanto quanto parece, como uma imagem em que, por