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I Série - Número 145

Sexta-feira, 27 da Julho de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE JULHO DE 1984

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários- Exmos. Srs. Leonel Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.

SUMÁRIO. - O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 55 minutos
Antes da ordem do dia. - Foram provados os n.ºs 119 a 134 da I série do "Diário"
Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr Deputado Hasse Ferreira (UEDS) referiu-se à actuação do Governo português relativamente aos Estados envolvidos em disputa territorial no Noroeste Africano e as suas implicações para a actividade dos pescadores portugueses
O Sr. Deputado César Oliveira (UEDS) depois de ler um artigo do jornal "Ecos do Som", contendo afirmações de extrema gravidade para a Assembleia da Republica, solicitou à Mesa que tomasse providência, no sentido de proceder criminalmente contra o referido jornal, no que foi secundado pelos Srs Deputados Jorge Lemos (PCP). Edmundo Pedro (PS) Menezes Falcão (CDS), José Vitorino (PSD) e Ferraz de Abreu (PS).
Em declaração política o Sr Deputado Joaquim Miranda (PCP) fez um balanço dos trabalhos desta Sessão Legislativa, tendo no fim, respondido, ao abrigo da figura regimental do direito de defesa, a protestos dos Srs Deputados Ferraz de Abreu (PS) e José Vitorino (PSD).
Também em declaração política, o Sr Deputado Marques Mendes (PSD) reflectiu sobre a actividade parlamentar desta sessão legislativa.
Ordem do dia. - Foi aprovada a prorrogação de prazo da Comissão Eventual de Inquérito à RTP (resolução n º 19/84)
Foi também aprovada a prorrogação de prazo da Comissão Eventual de Inquérito à EPAC (resolução n.º 12/84)
A Assembleia aprovou o 1.º Orçamento Suplementar paro 1984 da Assembleia da Republica, tendo sido adiada a votação de 2 das suas rubricas.
Após leitura do respectivo relatório pelo Sr Deputado Vilhena de Carvalho (ASDI) e das declarações de voto produzidas em comissão pelos Srs Deputados José Manuel Mendes (PCP) e Jorge Lacão (PS) apreciou-se o relatório da Comissão Eventual de Inquérito a detenção do Deputado Manuel Lopes (resolução n.º 13/84) tendo intervindo a diverso titulo, os Srs Deputados Lopes Cardoso (UEDS), Agostinho Domingues (PS), José Magalhães (PCP), José Luís Nunes (PS), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Luis Beiroco (CDS) e Fernando Costa (PSD).
Sobre este assunto, decidiu-se ainda, a requerimento do PS. pela publicação da parte doutrinária do relatório, sua distribuição pelos deputados e envio a todas as entidades policiais tendo proferido declaração de voto os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Lopes Cardoso (UEDS). Vilhena de Carvalho (ASDI), Fernando Costa (PSD), Menezes Falcão (CDS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) e José Magalhães (PCP).
Concluiu-se o debate, na generalidade, da proposta de lei n º 71/III.
do projecto de lei n.º 367/III do CDS sabre segurança interna e protecção civil e do projecto de lei n .º 370/III, da ASDI, sobre medidas especiais de prevenção ao terrorismo sobre o que intervieram a diverso titulo, os Srs Deputados Narana Coissoró (CDS), José Manuel Mendes e José Magalhães (PCP), António Gonzalez (Indep ), Ilda Figueiredo (PCP). Sottomayor Cardia e Edmundo Pedro (PS). César Oliveira (UEDS). Ângelo Correia e José Vitorino (PSD). Manuel Alegre (PS), Jorge Lemos e Carlos Brito (PCP). Luis Beiroco (CDS) António Taborda (MDP/CDE). Raul Rêgo (PS) Silva Marques (PSD) Lopes Cardoso (UEDS) Lino Lima (PCP) e António Rebelo de Sousa (PSD).
Apôs a aprovação na generalidade da proposta de lei - que teve votação nominal- e dos projectos de lei referidos que bailaram a uma comissão eventual para apreciação na especialidade, produziram declarações de voto os Srs Deputadas Nogueira de Brito (CDS) Octávio Cunha (UEDS) Jerónimo de Sousa (PCP). José Luís Nunes (PS), António Taborda (MDP/CDE) e Ângelo Correia (PSD)
Entretanto o Sr Deputado António Taborda (MDP/CDE) havia interpelado a Mesa sobre e, eficácia da votação da proposta de lei n .º 71/III (Segurança Interna e Protecção Civil), invocando para efeito o disposto no n .º 5 do artigo 171 .º da Constituição Sobre o assunto intervieram também os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS). João Amaral (PCP), Costa Andrade (PSD), José Luis Nunes (PS) e Luis Beiroco (CDS)
Procedeu-se a discussão e votação das propostas de lei n.ºs 84/III e 85/III. que autorizam o Governo, através do Ministério das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante, respectivamente, de USD 57 500 000 e de USD 45 000 000 para aquisição do material e equipamento de defesa proveniente dos EUA.
Intervieram no debate, além do Sr Secretário de Estado da Defesa Nacional (Figueiredo Lopes), os Srs Deputados Carlos Carvalhas (PCP) César Oliveira (UEDS) António Gonzalez (Indep ) e Octávio Teixeira (PCP).
Depois das aprovações na generalidade, na especialidade e final global, produziram declaração de voto os Srs Deputados Magalhães Mota (ASDI) e Carlos Carvalhas (PCP).
Igualmente se procedeu a votação final global da proposta de lei n º 55/III, relativa ao enquadramento dos órgãos e serviços de Estado a quem incumbe assegurar a obtenção, tratamento e difusão das informações necessárias a Defesa Nacional, ao cumprimento das missões das Forças Armadas, a segurança de Estado de direito e à garantia da legalidade democrática Fizeram declarações de voto os Srs. Deputados António Taborda (MDP/CDE), António Gonzalez (Indep ) Jorge Lacão (PS) Luis Beiroco (CDS), João Amaral (PCP) e Ângelo Correia (PSD).
Em seguida a Assembleia apreciou e aprovou um projecto de deliberação que prorroga o período normal de funcionamento da Assembleia

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s da República entre 2 e 15 de Outubro próximo. Usaram da palavra a diverso titulo, incluindo declarações de voto. os Srs Deputados Jorge Lemos (PCP) José Luis Nunes (PS), Marques Mendes (PSD). João Amaral (PCP) e Lopes Cardoso (UEDS)
O Sr. Presidente encerrou a sessão as 7 horas e 10 minutos do dia seguinte

Sr Presidente: - Srs Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão

Eram 10 horas e 55 minutos. Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Socialista (PS)

Abílio Aleixo Curto
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues
Alberto Manuel Avelino
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa
Almerindo da Silva Marques
Américo Albino da Silva Salteiro
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa
António Domingues Azevedo
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro
António José Santos Meira
António Manuel Carmo Saleiro
Armando António Martins Vara.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão
Belmiro Moita da Costa
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires
Carlos Cardoso Lage
Carlos Justino Luís Cordeiro
Carlos Luís Filipe Gracias
Dinis Manuel Pedro Alves
Edmundo Pedro
Eurico Faustino Correia.
Eurico José Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa
Fernando Fradinho Lopes
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro
Francisco Lima Monteiro
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira
Gil da Conceição Palmeiro Romão
Hermínio Martins de Oliveira
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferreira de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Luís Duarte Fernandes
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho de Menezes
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga
Joel Maria da Silva Ferro
Jorge Alberto Santos Correia
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda
José de Almeida Valente
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota
José Carlos Pinto Basto Torres
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes
José Luís Diogo Preza
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Nunes Ambrósio
José Manuel Torres Couto
José Maria Roque Lino
José Martins Pires
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro
Litério da Cruz Monteiro
Luís Abílio da Conceição Cacito
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Alfredo Tito de Morais
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa
Maria Luísa Modas Daniel
Maria Margarida Ferreira Marques
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos
Paulo Manuel de Barros Barrai
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos
Victor Hugo Jesus Sequeira
Victor Manuel Caio Roque

Partido Social-Democrata (PSD/PPD)

Abílio Mesquita Araújo Guedes
Amândio S Domingues Basto Oliveira
Amélia Cavaleiro Monteiro A Azevedo.
Anacleto Silva Baptista
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho
António Joaquim Bastos Marques Mendes
António Maria Orneias Ourique Mendes
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo
Arménio dos Santos.
Cecília Pita Catarino
Cristóvão Guerreiro Norte
Daniel Abílio Ferreira Bastos
Domingos Duarte Lima
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa
Fernando José Roque Correia Afonso
Fernando Monteiro do Amaral
Fernando dos Reis Condesso
Francisco Antunes da Silva
Gaspar de Castro Pacheco
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos
João Domingos Abreu Salgado
João Evangelista Rocha de Almeida
João Luís Malato Correia.
João Mana Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Jorge Nélio Ferraz Mendonça

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José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luis Fernando Gonçalves Riquito.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Cardoso Silva.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Lino Paz Paulo Bicho.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Mário Manuel Coelho Prudêncio.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Simões Areosa Feio.
Raul de Jesus Ferreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Riveiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Góes.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Maria da Conceição Dias Neto.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
Helena Cidade Moura.
João Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia
Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Para que fique registado, quero informar que a ordem do dia para hoje foi fixada numa reunião de líderes parlamentares e não corresponde exactamente ao que foi ontem anunciado. Houve depois um consenso geral em relação a esta alteração, sendo por ela que nos vamos orientar.

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Chamo ainda a atenção para o ponto 2.3 da primeira parte da ordem do dia, que é a discussão e votação do 1.º Orçamento Suplementar para 1984 da Assembleia da República. Ficou decidido, em reunião de líderes, que estes pontos da primeira parte não teriam discussão a fim de podermos entrar rapidamente na segunda parte.
O ponto 2.3 merece algumas observações estando ainda a tentar regularizar-se este problema. Se ele vier a discussão, de forma a não poder ser votado sem ser discutido, retirá-lo-ei da ordem de trabalhos.
Desejo também comunicar à Assembleia que, baseado num parecer da Auditoria Jurídica, não admiti o projecto de resolução n.º 38/III, apresentado pelo PCP, sobre a detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes o que já mandei comunicar, nos termos regimentais, aos signatários.

O Sr. Deputado Jorge Lemos deseja interpelar a Mesa?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, interpelarei a Mesa quando o Sr. Presidente me der a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Estou a conceder-lhe a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, como já ontem tive oportunidade de lhe comunicar em nome do meu grupo parlamentar, vamos recorrer da decisão do Sr. Presidente de não admitir o projecto de resolução n.º 38/III.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 119 a 134 do Diário respeitantes às reuniões plenárias de dias 6, 7, 8, 11, 12, 14, 15, 19, 20, 26, 27, 28, e 29 de Junho findo e dos dias 3, 4, e 5 de Julho corrente.

Pausa.

Como não há oposição, consideram-se aprovados. Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente

Carta

Da Associação Sindical dos Magistrados Judiciais Portugueses, agradecendo a todos os Srs. Deputados signatários da resolução sobre afirmações da TV francesa, por considerarem que tal atitude confirma o melhor entendimento existente entre o poder legislativo e o poder judicial.

Ofícios

Da Assembleia Municipal da Marinha Grande, do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa, da Comissão de Trabalhadores do Serviço de Transportes Colectivos do Porto, do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas - Secção Regional de Setúbal; e do Sindicato dos Enfermeiros da Zona Sul, todos repudiando a Lei de Segurança Interna.
Da Junta de Freguesia de Argoncilhe a enviar uma moção na qual se manifestam contra a hipotética divisão daquela freguesia.
Da Câmara Municipal de Viana do Castelo a remeter cópia de uma deliberação tomada por aquela autarquia em sua reunião de 3 do corrente, na qual foi aprovada uma proposta para a instalação da via férrea dupla entre Porto e Valença.
Da Assembleia Municipal de Mourão capeando uma moção relativa ao encerramento do ramal do caminho de ferro entre Évora e Reguengos de Monsaraz, contra o qual se manifestam, sem prévia audição dos autarcas daquele concelho.
Da Assembleia Municipal de Almeirim dando conhecimento do teor de uma moção na qual exigem que os preços de consumo de energia eléctrica sejam iguais em todo o País.

Telegrama

De Lúcio Feteira, de Lisboa, considerando ser de apoiar a proposta de lei sobre Segurança Interna e Protecção Civil.

O Sr. Presidente: - Vão ser lidos os requerimentos.

O Sr. Secretário (Herminio de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos seguintes:

Dia 19 de Julho de 1984 - ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Jaime Ramos; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Mota; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Cunha e Sá: ao Ministério da Saúde, formulado pelos Srs. Deputados Jaime Ramos e Eurico Figueiredo.
Dia 23 de Julho de 1984 - a vários ministérios (7), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Educação e à Secretaria de Estado do Equipamento Social (2), formulados pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho; a vários ministérios (4), formulados pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura e outros.
Dia 24 de Julho de 1984 - a vários ministérios (7), formulados pelo Sr. Deputado António Gonzalez; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Mota; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Lino Paulo; à Secretaria de Estado das Obras Públicas, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Costa.
Dia 25 de Julho de 1984 - ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelos Srs. Deputados Santos Correia, Luís Martins e outros, respectivamente; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Handel de Oliveira; à Secretaria de Estado do Orçamento, formulado pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo. O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Monteiro e outros, na sessão de 5 de Julho de 1983; Joaquim Ribeiro Arenga, na sessão de 12 de Dezembro; Ferreira Miranda, na sessão de 12 de Janeiro; Manuel Jorge Góes, na sessão de 3 de Fevereiro; Álvaro Brasileiro e Rogério Brito, na sessão de IO de Fevereiro; João Corregedor, na sessão de 16 de Fevereiro; António da Costa, Francisco Antunes da Silva e José Pereira Lopes, na sessão de l de Março, respectivamente; Leonel Fadigas, na sessão de 9 de Março; Machado Lourenço, na sessão de 21 de Março; António Gonzalez, nas sessões de 27 e 29 de Março; Magalhães Mota, na sessão de 16 de Abril; Maia Nunes de Almeida e Jorge Lemos, na sessão de 17 de Abril; Zita Seabra,

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na sessão de 26 de Abril; Agostinho Domingues, Daniel Bastos e outros, na sessão de 7 de Maio respectivamente; Carlos Espadinha, na sessão de 9 de Maio; Reinaldo Gomes e Ilda Figueiredo, na sessão de 23 de Maio, respectivamente; Agostinho Banquinho e Luis Monteiro, na sessão de 24 de Maio; José Magalhães e José Manuel Mendes, nas sessões de 29 de Maio e 6 de Junho; Abílio Araújo Guedes, na sessão de 6 de Junho; Octávio Teixeira, na sessão de 20 de Junho de 1983; Cardoso Ferreira, na sessão de 26 de Outubro; Figueiredo Lopes, na sessão de 4 de Novembro; António Taborda e Helena Cidade Moura, na sessão de 3 de Janeiro; Zita Seabra, na sessão de 13 de Janeiro; Magalhães Mota, nas sessões de 3 de Abril, 7 e 29 de Maio; Ilda Figueiredo, Araújo Guedes e Caio Roque, na sessão de 16 de Abril, respectivamente; José Vitorino, na sessão de 2 de Maio; Paulo Barrai, na sessão de 8 de Maio; Carvalho Silva, na sessão de 9 de Maio; Paulo Areosa e Jorge Patrício, na sessão de 10 de Maio; José Silva Marques, Manuel Laranjeira Vaz e outros, na sessão de 17 de Maio, respectivamente; Maria Ângela Pinto Correia, na sessão de 23 de Maio; Lino Paulo e Anselmo Aníbal, na sessão de 29 de Maio; Frederico de Moura e outros, na sessão de 29 de Maio; Agostinho Branquinho e outros, na sessão de 30 de Maio; Coelho Pires, na sessão de 31 de Maio; Eurico Figueiredo e António Meira, na sessão de 13 de Dezembro; José Vitorino, na sessão de 3 de Janeiro; Dinis Alves, na sessão de 5 de Janeiro; Manuel Jorge Góes, nas sessões de 13 de Janeiro e 3 de Fevereiro; Custódio Gingão, na sessão de 3 de Fevereiro; Magalhães Mota, nas sessões de 7 de Fevereiro e 3 de Abril; António Gonzalex, na sessão de 8 de Março; Jorge Lemos, na sessão de 20 de Março; António Dias Lourenço e outros, na sessão de 21 de Março; José Manuel Mendes, na sessão de 21 de Março; Octávio Teixeira, nas sessões de 30 de Março e 17 de Abril; Zita Seabra, na sessão de 26 de Abril; Lacerda de Queiroz, na sessão de 2 de Maio; João de Almeida Eliseu, na sessão de 4 de Maio; Ilda Figueiredo, nas sessões de 4, 8 e 23 de Maio; José Silva Marques, na sessão de 17 de Maio; Paulo Barrai e Raul de Brito, na sessão de 23 de Maio, respectivamente; Carlos de. Oliveira e Sousa, na sessão de 24 de Maio; Silvino Sequeira, nas sessões de 25 e 29 de Maio; Guido Rodrigues, na sessão de 30 de Maio; Ilda Figueiredo, na sessão de 29 de Maio; Agostinho Branquinho e outros, na sessão de 6 de Junho; Armando de Oliveira, na sessão de 5 de Janeiro; Helena Cidade Moura e outros, nas sessões de 13 de Janeiro e 5 de Abril; Luiza Cachado e António Mota, na sessão de 25 de Janeiro; Ferdinando Gouveia, nas sessões de 3 de Fevereiro e 29 de Março; António da Costa e João Corregedor, na sessão de 16 de Fevereiro, respectivamente; Jorge Lemos e outros, nas sessões de 20 de Março, 29 de Maio e 4 de Julho; Fillol Guimarães, na sessão de 21 de Março; Joaquim Miranda, na sessão de 27 de Março; Magalhães Mota, nas sessões de 16 de Abril, 2, 7 e 29 de Maio e 26 de Junho; Ilda Figueiredo e Jorge Lemos, na sessão de 17 de Abril; Zita Seabra, na sessão de 26 de Abril; José da Cunha e Sá, na sessão de 3 de Maio; José da Silva Marques, na sessão de 7 de Maio; Jaime Ramos e outros, na sessão de 30 de Maio; José Vitorino, na sessão de 5 de Junho; José
Manuel Maia e Jorge Lemos, na sessão de 11 de Junho; Luis Martins e Daniel Bastos, na sessão de 30 de Junho; Nelson Pereira Ramos e António da Costa, na sessão de 20 de Junho; João de Almeida Eliseu, na sessão de 29 de - Julho; Carlos Brito e Margarida Tengarrinha, na sessão de 4 de Julho.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Intervenho hoje nesta Assembleia, para me pronunciar sobre um assunto de política externa que tem no entanto bastante que ver, e directamente, com a actividade de cidadãos portugueses. Faço-o, porque tendo já há algum tempo procurado esclarecer--me, por via que considerei adequada, sobre qual a política do Governo português face a este assunto, não obtive ainda qualquer resposta. A importância da questão e o relevo dos interesses em jogo, bem como uma exigência de coerência no plano dos princípios, impõem-me que não deixe determinar esta prolongada Sessão Legislativa sem usar da palavra quanto a este assunto.
Não me vou referir à urgente questão de Timor-Leste, em relação à qual não será demasiada toda a conjugação de esforços que se possa efectuar, no plano da acção nacional e internacional, entre os órgãos de soberania. Presidente da República, Parlamento e Governo. Não vou também abordar os problemas concernentes à integração de Portugal na CEE, apesar da importância dos mesmos. Também não focarei hoje os problemas da paz e da guerra na América Central, o conflito do Médio Oriente ou sequer o Afeganistão. Tratarei de algo geograficamente mais próximo e envolvendo pessoalmente cidadãos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde há muitos anos que barcos de pesca portugueses demandam as costas do Noroeste Africano, procurando o peixe que não encontram em suficiente abundância nas costas portuguesas e na zona económica exclusiva ou que nessa própria zona lhe é disputado por marinhas mais bem equipadas do que a portuguesa. Não nos detenhamos por ora nas razões do atraso da nossa marinha de pesca ou na necessidade de orientar preferencialmente uma significativa parte da nossa marinha de guerra para as funções classicamente desempenhadas por uma guarda costeira.
Queria referir sim um assunto importante que tem a ver com a actuação do Governo português relativamente aos Estados envolvidos em disputa territorial nesse mesmo Noroeste Africano e com as suas implicações para a actuação dos pescadores portugueses.
Parece lógico e até aceitável que dada a prática da pesca por portugueses na referida zona, as autoridades portuguesas celebrem acordos com as autoridades dos países em cujas águas territoriais os pescadores portugueses têm exercido a sua actividade. Só que, existindo uma disputa territorial que tem oposto o povo saharaui, liderado pela Frente Polisário ao Estado marroquino chefiado por Hassan II, há consequências para o trânsito de navios nas próprias águas territoriais que têm de ser ponderadas.
O que se trava é uma guerra de libertação do Sara Ocidental, apoiada por diversas forças políticas, entre as quais destacamos, boa parte dos partidos responsáveis por governos africanos, designadamente o argelino e numerosas forças e organizações de esquerda na Europa, entre as quais temos o orgulho de nos contar. E essa luta liderada pela Frente Polisário já conduziu à liber-

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tacão territorial de uma parte extremamente significativa do território da RASD (República Árabe Saharaui Democrática) tendo a própria Mauritânia, em tempos envolvida na guerra, reconhecido a independência da mesma República; já a maior parte dos Estados da Organização de Unidade Africana declarou também o seu apoio à autodeterminação das populações e consequente independência do Sara Ocidental. A diplomacia sanaraui vai assim obtendo no plano internacional as vitórias que constituem o indispensável complemento dos triunfos que as suas forças vão obtendo no terreno, face às bem armadas tropas marroquinas.
Uma parte da costa do Sara Ocidental já está assim libertada e em poder das forças da Polisário que podem, a qualquer momento, utilizar peças instaladas na costa e disparar contra barcos marroquinos, tripulados por marroquinos ou com soldados marroquinos. Até agora, têm evitado, no entanto, os conflitos com portugueses, com paciência que se poderá esgotar, se não houver da nossa parte uma correspondência mínima.
Nestas circunstâncias, impor-se-ia toda a prudência por parte das autoridades portuguesas que têm estado envolvidas em acordos com Marrocos e, em contrapartida, têm dificultado o diálogo com a Frente Polisário. Recentemente, o Ministro dos Negócios Estrangeiros português ter-se-á recusado a receber um dirigente da Frente Polisário que se encontrava em Lisboa e, alguns dias depois, o mesmo ministro deslocou-se a Marrocos.
No dia 7 de Junho de 1984, pelas razões atrás descritas e outras fundamentadas no próprio documento, o signatário como deputado da UEDS, requereu ao Ministro dos Negócios Estrangeiros e à Secretaria de Estado das Pescas «o texto exacto e integral do Acordo de Pescas Luso-Marroquino» e perguntou ainda se existia algum acordo complementar com cláusulas de carácter militar ou concernentes à segurança das embarcações.
Visava-se ainda e concretamente, obter um esclarecimento sobre a autorização eventualmente dada pelas autoridades portuguesas no sentido de soldados marroquinos montarem o sistema de segurança e serem possivelmente transportados a bordo de barcos de pesca portugueses ou pertencentes a sociedades mistas
luso-marroquinas.
Dada a conjuntura que se focou e os avisos da Frente Polisário relativos a barcos marroquinos ou com tropas marroquinas que entrem nas águas territoriais reivindicadas pela RASD, compreende-se perigo de uma actuação imprudente neste domínio. Perigo que a intervenção feita a 8 de Junho último em Setúbal, por um dirigente da Frente Polisário, em sessão pública, veio evidenciar. Perigo que se terá traduzido numa atitude que me levou, como signatário do mesmo requerimento, a solicitar informações sobre a eventual recusa de alguns armadores portugueses em admitirem a bordo dos seus navios homens armados, eventualmente membros das forças armadas marroquinas.
Mais se requeria ao Ministério dos Negócios Estrangeiros que informasse sobre qualquer eventual alteração surgida na posição portuguesa quanto ao Sara Ocidental e posterior às assumidas na ONU». Relembra-se que a delegação portuguesa votou, na ONU, apoiando a autodeterminação do povo do Sara Ocidental.
Como complemento, dada a relevância do problema da segurança dos pescadores portugueses e uma exigência de coerência política que se deve ter perante os dirigentes do Estado português, requeria-se ainda ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e à Secretaria de Estado das Pescas que informassem «sobre a eventualidade de o acordo luso-marroquino abranger zonas contestadas ou seja, simultaneamente reivindicadas por marroquinos e saharauis». Requeriam-se também «esclarecimentos sobre a continuidade ou não dos contactos com a Frente Polisário na sequência dos efectuadas na vigência dos governos da Aliança Democrática».
Antes de terminar dizia-se no mesmo requerimento e mantém-se que «importa efectivamente esclarecer se os acordos de pesca luso-marroquinos revestem ou não um sentido hostil em relação à Frente Polisário e ao direito de autodeterminação das populações do Sara Ocidental».
Concluía-se o requerimento realçando que «importa ainda que fique bem claro se não se está a criar a possibilidade de limitar as perspectivas dos pescadores portugueses poderem exercer a sua actividade nas costas do Sara Ocidental, num futuro certamente próximo, após a consagração do direito das populações saharauis a disporem de si próprias, direito que se vai cada vez mais exercendo no terreno», pela libertação progressiva do território.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me efectivamente uma questão importante. Lamento a falta de resposta aos esclarecimentos pedidos e resumiria dizendo que se me preocupa bastante o problema do respeito pelos princípios da autodeterminação no Sara Ocidental como noutras zonas do globo, não menos me preocupa o risco que podem correr pescadores portugueses. Penso que se impõe um esclarecimento e uma atitude política clara! É isso que pretendemos. Ambiguidades neste domínio poderão ocasionar a perda de vidas portuguesas.

Aplausos da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, chegou-me há minutos às mãos um artigo de um jornal chamado Ecos de Sor, que me permito ler para informar a Câmara da gravidade do aqui está contido, em relação a esta instituição.
O artigo diz o seguinte: «Quem tem acompanhado o nosso parlamento nos últimos tempos fica boquiaberto com o que se tem passado. São as propostas, as contrapropostas, as alterações às propostas e às contrapropostas, os pedidos de prioridade e as faltas de quórum, as horas extraordinárias e as noitadas à volta da lei de segurança. Tudo isto traz como consequências para os deputados: ganhos de um período extraordinário, ganhos de muitas horas extraordinárias a compensar as horas ordinárias em que nada fizeram senão esperar número suficiente para haver quórum; aprenderem a executar todos os truques que impeçam uma lei de ser votada, quando não agrada.
Para o País as consequências são outras: gastos do dinheiro público para além do previsto, num erário tão depauperado; descrédito nos nossos deputados que passam o tempo a jogar connosco; a não aprovação das leis que nos são essenciais.
Alguém dizia há dias: mais valia que para fazerem isto fechassem a porta e fossem para casa - todos lucraríamos imenso com isso.
Não quero com isto dizer que não faça falta ao País uma lei de segurança. Os assaltos aos bancos, os atentados bombistas e à mão armada, os assaltos a embaixadas provam que a lei faz até muita falta. Agora não é com palhaçadas destas que se consegue aprovar uma lei em condições. Só espero que os deputados que tem tanto receio da aprovação desta lei antiterrorista, não estejam nesta posição porque temam estar a arranjar lenha para se queimar... Ou será que o terrorismo faz parte das sociedades democráticas? Ou será que todos

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os partidos com assento em São Bento são democráticos?

Haja moralidade, Sr. Alto Comissário anticorrupção. O que se passa no nosso parlamento é corrupto e por isso há que lhe pôr termo.»

Sr. Presidente, isto é grave. Resume, ao fim e ao cabo, as posições que vão por esse país fora habilmente urdidas, habilmente insinuadas na opinião pública por quem é antidemocrático, por quem anseia por uma revanche do 25 de Abril!
Solicitava à Mesa desta Assembleia, e certamente honra-me que seja V. Ex.ª, Sr. Engenheiro Tito de Morais, a presidir, neste momento, à sessão, que tomasse providencias urgentes e necessárias para que de imediato seja procedido criminalmente contra o jornal Ecos de Sor, e particularmente contra o senhor que escreve estas aleivosias sem nome, que são o prelúdio e a preparação psicológica para um golpe militar que destrua as liberdades em Portugal.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado o favor de mandar para a Mesa esse jornal. Tomarei as medidas requeridas em relação a este artigo, que não tem classificação, e que a todos nos indigna.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, pensamos que artigos do jaez do que acabamos de ouvir não dignificam a imprensa portuguesa. A liberdade de imprensa que conseguimos não foi para isto. Pensamos que V. Ex.ª terá os meios legais necessários para proceder, de modo a que factos e calúnias como as constantes desse papeleto não venham a repetir-se.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Edmundo Pedro.

O Sr. Edmundo Pedro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi atentamente a declaração feita pelo Sr. Deputado César Oliveira à qual dou o meu inteiro apoio. Queria, contudo, lembrar o seguinte: há poucos dias, falando justamente neste problema com alguns colegas nossos, sugerira a necessidade do esclarecimento, por parte da Assembleia, sobre o que se passa nessa matéria.
Para além de procedimento criminal e de um eventual processo ao autor destas miseráveis declarações, acho que deveríamos considerar a possibilidade de esclarecer o País quanto ao carácter das horas extraordinárias que aqui fazemos, as quais não têm qualquer contrapartida, representando apenas um esforço dos deputados.
Já agora faço um apelo aos órgãos de comunicação social aqui presentes, no sentido de ajudarem a esclarecer esta realidade pois a voz corrente entre a população é de que atrasamos os nossos trabalhos para fazermos horas extraordinárias e, consequentemente, ganharmos mais.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Falcão.

O Sr. Menezes Falcão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É só para declarar que nos solidarizamos com a manifestação de repulsa por aquele amontoado de monstruosidades.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É também para uma breve tomada de posição. Julgamos serem perfeitamente descabidos os comentários, o tom geral como foram feitos e que aqui foram reproduzidos pelo Sr. Deputado César Oliveira.
Temos lutado para que o funcionamento da Assembleia seja o melhor possível, daí, designadamente, pretendermos as alterações ao Regimento que darão, sem dúvida, uma muito maior eficácia aos nossos trabalhos. É criminoso que venha dizer-se que deixamos de trabalhar quando devemos, para o fazermos fora de horas só para recebermos horas extraordinárias! É o mínimo que se pode considerar!
É criminoso, quanto mais não seja pela ignorância ou pela má fé. Não acreditamos, porém, na ignorância de quem o escreve, pensamos antes que será, sem dúvida alguma, um acto de má fé que aqui deve ser veementemente condenado. Estamos, por isso, de acordo com a resposta que certamente o Sr. Presidente irá dar a mais este atentado ao regime democrático.

Aplausos do PS, do PSD do CDS da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de o nosso camarada Edmundo Pedro ter já pronunciado palavras de repúdio pela notícia apresentada pelo Sr. Deputado César de Oliveira, queremos exprimir, com a maior das veemência, o repúdio do nosso grupo parlamentar face à notícia e dizer que apoiamos totalmente a proposta do Sr. Deputado César Oliveira no sentido de ser intentado processo criminal contra o autor do artigo.

Aplausos do PS da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, permita-me que, antes de fazer u minha intervenção, refira, claramente, que as críticas duras que vou proferir têm precisamente como fim, melhorar o funcionamento da Assembleia da República, fazer com que ela tenha uma melhor produção e, logo, uma melhor imagem perante o público.
Naturalmente que da nossa intervenção ressalta que repudiamos aleivosias, monstruosidades como aquelas que agora nos foram lidas pelo Sr. Deputado César Oliveira. Elas vão precisamente em sentido contrário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O balanço dos trabalhos desta Sessão Legislativa leva inevitavelmente à conclusão de que ela será registada pela história parlamentar como uma das mais degradantes no período pós-25 de Abril.
Conduzida pela mão desregrada e incapaz de uma maioria particularmente vocacionada para a subordinação da Assembleia da República aos interesses do Governo, esta Sessão Legislativa, à partida condicionada por tais mazelas, transformou-se num continuado alentado aos direitos, liberdades è garantias dos cidadãos, nomeadamente dos trabalhadores. As raras excepções, essas, ficaram para confirmar a regra. E as

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excepções, neste caso, foram os três diplomas sobre a maternidade e os direitos da mulher.
Se é indiscutível que o Governo se encontra isolado do povo e do País, face à política antipopular e antinacional que vem desenvolvendo, não é menos verdade que esta maioria, transformada em porta-voz daquele e sem personalidade própria, é igualmente merecedora da crítica dura e generalizada da opinião pública.
Tal como o Governo, esta maioria parlamentar encontra-se esgotada de fundamentos que justifiquem a sua sobrevivência. E, a manter-se, não seriam apenas os partidos que a constituem que continuariam a deslizar em velocidade acelerada pela via do descrédito; a tendência seria a de levarem consigo, nessa viagem, o próprio prestígio deste orgão de soberania; para além de acentuar ainda mais os já graves problemas nacionais.
E é sintomático, Srs. Deputados, que nunca como nesta Sessão Legislativa tenham sido debatidas tantas e tão inqualificáveis iniciativas governamentais visando desrespeitar os mais elementares direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; os diplomas sobre a "fichagem" dos portugueses, os serviços de informação - que chamam à memória dos democratas os horrores da polícia política fascista - e ainda esta monstruosidade que continua em debate e que dá pelo nome de proposta de lei de segurança interna, aí o estão para o demonstrar.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se outras matérias não tivessem sido apresentadas e debatidas nesta Câmara e também elas de extrema gravidade estas que referi, por si só manchariam irremediavelmente a presente Sessão Legislativa.
Porém outras houve e também elas gravosas. Refiro--me à autorização legislativa que determinou a legislação que abriu caminho ao grande capital privado nacional e internacional -a Banca e os seguros. Uma velha aspiração que a AD não conseguiu ver aprovada, mas que o presente Governo e esta maioria, como que para dar o sinal de continuidade, fizeram aprovar em marchas forçadas logo no início da sessão.
Foi ainda o caso da autorização legislativa que visou a revogação da Lei de Finanças Locais e a publicação de um pacote antiautárquico merecedor de um alargado repúdio por parte das autarquias e dos eleitos locais.
E foram também o Orçamento de Estado e as Grandes Opções do Plano esses sustentáculos da política económica e financeira governamental que vem determinando o empobrecimento generalizado das populações e a ruína de milhares de pequenas e médias empresas.
Diplomas que, por si só, são gravosas, mas que mesmo assim não são acatados pelo Governo como se verifica quanto ao plano anual que continua por publicar.
Porém a estas e outras peças definidoras dos interesses que movem o Governo e a sua maioria, importa acrescentar o que não se fez porque a isso o Governo e a maioria se opuseram. Assim o quadro ficará mais elucidativo.
Virando costas a compromissos assumidos e rejeitando projectos tendentes à resolução de problemas agudos, a maioria inventou expedientes grosseiros, ludibriou populações e acentuou mesmo dramas que afectam milhares de famílias.
O PS comprometeu-se, através de alguns dos seus mais destacados dirigentes, a votar favoravelmente um projecto de lei de criação do concelho de Vizela. Ficou-se pelo compromisso e, aqui na Assembleia, refugiou-se no expediente, que desde logo denunciámos, da elaboração de uma lei quadro de criação de municípios.
O expediente foi grosseiro como hoje se prova, o que em si é bastante grave; mas pior ainda é que a população de Vizela foi assim vergonhosamente ludibriada por esta maioria sem princípios.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Ocorre referir a recente noticia, segundo a qual e em protesto por esta actuação inqualificável, a totalidade dos eleitos das 2 freguesias de Vizela pediram a sua demissão dos cargos que nelas vêm exercendo. É esclarecedor!
Mas foi mais longe a maioria. Criou a expectativa de finalmente ser criado um elevado número de novas freguesias. As populações respectivas viram perspectivada a resolução de aspirações antigas. No entanto e perante o imperativo legal de realização de eleições em tão significado número de localidades de todas as latitudes do País, de cuja concretização resultariam inevitáveis e fortes penalizações para os partidos da maioria, esta recuou de forma atabalhoada e vergonhosa e acabou por sacrificar aqueles anseios populares a interesses meramente partidários.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Fez baixar tais projectos à Comissão Parlamentar respectiva. Continuou, entretanto, a prometer às populações o seu agendamento e a aprovação final global ainda nesta sessão. Não se coibiu mesmo de participar - e seguramente fomentar- comezainas em que alardeou a sua hipocrisia. Chegados que somos ao final da sessão, os projectos aprovados na generalidade mantém-se, porém, nas catacumbas da Comissão e as freguesias continuam por criar. É um escândalo!
Mas, mais grave ainda, foi a atitude desta maioria e do seu Governo quanto a esse flagelo que são os salários em atraso.
Apesar de ter sido forçada a reconhecer a gravidade da situação, depois de muitas denúncias que aqui formulámos, nomeadamente numa interpelação ao Governo sobre a matéria, a maioria, cega e sectariamente, votou contra todas as iniciativas legislativas que aqui apresentámos e impediu mesmo a admissão de algumas delas. E, apesar do PS ter anunciado a intenção de aprovar medidas tendentes à resolução do problema, o certo é que, não chegou sequer a apresentar qualquer projecto. É inadmissível, Srs. Deputados, que esta Assembleia no termo desta Sessão Legislativa, não tenha legislado com vista a pôr cobro a uma tão dramática situação.

Aplausos do PCP.

É inadmissível mas também é sintomático e elucidativo dos objectivos antipopulares que norteiam esta maioria. Só de uma maioria e de um governo como estes, que tão empenhados têm estado na limitação das liberdades e no ataque aos mais elementares direitos dos trabalhadores, poderia resultar uma tal postura antipopular.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como referi no início desta intervenção um dos elementos caracterizadores desta Sessão Legislativa encontra-se na constante tentativa de governamentalização da Assembleia da República.
Os pedidos de autorização legislativa pelo Governo, sucederam-se tendo a Assembleia aprovado nada menos que 24 (para além das cerca de 80 que integravam o Orçamento do Estado), ao que acrescem mais 13 propostas de lei que igualmente daqui saíram com a chancela da maioria.

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Os trabalhos da Assembleia foram assim dominados pelos interesses e objectivos do Governo.
Mas à governamentalização somaram-se ainda os constantes impedimentos ao agendamento dos pedidos de ratificação de decretos-leis. Ou seja: à governamentalização seguiu-se uma verdadeira obstrução pela maioria do exercício do importante papel de fiscalização dos actos governamentais. Um exemplo elucidativo: só o PCP apresentou 95 pedidos de ratificação. No entanto, para que o exercício desse direito regimental fosse acatado, foi, necessário recorrer, como aconteceu com o pacote antiautárquico, ao exercício do direito de marcação. E, mesmo assim, nem todo o pacote antiautárquico pôde ser analisado pela Câmara. Não fosse esse agendamento e dificilmente os problemas das autarquias locais seriam debatidos nesta Câmara.
De resto também só pela iniciativa dos partidos da oposição e nomeadamente do PCP, através de uma interpelação ao Governo, foi possível durante este ano parlamentar e quando se agravam os problemas económicos e sociais do País, discuti-los aqui seriamente e apresentar soluções alternativas.
Mas, Srs. Deputados, será que a governamentalização, a obstrução às iniciativas dos partidos da oposição e nomeadamente do PCP, resultam de uma falta de iniciativa ou de uma menor importância dos projectos apresentados, ou ainda da falta de tempo para os discutir? É evidente que não!
Para além dos pedidos de ratificação já referidos o PCP apresentou na Mesa da Assembleia, 118 projectos de lei respeitantes a áreas e sectores tão diversos como o poder local, os direitos dos trabalhadores e dos cidadãos, a economia, a agricultura e as pescas, a habitação, o ensino, a saúde e a segurança social, os deficientes, os emigrantes, a juventude, a comunicação social, as regiões autónomas, a cultura e o património, a paz e o desarmamento. E apresentámos ainda 10 pedidos de inquérito relacionados com fortes suspeições de corrupção, 6 dos quais no seguimento do compromisso assumido pelo Ministro de Estado Almeida Santos no sentido de que o Governo colaboraria na sua realização e a maioria os votaria favoravelmente. Respondemos ao desafio. Nós cumprimos; o mesmo não se pode dizer do Governo e da maioria que impediram o agendamento e a votação de tais inquéritos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não pode, em boa verdade, argumentar-se com falta de matéria e de matéria importante para discutir. De resto são muitos e graves os problemas que o País e o povo enfrenta. Deles demos conta através de mais de 60 intervenções que proferimos no período de antes da ordem do dia.
Srs. Deputados, senão é possível argumentar com falta de matérias importantes para discutir, é igualmente impossível argumentar com falta de tempo. Se outros exemplos não existissem, e existem bastantes, aí teríamos o significativo caso da lei iníqua a que irremediavelmente ficará ligado o Sr. Deputado Montalvão Machado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Vou terminar o mais rapidamente possível.

O Sr. Presidente: - Não é tentar, Sr. Deputado, é terminar mesmo.

O Orador: - Terminarei, Sr. Presidente.

Quem desconhece hoje, Srs. Deputados, a incapacidade desta maioria para organizar os trabalhos da Assembleia? Quem desconhece que, com esta maioria, a generalidade das comissões funcionam anomalamente - quando funcionam?
E é ou não verdade, Srs. Deputados que só a inépcia, o sectarismo, a subordinação cega aos objectivos governamentais, levaram a que esta maioria transformasse o funcionamento desta Assembleia num verdadeiro caos?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Pedia-lhe o favor de ...

O Orador: - Sr. Presidente, queria apenas terminar esta parte.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Assembleia não permite. Tenho imensa pena.

O Orador: - Sr. Presidente, se me permite, penso que se trata de uma situação anómala pois é normal em declarações políticas poder-se ultrapassar ligeiramente o tempo previsto. Aliás, isso tem sido assim ao longo de toda a Sessão Legislativa.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado já ultrapassou ligeiramente o tempo, e se a Assembleia estivesse de acordo não tinha dúvidas em deixá-lo continuar.

O Orador: - Sr. Presidente, então agradecia-lhe que perguntasse à Assembleia se permitia que terminasse num minuto e meio esta minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Joaquim Miranda solicita-me que pergunte à Assembleia se concorda em que ele prolongue por minuto e meio a sua intervenção.
Se houver objecções, agradeço que me digam, não havendo considero não haver inconveniente. Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, pensamos que deve cumprir-se o que ficou acordado quanto a tempos, em reunião de líderes.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É a primeira vez que uma coisa destas se passa!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É uma deselegância!

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, registamos esta atitude do PS. Ela vem de facto, ao encontro daquilo que aqui denunciámos durante a intervenção que foi possível produzir.

Aplausos do PCP.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Hão-de pagar isto!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Ferraz de Abreu pede a palavra para que efeito?

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Para protestar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se esse protesto se reporta à intervenção do Sr. Deputado Joaquim Miranda, devo esclarecer que ele não tem tempo para lhe responder.

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O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Já sei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Vou usar da palavra para protestar contra as afirmações feitas pelo Sr. Deputado Joaquim Miranda.
Naturalmente que repudiamos totalmente todas as afirmações que aqui fez, visando, especialmente, o Partido Socialista.
Quando o Sr. Deputado começou por considerar que esta Sessão Legislativa havia sido uma das mais degradantes e degradadas da Assembleia, nós admitimos que viesse a fazer a sua autocrítica ou a do seu partido.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Mas, na realidade, o Sr. Deputado enveredou por ataques inclassificáveis e, consciente das enormes responsabilidades que o seu partido tem no atraso dos trabalhos desta Câmara, enveredou pela leitura e pelo enunciado do muito que o Partido Comunista fez e propôs à Assembleia da República.
Ora, está bem presente na memória de todos nós a acção obstrutiva dos trabalhos nesta câmara exercida pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Penso não ser necessário pronunciar muitas palavras nem fazer demonstrações de qualquer espécie nesta matéria. Os factos são claros, as manifestações de tal obstrução são recentes, são actuais e as perdas de tempo são permanentes. Aliás, este momento em que o Sr. Deputado proeurou prolongar o tempo que lhe foi concedido e que estava acordado, mais não foi do que uma nova tentativa para exercer essa obstrução aos trabalhos do Parlamento.

Aplausos cio PS e cio PSD.

O Sr. Presidente: - Também para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - O Partido Social-Democrata, quer deixar aqui o seu mais veemente protesto pelas críticas absolutamente inaceitáveis e hipócritas de um partido como o Partido Comunista, que tudo tem feito para boicotar os trabalhos desta Assembleia, sendo o principal responsável por parte importante de má imagem que o Parlamento tem e que vem agora acusar a maioria dessa mesma responsabilidade que é apenas sua.

Aplausos do PSD e do PS. Protestos do PCP.

O Sr. António Mota (PCP): - É preciso descaramento!

O Sr. Presidente: - O sr. Deputado Joaquim Miranda pede a palavra para que efeito?

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, naturalmente que pretendo dar resposta às acusações que me foram feitas quer pelo Sr. Deputado Ferraz de Abreu, quer pelo Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. Presidente: - De acordo com a resolução que foi tomada pela conferência dos líderes parlamentares,
o Partido Comunista já não dispõe, neste momento, de mais tempo, pois esgotou os 10 minutos que tinha.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, lenho conhecimento das deliberações tomadas na conferência de líderes, mas penso que dessa reunião não saiu uma resolução no sentido de impedir o exercício do direito de defesa perante acusações como aquelas que foram proferidas pelo Sr. Deputado Ferraz de Abreu e pelo Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, quando referi que me queria defender daquelas acusações, linha implícita, naturalmente, a utilização da figura regimental do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado poderia ter implícito o exercício desse direito, mas, segundo o Regimento, só invocando-o explicitamente é que lhe posso dar a palavra.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Tem razão, Sr. Presidente.
Então, peço a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Tal como referi no final da minha intervenção, o que aqui se passou agora é a prova mais cabal de tudo aquilo que referi nessa minha intervenção.

O Sr. Paulo Barrai (PS): - Não é, não!

O Orador: - Esta maioria, constituída pelo Partido Socialista e pelo PSD, tem pautado toda a sua acção pela governamentalização. Tudo o que vem do Governo é para discutir, é para votar, mesmo que cegamente, mesmo que silenciosamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é uma das posturas da maioria. Isto é mais do que evidente, tal como demonstrei ao longo da intervenção que fiz.
De facto, todas as iniciativas dos partidos da oposição foram claramente obstruídas pela maioria, mas claramente obstruídas pela maioria!

Vozes do PCP: - Muito bem! Protestos do PS e do PSD.

O Orador: - Nunca como nesta Sessão Legislativa se viu uma situação como aquela a que presentemente assistimos.
Na verdade, esta maioria obstruiu, boicotou todas as iniciativas parlamentares da oposição e, particularmente, as iniciativas do Partido Comunista Português.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Vozes do PSD: - Muito mal!

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O Orador: - Vêm os Srs. Deputados Ferraz de Abreu e José Vitorino acusar o PCP de obstrução dos trabalhos.

É ridícula essa afirmação. E é ridícula, Srs. Deputados, porque hoje é claramente evidente a incapacidade, o desregramento desta maioria ...

Protestos do PS e do PSD.

..., é ridícula até pelas divisões, pelas animosidades pessoais que hoje se verificam nesta maioria Isto é por demais evidente...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., é por de mais evidente que esta maioria é incapaz de organizar seriamente os trabalhos desta Câmara

Protestos do PS e do PSD

Então, Srs. Deputados, como é que justificam que esta Câmara andasse a discutir durante dias, dias e dias uma proposta que poderia ser discutida na especialidade, em sede de comissão especializada? Por que não foi feito isso, nomeadamente em relação à lei a que ficará ligado o Sr. Deputado Montalvão Machado? Por que obrigou esta maioria a que perdêssemos aqui dias e dias com a discussão de uma tal lei quando havia outras matérias mais importantes para discutir e quando essa podia ser também discutida em sede de comissão? Por que é que fizeram isso? Foi ou não foi para obstruir os trabalhos desta Câmara? Foi ou não foi para obstruir a discussão de propostas apresentadas pelo PCP?

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para responder ao Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Presidente: - Faça o favor

O Sr. José Vitorino (PSD)- O que é evidente e o que é ridículo são as argumentações do Partido Comunista Português quando, em relação a um mesmo orador e a um mesmo assunto, o Grupo Parlamentar do PCP faz dezenas de pedidos de esclarecimento e dezenas de protestos, iniciando um processo novo e histórico nesta Assembleia...

Protestos do PCP.

..., com o mero objectivo de impedir o avanço dos trabalhos...

Protestos do PCP.

.. , pondo questões que nada têm a ver com a matéria em discussão.
Isto é que é ridículo, e isto cai tudo sobre o Partido Comunista. E só não é mais ridículo porque o povo português já o conhece sobejamente.

Aplausos do PS e do PSD Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS) - Sr. Presidente, suponho que o meu agrupamento parlamentar dispõe ainda de algum tempo - 1 minuto, julgo -, pelo que solicito a V. Ex ª que me conceda a palavra para utilizar esse minuto.

O Sr. Presidente: - Com efeito, a UEDS ainda dispõe de 1 minuto.
Parece-me, no entanto, que não é ainda a altura de o Sr Deputado intervir, uma vez que está outro Sr Deputado inscrito para efectuar uma declaração política

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS) - Sr Presidente, a minha intervenção seria, no fundo, um protesto em relação àquilo que se passou nesta Assembleia, seria um protesto em relação aos protestos e contraprotestos que se sucederam.
Se o Sr. Presidente me der já a palavra, intervirei agora; se não, aguardarei até ao momento em que V. Ex ª achar mais oportuno.

O Sr. Presidente: - Bom, o Sr Deputado deseja fazer um protesto em relação a quê?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para facilitar e por razões meramente processuais, direi que o protesto e em relação à última intervenção produzida neste hemiciclo.
No entanto, Sr Presidente dar-me-á a palavra quando entender, possivelmente depois de o orador inscrito a seguir ter produzido a sua declaração política

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, solicitei a palavra para produzir a defesa da bancada do PCP

O Sr Presidente: - O Sr. Deputado Joaquim Miranda já usou da palavra para esse efeito

O Sr. José Manuel Mendes PCP). - Não foi paia esse efeito!

O Sr Jorge Lemos (PCP). - Sr Presidente, ao que sei, o Sr. Deputado Joaquim Miranda defendeu a sua honra pessoal.

Pisos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, importa cumprir à risca o Regimento, pelo que solicito que mencione o artigo em que se baseia para utilizar a palavra

A Sr.ª Georgete Ferreira (PCP). - Parece que já estamos na Assembleia Nacional!

Uma voz do PS: Não, parece é que já estamos no Politsburg!

O Sr. Jorge Lemos (PCP) - Sr. Presidente, baseio-me nos artigos 89.º, n.º l, alínea c), e 92 .º, ambos do Regimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, os artigos 3.º e 8.º do Regimento, que fundamentam o exercício do direito de defesa nos termos dos artigos 89.º, n.º l, alínea í), e 92 .º, reportam-se à verificação de poderes e â perda do mandato, respectivamente.
Ora, como não são estes os casos em que se encontra, não lhe posso conceder a palavra ao abrigo destes artigos.

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O Sr Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não vamos recorrer dessa sua decisão, mas entendemos que e extremamente curioso e significativo que, pela primeira vez, tenha sido negada a hipótese de, ao ser invocado o direito de defesa a uma bancada que foi vilipendiada e ofendida por intervenções de outros Srs. Deputados, podermos usar da palavra para esse efeito.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Lopes Cardoso

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS) - Prescindo, Sr Presidente

O Sr Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr Deputado Marques Mendes

O Sr. Marques Mendes (PSD) - Sr. Presidente, Srs Deputados Ao findar mais l ano de trabalho parlamentar pensamos que não é descabido assinalar e recordar aqui alguns aspectos e factos
Não e de modo algum um balanço que pensamos fazer, mas estamos certos de que valerá a pena reflectir por momentos o que foi, o que podia ou deveria ter sido a actividade parlamentar desenvolvida, e que com ela directa ou indirectamente se acha relacionada
Todos sabemos do interesse que certos sectores da vida portuguesa procuram continuamente tudo fazer para desprestigiar e depreciar o Parlamento e a alta missão que nele -e lambem mesmo fora dele- têm os deputados

O Sr. Daniel Bastos (PSD) - Muito bem!

O Orador: - Sabemos bem como são exageradas certas criticas, e certos comentários, bem montados aliás, que são feitos a este órgão de soberania e aos seus titulares, sem que se procure saber sequer - e intencionalmente o não querem fazer - das causas, próximas ou remotas, que levam a que nem sempre os trabalhos decorram pela forma que desejávamos Vejamos o caso aqui referido ainda há pouco pelo Sr Deputado César Oliveira
Mas para esses que não querem Parlamento, porque obstáculo aos seus permanentes objectivos, não conseguiremos, e sabido, demonstrar-lhes o como e o porquê da actividade parlamentar, do que se fez, ou não se fez, e que pior que o cego que não vê ou o surdo que não ouve, e aquele que não quer ver nem quer ouvir, porque obstinado na concretização dos seus propósitos só vê e ouve, mesmo que deturpado, o que com estes se possam conjugar

O Sr. Rocha de Almeida (PSD) - Muito bem!

O Orador: - lemos de convir. Sr Presidente e Srs. Deputados que mais poderia ter sido feito, mas há também que reconhecer que foi particularmente intensa a actividade desenvolvida e de considerável alcance o que se produziu, no domínio das varias competências constitucionais da Assembleia da Republica
Apesar disso, existe certamente em muitos de nos um certo sentimento de frustração, pois vimos gorados os desejos de levar ainda mais longe o nosso trabalho
Porém, o boicote - e a palavra exacta - que aqui dentro foi leito - e de que o que vem sucedendo nestes últimos tempos e o exemplo vivo e clarificador - não possibilitou que se conseguisse levar mais longe os resultados deste ano parlamentar.
O uso manifestamente abusivo -ultrapassando mesmo os limites do tolerável - que o PCP orquestradamente fez do Regimento da Assembleia da República, abusando da sua permissividade e da excessiva tolerância da Mesa, deixou ao menos bem clara a necessidade da revisão do Regimento, não para coarctar direitos a quem quer que seja, mas para dotar o Parlamento de um texto que obrigue todos a ter presente que é legítimo o exercício de um qualquer direito quando em detrimento dos direitos dos outros

Aplausos ao PSD e ao PS

Lutamos há muito por essa revisão, não foi possível concluí-la até este momento

O Sr Joaquim Miranda (PCP) - Felizmente!

O Orador: - Mas cremos que está demonstrado à saciedade e perante todos quantos querem a eficácia e o prestígio desta instituição que ela se impõe, já que os abusos não podem mais ser consentidos nem sequer tolerados.
Sr. Presidente, Srs Deputados Está o PSD em coligação com o PS, coligação que constituída por imperativos nacionais de mudança da sociedade portuguesa e defesa e consolidação do regime democrático, se quer cada vez mais viva e actuante no cumprimento dos objectivos que ficaram expressos no respectivo Programa de Governo
Ninguém ousara esquecer que dela fazem parte os dois maiores partidos, que são também os mais implantados na sociedade portuguesa, aos mais diversos níveis, e que, com a especificidade própria de cada um deles, têm a consciência de que, em cada acto eleitoral, cada um deles é o mais seno candidato a partido maioritário ou, pelo menos, a partido mais votado.
Os partidos não podem nunca, mesmo quando coligados, esquecer a sua essência fundamental de expressão de uma vontade do eleitorado e de alcance e exercício do poder, isso, por vezes, causa, obviamente, algumas dificuldades.
Porem, tentar esquecer essa realidade para se andar constantemente a pretender esgrimir com a fragilidade da coligação é não querer reconhecer, malevolamente aliás, aquela realidade, e desconhecer que a especificidade de cada um obriga quantas vezes perante situações concretas a obtenção dos necessários pontos de consenso, ou seja, a procurar, com base nos imperativos que ditaram essa mesma coligação e naquilo que une os coligados, as soluções mais adequadas e realistas
Temos de convir que ao longo do tempo os grupos parlamentares da maioria têm sabido demonstrar um crescente entendimento na busca das melhores soluções, quer entre si, quer entre o Governo que apoiam e que desse apoio dimana.

Votes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não seremos nós, como não e com certeza também o Grupo Parlamentar do PS, a dizer que já nada ha a melhorar e a aperfeiçoar, tal como os homens, também os grupos, são constantemente movidos pelo desejo e pela necessidade de valorizarem permanentemente a sua actuação t o seu relacionamento
Por isso, os sociais-democratas consideram que as experiências deste período passado também são motivo de reflexão, de modo a que no próximo ano parlamentar todo o relacionamento, aos vários níveis em que a coligação se repercute, vai melhorar sensivelmente, a bem dos objectivos nacionais que a si própria impôs
É bom que fique claro que os grupos parlamentares da maioria, contrariamente a várias acusações que aqui lhe têm sido feitas, algumas vezes por aqueles que tudo fazem para tentar provocar brechas numa maioria que

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tanto os incomoda, não estão neste Parlamento para abdicar dos seus poderes/deveres constitucionais, mesmo perante o Governo que apoiam.
Apoio e confiança não significam nem implicam aceitação cega das posições do apoiado.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Dispondo, como se sabe, de meios tão insuficientes, os deputados, não esquecem jamais o sentir da população, e por isso têm criticado e exigido quando tal se impõe, conscientes do papel extremamente importante que lhes incumbe; porém, as criticas, exigências, observações ou recomendações dos deputados da maioria não visam outros objectivos que não sejam os de fazer com que o Governo esteja permanentemente alertado e os de provocar uma governação cada vez mais eficiente com vista à resolução dos problemas prementes do povo português.
Consideramos ser esse o nosso dever, e muito do ocorrido no ano que agora vai findar também neste domínio nos vai permitir uma reflexão, a fim de todos nós podermos constantemente, como representantes eleitos pelos portugueses, fazer mais e melhor por esse povo que servimos; não agiremos porém, na busca de pretensos fáceis dividendos, que alguns procuram obter à custa das dificuldades reais do Pais, dificuldades que ostensivamente procuram ignorar ou subvalorizar, sabendo bem que a realidade é bem diversa da que apregoam, na tentativa de explorar os problemas com que, infelizmente, se debate o País.
Todavia, não nos deixaremos impressionar com certos comportamentos das oposições, pois confiamos naqueles que irão no respectivo acto eleitoral julgar a maioria e as oposições, ou seja, confiamos e acreditamos na serenidade e maturidade dos eleitores, para quem a demagogia não tem sentido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Durante este ano parlamentar completaram-se e celebraram-se 10 anos de vida democrática, assim como se completaram e celebraram 10 anos de existência do Partido Social-Democrata.
Estes factos foram e são altamente significativos pelo que entendemos
referi-los; e não podemos deixar de dizer que o PSD - e a história o irá revelando- foi ao longo deste período, como o será sempre no futuro, imprescindível à construção e consolidação do regime democrático, pois é inegável a sua valiosa actuação passada e presente, conhecido que é o seu profundo e sério enraizamento popular.

Aplausos de PSD e do PS.

Ao celebrar o PSD os seus 10 anos de existência, não esquecemos que neste mesmo ano comemoramos o que seria o 50.º aniversário do nascimento de um dos seus fundadores, seu líder natural, tragicamente falecido, Dr. Francisco Sá Carneiro.
Ao evocar aqui este facto, não foi possível esquecer o papel extremamente importante que esse político insigne desempenhou ainda durante o regime deposto, designadamente quando nesta mesma Casa leve a coragem de defender denodadamente os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, de atacar com a sua conhecida frontalidade certas situações, tais como, por exemplo, a polícia política e a censura, tudo sempre na luta pela liberdade e pela democracia.

Vozes do PSD e do deputado do PS Sottomayor Cardia.

O Orador: - Político e parlamentar de craveira superior, líder que soube conquistar essa liderança, e estadista que o Pais jamais esquecerá, Francisco Sá Carneiro será sempre recordado, mesmo pelos seus adversários políticos, como uma personalidade cujo desaparecimento deixou mais empobrecido o País a que se devotou.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS.

E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, antes de terminar estas singelas palavras de recordação reflexiva deste ano de vivência parlamentar, não posso, em nome do meu grupo parlamentar, deixar de recordar, com amargura, que foi também este ano que o grupo e a própria Assembleia da República viu partir para sempre do seu convívio um Homem, que foi em todos os aspectos um exemplo de convivência e tolerância democráticas de como se deve desempenhar a missão de deputado.
Refiro-me, como todos já concluíram, ao Dr. Nuno Rodrigues dos Santos, deputado do Grupo Parlamentar do PSD desde a Constituinte, várias vezes vice-presidente desta Assembleia e presidente honorário do partido em que, com arreigada convicção, sempre militou.
A perda desse companheiro...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

O Orador: - Então, dou por terminada a minha intervenção, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS.

O Sr. Presidente: - Ficam inscritos os Srs. Deputados Jorge Lemos e João Corregedor da Fonseca para pedir esclarecimentos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passando ao período da ordem do dia, devo adiantar que há uma dúvida relativa ao problema da continuação dos nossos trabalhos da primeira parte desta ordem do dia.
Por isso, convoco uma reunião dos presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares no meu gabinete.
Se estiverem de acordo, suspenderemos a sessão por meia hora para efectuarmos esta reunião, na medida em que ela é imprescindível para seguirmos a ordem do dia.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - O Deputado José Vitorino vai dizer que é boicote!

O Sr. José Vitorino (PSD): - A questão que se coloca ao Grupo Parlamentar do PSD é a seguinte: haverá, de facto, razões que inviabilizam a continuação dos trabalhos?
Se há alguma matéria que necessita de ser equacionada na reunião de líderes, então que seja, mas continuem-se a discutir aqui outras matérias.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, o problema, que, aliás, já tinha referido no início desta sessão, é o da votação do 1.º Orçamento Suplementar da Assembleia da República.

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Como sabe, ficou assente na reunião dos líderes que este ponto não seria discutido, mas simplesmente votado, desde que fosse desdobrado o Orçamento
Porém, há razões técnicas e razões legais para que esse desdobramento não possa ser feito. Suponho que o Conselho Administrativo foi convocado de emergência, mas penso que não fé? essa reunião porque não estavam todos os membros presentes
Por tudo isto, não posso continuar sem que seja definido se se vai votar, sem discussão, o orçamento suplementar ou não, isto é, tal e qual ele deu entrada na Mesa, portanto sem o desdobramento.
Este é o problema que preciso de colocar aos líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares, na medida em que esta ordem de trabalhos foi feita com os Srs. Deputados.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o lavor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD) - O Grupo Parlamentar do PSD sugere que, primeiro, se entre na primeira parte da ordem do dia, segundo, se discutam e votem os pontos 2.l e 2.2. Ao mesmo tempo, reuniriam os lideres durante cerca de um quarto de hora, pois julgo que esse tempo basta para se resolver este problema.

O Sr Presidente: - O Sr Deputado Carlos Lage pede a palavra para que efeito?

O Sr Carlos Lage (PS) - Prescindo. Sr Presidente.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados estou de acordo com o sugerido pelo Sr Deputado José Vitorino e espero que um quarto de hora chegue

O Sr. Deputado José Vitorino pretende usar da palavra para que efeito!

O Sr José Vitorino (PSD) -Sr Presidente, apenas queria chamar a atenção para que os pontos 2.l e 2.2 se referem às prorrogações dos prazos.

O Si Presidente: - Pois, Sr Deputado, mas neste momento não ha quórum para os votarmos!

O Sr José Vitorino (PSD) - Então, sugiro que se interrompa a sessão por 15 minutos, Sr Presidente.

O Sr Presidente: - Com certeza. Sr Deputado. Está suspensa a sessão por 15 minutos.

Eram 12 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, esta reaberta a sessão.

Eram 13 horas.

O Sr Presidente: - Queria comunicar à Câmara que, como a conferência dos líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares durou mais tempo do que aquilo que se estipulou - aliás, como eu previra -, e uma vez chegados à hora regimental de encerramento dos trabalhos paia o almoço, vou suspender a sessão para recomeçarmos às 15 horas
Pedia a comparência dos Srs Deputados e essa mesma hora, uma vez que já perdemos muito tempo.

Esta suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 2 minutos

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum para funcionamento, pelo que declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

No entanto, peço, mais uma vez, às direcções dos grupos e agrupamentos parlamentares para providenciarem no sentido da comparência dos restantes deputados no Plenário a fim de iniciarmos as votações a que, desde já, temos de proceder.

Pausa.

Srs. Deputados, não estamos em condições de prosseguir com os nossos trabalhos por falta de quórum para votação, pelo que vou suspender a sessão por 15 minutos

O Sr José Vitorino (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr Presidente: - O Sr Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito!

O Sr José Vitorino (PSD) - Sr. Presidente, pedia apenas que a Mesa nos informasse quantos deputados faltam.

O Sr Presidente: - Faltam quatro, Srs. Deputados.

O Sr José Vitorino (PSD) - Então sugeria que o Sr. Presidente não desse a sessão por interrompida, pois vamos fazer um forcing de 2 minutos para tentar obter o quórum necessário.

Vozes do PS: - Já há quórum!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, foi por entendimento unânime da Mesa que foi tomada esta deliberação.

Protestos de PS e do PSD

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de prestarem atenção.

Vozes do PS: - Já há quórum!

O Sr Presidente: - Eu avisei várias vezes, pedi aos grupos e agrupamentos parlamentares que chamassem os Srs. Deputados que faltavam e preveni-os às 15 horas e 30 minutos, isto é, meia hora depois do início dos trabalhos, que passados 5 minutos suspenderia a sessão.
Entretanto, vejo chegar alguns Srs Deputados e, se outros não saíram, talvez tenhamos quórum para votar.
A Mesa vai verificar o quórum, Srs. Deputados.

O Sr. José Vitorino (PSD) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Pausa

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, verificado o quórum, podemos prosseguir com os nossos trabalhos que, segundo a agenda aprovada para a primeira parte do período da ordem do dia, será a votação da prorrogação do prazo que foi dado à Comissão Eventual de Inquérito à RTP (resolução n º 19/84), para apresentar o seu relatório e que termina no dia 27 do corrente, em relação ao qual o Sr. Presidente dessa Comissão Eventual pede a prorrogação até 30 de Outubro próximo,

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com funcionamento durante o período de férias parlamentares. Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade

Q Sr. Presidente: - O ponto n.º 2, refere-se a um pedido de autorização de prorrogação do prazo estabelecido para a conclusão dos trabalhos da Comissão Eventual encarregada de proceder ao inquérito sobre o processo de liberalização do comércio de cereais, ramas de açúcar e oleaginosas, constituída ao abrigo da Resolução da Assembleia da República n.º 12/84.
Neste pedido, é solicitada a prorrogação do prazo até 30 de Novembro do corrente ano.

Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - O ponto seguinte refere-se à discussão e votação do l.º Orçamento Suplementar para 1984 da Assembleia da República, sobre o que acaba de entrar na Mesa uma proposta, que penso ter de ser votada previamente, subscrita por todos os grupos e agrupamentos parlamentares, excepto a UEDS cujo presidente do respectivo agrupamento parlamentar não se encontra presente.
A proposta é a seguinte: «Propõe-se que as verbas inscritas no presente Orçamento Suplementar com os n.ºs 32 e 36 da referência da justificação, não sejam utilizadas nem desenvolvidas até à apreciação e votação de novo Orçamento Suplementar ».
Os Srs. Deputados estão certamente inteirados do que se resolveu neste sentido, pelo que vou pôr esta proposta de imediato à votação.

Submetida à votarão, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, creio que poderíamos passar à votação do 1.º Orçamento Suplementar para 1984 da Assembleia da República, sem a inclusão destes 2 números que foram agora retirados.

Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Gostaria agora de comunicar à Câmara que, também em conferência de líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares, ficou decidido que as declarações de voto sobre toda a matéria que for agora discutida serão entregues por escrito na Mesa ou no meu gabinete até à próxima terça-feira.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para que eleito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP). - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Apenas pedia que V. Ex.ª nos esclarecesse qual o tempo verbal que utilizou.
De facto, não percebemos bem se disse «for» ou «foi».
É que se é o tempo passado, não temos objecções; se, por outro lado, é o tempo futuro, então teremos que interpelar novamente a Mesa!

O Sr. Presidente: - Ó Sr Deputado esta foi a última resolução, mas é evidente que se os Srs. Deputados quiserem começar a fazer declarações de voto, como a conferência de líderes não tem poderes para o impedir, os Srs. Deputados serão livres de o fazer de acordo com o Regimento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP). - Sr. Presidente, o nosso entendimento é o de que, sobre a matéria que acabámos de votar, há acordo e consenso no sentido de que as declarações de voto sejam entregues na Mesa por escrito.

O Sr. Presidente: - Pois, Sr. Deputado. E sobre as matérias seguintes isso também em princípio ficou estabelecido.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não, não!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, quanto a esse aspecto é que nós discordamos.

O Sr. Presidente: - Está muito bem, eu tomo nota. O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Vitorino (PSD). - Sr. Presidente, queria apenas, nesta circunstância, confirmar que, em relação ao ponto seguinte, não houve esse acordo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - A verdade acima de tudo!

O Sr. Presidente: - Está certo, Sr Deputado.
Entramos, portanto, na apreciação e votação do Relatório da Comissão Eventual de Inquérito à Detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes. Comissão que foi constituída ao abrigo da Resolução da Assembleia da República n.º 13/84.
Srs. Deputados, está em discussão.

O Sr. Deputado José Manuel Mendes pretende intervir?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que seria aconselhável que a Mesa procedesse à leitura do Relatório.

O Sr. Presidente: - O Sr Deputado Agostinho Domingues pediu também a palavra?

O Sr. Agostinho Domingues (PS). - Sr. Presidente, tinha-me inscrito exactamente para pedir a leitura do Relatório. Como ela já foi pedida, queremos apenas confirmar que era nossa intenção solicitá-la.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como há um relator da Comissão, pedia-lhe o favor de ler o relatório.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): Sr. Presidente, Srs. Deputados.

Comissão Eventual de Inquérito à Detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes

Relatório

A Comissão Eventual de Inquérito à Detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, foi constituída por Reso-

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lução da Assembleia da República n.º 13/84, de 3 de Abril, e publicada no Diário da República, n.º 84, de 9 de Abril de 1984.
Nesta resolução, depois de se aludir à comunicação ao Plenário da Assembleia da República do Sr. Deputado Manuel Lopes na qual relata as condições em que foi detido frente à residência oficial do Primeiro-Ministro e do teor das informações contraditórias do Governo sobre o mesmo assunto, afirma-se:

Afigurando-se necessário, dada a natureza das questões inerentes a estes factos, que a Assembleia da República possa pronunciar-se com conhecimento aprofundado e objectivo, evitando um debate prejudicado pela falta de informação rigorosa e isenta, os deputados abaixo assinados propõem que seja criada uma comissão parlamentar de inquérito.

Este, pois, o escopo desta Comissão. A Comissão foi composta por 14 deputados, distribuídos da seguinte forma:

4 do Partido Socialista:

Teófilo Carvalho dos Santos.
José Maximiano A. Almeida.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Jorge Lacão da Costa.

3 do Partido Social-Democrata:

Fernando José da Costa
Fernando José Roque Correia Afonso
Manuel Filipe Correia de Jesus

2 do Partido Comunista Português:

José Manuel Santos de Magalhães.
José Manuel Mendes.

2 do Centro Democrático Social:

Abel Augusto de Sousa de Almeida.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.

l do Movimento Democrático Português:

António Monteiro Taborda

l da União de Esquerda Democrática Socialista:

António Poppe Lopes Cardoso

da Acção Social-Democrática Independente:

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho

A presidência da Comissão coube ao Partido Socialista e foi exercida, primeiro pelo Sr. Deputado Teófilo Carvalho dos Santos, que em 4 de Maio pediu escusa por motivos de saúde sendo substituído, por proposta do Partido Socialista, pelo Sr. Deputado António Costa.
Serviram de secretários os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho da ASDI e António Monteiro Taborda do MDP/CDE.

O Sr. Deputado José Maximiano A. Almeida foi substituído pelo Sr. Deputado João Luís Duarte Fernandes, ambos do e a requerimento do PS.
Os funcionários que coadjuvaram os trabalhos da Comissão prestaram, todos, termo de juramento e a Comissão elaborou e aprovou o seu Regimento.
O prazo estabelecido inicialmente foi de 15 dias que expirou em 15 de Maio de 1984 e, nessa data, foi solicitada à Assembleia da República a sua prorrogação até 12 de Junho de 1984, data em que foi solicitada nova e última prorrogação.
A Comissão efectuou até à data, 10 reuniões, todas gravadas por sistema magnético e com as presenças constantes do respectivo livro.
As reuniões tiveram lugar nos seguintes dias: 2, 3, 4, 10, 15, 16, 17, 23, 30 e 31 de Maio de 1984.
Foram inquiridas 18 pessoas pela forma seguinte: No dia 13 de Maio de 1984 - Audição do Sr. Deputado Manuel Lopes, da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, que apresentaram declarações escritas e foram inquiridos oralmente e do
subchefe-ajudante Eduardo Carneiro.
No dia 15 de Maio de 1984 - Audição do Chefe da Esquadra do Palácio de S. Bento, do primeiro comissário Manuel de Oliveira e do chefe da 30.ª Esquadra da PSP.
No dia 23 de Maio de 1984 - Audição de 8 agentes da PSP, que foram indicados pela 4." Divisão da PSP como sendo os que prestavam serviço à residência do Sr. Primeiro-Ministro no acto da detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes.
No dia 31 de Maio de 1984 - Audição das 4 testemunhas indicadas pelo Sr. Deputado Manuel Lopes.
As sessões realizaram-se, muitas delas, por um período diário de mais de 8 horas, com sessão de manhã e à tarde.
O processo tem, neste momento, cerca de 1550 páginas, nele se tendo incorporado vários documentos emanados do Sr. Deputado Manuel Lopes, das instâncias oficiais e todos os recortes dos jornais publicados em Lisboa e Porto sobre o «caso Manuel Lopes».
A Comissão elegeu como relatores os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho (ASDI), Correia de Jesus (PSD) e António Taborda (MDP/CDE).

II
Da análise da prova produzida resultam apurados os seguintes factos relevantes.

1.º

O Sr. Deputado Manuel Lopes não se identificou como deputado quando da sua detenção aos 27 de Março de 1984 junto à residência oficial do Primeiro-Ministro, apenas tendo dito na mesma ocasião: Então eu também vou?...

2.º

O Sr. Deputado Manuel Lopes só se identificou, como deputado, na Esquadra das Francesinhas, e, tão pronto o fez, foi posto em liberdade.

3.º

O Sr. Deputado Manuel Lopes estava convencido de que o agente que procedeu à sua detenção o conhecia como deputado.

4.º

Os sindicalistas presentes na ocorrência objecto de inquérito conheciam o Sr. Deputado Manuel Lopes como deputado.

5.º

Não se provou que o subchefe da PSP que ordenou a detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, nem qualquer dos agentes presentes no local, conhecessem a qualidade de deputado do detido.

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6.º

Não se provou que alguém, quer sindicalista, quer agente da PSP, tivesse chamado, em termos audíveis, a atenção do subchefe Eduardo Carneiro para a qualidade de deputado do Sr. Deputado Manuel Lopes.
Apurados que foram os factos acabados de relatar e que são dados como provados no âmbito do presente inquérito, vejamos agora qual o tratamento que é dado pelo direito positivo às chamadas imunidades parlamentares.
A Constituição da República consagra estas imunidades, que se traduzem, por um lado, na irresponsabilidade civil, criminal ou disciplinar dos deputados pela emissão de votos e opiniões no exercício das suas funções e, por outro lado, na inviolabilidade dos deputados quanto à prática de certos actos passíveis de censura criminal, cometidos na qualidade de simples cidadãos e alheios às suas funções.
É, naturalmente, só a questão da inviolabilidade que, no quadro da imunidades parlamentares, importa aqui apreciar.
Encontra-se esta matéria sediada no artigo 160.º da Constituição, onde expressamente se dispõe, nos n.ºs 2 e 3, que nenhum deputado pode ser detido ou preso sem autorização da Assembleia, salvo por crime punível com pena maior e em flagrante delito, dispondo-se ainda que, movido procedimento criminal contra algum deputado e indiciado este definitivamente por despacho de prenuncia ou equivalente, salvo no caso de crime punível com pena maior, a Assembleia decidirá se o deputado deve ou não ser suspenso, para efeito de seguimento do processo.
Ao consagrar as imunidades parlamentares dos deputados que se traduzem na sua inviolabilidade, o legislador constituinte de 1976, não fez mais do que seguir a nossa tradição jurídico-constitucional, pois já se encontravam disposições idênticas na Constituição de 1822 (artigo 97.º); na Carta Constitucional de 1826 (artigo 27.º) e .nas Constituições de 1838, 1911 e 1933 (artigos 48.º, 17.º e 89.º), respectivamente.
Também no direito comparado encontramos, por forma muito generalizada, a aceitação do princípio da inviolabilidade dos parlamentares, embora com ligeiras diferenças, nalguns casos. Citaremos, à guisa de exemplo, as Constituições da França (artigo 26.º); dos Estados Unidos da América (secção vi, n.º 1); da Suécia (artigo 8.º); do Brasil (artigo 32.º); da Itália (artigo 68.º); da República Federal da Alemanha (artigo 46.º); da Bulgária (artigo 88.º); da República Democrática Alemã (artigo 60.º); da República de Cuba (artigo 81.º); da Espanha (artigo 71.º) e da União Soviética (artigo 118.º).
Citaremos, por último, o decreto francês de 23 de Junho de 1789, que é o precedente mais claro quer da Europa, quer dos países tributários da tradição constitucional francesa, da constitucionalidade das imunidades parlamentares.
Quando se não atente na ratio dos preceitos que nas diferentes constituições, inclusive a nossa, consagram a inviolabilidade parlamentar, poderá supor-se que, por esta forma, se abre uma excepção, traduzida em privilégio, em relação ao princípio geral da igualdade dos cidadãos, que funcionaria a favor dos deputados.
Mas não é assim.
Com efeito, as imunidades parlamentares têm menos em conta a pessoa individual do deputado, do que o Parlamento e a sua organização e funcionamento. As imunidades existem para assegurar a interrupção de funções, a defesa do órgão de soberania e o seu pleno e permanente funcionamento, ao abrigo da intervenção de outro orgão ou agentes, dentro de determinados limites.
A inviolabilidade é, assim, um factor de garantia da livre configuração da vontade parlamentar, na medida em que trava ou impede que essa mesma vontade seja posta em causa através da detenção, mais ou menos justificada, perante o direito comum, de um membro do Parlamento. Não existe intuitu personae, não é, pois, um privilégio. Mas, como figura constitucional que é, a inviolabilidade dos deputados tem de ser sempre apreciada com a prevalência que sobre o direito comum e, de entre este, o direito penal, assume o direito constitucional.
Daqui deriva que a inviolabilidade parlamentar deverá funcionar como regra e que só por excepção podem os deputados ser submetidos ao direito comum (penal, entenda-se), durante o exercício das suas funções.
Uma dessas excepções, contempladas na própria Constituição, verificar-se-á no caso de prisão em flagrante delito, pela prática de crime a que corresponda pena maior, o que bem se compreende e aceita, dada a natureza das infracções sujeitas a tais penas e perante as quais se entende então que o Parlamento se deve eximir quer à ponderação sobre o retardamento do respectivo processo criminal, quer mesmo à invocação de que é em seu nome e prestígio que as imunidades são atribuídas aos deputados, pois a manutenção da liberdade destes, em tais circunstâncias, comprometeria, antes, a configuração de uma autêntica e genuína vontade parlamentar.
Mas do acima exposto deriva ainda que, gozando em regra o deputado e reflexamente, da inviolabilidade parlamentar, a ele compete, em primeira linha, tudo fazer quanto esteja ao seu alcance para evitar que outrem viole' as imunidades parlamentares que, aproveitando-se, se acham garantidas na Constituição e no estatuto dos deputados, em consideração do órgão de soberania onde exerce funções, mais do que em consideração de si próprio.

E assim sendo, perante a iminência de uma detenção ilegal o deputado deve usar de todos os meios para evitar e resistir mesmo à sua efectivação.
Nem sequer se pode colocar a questão em termos de o deputado, motu próprio, se não importar, ou mesmo desejar voluntariamente que se efective em relação à sua pessoa, uma ordem de detenção ou de prisão.
O seu direito a não ser preso, nos termos em que lhe é reconhecido pela Constituição e pela lei, é irrenunciável e a conduta que, por simples omissão, assuma perante uma prisão ilegal, por forma a não a impedir, traduz-se numa violação do dever de contribuir, pela sua diligência, para a observância da Constituição, artigo 15.º, alínea f), do Regimento da Assembleia da República.
Por sua vez, deve também a Assembleia da República, sempre que se verifique uma violação das imunidades parlamentares traduzida na detenção ilegal de um dos seus membros, providenciar pelos meios e termos próprios por que seja reposta a legalidade e bem assim proceder na forma legal contra os infractores da Constituição e da lei, porventura incursos no disposto no artigo 417.º do Código Penal.
Citado o direito que nos rege em matéria de imunidades parlamentares, referida a ratio legis em que se funda e atentos os factos dados como provados no presente inquérito, a Comissão formula as seguintes conclusões:

a) Não houve violação das imunidades parlamentares em relação só Sr. Deputado Manuel Correia Lopes;

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b) A detenção do Sr. Deputado Manuel Correia Lopes poderia ter sido por si evitada se o mesmo se houvesse identificado no momento em que lhe foi dada a ordem de detenção, dado que a sua libertação se verificou imediatamente após o acto da identificação;
c) Todos os deputados têm o dever de velar pelo cumprimento da Constituição e das leis e de impedir que sejam violadas as imunidades parlamentares, assim como todas as autoridades têm o especial dever de respeitar aquelas imunidades.
Palácio de S. Bento, 19 de Junho de 1984. -Os Relatores: Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho - Manuel Filipe Correia cie Jesus - António Monteiro Taborda.
Srs. Deputados, seguem-se, por estarem anexos a este Relatório da Comissão, as declarações de voto dos Srs. Deputados do PCP e do PS, membros desta Comissão de Inquérito.
Naturalmente que, se assim for desejado, devem ser os deputados de qualquer desses partidos a proceder a essas declarações de voto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como já se devem ter apercebido, na ordem de trabalhos há um erro, aliás, ela foi feita muito à pressa. É que sobre este ponto em discussão não recai, tal como consta da ordem de trabalhos, nenhuma votação, mas apenas a apreciação.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, é apenas para fazer uma observação muito simples: julgo que teria sido, e seria ainda, útil que, em anexo ao relatório, fosse dado conhecimento da forma como as votações para a aprovação desse mesmo relatório se processaram.
Recordo-me de que a votação foi Feita ponto por ponto e que nem todos tiveram o mesmo sentido de voto. Designadamente, a UEDS votou a favor do primeiro ponto da conclusão, isto é, de que não houve violação da imunidade parlamentar do Sr. Deputado Manuel Lopes, mas, se a memória não me falha, absteve-se relativamente ao ponto da conclusão que fazia considerações àquilo que devia ter sido o comportamento do Sr. Deputado Manuel Lopes por entendermos - e apenas por isso - que a Comissão, ao abordar esse aspecto, exorbitava da sua competência.
De qualquer modo, julgo que seria útil que o Plenário tivesse conhecimento da posição assumida pelos diferentes partidos aquando da votação do relatório.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, desejava fazer uso do direito de proceder a leitura da declaração de voto dos deputados do PCP, declaração de voto essa que vem anexa ao relatório, que, entretanto, a Câmara conheceu pela voz do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os deputados do PCP membros da Comissão Eventual de Inquérito à Detenção do Deputado Manuel Lopes, constituída pela Resolução n.º 13/84, de 3 de Abril, tendo dado o seu activo contributo para a realização das diligências levadas a cabo ao longo de múltiplas sessões, não votaram favoravelmente as conclusões do respectivo inquérito, nos termos e com os fundamentos constantes dos autos, que seguidamente, em resumo, se expõem.
l - A Comissão, constituída pelo facto de as informações dadas à Câmara pelo deputado Manuel Lopes sobre a sua detenção terem sido «postas em causa por comunicação que o Governo sobre o assunto transmitiu ao Sr. Presidente da Assembleia da República», motivando «diversas e contraditórias tomadas de posição de várias bancadas», inquiriu ao longo de diversas semanas 18 pessoas, realizou 12 reuniões, constando os seus trabalhos de autos com mais de 1600 páginas.
De acordo com a respectiva resolução constitutiva cabia à Comissão «proceder à análise da ocorrência, com vista a determinar o cumprimento da Constituição e das leis», permitindo à Assembleia da República pronunciar-se sobre a matéria «com conhecimento aprofundado e objectivo».
Folheando os autos, de imediato se comprova que as inquirições realizadas o foram, na quase totalidade, por iniciativa ou sob proposta dos deputados do PCP. Igualmente se comprova, no entanto, que foi rejeitada a realização de outras diligências necessárias e úteis para apurar em toda a extensão os termos em que ocorreu a detenção do deputado Manuel Lopes, bem como para a mais correcta avaliação das afirmações caluniosas feitas pelo Governo veiculadas neste domínio. Entre as diligências recusadas, conta-se a audição do Sr. Ministro da Administração Interna, cujos serviços haviam transmitido à Assembleia da República uma versão dos factos distorcida, inverídica e fortemente ofensiva da dignidade do deputado Manuel Lopes e da própria Assembleia da República, bem como do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que a sustentou perante o Plenário.
Neste termos, a conclusão de que «não houve violação das imunidades parlamentares em relação ao Sr. Deputado Manuel Correia Lopes» merece aos signatários as seguintes observações e reservas:

a) A conclusão assenta em meios de prova obtidos num quadro de diligências que, a bem do apuramento da verdade, os deputados do PCP procuraram que fosse ampliado;
b) A valorização das provas ainda assim obtidas não é subscrita pelos deputados signatários. Desde logo porque os testemunhos colhidos de elementos da PSP, caracterizando-se pela uniformidade e negação metódica de conhecimento dos factos que eram relevantes para dilucidar dúvidas, vieram a revelar em certos casos obscuridades e contradições. Provindo de profissionais cuja formação inclui o treino da memória, chocam, por vezes, pela imprecisão ou suscitam estranheza pela incapacidade de evocação de ocorrências notórias e de reconstituição de eventos em que os inquiridos comprovadamente participaram.

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Por outro lado, não foram suficientemente tidas em conta informações trazidas aos autos por testemunhas qualificadas, entre as quais a Sr. Deputada Helena Cidade Moura
Sabendo-se como no domínio processual o apuramento da verdade material é sempre condicionado por limites formais (a começar pelos respeitantes à qualidade e quantidade da prova recolhida), não pode deixar de lamentai-se que não tivessem sido esgotados os meios adequados para eliminai fundadas dúvidas subsistentes após certas inquirições e para apoiar em toda a latitude como, por que razão e com base, em que instruções foi efectuada a detenção do deputado Manuel Lopes
2 - Os deputados signatários votaram contra a segunda conclusão do inquérito e consideram-na particularmente grave Em primeiro lugar, porque a sua emissão não se coaduna com os critérios e padrões de actuação que decorrem do Regimento e da lei. De acordo com a Resolução n.º 13/84, de 3 de Abril, deveria a Comissão de Inquérito fazer o necessário para que a Assembleia da República não fosse «prejudicada pela falta de informação rigorosa e isenta» sobre as ocorrências do dia 27 de Março. Ora, muito pelo contrário, enveredou-se pela formulação de juízos probabilísticos, de cunho puramente especulativo.
Partindo-se de um facto apurado nos autos (o deputado Manuel Lopes só foi libertado na esquadra quando solicitado, pela primeira vez, a exibir o cartão de deputado efectivamente o mostrou), a Comissão deduziu, sem qualquer legitimidade, que «a detenção poderia (?) ter sido, foi si (!?) evitada» Como teria sido isso possível? A Comissão julgou-se habilitada a asseverar que bastaria que «o mesmo se houvesse identificado no momento em que lhe foi dada a ordem de detenção» E porquê! Porque a Comissão apurou que «a sua libertação se verificou imediatamente após o acto de identificação» (na esquadra!). E que se teria passado se as entidades policiais houvessem requerido a exibição do cai tão de deputado no local de detenção (coisa que não fizeram)? E que se teria passado se tivessem sido ouvidas pela PSP as advertências de testemunhas presenciais como o Sr Horácio Silva nos lermos constantes dos autos?
Quem pode razoavelmente garantir que as coisas se passariam como a Comissão as hipotetiza? Ninguém!
E muito menos os Srs. Deputados que não estão sequer a ouvir a declaração de voto, pelo que pedia ao Sr. Presidente que procedesse, através dos meios habituais, à obtenção do silêncio mínimo para que eu continue no uso da palavra

O Sr Presidente: - Pedia silencio, Srs Deputados Faça favor de continuar, Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Orador: - Ninguém! A própria Comissão o admite, ao rodear de muitas cautelas e formulações condicionais, dubitativas, a «conclusão» em apreço...
Cabe sublinhar, porém, que esta seria sempre (qualquer que fosse a formulação de tipo probabilístico) incompatível com as específicas competências legais e regimentais da Comissão
3 - Os deputados signatários congratulam-se com o facto de a análise da prova produzida ter levado a Comissão a considerar, a justo título, apurados factos relevantes cuja ocorrência nos termos provados fora iniquamente posta em causa pelo Governo através de ofício do Ministério da Administração Interna lido no Plenário da Assembleia da República.
Não só nada se apurou que corroborasse as imputações infamantes constantes do mencionado ofício, como o inquérito carreou provas que as vieram desmentir.
Ao contrário do que o Governo sustentou perante o Plenário da Assembleia da República:
O deputado Manuel Lopes não «tentou impedir que a PSP cumprisse o seu dever fazendo dispersar a manifestação ou detendo os seus promotores com vista à reposição da legalidade» (que os tribunais já comprovaram, aliás, não ter sido por qualquer modo ofendida!),
O deputado Manuel Lopes eslava convencido de que o agente que procedeu à sua detenção o conhecia como deputado, proeurou clarificar no próprio local se a ordem de detenção o abrangia, em nenhum momento lhe tendo aí sido solicitada a identificação formal.
Face ao contido nos autos é desmentida por completo a afirmação governamental de que «por informações que foi possível recolher» o deputado Manuel Lopes «premeditou a sua atitude tendo em vista explorar as consequências do possível acontecimento». Os factos relatados e dados como provados no âmbito do inquérito parlamentar fazem cair pela base as «informações que (ao Governo, não se sabe como) foi possível recolher» e vincam o carácter insultuoso e politicamente irresponsável das acusações lançadas sobre um deputado que exercia normalmente o seu mandato e que, ao contrário do sucedido na véspera, foi impedido de o fazer nos temos a que tem direito e como é seu dever
4 - Na verdade, como sublinha a terceira conclusão do inquérito, a que os signatários aderem sem reservas, «todos os deputados têm o dever de velar pelo cumprimento da Constituição e das leis e de impedir que sejam violadas as imunidades pai lamentares, assim como todas as autoridades têm o especial, dever de respeitar aquelas imunidades».
Importa que para isso contribua o presente inquérito, cujas peças processuais deverão ser objecto de publicação integral, para que todos possam ajuizar livremente do trabalho realizado, dos factos apurados e por apurar, da correcção dos juízos de valor emitidos por cada um.
Muito embora reflectindo labor positivo que devidamente se assinalou, o relatório agora submetido ao Plenário da Assembleia da República vê limitada (mesmo inquinada em medida lamentável) a sua parte conclusiva.
Foi isto e apenas isto que em consequência determinou a posição dos signatários em todas as votações a que houve lugar

Assembleia da República, 28 de Junho de 1984 -Os, Deputados: José Manuel Santos Magalhães - José Manuel de Melo Antunes Mendes

O Sr Jorge Lacão (PS) - Peço a palavra, Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, é para ler a declaração de voto dos deputados do Partido Socialista.

O Sr Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado

O Sr. Jorge Lacão (PS) - Sr. Presidente, antes de proceder à leitura da declaração de voto, queria chamar a atenção da Mesa para o facto, um pouco lamentável.

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de a declaração de voto dos deputados do Partido Socialista não ter sido inserida no boletim de informação, distribuído pela direcção dos serviços desta Casa que têm essa competência, e portanto, nessa medida, estar sonegado um elemento de apreciação que, do nosso ponto de vista, deveria constar e estar apensa ao relatório oportunamente distribuído.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Quando é que a entregaram? Nem sequer foi recebida na Comissão!

O Orador: - Posto isto, passarei à leitura da declaração de voto.

Os deputados abaixo assinados votaram favoravelmente o relatório e as conclusões dele constantes, com os fundamentos seguintes:

a) Por concordância total com a matéria de facto referida no capítulo li do relatório, perfeitamente apurada em função das provas produzidas durante o inquérito;
b) Por adesão à interpretação, de natureza jurídico-constitucional, expressa no capítulo 111 do relatório, relativa à interpretação do sentido, do significado e do valor do princípio da imunidade parlamentar;
c) Por apoio às conclusões expressas no relatório que, clara e inequivocamente, derivam das provas produzidas nos autos.

Os deputados abaixo assinados manifestam a sua satisfação pela forma construtiva como decorreram os trabalhos da Comissão de Inquérito, pela disponibilidade revelada pelos inquiridos, tendo em vista o apuramento da verdade dos factos relativos à detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes e, finalmente, pela contribuição altamente positiva conferida pelos relatores nomeados ao apresentarem um relatório verdadeiramente isento e objectivo.

Os Deputados: António Custa - Acácio Barreirou - João Fernandes - Jorge Lacão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para, sobre esta matéria e em nome da minha bancada, pronunciar algumas palavras que procurarei serem breves.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Dr. Deputado.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da bancada do Partido Socialista, assumo esta missão grata e, simultaneamente, ingrata de me pronunciar sobre esta matéria.
Digo missão grata porque, em primeiro lugar, me cabe elogiar o papel da Comissão Eventual de Inquérito que, apesar da falta de meios e dos quais todos nós temos conhecimento nesta Casa, procedeu, em tempo record, à análise de uma matéria que exigiu um trabalho exaustivo; em segundo lugar, porque a Comissão se debruçou sobre uma matéria que põe em causa um nosso colega deputado, embora ele pertença a uma bancada diferente da nossa.
Digo missão ingrata, porque é sempre delicado, para cada um de nós - deputados - termos de nos pronunciar, de uma maneira menos honrosa, sobre qualquer um dos nossos colegas deputados, mesmo pertencendo eles a uma bancada diferente da nossa.
Sobre esta questão, gostaria de dizer, em primeiro lugar, a todos nesta Câmara que, respondendo embora em nome da minha bancada, não posso deixar de evidenciar algumas credenciais de isenção nesta matéria, exactamente porque, por um lado, não considero que em geral todas as intervenções da Polícia de Segurança Pública sejam -como deveriam ser- de actuação democrática, nem, por outro, estou eivado de qualquer anticomunismo primário que me leve a cometer o erro de, porventura, atribuir à bancada do Partido Comunista aquilo que possa ter sido uma actuação menos correcta de um dos seus deputados.
Postas as questões nestes termos, gostaria de aqui deixar claro, em nome da bancada do Partido Socialista, que me parece que esta Assembleia da República saiu prestigiada ao ter sido capaz de levar a bom termo, no seio de uma comissão de inquérito, constituída por deputados de todos os grupos e agrupamentos parlamentares, uma matéria que terminou no apuramento da verdade. E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, convém continuarmos a lembrar-nos que só a verdade é revolucionária.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Que grande descoberta!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Manuel Lopes porventura quis usar meios menos legítimos para fazer vingar a causa do sindicalismo que ele professa, parece-me que fez demonstrar que não são quaisquer meios que servem os fins, mesmo quando estamos convencidos da legitimidade dos fins que defendemos.

O Sr. Paulo Barrai (PS): - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O que você está a dizer é infame para si como deputado!

O Orador: - Se o Sr. Deputado quiser depois usar da palavra, terei todo o interesse em responder-lhe, quer em termos políticos, quer em termos pessoais.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Já leva, já leva! Não perde pela demora!

O Orador: - Ficou provado no relatório que as imunidades parlamentares não foram lesadas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não foram o quê?

O Orador: - Ficou provado. Sr. Deputado José Magalhães, que as imunidades parlamentares não foram lesadas. Cada um de nós -deputados-, conforme, aliás, está expresso no relatório, tem que fazer todos os possíveis para salvaguardar a dignidade do órgão em que nos integramos e que queremos defender. De facto, parece que não foi isso que aconteceu, naturalmente por intenções que só ao Sr. Deputado cabem.

Protestos do PCP.

Ficou claro que, na realidade, não foram usados meios que prestigiassem esta Assembleia da República. Na realidade, o Sr. Deputado Manuel Lopes, ao proceder da forma como procedeu, permitiu, talvez intencionalmente ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isto é demais! O Orador: - ..., a sua própria detenção. Protestos do PCP.

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A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado, isso não!

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso é um abuso!

O Sr. Presidente: - Pedia a atenção dos Srs. Deputados para não interromperem o orador.

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Comunista,...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Encomendaram-lhe o discurso!

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Comunista, é perfeitamente legítima a vossa solidariedade.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Ilegítimo é o insulto!

O Orador: - Humanamente, é respeitável. Aliás, não podia ser outra a vossa atitude. Mas, Srs. Deputados do Partido Comunista, convém que os Srs. Deputados, de uma vez por todas...

Protestos do PCP.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Convém que estude! Para dar lições é preciso estudar!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam favor de manter silêncio.

Faça favor de continuar, Sr. Deputado Agostinho Domingues.

Protestos do PCP.

O Orador: - Sr. Presidente, eu não tenho condições para continuar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de manterem silêncio.

Faça favor de continuar, Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Felizmente, estamos num pais civilizado, com uma cultura desenvolvida e onde as pseudoverdades primárias e a guerra psicológica do Partido Comunista não colhem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De facto, só junto da ignorância é que as vossas pseudoverdades podem ter cabimento.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. António Mota (PCP): - Queria palmas!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não queria palmas, mas apenas a verdade e o direito de dizer claramente aquilo que a minha bancada pensa. Não é pelo facto de o Partido Comunista Português...

Protestos do PCP.

..., pretender mostrar à saciedade como verdade aquilo que é de facto mentira que essas verdades penetram nos espíritos inteligentes, cultivados e de boa memória do povo português.

O Sr. Paulo Barrai (PS): - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Está condenado a fazer figuras tristes nesta Assembleia!

O Orador: - Esta questão permitiu perfeitamente elucidar que o Parlamento foi capaz de se prestigiar, levando a bom termo o inquérito -embora doloroso por se tratar de um colega nosso, porque, como todos nós, é deputado. Mas a Assembleia da República assumiu esta dignidade e provou ao País - e peço a colaboração dos órgãos de comunicação social para que divulguem suficientemente quando o Parlamento tem atitudes dignas deste jaez, que são as suas atitudes habituais - que é capaz de demonstrar que, de facto, a verdade é revolucionária e que é a única que impera no seio deste órgão de soberania.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Fraquinho, fraquinho!

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Helena Cidade pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, desejava intervir em nome pessoal, porque sou mencionada no relatório.

O Sr. Presidente: - Desejava, então, fazer uma intervenção?

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, se me dá licença, porque outros Srs. Deputados também se inscreveram, perguntar-lhes-ia para que efeito pedem & palavra.

Sr. Deputado Luís Beiroco deseja fazer uma intervenção?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado José Magalhães?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado Lopes Cardoso?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado Fernando Costa?

O Sr. Fernando Costa (PSD): - É para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para formular um protesto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, o início da sua intervenção preocupou-nos. É que o Sr. Deputado começou por dizer que a Comissão - e com isso se congratulava - tinha trabalhado em tempo record. Isto é uma verdadeira manifestação de desconhecimento e de ignorância completa sobre a maneira como a Comissão trabalhou, porque a verdade é que ela não trabalhou em tempo record; teve que prorrogar, por várias vezes, os seus

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trabalhos, trabalhos esses que foram morosos, aliás, como se denota da própria leitura do relatório.
Mas o que veio a seguir foi bastante pior porque, como poderia ter apreendido se tivesse conversado com os seus camaradas que estavam na Comissão e que foram nossos colegas ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Se tivesse lido o relatório!

O Orador: - ..., se tivesse lido o relatório com olhos de ler...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Com inteligência!

O Orador: - ..., se tivesse reflectido sobre o conteúdo do relatório, se tivesse ponderado a medida que o caracteriza e que, como bem imagina (ou talvez nem imagine!, mas nós dizemos-lhe), foi objecto de aturadíssimas discussões durante os trabalhos da Comissão, teria verificado que houve o cuidado de excluir certas formulações que, pela sua bruteza, pela sua rudeza, pela sua indelicadeza, pelo seu carácter calunioso, pelo seu carácter não ponderado, poderiam ferir a honra e a dignidade de um deputado desta Câmara - e nem em geral, nem em particular nenhum merece isso - quanto ao seu comportamento, como, aliás, os autos provam. O Sr. Deputado não pode vir para este Plenário extravasar o âmbito dos autos e das conclusões do relatório, que acabou de ser lido em nome da Comissão.
A Comissão forneceu uma determinada versão dos factos e o Sr. Deputado não pode vir para aqui, ainda que esteja de acordo com essa versão, repetir, em rude e em bruto, as calúnias que eram vertidas pelos serviços pidescos do Sr. Ministro da Administração Interna, que está sentado na bancada do Governo, a retomar as calúnias infames que bolsaram sobre o Sr. Deputado Manuel Lopes.

Aplausos do PCP.

Manifestações cie protesto do PS e do PSD, batendo com as mãos nas bancadas.

Não o pode fazer em nome da verdade. O Sr. Deputado não pode comportar-se como uma vestal ferida, depois de ter bolsado calúnias sobre um deputado, cujo inquérito provou não poder ser objecto das suspeições que o Sr. Deputado, irresponsavelmente, aqui bolsou.
Não se pode dizer se o deputado Manuel Lopes quis porventura usar meios menos legítimos para fazer vingar a causa do sindicalismo e outras observações, que eu não qualifico, deste jaez. Não pode fazê-lo!
E não somos nós que o impedimos - e o Sr. Deputado é livre de se asneirar como entender!-, mas é a verdade dos factos, é a lei dos inquéritos parlamentares. Porque então o que é que a Comissão andou a fazer durante semanas? O que é que a Comissão andou a fazer, se o Sr. Deputado vem aqui bolsar aquilo que precisamente se quis evitar? Daí a redacção do relatório. Nós não estamos de acordo com a redacção do relatório e, na declaração de voto, explicámos serenamente o porquê. Mas houve uma preocupação da Comissão, que sublinhámos e que consideramos positiva: a de não lançar suspeições sobre um deputado desta Casa. O Sr. Deputado rompeu isso, e nós protestamos veementemente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fui informado pelos elementos que integram a Mesa de que temos que ser rigorosos no cumprimento dos tempos.

Aplausos de alguns Srs. Deputados do PS e do PSD.

Aliás, acho perfeito que assim seja, na medida em que já tive oportunidade de referir que a Mesa não pode conceder, generosamente, como era hábito, aquilo que lhe não pertence, porque o tempo é de todos.
Assim sendo, logo que surja a luz vermelha nos semáforos existentes na Sala, os Srs. Deputados, que ainda têm 30 segundos, deverão terminar, para não obrigarem a Mesa a retirar-lhes a palavra.

Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues, para contraprotestar.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, não me admira que o Sr. Deputado José Magalhães venha aqui trazer conclusões, que, aliás, não são conclusões mas sim antecipações, pois ainda antes da realização do inquérito já o PCP as defendia!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não nos venha com tretas!

O Orador: - ..., o que, aliás, é aceitável, tendo em conta a solidariedade que há momentos invoquei, embora, de facto, a verdade tenha de se sobrepor à falsa solidariedade!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Leia o relatório e não venha com tretas!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado José Magalhães, eu queria deixar bem claro, perante esta Câmara e o País, o seguinte: o PCP acaba hoje de demonstrar, pela voz do Sr. Deputado José Magalhães, que de facto está interessado em denegrir o Parlamento português ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Que patetice!

O Orador: - ..., porque quando afirmei que a Comissão de Inquérito trabalhou em tempo record, naturalmente que queria dizer - e aliás, tive o cuidado de o referir- que ela trabalhou em tempo record apesar da deficiência de meios, das pessoas inquiridas e de todo o trabalho realizado! É importante que o País saiba claramente as condições em que esta Câmara trabalha, mas o PCP, que sempre foi contra o parlamentarismo, é evidente que está interessado em dar ao público a imagem de que o Parlamento trabalha mal, mesmo quando ele trabalha bem!

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Além disso, Sr. Deputado, quanto à metáfora da vestal ferida que usou - e parece-me que é importante que comecemos a desmontar as metáforas, sobretudo quando elas são perigosas -, devo dizer que a aplicou muito mal porque a vestal é o Sr. Deputado, não as damas de companhia feridas do Sr. Deputado Manuel Lopes, que infringiu. Portanto, a vestal ferida não está na bancada do PS, a vestal, a que só faltam as candeias acesas, está no santuário do PCP!

Aplausos do PS e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Amaral.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para interpelar a Mesa Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Queira ter a bondade de o fazer.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, passados quase 10 anos desde que esta Assembleia está a funcionar, julgo que é tempo de acabar com determinado tipo de expressões que põem em causa a dignidade dos titulares dos órgãos de soberania e mesmo os próprios órgãos, que não dignificam nem aqueles que as produzem nem aqueles a quem se dirigem...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Olha quem fala!

O Orador: - ..., e muito menos ainda os órgãos a que eles pertencem.
Mas o problema é que não se pode confundir a discussão política - com toda a profundidade que ela deve Ter - com a ofensa e a calúnia pessoal ou aos órgãos de soberania. Por isso, Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PSD solicita à Mesa que esta não permita mais o uso nesta Câmara de expressões como as que foram usadas pelo Sr. Deputado do PCP.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado acaba de fazer um apelo à Mesa, que se regista, e que, como é hábito nesta Casa, fica à consciência e ao espírito de colaboração que todos temos de ter uns para com os outros.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O direito de defesa é exercido em relação a duas bancadas, à do PS e à do PSD, e espero que a Mesa tenha isso em atenção.

Sr. Deputado Agostinho Domingues, creio que a réplica que escolheu é particularmente infeliz. Protestei por o Sr. Deputado não se ter cingido às conclusões do relatório - e, objectivamente, creio que quem quer que o leia aperceber-se-á disso - ou melhor, por não ter sequer tecido considerações sobre o relatório e o seu processo de elaboração, exprimindo, como é seu direito, sua opinião sobre a matéria.
Em vez disso, o Sr. Deputado retomou e agravou algumas das imputações mais infelizes que o inquérito tinha precisamente afastado. Então, julguei-me recuado aqui há 3 meses atrás, como se não se tivesse passado nada!
Devo dizer que passamos dezenas de horas naquela Comissão, discutimos ao milímetro muitas questões, interrogámos, durante horas, 18 testemunhas e alguns interrogatórios foram difíceis, morosos e até dolorosos para ambas as partes, digo-o com toda a sinceridade. Findo esse trabalho, os relatores - trabalharam -e creio que trabalharam bem, exaustivamente - ao longo de vários dias para tentar apurar conclusões que correspondessem ao sentir comum, tendo em atenção a necessidade de defender o prestígio da Assembleia da República.
E, repare, Sr. Deputado, que dizem aquilo que disse é relaxar ao braço comum da infâmia, do opróbrio, um colega seu, um colega nosso ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - .... o que não coloca apenas uma questão de solidariedade de partido!

O Sr. Deputado Manuel Lopes é deputado independente do Grupo Parlamentar do PCP mas é sobretudo deputado desta Casa e partilha com todos nós uma certa qualidade. Ora, a preocupação de ter isto em conta nos trabalhos da Comissão de Inquérito foi notória da parte de todos e de cada um dos seus membros, que, portanto, têm autoridade moral para fazerem uma declaração de voto. Nós ouvimos em silêncio, como bem reparou, a declaração de voto dos deputados do seu partido; não ouviu da nossa parte qualquer comentário, qualquer aparte, qualquer protesto. A vossa declaração de voto foi. feita em silêncio, tal como, em silêncio, os Srs. Deputados ouviram a declaração de voto que nós' produzimos e que diverge, na interpretação dos factos, daquela que é a versão oficial do relatório.
Pergunto, então: o que é que denigre a imagem do Parlamento? Sem a mínima dúvida, dizemos que o que denigre a imagem do Parlamento é uma intervenção como aquela que o Sr. Deputado produziu e que é da máxima gravidade, na medida em que imputa ao Sr. Deputado Manuel Lopes precisamente aquilo que o inquérito parlamentar excluiu!
Como é que o Sr. Deputado quer escapar a esta conclusão irrefutável afirmando que o que eu deveria dizer era que a Comissão de Inquérito trabalhou em tempo record, o que eu deveria dizer era que a Comissão trabalhou excelentemente e que trabalhou tão excelentemente que o Sr. Deputado pode tirar conclusões abusivas como aquelas que acaba de tirar?!
Devo dizer que me recuso absolutamente a dizer isso. Mais: considero que isso prejudica -e muito seriamente - a imagem do Parlamento e vem lançar suspeições e dúvidas que dificultam o nosso contacto com os agentes das forças policiais, repescando fantasmas, calúnias e sombras que gostaríamos de ver definitivamente afastadas e retomando as ofensas, as inverdades, as distorções constantes de um relatório anónimo, sobre cuja origem não podemos interrogar o Sr. Ministro da Administração Interna, como bem gostaríamos, porque, lamentavelmente, essa possibilidade nos foi recusada.
Quanto às damas feridas, Sr. Deputado Agostinho Domingues, da nossa parte não há nenhuma susceptibilidade de carácter pessoal em relação às afirmações que produziu, mas se fosse outro deputado desta Câmara que fosse objecto das suspeições, aleivosias e insultos que V. Ex.ª proferiu, não hesitaríamos em erguer a voz para as condenar tão firmemente como condenámos estas suspeições que lançou agora!

Aplausos do PCP.

Já provámos isso cabalmente em relação a deputados da vossa bancada, relativamente aos quais houve um inquérito parlamentar que os ilibou por completo de acusações infames bolsadas sobre a sua honra e reputação. Fizemo-lo e sem qualquer dificuldade! Apreciámos os materiais dos autos e em boa verdade concluímos isso e dissemo-lo aqui!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - Mas o que nos repugna e choca é ver assumir, simultaneamente, um ar de defesa da verdade e um ar de vestal ofendida por parte de quem não tem a brancura, a limpeza, que caracterizava as verdadeiras vestais, as históricas vestais!
Não têm nenhuma legitimidade para vir protestar contra a bancada do PCP por adoptar uma atitude de

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defesa da verdade, da correcção, da integralidade que aqui defendemos!
Quanto ao Sr. Deputado José Vitorino, ele não merece qualquer resposta quanto ao linguajar que aqui proferiu. A Comissão arredou essas conclusões e o Sr. Deputado bolsou-as aqui irresponsavelmente!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Magalhães referiu-se às bancadas do PS e do PSD e cabe-me dar algumas explicações em nome da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Uma questão que foi levantada é a da objectividade, e quanto a ela direi o seguinte: pegue-se naquilo que o PCP disse e escreveu aquando da nomeação da Comissão de Inquérito à detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, pegue-se nas conclusões relativas ao relatório da Comissão e verifique-se que as coisas que são referidas nesse relatório e as coisas que então foram ditas pelo PCP são diferentes!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é falso!

O Orador: - Penso que é melhor ficarmos por aqui e dar este assunto por encerrado!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, não! Isso é pior!

O Orador: - É pior, é!... A partir deste momento, pelo menos, da minha bancada, não será dita nem mais uma palavra sobre este assunto!

Protestos do PCP.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, sou obrigado a pedir a palavra porque as observações feitas pelo Sr. Deputado José Luís Nunes sobre a posição da minha bancada em relação às conclusões do inquérito exigem uma explicação defensiva.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu bem gostaria de lhe ser agradável mas V. Ex.ª já exerceu o direito de defesa e o Sr. Deputado José Luís Nunes deu explicações em nome da bancada do PS.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, fundamento sucintamente o meu pedido: exerci o direito de defesa em relação a afirmações proferidas pelo Sr. Deputado Agostinho Domingues e em relação -embora apenas parcialmente- às afirmações vertidas para o Plenário pelo Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Manuel Mendes (PS): - Sumária e bastantemente!

O Orador: - Entretanto, o Sr. Deputado José Luis Nunes proferiu declarações de teor diferente sobre a mesma matéria, que atingem a minha bancada e isso origina, como V. Ex.ª sabe, direito de defesa, para resposta.
Portanto, desejo usar do direito de defesa em relação a um destinatário diferente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem toda a razão. Queria ter a bondade de usar da palavra.

O Sr. Fernando Costa (PSD) - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa e fazer um apelo ao bom senso dos grupos parlamentares face à seguinte questão: este debate está a transcender aquilo que me parece minimamente possível e ético!
Com efeito, já se está a entrar na discussão do trabalho da própria Comissão, pondo-se em causa o trabalho dos seus membros e, Sr. Presidente, a Comissão elaborou um relatório que, em nossa opinião, é um veredicto. Portanto, penso que neste momento aquilo que é minimamente exigível a todos os grupos parlamentares é que não transcendam as conclusões que estão no relatório, porque, de outra forma, põe-se em causa o trabalho e a dignidade de qualquer comissão parlamentar!

Aplausos do PSD do PS do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Costa, fica registado o seu apelo e vamos esperar que os grupos e agrupamentos parlamentares sigam a orientação que o Sr. Deputado alvitrou através da interpelação que deduziu.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para exercer o direito de defesa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pela primeira vez na minha vida aplaudi o Sr. Deputado Fernando Costa! Realmente não concebemos que este debate se possa pautar por outras regras que não por aquela primeira que, desde logo, respeita o labor levado a cabo pela Comissão Parlamentar de Inquérito, para cujo trabalho nós contribuímos activamente, como sublinhámos na nossa declaração de voto.
Assim, o direito de defesa será pois exercido de forma muitíssimo sucinta e apenas para dizer que creio que um dos aspectos mais importantes do trabalho desenvolvido pela Comissão foi precisamente o facto de, em relação às realidades apuradas - e que foram previamente quesitadas e investigadas -, ela ter excluído determinantemente as imputações infamantes que em dada altura chegaram a pesar sobre a conduta do Sr. Deputado Manuel Lopes.
Do ponto de vista institucional isto é muito importante, honra a Comissão que levou a cabo os trabalhos de investigação e, aliás, é bom que se diga, não poderia ser de outra forma, para respeito da verdade!
Como sublinhámos, no inquérito não só não se apurou nada que corroborasse as imputações infamantes como até carreou provas que as desmentem. Por exemplo, ao contrário do que o Governo sustentou perante o Plenário, o Sr. Deputado Manuel Lopes não tentou fazer nada que se assemelhasse a impedir a PSP de exercer as suas funções, como diz aquela carta lamentável que o Governo enviou; o deputado Manuel Lopes estava convicto - a Comissão reconhece-o - de que o agente que procedeu à sua detenção o conhecia como deputado,

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proeurou até clarificar se a ordem de detenção também o abrangia e a sua identificação não foi solicitada formalmente em nenhum momento.
E pena é, Srs. Deputados, que não tenham sido carreados mais elementos probatórios para os autos, como nós próprios desejávamos! Mas não foram e, portanto, as conclusões espelham o labor desenvolvido e não podem, naturalmente, espelhar deligências que infelizmente não foram levadas a cabo!
Portanto, consideramos abusivo, pernicioso e incorrecto, do ponto de vista político e parlamentar, que o Grupo Parlamentar do PS, através dos 2 deputados que usaram da palavra nesta matéria, tenha vindo a levantar, de maneira equivoca e em certos aspectos até provocatória, suspeições que estavam enterradas. E eu pergunto: o que é que os senhores querem ao desenterrar suspeições deste tipo?
E contra isso que nós protestamos e são essas imputações aleivosas que a nossa bancada não aceita de modo nenhum!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria agradecer o trabalho da Comissão de Inquérito à detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes.
Foi relator dessa Comissão um colega de bancada, o Sr. Deputado António Taborda, para além dos outros 2 relatores, e isso dá-me a certeza de que houve um grande esforço para encontrar a verdade.
Quanto a mim, pessoalmente, como testemunha dos acontecimentos, penso que essa verdade não foi encontrada. Sei que é difícil, mas lamento-o!
É evidente que quando o testemunho é explicar o que é uma colher, o que é um garfo ou um prato, é fácil, mas quando o testemunho é explicar situações de sensibilidade é difícil que as palavras cheguem.
Por outro lado, lamento que o meu testemunho não tenha sido suficientemente explícito para que toda e qualquer suspeita pudesse ser sanada e isto sobretudo depois da lamentável discussão aqui trazida pelo Sr. Deputado Agostinho Domingues sobre o Sr. Deputado Manuel Lopes, que eu respeito há muitos anos, tanto como pessoa e cidadão como enquanto deputado desta Assembleia.
Queria ainda dizer que lamento, sobretudo, que não tenha sido possível encontrar um consenso para que seja publicado o material do inquérito. E isto porque, tal como eu, possivelmente outros depoentes gostariam que os seus testemunhos pudessem ser julgados por outros deputados para além daqueles que integravam a Comissão de Inquérito, que é sempre um grupo fechado que tem uma missão a cumprir e que, possivelmente, por esse facto, se autolimita.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu grupo parlamentar deseja, com serenidade, tirar apenas 3 consequências do trabalho desta Comissão Eventual de Inquérito e do incidente que motivou a sua criação.
Em primeiro lugar, como na altura tivemos ocasião de sustentar (o presidente do meu grupo parlamentar e eu próprio), só depois de um apuramento dos factos a
Assembleia da República estaria em condições de se pronunciar sobre eles, sem correr o risco de o fazer baixar de um clima emocional como aquele em que os factos foram trazidos a esta Câmara.
Nesse sentido, o meu grupo parlamentar tem que louvar o trabalho feito por esta comissão, não só pela celeridade com que o fez como também pela insenção e pelo rigor que pôs nas averiguações.
Em segundo lugar, o meu grupo parlamentar quer congratular-se pelo facto de a comissão ter concluído que não houve violação da imunidade parlamentar do deputado em causa. Seria um facto extraordinariamente grave que qualquer autoridade não respeitasse as imunidades dos deputados e, felizmente - e creio que todos nos devemos congratular com isso -, tal facto não se verificou.
Finalmente, queremos dizer, muito claramente, que não estamos aqui sentados para julgar ninguém - não é essa a nossa função nesta Assembleia - e pensamos que deste incidente e do trabalho desta comissão apenas devemos tirar uma conclusão: é que nós, deputados, devemos ter, em todas as circunstâncias, a preocupação de colaborar com todas as autoridades para que as nossas imunidades sejam, em todos os lugares e em todos os tempos, respeitadas.

Aplausos do CDS, cio PS, do PSD, do PCP e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o PSD se regozija com a constituição desta Comissão Eventual de Inquérito e com os resultados a que chegou.
Tem sido, frequentes vezes, posta em causa a idoneidade das comissões de inquérito, bem, como muitas vezes, se tem posto aqui em dúvida o trabalho e a independência que os membros das comissões de inquérito devem assumir plenamente. Neste caso, que se veio a verificar não ter a gravidade que se poderia supor que tivesse, os deputados membros dessa comissão - da qual também fizemos parte - trabalharam, na minha opinião, com a maior independência e com a maior dignidade, levando até ao fim a investigação que ao caso cabia.
Pensamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que fazer aqui no Parlamento outros juízos de valor que não aqueles que estão insertos no relatório é indevido. Por outro lado, cremos que fazer aqui, no relatório, juízos a respeito do comportamento dos membros da comissão ou daqueles que estiveram envolvidos com os factos - e a comissão não pode tirar ilações sobre aquilo que ficou estritamente provado - também não nos parece correcto, sob pena de, ao fim e ao cabo, se pôr em causa a essência ou o objectivo das comissões parlamentares.
Apraz-nos, contudo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, registar que, efectivamente, não se verificou aquilo que poderia ser extremamente grave, ou seja, a violação das imunidades parlamentares, mas sim - e refiro-me a isto porque consta das declarações - um comportamento da PSP que podemos considerar correcto.
Somos da opinião que o Sr. Deputado Manuel Lopes poderia ter evitado este incidente. Contudo, como sindicalista que era, também reconhecemos que, por dever de solidariedade, não tinha que se apartar dos seus colegas que acabavam de receber uma ordem de detenção.
Por outro lado, também nos apraz registar - e assim aponto as conclusões do inquérito- que é dever de todos os deputados, que querem usar dos seus direitos,

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invocar esses mesmos direitos, pois as entidades policiais não são obrigadas nem têm o dever de pôr em prática faculdades que os detentores das mesmas não pretendem usar.
Por tudo isto, Sr Presidente e Srs Deputados, pensamos que se evitaram equívocos - diga-se a verdade - e que valeu a pena que esta Comissão Eventual de Inquérito tenha trabalhado para que este caso, que podia ensombrar a dignidade do Parlamento, do Governo e das entidades policiais, tenha ficado (como ficou) esclarecido Em boa verdade, as graves consequências que podiam daí advir, feiamente, não se verificaram.

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado José Magalhães.

O Sr José Magalhães (PCP) - Sr. Presidente, Srs Deputados A opinião do Grupo Parlamentar do PCP sobre a maneira como os trabalhos da Comissão Eventual de Inquérito decorreram, bem como o juízo de valor sobre as suas conclusões, consta da declaração de voto de que somos signatários, não merecendo portanto da nossa parte, nenhum aditamento Com efeito, retomamos aqui por inteiro essas considerações.
As nossas preocupações quanto a quaisquer ilações que pudessem ser perniciosas para o prestígio da Assembleia da República e para o deputado visado foram, em larga parte, afastadas pela maneira como os trabalhos da comissão decorreram. O incidente a que assistimos há pouco é, creio, um incidente de percurso não significativo (pelo menos assim o esperamos).
Creio que o que importa fazer agora, como sublinharam outros senhores Srs Deputados, é tirar lições e, designadamente, ponderar o que é possível fazer para que casos como este, que foi objecto de inquérito, não se repitam com outro qualquer deputado de qualquer bancada
Foi nesse sentido que apresentámos, oportunamente, um projecto de resolução tendente a garantir a publicação integral das actas desta Comissão Eventual de Inquérito Sabemos que são volumosas -contém 18 inquirições e inúmeros debates -, mas cremos que só a publicação dessas actas e dos depoimentos que as integram poderá permitir que cada um, por seu juízo próprio avalie se as conclusões que a comissão aprovou maioritariamente, são ou não correctas e adequadas - e cada um será livre de entender, sobre essa matéria, o que, em sã consciência, vier a apurar.
Nesse sentido, apresentámos, como já disse, um projecto de resolução que, segundo nos informaram, S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República não admitiu.
Consideramos que, certamente, também aqui há um equívoco.
O que propusemos foi que a Assembleia da República fizesse publicar na 2.ª série do seu Diário as actas da Comissão Eventual de Inquérito. E mais nada!
Ora, este é um procedimento normal, razoável e imprescíndivel - como já aqui foi sublinhado por deputados de outras bancadas- e não vemos que a ele se possa obstar qualquer razão constítucional. Se alguém tem razões políticas, que o diga Mas razões constitucionais. Srs Deputados, realmente não há!
Junto ao despacho de S. Ex.ª o Sr Presidente da Assembleia da República foi anexado um parecer, subscrito por um Sr Auditor Jurídico da Assembleia da República Não sei se, em bom rigor, caberia ao auditor jurídico da Assembleia da República emitir pareceres sobre a admissibilidade de projectos de resolução ou de projectos de lei Temos uma assessoria jurídica, como os Srs. Deputados sabem, e caso para ponderar para que é que ela serve se é chamado a dar parecer sobre esta matéria o auditor jurídico da Assembleia - que, como sabemos, é o representante do ministério público, para curar da legalidade da actividade dos serviços.
Em todo o caso (aquilo era um parêntesis), esse parecer do Sr. Autitor Jurídico considera inconstitucional um projecto de resolução por razões que, verdadeiramente, são surpreendentes para nós e que passarei a enunciar
Primeira razão, a lei não permitiria a publicação das actas da comissão.
Creio que uma leitura atenta e minimamente cuidadosa da lei permite demonstrar que ela, especificamente, autoriza a divulgação, desde que seja obtida autorização dos depoentes, como certamente o será, pois creio que nenhum deles se furtará a fornecê-la.
Portanto, a primeira razão invocada é totalmente destituída e é verdadeiramente surpreendente que alguém, com a qualificação da entidade que subscreve este texto, possa emitir um tal parecer
Em segundo lugar, sustenta-se que a iniciativa da resolução teria que partir da Comissão Eventual de Inquérito, o que e, manifestamente, uma segunda incapacidade de leitura da lei das comissões eventuais de inquérito
Como os Srs. Deputados sabem, a Lei n º 43/77, prevê que as comissões eventuais de inquérito possam, uma vez concluídos os seus trabalhos, apresentar projectos de resolução sobre a matéria dos trabalhos, como é evidente Aliás, tem de o fazer por uma razão muito simples é que, como os Srs Deputados sabem, quem tem iniciativa legislativa e iniciativa na apresentação de projectos de resolução são, por um lado, os deputados, e, depois da revisão constítucional, os grupos parlamentares
As comissões parlamentares não têm direito de iniciativa legislativa

O Sr Jorge Lemos (PCP) - Claro!

O Orador: - Entendeu-se, na altura em que se elaborou a Lei n º 43/77, que se deveria abrir uma excepção neste caso, e então estabeleceu-se que também as comissões poderiam apresentar projectos de resolução, obviamente, sem prejuízo do direito, que é constítucional, dos deputados apresentarem projectos de resolução, tantos quantos entenderem.
Ora, interpretar isto, que é um alargamento da competência em matéria de iniciativa legislativa para abranger as comissões de inquérito, como um monopólio da iniciativa dos projectos de resolução, quando se trata de matérias que foram objecto de inquérito, é verdadeiramente um salto que nada permite, é um salto no eseuro Portanto, parece-nos totalmente destituída de fundamento uma tal alegação subscrita pela entidade que referi com a qualificação de auditor jurídico
Diz-se, também, que, com a aprovação de uma resolução deste tipo, se violaria o princípio da hierarquia das leis, o que não colhe minimamente e não merece sequer comentários.
Em suma, não há nenhum fundamento para que este projecto de resolução não tivesse sido admitido. Mas nem vamos recorrer disso.
O que nos parece importante é colocar à Câmara esta (e apenas esta) questão é ou não necessário, Srs Deputados, que a Assembleia da República faculte a todos os cidadãos, que os queiram ler, os depoimentos constantes dos autos da Comissão Eventual de Inquérito, sobre os quais não pende agora sigilo nenhum? Aliás, nem tem que pender nenhum sigilo, e muito estranho é que venha alguém sustentar que deve pender sigilo.

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porque, então, aí poderá fomentar suspeições que, precisamente, a todo o custo queremos evitar.
Apresentámos, portanto, um requerimento à Mesa no sentido de se fazer a publicação destes textos. Aliás, devo dizer que, se não se fizer essa publicação, teremos todo o gosto em incorporar em documento próprio todos os textos que pudermos sobre esta matéria, a fim de os revelarmos ao povo português. Esses textos não serão sonegados pois há meios regimentais para divulgarmos aquilo que tem de ser divulgado. Cremos, no entanto, que este acto deveria ser consensual e que deveria ser a própria Assembleia, de moto próprio, a facultar a possibilidade de conhecimento destes depoimentos, materiais fundamentais da comissão.
Um segundo aspecto que, creio, merece consenso, para evitar a repetição de acontecimentos deste tipo, e a importância da Assembleia da República divulgar largamente a doutrina constante do parecer quanto à defesa das imunidades parlamentares.
Creio que foi um esforço muito importante a reflexão levada a cabo designadamente pelos quatro relatores do texto, sobre as imunidades parlamentares. Na realidade, não havia estudos sobre esta matéria nem pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos. Portanto, o esforço de reflexão feito e meritório e, quanto a nós, merece a máxima divulgação. Aliás, circulou pelas diversas bancadas um texto que, precisamente, visava divulgar o mais possível estas conclusões, a bem da defesa do mandato dos deputados e do prestígio da própria Assembleia da República.
Pensamos que este, sim, é um caminho positivo. A comissão trabalhou, as suas conclusões têm o valor que tem e o povo português ajuizará do trabalho de todos e de cada um de nós.
A doutrina que a propósito deste incidente, que é lamentável, foi possível emanar é uma doutrina positiva e muito importante, pois é clarificadora. Foi nesse sentido que a partilhámos, subscrevemos e a ela aderimos inteiramente - e digo isto não só em relação ao seu conteúdo. Aliás, pretendemos votá-la e, mais ainda, apoiar todas as iniciativas que visem levá-la tão longe quanto possível.
Quer isto dizer, em síntese, que partilhamos do espirito, que aqui foi enfatizado por várias bancadas, de que a defesa do mandato dos deputados deve ser feita por todos os meios constitucionais e legais e que quando um deputado defende o seu mandato é o próprio prestígio da Assembleia da República que está a defender. Não é coisa pessoal o que está a defender; é, afinal, um pouco de todos nós e da República que nos cabe representar e defender.
O nosso voto é o de que essa defesa e essa representação se faça nos termos adequados a bem da própria República.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento, de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado Jorge Lacão, que vou passar a ler:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República: O relatório aprovado no termo dos trabalhos da Comissão Eventual de Inquérito à detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, independente do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, contém matéria de matriz doutrinária sobre as imunidades parlamentares - seu estatuto e exercício -, cuja validade aconselha a sua ampla publicitação.
Nestes termos, de acordo com as normas regimentais pertinentes, os deputados abaixo-assinados requerem:
Primeiro, a publicação em separata do Diário da Assembleia da República, 2.ª série, da parte doutrinária do relatório, que tem por objecto as imunidades parlamentares e consta do seu n.º III até ao enunciado das conclusões, ou seja, até ao fim do § 18.
Segundo, a distribuição da aludida separata por todos os deputados.
Terceiro, o envio do mesmo texto a todas as entidades policiais.

O Sr. Presidente: - Deu, também, entrada na Mesa um outro requerimento, apresentado pelo PCP, de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado José Magalhães, que vou passar a ler:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República: A detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, pela PSP, em Março último, originou indignação e perplexidade, quer na opinião pública quer na Assembleia da República. Constituída, com um âmbito demarcado pela maioria parlamentar, a Comissão Eventual de Inquérito que apreciou os factos, trabalhou ao longo de semanas e concluiu a sua tarefa com a aprovação de um relatório.
Importa viabilizar o conhecimento das peças que permitiram as conclusões do inquérito, desde logo para se aquilatar das posições dos diversos interventores, deputados e depoentes. Impõe-se que não fiquem dúvidas, que não restem obscuridades insanáveis, que tudo, mas tudo, se esclareça. A publicação dos materiais da Comissão Eventual de Inquérito, permitida pela lei, apenas favorece a transparência dos actos políticos, o prestígio da Assembleia, a clareza do funcionamento das instituições democráticas. Se, em tese geral, esta afirmação é irretorquível, mais ela se sublinha no caso vertente, pelas implicações de que se reveste nos domínios da opinião responsável e pelo melindre da problemática que envolve a própria dignidade parlamentar.
É irrecusável que se forneça aos interessados o conjunto de elementos de que os deputados membros da Comissão de Inquérito dispuseram. Nem de outro modo poderia ser, sob pena de gerar suspeições que ninguém deseja.
Nestes termos, os deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, ao abrigo das disposições regimentais, legais e constitucionais aplicáveis, requerem a publicação, na 2.ª série do Diário, das actas da Comissão Eventual de Inquérito à detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes, cabendo à Mesa proceder às diligências legais e processuais para tal indispensáveis.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra. Sr. Presidente. É para interpelara Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, tendo em conta que estão 2 requerimentos na Mesa e que o primeiro traduz um consenso dos diversos grupos parlamentares, se esta estiver de acordo, gostaria de sugerir que colocasse, em primeiro lugar, à votação o primeiro requerimento, dado que sobre ele, creio, não haverá nenhuma objecção da Câmara.

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Aproveito para pedir à Mesa que me inscreva desde já para uma interpelação ainda antes da votação do segundo requerimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não é usual pedirem-se interpelações a prazo, mas na altura própria V. Ex.ª poderá levantar-se para fazer a interpelação.
Pareceu-me que o Sr. Deputado José Luís Nunes também tinha pedido a palavra. Quer fazer favor de me dizer que uso pretende fazer dela, Sr. Deputado?

O Sr, José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, o meu pedido de palavra era no sentido de interpelar a Mesa. Porém, dada a douta intervenção do meu colega Jorge Lacão, prescindo de o fazer.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente gostaria de saber se o último texto que foi lido por V. Ex.ª é um projecto de resolução ou um requerimento.

O Sr. Presidente: - É um requerimento, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos votar o primeiro requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Conforme o pedido, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, para interpelar a Mesa.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no seguinte sentido: o conteúdo do segundo requerimento que V. Ex.ª leu a esta Câmara é a tradução de um projecto de resolução, apresentado pelo PCP, cuja entrada na Mesa o Sr. Presidente da Assembleia da República indeferiu.
Sem me querer pronunciar, desde já, quanto ao fundo da questão, colocada em termos doutrinários na intervenção que acabou de fazer o Sr. Deputado José Magalhães penso que, em coerência com a atitude do Sr. Presidente, e dado tratar-se da mesma matéria que é colocada, exactamente, nos mesmos termos, a Mesa não deverá admitir este requerimento, justamente por total coerência com o acto do Sr. Presidente, que não admitiu um projecto de resolução de teor idêntico.
Se a Mesa tiver este entendimento, nada mais teremos a dizer. Porém, se tiver entendimento diverso, seremos obrigados a recorrer do acto da Mesa por o considerarmos gravemente incoerente com uma atitude tomada anteriormente pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Oportunamente procurarei dar resposta a V. Ex.ª depois de ouvir os restantes membros da Mesa.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por iniciativa e diligência da bancada do PCP, foi possível que esta Câmara subscrevesse por unanimidade o requerimento que acaba de ser votado, no qual se contém a decisão de a Assembleia da República proceder à mais ampla distribuição e divulgação da parte substantiva e doutrinária constante do relatório que resultou dos trabalhos da Comissão Eventual de Inquérito à Detenção do Sr. Deputado Manuel Lopes.
Com efeito, essa parte integra matéria apreciável, extremamente positiva, para a compreensão do estatuto parlamentar, dos direitos e deveres funcionais dos
deputados, de como não podem ser violadas as suas imunidades, e de como não é legítimo pôr em causa toda a forma de exercício livre e indeterminado do mandato, na auscultação da realidade popular e na busca de habilitação material, por parte de cada deputado, da sua intervenção no meio em que se insere.
Das decisões agora tomadas resulta que o Sr. Presidente da Assembleia da República e a Mesa providenciarão no sentido de que seja enviado a todas as entidades policiais e fornecido aos Srs. Deputados o texto dessa parte substantiva do relatório, que deverá ser publicado em suplemento da 2.ª série do Diário.
Trata-se de uma medida de grande relevância, do maior alcance, accionada pela vontade explícita de todos os grupos e agrupamentos parlamentares que importa salientar pelo conteúdo eminentemente esclarecedor, clarificador e democrático que nela se insere.
Por estas razões e certos de que esta iniciativa dignifica a Câmara, votámos, em consenso com todos os restantes partidos aqui presentes, a favor do requerimento em boa hora formulado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa entende que deve admitir o requerimento para o pôr à votação. Isto, procurando responder à interpelação do Sr. Deputado Jorge Lacão -e esta decisão é por maioria e não por unanimidade da Mesa -, porque se entende que os objectivos a alcançar com o projecto de resolução são diferentes do contexto do requerimento.
Admitido o requerimento, iremos pô-lo à votação, salvo se o Dr. Deputado Jorge Lacão pretender levar por diante outro processo regimental admitido.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, devidamente ponderadas as razões da Mesa - e embora não nos conformemos com a razão de ser final - não iremos apresentar recurso do acto da Mesa e preferimos votar o requerimento apresentado. Porém, em seguida, iremos usar da palavra para formular uma declaração de voto que explicará á nossa posição...

O Sr. Presidente: - Muito obrigado. Sr. Deputado. Tal atitude facilitar-nos-á o processo e ganharemos muito tempo.
Vamos então à votação do requerimento apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos a favor do PCP, do M DP/C DE, da UEDS e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o requerimento apresentado pelo PCP porque as comissões de inquérito parlamentar têm uma natureza própria, natureza essa que lhe é conferida por uma lei aprovada pela Assembleia da República que é a Lei n.º 43/77. E, pois, no âmbito dessa lei que decorrem a actividade e as competências das comissões de inquérito.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É falso e ridículo!

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O Orador: - Segundo ela, no seu artigo 6.º, todas as diligências das comissões de inquérito são sigilosas, salvo se a própria Comissão decidir em sentido contrário.
Sucede também que, de acordo com o artigo 12.º dessa lei, no final dos trabalhos das comissões de inquérito, paralelamente à apresentação do respectivo relatório, elas podem apresentar projectos de resolução se o entenderem conveniente. Ora, como se sabe, não foi esse o caso desta Comissão de Inquérito.
Portanto, estivemos apenas face a um relatório que não teve que ser objecto de votação - porque não tinha que ser -, mas simplesmente de apreciação política nos termos já efectivados.
Restava a questão suscitada pelo Partido Comunista Português sobre a possibilidade de ser o Plenário da Assembleia da República a decidir dar publicidade às actas da Comissão de Inquérito.
Ora, tendo em conta que essa Comissão - como já referi - funciona no âmbito de uma lei própria que a regulamenta e, tendo em conta que a Comissão não deliberou ela própria nos termos do seu artigo 6.º, dar publicidade a essas actas, temos para nós que uma deliberação do Plenário da Assembleia da República nesta matéria seria uma deliberação contra a própria lei que regulamenta o funcionamento das comissões de inquérito.
Por esta exclusiva razão votámos contra o requerimento apresentado pelo PCP, justamente por entendermos que as comissões de inquérito têm o seu foro próprio e que foi no âmbito desse foro que se extinguiu esta competência. Como tal, ela não pode ser agora avocada pelo Plenário da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o requerimento apresentado pelo PCP porque, de um ponto de vista legal, não há rigorosamente nada que impedisse esta decisão. Só por absurdo se pode contestar o direito dos deputados apresentarem projectos de resolução ou fazerem requerimentos pelo facto de a lei reconhecer à Comissão esse direito, no que concerne às resoluções.
O que a lei diz é que as comissões podem apresentar projectos de resolução. Não diz, nem o poderia dizer sob pena de infringir a própria Constituição, que os deputados o não possam fazer e, muito menos, que não possam fazer requerimentos.
A lei também nada determina quanto à competência para decidir da publicação das actas. O que a lei diz é que as actas poderão ser publicadas, mas, no artigo 6.º, não diz nem limita o direito de decisão da publicação das actas. No n.º 1 do mesmo artigo refere a publicidade das sessões da Comissão, no n.º 4 refere ainda a publicação dos depoimentos, mas nada diz em relação à competência para decidir quanto a isso. E se a Comissão tem essa competência, por maioria de razão, também a tem este Plenário de quem essa Comissão emana. Portanto, no plano puramente legal, não haveria nada que o impedisse.
No plano político, porém, creio que a atitude aqui assumida é de uma extrema gravidade porque, quer queiramos quer não, vai levantar uma suspeição sobre o trabalho da Comissão e das suas conclusões...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ..., vai permitir que se diga que há alguma coisa a esconder. Ora, esse propósito, gostaria de afirmar muito claramente que conheço as actas,
acompanhei a Comissão, tenho conhecimento do relatório e sei que este reproduz fielmente aquilo que se passou e não foi nada escamoteado. Esta é a minha posição.
Contudo, o que não posso afirmar, não posso garantir e do que não me posso livrar é de que quem dela não tenha conhecimento, e perante a recusa desta Assembleia em tornar públicos depoimentos, não raciocine, imputando responsabilidades, segundas intenções quanto a esta decisão e levantando suspeitas sobre este relatório e sobre a sua decisão. Ora, considero que isto é gravíssimo!
Não há, e creio tê-lo demonstrado, nenhum impedimento legal. Assim, na ausência de impedimento legal e dada a importância política desta decisão, é lamentável a decisão que foi assumida pela maioria desta Assembleia. E é lamentável pelas consequências inevitáveis que, quer queiramos quer não, ela trará.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o requerimento apresentado pelo PCP por 2 ordens de razões.
Em primeiro lugar, porque idêntico requerimento já tinha sido feito no seio da Comissão de inquérito e não obteve vencimento. Como membro dessa Comissão acato neste Plenário a deliberação da Comissão, independentemente de qual tenha sido a minha posição de voto acerca desse requerimento no seio da Comissão.
Em segundo lugar, sobretudo e principalmente, votei contra o requerimento porque nem sequer estão reunidas as condições legais para que este Plenário pudesse decidir favoravelmente sobre ele.
Quais seriam essas condições legais? São as constantes do n.º 4 do artigo 6.º da lei que estabelece o regime jurídico das comissões parlamentares de inquérito, o qual sujeita a autorização prévia dos autores dos depoimentos a respectiva publicidade.
O Plenário não pode nem nunca poderia dizer que se deveria proceder à publicação de depoimentos sem previamente estar inteirado e conhecedor de qual seria a resolução dos seus autores.
Portanto, não há que colocar a questão de suspeição ou não suspeição sobre os trabalhos da Comissão e se o Plenário tem alguma razão para suspeitar, então, não se fique por meias palavras e diga que a Comissão de Inquérito é possível de quaisquer reparos, o que não vi fazer por parte dos Srs. Deputados.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Paca uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o requerimento apresentado pelo PCP por três ordens de razões. A primeira deve-se ao facto de considerarmos que seria ilegal esta resolução.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas qual resolução?

O Orador: - A segunda ordem de razões funda-se no juízo que o Sr. Deputado Lopes Cardoso fez. Creio que o Sr. Deputado não tem razão quando afirma que pode haver suspeições sobre a Comissão.
Se esta Assembleia aprovasse a publicação das actas quando a Comissão, em sede própria e por ser entidade própria, a rejeitou, isso seria um juízo de desconfiança por parte desta Assembleia contra a Comissão e esta não poderia deixar de se considerar desautorizada.

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O Sr José Magalhães (PCP) - Ora essa!

O Orador: - Ora, as comissões de inquérito têm funções jurisdicionais Os deputados, nas comissões de inquérito, não representam os partidos e devem comportar-se como independentes Portanto, tomar uma resolução ou uma medida que contrariasse uma decisão importante da Comissão seria, por certo, um juízo de demérito ou até um juízo de censura.
A terceira ordem de razões já o Sr Deputado Vilhena de Carvalho a expôs Acontece e acresce que, como o Sr Deputado já adiantou, mesmo assim, e possível fazer regimentalmente a publicação de alguns depoimentos, nomeadamente daqueles que os depoentes autorizem.
Porém, passar daí para a tese mais lata de que todos os depoimentos fossem publicados parece-nos que podia trazer graves riscos, nomeadamente porque num processo desta natureza os depoentes podem não estar interessados em que os seus depoimentos sejam publicados e, em futuros inquéritos, poderiam inclusivamente levar à retracção o tipo de depoimentos que gostariam de fazer.
Por razões de legalidade e de conveniência, cremos ter agido bem quando votámos contra este requerimento

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Menezes Falcão.

O Sr Menezes Falcão (CDS) - Sr Presidente, Srs Deputados Votámos contra o requerimento do PCP com fundamento nas razões de ordem legal invocadas pelo Sr Deputado Vilhena de Carvalho e que não importa repetir
Porém, há mais Parece-me oportuno referir aqui um pormenor importante ao abrigo do princípio de que a justiça deve ser feita em todas as circunstâncias. É que, tendo acompanhado os trabalhos da Comissão de Inquérito, verifiquei logo no primeiro dia que veio à nossa mão um documento particularmente importante e que nos orientou ao longo de todos os trabalhos. Ora, esse documento é precisamente uma declaração escrita do Sr Deputado Manuel Lopes
O Sr. Deputado Manuel Lopes forneceu à Comissão uma declaração produzida em termos de tal isenção, aprumo e dignidade que pelo menos, a mim não deixou a mais pequena dúvida quanto à forma como devia ser orientado o raciocínio ao longo de todas essas averiguações O Sr Deputado nunca afirmou que se tinha identificado inequivocamente perante as forças policiais, o Sr Deputado invocou a seu favor e com toda a legitimidade a convicção de que estava convencido de que era reconhecido como deputado.
Para além disto, tudo foram afirmações, averiguações, algumas contradições, mas foi todo um processo desenrolado no sentido de a Comissão ter um trabalho particularmente facilitado.
Amontoaram-se resmas de papel, mas, para mim, o simples documento do Sr Deputado Manuel Lopes, amplamente divulgado, da conta ao público - àquele publico à quem o PCP quer prestar satisfações e muito bem - de tudo quanto ali se passou e de tudo quanto é essencial. O resto e despiciendo Portanto, a nosso ver, essa publicação, alem de desnecessária é inoportuna Foi, pois, com estes fundamentos que votámos contra.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado João Corregedor da Fonseca

O Sr João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE)- - Sr. Presidente, Srs. Deputados. O MDP/CDE entende que as actas da Comissão de Inquérito deveriam, e poderiam, ter sido publicadas.
É que as actas desta Assembleia da República devem ser claras, lapidares e não se deve escamotear ao público o reconhecimento de todas as posições, o que, com certeza, facilitaria a apreciação de todos os relatórios Assim, seria mais claro para todos, quer para d Câmara quer paia o público em geral.
Somos de opinião que não devem restar dúvidas nem sobre este caso nem sobre outros idênticos Não entendemos por que razão a maioria impede o conhecimento desta matéria, o que só dignificaria a Assembleia da República e a própria dignidade parlamentar.
Aliás, a minha colega de bancada Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura disse que gostaria mesmo de ver publicadas as suas declarações.
Entendemos que a publicação destas actas não traria implicações legais e que a sua não publicação poderá, isso sim, trazer alguma dúvida sobre os motivos que levaram à rejeição do presente requerimento.
Aliás, se a Câmara votou favoravelmente - sem votos contrários - as conclusões do relatório, seria então positiva a publicação das respectivas actas e, de maneira nenhuma, isto seria contraditório.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado José Magalhães.

O Sr José Magalhães (PCP) - Sr Presidente, Srs Deputados. A deliberação que agora foi adoptada fundar-se-á talvez em razões de conveniência - disso não temos dúvidas nenhumas - e, em absoluto, em nenhumas razões de legalidade, como aliás, já foi aqui demonstrado.
O nosso voto é, pois, no sentido de que, de forma alguma, esta deliberação faça precedente, uma vêz que carece, absolutamente, de qualquer fundamento legal e constítucional.

O Sr Carlos Brito (PCP) - Muito bem!

O Orador: - É uma decisão conjuntural, assente num receio de transparência que nos parece bastante significativo e que revela um certo estilo de actuação de algumas bancadas - de outras, porventura, não.
Creio que a falta de fundamento e patente e isso decorre, designadamente, das alegações que aqui (oram produzidas em nome da bancada do PS.
Na verdade, todos sabemos que as diligências das comissões parlamentares de inquérito são sigilosas mas que, terminados os seus trabalhos, a comissão pode deliberar sobre a respectiva publicitação É, de resto, o que a lei prevê no artigo 6. º e, em particular, no seu n.º 4, isto é, depois de cumpridas determinadas formalidades, designadamente a obtenção da autorização dos interessados que têm interesse legítimo em não ver reveladas as suas declarações em certas circunstâncias. A lei faculta-lhes isto e a Assembleia a tal se deve conformar e nunca nos passaria pela cabeça questionar tal direito.
Quer isto dizer que, cumpridas certas formalidades, a divulgação pode ser feita Neste caso, por tudo o que já alegámos, achamos que é particularmente importante que tal seja feito. E isto porque a Comissão de Inquérito teve sobre esta matéria, ao contrário do que o Sr Deputado Vilhena de Carvalho disse, não uma, mas duas deliberações Certamente por lapso o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho esqueceu-se da primeira. É que a Comissão começou por deliberar a publicação integral dos trabalhos e, lamentavelmente, em reunião plenária convocada no dia subsequente, essa deliberação foi revogada, depois de acesa discussão.

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Nós lamentamos profundamente que a primeira deliberação tenha sido revogada, por um lado porque viola regras elementares sobre os procedimentos de órgãos colegiais e, por outro lado, se a Comissão deliberou, e bem, no sentido de fazer publicar o texto, nenhuma razão havia - e, pelo contrário, todas as razões se levantavam - para que esta decisão não fosse revogada. Foi-o, aliás, em circunstâncias que lamentamos profundamente.
Invocar que a Comissão deliberou não publicar, é invocar a segunda deliberação -que é infeliz - e esquecer a primeira, que não deveria nunca ter sido revogada. Este foi o primeiro aspecto.
Mas há um segundo aspecto, que é o seguinte: o Plenário é, obviamente, soberano para deliberar a publicação, a qualquer tempo, dos trabalhos preparatórios ou dos trabalhos da própria Comissão. Isto porque o Plenário é o Plenário -todos o sabemos - e portanto tem poderes máximos nesta matéria, que não podem ser questionados nem deferidos a uma comissão como monopólio seu.
Compreendemos que alguns gostassem que assim fosse: a Comissão está extinta porque concluiu os seus trabalhos e, portanto, a questão estaria corripletamente ultrapassada, isto e, o Plenário estaria totalmente tolhido para deliberar. Só que a lei não permite tal arrimo e tal porta escapatória fácil a quem não deseja ver publicados os trabalhos preparatórios. É preciso assumir frontalmente aquilo que se quer nesta matéria e não buscar soluções de carácter escapatório e de subterfúgio.
Temos, pois, que o Plenário deveria ter cumprido as formalidades legais e deliberado publicar.
E, sobre essa matéria, temos uma proposta a formular às diversas bancadas.
O nosso intuito, em todo este processo, foi o de que os trabalhos da Comissão fossem maximamente conhecidos para que não pairasse qualquer suspeição sobre a forma como o labor investigatório foi conduzido.
Foi recusada a possibilidade de publicação integral do texto dos trabalhos da Comissão mas, em nome da minha bancada, pergunto aos Srs. Deputados: o que é que estão dispostos a fazer publicar? Só o relatório, nos termos em que está formulado ou também as peças processuais fundamentais, escolhidas pelos deputados que integraram a Comissão de acordo com critérios de isenção e objectividade?
Pela nossa parte, estamos inteiramente disponíveis para considerar, de forma isenta e objectiva, que peças processuais - no mínimo - há que publicar, salvaguardadas todas as formalidades legais, para que não paire a mínima suspeição sobre o labor da Comissão.
Fazemos esta proposta, neste momento, apelando às diversas bancadas no sentido de que, em tempo, se formule um consenso - tal como foi possível formulá-lo em relação à questão da difusão da doutrina - para que se afaste isto que, agora e neste momento por responsabilidade vossa, paira como espectro sobre o labor desenvolvido pela nossa Comissão de Inquérito Parlamentar.
Esta declaração de voto tem, pois, implícito um voto. Esse voto e o de que seja possível encontrar uma solução que evite que a transparência seja posta em questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares a deslocarem-se ao Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República para uma reunião de líderes.
Srs. Deputados, vamos fazer agora o intervalo regimental. Recomeçaremos os nossos trabalhos às 18 horas e 10 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar a discussão da proposta de lei n.º71/III e dos projectos de lei n.ºs 367/III e 370/III.
Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados no decorrer da sessão anterior, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, eu ia responder ao Sr. Deputado Carlos Brito, que está de costas.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que não será necessário mas, em todo o caso, atrevo-mo a lembrar-lhe que lhe tinham formulado pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Carlos Brito, José Manuel Mendes, João Amaral e José Magalhães.

O Orador: - Sr. Presidente, não vou aproveitar, como já aqui se fez o ensejo para responder aos meus colegas fazendo outra intervenção. Como estes pontos já foram bastante debatidos, vou dizer simplesmente duas ou três coisas que me parecem ser importantes até porque não estou disposto a permanecer nesta Assembleia até às 8 horas da manhã e também estou interessado em que este problema se resolva o mais depressa possível.
O Sr. Deputado Carlos Brito levantou o problema da sua perplexidade quanto às opiniões diferentes dos membros do Governo em relação à lei de segurança e, principalmente, de membros do Governo que não estão aqui presentes.
Ora, eu queria referir-me, como disse na minha alocução, ao facto de a posição do Sr. Vice-Primeiro-Ministro não estar ainda esclarecida. O Sr. Primeiro-Ministro gosta de dizer que não quer falar à entrada e saída das portas; o Sr. Vice-Primeiro-Ministro só gosta de falar nos guarda-ventos. E o que sucede é o seguinte: neste momento, temos 2 membros do Governo que se contradizem um ao outro.
Para nós, deputados e membros de um partido da oposição e, ao que julgo, para toda a Câmara, as palavras de dois ministros valem por igual. Não há qualquer hierarquia entre eles: o que diz o Sr. Ministro da Administração Interna tem tanto peso como o que diz o Sr. Ministro da Justiça. E pelo facto de o Sr. Ministro da Justiça ter dito alguma coisa diferente e contrária ao que disse, antes dele, o Sr. Ministro da Administração Interna, não podemos tirar a ilação que geralmente tiramos nas leis de que uma lei posterior derroga a primeira, ou seja, de que aquilo que o Sr. Ministro da Justiça disse derrogou aquilo que o Sr. Ministro da Administração Interna dissera anteriormente.
Gostaríamos, realmente, que o Sr. Ministro da Administração Interna dissesse: sim senhor, tudo aquilo que eu disse estava mal e faço minhas as palavras do Ministro da Justiça. Esqueçam-se daquilo que eu disse porque mudei de opinião e agora sou seguidor, atento e obediente, do Sr. Ministro da Justiça.
Por outro lado, também sucede que se trata de ministros de dois partidos diferentes que se degladiam dentro da coligação.

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Ouvimos aqui o Sr. Deputado Ângelo Correia erigir, propositadamente, uma plataforma para uma grande estátua política ao Sr. Ministro da Justiça e a querer, ao mesmo tempo, enterrar, o Sr. Ministro da Administração Interna. E fê-lo explicitamente!
Estes são jogos da coligação a que nós somos alheios; são rés inter alios, mas é um triste espectáculo ver que cada um dos deputados da maioria tem o seu ministro preferido e não se importa de enterrar o outro.
É isto que lhe quero dizer, Sr. Deputado Carlos Brito.
Quanto ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro, aguardamos que diga, na sede própria, o que realmente quer.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - A sede própria é a Universidade de Coimbra!

O Orador: - Porque os seus próprios deputados não disseram aqui, nem ele o fez quais são aquelas vírgulas que entendem modificar. O que parece é que só quer modificar vírgulas e não quer modificar mais nada!
Quanto ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, devo dizer-lhe, como fiz na minha intervenção, que embora esta seja a sede para discutir as restrições aos direitos, liberdades e garantias, temos aqui duas opiniões completamente diferentes.
Nós defendemos que os direitos, liberdades e garantias podem ser restringidos em casos excepcionalíssimos porque entendemos que a Declaração dos Direitos do Homem faz parte integrante da Constituição.
Já sei o que o Sr. Deputado me vai dizer: o artigo 29.º da Declaração dos Direitos do Homem, permite esta restrição em determinados casos, como é, expressamente, o caso do terrorismo.
Mas vai dizer-me também que a Constituição prevalece sobre a Declaração dos Direitos do Homem, o que eu não admito porque a Declaração dos Direitos do Homem tem a mesmíssima força constitucional do preceito do artigo 18.º, n.ºs 2 e 3, que não faz qualquer supra/infra ordenação entre os direitos e garantias previstas na Constituição e direitos e garantias previstas na Declaração dos Direitos do Homem.
Há opiniões de juristas sobre neste sentido e há também opiniões de outros juristas em sentido contrário. Portanto, essa questão é controvertida e não vamos aqui debatê-la.
V. Ex.ª tem os seus argumentos e eu tenho os meus; V. Ex.ª tem, ao seu lado, alguns mestres e eu tenho do meu lado, outros comentadores e outros mestres. O Tribunal Constitucional resolverá.
Mas há uma coisa absolutamente certa: é que, para nós, esta restrição é só para casos de perigosidade, só em casos excepcionais e tem que haver dois juízos de valor.
Em primeiro lugar, tem que haver um juízo de valor sobre se se verifica a excepcionalidade para restringir esse direito, em cada caso concreto.
Em segundo lugar, um juízo de valor para se saber até que ponto pode esse direito ser restringido - quais os limites da restrição -, isto é, se se mantém o conteúdo essencial que, para nós. é a dignidade da pessoa humana. E este próprio conceito de conteúdo essencial pode ser fiscalizado pelo juiz de qualquer instância, e, em última instância, pelo Tribunal Constitucional.
Ora, a proposta do Governo não admite, nem o primeiro nem o segundo juízos porque restringe os direitos, liberdades e garantias a granel, como eu disse.
Quanto ao Sr. Deputado José Magalhães, a sua crítica é muito velha, ao dizer que o nosso projecto é o filho da coruja, que é uma fraude, que é uma cópia.
Toda a nossa intervenção foi precisamente para demonstrar o contrário. Por isso é que eu disse que a proposta governamental era o mesmo que o Tollan,
porque está de pernas para o ar, porque aquilo que devia ser o normal transforma-se em excepção e aquilo que devia ser excepção transforma-se em normal. Só vemos as excepções em cima da água quando toda a garantia dos direitos fundamentais está mergulhada dentro de água e não há ninguém que a possa virar.

Uma voz do PS: - Também nem tanto!

O Orador: - Ora bem, o que nós dizemos é o seguinte: enquanto a proposta governamental defende, através desta Lei de Segurança, que é uma lei de segurança do Governo ou do Estado contra a sociedade, o nosso projecto é uma lei da sociedade contra o Estado. Isto está claro na nossa proposta.
Em segundo lugar e quanto a direitos, liberdades e garantias, para nós, a defesa da legalidade democrática exerce-se normalmente através do aparelho do Estado e só em casos muito excepcionais é que eles podem ser restringidos; para o Governo, o que sucede é que os direitos, liberdades e garantias podem ser sempre restringidos e a lei de segurança interna é um aparelho normal através do qual se exerce a defesa da legalidade democrática e a defesa das instituições democráticas. Para nós, a Constituição e todo o aparelho de Estado é uma actuação normal e a Lei de Segurança Interna é uma excepção; para o Governo, a Lei de Segurança Interna é o instrumento por excelência de defesa da legalidade democrática. Isto basta para mostrar a que anos-luz de distância nós estamos da proposta governamental, principalmente neste problema. Mas isto acontece também em relação a muitos outros, como por exemplo, quanto à militarização, quanto à formação da vontade, às buscas, etc.
Mas há aqui um problema: foi aqui muito louvada pela bancada do PSD - e toda a gente parece estar completamente obcecado ou hipnotizado - a proposta feita pelo Sr. Ministro da Justiça de resolver o problema da restrição dos direitos, liberdades e garantias através da criação dos chamados juízos permanentes de instrução criminal.
Mas aqui há uma coisa: isto é uma jurisdição formal ou material?
Sr. Ministro de Justiça, não lhe estou a fazer perguntas porque não é agora altura disso, mas aproveito para lhe dizer que não percebi bem o seguinte: V. Ex.ª admitiu - no seu discurso eu li isso por três ou quatro vezes - que os mandados de captura e os mandados de busca podiam ser telexados ou por fac simile. Como é que pode haver um mandado de captura por telex ou um mandado de captura por fac símile, enviado de Lisboa, Coimbra, Porto ou, eventualmente, de Faro para Freixo de Espada à Cinta, ou Bragança?
Eu não percebo isto: é que é a mesma coisa que uma autoridade receber um telex e haver um mandato de captura por telex ou por fac simile.
Sei, porém, que há qualquer coisa de sério nestas afirmações porque V. Ex.ª é um brilhante professor de Direito e com certeza que não explicou suficientemente a esta Câmara -o que cria alguma preocupação- o que são mandados de captura por telex ou mandados de busca por documentos Jac simile e por telex.
Gostaria que fizesse o favor de nos explicar este aspecto porque, se não foi isso que queria dizer e se V. Ex.ª quer juízos meramente formais -uma pessoa que às 5 horas da manhã passa sem mais nem menos um mandado de captura que depois é telexado -, teremos sim um juízo de instrução formal mas não uma jurisdição material, que interessa ter. E que os direitos, liberdades e garantias pressupõem, além de um juiz formal, também um juiz materialmente competente que pratica competentemente actos de processo.

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Portanto, isto é um enigma e enquanto não for resolvido esse assunto do mandado de captura por telex, para nós trata-se de uma resposta sem conteúdo, isto é, continua a governamentalização e a administrativização das buscas e dos mandados de captura. Mas pior: obriga o juiz a tomar decisões para que funcionalmente não está preparado nem pode tomar.
Finalmente, vou responder ao Sr. Deputado João Amaral.
V. Ex.ª perguntou quantos polícias, quantas autoridades, estariam envolvidas nisto: são aqueles que enumerámos.
V. Ex.ª acha que são em excesso.

O Sr. José Magalhães (PCP): - São centenas!

O Orador: - Nós achamos que não.
Acho que nessa aldeia onde, como nós sabemos, os terroristas ou os criminosos se acoitam, não se pode, realmente, esperar que chegue uma alta autoridade do Porto, de Lisboa ou Coimbra. E em cada terra, em raios mais ou menos definidos, tem que haver uma autoridade que possa perseguir imediatamente o criminoso e que, dentro da legalidade e dentro de todas as cautelas, o possa fazer.
O critério não nos choca pelo facto de ser o do número; o que choca é que esta medida pode ser mal aplicada...

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Essa é boa!

O Orador: - ..., mas tanto pode ser mal aplicada por um guarda como pelo comandante da polícia.
Não é da qualidade das pessoas que vem a sua boa ou má aplicação mas sim da sua formação e da legalidade de como estes actos são praticados.
O Sr. Deputado Ângelo Correia disse que da maneira psicologicamente defraudada como a polícia está ninguém ousará utilizar esses meios. Para nós, isto também é preocupante porque se fazemos leis que a polícia não sabe utilizar ou tem medo de utilizar, então cairemos numa anarquia.
Em todo o caso, para dizer a verdade e porque somos fiéis àquilo que escrevemos - e não o vamos alterar aqui, de qualquer maneira, ao sabor das críticas da oposição - quero expressar-lhe que o número de quantidade dos agentes não nos assusta.
Quanto à disciplina, entendemos que isto é um problema do estatuto disciplinar da polícia e que, como se trata de forças paramilitarizadas, deve fazer parte da ética policial não divulgar as informações.
Assim, também entendemos que um polícia não deve entrar fardado num comício público nem deve entrar fardado quando não está a exercer as suas funções...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira desculpar-me mas acabou o seu tempo, pelo que não pode continuar a usar da palavra.
Pediram a palavra, para protestar, só Srs. Deputados José Manuel Mendes e José Magalhães.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, penso que não valerá a pena entrarmos em grandes disputas doutrinárias acerca do valor da Declaração Universal dos Direitos do Homem, uma vez recebida pelo direito constitucional português, tanto mais que é certo que tenho a opinião de que se a nossa Constituição permite mais direitos e é mais exigente no que a eles concerne, o que está preceituado no Diploma Internacional não pode, de maneira nenhuma, fazer com que aqueles sejam restringidos.
Mas subsiste um outro feixe de assuntos para os quais pedia o contributo do seu pensamento e que andam à volta de um problema que reveste, nesta fase do debate, a maior importância.
O Sr. Ministro da Administração Interna defendeu, um a um, os 35 artigos da proposta de lei do Governo.
O Sr. Ministro da Justiça veio, pelo contrário, advogar a necessidade de introduzir modificações, jurisdicionalizando, formalmente, determinados circuitos, deixando, embora, por definir os contornos do que estaria disposto a aceitar como alterações.
Por outro lado, sabemos que o Prof. Mota Pinto revela uma atitude extremamente fechada, falando de um núcleo central de questões que não podem ser mexidas.
Gostaria de saber se o Sr. Deputado Narana Coissoró pode dar alguma contribuição para o esclarecimento do que pensa será esse nódulo irredutível, que passa pela especialidade incólume, que é preconizado pelo dirigente máximo do segundo partido da coligação.
Suponho que se isto não for aclarado a discussão nesta Câmara está a ser feita em bases perfeitamente surrealistas e de todo em todo inaceitáveis do ponto de vista democrático.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, nós acusámos o CDS de ter corrido a foguetes e de ter apresentado um projecto atamancado que decalca algumas das soluções viciadas e inconstitucionais da proposta do Governo. Não vamos agora discutir se em grau muito menor ou só menor.
Em todo o caso, o que ficou por provar foi a necessidade de um instrumento jurídico chamado Lei de Segurança Interna que se vê que é um índice de polícias visando a concentração das ditas. É um conjunto de medidas brutais de excepção que atingem os cidadãos indiscriminadamente com regras completamente inconstitucionais no plano regional e que violam também a autonomia do poder local, etc., etc., etc.
O Governo veio aqui e não provou os pressupostos. Não provou que fosse aqui que estivessem as dificuldades da administração penal que temos.
À medida que o debate avança, mais claro se torna que não é aqui que estão as questões fulcrais que estão a prejudicar a detecção de criminosos ou a sua submissão aos trâmites da instrução criminal e consequente punição pelos tribunais.
Os problemas estão noutro sítio e o CDS está longe de cuidar dessas questões que vão desde a revisão de legislação até outras aparentemente mais simples.
Por exemplo, é ou não é verdade que hoje é o legislador o principal responsável pelo aumento preocupante da população prisional e pela quota alarmante de presos preventivos?
É ou não é verdade, por exemplo, que a legislação sobre crimes incaucionáveis acarreta a impossibilidade de liberdade provisória para presos que podiam aguardar em liberdade o seu julgamento?
É ou não é verdade que há 38% de detidos preventivos, na sua maioria jovens, nas prisões portuguesas? Isto é uma coisa verdadeiramente espantosa e escandalosa e é um factor criminógeno. Trata-se de jovens e numa percentagem absolutamente impressionante.
E em relação a estes factores criminógenos, não se tomam medidas.
Simultaneamente constata-se a impossibilidade de manutenção de prisão preventiva dos arguidos presos em flagrante delito por crimes a que corresponde processo correccional. Esta situação encontra-se por resolver e provoca a necessidade de libertação de arguidos

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que deviam ficar presos. E em nome disto vêm-se proibir manifestações, tomar medidas de excepção. Ora, é em relação a isto que o projecto de lei do CDS também é indefinido, como, aliás foi confessado em conferência de imprensa, prometendo corrigi-lo, o que não foi feito. Por isso é que dizemos que o CDS corre a foguetes...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para contraprotestar.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, eu não estou aqui a defender a proposta do Governo e muito menos o que não está na proposta e não me interessa nada o que me dizem os Srs. Ministros e o Sr. Vice-Primeiro-Ministro porque não vou votar as suas declarações.
Por isso é que perguntei ontem se o Sr. Ministro da Justiça, depois da sua declaração, tinha depositado algumas alterações ou um novo texto em alternativa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não depositou nada!

O Orador: - O que se vai votar é a proposta e não os discursos do Sr. Ministro da Justiça e da Administração Interna ou as declarações do Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
Agora, se alguém quiser votar as declarações, isso é com eles. Ninguém tem de divulgar o seu voto. Até posso votar o que vou almoçar amanhã aproveitando o ensejo de votar a proposta de lei.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Uma coisa não tem absolutamente nada a ver com a outra.
Agora, a proposta de lei é que eu não vou votar, porque ninguém a defendeu, toda a gente a criticou, inclusive o Sr. Ministro da Justiça.
Quanto ao Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer-lhe que tem feito alguns progressos porque, de tantas vezes dizer que o nosso projecto é uma cópia, parte da comunicação social também já vai na fita e diz que se trata de uma cópia.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não insulte a comunicação social! O Sr. Deputado está a chamar-lhes mentirosos!

O Orador: - Por aí o senhor ganhou. Valeu a pena dizer tantas vezes a mesma mentira. Valeu a pena porque muita gente correu atrás dos foguetes.
Quanto ao outro problema que põe, acompanho-o, mas ele nada tem a ver com a segurança interna. Tem que ver com a criminalidade em geral, com a reforma do Código de Processo Penal que o Sr. Ministro da Justiça já nos prometeu até ao fim do ano.
Mas quanto ao Código de Processo Penal tenho a certeza que ele o trará.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Tem?!...

O Orador: - Traz com certeza porque já está muito avançado.
Naturalmente que o Sr. Ministro não vem defender aqui coisas que defendeu ontem ou anteontem porque conheço os juristas que estão envolvidos nisso e tenho fé que essas pessoas apresentam o seu trabalho até Dezembro.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Olhe. Sr. Deputado, o Sr. Ministro está a ler o jornal!

O Orador: - Alguém há-de tirar louros deste trabalho, seja este Governo ou outro qualquer.
Quanto à segurança interna. V. Ex.ª sabe que para nós o Conselho de Segurança Interna é completamente diferente do que para o Governo. Para o Governo o Conselho é um instrumento normal de defesa da democracia e para nós é um instrumento de excepção para ser aplicado em casos de excepção.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Prescindo. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A História dos povos e no nosso caso, do povo português, está repleta de revoltas de populações oprimidas, economicamente em crise, politicamente marginalizadas e cujas energias criadoras foram violentamente reprimidas pelas elites dirigentes das classes dominantes até, claro está, se chegar a situações insustentáveis em que os primeiros rebentam com os sistemas repressivos - policiais e militares - impostos pelo poder, controlado pelos segundos.
Naturalmente que as revoltas do povo explorado foram sempre precedidas de reuniões clandestinas ou não, de manifestações mais ou menos violentas, resultantes da reacção popular à actuação injusta e sempre brutal das forças ditas de «Ordem interna».
Em Portugal vive-se actualmente uma situação altamente crítica nos planos económico e social.
A «carência alimentar», eufemismo utilizado normalmente por rotundos e anafados cidadãos quando se referem à fome, é já uma constante para largos milhares de portugueses; a saúde é uma lástima; da habitação (sua ausência) nem falar!
O crescente aumento de desemprego, o não menos crescente número de trabalhadores com salários em atraso, a falta de perspectivas de futuro para a juventude, são factores geradores de tensões que nem a vaga de alienação massiva, promovida ou apoiada pelo Governo e pelos aparelhos ideológicos que controla, consegue dissimular e neutralizar.
O controle apertado dos meios de comunicação social estatizados-de todos nós? -evidência, quotidianamente, o ponto a que chegámos no que respeita à manipulação da opinião pública e à «informação» que nos impinge a voz no dono.
O regime de telenovelas em alta rotatividade, as transmissões intensivas de jogos de futebol - às vezes anunciadas em cima da hora e, pura coincidência?, em dias em que têm lugar manifestações de protesto contra a acção governamental - a parcialidade com que são tratadas as notícias referentes à vida política nacional, têm, como único objectivo, tentar desviar a atenção do nosso povo, dos problemas que enfrenta a nível da satisfação das necessidades básicas, e embotar o seu sentido crítico.

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E, apesar disso, as tensões crescem. Nos mercados na hora de comprar. Nos apertos dos transportes públicos, apinhados de gente e cada vê/mais caros. No trabalho, pela incerteza da manutenção do emprego e do recebimento do salário. De um salário cada vez mais curto, que sustenta a família, em meses cada vez mais longos. Desesperantemente longos!
As tensões alastram como mancha de óleo sobre a água. As medidas preconizadas por este governo, com tendências galopantes para a autocracia e surdo ao diálogo, mostram-se insatisfatórias; quando não inexistentes, no que se refere à resolução dos grandes problemas com que o País se debate aos níveis económico e social. No plano político os resultados estão à vista. Preto no branco. 10 anos depois de Abril, 10 anos depois daquela madrugada libertadora, o Governo apresenta-nos esta abencerragem salazarenta que dá pelo nome de Lei da Segurança Interna.
É caso para perguntar por quê chegámos a este ponto: por que razões um Governo de tão apregoadas virtudes democráticas, de um Estado democrático, apresenta um projecto de lei que atenta escandalosamente contra as liberdade democráticas dos cidadãos e das organizações populares?
De facto, Srs. Membros do Governo, reprimir as manifestações com forte aparato policial dá muito nas vistas e confere mau aspecto ao País quando visto do exterior.
De facto, Srs. Membros do Governo, reduzir a participação popular nas manifestações de protesto contra o actual desgoverno do País parece ser a preocupação primeira de quem e justamente criticado, julgado e posto em causa.
Porém, Srs. Membros do Governo, a fome - perdão, as carências alimentares! - o cansaço e mesmo o medo, embora pesem, não chegam para desmotivar os sectores mais inconformistas do nosso povo, não chegam para desarticulara revolta.
Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, apesar dos pesares, o nosso povo cerra os dentes e o clamor das suas críticas, da sua revolta, chega ao outro lado dos «Bunkers» dos gabinetes governamentais e aos ouvidos dos seus responsáveis.
Atingido na sua credibilidade, a que recorre então o Governo?
À utilização, melhor dizendo, à regulamentação da utilização da força bruta e arbitrária. Pelos vistos, a tentação totalitária «Orweliana», versão «1984», afecta até os paladinos da liberdade e da democracia, quando são governo, governam mal, e pretendem garantir o poder a todo o transe. Dir-se-ia que é quase uma necessidade «fisiológica».
Srs. Membros de um Governo dito democrático, de um Estado democrático, para quê criar uma legislação pidesca, que cerceia as liberdades fundamentais do cidadão, quando o Estado dispõe de legislação mais que suficiente para garantir a sua segurança. Vide o que foi possível fazer - no caso das recentes operações policiais que visavam as FP's 25.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pelos vistos parece que se pretende, passo a passo - a passos largos - transformar o País numa sociedade policial.
Polícia de intervenção bem treinada e alimentada, dispondo de óptimos transportes e esplêndidas instalações; aumento dos quadros repressivos; apresentação de legislação permissiva que visa regulamentar as escutas telefónicas, a violação da correspondência, as prisões preventivas, as proibições arbitrárias ao direito de expressão, reunião, manifestação, etc...
Srs. Deputados: de todos os cantos do País chegam-nos moções, gritos de alerta, oriundos dos mais diversos quadrantes políticos, culturais e laborais, para que não deixemos passar nesta Câmara a presente Lei de Segurança Interna.
Estamos ainda a tempo de arrepiar caminho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Portugal não precisa da repressão regulamentada. De um ouvido atento em cada canto; de olhares inquiridores em cada esquina; de dedos delatores em cada gesto; do medo chancelado pela lei.
Portugal precisa, isso sim, que cultivem o seu solo, que se aproveitem racionalmente as suas potencialidade, que se criem condições para que nele se integrem todos os portugueses sem excepção. Para que a tristeza e as rugas da angústia desapareçam do rosto dos jovens, das mulheres e dos homens. Para que milhares e milhares de crianças não tenham de andar mal vestidas e alimentadas, ao deus-dará pelas esquinas da vida aprendendo o abe da marginalidade.
Opções saudáveis de ocupação dos tempos livres, satisfação no ensino, habitação, saúde, alimentação e protecção por parte da sociedade onde tentam sobreviver, o que é isso, onde estão?
Estas leis, estes gastos, estes esforços, deveriam ser canalizados para a resolução dos problemas da criminalidade; mas na sua origem; lá, onde moram a fome, o desespero, a revolta.
Não custa legislar sobre repressão. O que custa é tomar as decisões políticas adequadas, é fazer opções de acordo com as nossas potencialidades e de acordo com as expectativas da maioria da nossa população. Estas opções, não se identificam, de facto, com os interesses das grandes empresas acumuladoras de lucros, sejam elas nacionais ou internacionais.
Apoie-se antes, a iniciativa dos trabalhadores, a sua criatividade e a sua participação nos destinos das empresas. Fomente-se o cooperativismo e a autogestão; avance-se com coragem para o reforço do poder local e para a regionalização, com critérios, que respeitem, os equilíbrios ecológicos regionais.
Sabemos bem que os partidos representados no poder central, pressionados pelos gigantes económicos nacionais e, principalmente, estrangeiros, não o querem fazer, têm medo de ousar e optam pela solução mais fácil a curto prazo, ou seja, pelo recurso aos empréstimos e pela subordinação ao controle externo da nossa economia.
Este governo, apoiado por esta maioria, fez a sua opção. Logicamente, deverá preparar-se para defrontar as consequências económicas e sociais que ela acarreta. Mas ... no mesmo quadro que propiciou a sua constituição!
Alguns, de entre os presentes perguntar-se-ão porque motivo venho eu, que sou ecologista, embrenhar-me neste assunto intrincado que é a segurança interna. Naturalmente, pensam que deveria ficar com os peixinhos, com as flores, com a «Paz e amor», em suma com um certo folclore Hippie belo, poético mas insuficiente! E claro, deixar as polícias regerem a banda da «ordem, da paz e da segurança»... Em paz vigiada e armada!?!? Não obrigado!
Ecologia assim, era antes da década de 1960. Hoje, está mais que assente nos meios ecologistas que é impossível alcançar formas sadias e pacíficas nas relações dos povos, se não se caminhar para uma nova forma de relação entre os homens baseada na co-gestão racional dos recursos da Terra e na cooperação a todos os níveis entre os diversos povos do Mundo.
Investir em armamento, procurar o equilíbrio desequilibrante dos gigantismos seja a nível económico como militar é condenar o futuro próximo deste planeta.
E seus habitantes, é algo que me arrepia e não pode deixar de assustar e entristecer aqueles que reconhecem

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as potencialidades da Terra e do ser humano e analisam as evoluções de ambos.
Mas voltando atrás, os ecologistas efectuam ao longo do ano, calmas e pedagógicas acções de sensibilização das populações para a degradação do seu meio ambiente, tanto rural como urbano.
Porém e frequentemente, registam-se por parte de gestores de unidades fabris e do próprio poder central, acções de prepotência e desrespeito pela lei e pelo direito dos povos viverem num mundo puro e não agressivo.
O recurso a campanhas que assumam um carácter de mobilização popular é um dos últimos recursos das organizações ecologistas.
Essas acções legítimas de protesto, após o esgotamento de outras alternativas (abaixo-assinados, moções, etc.) são encarados pelos governantes atrás descritos como ingerências e, mais, como flagrantes atentados à sua autoridade, à ordem e à segurança das populações que como pais, dizem proteger.
Daí à proibição da reunião, festa, manifestação, etc., é um passinho que pode só não ser dado por pudor ou por não ser momentaneamente conveniente, mas basta qualquer agitação na manifestação, oportunamente ocasionada por grupos que a ela são alheios, para que as «forças da ordem» estrategicamente já colocadas, actuem para restabelecer a paz, só por momentos perturbada por «tenebrosas forças ocultas» como será dito depois com um calmante sorriso artificial pelo locutor de serviço, no pequeno écran.
E pronto! Está justificada a dispersão, pelas forças policiais, da manifestação.
E é por todas estas razões que os ecologistas também dizem não a todo este «Pacote de insegurança».
Porque resumindo, não vem resolver as causas da criminalidade real, permitindo por outro lado, arbitrariedades policiais e repressões políticas às oposições e a todas as formas de reunião e manifestação popular. É de novo o medo de falar ao telefone e não só de expressar publicamente uma posição política, é o incitamento à clandestinidade que arrastará uma complexificação nas relações sociais, culturais e laborais.
Nós «Os Verdes», entendemos que a liberdade e a democracia são sempre necessárias, mas nunca suficientes. Porque são processo. Porque não se esgotam em modelos estabelecidos num dado momento histórico. Porque entendemos que quanto mais repressivo, ou melhor, quanto mais medidas repressivas adoptar um Estado dito democrático, mais frágil se torna a liberdade e em farsa se transforma e democracia.
Nós «Os Verdes», não pactuamos com farsas. E, sinceramente estranharemos se democratas e antifascistas de longa data vierem agora caucionar esta lei.
Porque acreditamos ainda no sentido democrático de uma maioria de deputados desta Câmara, porque o nosso povo assim o exige, esperamos que esta lei não passe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Termino esta intervenção parafraseando Eça de Queiroz: «Este projecto de lei não vai ser derrubado porque não é um edifício. Ele vai ser limpo com benzina porque é uma nódoa!»
Uma mancha no regime democrático e de liberdade, 10 anos depois de Abril.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado António Gonzalez, é de facto verdade que assistimos neste momento a um aumento da instabilidade económica e social no nosso país.
Vários factores de instabilidade contribuem para um desagrado da população em relação à actual política económica e social do Governo. É o desemprego que • aumenta, são os salários em atraso - essa chaga terrível que está a espalhar a fome em vastas zonas do nosso país -, é a inflação e o consequente agravamento do nível de vida da população.
Naturalmente que esta situação não tem a ver nem justifica o terrorismo, mas é uma situação que leva a um agravamento do descontentamento popular em relação a um governo no quo lenta neste momento pôr em prática medidas altamente repressivas e inconstitucionais contra o povo, pondo em causa os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Não acha o Sr. Deputado que numa situação destas, em que os factores de instabilidade económica e social aumentam, era necessário que o Governo, em vez de enveredar por esta via, tomasse um conjunto de medidas preventivas de carácter geral e especial, nomeadamente no campo do combate à criminalidade económica, à corrupção, à especulação, à degradação do ambiente e a tudo aquilo que põe em causa os direitos do consumidor?
Não acha que o Governo devia antes optar por autênticas medida de defesa e protecção do consumidor que defendessem o nível de vida da população e, sobretudo, dos mais carenciados?
Não considera o Sr. Deputado que este deveria ser o caminho de um Governo que estivesse devidamente empenhado na defesa dos direitos, liberdades, garantias e tranquilidade dos cidadãos?
Esta não é a via que o Governo está a seguir, mas não considera o Sr. Deputado que seria esta a via correcta e que, em vez de hoje estarmos aqui a discutir esta lei, deveríamos, pelo contrário, estar a fazer um debate sobre medidas que levassem à melhoria das condições de vida do nosso povo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez, para responder.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, pensei que tinha focado bem a nossa rejeição em relação à canalização dos nossos recursos para uma área como esta quando é preciso atacar os problemas a montante - como referi aqui há dias em perguntas ao Sr. Ministro da Justiça.
Estou perfeitamente de acordo com as suas sugestões. Os delitos económicos, os delitos ao ambiente e os delitos aos direitos do consumidor devem ser atacados nas origens.
Por outro lado, os poucos recursos de que dispomos - e que não são tão poucos como isso - devem ser canalizados para essas áreas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: serei muito breve. Rigorosamente, as minhas palavras não são uma intervenção. Praticamente, tudo está dito a respeito dós diplomas em apreço. A minha declaração é, na verdade, uma declaração de voto.
Segurança e liberdade são valores nucleares da sociedade política. Valores entre si indissociáveis. É para garantir tais valores que, basicamente, existe o Estado.

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E é incontroverso que apenas o Estado os pode garantir de modo eficaz.
Segurança e liberdade são valores que devem ser respeitados. Por consequência, o Estado deve ser respeitado. A democracia tem o direito de exigir que o Estado seja respeitado. Os cidadãos têm o dever genérico de respeitar os órgãos de soberania; é um corolário do respeito devido ao Estado. Os titulares de órgãos de soberania tem o dever especial de respeitar os órgãos de soberania; é um corolário do respeito que, em razão das suas altas funções, certas autoridades públicas devem ao Estado.
A apresentação da insólita proposta n.º 71/III, é um acto que nem desrespeita o Governo, nem desrespeita o Parlamento. Livre é o Governo de propor o que entender conveniente, por mais heterodoxo. Se, formalmente, pressionasse o Parlamento, designadamente no sentido de o coagir a votar uma proposta de lei, desrespeitaria a representação nacional. Mas tal não terá, rigorosa e inequivocamente, ocorrido.
Aproxima-se o momento da votação da proposta que temos discutido. É notório ter sido anunciada a intenção de votar favoravelmente a proposta na generalidade, com o intuito premeditado de, na especialidade, a alterar no essencial. Mesmo que disso não haja consciência, um voto favorável concedido nesse contexto, significará desrespeito pelo Governo.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Porque o voto é um acto formal, não um acto simbólico. Autodesrespeitar-se-á o Governo se porventura aceitar como política e juridicamente eficaz um voto favorável, fundado em manifesta duplicidade política.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Um sim não é idêntico a um não, uma proposta de lei não se confunde com um bloco de folhas, em branco, uma iniciativa legislativa não é equiparável a matéria vaga.
É duvidoso que a rejeição constitua derrota política do Executivo. Mas é certo que a aprovação, nas circunstâncias em que inevitavelmente terá de ser dada - a sê-lo- representa desrespeito pelo Governo como órgão de soberania.
Na qualidade de protagonistas da acção política, alguns membros do Governo poderão não se sentir desrespeitados por tal voto. Poderão mesmo recebê-lo como homenagem. Cada um de nós é livre de avaliar o teor das homenagens que julga ou reconhece merecer.
Todavia, como órgão de soberania da República Portuguesa, o Governo permanece e permanecerá enquanto Portugal for Estado independente e soberano. O Governo é uma instituição que permanece para além dos elencos ministeriais, sucessivamente chamados a exercer funções governativas. Os governantes têm obrigação de não esquecer que o Governo os transcende. Os governantes não dispõem de estatuto especial na determinação do que representa respeito ou desrespeito do Governo. Importa ter presente que o Governo é um corpo político essencial do Estado. Como importa não esquecer que o Estado é de todos os cidadãos.
Independentemente da ponderação das respectivas motivações, os governantes têm obrigação de não esquecer que o Governo os transcende. Tem obrigação de não solicitar da Assembleia um voto desrespeitador do próprio órgão de soberania a que pertencem. Mesmo que haja insistência em pedir-mo, não o darei. Não há forças humanas que me obriguem a desrespeitar um órgão de soberania da nação portuguesa. Por esta singela razão - evidente em meu critério, decerto insubsistente, segundo critérios diversos-, votarei na generalidade contra a proposta n.º 71/III. Se outras faltassem, seria essa, do meu ponto de vista, razão suficiente e definitiva.
O que sumariamente acabo de dizer não é um protesto moral. Decorre apenas da minha sensibilidade política: a consideração de que o prestigio do Estado é um dos valores supremos da política.

Aplausos do CDS, do MDP/CDE, da UEDS. de alguns deputados do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Edmundo Pedro.

O Sr. Edmundo Pedro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de começar, desejaria pedir aos meus colegas que a seguir à minha intervenção, não me dirigissem perguntas, às quais eu não estou em condições de responder, dado o carácter da própria declaração que vou fazer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Justificar-se-á a minha intervenção, ao fim deste prolongado e esclarecedor debate sobre a proposta de lei n.º 71/111, chamada de Segurança Interna e Protecção Civil? Valerá a pena, depois de terem sido trazidas a esta Câmara tão valiosas contribuições para o esclarecimento desta matéria? Não será fazer perder mais tempo ao Parlamento, tanto mais que não tenho a pretensão de trazer a esta riquíssima discussão qualquer elemento novo? Justificar-se-á este gesto individual, ainda por cima à revelia da vontade dos meus camaradas de bancada e com as consequências que, necessariamente, comporta?
Como é compreensível, não deixei de fazer estas perguntas a mim mesmo. Mas a resposta, vinda do mais fundo da minha consciência, impôs-se-me, com uma clareza meridiana: tinha de o fazer, quaisquer que fossem os resultados no plano pessoal.
Em que se estriba, Srs. Deputados, tal imperativo?
Antes de mais e em termos genéricos, em razões de elementar coerência, ditadas por todo um passado remoto e recente e também por motivos de índole política e moral.
Muitos dos deputados que fazem parte desta Assembleia, devotaram uma parte significativa das suas vidas à luta contra o regime salazarista, por meios legais e ilegais, pacíficos e violentos. Alguns fizeram mesmo dessa luta a razão de ser de toda a sua existência. E entre as exigências que, ao longo do tempo, a oposição democrática fez ao regime deposto em Abril de 1974, a mais constante de todas foi, certamente, a de exigir a concretização efectiva do artigo 8.º da Constituição de 1933 - o que passava pela eliminação das disposições que transformavam em letra-morta tudo o que esse articulado estatuía em matéria de direitos, liberdades e garantias individuais.
A Revolução de Abril permitiu concretizar essa aspiração de várias gerações de resistentes, criando as condições indispensáveis para que fosse elaborado e aprovada a Constituição que, revista em 1982, serve de matriz ao ordenamento legal do País - texto que consagrou, finalmente, os direitos, liberdades e garantias individuais, reclamados pela esmagadora maioria dos portugueses há dezenas de anos.
Sabemos, aliás, as dificuldades que os democratas tiveram de enfrentar, mesmo depois do 25 de Abril, para consolidar o regime -nomeadamente as pressões que se exerceram sobre os constituintes e os obstáculos que tiveram de vencer para dotar o País de uma Constituição democrática.

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A ocorrência de tais dificuldades não é, aliás, de somenos importância, pois tem a ver com certas condições específicas que não podem ser menosprezadas
Alguns clamam que somos assaltados, sem razão para tal, por pretensos fantasmas do passado Ora o passado, no plano da limitação dos direitos individuais, foi uma dura, triste e prolongada realidade -e compreende-se portanto que se projecte com força especial naqueles que mais fortemente sentiram as suas consequências Nada há de mais natural Na verdade, o que receamos é que esses alegados fantasmas, reintroduzidos na sociedade portuguesa pela porta do cavalo, assumam, no futuro, o contorno de perigosas realidades- realidades que julgávamos, com a aprovação da Constituição, em 2 de Abril de 1976, ter definitivamente expulso da sociedade portuguesa
É que, Srs Deputados, as pessoas passam e as leis ficam E as marcas do passado continuam, infelizmente, a estar bem vivas no presente. Representa-as uma mentalidade autoritária que se agravou singularmente ao longo de quase meio século de regime salazarista.
Portugal não é, nesse aspecto, nem a Itália - onde o regime fascista durou pouco mais de 20 anos e a democracia se instalou há cerca de quarenta - nem a Alemanha, onde o nazismo durou apenas 13 anos e a democracia existe, desde o fim da última guerra Menos ainda é a França, a Inglaterra e outros países, com século e meio de tradição democrática ininterrupta Portugal saiu de um prolongado regime autoritário há escassos anos
Aliás, a luta sem quartel que fomos obrigados a travar contra o regime salazarista, ao longo de dezenas de anos, e o combate vital, em que nos empenhámos a seguir ao 25 de Abril, para defender e consolidar as instituições nascentes, deve fazer pensar na especificidade do nosso país, quanto as condições de base para o funcionamento de um Estado de direito.
Ora, a rigorosa separação de poderes constitui justamente, quanto a garantias de democraticidade do regime, uma das suas mais importantes traves mestras - talvez a mais significativa no que respeita à defesa dos cidadãos contra os eventuais abusos do poder político
É por isso que certas disposições previstas na proposta de lei, como foi aqui abundantemente discutido, me parecem, nesta perspectiva, extremamente perigosas. É por isso que não posso deixar de manifestar a minha estranheza, por verificar que direitos fundamentais como os do sigilo da correspondência e das comunicações telefónicas, o da privação da liberdade e o da inviolabilidade do domicílio, o direito de manifestação, etc., possam ser postos em causa por meros critérios policiais, tutelados pelo poder político e ao sabor, portanto, do contexto variável em que se exerce
Não é por acaso que no nosso país - ao contrário do que aconteceu noutros países do ocidente da Europa onde, após a última guerra, se estabeleceram regimes democráticos - não é por acaso, repito, que se assistiu entre nós à tentativa de impor, logo após a queda do regime, um novo modelo autoritário Só a educação cívica, com o tempo, poderá alterar este condicionalismo negativo
E e por isso que, para além das razões de princípio, esta lei é extremamente perigosa - e não tem em conta, ela sim, o país real que nos somos, a sociedade concreta que edificámos E é também por essa razão que as comparações com outros países europeus são, infelizmente, carecidas de sentido A triste verdade é que se justificam plenamente, entre nós, cautelas especiais, pois a tentação autoritária espreita-nos de todos os lados
Perante tais e tão iniludíveis circunstâncias, a rigorosa defesa dos princípios democráticos parece ser a única base segura para a defesa do regime contra todos os seus inimigos.
Sr Presidente, Srs Ministros, Srs Deputados: Não faço processos de intenção a quem quer que seja e muito menos a pessoas que conhecemos As pessoas que apresentaram a proposta de lei merecem-me, aliás, toda a confiança, porque conheço as suas convicções democráticas e não duvido de que farão da lei, quando aprovada, depois de eliminados os aspectos reconhecidamente indesejáveis, um uso que reflicta as preocupações aqui abundantemente manifestadas por todos os sectores desta Assembleia
A verdade é que as leis estabelecem normas imperativas, ou seja, proporcionam um quadro de referência unívoco, com um único sentido claro e preciso - insusceptíveis, portanto, de serem aplicadas de modo variável, conforme os interesses ou a personalidade de quem as executa Mas todos sabemos quanto isso é uma ficção. A mesma lei, desde que contenha alguma margem de ambiguidade e de falta de rigor (e neste caso falta de rigor constítucional), pode dar lugar às mais diversas práticas, consoante a formação dos agentes que a transformam em actos E a nossa tradição recente, alicerçada em dezenas de anos de prática, faz-me recear, para retomar o fio das minhas preocupações, as mais pesadas consequências nesta matéria

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, Srs Ministros Desejo declarar que dou o meu acordo, sem ambiguidades, a uma Lei de Segurança que integre e racionalize os recursos vocacionados para essa tarefa Mas a própria natureza do desafio terrorista impõe os maiores cuidados quanto ao modo e aos meios de o combater e, sobretudo, a rigorosa conformação desses meios com as disposições constitucionais Sem pretender teorizar sobre o fenómeno do terrorismo, de inspiração esquerdista, permitir-me-ia observar que o recurso à violência política é assumido por pseudovanguardas que, independentemente das intenções subjectivas de alguns dos seus autores, acabam por assumir um carácter marcadamente reaccionário, já que fazem o jogo das forças interessadas na liquidação dos direitos democráticos que constituem, em muitos casos, conquistas populares amassadas em sacrifícios sem conta

O Sr César Oliveira (UEDS) - Muito bem!

O Orador: - Os seus agentes baseiam a legitimidade da sua acção na alegada incapacidade de resposta dos trabalhadores e da classe operária em particular à ofensiva do capital e no invocado carácter de classe do aparelho de Estado Nesse pressuposto, constituem-se em «vanguarda revolucionária» e atribuem-se, no desencadeamento das suas acções, uma representatividade que não têm - fazendo correr, àqueles que dizem defender e representar, os maiores riscos
A base da fundamentação teórica desse tipo de violência política, consiste, pois, no argumento de que ao alegado terrorismo de Estado, para o qual a classe operária e os explorados em geral não teriam capacidade de resposta, há que ripostar com a acção violenta da sua vanguarda mais consciente e determinada, a funcionar como um deus vingador, com legitimidade imanente, que dispensa consultas aos interessados, em nomes dos quais actua, e aos quais atribui, de resto, um estatuto de menoridade mental.
Ora, todos os verdadeiros democratas sabem a que resultados práticos, do ponto de vista dos cidadãos em geral e dos trabalhadores em particular, conduz esta teoria Todos sabemos, à luz da prática social e política contemporânea, como a classe operária, em nome de cujos interesses são assumidas tais posições, tem sido a

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primeira vítima destes deuses vingadores, cuja acção concreta tem contribuído, não poucas vezes, para que lhe sejam retiradas todas as chamadas liberdades formais, ou seja, todos os direitos, liberdades e garantias que tem constituído, até agora, o seu único e verdadeiro bastião defensivo contra todos os seus inimigos e que devem constituir uma conquista histórica e irreversível das sociedades modernas.
Por isso a luta contra a violência política de inspiração esquerdista não terá pleno êxito se limitada à destruição das suas estruturas organizativas. Tal luta não pode nem deve esquecer as realidades humanas, em nome das quais ela é preconizada ou proposta como veículo de libertação. Tem de desenvolver-se ao nível político e cultural. Deve empenhar-se frontalmente no plano ideológico, percorrendo os contraditórios refúgios onde se fundamenta a base teórica do projecto revolucionário violento contra a democracia. Temos desmistificar o núcleo de ideias onde se inspira o sentido mítico e místico da sua intervenção, que engana, não poucas vezes, os seus próprios agentes.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Temos que reduzi-los, através desse combate de ideias, àquilo que efectivamente são: por via de regra, filhos de gente bem instalada na vida, que invocam, para exorcizar os seus complexos burgueses, razões justas para as suas acções, mas cuja resultante, a médio prazo, é a limitação das liberdades individuais e, a longo prazo, qualquer que seja o fim do impasse e da inviabilidade social a que conduzem (assumido pela extrema-direita ou pela extrema-esquerda, tanto faz), a longo prazo, dizia, implica a liquidação de todas as liberdades e garantias individuais, pelas quais lutámos durante infindáveis anos, e que afectam, em primeiro lugar os trabalhadores. Não queremos voltar ciclicamente ao princípio.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, como militante de origem operária, ligado historicamente a significativas lutas, pela sua autodeterminação, que tem reflectido apaixonadamente sobre estes problemas -e os tem vivido, aliás, com a mesma intensidade- e como militante e deputado, nesta Assembleia, do Partido Socialista - partido cuja base social de apoio é constituída, maioritariamente, por trabalhadores assalariados- não posso deixar de me preocupar profundamente com estas questões vitais para o futuro da democracia.
A resposta política aos terroristas, do ponto de vista da classe cuja representação abusivamente assumem, passa pela defesa intransigente dos direitos e liberdades constitucionais, que permitam ao movimento operário o seu reforço e participação, em termos responsáveis, na vida política do País. Porque a única perspectiva realista, que corresponde à experiência dos países industriais avançados, não é, ao contrário do que afirma a «vanguarda revolucionária», a conquista do poder pelos operários, mas sim a pressão sobre o poder, exercida, antes de mais, pelo movimento sindical. Influenciar o poder e não conquistá-lo -o que nunca aconteceu nem acontecerá -, discutir as suas decisões e os respectivos reflexos ao nível dos seus interesses, responsavelmente assumidos, eis o que só é possível defendendo intransigentemente o espaço da liberdade indispensável à expressão organizada do movimento operário, que tem de apostar no regime democrático -único que lhe garante um desenvolvimento autónomo, livre a responsável - o que implica, necessariamente, que o Partido Socialista assuma o seu dever histórico de proteger, a todo o custo, essa área de liberdade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Foi a profunda consciência dessa missão que inspirou a luta dos socialistas, a seguir ao 25 de Abril, pela defesa e consolidação dos direitos democráticos. E é inaceitável para os socialistas que a bandeira das liberdades -que, junto com outros democratas, intransigentemente defenderam- passe para as mãos daqueles que consideram as liberdades e garantias individuais em termos meramente instrumentais e não essenciais, isto é, não como um fim - e dos mais importantes do regime democrático - mas com um simples meio, para mais facilmente, liquidarem as próprias liberdades.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - A coerência, a credibilidade e a legitimidade do duro combate que temos travado pela legalidade democrática, contra todos os seus adversários, impõe-nos, pois, que exijamos a absoluta conformação do poder com todos os imperativos constitucionais.
O regime democrático não pode ser defendido por processos de duvidosa constitucionalidade. A democracia não pode ser acautelada recorrendo a processos que, mesmo remotamente, tenham a ver com os dos seus inimigos, sob pena de perder o seu mais válido suporte, ou seja, a base moral e política de onde dimana a sua força, que acabará, estou certo, por vencer o totalitarismo de todos os matizes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Aplaudi e apoio os esforços da direcção do meu grupo parlamentar, para expurgar a proposta de lei dos seus aspectos controversos, de modo a chegar, finalmente, à formação de um texto que mereça o máximo de consenso possível. Mas ligado à resistência ao antigo regime durante mais de meio século e tendo tido especiais responsabilidades, no âmbito do meu partido, como é do domínio público, na organização da resistência, após o 25 de Abril, ao desvio extremista da Revolução, justamente em nome das liberdades e garantias constitucionais, não me é possível, por óbvias razões de coerência, dar o meu apoio a um texto de mais que duvidosa constitucionalidade - projecto que é repudiado, aliás, como se tornou evidente, pela parte mais activa, do ponto de vista da consciência social, da sociedade portuguesa.

O Sr. Fernando Costa (CDS): - Essa agora?!

O Orador: - É para mim inaceitável aprovar um texto cuja filosofia essencial e cujo intuito globalizante enfraquecem as bases políticas e morais do nosso combate ao terrorismo e a todas as formas de tentação totalitária que espreitam a sociedade portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Há momentos na vida, em que a voz da nossa consciência se sobrepõe a qualquer outra consideração - momentos em que sentimos o dever de nos assumir em face de nós próprios. E este, encarando retrospectivamente toda a minha existência, é, sem sombra de dúvida, um desses momentos.
Estou habituado a assumir as responsabilidades e a sofrer-lhe as consequências. Fi-lo em vários momentos da minha vida, com os mais graves resultados pessoais. Nalguns casos, perante o estranho distanciamento de quem se escusou a partilhar responsabilidades efectivas. Mas nem isso alterou o meu sentido do dever e o meu respeito por mim próprio. Sou um militante político e não um profissional da política. A minha militância tem decorrido sempre sob o signo da incomodidade e do risco, porque a única coisa que busquei, ao longo do tempo, foi a minha realização moral e cívica. Essa é

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para mim, de resto, a única justificação para a actividade política. E não era agora, quase no fim da minha vida, que iria adoptar uma outra norma de conduta.
De qualquer maneira, e para terminar, faço votos para que as limitações às liberdades, impostas em certos casos, rigorosamente delimitados e precisos pelas autoridades constitucionalmente competentes, não ponham nunca em causa a liberdade que usufruímos e que foi tão dolorosamente alcançada.

Aplausos do MDP/CDE, da UEDS e de algum deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados tenho o prazer de vos anunciar que se encontram na Tribuna do Corpo Diplomático alguns Srs. Deputados do Parlamento brasileiro.
Apresento-lhes os meus cumprimentos e faço votos de que levem daqui, do Parlamento e do País, as melhores recordações.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Estava agora inscrito, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, que não vejo na bancada.
Para uma intervenção, tem então a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Tudo ou quase tudo já foi dito sobre o conteúdo da Proposta de Lei de Segurança Interna e Protecção Civil. Limitar-me-ei a tratar, por isso apenas alguns aspectos que, envolventes da proposta de lei e da discussão já realizada, requerem, a meu ver, adequado esclarecimento.
Esta proposta de lei, como já tem sido afirmado nesta Câmara, é a terceira versão de um diploma que andou em bolandas entre o Conselho de Ministros e os Gabinetes Ministeriais. Muito tempo antes de os deputados lhe conhecerem o texto, já a imprensa havia divulgado algum do seu conteúdo. A polémica suscitada começou muito antes do início da sua discussão neste hemiciclo. Mal o seu texto foi reconhecido e se esboçou aqui a sua discussão, logo começaram as demarcações em relação ao seu conteúdo. No entanto e apesar das demarcações de uns, do silêncio acusador de outros e dos apelos vindos de quadrantes muito diversos, para que fosse poupado aos deputados o sacrifício de ter de votar um diploma que todos reconheceram carecer de profundas alterações, o Governo persistiu, obstinado, em torno de um texto que ninguém aceita como razoável. Porquê esta obstinação? Porquê esta intransigência em manter um texto que se sabe causador de problemas, de clivagens e de conflitos quando houve, já no decurso deste debate e por várias vezes, a oportunidade de emendar a mão e criar condições para a produção de uma Lei de Segurança Interna que não ficasse marcada, como inevitavelmente vai acontecer, pelo ferrete dos normativos da proposta do Governo?
Ao fim de várias horas de debate, ainda não encontrámos respostas a estas interrogações. Será que se pretende - como num vulgar negócio entre gente astuta e manhosa- pedir 1000 para vender por 50? Será que permanecendo o Governo obstinado, consegue conquistar, com a aprovação na generalidade do seu próprio texto, uma base negocial, que poderá sempre permanecer de pé se não houver acordo na elaboração de alternativas às disposições que mais se criticam?
Há dias, o Sr. Deputado Manuel Alegre perguntou ao Sr. Ministro da Administração Interna se esta proposta de lei não seria uma armadilha ou uma cilada.
Esta pergunta não foi respondida. No entanto, o percurso já realizado deste debate permite tirar algumas ilações que são, sem sombra de dúvida, um começo de resposta à pergunta do Sr. Deputado Manuel Alegre. Na verdade, é importante que se faça a leitura política das evidentes conexões entre as intervenções do Sr. Ministro Rui Macheie e do Sr. Deputado Ângelo Correia. Todos temos também presentes estas intervenções e poderemos, sem qualquer esforço, concluir que:

a) O Partido Socialista ficou, por força daquelas intervenções, inteiramente responsabilizado pela proposta de lei;
b) O Sr. Ministro Rui Macheie erigiu-se pela sua própria mão e pelos fortes impulsos recebidos do Sr. Deputado Ângelo Correia, no Ministro flexível, no homem que vem assumir publicamente os compromissos reclamados pela maioria de apoio ao Governo;
c) O Sr. Ministro da Administração Interna foi crucificado pela operação combinada das intervenções do Sr. Dr. Rui Macheie e do Sr. Deputado Ângelo Correia e transformado, pela dialéctica habilidosa e pela retórica do Sr. Deputado Ângelo Correia, no protótipo do Ministro intransigente. Reconheça-se, pelo menos, que o Eng. Eduardo Pereira, ao contrário do Dr. Rui Macheie, deu a cara na defesa da proposta de lei de que, como o Sr. Ministro da Justiça, foi um dos subscritores. Já no debate sobre a moção de confiança, tive a oportunidade de afirmar que o posicionamento do PSD e a formulação das famosas reivindicações estruturais do não menos famoso Prof. Mota Pinto (que pelos vistos deve andar atarefadíssimo à procura das chaves do seu próprio carro para regressar a Pombal) visava fazer pagar ao seu parceiro de coligação a impopularidade da acção governativa. A táctica seguida, nas semanas que precederam o debate, sobre a moção de confiança, foi reeditada aqui na operação protagonizada por Machete Ângelo Correia. Aliás, o PSD vem repetindo, ao longo dos anos, este número que já não deveria enganar mais ninguém.
Sr. Deputado Manuel Alegre, se esta proposta de lei não foi, desde a sua gestação, pensada como uma armadilha, a verdade é que o debate já realizado nesta Câmara transformou-a, de facto, numa cilada, armada pelo PSD ao Partido Socialista.

Vozes de protesto do PSD.

O Orador: - Depois protestam, se quiserem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não diga disparates!

O Orador: - Não se excite, Sr. Deputado Manuel Moreira, não se excite! Está excitado?! ...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não diga disparates!

O Orador: - Não diga que é disparate! Prove que é disparate!

Mas tenha calma, não se excite! Não fique vermelhinho, calma. O senhor é laranja, não é vermelho ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César Oliveira, agradeço o favor de não estabelecer diálogo.

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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já tive oportunidade de citar, durante este debate, Winston Churchill: «A democracia é o pior dos sistemas. No entanto, todos os outros são piores.»

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Isso é uma citação muito ordinária!

O Sr. Cosia Andrade (PSD): - Não era bem assim!

O Orador: - Em matéria de citações, sobretudo sociais-democratas, o PSD era melhor estar caladinho e não abrir o bico neste debate.
Pese o facto deste debate, em muitos momentos, se ter caracterizado por um certo surrealismo, não restam dúvidas de que a democracia acabou por sair vitoriosa deste debate. Na verdade, a proposta de lei apresentada pelo Governo, permitiu que nesta Câmara fossem tratados problemas essenciais, concernentes à liberdade e à segurança dos cidadãos. E a discussão realizada demonstrou, inequivocamente, que a democracia só pode defender-se pelo reforço da democracia, que não há liberdade possível no pais quando no Parlamento não houver a possibilidade de cada deputado dizer o que pensa e exprimir, sem peias, as suas preocupações.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Este debate tem sido longo e desgastante. Alguns Srs. Deputados manifestaram, por diversas vezes, a sua irritação pelo uso pleno dos direitos regimentais. No entanto, cabe afirmar que o uso desses direitos regimentais constituiu a prova provada de que qualquer outra prática parlamentar seria sempre redutora da democracia e da liberdade.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A destruição das prerrogativas e dos direitos regimentais será sempre, e em qualquer caso, o começo do fim da nossa democracia.

Aplausos da UEDS.

Há anos, assisti em Coimbra, a uma representação do Tartufo de Moliére. O chefe dos guardas, virado para o público, no final, dizia: «Este nosso Governo é bom e é justo. O que é preciso é que os cidadãos sejam calados e obedientes.»

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE: - Muito bem!

O Orador: - Este debate demonstrou também que, felizmente, há cidadãos, e que, felizmente, há deputados que não são calados e não são obedientes.

Uma Voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por ter sido assim, fica mais rica a democracia portuguesa e provou-se a utilidade da instituição parlamentar. A Lei de Segurança Interna não será já a Lei de Segurança Interna, tal como foi proposta pelo Governo.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos, dentro em pouco, votar. O objecto da nossa votação é, pese tudo o que se disse, o texto que nos foi enviado pelo Governo. É esse texto que ficará aprovado até terminarem os trabalhos em especialidade e perante o seu conteúdo não pode haver posições marcadas por qualquer ambiguidade. Por outro lado, cumpre assinalar que a obstinação e irredutibilidade do Governo em manter um texto e uma proposta que todos condenam, irá traduzir-se numa vitória aparente. Vitória aparente, porque todos sabem já que este conteúdo da proposta de lei do Governo irá ser derrotado na especialidade. Por isto, esta aparente vitória do Governo não releva de uma posição de força. Só a consciência da fraqueza pode permitir que o Governo considere uma vitória a aprovação de um texto que, a acreditar na maioria, irá ser corripletamente reformulado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Disse um poeta presente nesta Câmara: «Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não.» Aconteça o que acontecer, seja qual for o texto final da Lei de Segurança Interna, a verdade é que, apesar da votação favorável que irá receber a proposta do governo, aqueles que acabarão por vencer, serão os que souberem resistir, serão os que souberem dizer não.
Disse.

Aplausos da UEDS, do PCP, do MDP/CDE, de alguns deputados do PS e do PSD, do Sr. Deputado Magalhães Mota, da ASDI e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez.

O Sr, Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para fazer pedidos de esclarecimento ou protestos, os Srs. Deputados Ângelo Correia, Manuel Alegre, José Manuel Mendes, José Magalhães, Jorge Lemos, Carlos Brito e José Vitorino.

Pausa.

Fica assinalado que os Srs. Deputados Ângelo Correia e José Vitorino se inscreveram para protestar.
Estes Srs. Deputados ficam com a palavra reservada, pois chegámos ao termo dos nossos trabalhos, nesta primeira parte, para recomeçarmos às 22 horas.
Está suspensa a sessão.

Eram 20 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 22 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Para um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado César Oliveira, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Deputado César de Oliveira, V. Ex.ª fez uma declaração política sobre a lei de segurança interna que é impertinente, que é politicamente errada e que justifica o nosso protesto.
O PSD aceitou fazer um acordo político com o Partido Socialista para resolver dois problemas que considerámos importantes: primeiro, atacar uma situação financeira difícil; segundo, criar as condições para, através de uma maioria de dois terços necessária, proceder às transformações de que o Estado e a sociedade careciam e que só essa maioria permitiria desbloquear.
Esses factores mantém-se, são importantes, são relevantes e justificam a nossa permanência no Governo, justificando, também, que em cada momento seja expressada a fracção da consciência nacional que em nós depositou o seu voto, na defesa desses mesmos interesses, de acordo com um ideário social-democrata.
É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que nesta votação e neste debate a Lei de Segurança Interna, o

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Partido Social-Democrata tinha presente duas condições uma nacional, no sentido de tentar projectar as necessidades de segurança interna, organização das forças policiais e combate ao terrorismo, movidas no quadro do sistema democrático sem dele abdicar, outra institucional, para fazer com que este Parlamento se prestigiasse não fosse uma mera correia de transmissão onde o mecanismo ou o automatismo político desvirtuassem o sentido da dignidade institucional deste orgão de soberania
E por isso que, nesta sede, nesta instância, dissemos o que pensamos a fim de corrigir a substância do diploma
É incorrecta, inadequada e injusta qualquer tentativa para encontrar uma divisão neste domínio entre os dois partidos que compõem a coligação ou qualquer tentativa de isolamento de quem quer que seja
Sr Presidente, Srs Deputados Pelo contrário, sentimos que era uma acção de prestigiar e reforçar a coligação, tentar encontrar as melhores formas que, na pratica consubstanciassem o seu programa e a intenção política que presidiu a esta intervenção e a esta lei.

O Sr Presidente: - Terminou o seu tempo. Sr Deputado, que e inultrapassável segundo decisão da Assembleia

O Sr Ângelo Correia (PSD) - Sr Presidente, muito obrigado pelo critério que V. Ex.ª nos atribuiu

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - O critério não foi aplicado por mim, foi reclamado por diversas bancadas, particularmente pela sua

Voz do PCP: - Particularmente pela sua!

O Sr Ângelo Correia (PSD) - Aceito a explicação de V. Ex.ª e desejo que ela seja perfilhada para sempre, em toda esta noite

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado César Oliveira

O Sr César Oliveira (UEDS) - Sr Presidente, pretendo responder imediatamente ao Sr Deputado Ângelo Correia
Começo por dizer que agradeço muito que V. Ex.ª me aplique, rigorosa e impiedosamente, o critério que utilizou para o Sr Deputado Ângelo Correia, que eu de certo não protestarei

Aplausos do CDS

Queria, em primeiro lugar, pedir desculpa ao Sr Deputado Manuel Moreira e a bancada do PSD, garantindo-lhes que não houve, aquando da minha intervenção, qualquer espécie de melindre da minha parte, mas apenas e lamentavelmente, talvez devido ao cansaço, o esquecimento do Moreira a juntar ao Manuel
O Sr Deputado Ângelo Correia, V. Ex.ª fez anteontem uma intervenção. Ora é minha obrigação, como deputado, fazer a respectiva leitura política V. Ex.ª vem agora, emendar a mira e a alça tentando rectificar o tiro, pois não o conseguiu fazer na sua primeira atiradela nesta Assembleia.

Risos

O problema e seu não e meu.
Repito que V. Ex.ª fez anteontem, se a memória me não falha, uma intervenção de qualidade com a qual até estou muito de acordo, o que não me impede de tirar as ilações políticas que a sua declaração teve nesta Câmara
E tanto assim e que V. Ex.ª não ousou ter, agora, uma palavra de solidariedade para com o seu Ministro da Administração Interna, visto que V. Ex.ª o apoia como membro integrante da coligação

O Sr Vasco Miguel (PSD) - Ora toma .Estas a ver, que inteligência!

O Sr Presidente: - O Sr Deputado Ângelo Correia deseja a palavra para que efeito?

O Sr Ângelo Correia (PSD) - Para exercer o direito de defesa. Sr Presidente

O Sr Presidente: - Faça favor. Sr Deputado

O Sr Ângelo Correia (PSD) - Pretendo corrigir duas afirmações do Sr Deputado César Oliveira A intervenção que fiz foi no sentido de explicar o ponto de vista do Partido Social-Democrata em relação a uma proposta de lei.
Não tem qualquer sentido ter uma mira especifica em relação a quem quer que seja, muito menos ao Partido Socialista
Em relação a segunda questão que levantou, relativamente ao Sr Eng. Eduardo Pereira, Ministro da Administração Interna O Sr Deputado César Oliveira, em relação a mim, não poderá dizê-lo, visto que fui, talvez, o único deputado que, nos períodos de perguntas imediatamente a seguir a intervenção do Sr Ministro Eduardo Pereira com ele me solidarizei, independentemente do conteúdo político da referida intervenção, com o sentido humano e a solidariedade natural que lhe era devida, perante alguns enxovalhamentos que nesta Câmara lhe estavam a ser injustamente feitos.
Estas duas correcções anulam o protesto de V. Ex.ª

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado César Oliveira

O Sr César Oliveira (UEDS) -Muito rapidamente, não gastarei o tempo que me e destinado.
Ainda bem que V. Ex.ª, Sr Deputado Ângelo Correia, reiterou que a posição oficial do PSD, foi aquela que V. Ex.ª exprimiu, o que só vem dar razão à minha declaração quando falei de ciladas e armadilhas.

O Sr Presidente: - Para que efeito pede a palavra o Sr Deputado José Vitorino?

O Sr José Vitorino (PSD) - Para um protesto. Sr Presidente Já me tinha inscrito

O Sr Presidente: - Sr Deputado, diz-me a Mesa que V. Ex.ª esta realmente inscrito para um protesto mas esta no fim da lista, isto e, há vários pedidos de esclarecimento pelo meio

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O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, eu pretendo protestar contra a intervenção do Sr. Deputado César Oliveira, pelo que terei de falar agora.

O Sr. Presidente: - Então faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Deputado César Oliveira, o problema que se põe é que, para além das referências que o Sr. Deputado fez em relação ao debate que se tem suscitado sobre a lei de segurança interna, de um modo geral, proeurou atribuir ao Partido Social-Democrata uma atitude de golpe e contragolpe, eventualmente até, de deslealdade face à coligação.
O Partido Social-Democrata este nesta coligação de forma voluntária e daí que assuma todos os seus dividendos e eventuais custos, na exacta medida em que é parceiro da coligação.
Não fazemos armadilhas nem estamos com um pé dentro e um pé fora da coligação. Naturalmente que, em problemas mais complexos, há posições por vezes diferentes. Mas isso não põe em causa o essencial nem constitui motivo para procurarmos enfraquecer o parceiro da coligação. Se o tentássemos fazer seria enfraquecermo-nos a nós próprios, porque somos co-responsáveis perante o País por essa mesma coligação.
O que tem aqui ficado sempre bem claro é que os órgãos do Partido Social-Democrata, e sublinho esta posição, no essencial, têm manifestado sempre a sua solidariedade e o seu empenho, designadamente, a direcção do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, especialmente aquando da discussão de confiança que o Sr. Deputado aqui referiu.
Há solidariedade, há lealdade, é nesse caminho que continuaremos e é apenas nessa perspectiva que se justifica a continuação de coligação. A coligação continua, pois, a justificar-se.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira, uma vez que deseja responder.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado José Vitorino, é exacto que eu assumo inteiramente -e reafirmo- que o posicionamento do PSD é uma táctica de golpe e de contragolpe.
A V. Ex.ª compete dizer que não é. A análise das posições e da evolução das situações dirá se a sua táctica foi de golpe ou de contragolpe.

Risos do CDS.

Eu estou convencido de que foi as duas coisas: de golpe e de contragolpe.
Admito que os órgãos do PSD manifestem a sua solidariedade, mas estranho que o Sr. Deputado não venha falar nas cinco famosíssimas reivindicações estruturais do não menos famosíssimo Sr. Prof. Mota Pinto, apagador de velas no Dia do Exército,...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Mau pagador!

O Orador: - ...que já deve andar - desculpe, é o que vem no jornal, Sr. Deputado Manuel Moreira, é o que vem no jornal - com a chave na mão à procura do carro ou o carro à procura das chaves, nunca se sabe bem.
A solidariedade, sim senhor, isso é um problema interno do PSD, com o qual eu não tenho nada a ver. Tenho a ver é com a leitura política das posições do PSD. Disso não abdico.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, para que efeito pede a palavra?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Pretendo exercer o direito de defesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Naturalmente que se o Sr. Deputado não tem nada a ver com as posições do PSD, obviamente que também acho que não deveria fazer processo de intenção em relação ao comportamento do PSD.
Parece que haveria aqui uma certa lógica de comportamento se actuasse desta forma e não daquela como actua.
Em relação às cinco reivindicações do Prof. Mota Pinto, não são reivindicações do Sr. Prof. Mota Pinto, são as posições de fundo que o Partido Social-Democrata sempre tem defendido face à sociedade portuguesa. Fizemo-lo quando se formou a coligação, continuamos a fazê-lo, é um direito que nos assiste, tal como cabe ao Partido Socialista defender as posições programáticas e de projecto de sociedade que sempre defendeu.
E nesta dialéctica, é neste debate, neste conceito permanente que a coligação se vai vivificando e na nossa perspectiva irá concretizando e resolvendo os problemas da sociedade portuguesa.
Em relação às questões referentes ao Prof. Mota Pinto, de lhe pôr o epíteto de apagador de velas, naturalmente, Sr. Deputado, que isso não é próprio de um deputado, não é próprio desta Assembleia da República. Uma notícia, conforme vem transcrita no jornal, é uma notícia e dar, a partir daí, um epíteto a um dirigente de um partido, a um Vice-Primeiro-Ministro, não serve a democracia nem serve este Parlamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Eu, de facto, emendo a mão; não é apagador porque não conseguiu apagá-las.
Sr. Deputado, afinal é muito pior do que aquilo que eu julgava. É que as cinco reivindicações não são apenas do Prof. Mota Pinto, são também do PSD.
Bem, o problema é vosso!
O Sr. Deputado disse há pouco que estava na coligação para recolher os dividendos e pagar os custos.
É isso? É a sua táctica?
Os senhores estão na coligação a colher dividendos e a pagar os custos e a obrigar o PS a pagar os custos e a recolher os dividendos, que é algo de diferente do posicionamento que eu entendo que deveria ter um parceiro de coligação.

O Sr. Rocha Almeida (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Rocha Almeida!

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado Rocha de Almeida, mas hoje estou mau para nomes e ia metendo água outra vez.

O Sr. Rocha Almeida (PSD): - Muito obrigado, Sr. Deputado César Oliveira.
Era só para o chamar a atenção para uma coisa que não dá para entender. V. Ex.ª hoje iniciou os nossos trabalhos verberando aquilo que vinha escrito num jornal. Agora, porque o jornal lhe serviu, já esse jornal e o que nele está dito é bom.

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O Orador: - Eu não digo que o jornal é bom ou mau. Admito até que a notícia seja incorrecta.

O Sr. Rocha Almeida (PSD): - Mas eu quis dizer que V. Ex.ª não foi tão bom quanto devia ser, servindo-se agora do jornal.

O Orador: - Mas não era o mesmo. Aquele era o Ecos de Sor, este é o Diário de Notícias que é um órgão prestigiado.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Deputado César Oliveira, começo por lhe agradecer as referências que teve a amabilidade e amizade de me fazer. Pertencemos à mesma geração, travámos os mesmos combates, sonhámos os mesmos sonhos, tivemos as mesmas ilusões e desilusões e creio que temos a mesma esperança.
Penso, aliás, que é significativo que a maior parte dos deputados da nossa geração, desde o deputado Nogueira de Brito até ao deputado António Taborda, passando por nós, tenham sobre esta matéria a mesma posição. Tem um significado cívico, político e cultural.
Há, no entanto, um ponto na sua intervenção com o qual eu não estou de acordo e a esse me refiro. É a afirmação feita pelo Sr. Deputado de que esta proposta de lei é uma armadilha feita pelo PSD ao Partido Socialista.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não estou de acordo com isso.
Julgo que as intervenções do Sr. Deputado Ângelo Correia e do Sr. Ministro Rui Machete, foram significantes e significativas.
Penso, por isso, que se esta proposta de lei não for substancialmente alterada teremos todos sido vítimas, de facto, de uma cilada e de uma armadilha. Não é só o Partido Socialista, mas o PSD e mais: o Governo que a propôs e que a apresentou, todos aqueles que a votaram e de uma maneira geral, e isso é que é mais grave, a democracia portuguesa.

Aplausos de alguns deputados do PS, de alguns deputados do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, há mais inscrições, mas se deseja já responder, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Agradeço ao Sr. Deputado Manuel Alegre - meu querido amigo, companheiro e camarada de há muitos anos - as palavras que entendeu referir-me. Não tenho nenhum comentário a fazer ao seu pedido de esclarecimento. Cada um poderá ter as suas ópticas diferentes, que não deixaremos nunca de ser camaradas, companheiros e amigos.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado César Oliveira, na intervenção que proferiu, teve a oportunidade de escalpelizar a proposta de lei governamental e de sinalizar os perigos que redundariam para a democracia da sua eventual aprovação. Gostaria de ouvi-lo sobre uma das coordenadas centrais que o Governo pretende colocar como enformadora de todo o articulado. É a velha e revelha questão da ordem.
Para alguns dos Srs. Deputados, de formação mais liberal, talvez valesse a pena lembrar-lhes José Estevão que, no Parlamento do seu tempo, dizia: «Ordem - palavra mágica que faz bravejar aqueles que mais vezes a pronunciam.»
Para os outros, para os que nos reclamamos de uma leitura mais correcta, menos perfunctória, de uma qualquer disposição legal, impõe-se a análise num outro ângulo. Daí que pergunte que ordem é essa que se pretende contrabandear contra as disposições constitucionais no tocante aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos? Onde podemos chegar se, de modo inavisado ou cúmplice, formos atrás dessa retórica bafienta da ordem?
Finalmente, até que ponto, explorando o comércio do medo - como tenho aqui reiteradamente afirmado -, o Governo não pretende, apelando a formulações deste tipo, erguer um edifício repressivo, constritório, de tal modo brutal que permitiria a erradicação de muito do que é o adquirido democrático da Revolução de Abril?
Suponho que não há nenhum exagero, nenhuma judicação excessiva no que acabo de defender. Era importante que, no plano dos conceitos, como no plano da abordagem política, o Sr. Deputado César Oliveira pudesse dar-nos o contributo do seu pensamento relativamente a estes problemas.

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª deseja já responder, tem a palavra.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Exacto, Sr. Presidente.
Gostaria de começar por agradecer duas coisas ao Sr. Deputado José Manuel Mendes: as palavras que quis dirigir à minha intervenção e o facto de no seu pedido de esclarecimento ter usado palavras que percebi perfeitamente....

Risos.

Dizia um filósofo personalista - Emmanuel Mounier, se a memória não me falha -: «Que quando a desordem se torna ordem, uma atitude se impõe». É isso que está a acontecer nesta Câmara.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Não sabia que citavas Mounier!...

O Orador: - Cito! E também Bernstein Kautsky e outros, que não vejo muito citados por essa bancada! Não vejo, não vejo... Aliás, se o Bernstein vos ouvisse na tumba, os ossos dele estariam completamente revolvidos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Temos que citar o Fernando Condesso, que é o grande filósofo social-democrata!

O Orador: - Então, julgo que sobre este tema, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia definiu bem o quadro da situação, quando afirmou que tal podia abrir espaço para o «populismo da ordem». Isto porque se verificam duas circunstâncias, que reconheço que carecem de tratamento urgente: uma, é o combate ao terrorismo - e concordo com a distinção que fez aqui anteontem o Sr. Ângelo Correia, se a memória não me falha, estando inteiramente de acordo com ele - e daí a necessidade de uma lei de segurança interna - talvez seja aqui que discordemos, eu e o Sr. Deputado José Manuel Mendes -, embora a minha lei de segurança interna tenha que ser estritamente no quadro da Cons-

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tituição da República; a outra, é o problema da segurança diária dos cidadãos, que não estão mais para suportar serem assaltados, bem como os miúdos que vão para o liceu serem vilipendiados e que lhes roubem os relógios, dinheiro, etc., como tenho diariamente conhecimento de casos que acontecem nessa matéria, assim como de casas assaltadas, etc.
Julgo que nada disto justifica um apelo à ordem, um apelo à segurança, que possa significar, por outro lado, sair do quadro da Constituição, ou seja, o combate ao terrorismo, à criminalidade e à delinquência exigem, antes de mais, que a democracia se reforce, que tudo seja medianamente transparente, de modo a não haver lugar a qualquer suspeição de que estejamos a caminhar para «o populismo» da ordem».

O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado César Oliveira, creio que a sua intervenção traduziu um pouco aquilo que é sentimento geral, face à maneira de como este debate tem decorrido.
Tem sido como disse: um debate longo e desgastante. Há quem o ache, na bancada do PSD, vivificador. Acho que é um pouco espírito sado-masoquista. Pelo menos é, de certeza, sádico em relação a nós. Mas é também um debate misterioso.
O Sr. Deputado sublinhou, e bem, alguns dos mistérios. Gostava de lhe dizer que considero misteriosos outros aspectos. Em matéria de justiça, foi uma espécie de interpelação frustrada ao Governo, ao qual o Sr. Ministro da Justiça não respondeu.
Foi uma interpelação em matéria de segurança, ao qual o Ministério da Administração Interna também não respondeu, a não ser da maneira que tivemos ocasião de ver.
Mas há um mistério suplementar para o qual lhe chamava a atenção. Na altura em que estava a ser parturejado o articulado que nos chegou aqui - no estado em que chegou depois de ter ido três vezes ao Conselho de Ministros -, estava também em preparação, em gestação, um outro texto, um outro articulado, que desapareceu misteriosamente a meio do caminho. Esse articulado é bastante importante, porque se insere precisamente numa perspectiva oposta a esta: é a perspectiva, quanto à criminalidade, da prevenção social.
Dizia-se num parecer da Procuradoria-Geral da República - de que foi dado conhecimento público num seminário, pelo que não é um documento confidencial, secreto, misterioso é o facto de ele ter sido desencaminhado e de ter desaparecido -, que «era urgente constituir em Portugal uma estrutura superior adequada ao estudo, planificação e coordenação da política de prevenção social».
«Em segundo lugar, a planificação da prevenção social, de modo a imprimir prevalência ao combate à delinquência juvenil, nomeadamente nas áreas do vandalismo escolar, do tráfico e consumo de substâncias e preparados estupefacientes; coordenação de diversos corpos policiais neste domínio; incentivação da acção de prevenção social da polícia.» Depois, proponham-se medidas concretas, designadamente a criação de centros de apoio auxiliares às vítimas dos crimes, com a cooperação da policia, difusão da imagem da polícia nos estabelecimentos de ensino; esclarecimento da opinião pública sobre a acção preventiva da policia. O Sr. Deputado ouve e nota, certamente, que isto está nos antípodas daquilo que nos chegou aqui e que é um mostrengo.
O que me intriga, pessoalmente, é o facto de como é que este articulado - digamos este conjunto de metas - desapareceu pelo caminho e nos chega aqui este monstro cheio de inconstitucionalidades. Intriga-me, também, por que não nos chegou o referido articulado e a maneira misteriosa como este nos chegou aqui - independentemente de quem é a «cilada», se é do PSD, se é de alguém que esteve por debaixo desse articulado, se é de quem fez, por exemplo, o miserável estudo de direito comparado, que se traduziu na cópia absolutamente grosseira de um projecto frustrado espanhol. Quem é que passou esse material ao Governo? Este último facto não me interessa. A responsabilidade é do Governo, dele todo e não só dos Srs. Ministros que o assinaram. Mas de quem será, também, a responsabilidade do desaparecimento dessa componente preventiva, que é primafacie da responsabilidade do Sr. Ministro da Justiça? De quem é a responsabilidade do apagamento completo de qualquer lógica de prevenção na acção do Governo e de mistificação, que só deixa a num intuito de repressão política? Isto é para mim um mistério absolutamente fundamental, que ensombra este debate e compromete o Governo na globabilidade, para além de comprometer, muito particularmente, o Sr. Ministro da Justiça. Gostava de saber a sua opinião sobre este aspecto.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado César Oliveira deseja já responder?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Exactamente, Sr. Presidente,

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado José Magalhães, tenho já dito aqui neste debate -julgo que foi neste debate-, que no «Cartesianismo», quando a evidência apodíptica não correspondia à realidade, Descartes recorria ao Demiurgo para explicar o fracasso das evidências apodípticas. Não sei se há um Demiurgo, passeando-se por entre as pernas e os cérebros dos Srs. Membros do Governo. É natural que haja. Mas espero que até ao fim do debate os mistérios que V. Ex.ª acabou de enunciar e os mistérios que eu e outro Sr. Deputado temos aqui enunciado possam ser esclarecidos, a menos que - e volto a citar a consabida frase do meu pai: «Isto seja, também e mais uma vez, a solução à portuguesa.» É natural que seja mais um mistério à portuguesa.
Havia um amigo meu italiano que, quando via aqui toda a malta envolta em perturbações na rua, e em discussões, costumava dizer: «Portugal é o único país do mundo, onde depois de uma discussão, quem andou envolvido nela diz para o outro: Oh, pá, deixa-te lá disso.» Então, se calhar é isto: deixemo-nos de saber os mistérios, porque um dia qualquer se esclarecer-se-ão. É natural que isto aconteça assim, ou então, o que não invalida a nossa reivindicação, deveremos exigir aqui, durante este debate, a descoberta desses mistérios para que a democracia ganhe em Portugal. É esta a nossa tarefa aqui na Assembleia e julgo que esta é uma vitória da democracia, é uma vitória do parlamentarismo e é uma vitória da utilidade do parlamentarismo sobre aqueles que o denigrem. Efectivamente, é uma vitória o facto de termos contribuído para que alguns mistérios fossem esclarecidos e para que a lei de segurança que for aprovada não seja um monstrengo, como V. Ex.ª classificou a lei de segurança do Governo, isto é, uma grande vitória da democracia em Portugal.

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Ângelo ... desculpe César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Francamente! Risos do PCP.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado Ângelo Correia perturbou de tal modo os nossos espíritos com as declarações que fez que, certamente, não me levarão a mal que, por vezes, tenha certas fixações.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - V. Ex.ª é um homem fraco!

O Orador: - Não tem nada a ver com fraqueza, Sr. Deputado Ângelo Correia. Tem a ver com algumas declarações que V. Ex.ª fez e que ainda não estão corripletamente clarificadas. O meu pedido de esclarecimento também tem a ver com isso.

O Sr. Presidente: - O seu tempo está a contar Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado César Oliveira, no essencial estou de acordo com a sua intervenção. Creio que ficou claro - e V. Ex.ª disse-o - que continuamos a ter como pano de fundo a proposta de lei n.º 71/III e que não existe qualquer texto alternativo para essa proposta. Como tal não poderemos estar a dar o nosso voto a declarações de intenção, uma vez que nos termos regimentais e legais, não votamos intenções, votamos articulados. De qualquer modo, desejava colocar-lhe uma questão. Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro - e talvez fosse bom que ele pudesse estar aqui connosco para esclarecer declarações que presta à imprensa, mas que recusa à Câmara -, veio dizer que não se deveria alterar no essencial a lei. Deputados desta casa com muito «peso» dentro de estruturas dos partidos do Governo, vêm dizer precisamente o contrário; Ministros, de um dos partidos, dizem também o contrário; outros Ministros, do outro partido da coligação, assumem na íntegra a proposta governamental. Em que ficamos? Considera V. Ex.ª Sr. Deputado César Oliveira, que a questão está esclarecida? Ou pensará que tudo se resolve com a sua «tese da tenaz»?
Em terceiro lugar. Sr. Deputado César Oliveira, creio que também ficou provado, ao longo deste debate, que a presente proposta de lei não visa corresponder nem dar resposta ao combate ao terrorismo e à criminalidade. Então visa o que. Sr. Deputado Ângelo Correia ... desculpe, Sr. Deputado César Oliveira?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É um acto falhado!

O Orador: - Estou fixo, desculpe.
Então, o que se pretenderá? Isto leva-me a outra questão. Estará o Sr. Deputado César Oliveira de acordo em que até agora ainda nada foi dito que demonstre que não se pretende através desta proposta de lei, que se confunda a segurança da República e dos cidadãos com a segurança do Governo, contra a legítima oposição dos cidadãos que põem em ...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para responder ao Sr. Deputado Jorge Lemos, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, acredite que também estou ansioso pela presença do Dr. Mota Pinto neste hemiciclo. Se tivesse um «santinho» da minha devoção -não tenho-, já teria posto um monte de velas no altar desse «santinho» para que permitisse e fizesse força, para que o Prof. Mota Pinto se deslocasse a este hemiciclo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não as apagava!

O Orador: - Sr. Deputado, disse algumas coisas com as quais concordo. Avançou outros mistérios. De mistério em mistério não chegaremos à vitória final, mas poderá ser que cheguemos a um esclarecimento mínimo destas questões.
É evidente que há neste texto de segurança interna, disposições inadmissíveis com as quais, de forma nenhuma, podemos pactuar. É o caso do encerramento de empresas, da proibições de manifestações, etc., que lançam suspeitas óbvias sobre a lei e sobre as suas intenções. Essa é uma das razões -além de outras, obviamente-, porque estamos frontalmente contra esta lei. Mas esperemos que o Prof. Mota Pinto aqui venha esclarecer, do alto da sua imponência, a diatribe que formolou contra aqueles que ousaram modificar a lei. Julgo que, ao fim e ao cabo, o Prof. Mota Pinto também acabará por, nesta matéria como em outras, sair derrotado deste pleito com que ele se meteu sem jeito nenhum.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Deputado César Oliveira preocupou-se muito na sua intervenção, que acompanhei com muito interesse, em esclarecer o mistério de um Governo da República apresentar uma proposta de lei como esta.
A proposta de lei tem sido classificada das maneiras mais variadas e talvez nenhum outro diploma em Portugal tenha tido uma tão vasta gama de designações - diploma execrável, proposta terrorista, Tollan, cavalo coxo, gato morto, mostrengo, etc.
O Sr. Deputado preocupou-se com a ideia da maquinação, da cilada, de saber de quem era a cilada e contra quem, e creio que traçou um quadro em que as hipóteses são politicamente plausíveis.
Mas o Sr. Deputado não acha que esta proposta de lei é um grande impulso no sentido do autoritarismo? O tal «impulso» que tem sido também muito reclamado não será um grande impulso no sentido do autoritarismo, o qual vem precedido de outros impulsos mais pequenos mas que marcam uma direcção? Não é isto que torna ainda mais preocupante esta proposta de lei?
Outra questão refere-se ao facto de terem estado sempre ausentes deste debate os dois primeiros subscritores da proposta de lei. Um porque é Primeiro-Ministro e outro, porque sendo Vice-Primeiro-Ministro, é ao mesmo tempo o presidente de um dos partidos da coligação. Essa ausência não permite toda esta interrogação sobre as origens e objectivos um tanto nebulosos da proposta de lei? Não seria uma mínima prova de respeito a presença na Assembleia da República do Sr. Vice-Primeiro-Ministro? Mas este é, como temos verificado, uma personalidade política, um homem de

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Estado, um tanto surpreendente ... E o próprio Primeiro-Ministro não deveria ter vindo aqui prestar alguns esclarecimentos à Assembleia de República quando a questão se começou a colocar?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Espero que os deputados do Partido Comunista não pensem que deito cartas, sou cartomante, ou tenho alguma bola de cristal para poder responder a tantos mistérios. Quem for cartomante ou possua bola de cristal que responda, mas eu não.
Já tive oportunidade de dizer, numa declaração pública ao Diário cie Lisboa, que este diploma, tal como está, a ser utilizado pela direita -pela direita fera, ingente, troglodista - pode dar caminho e abrir passo ao autoritarismo militarista de Estado.
Também lamento que o Sr. Primeiro-Ministro não tenha vindo aqui prestar esclarecimentos. Os ministros que estão aqui não deixarão de reclamar a sua presença e, certamente, ele ainda virá, até ao fim do debate.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, durante a tarde foi-nos distribuída uma fotocópia de um ofício do Sr. Presidente da Assembleia Regional dos Açores, que capeia um parecer do presidente da Comissão para os Assuntos Políticos e Administrativos da Assembleia Regional dos Açores. É sobre essa matéria que queríamos interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a matéria está fora da ordem do dia....

O Orador: - Não está, Sr. Presidente. É que pretendia, precisamente, interpelar a Mesa sobre esta matéria. Simplesmente vejo reacções negativas da parte da bancada socialista e tive que situar a minha interpelação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se situa a interpelação precisamente nesse campo, dificilmente a posso incluir na ordem do dia; se é sobre essa matéria que deseja interpelar a Mesa, terá de escolher uma nova oportunidade.

O Orador: - O Sr. Presidente mandou distribuir o documento a que acabei de me referir como sendo o parecer da Assembleia Regional dos Açores sobre a matéria que está em discussão, ou seja, sobre a proposta de lei n.º 71/III e sobre os projectos de lei apresentados pelo CDS e pela ASDI. É sobre esta questão que estou a interpelar a Mesa.
Vou ser extremamente breve, mas espero que não ponham em causa o meu uso da palavra, como interpelação à Mesa, porque espero uma resposta de V. Ex.ª
Em face do documento que foi distribuído, queríamos dizer que o Grupo Parlamentar do PCP desde sempre tem afirmado o respeito pelo exercício das competências próprias dos órgãos de Governo Regional, no quadro de autonomia regional e nos termos constitucionais. Registe-se, aliás, que foi por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP que foi solicitado às regiões autónomas o pedido de parecer em relação aos diplomas em discussão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia que na sua interpelação à Mesa perguntasse o que tem a perguntar, para eu lhe poder responder.

O Orador: - Só que entendemos, Sr. Presidente, que o parecer, para poder ser considerado como tal, deve corresponder às disposições constitucionais que se referem ao modo como os órgãos de governo próprio das regiões autónomas devem emitir parecer. Ora o parecer vem subscrito por uma comissão da Assembleia Regional dos Açores, não vem subscrito pela Assembleia Regional dos Açores.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vou-lhe retirar a palavra. Se não interpelar a Mesa nos termos regimentais, sucintamente e em vez de fazer um discurso, como está a acontecer, e como o Sr. Deputado tem a consciência plena disso.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Sr. Presidente, para definir o sentido do que pretendo perguntar a V. Ex.ª, tenho que expor, sucintamente, as razões que me levam a colocar-lhe essa pergunta.
Requeiro ao Sr. Presidente que volte a solicitar parecer à Assembleia Regional dos Açores sobre a proposta de lei n.º 71/III e sobre os projectos de lei apresentadas pelo CDS e pela ASDI, sobre matéria conexa, uma vez que não se encontram reunidas as condições para considerar que o documento que chegou à Assembleia da República possa ser considerado como parecer do órgão de governo próprio, que é a Assembleia Regional dos Açores.
Pensamos que actuações deste tipo desacreditam as instituições regionais, como outras que visam retirar quórum às assembleias regionais quando são questionadas moções de censura a governos regionais.

Aplausos do PCP. Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado, se desejar, exporá por escrito, à Mesa, a interpelação que acaba de fazer. Depois, verei o seguimento que poderá ser dado ao assunto.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Creio que após numerosas e longas horas de debate já tudo, ou quase tudo, foi dito sobre os diplomas que estamos a analisar.
A proposta de lei do Governo, sobre segurança interna e protecção civil, que o Sr. Ministro da Administração Interna defendeu nesta Câmara, disposição por disposição, quase diria, norma por norma - e quero prestar essa homenagem ao engenheiro Eduardo Pereira -, suscitou no País um clamor de protestos que não vieram apenas de um só sector de opinião, mas praticamente de todos os sectores da opinião pública portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esse é o primeiro facto que neste momento importa sublinhar.

Não creio que valha já a pena voltar à comparação do texto da proposta de lei n.º 71/III e dos projectos de lei apresentados pelo CDS e pela ASDI - o projecto de lei do CDS foi já abundantemente explicado pelos meus colegas de bancada Nogueira de Brito e Narana Coissoró. Neste momento importa, sim, fazer um balanço político deste debate.
Como ia dizendo, o primeiro ponto que importa sublinhar é que tratando-se, como se trata, de uma questão

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que é importante para a construção do estado democrático em Portugal, desta vez não houve de um lado o Partido Comunista e do outro lado os restantes partidos políticos, como aconteceu em matérias fundamentais, designadamente, na revisão da Constituição ou na Lei de Defesa Nacional e Forças Armadas.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Desta vez, os protestos vieram de todas as forças políticas e de todas as mais relevantes correntes de opinião existentes no País.
Aqui, na Assembleia da República, tivemos a oportunidade de ouvir o Sr. Deputado Sottomayor Cardia falar-nos do Estado e dos órgãos de soberania, designadamente do Governo e do respeito que o Governo deve merecer a esta Assembleia, bem como aqueles que, em cada momento, são os governantes.
Ouvimos também o Sr. Deputado Manuel Alegre, com a autoridade que se lhe reconhece, falar-nos da liberdade e do que pode estar em causa nesta proposta de lei.
Ouvimos o Sr. Deputado Jorge Lacão, em nome da sua bancada, elencar uma série de alterações que o Partido Socialista considera necessárias à discussão desta lei na especialidade.
Ouvimos o Sr. Ministro da Justiça defender uma concepção das medidas especiais de polícia, inteiramente diversas da que consta da proposta de lei do Governo, de que é subscritor, ou seja, de uma forma muito mais jurisdicionalista e que se aproxima das propostas que constam do nosso próprio projecto de lei, bem como do projecto de lei da ASDI.
Ouvimos, finalmente, o Sr. Deputado Ângelo Correia, com a autoridade e competência que tem nestas matérias, desmontar ponto por ponto a proposta de lei do Governo, a ponto de nos podermos interrogar, depois da sua intervenção, o que fica daquela proposta de lei, para além da intenção de o Governo legislar numa matéria em que se reconhece ser importante que se legisle.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Ângelo Correia foi mesmo um pouco mais longe e teceu ainda judiciosas considerações para uso das coligações -presente e futuras-, de que tomámos nota. Terá, porventura, feito alguns avisos à navegação...
Neste momento creio que há, no entanto, duas interrogações que permanecem nesta Câmara. A primeira é sobre o que levou o Governo a apresentar esta proposta de lei - e digo apresentar esta proposta de lei e não apresentar uma iniciativa legislativa nesta matéria, cuja utilidade, para nós nunca esteve em causa.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Recusamo-nos a aceitar que um Governo presidido pelo Dr. Mário Soares e apoiado pelos Partidos Socialista e Social-Democrata tenha em mente, através desta proposta de lei, o controle das oposições. Não é, para nós, com certeza, o objectivo desta iniciativa legislativa do Governo. Mas, então, teremos de nos interrogar sobre qual a razão concreta da apresentação desta proposta de lei.
Podemos hesitar entre considerar que houve leviandade do Governo em trazer a esta Câmara a proposta de lei n.º 71/III. Mas é difícil podermos aceitar esta tese quando consta -e nunca foi desmentido- que ela representa uma versão aperfeiçoada e mais moderada de outras propostas de lei que o Governo, abundantemente, discutiu.
Podemos também pensar que, no fundo, do que se tratou foi de, neste final de Sessão Legislativa em que a maioria experimentou, por mais de uma vez, dificuldades no Parlamento e fora dele, distrair a atenção desta Câmara e do País de algumas questões, as questões relativas às célebres reformas de estrutura. Mas, se assim é, é grave. E é grave porque esta matéria é essencial para o Estado Português e é uma matéria que não pode servir para qualquer manobra de diversão.
A segunda questão, que entendemos que se nos coloca, neste momento, é a de saber o que é que vai significar o voto do Parlamento sobre os diplomas em apreço. A forma como o Governo coloca a questão perante a sua maioria pode, porventura, significar que o Governo está a pedir à sua maioria um voto de confiança. Mas não pode significar, sem que isso constitua um grave enviesamento do processo democrático, que o Governo queira, numa questão relevante, procurar um consenso democrático ou, mais ainda, um consenso democrático alargado.
Aliás, a Constituição, no seu artigo 196.º, estabelece as condições em que o Governo pode solicitar um voto de confiança. São elas, uma declaração de política geral ou qualquer assunto de relevante interesse nacional. A Constituição Portuguesa não contempla, como outras fazem, e designadamente a Constituição Francesa de 1958, que o Governo coloque a questão da confiança sobre um projecto de diploma legislativo que submete à apreciação do Parlamento.
O que se verifica, pois, é que o Parlamento vai ter de se pronunciar sobre a confiança do Governo e não sobre os diplomas que temos estado a debater. Sabendo-se de antemão, como se sabe, que a proposta de lei do Governo não tem quaisquer condições para o seu conteúdo servir de matriz a um debate na especialidade sobre esta questão e que, muito pelo contrário, são nesta matéria os projectos apresentados pelo CDS e pela ASDI que podem servir de matriz a um debate útil e aprofundado sobre esta questão.
É esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a questão que se põe ao Parlamento e a situação verdadeiramente insólita em que esta Câmara se vê colocada, neste final de Sessão Legislativa.
Pela nossa parte, colaboraremos sempre em todas as iniciativas destinadas a dotar o Governo -que para nós continua sempre a ser o Governo de Portugal, mesmo quando estamos na oposição- de todos os instrumentos necessários ao cumprimento das funções constitucionais. Mas não abdicaremos nunca de defender os princípios do Estado de direito. Só nesse quadro se combaterá eficazmente o terrorismo, só respeitando os princípios, mas todos os princípios, cumpriremos o mandato que nos foi confiado.
É..para nós líquido que, de qualquer forma, e seja qual for o resultado das votações que incidirem sobre os diplomas em apreço, o Governo sairá derrotado deste debate! Não derrotado principalmente pelas oposições, mas derrotado por si próprio, pelas circunstâncias em que se apresentou nesta Câmara.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A fronteira de defesa da liberdade não passa, hoje, como por vezes passou no passado, por esta ou por aquela força política. Passa, antes, pela consciência de todos e de cada um dos deputados.

Aplausos do CDS, da ASDI, da UEDS e dos deputados do PS Manuel Alegre e Sottomayor Cardia.

Os deputados do CDS estarão, conjuntamente com outros deputados, na primeira linha desse combate.

Aplausos do CDS, da ASDI, da UEDS e dos deputados do PS Manuel Alegre e Sottomayor Cardia.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, tinha pedido a palavra no inicio da intervenção do Sr. Deputado Luís Beiroco. Mas, tendo ouvido toda a sua intervenção, ela foi de tal maneira clara e precisa, que penso que não carece, pelo menos, pela minha parte, de quaisquer esclarecimentos complementares. Portanto, prescindo da palavra.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, para uma intervenção o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O poder é, em si, concentracionário e tende para ser totalitário.
A história do homem é a luta pelo poder mas é, também a principalmente, a luta contra o poder absoluto.
Foram os gregos, talvez, os primeiros a conceptualizar a ideia de que o poder tem limites que lhe vêm da sua própria legitimidade e que esta radica tão-só no povo.
Só o poder exercido pelo povo, ou em nome do povo, é legítimo.
E assim nasceu a ideia de democracia.
2000 anos são passados sobre esta reflexão grega e ainda hoje, aqui e agora, neste país, estamos a aprender a democracia.
Durante 8 séculos, com pequenos interregnos, o povo português foi dominado pelo poder absoluto, principalmente desde D. João II. Tivemos a inquisição, tivemos o fascismo, mas também fizemos os descobrimentos e também tivemos Camões, Damião de Gois e Catarina Eufemia.
Aspirámos sempre à liberdade.
O acto de constituição deste país foi um acto de rebeldia contra o poder constituído e, ao longo de toda a nossa história, mantivemos sempre, enquanto povo, uma atitude de rebeldia contra todo o poder absolutizante e concentracionário.
Em todas as épocas houve sempre portugueses que disseram não.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, a proposta de lei governamental sobre segurança interna e protecção civil reflecte toda uma concepção do poder autocrático e totalitário.
Não admiram, pois, as reacções que tem tido em todos os espíritos lúcidos e democráticos de todos os quadrantes, a começar por alguns dos seus próprios proponentes governamentais.
A proposta de lei n.º 71/III, ataca frontalmente alguns direitos, liberdades e garantias, consignados na Constituição da República - como o direito à liberdade e segurança, o direito à vida privada, o direito ao domicílio, o direito à livre circulação, o direito à livre expressão do pensamento, o direito de reunião e manifestação, etc. - sem que, nem sequer proporcionalmente, assegure a segurança dos cidadãos.
A proposta governamental confunde e funde segurança interna com protecção civil, reduz as forças armadas a meros órgãos de segurança interna, torna a delacção obrigatória, marginaliza o poder judicial, administravando a justiça, atentando, assim, contra a independência dos tribunais.
Em suma: rasga a Constituição no que se refere aos direitos fundamentais, ao poder judicial, à função das forças armadas e ao conceito de forças de segurança, ao estado de sítio e de emergência.
Mas não vou agora referir-me às inúmeras inconstitucionalidades de que a proposta governamental está recheada, pois já o fiz no local e no momento processualmente próprios, isto é, aquando da discussão dos recursos, interpostos pelo Grupo Parlamentar do MDP/CDE, da admissibilidade da proposta e dos projectos de lei do CDS e da ASDI.
Não vou também referir aqui as posições públicas assumidas por tantas e tão variadas personalidades de, praticamente, todos os sectores da vida portuguesa, contra a lei «celerada», «execrável», ou «iníqua», como foi por elas baptizada.
Mas, talvez seja conveniente dar-vos conhecimento, Sr. Presidente e Srs. Deputados, das reacções que se começam a sentir um pouco por toda a Europa, em relação à proposta de lei governamental e que começaram a chegar ao meu conhecimento, quer directamente, quer através da CEDRI - Comité Europeu para a Defesa dos Refugiados, de que sou membro.
Telefonava-me, no outro dia, um amigo meu francês, filho de um ministro do actual governo de Mitterrand, perplexo e perguntando quem seria o autor material de tão inacreditável proposta de lei, acrescentando que, na opinião dele, não poderia deixar de ser algum obscuro funcionário imbuído, ainda, do espírito fascista.
A deputada social-democrata Élida R. Wessel-Tuinstrá do partido holandês e presidente da sua Comissão de Negócios Estrangeiros escreveu-me a seguinte carta, que passo a transcrever:
Por esta carta, eu, como membro do Parlamento Holandês protesto solenemente contra o articulado da Lei de Segurança Interna e Protecção Civil.
Penso que medidas como estas são pensadas numa altura de guerra, quando o inimigo deve ser afastado dos serviços secretos. Mas, mesmo nessas alturas, deve haver garantias para as pessoas e protecção da sua vida privada.
Estou deveras admirada que Portugal, com o seu governo progressista, com tudo o que tem conseguido no campo dos direitos humanos, esteja a voltar atrás anos e anos.
Há um novo Salazar em perspectiva?
Não ouso pensar tal.
Espero que o Parlamento Português vote contra esta proposta.
Também o antigo deputado do Partido Social-Democrata Alemão (SPD) e escritor Dieter Lattmann me diz, entre outras coisas, na sua carta que: «sem que eu possa, enquanto escritor, estudar todos os detalhes de lei português com juristas, este parece-me extremamente preocupante. Se ele for realizado, poderá ter consequências desastrosas para as liberdades fundamentais democráticas», fazendo depois referência aos debates parlamentares, na Alemanha Federal, em que participou durante os anos de 1966-1980 sobre as leis antiterroristas.
Mas o que parece fundamental, para a nossa própria compreensão da proposta de lei governamental, é o parecer que me foi enviado pelo professor Ingo Maller, professor catedrático de Direito Público e Penal em Bremen, na Universidade Oldenburg, bem conhecida na RFA pelas suas publicações de desmontagem crítica dos direitos da defesa e da colisão de poderes, e que passo a transcrever:
As reflexões sobre a proposta de lei tocam dois pontos principais: o primeiro refere-se a medidas para a restrição dos direitos individuais e o segundo diz respeito à concentração das forças de segurança e militarização da segurança.
Quanto ao primeiro, a proposta de lei prevê as restrições dos seguintes direitos individuais (direitos fundamentais); possibilidade de prisão de pessoas

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para verificação de identidade -artigo 21 º, buscas domiciliárias pela polícia - artigo 22 º, detenção preventiva - artigo 23 º; escutas telefónicas e controle de correspondência - artigo 24 º; autorização do Ministro do Interior para proibir manifestações e reuniões - artigo 26 º, interdição absoluta de qualquer empenhamento político da parte dos membros das forças de segurança - \artigos 14 º e 29 º
É preciso salientar que há um grande número de novas possibilidades de intervenção, da parte da polícia, em domínios habitualmente reservados aos juízes (controle de correspondência, inquirições, prisões) A transmissão destes poderes à polícia -trata-se na maior parte de competências subsidiárias (quando a demora constitui impedimento) - não seria tão grave se o desencadear destas intervenções também não fosse da competência da polícia.
Com efeito, nem sequer é necessária qualquer suspeita concreta contra uma pessoa, para se proceder a uma busca, a uma detenção, ou para se proceder a uma escuta telefónica Pelo contrário, para desencadear intervenções contra uma pessoa, não indiciada explicitamente como suspeita, bastam as situações designadas, na generalidade, como perigosas.
Explicitando designa-se como «suspeito» todas as pessoas que são suspeitas de ter cometido um acto criminoso e designa-se como «sujeito a suspeição» todo aquele que se crê capaz de cometer, no futuro, um acto criminoso Esta proposta de lei abriga em vários pontos, este conceito de «suspeição» - ver os artigos 23 º e 27 º-, onde aparentemente se faz alusão a alguém, suposto de ter cometido um dos crimes graves citados na lei, tudo isto com o objectivo de desviar a atenção e de criar uma cortina de fumo Contra alguém, suposto de ter cometido um crime grave e que se tema que possa escapar à justiça, passa-se um mandato de captura e uma tal situação dispensa mesmo qualquer ordem do Ministro do Interior, segundo o artigo 23.º
É neste último aspecto que a proposta de lei tem a sua força explosiva
Não é tanto um ou outro poder concreto de intervir nos direitos individuais que torna esta proposta de lei tão preocupante A Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o Pacto Internacional para a Protecção dos Direitos Políticos, permitem também uma ou outra medida planificada.
Mas a quantidade de medidas e a sua combinação, em diferentes possibilidades de intervenção representam um grave perigo para o Estado de direito e, quando se trata de restrições de direitos fundamentais, para o processo democrático.
Quanto ao segundo ponto, a concentração dos poderes que visam a criação da Segurança Interna é, no essencial, realizada pelas seguintes medidas: criação de uma autoridade nacional para a segurança interna - artigo 6 º, institucionalização do que se pode chamar o estado-maior de crise permanente, através da criação de um conselho superior para a segurança e a protecção civil, bem como a criação de conselhos semelhantes nas regiões autónomas e, em nível inferior, nos distritos - artigo 7.º, obrigação para todas as autoridades, de fornecer a sua assistência oficiosa às forças da ordem - artigo 25.º; obrigação para todos, que tenham um ficheiro informativo, de o declarar à autoridade nacional de segurança interna - artigo 33.º
Esta enumeração mostra desde logo, uma concentração e uma uniformização das diferentes repartições, autoridades e poderes e, nomeadamente, uma união das forças executivas policiais com os serviços secretos de informação, que me parece único na Europa As competências, que serão concentradas na autoridade nacional de segurança interna, estão repartidas, na República Federal da Alemanha, entre onze Ministros do Interior dos "Lands", um Ministro Federal do Interior, onze procuradores gerais, um procurador-geral federal, uma repartição federal de criminalidade, três serviços secretos e uma polícia federal
Note-se que os serviços secretos não têm poder executivo (prisões, confiscações, requisições, busca de domicílios) e que a colaboração entre as polícias e os serviços secretos e estritamente limitada pela lei. Esta regulamentação, que deve garantir uma separação completa dos ficheiros das polícias, dos locais de declarações, das forças armadas e dos serviços secretos, tem por objectivo impedir o desenvolvimento de monopólios todo-poderosos, ao nível da informação e do poder executivo.
Neste aspecto, existe um grande perigo de que a autoridade nacional de segurança, que o projecto de lei quer criar, e que deve coordenar todos os serviços e forças de segurança, venha a ser um centro de podei extraordinário, de cuja benevolência dependerão mesmo aqueles que, em princípio, o deveriam orientar, dirigir e controlar. Tais aparelhos desmesurados têm a tendência de se transformar em poderes autónomos, sobretudo quando todo o poder está neles concentrado
Esta tendência é ainda encorajada, de forma extraordinária, pelos artigos 14.º e 29.º, que proíbem ou membros das forças e dos serviços de segurança de pertencerem a partidos ou sindicatos, bem como de participarem activamente em reuniões políticas
Tais interdições tem como consequência que as forçai de segurança percam o contacto com os partidos democráticos e que estes deixem de ter qualquer contacte com a estrutura das forças de segurança Como o prova o exemplo histórico do «Reichswehr», as Forças Armadas da República Alemã de Weimar (1919-1930), a interdição de aderir a um partido político não conduz à abstenção política, mas sim ao engajamento a movimentos autoritárias e fascistas, sob pretexto da salvaguarda dos «interesses nacionais»
Os proponentes da proposta de lei sobre a Segurança Interna não têm o direito de se referir a leis pretensamente semelhantes, na RFA É verdade que no quadro das leis alemãs, ditas antiterroristas. foi reduzido um número importante de direitos de defesa no processo penal, é também verdade que com a lei sobre as razias de 14 de Abril de 1978 e com diversas leis policiais dos Estados - na RFA, a organização e a definição de competências da polícia dependem dos 11 estados federados - a competência da polícia e, em diversas leis sobre a protecção da Constituição, ao nível dos Estados, as competências do serviço e protecção da constituição foram muito alargadas. Apesar disso, a legislação federal alemã, neste domínio, vai muito menos longe do que a proposta portuguesa
1 - Mesmo as medidas alemãs citadas foram vivamente criticadas a nível nacional e internacional e a oposição democrática é unânime em verificar que muitas das medidas então decididas, foram desmedidas, exageradas e perigosas para o Estado de direito, e que elas devem ser, em consequência, abolidas
2 - Não é a mesma coisa dar novos poderes de intervir nos direitos de cada cidadão, que está nas mãos de uma polícia organizada de uma forma federalista, dividida em numerosas unidades separadas umas das outras e controladas, ou, pelo contrário, num centro estatal de informação, que reúne ao mesmo tempo sobre si todos os poderes executivos
Seja as leis «antiterroristas» alemãs podem, em certos casos, levar a situações em que uma acção policial compatível com as exigências do Estado de direito não

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é garantida, os poderes executivos, alargados na lei portuguesa de segurança interna, devem ser compreendidos como um convite real a um abuso político em larga escala.
A possibilidade de ordenar a detenção preventiva - artigo 23.º; de interditar preventivamente a saída do território nacional - artigo 27.º; de proceder a buscas domiciliárias sem condições formais (mandato judicial) ou materiais (suspeita de um acto criminoso) - artigo 22.º; de escutas telefónicas e violação de correspondência - artigo 24.º; de dispersar reuniões e proibir manifestações - artigo 26.º, poderia muito bem, em tais condições, reprimir a oposição democrática. Pior, o confundir e o concentrar de todos os poderes dos serviços secretos e do executivo, assim como a unificação da polícia e das forças armadas numa superautoridade nacional é um convite à repressão de movimentos democráticos e à instalação de uma ditadura policial, sobretudo porque o artigo 30.º representa para os golpistas, ou, mesmo até, para os membros das forças policiais que cometem actos criminosos, transgredindo as suas competências (torturas, privação de liberdade, espancamentos e ferimentos) uma amnistia antecipada. Uma tal regulamentação impede qualquer tentativa de restringir os poderes da polícia num sentido democrático.
Mesmo que alguns artigos da lei, sobretudo os que respeitam às medidas de restrições dos direitos individuais, tenham como modelo as leis italianas, inglesas ou alemãs, estas disposições, dada a extraordinária concentração de todos os poderes no Estado, que não tem igual em nenhum outro país democrático ocidental, apresentam um grave perigo para a democracia.
Esta concentração de todos os poderes exige que se considerem as restrições dos direitos fundamentais sobre outro ângulo e leva a uma tomada de medidas enérgicas perante uma tal proposta de lei.
«A história da queda da Primeira República alemã de Weimar mostra as consequências fatais de uma lei, que devia proteger a República, que foi criada para defender essa República contra os ataques de direita e que nada mais fez do que facilitar a tomada de poder pelos fascistas.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A presente proposta de lei governamental tem tido um itinerário bem curioso. Começou por ninguém assumir a sua paternidade, a não ser em termos formais. Depois, dada a unânime reprovação de que foi alvo, alguns vieram propor alterações e tentar convencer a Câmara de que o que se iria votar na generalidade não era a proposta de lei que se encontra depositada na Mesa da Assembleia da República, mas sim as alterações vagas e orais que propunham.
Era, talvez, um modo enviezado a canhestro, subentendia-se, de o Governo poder salvar a face do monstro que gerou, como se não fosse mais honrado, para qualquer governo democrático, retirar aquilo que, ele próprio, através de alguns membros, considerou já inquinado senão de algumas inconstitucionalidades, pelo menos, algumas imperfeições.
A verdade e que, em termos desta Assembleia da República, se tem de verificar que, dos dois partidos da coligação, foi o Partido Socialista, em termos oficiais, quem assumiu a proposta governamental, quer através do seu Ministro da Administração Interna, que a assumiu integralmente, quer através do deputado Jorge Lacão que, apesar de algumas críticas, a assumiu no essencial, anunciando o voto favorável do seu partido.
Por outro lado, o PSD distanciou-se da proposta governamental, quer no discurso do seu Ministro da Justiça, quer da intervenção contundente do seu deputado Ângelo Correia, que desmontou totalmente a proposta.
Diga-se, porém, em nome da verdade, que vieram do Partido Socialista, embora a título individual, as críticas mais duras em termos políticos e em termos morais, designadamente nas intervenções dos Srs. Deputados Manuel Alegre e Sottomayor Cardia.
Mas, eu pergunto como é possível que, deputados democratas e defensores dos direitos do homem possam votar favoravelmente, mesmo na generalidade, a proposta de lei n.º 71/III?
Lembraria os Srs. Deputados do PSD que, pelo menos, desde os finais dos anos de 1960, Sá Carneiro foi um dos portugueses, que, a seu modo, mais lutou pelos direitos do homem.
Com Francisco Sá Carneiro, César Oliveira, Mário Brochado Coelho e outros, fundámos, no Porto, naquela época ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe, mas terminou o seu tempo!

Sr. Deputado César Oliveira, pretende a palavra para que efeito?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, queria pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. Presidente: - Só um momento Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, o MDP/CDE tinha pensado fazer uma terceira intervenção durante 10 minutos. Uma vez que o Sr. Deputado António Taborda precisaria de cerca de 5 minutos para terminar a sua intervenção, solicitamos - tal como ontem o Sr. Deputado Ângelo Correia fez- que se juntassem os 10 minutos finais aos 20 minutos já utilizados, de forma a possibilitar que o Sr. Deputado António Taborda possa terminar a sua intervenção. Nesse caso, prescindiríamos da nossa última intervenção.

O Sr. Presidente: - Penso que a Câmara não se opõe na medida em que, já ontem, o mesmo foi concedido a outro Sr. Deputado.
Assim, faça o favor de continuar, Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Dizia eu, com Francisco Sá Carneiro, César Oliveira, Mário Brochado Coelho e outros, fundámos no Porto, naquela época, a Cooperativa Cultural Confronto, onde se fizeram debates importantes sobre a liberdade, o que nos levou a sofrer várias incursões da PIDE.
Em Janeiro de 1974, escrevi com Anselmo Borges, Armando Castro, Calvet Magalhães e Francisco Pinto Balsemão, por ocasião do 25.º aniversário da Declaração Universal, um livro que tinha precisamente por título «Os Direitos do Homem em Portugal», livro este que tem uma introdução de Francisco de Sá Carneiro, onde ele escreveu o seguinte:
Todos os Estados reconhecem, em princípio, as liberdades políticas e os direitos cívicos, que inscrevem, mais ou menos satisfatoriamente, nas suas Constituições. Mas uns aceitam a garantia do seu exercício através de limitações ao poder político e

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outros arrogam-se o direito de ser a sua única medida.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Só o cita quando lhe interessa!

O Orador: - E, referindo-se ao caso português da época dizia:
Foi para manter, a essa minoria, uma ilimitada liberdade de ter, que se coarctou, à imensa maioria dos portugueses, a liberdade de ser. Enquanto isso se não modificar, não há possibilidade de paz interna.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, sei que os deputados da minha geração de Coimbra, que aqui se sentam em diversas bancadas, apesar da diversidade de opiniões políticas que isso pressupõe, não irão votar favoravelmente a proposta de lei governamental.
Estou a lembrar-me de Nogueira de Brito, Horácio Marçal e António Vasconcelos do CDS, de Silva Marques do PSD, que aplaudiu de pé Manuel Alegre, de César Oliveira e Octávio Cunha da UEDS e, claro, de Manuel Alegre, Sottomayor Cardia e Eurico de Figueiredo do PS.
Isso significa, a meu ver, que para a minha geração, a liberdade está acima de todas as querelas políticas.
Mas, como será possível que, antifascistas de sempre, alguns com longos anos de cadeia ou de exílio por defenderem a liberdade, possam votar agora contra a liberdade?
Falo em António Macedo, em Carlos Lage, em Beatriz Cal Brandão, em Raúl Rego, em Teófilo Carvalho dos Santos, em Tito de Morais, em Montalvão Machado e tantos outros, já que Edmundo Pedro nos disse, publicamente, que vai votar contra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, esta proposta de lei teve, no entanto, um mérito: uniu contra ela uma imensa plêiade de democratas, de combatentes da liberdade, alargou incomensuravelmente a base de apoio à democracia.
E permitiu, deste modo, que o reencontro de tantos de nós fosse, outra vez* a festa e o encontro da liberdade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, diz Sofia de Melo Brayner, no início de um belíssimo poema.
A primeira reflexão do homem foi a justiça.
Saibamos todos reflectir no significado profundo da votação da proposta de lei.
E como Hémon disse a Creonte, na tragédia de Sófocles, eu direi ao Governo e à maioria:

Mas não é vergonha que um homem, ainda que seja sábio, aprenda muita coisa e não estenda demasiado a corda. Tu vês, como nas torrentes invernais, quando as árvores cedem, como os ramos se salvam: quem oferece resistência, perde-se com as próprias raízes. Do mesmo modo, quem, tendo distendido a poderosa cordagem da nau, não cede em nada, voltado para baixo, navega para sempre com os bancos dos remadores virados ao contrário.

Aplausos do MDP/C DE, da UEDS. da ASDI e dos deputados do PS Manuel Alegre e Sottomayor Cardia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir um esclarecimento, o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado António Taborda, decididamente, não penso que posição que se tome sobre esta lei, seja uma questão de geração. Mas penso também que, de facto, muita gente aqui nesta Assembleia, anda na vida política, porque acredita nas bandeiras em que julga que deve acredita e por aquilo em que deve acreditar. Muita gente, aqui quer na direita, quer na esquerda, acredita fiel e profundamente nos valores por que julga que vale a pensar construir a sua vida e isso é motivo bastante para ter convicção e para tomar posição perante esta lei.

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado António Taborda pretende responder só no fim, tem a palavra Sr. Deputado Raúl Rêgo.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Queria dar um esclarecimento.
Sr. Deputado António Taborda, em primeiro lugar quero dizer-lhe que confundiu, pois a República de Weimar não caiu por afastar os militares da política: Caiu, porque confiou a política aos militares. Lembre-se que quem chamou Hitler ao poder foi o marechal Hidenburg.

Aplausos do PS.

Podia lembrar-lhe, aliás, o exemplo português de 1926, que talvez esteja mais próximo de nós do que o de Weimar, e que foi a confusão, sempre feita, entre militares e políticos que originou uma série de revoluções e que destruiu a democracia em Portugal.

Aplausos do PS, do PSD e de alguns deputado do CDS.

Queria também agradecer-lhe o facto de me ter colocado no rol dos defensores da liberdade, mas quero dizer-lhe que, para defender essa liberdade, confio mais naqueles que sempre a defenderam, antes de 1974 e em 1975, do que naqueles que me a quiseram tirar em 1975

Aplausos do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - António Taborda falaste em gerações, mas sabes António Taborda qu as gerações têm de tudo. Por isso, Sr. Deputado António Taborda, ao invocar o meu nome a propósito de direitos, liberdades e garantias, sabendo vós que essa filosofia, esses valores não têm sentido, na sua existência real, fora do quadro do Estado democrático e pluralista penso que não tem sentido a invocação do meu nome na boca de um deputado do MDP/CDE.
Quando o MDP/CDE cortar com a lógica leninista do Partido Comunista, então tem sentido essa invocação e não é necessário fazer referência a gerações, porque elas só criam confusão.
Quando aqui, durante dias e horas os maiores inimigos dos direitos, liberdades e garantias -porque e maiores inimigos do Estado democrático fazem jura de fidelidade a valores que negam -, fizeram uma operação da mais monstruosa hipocrisia e ainda por cima perguntam a outros, porque não tremem ao irem eventualmente votar a favor desta proposta de lei - foi pergunta do Sr. Deputado Lino Lima -, digo que é facto eles não tremem, não obstante a monstruosidade hipocrisia, porque o seu espírito está despojado da mais ínfima migalha de sentido crítico.

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Outros tremem, e ainda bem, porque não perderam - sentido crítico. Tremer é sinal de vida, e enquanto remarmos estamos vivos.

Aplausos do PSD, de alguns deputados do PS e do CDS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para um pedido e esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado António Taborda, de facto parece que já sabemos tão-touco aquilo que vamos votar, à força de nos explicarem o que vamos votar não é aquilo que realmente/amos votar, que já vi, e começo a ver invocar aqui para justificar o voto a favor ou contra a proposta de lei, não o conteúdo da lei, mas as gerações, a autoridade deste ou daquele que se pronuncia a favor ou contra a lei. Ora, não estamos aqui nem para julgar dos sentimentos democráticos - que eu não ponho em causa, mas não é isso que estamos a julgar - do Governo, nem daqueles que contestam ou defendem a proposta de lei, temos é de nos pronunciar concretamente sobre uma proposta de lei e só sobre isso, e não arranjemos subterfúgios para não assumirmos a responsabilidade, não perante aqueles que nos propõem, defendem ou criticam a proposta de lei, mas perante a própria proposta de lei que nos é submetida.
Não é uma questão de pessoas, menos ainda uma questão de gerações.
Mas dito isto Sr. Deputado, a questão que lhe queria colocar é se, entre os múltiplos mistérios que envolvem esta discussão há um outro.
É hábito, tradição e praxe nesta Assembleia que, quando se faz a discussão na generalidade de propostas ou projectos de lei que merecem fortes críticas, se assumam compromissos e se avancem propostas de alteração na especialidade, que vão sendo concretizadas, através de textos distribuídos durante a discussão na generalidade, para que cada um de nós possa aquilatar do verdadeiro sentido e significado das alterações que - e pretendem eventualmente apresentar aquando da discussão na especialidade.
Aquilo com que nos deparamos neste momento é esta coisa bizarra: toda a gente fala na necessidade de introduzir alterações na especialidade, no pressuposto da aprovação na generalidade desta proposta de lei, mas não há nenhuma proposta concreta de alterações nesse sentido.
O que é que isto significa em seu entender Sr. Deputado?
Não penso que signifique, nem faço esse processo de intenções, que aqueles que dizem que vão alterar a proposta de lei na especialidade a não querem alterar. Talvez a razão seja outra: é que a concretização, através de propostas concretas de alteração na especialidade, vinha deixar sem margem para dúvidas que aquilo que. será votado, no final, não tem rigorosamente nada a ver com aquilo que querem que seja votado neste momento.
Isto é, iria sublinhar aquilo que já aqui foi chamado de duplicidade de voto, iria sublinhar o significado que em de desrespeito às instituições, aos órgãos de soberania e ao próprio Governo, a duplicidade de um voto que sendo sim quer dizer não.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - O Sr. Deputado César Oliveira não fez nenhum pedido de esclarecimento, mas agradeço as suas palavras.
Sr. Deputado Raúl Rêgo, quando falei - talvez devido ao barulho existente na Câmara não tivesse ouvido bem- duas vezes na República de Weimar, não eram propriamente as minhas palavras que estava a ler.
Era um parecer do Prof. Ingo Maller em que ele citava a lei de segurança interna da República de Weimar dessa altura, pouco antes de 1930, e tirava a ilação de que teria sido uma lei de segurança desse género um dos motivos porque a Alemanha caiu no nazismo.
Por outro lado, Sr. Deputado, citei o seu nome porque desde sempre foi publicamente conhecido como antifascista, que sempre lutou pela liberdade, e foi nessa medida e como homenagem ao seu passado, e até ao seu presente, que citei o seu nome.
O Sr. Deputado Silva Marques não gostou que tivesse citado o seu nome, exactamente, nessa qualidade.
Julgava que o Sr. Deputado Silva Marques continuava, como no tempo em que era jovem e estávamos em Coimbra, a luta pela democracia e pelas liberdades, tanto mais que sofreu na carne, esteve preso, e fez na altura uma espectacular evasão da PIDE do Porto. Julguei que esse núcleo essencial da personalidade e da vida de um homem se tivesse mantido pela vida fora.
No entanto, não cheguei muito bem a perceber o seu protesto, suponho que não se sentiu bem ao lado dos antifascistas e dos democratas que citei.
O problema é seu Sr. Deputado.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, é evidente que esta questão e esta votação não é uma questão de gerações. O eu ter chamado à colação de alguns deputados desta Câmara, que foram meus companheiros dessa geração, foi só, talvez, uma questão sentimental, mas não é efectivamente esse o problema que temos aqui. Foi também uma questão de demonstrar que, apesar de muitas divergências políticas, há alguma coisa de constante e de essencial em todos nós dessa geração, que é esse amor à liberdade.
Mas indo à questão fundamental que me põe, referente às propostas de alteração, seria efectivamente curial e normal que, tendo sido anunciadas por alguns intervenientes neste debate várias alterações que eram indispensáveis para a vocação da própria proposta de lei e tendo sido referido que entendiam e iriam votar essa proposta de lei, não como ela está depositada na Mesa da Assembleia da República, mas no sentido das alterações que referiam nos seus discursos, como o Sr. Deputado disse, essas alterações já deviam ter a letra de forma e deveriam entrar antes da votação na generalidade, porque só assim se dava um cariz sério a essas propostas de alteração.
No entanto, perguntava-lhe por minha vez. Sr. Deputado, se não seria mais curial, tendo até alguns membros do Governo - pelo menos um - posto também o problema de importantes alterações a serem feitas na proposta de lei, que o Governo retirasse esta proposta e apresentasse imediatamente outra em que já estivessem incluídas essas alterações.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pede a palavra para que efeito?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Para exercer o direito de defesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.

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O Sr Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado António Taborda, vou exercer o meu direito de defesa da forma mais descontraída, porque depois da razão da minha emoção de há pouco -aliás, sã, como decerto compreendeu, e sem incompatibilidade com uma grande amizade pessoal - é o momento da descontracção.
Evadi-me sim da cadeia, mas que tem isso a ver com o que estamos a discutir! Evadi-me da cadeia da ditadura e se a democracia me prender espero que ela feche melhor a porta.
De qualquer modo, isto tem uma certa relação com o tema, porque o principal ferrolho das cadeias relativamente àqueles que se colocam numa posição de ilegalidade, não é a cadeia propriamente dita, não é o ferrolho, porque como se viu - e eu sou disso exemplo pudico - , não há ferrolho que seja sólido quando ele é o ferrolho da ditadura. O ferrolho mais sólido é o da democracia e o da fidelidade aos princípios do Estado democrático e pluralista. Só aí tem sentido a ilusão e os valores dos direitos, liberdades e garantias.
Se o Sr Deputado o não compreendeu há bocado, não tenho a menor dúvida de que agora ficou esclarecido

O Sr. José Magalhães (PCP): - Fale da proposta!

O Orador: - Não podia acabar sem estareferência, na medida em que o Sr. Deputado tocou na corda do sentimento, um pouco a guitarra fadista. De facto, não me sinto bem ao lado dos antifascistas que não são democratas.

Aplausos do PSD

O Sr. Presidente: - O Sr Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que eleito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS) - Para um protesto, Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS) - É um protesto que é, afinal, uma resposta à questão que o Sr. Deputado me colocou.
Entendo que o que teria sido mais curial, neste momento, era a baixa à Comissão, como aliás eu e o Si Deputado tivemos ocasião de requerer e que foi recusado pela Assembleia.

O Sr. Presidente: - Foi entregue aos Srs. Deputados uma copia de um parecer da Assembleia Regional dos Açores que foi recebido nesta Assembleia, e que se referia a proposta e aos projectos de lei em discussão.
Está na Mesa um requerimento que penso ter de pôr à votação do Plenário, dado que ele implicaria, digamos, a suspensão da discussão desta proposta de lei e dos projectos de lei que lhe seguem.
O requerimento, cujo primeiro signatário é o Sr. Deputado Jorge Lemos, é redigido nos seguintes termos. «Sr Presidente da Assembleia da República, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, requerem a V. Ex.ª que nos termos do artigo 231.º da Constituição, seja solicitado o parecer à Assembleia Regional dos Açores sobre a proposta de lei n.º 71/III e sobre os projectos de lei n.ºs 367/III e 370/III, uma vez que o documento recebido, e que se anexa ao presente requerimento, não corresponde às exigências das disposições constitucionais aplicáveis

O Sr Deputado José Luís Nunes pediu a palavra?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, pareceu-me ter ouvido que esse requerimento se dirige a V. Ex.ª?

O Sr Presidente: - Com efeito, Sr Deputado.

O Sr José Luís Nunes (PS): - A questão que o Sr. Deputado Jorge Lemos põe refere-se ao problema da comunicação da Assembleia Regional dos Açores, em que efectivamente existem dois pontos.
Um ponto diz: «A Comissão para os Assuntos Políticos e Administrativos da Assembleia Regional dos Açores reuniu...para dar parecer ..» Mas depois diz no ponto dois. «A Assembleia Regional pronuncia-se sobre aquelas iniciativas legislativas, nos termos »
Não há dúvida nenhuma que não está claro de onde é oriundo este documento, se da Assembleia Regional dos Açores ou se da comissão.
Neste sentido, sugeríamos ao PCP que tivesse uma modificação no seu requerimento - que não tem de ser votado aqui porque se dirige ao Si. Presidente - , no sentido de o Sr. Presidente da Assembleia da República saber se este documento é um documento da Assembleia Regional ou um documento da comissão
Se é um documento da Assembleia Regional, deve ser considerado, se é um documento da Comissão, embora desconhecendo quais são as disposições que regem a Assembleia Regional dos Açores em período de férias, não pode obviamente ser considerado e terá de ser pedido outro parecer

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção do Sr. Deputado José Luís Nunes, que este documento que contem o parecer da Comissão para os Assuntos Políticos e Administrativos da Assembleia Regional dos Açores, vem assinado pelo presidente da Comissão e pelo presidente da Assembleia Regional

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Por isso mesmo Sr. Presidente e que existe uma ambiguidade no n.º 1 diz-se, que «A Comissão para os Assuntos Políticos», no n.º 2 diz-se que «A Assembleia Regional pronuncia-se sobre aquelas iniciativas.»
Se este documento não está devidamente clarificado como um documento da Assembleia Regional, tem de ser obviamente corrigido. Portanto, era bom que a Assembleia Regional dos Açores esclarecesse este ponto. Até esse momento este documento não corresponde aquilo que está determinado no artigo 231.º da Constituição, porque a Comissão não é um órgão de poder regional

O Sr. Presidente: - O Sr Deputado Jorge Lemos pediu a palavra?

O Sr. Jorge Lemos (PCP) - Sr. Presidente, gostaria de clarificar que há pouco tentei, em interpelação que fiz a V. Ex.ª e à Mesa, pôr precisamente as questões que o Sr. Deputado José Luís Nunes está agora a colocar
Não me compete a mim clarificar o que claro está.
O que foi distribuído foi um ofício do presidente da Assembleia Regional dos Açores que capeava uma tomada de decisão de uma comissão da assembleia, num documento identificado como tal, subscrito pelo presidente dessa comissão específica
A questão que eu coloquei a V. Ex.ª foi a de não estarem reunidas as condições constitucionalmente previstas, para se considerai um tal parecer como parecer do órgão de governo próprio da Região Autónoma dos Açores.

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Alias, Sr. Presidente, permita-se que lhe diga que para nós é preocupante que o Sr. Presidente da Assembleia Regional dos Açores confunda, sistematicamente, o que ião poderes da assembleia regional com a sua simples assinatura em documentos, como se verificou há dias com o recurso da assembleia regional que não tinha reunido para recorrer fosse do que fosse.
Daí a minha interpelação para clarificai este estado de coisas, daí o requerimento que dirigi a V. Ex.ª e que V. Ex.ª, e bem, está a pôr à consideração da Câmara

O Sr José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr Deputado

O Sr José Luís Nunes (PS) - É evidente que sobre esta questão podemos pôr-nos rapidamente de acordo.
O ofício que capeia diz o seguinte. «Consultando, ao abrigo do artigo [...], a Assembleia dos Açores emite o seu parecer que, nos termos do artigo 193.º do seu Regimento, e o da Comissão para os Assuntos Políticos e Administrativos, a qual apreciou aqueles textos e não lhes sugere alterações.»
Depois o texto da Comissão para os Assuntos Políticos e Administrativos, no seu n.º 2, fala em nome da Assembleia Regional.

O Sr. Jorge Lemos (PCP) - E mal!

O Orador: - Como isto e uma questão de constitucionalidade e na defesa dos próprios interesses da autonomia regional, creio que sem necessidade de se estar a proceder a uma votação, bastaria que o Sr. Presidente esclarecesse o sentido deste despacho junto do Sr. Presidente da Assembleia Regional dos Açores, e nada mais.

O Sr Nogueira de Brito (CDS) - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr Nogueira de Brito (CDS) - Sr Presidente, na sequência da sugestão feita pelo Sr Deputado José Luís Nunes, sugeria a V. Ex.ª que também tentasse um esclarecimento sobre o sentido do parecer da Assembleia Regional dos Açores, no que respeita ao projecto de Lei do CDS e ao projecto de Lei da ASDI, pois que no n.º 3 do parecer da Comissão diz-se que foram apreciados os três textos, mas depois no n.º 4 e no n.º 5 não há qualquer indicação aos textos do CDS e da ASDI.
Portanto, fazia esta sugestão, a acrescentar à feita pelo Sr Deputado José Luís Nunes e na linha por ele sugerida

O Sr José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr Presidente

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD) - Sr. Presidente, creio que não há razão para qualquer incidente sobre esta matéria. Se, de facto, há dúvidas de alguns Srs. Deputados em relação ao parecer que vem da Assembleia Regional dos Açores, então o que haverá que fazer é apenas o que foi sugerido, queira o Sr. Presidente ter a bondade de diligenciar junto do Sr Presidente da Assembleia Regional dos Açores para clarificar essas dúvidas.
Assim, creio que o assunto se deverá dar por encerrado Isto não causa problemas, não impede que a discussão continue e que a votação se taça podendo o parecer chegar mesmo em qualquer altura, inclusivamente durante o debate na especialidade Assim, devemos passar rapidamente sobre esta matéria enquanto esse requerimento fica à consideração do Sr Presidente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr Jorge Lemos (PCP): - Sr Presidente, creio que a posição do Partido Comunista e do seu grupo parlamentar está clara.
Suscitámos a questão em interpelação à Mesa, não obtivemos resposta de V. Ex.ª na aluna - e não vale a pena estarmos a voltar a isso - e apresentamos um requerimento. O nosso objectivo e que sejam cumpridas as disposições constitucionais, quanto à emissão de parecer pelo órgão de governo próprio da legião, ou seja, pelo plenário da Assembleia Regional.
É tão-só isto que queremos e o que V. Ex.ª entender mais adequado para que tal desiderato seja cumprido vem no sentido do que pretendemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Srs Deputados, creio poder deduzir que estão todos de acordo em que a Mesa da Assembleia da República ou eu próprio esclareça com o Sr. Presidente da Assembleia Regional este problema.
Os termos em que o requerimento do PCP era apresentado obrigaram-me a fazer esta consulta à Câmara, porque isto podia ser considerado, até, como uma impugnação no sentido de que estávamos a aprovar qualquer projecto ou proposta que não fosse constítucional
No entanto, como não é o caso, procurarei esclarecer o assunto com o Sr. Presidente da Assembleia Regional dos Açores e depois comunicarei a resposta que recebi.
Para uma intervenção, tem a palavra o Si Deputado Lino Lima.

O Sr Lino Lima (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados Vou preceder o discurso que trazia escrito por algumas considerações sobre os direitos fundamentais.
Hoje ninguém nega os direitos fundamentais Os direitos fundamentais fazem já parte do património cultural da humanidade, que e alguma coisa mais do que o seu património político, e em toda a parte se põe o problema dos direitos fundamentais.

Vozes do PSD: - Especialmente na Rússia!

O Orador: - A questão que está por resolver a nível da humanidade não é de os enunciar, mas de os realizar, de os concretizar.

Aplausos do PCP

De certo modo, pode dizer-se que a luta que caracteriza hoje o nosso mundo entre o socialismo e o capitalismo ...

O Sr. José Vitorino (PSD): - Já estragou tudo!

O Orador: - ..., é a luta pela realização e pela concretização dos direitos fundamentais, a vitória, essa. pertencerá àqueles que efectivamente os realizam.

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Ora, não podem pensar e dizerem-se defensores dos direitos fundamentais aqueles que aceitaram o desemprego, aqueles que aceitaram que os povos industrializados explorem de uma maneira brutal os povos atrasados, roubando-lhes as suas matérias-primas, porque lhas pagam por preços ínfimos e reduzem, portanto, esses povos a situações de fome.

Protestos do PS, cio PSD e do CDS.

Quem é que defende os direitos fundamentais desses povos?
Não podem nem têm o direito de falar em direitos fundamentais aqueles que aceitam uma sociedade que tem a prostituição organizada a terríveis níveis.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Na Rússia como é que é?!...

O Orador: - Não podem falar em direitos fundamentais aqueles que apoiam uma civilização que consente bairros de lata.
Não podem falar em direitos fundamentais aqueles que não propiciam aos povos condições de cultura, até porque hoje, na nossa democracia, na democracia moderna, mais do que o direito de voto - e é, sem dúvida nenhuma, muito importante os cidadãos poderem escolher...

Uma Voz do PSD: - É preciso ter lata!

O Orador: - ... há uma questão muito importante que é o direito dos cidadãos participarem; e só participam aqueles cidadãos que, efectivamente, adquirem na sociedade certas condições materiais de existência que lhe permitem a cultura e que lhe permitem participar na vida social e política do seu povo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É como na Rússia!

O Orador: - Srs. Deputados, não tenho muito tempo, mas gostaria de terminar estas minhas considerações dizendo que nós, comunistas, não recebemos lições de luta pela liberdade de ninguém.

Aplausos do PCP.

Protestos do PS, do PSD e do CDS.

De toda a parte, desde o 5º Regimento em Madrid até à França ocupada, nas Américas Latinas, aqui em Portugal, em todo o sítio, os comunistas têm estado sempre na primeira fila da defesa das liberdades.

Aplausos do PCP.

Protestos do PS, do PSD e do CDS.

E não é por acaso que os reaccionários de extrema-direita vos poupam a vocês e nos atacam a nós.

Protestos do PS, do PSD e do CDS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: já está tudo esclarecido acerca desta proposta de lei do Governo presidido pelo Dr. Mário Soares. Já não há nada escondido, .ninguém engana ninguém ao votá-la ou reprová-la, todos temos cabimento das suas monstruosas inconstitucionalidades. Todos temos consciência do que será esta lei, para que serve, quais os fins que pretende alcançar, quem é objecto principal das suas medidas. Todos sabemos quais os telefones que se querem escutar," que correspondência se quer interceptar, quem se pretende vigiar, que pessoas se querem perseguir e que manifestações se desejam proibir. Todos sabemos que esta lei se destina fundamentalmente aos adversários políticos do Governo e àqueles que usam as liberdades para o combater. Todos sabemos que esta lei celerada se destina sobretudo aos trabalhadores - a quem não pagam os salários e a quem não dão emprego - e que, por isso mesmo, gritam a sua fome para ver se há quem os ouça. Todos sabemos que nesta proposta de lei o combate ao terrorismo e aos terroristas não é o seu fim fundamental mas «a peninha para disfarçar os seus reais objectivos». Todos sabemos que esta proposta de lei é terrorista, faz parte -juntamente com a lei do serviço de informações e a da informática para fichar os cidadãos - do projecto autoritário que o Governo presidido pelo Dr. Mário Soares pretende implantar no nosso país para dominar aqueles que não aturam nem a sua política, que o criticam e o combatem, que se opõem aos seus projectos, aos seus desígnios e às suas ambições. Todos sabemos que esta lei representa um corte radical com os direitos, liberdades e garantias que a democracia implantada no 25 de Abril garantiu ao povo português e o regresso a métodos e processos de luta política, de perseguições políticas, contra os quais vários de nós, ainda aqui presentes nesta Câmara, lutámos durante uma vida inteira. Luta essa, passado esse, que aqui e fora daqui continuava a unir-nos até hoje, mesmo quando nos separavam concepções políticas diferentes, mesmo quando nos combatíamos. Ainda nesses momentos havia entre nós esse património comum da mesma luta pelas liberdades, pelo direito de livre manifestação e reunião, pelo fim dos métodos pidescos, contra as escutas telefónicas e a intercepção da correspondência, contra a invasão do domicílio sem um mandado judicial, contra polícias e bufos que nos prendiam, nos seguiam, nos vigiavam. Juntos, demos combate a tudo isso durante dezenas de anos e essa luta comum unia-nos, mesmo separados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Agora, será que também isso se vai romper. Apesar das palavras de bom senso de alguns desses antigos companheiros, do Sottomayor Cardia -que estou a lembrar imobilizado durante semanas numa cama, com os olhos vendados porque a polícia o tinha agredido tão violentamente que ia ficando cego - e do Manuel Alegre -o poeta da «Praça da Canção», alguns de cujo poema me chegaram às mãos e li ainda antes de publicados em livro - e de outros deputados da bancada socialista para quem esse passado é uma ordem para o presente, como já aqui disse há dias o deputado Manuel Alegre. Mas onde estão outros desses combatentes? Onde está o António Macedo, meu companheiro de quarto na prisão da PIDE, no Porto?

Uma Voz do PS: - Está ali a ouvi-lo!

O Orador: - E outros, vários outros, que daqui estou a ver e acerca dos quais tenho recordações de lutas comuns? E esses irão votar favoravelmente uma proposta de lei que quer restabelecer aquilo que combateram? Restabelecer aquilo contra o qual lutaram com tenacidade e brio durante meio século?
Não gostaria de vos dizer tudo isto, mas não o posso calar. Se esta lei terrorista porventura algum dia viesse a entrar em vigor com os vossos votos -quando sentisse que o meu telefone era escutado, quando soubesse

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que a minha correspondência era lida por estranhos, quando me visse seguido por um polícia e vigiado por um bufo mandar-vos-ia um telegrama de pêsames pela morte do vosso passado.

Uma Voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto, porém, são questões pessoais e sentimentais, mas para além delas outras existem. Os actos dos homens públicos não são inocentes e ninguém consente que o sejam. Uma vez praticados, há aqueles que marcam numa vida e às vezes se prolongam para além dela. As opções dos homens públicos pagam-se. Lembro-me, por exemplo, do voto de confiança ao marechal Pétain: após a derrota militar inicial da França na última guerra e da sua ocupação pelas forças nazis, o Parlamento Francês foi convocado irregularmente para legislar a tomada do poder pelo marechal que tinha o apoio dos alemães. Leon Blum, entre outros, negou a confiança. Foi perseguido, mas salvou a sua honra, a do seu partido e a da própria França; a maioria, porém, concedeu a confiança. A história condenou-os e aqueles que a deram nunca mais se viram livres desse ferrete. Vivos, quando morreram, mesmo depois da morte, sempre foram lembrados e apontados por esse acto que passou a ser o seu brazão de ignomínia. Pois bem, creio que com a votação desta proposta de lei vai suceder o mesmo. Depois de meio século de ditadura, o 25 de Abril deu ao povo a possibilidade de gozar as liberdades. E a Constituição -que os socialistas e o Partido Socialista sempre se vangloriaram de ser a sua Constituição - consagrou essas liberdades como direitos inalienáveis. De repente, esses mesmos socialistas, esse mesmo Partido Socialista, através de um governo presidido pelo seu secretário-geral, vêm tentar repor o regime de arbitrariedades que os fez sofrer durante o fascismo, vem querer cortar o exercício das liberdades, vem pretender estabelecer um conjunto de medidas que caracterizam os processos de perseguição do fascismo. O espectro das polícias a entrarem de rompante nas nossas casas ao nascer do dia, a escutarem às nossas portas, a abrirem a nossa correspondência, a proibirem manifestações e reuniões paira de novo em Portugal. Toda a gente o sente e eu creio que poucos perdoarão àqueles que aqui, neste Parlamento, com o seu voto, o permitirem.
Dos tempos do fascismo ainda há lágrimas que não secaram em muitos olhos e dores que não se apagaram em muitos corações. Quem vai perdoar àqueles que agora querem fazer correr novas lágrimas e provocar novas dores?
Para mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta lei - além de ser uma lei celerada - é uma lei fedorenta. Quer se queira quer não, ela fede que tresanda aos «curros» do Aljube, esses gavetões imundos onde a PIDE metia os presos. Quer se queira quer não, esta lei fede que tresanda ao último andar do edifício da Rua de António Maria Cardoso onde os presos eram interrogados e torturados pela PIDE. Esta lei tem o fedor característico das prisões fascistas, só que agora esse cheiro não vai pregar-se à pele e à roupa de novos presos: não haverá novos presos políticos, por muito que isso pese ao governo.
O povo, as instituições, os democratas portugueses não o consentirão e o projecto sinistro não se concretizará. Por isso, serão outros a carregar com o fedor desta lei, a arrastar essa fedentina prova junto da mulher, dos filhos e dos netos e a levá-la pelas ruas. E não haverá perfume que a apague, porque não há vaidades, não há ambições, não há ódios que justifiquem a apresentação desta proposta de lei, e não há amizades, não há solidariedades, não há disciplinas que justifiquem aprová-la. Esta proposta de lei é uma monstruosidade jurídica, política e moral.
Como já aqui tem sido dito e repetido, ninguém assume a sua autoria, ninguém a defende e todos lhe põem defeitos e vícios. Mais: é evidente que todos a temem por esta razão ou por aquela. Há, porém, quem a vá votar na generalidade... sob a condição dela ser alterada profundamente na especialidade. Mas não há ninguém que especifique, que discrimine, com garantia idónea quais serão essas alterações. Quer dizer, há quem se disponha a hipotecar-se por um valor que não conhece; há quem queira ser ingénuo e fazer de ingénuo. Mas há também quem se recuse a isso, quem não queira hipotecar-se, quem compreenda que uma proposta de lei não é um bilhete de lotaria. Há quem compreenda que todos nós merecemos o respeito de nos apresentarem obras limpas e esta Assembleia merece o respeito de não lhe trazerem para aqui papel sujo.

Aplausos do PCP.

Sim, papel sujo. O que estão a dizer aos deputados é que votem um papel sujo de palavras que não valem nada, um papel que se destina ao caixote do lixo, porque depois, então sim, é que virá um papel com as palavras exactas. Quem aceita esta habilidade? Quem aceita esta vergonha? Nós, comunistas, não aceitamos. E por isso votamos contra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - O Sr. Deputado Lino Lima referiu que se não pode falar em direitos, liberdades e garantias fundamentais e aceitar o desemprego, a exploração colonial e o analfabetismo.
Disse que o problema que hoje se coloca nos nossos dias é o do aprofundamento dessas liberdades desses direitos e dessas garantias. E que não basta, no fundo, permitir o exercício do direito de voto, mas que é necessário aprofundar e dar um verdadeiro sentido de participação a esse direito de voto.
A pergunta que lhe fazia, avançando que estou absolutamente de acordo consigo, é se o Sr. Deputado entende que é possível falar em direitos, liberdades e garantias fundamentais, aceitando a censura, o partido único e a proibição do direito de associação. Pergunto se é possível aprofundar o significado do voto, retirando o direito real de voto e se é possível defender, no fundo, o aprofundamento dos direitos, liberdades e garantias fundamentais começando precisamente por os negar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Penso que não e é exactamente por isso, independentemente de qual seja a política deste governo no domínio do emprego, da justiça social e da educação - isso é uma outra discussão - que voto contra a proposta de lei apresentada pelo Governo.
É que não há nada que justifique que se coarctem os direitos, liberdades e garantias fundamentais e muito menos que tal se faça em nome de um pretenso aprofundamento desses direitos, dessas liberdades e dessas garantias.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.

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O Si. Lino Lima (PCP) - Sr Deputado Lopes Cardoso, compreendo as perguntas que me fez e estou de acordo com elas

Vozes do PSD: - Olhe que ainda vai para a rua!

O Orador: - Estou de acordo, também, com a resposta que o Si Deputado não adiantou, mas que porventura está implícita nas perguntas que me fé?.
A questão que se põe, também, e a de saber como é que em muitos sítios e em muitos lugares se chegou a determinadas situações e conhecer as justificações históricas

O Sr Narana Coissoró (CDS): - Responda às perguntas, Sr Deputado

O Orador: - Por outro lado. Si. Deputado Lopes Cardoso, quero-lhe di/er que se efectivamente não houvesse neste mundo uma luta brutal, se os países socialistas não estivessem cercados

Risos do PS, do PSD e do CDS

Aqueles Srs Deputados não sabem que há bases americanas desde a Alemanha Federal à Turquia, à Grécia, etc.

Risos do PS, PSD e CDS.

O Sr Narana Coissoró (CDS) - E na Hungria, Checoslováquia, Angola e Cuba, por exemplo.

O Orador: - E que nos Açores não são bases soviéticas que lá estão, mas sim americanas!

Risos do PS, PSD e CDS.

Se nessa luta não houvesse necessidades fundamentais de segurança, em muitos países já se teriam dado aprofundamentos e passos muito importantes no sentido daquilo que as próprias pessoas desejam.
Eu disse, Sr. Deputado, que ainda ninguém hoje realizou e concretizou os direitos humanos. Mas não aceito que aqueles que estão efectivamente metidos num mundo onde se revela todos os dias a falta permanente e constante dos direitos do homem, os invoquem.
O Sr Deputado Lopes Cardoso já viu estes deputados que aqui se riem protestarem, ao menos uma vez, nesta Câmara, por esse cúmulo de ignomínia que é obrigar um cidadão a trabalhar e no fim não lhe pagar o salário?
O Sr Deputado já reparou na lógica destes Srs Deputados, que falam muito nos direitos, liberdades e garantias, mas vão aqui aprovar uma lei que os coarcta?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Lacerda Queiroz (PSD) - Muito mal!

O Sr Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr Deputado António Rebelo de Sousa.

O Sr António Rebelo de Sousa (PS) - Sr. Presidente, depois de ter ouvido o Sr Deputado do PCP, queria começar por dizer que julgo interpretar as preocupações da bancada do PS quando sou o primeiro a afirmar que também pensamos que há direitos e liberdades fundamentais que têm que ser necessariamente respeitados
Contrariamente aquilo que é o pensamento do deputado Lopes Cardoso, julgamos que no seguimento das intervenções ficámos suficientemente esclarecidos quanto à intenção que existe, no sentido de, através das alterações que vão ser introduzidas na especialidade, se conseguir garantir o respeito dessas mesmas liberdades fundamentais.
Mas já agora, queria colocar ao Sr Deputado do PCP algumas questões.
Sei que vou ser um bocado contra as tendências nacionalistas e não internacionalistas do PCP, que não gosta de se pronunciar sobre questões relacionadas com a América Latina ou com outras regiões do Mundo, mas apenas de tecer considerações sobre a situação política nacional. Todavia, gostava de obter da parte do Sr. Deputado uma resposta muito concreta

O Sr. Carlos Brito (PCP) - Fale da proposta de lei!

O Orador: - Pensa o Sr Deputado que a busca domiciliária em casa, por exemplo, do sindicalista Walesa é razoável e convincente ou não? Pensa o Sr Deputado que as escutas telefónicas dos dirigentes do Solidariedade na Polónia é razoável ou não?

Protestos do PCP.

Pensa o Sr Deputado que a proibição das manifestações do Solidariedade na Polónia é razoável ou não?
Ou será que o texto da proposta do Governo, tal como se encontra formulado, já seria justificável tendo como Primeiro-Ministro o Sr. ex-Primeiro-Ministro Vasco Gonçalves e estando Portugal cercado por Filipe Gonzalez e pelo seu Governo, por Mitterrand e o seu Governo altamente reaccionário, justificando isso a adopção de medidas quê no entendimento do Sr Deputado seriam consideradas menos democráticas?
Para esta questão, Sr Deputado, não quero uma evasiva da sua parte, mas que diga claramente sim ou não. Se concorda ou não, nas presentes circunstâncias e nas presentes condições, com as buscas domiciliárias a Walesa e com a proibição de manifestações do Solidariedade na Polónia.

Protestos do PCP

Ou, então, teremos de concluir que o Sr Deputado apenas tem uma ideia clara sobre aquilo que é a situação política do nosso país e apenas está permitido a tomar posições sobre as questões que se passam, não podendo por qualquer outro motivo, eventualmente porque a sua direcção partidária não o permite, tecer considerações sobre a situação nos outros países

Aplausos de PS e do PSD Protestos do PCP

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP) - O Sr Deputado Rebelo de Sousa está muito preocupado com o Sr Walesa

O Sr. Lacerda Queiroz (PSD). - E com razão!

O Orador: - Mas punha-lhe esta questão, por que é que o Sr. Deputado não se preocupa com a situação dos trabalhadores portugueses?

Risos do PS e do PSD.

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Sr. Deputado, não me importo nada de discutir consigo, ali fora, na presença de quem quiser, esta questão que pôs.

Agora o que não aceito, e o Sr. Deputado não me leva com essa, é arranjar aqui uma manobra para distrair a atenção da Câmara da situação em que se encontra o PS e os deputados socialistas ao aprovarem esta lei monstruosa.

Aplausos do PCP.

Para essas manobras o Sr. Deputado não conte comigo. Agora, se quiser discutir esse assunto ali fora, depois do debate, pode escolher quem quiser para assistir a essa conversa, que estarei pronto para o fazer
Já sou bastante mais velho que o senhor. Não sei se terei mais conhecimentos, mas tenho experiência. E a seu respeito, naturalmente que não teria dificuldade nenhuma em dizer-lhe algumas coisas que não lhe seriam muito agradáveis!..

Aplausos do PCP.

O Sr. {Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr Deputado Lopes Cardoso.

O Sr Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs Deputados, Sr Deputado Lino Lima. Creio que a sua intervenção colocou uma série de questões extremamente importantes e interessantes, que me seria extremamente agradável debater com o Sr Deputado, nomeadamente tudo aquilo quanto diz respeito ao aprofundamento real da democracia. Não é este, no entanto, o momento nem a sede.
Mas o Sr. Deputado colocou-me uma questão, que lógica há por parte daqueles que aprovam a proposta de lei do Governo -e quando falo em aprovar a proposta de lei do Governo refiro-me à aprovação da proposta em concreto e não às intenções do Governo, porque não são essas que vamos votar (até admito que venha a votar a tal proposta que sairá um dia, mas não sei qual é!) - e aqueles que condenam o que se passa, nomeadamente, na Polónia? Dir-lhe-ei que do meu ponto de vista não tem lógica nenhuma. Tem uma lógica tão incompreensível como a daqueles que condenam o que se passa na Polónia, mas se calam perante o que se passa na Nicarágua e a daqueles que condenam o que se passa na Nicarágua e ficam calados perante aquilo que se passa na Polónia

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Si Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, aquilo que enunciou é um princípio da lógica de classes que está efectivamente presente na vida política Há pessoas que são extremamente cínicas e querem esconder que actuam de harmonia com uma lógica de classes. Mas actuam de verdade com essa lógica. O cinismo fica com eles, que defendem determinadas coisas Pela minha parte, defendo outras.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Rebelo de Sousa.

O Si António Rebelo de Sousa (PS): - Sr Presidente, o meu protesto tem algumas razões fundamentais, que enunciarei.

Em primeiro lugar, protesto pelo simples facto de o Sr Deputado não ter chegado a respondei a minha pergunta, como certamente convirá.
Em segundo lugar, protesto porque contrariamente ao que o Sr. Deputado disse - e aqui está também implícito um convite ao Sr. Deputado, que desde já formulo na presença de todos os Srs. Deputados - penso que há certas questões que têm que ser discutidas aqui frontalmente e não lá fora E até laço o convite ao Sr Deputado, se é que em relação à minha pessoa podei ía dizer algumas coisas menos agradáveis e menos simpáticas, que o fizesse não lá fora, mas aqui no Plenário, na frente de todos.

Aplausos do PS e do PSD

Finalmente, queria terminar dizendo que depois de ter ouvido a interrogação do Sr Deputado, cada vê/mais me vou convencendo de que as convicções democráticas do PCP parecem ter começado a surgir em Julho de 1984 e parecem também acabai na fronteira portuguesa.

Aplausos do PS e do PSD

O Sr. Presidente: - Para respondei, tem a palavra o Si. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP). - Sr. Presidente, era para dizer que aqui não chegaram vozes nenhumas!

Aplausos do PCP

O Sr Presidente: - Srs Deputados, chegou à Mesa um requerimento do seguinte teor «Ao abrigo do disposto no artigo 109.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados abaixo assinados requerem a votação nominal para a votação na generalidade da proposta de lei n.º 71/III Segurança Interna e Protecção Civil» Seguem-se as assinaturas e o primeiro signatário é o Sr Deputado Carlos Brito
Vamos proceder à votação do requerimento

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vozes do PSD: - Ninguém tem medo!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, declaro encenado o debate e vai proceder-se, primeiro, à votação nominal da proposta de lei n.º 71/III
Procedeu-se à chamada, o resultado foi o seguinte:

Abel Augusto de Sousa Gomes Almeida (CDS)
Abílio Aleixo Curto (PS)
Abílio Mesquita Araújo Guedes (PSD)
Acácio Manuel de Frias Barreiros (PS)
Adriano José Alves Moreira (CDS)
Agostinho Correia Branquinho (PSD)
Agostinho Jesus Domingues (PS).
Alberto Manuel Avelino (PS).
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa (PS).
Alexandre Carvalho Reigoto (CDS)
Alfredo Albano Azevedo Soares (CDS)
Almerindo da Silva Marques (PS).
Álvaro Favas Brasileiro (PCP)
Amândio S. C. Domingues Basto Oliveira (PSD).
Amália Cavaleiro M. de A. de Azevedo (PSD)
Américo Albino da Silva Salteiro (PS).
Anacleto da Silva Batista (PSD).
António Anselmo Aníbal (PCP)
António Augusto Lacerda de Queiró? (PSD)

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6344 I SÉRIE-NÚMERO 145

António Borja dos Reis Borges (PS).
António Cândido Miranda Macedo (PS)
António César Gouveia de Oliveira (UEDS)
António Costa (PS).
António Dias Lourenço da Silva (PCP).
António Domingues de Azevedo (PS).
António D'Orey Capucho (PSD)
António Frederico Vieira de Moura (PS).
António Gonçalves Janeiro (PS).
António Guilherme Franco Gonzalez (PCP)
António Joaquim Bastos Marques Mendes (PSD).
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa (PS).
António José Bagão Félix (CDS).
António José Cardoso Silva (PCP)
António José Gomes Pinho (CDS)
António José Monteiro Vidigal Amaro (PCP).
António José dos Santos Meira (PS).
António Manuel Carmo Saleiro (PS)
António Mana de Orneias Ourique Mendes (PSD).
António Monteiro Taborda (MDP)
António Mota (PCP).
António Nascimento Machado Lourenço (PSD).
António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).
António Roleira Marinho (PSD)
António Sérgio Barbosa de Azevedo (PSD).
Armando Martins Vava (PS).
Armando Domingos Ribeiro de Oliveira (CDS)
Arménio dos Santos (PSD).
Avelino Feliciano Martins Rodrigues (PS).
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca (CDS)
Beatriz Almeida Cal Brandão (PS).
Belchior Alves Pereira (PCP)
Belmiro Moita da Costa (PS)
Bento Gonçalves da Cruz (PS).
Carlos Alberto da Costa Espadinha (PCP)
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas (PCP).
Carlos Alfredo de Brito (PCP).
Carlos Augusto Coelho Pires (PS).
Carlos Cardoso Lage (PS)
Carlos Justino Luís Cordeiro (PS)
Carlos Luis Filipe Gracias (PS)
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho (PSD)
Cecília Pita Catarino (PSD)
Cristóvão Guerreiro Norte (PSD).
Custódio Jacinto Gingão (PCP)
Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD).
Dinis Manuel Pedro Alves (PS)
Domingos Duarte Lima (PSD).
Edmundo Pedro (PS).
Eleutério Manuel Alves (PSD).
Eugénio Mana Nunes Anacoreta Correia (CDS).
Eurico Faustino Correia (PS).
Eurico José Carvalho Figueiredo (PS).
Fernando Alberto Pereira de Sousa (PS).
Fernando Fradinho Lopes (PS)
Fernando José Alves Figueiredo (PSD).
Fernando José da Costa (PSD)
Fernando José R. Roque Correia Afonso (PSD).
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira (PSD).
Fernando Monteiro do Amaral (PSD).
Fernando dos Reis Condesso (PSD)
Francisco António Lucas Pires (CDS).
Francisco Antunes da Silva (PSD).
Frederico Augusto F. Handel de Oliveira (PS).
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues (PS).
Francisco Igrejas Caeiro (PS).
Francisco Lima Monteiro (PS).
Francisco Manuel Costa Fernandes (PCP).
Francisco Manuel de Menezes Falcão (CDS).
Francisco Miguel Duarte (PCP)
Gaspar de Castro Pacheco (PSD).
Gaspar Miranda Teixeira (PS).
Georgete de Oliveira Ferreira (PCP)
Gil Conceição Palmeiro Romão (PS)
Guido Orlando Freitas Rodrigues (PSD)
Helena Cidade Moura (MDP).
Henrique Manuel Soares Cru? (CDS).
Hermínio Martins Oliveira (PS)
Hernâni Torres Moutinho (CDS).
Horácio Alves Marçal (CDS)
Jaime Adalberto Simões Ramos (PSD)
Jerónimo Carvalho de Sousa (PCP)
João Alberto Ribeiro Rodrigues (PCP).
João de Almeida Eliseu (PS).
João Amaral (PCP)
João António de Morais Silva Leitão (CDS)
João António Torrinhas Paulo (PCP).
João Carlos Abrantes (PCP).
João Carlos D. M. Coutinho de Lencastre (CDS)
João Corregedor da Fonseca (MDP).
João Domingos Abreu Salgado (PSD)
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu (PS).
João Evangelista Rocha de Almeida (PSD).
João Gomes de Abreu Lima (CDS).
João Joaquim Gomes (PS).
João Lopes Porto (CDS).
João Luís Duarte Fernandes (PS)
João Luís Malato Correia (PSD)
João Maurício Fernandes Salgueiro (PSD)
João M. Ferreira Teixeira (PSD)
João do Nascimento Gama Guerra (PS).
Joaquim António Miranda da Silva (PCP).
Joaquim Eduardo Gomes (PSD).
Joaquim Jorge M. Saraiva da Mota (ASDI).
Joaquim José Catanho de Menezes (PS)
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro (PSD)
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga (PS)
Joaquim Rocha dos Santos (CDS)
Joaquim dos Santos Pereira Costa (PSD)
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira (UEDS)
Joel Mana da Silva Ferro (PS)
Jorge Alberto Santos Correia (PS)
Jorge Lacão Costa (PS)
Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP)
Jorge Manuel Patrício Ferreira Miranda (PS)
Jorge Manuel Lampreia Patrício (PCP)
Jorge Nélio Ferraz Mendonça (PSD).
José Adriano Gago Vitorino (PSD)
José de Almeida Cesário (PSD)
José de Almeida Valente (PS)
José Ângelo Ferreira Correia (PSD)
José António de Morais Sarmento Moniz (CDS)
José António Valério de Couto (PSD)
José Augusto Fillol Guimarães (PS).
José Augusto Gama (CDS).
José Augusto Santos Silva Marques (PSD).
José Barbosa Mota (PS).
José Bento Gonçalves (PSD)
José Carlos Pinto Basto Torres (PS)
José da Cunha e Sá (PS).
José Lello de Almeida (PS)
José Júlio Carvalho Ribeiro (PSD).
José Luís do Amaral Nunes (PS).
José Luís Diogo Preza (PS)
José Luís de Figueiredo Lopes (PSD)
José Luís Nogueira de Brito (CDS)
José Manuel Antunes Mendes (PCP)
José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP)
José Manuel Niza (PS).
José Manuel Nunes Ambrósio (PS)
José Manuel Santos Magalhães (PCP)
José Manuel Torres Couto (PS).
José Maria Roque Lino (PS)
José Mário Lemos Damião (PSD)

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27 DE JULHO DE 1984 6345

José Martins Pires (PS).
José Maximiano Almeida Leitão (PS).
José Miguel Anacoreta Correia (CDS).
José Pereira Lopes (PSD).
José Rodrigues Vitoriano. (PCP).
José da Silva Domingos (PSD).
José Vargas Bulcão (PSD).
José Vieira de Carvalho (CDS).
Juvenal Batista Ribeiro (PS).
Leonel Santa Rita Pires (PSD).
Leonel de Sousa Fadigas (PS).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Litério da Cruz Monteiro (PS).
Lino Carvalho de Lima (PCP).
Lino Paulo Paz Bicho (PCP).
Luís Abílio da Conceição Cacito (PS).
Luís António Martins (PSD).
Luís Fernando Gonçalves Riquito (PSD).
Luís Filipe Paes Beiroco (CDS).
Luís Silvério Gonçalves Saias (PS).
Manuel Alegre de Melo Duarte (PS).
Manuel Alfredo Tito de Morais (PS).
Manuel António de A. Azevedo Vasconcelos (CDS).
Manuel António Araújo dos Santos (PSD).
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
Manuel Correia Lopes (PCP).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Manuel Filipe Santos Loureiro (PS).
Manuel Ferreira Martins (PSD).
Manuel Filipe Correia de Jesus (PSD).
Manuel Fontes Orvalho (PS).
Manuel Gaspar Cardoso Martins (PCP).
Manuel Jorge Forte Góes (CDS).
Manuel Laranjeira Vaz (PS).
Manuel Maria Moreira (PSD).
Manuel Maria Portugal da Fonseca (PSD).
Manuel Pereira (PSD).
Manuel Rogério de Sousa Brito (PCP).
Manuel Tomás Rodrigues Queiró (CDS).
Maria Alda Barbosa Nogueira (PCP).
Maria Ângela Pinto Correia (PS).
Maria Helena Valente Rosa (PS).
Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP).
Maria da Conceição Dias Neto (CDS).
Maria da Conceição Quintas (PS).
Maria do Céu Sousa Fernandes (PS).
Maria Luísa Modas Daniel (PS).
Maria Margarida Ferreira Marques (PS).
Maria Margarida Salema de M. Ribeiro (PSD).
Maria Odete dos Santos (PCP).
Mariana Santos Calhau Perdigão (PSD).
Mariana Grou Lanita (PCP).
Marília Dulce Morgado Raimundo (PSD).
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia (PS).
Mário Manuel Coelho Prudêncio (PCP).
Mário Martins Adegas (PSD).
Mário Montalvão Machado (PSD).
Mário Almeida Mendes Santos (PSD).
Narana Sinai Coissoró (CDS).
Nelson Pereira Ramos (PS).
Octávio Augusto Teixeira (PCP).
Octávio Ribeiro da Cunha (UEDS).
Paulo Manuel de Barros Barrai (PS).
Pedro Miguel Santana Lopes (PSD).
Pedro Augusto Cunha Pinto (PSD).
Pedro Paulo Carvalho Silva (PSD).
Raul D'Assunção Pimenta Rego (PS).
Paulo Simões Areosa Feio (PCP).
Raul Fernando Brito (PS).
Raul de Jesus Ferreira (PCP).
Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD).
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros (PS).
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo (PS).
Rosa Maria da S. S. da Horta Albernaz (PS).
Ruben José de Almeida Raposo (ASDI).
Rui Fernando Pereira Mateus (PS).
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves (PS).
Rui Manuel de Oliveira Costa (PSD).
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes (PSD).
Rui Monteiro Picciochi (PS).
Silvino Manuel Gomes Sequeira (PS).
Teófilo Carvalho dos Santos (PS).
Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD).
Victor Hugo de Jesus Sequeira (PS).
Victor Manuel Caio Roque (PS).
Virgílio Higino Gonçalves Pereira (PSD).
Zita Maria de Seabra Roseiro (PCP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta de lei foi aprovada com 138 votos a favor, 79 votos contra e 2 abstenções. Votaram 219, Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa por causa do anúncio do resultado da votação.
Nos termos do artigo 151.º, n.º 1, do Regimento, o que se acabou de votar foram os princípios e o sistema. Faz parte dos princípios da proposta, nos termos do artigo 29.º, a restrição ao exercício de direitos da Polícia de Segurança Pública e do pessoal dos quadros de pessoal militarizado da Marinha.
Ora nos termos do artigo 171.º, n.º 5, da Constituição, as leis que digam respeito a estas restrições de militares ou de agentes militarizados, terão que ter a aprovação por maioria de dois terços dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções.
Nestes termos parece-me que a proposta de lei não foi aprovada, Sr. Presidente.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Taborda pode ter a bondade de me dizer qual é o artigo da Constituição a que se refere?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, é o artigo 171.º, n.º 5.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados o favor de se manterem calmos, pois a interpelação à Mesa merece ser analisada nos termos constitucionais.
Contudo, há outros Srs. Deputados que desejam interpelar a Mesa. É o caso da Sr.ª Deputada Cecília Pita Catarino, a quem concedo a palavra.
A Sr.ª Cecília Pita Catarino (PSD): - Sr. Presidente, eu gostava de interpelar a Mesa no seguinte sentido: tendo chegado uns segundos atrasada por razões imponderáveis de natureza pessoal, queria declarar ao Sr. Presidente e à Câmara que se tivesse estado presente à votação teria votado a favor da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr.ª Deputada, mas o que é facto é que as declarações de voto agora não têm cabimento.
O Sr. Deputado Martins Pires tem também a palavra para interpelar a Mesa.

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6346 I SÉRIE-NÚMERO 145

O Sr Martins Pires (PS) - Sr. Presidente, uma vez que não pude estar presente no acto da votação, quero declarar que se tivesse estado presente teria votado favoravelmente a proposta do Governo

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, fiquei ciente disso. Sr. Deputado.
Tem a palavra igualmente para uma interpelação à Mesa o Sr. Deputado Jaime Ramos

O Sr Jaime Ramos (PSD) - Sr. Presidente, embora não lenha estado presente na votação da proposta de lei n.º 71.º III apresentei com alguns colegas a declaração de voto em relação a essa votação, da que solicite a V. Ex.ª que mantenha a minha assmatuia na referida declamação de voto indicativa do sentido que lhe teria dado e em que são dadas as justificações para o mesmo

O Sr. Presidente: - Não o posso fazer, Sr Deputado, porque isso seria contrariar o Regimento em a palavra para uma interpelação o Sr. Deputado Jorge Lacão

O Sr Jorge Lacão (PS) - Sr. Presidente, tendo em consideraçâo a ponderação feita pela Mesa apôs a interpelação do MDP/CDE sobre o sentido e a eficácia da votação que acabou de ter lugar, pretendia afirmar, em nome do Grupo Parlamentar do PS, que entendemos que a questão suscitada não tem qualquer razão de ser. Isto porque, segundo o artigo 171.º da Constituição, as votações se distinguem por serem na generalidade depois obviamente dos debates na generalidade -, na especialidade na sede respectiva-e finalmente a chamada votação final global Assim o n.º 5 do artigo 171.º refere-se a necessidade de certas matei ias. para serem aprovadas, carecerem de uma aprovação por maioria, ou seja, essa questão da aprovação só se põe depois da votação final global.

O Sr José Manuel Mendes (PCP) - Essa e boa!

O Orador: - Por enquanto tivemos a votação na generalidade de um diploma e ainda não o aprovámos

O Si Jorge Lemos (PCP) - Isto é que é um esperto

O Orador: - É que o conceito constítucional e de aprovação e não de votação na generalidade

O Sr José Magalhães (PCP) - Olha o esperto

O Orador: - Assim, a votação que acabámos de fazer e totalmente ética, do nosso ponto de vista, Sr. Presidente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge de Lemos (PCP): - Isto é a chamada argumentação à Eduardo Peneira

Protestos do PS

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, peço o favor de fazerem silêncio para ver se resolvemos este problema.
Tem a palavra o Sr Deputado António Taborda, para um protesto.

O Sr. António Taborda (MDP, CDE) - Sr Presidente, o processo de aprovação de qualquer lei, tem em principio 3 fases: a votação na generalidade, a votação na especialidade e a votação global final.
Em nosso entender o n.º 5 do artigo 171.º da Constituição, porque não faz referência a qualquer dessas fases - ao contrário dos n.ºs 1, 2 e 3 que se referem a eles -, aplica-se igualmente a qualquer das fases De qualquer modo, Sr Presidente, o que nós votamos nos termos do artigo 151.º, n.º 1 , do Regimento foi como disse há pouco, os princípios gerais e o sistema da proposta de lei
Recordo ainda a V. Ex.ª que o primeiro proponente oral desta proposta de lei - o Sr. Ministro da Administração interna - na metade final do seu discurso, versou sobre o tema das restrições ao exercício dos direitos dos agentes militarizados e da PSP, e porque se trata de um principio essencial desta lei, em nosso entender, e aplicável o n.º 5 do artigo 171.º da Constituição Daí o considerarmos que a proposta de lei não foi aprovada na generalidade

O Sr Jorge Lemos (PCP) - Muito bem!

O Sr Presidente: - Para uma interpelação tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral

O Sr João Amaral (PCP) - Sr Presidente, a questão aqui colocada e simples e é a do circulo vicioso, ou seja, das duas uma ou se trata neste caso da confirmação a respeito do que diz o artigo 270.º - e então será preciso uma maioria de dois terços - ou não há aplicação do referido artigo, ou seja, não há direito a restrição, não há cabimento à restrição de direitos Portanto elas não são possíveis Essa e que e, pura e simplesmente, a questão

O Sr José Magalhães (PCP) - Muito bem!

O Orador: - Entretanto deve agradecer-se a importante contribuição que deu o Sr Deputado Jorge Lacão quando finalmente descobriu que existia na Constituição um artigo que tinha por n.º 171. E deu importante contribuição ao demonstrar que, por a mais, no n.º 2, há uma votação na generalidade, uma votação na especialidade e uma votação final global. Tratamos agora da votação na especialidade e ninguém pode distinguir o que a Constituição não distingue. Se é uma votação da generalidade que estamos a tratar, será em relação a ela que se terá de aplicar o condicionamento do n.º 5. Mas, se entendem os Srs Deputados que se aplicam aqui -porque se trata de agentes militarizados, na vossa opinião - restrições de direito e que elas têm cabimento, então não têm outro remédio senão considerar o que está disposto em relação ao sistema de votação. Ou seja, que têm que ter os dois terços, na votação na generalidade, na votação na especialidade e na votação final global

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esse é o liminar entendimento do que di? a Constituição e ninguém pode aqui distinguir o que a Constituição não distingue.

O Sr José Magalhães (PCP) - Muito bem!

O Orador: - Portanto, os senhores precisam de dois terços, não os tiveram e foram por isso derrotados.

Aplausos do PCP

O Sr Presidente: - Tem a palavra para uma interpelação, o Sr. Deputado Costa Andrade

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O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, eu gostaria de, nesta primeira abordagem, dar a opinião do nosso grupo parlamentar sobre esta matéria.
Assim, começo por reconhecer que o assunto não é à primeira vista óbvio ou pelo menos não é, do nosso ponto de vista, de evidência. Contudo temos algumas razões para acreditar que não assiste razão - e nesse sentido nos pronunciaremos - à impugnação feita. Este entendimento resulta de duas razões: em primeiro lugar, seria muito questionável integrar a norma do Regimento no dispositivo constitucional (norma do Regimento que se refere ao conteúdo da votação da generalidade) dizendo que a mesma se reporta aos princípios gerais. Isso obrigava-nos - caso se viesse a entender que já na votação na generalidade era exigida a maioria de dois terços - a um dificílimo exercício lógico, ou seja, saber o que desta proposta de lei, destas diversas soluções dispersas pela lei valia ou não como princípio geral da própria lei. Tínhamos, pois, de estabelecer barreiras dificílimas em termos de lógica, tais como o que são os princípios gerais, o que são as soluções concretas.
Alguns dirão que os princípios gerais consistem na luta contra o terrorismo e a eficácia da segurança interna...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não brinque com isto.

O Orador: - Eu estou a falar, depois ouvirei também com atenção o Sr. Deputado Magalhães. Afias devo dizer-lhe - por amor à honestidade - que não tenho evidências, não as tenho aqui no bolso e se o Sr. Deputado as tem exponha-as. Estou a debater-me com um problema raciocinando alto na Assembleia, onde penso que isso é legítimo, ao mesmo tempo que pretendo contribuir para a vontade...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., do órgão. Mas se me perguntar se tenho uma solução no bolso, devo dizer-lhe honestamente que não a tenho.
Mas, voltando ao ponto em que estava, se vamos entender - como entende o Sr. Deputado Taborda - que a votação na generalidade é uma votação dos princípios e se admitirmos também -segundo o pressuposto - que a votação dos princípios reclama dois terços, isto obriga-nos a uma discussão prévia: essa solução concreta é princípio geral da lei ou é uma solução concreta? É princípio geral já isso?
Isso obriga-nos a um extraordinário exercício de lógica, a uma hierarquização escolástica das concretas normas com os princípios gerais e, não sei onde chegaríamos por este caminho.
Por outro lado, é irrecusável que a Constituição reclama, para aprovação de lei nesta matéria, a maioria de dois terços. Assim tudo está em saber, no silêncio da Constituição, qual é a solução mais razoável e essa parece-me que só pode reportar-se àquele último acto do Parlamento que em definitivo ergue uma proposta ou um projecto normativo e que o converte em verdadeiro acto normativo, ou seja, aquele acto através do qual o Parlamento Português enriquece a ordem jurídica com novos dispositivos, aquele acto definitivo através, do qual esta Assembleia põe na constelação da ordem, jurídica portuguesa novas normas jurídicas. Isso porque no fundo o que está em causa é a racionalidade teleológica do preceito, este só pode ser, a meu modo de ver, aquele que, emergindo da Assembleia, considera a norma em definitivo e tem atrás de si o suporte definitivo e qualificado de dois terços. Até lá, no silêncio da Constituição, parece-me que seria extremamente arriscado e que seria até frustrar a ordem lógica dos interesses de um preceito como este...
O que a Constituição quer e que nesta matéria em definitivo não se inscrevam na ordem jurídica portuguesa normas que não tenham atrás de si o suporte qualificado de dois terços. E isso não acontecerá se estas normas não obtiverem dois terços na altura da votação definitiva, quando se tratar de converter isto - que em termos lógicos não sabemos bem o que é - numa lei, que ainda não é. Aí haverá, penso eu, que assegurar os dois terços.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente eu tenho a impressão de que nós estamos, através de um método ínvio, a retomar toda a discussão que terminámos há bocado.
Foi feita uma interpelação à Mesa sobre essa matéria e a Mesa - quanto a mim bem, mas não vou entrar na questão de fundo porque foi discutida durante um debate enorme - proclamou que a proposta de lei do Governo tinha sido aprovada.
Os Srs. Deputados do MDP/CDE impugnaram a decisão da Mesa, portanto esta já está suficientemente habilitada a tomar uma decisão e não deve permitir que se transforme em novo debate o que já foi debatido durante cerca de 15 dias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto aquilo que eu queria saber é qual é a decisão da Mesa sobre a matéria. Se a decisão da Mesa for a que servir a todos os deputados, obviamente que se passa ao segundo ponto para continuarmos os nossos trabalhos, se a decisão não servir ou tive a discordância de alguns deputados, estes recorrem dela. Agora o que não se pode é entrar nesta discussão que não tem sentido.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a chamada de atenção que foi feito à Mesa pelo Sr. Deputado António Taborda é baseada em preceitos constitucionais que a Mesa -eu próprio - não linha presentes. Assim, parece-me que é um assunto importante e que o Sr. Deputado José Luis Nunes podia auxiliar a Mesa dando-lhe o seu parecer sobre esta matéria, não para abrir um debate mas para que a Mesa tome uma posição definitiva sobre esta matéria.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª de certa maneira devolveu-me a bola, mas a posição do meu grupo parlamentar já foi exposta pelo meu colega de bancada Jorge Lacão.

O Sr. João Amaral (PCP): - Leu o artigo da Constituição.

O Orador: - Assim parece-me que já foi longe de mais este debate, daí que me pareça que V. Ex.ª neste momento deve tomar uma decisão que já tudo está dito. Se essa decisão tiver a aquiescência de todos os membros da Câmara não há problema, mas se a não tiver não há também problema, porque esses recursos decidem-se através do voto.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa, continuará a ouvir a opinião dos Srs. Deputados sobre este assunto e sobretudo de cada grupo parlamentar que queira exprimir-se.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Ora aí está! Meia bola e força!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma interpelação, o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luis Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, penso que por muito relevante que seja esta questão - e é certamente - nós não temos condições neste momento para ir travar um debate - certamente muito interessante mas algo académico sobre estas disposições constitucionais, até porque em qualquer caso e em última análise, não temos poderes para interpretar a Constituição. Por isso penso que temos de decidir a questão politicamente. Assim, precisamos de saber se a Mesa confirma ou não a indicação do resultado da votação e se depois há ou não recursos, os quais serão votados. Mas não podemos neste momento ir travar um debate, que é extremamente complexo, sobre a interpretação da Constituição, nesta matéria.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A maioria não quer é falar.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa, por maioria, resolve confirmar o resultado da votação que anunciou. Isto muito embora tenhamos dúvidas concretas sobre a interpretação que se deve dar ao texto Constitucional. Mas também não me parece que seja esta a altura de abrir um debate sobre este problema.

Vozes do PCP: - Ai, é, é!...

O Sr. Presidente - Além do mais, está sobre a Mesa um requerimento de baixa à Comissão desta proposta e de outros projectos que vamos votar em seguida, daí que a todo tempo me parece que este assunto deverá convenientemente ser estudado e decidido em definitivo - e isto até porque a lei não está aprovada em definitivo mas apenas na generalidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa, no seguinte sentido: o debate, como V. Ex.ª bem entendeu ao deliberar após consulta à Mesa, não era um debate académico nem sem sentido.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Era uma questão de voto.

O Orador: - Era um debate que tinha sentido concreto porque a Mesa e o Sr. Presidente não se limitam a anunciar o resultado aritmético de uma votação. Mais
deve ser dito: se em relação ao resultado concreto que foi obtido, a proposta tem cabimento constitucional para ser considerada como aprovada ou não.
No caso concreto, Sr. Presidente, a proposta não obteve dois terços do número de deputados presentes e nessa medida não deveria ter sido considerada aprovada.
A Mesa entendeu de forma diferente, mas fica a questão e é bom que ela seja sublinhada. Como é que a Mesa pode entender isso se o que está precisamente em jogo é a restrição de direitos e se no caso de esta ser admissível teria de ser aprovada por dois terços? É porque, não o sendo, a proposta será sempre inconstitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Correia Afonso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, eu não tinha pedido a palavra para interpelar a Mesa, antes da decisão que já foi anunciada pela Mesa. Desta forma julgo deslocado usar da palavra neste momento.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes, e V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bom, às vezes, recordar ou ler documentos antigos. Vou ler o n.º 136 do Diário da Assembleia da República, 1.ª série, de quarta-feira, 13 de Outubro de 1982:

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições na Mesa, pelo que declaro encerrado o debate.
Vamos, assim, proceder à votação da proposta de lei n.º 129/II, sobre a Defesa Nacional e a Organização das Forças Armadas.
Anúncio entretanto que, após esta votação, haverá ainda que proceder às votações de um requerimento de baixa à respectiva Comissão desta proposta de lei para efeitos de discussão e votação na especialidade, de uma proposta de alteração à composição da Comissão de Defesa Nacional e ainda de um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Vamos, então, votar a Proposta de Lei n.º 129/II.

Submetido à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM, com votos contra do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP e as abstenções do PS e da ASDI.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, requeiro a V. Ex.ª que se proceda à contagem dos votos.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Vamos então proceder à contagem de votos.

Submetida de novo à votação, a proposta de lei foi aprovada, com 117 votos a favor (do PSD, do CDS

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e do PPM), 39 votos contra (do PCP, da UEDS, do MDP/CDE da UDP) e 24 abstenções (do PS e das ASDI).
V. Ex.ª, decidiu muitíssimo bem, Sr. Presidente, Existia um precedente nesta Casa.
Aquilo a que assistimos aqui foi mais uma manobra para impedir a expressão da vontade maioritária da Assembleia da República, contra um precedente já tomado em matéria idêntica. É inqualificável ou, melhor, é facilmente qualificável...!

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, aquilo a que se assistiu aqui foi a uma chamada de atenção para um ponto da Constituição que me parece perfeitamente legítima.
O que me parece também é que não é agora e nesta sede que o problema deve ser resolvido. Disse ao Sr. Deputado e a todos os Srs. Deputados que não tenho condições - e estou em piores condições até que os ilustres juristas que fazem parte desta Assembleia - para, neste momento, interpretar correctamente a Constituição.
Daí que esta decisão da Mesa fosse uma decisão baseada nalgumas das afirmações que aqui foram feitas, o que não quer dizer que eu próprio esteja inteiramente esclarecido sobre o assunto.

O Sr. Deputado António Taborda pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, como houve dúvidas quanto ao modo como eu, de início, me dirigi à Mesa desejava dizer que o MDP/CDE não interpôs qualquer recurso do anúncio da votação.
Interpelei a Mesa, nos termos em que o fiz, chamando a atenção para preceitos regimentais e constitucionais nesse sentido.
Assim, o MDP/CDE acata, como não podia deixar » de ser, a decisão da Mesa, mas mantém as dúvidas que linha e entende também que é ao Tribunal Constitucional que compete, em definitivo, resolver este caso.
Para terminar, Sr. Presidente, queria apenas dizer que o nosso sistema jurídico não é o sistema inglês do precedem law ou precedente case. Não interessam os casos precedentes, interessa é aplicar concreta e directamente a Constituição e para aferir isso há o Tribunal Constitucional. Não fazia qualquer sentido que se fizesse uma votação sobre a qualificação de uma votação anterior. Como é óbvio, é ao Tribunal Constitucional que compete decidir em definitivo este caso.
Portanto, a dúvida persiste. E com isto termino, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, desejo apenas dizer que se este debate continuar nestes termos estaremos mais uma vez a fazer uma transgressão ao Regimento.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Essa é boa!

O Orador: - O Sr. Presidente declarou a decisão da Mesa, portanto a partir daí não há mais nada a dizer, senão eventualmente interpor recurso da sua decisão. Desta forma, propomos que se passe ao ponto seguinte que é a votação das outras matérias.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente:

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Luís Nunes brindou a Assembleia com a leitura «rigorosa» -com apartes e comentários- de um texto produzido na Assembleia.
No entanto, embora bom leitor é mau matemático. E a questão é muito simples: é que as contas que o Sr. Deputado aqui trouxe provam que a proposta de lei que o Sr. Deputado refere foi aprovada, naquela altura, por dois terços dos deputados que estavam presentes.

Protestos do PS e do PSD.

É bom sublinhar que, com este pequeno erro, o Sr. Deputado José Luís Nunes não vai dormir descansado, nem em paz com a consciência a partir deste momento por ter lido só os pedaços do Diário que leu.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Não pode ser, Sr. Presidente. Isto não pode ser.

O Sr. Roleiro Marinho (PSD): - Empresto-lhe uma máquina de calcular, Sr. Deputado João Amaral! Eu tive um professor na escola primária que me ensinou a fazer contas.
O Sr. Eng. Lopes Cardoso devia ensiná-lo a somar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo nenhuma impugnação da decisão da Mesa, vamos continuar os nossos trabalhos.

O Sr. Deputado José Vitorino pede de novo a palavra para que efeito?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, nos termos regimentais antes de se proceder à votação...

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado, só um momento... dá-me licença que o interrompa?

Risos. Faça favor.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado João Amaral disse que eu não dormiria com a consciência tranquila.

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6350 I SÉRIE-NÚMERO 145

O Sr. Presidente: - Sr Deputado desculpará mas este assunto esta encerrado

O Sr José Luis Nunes (PS) - Sr Presidente desculpe mas não está encerrado. Se eu dissesse a V. Ex.ª, por hipótese absurda, aquilo que o Sr. Deputado João Amaral me disse a mim V. Ex.ª considerá-lo-ia como uma descortesia e eu também considerei como tal.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que realmente o assunto está encenado. Se V. Ex.ª se sentiu ofendido pelas palavras do Sr Deputado João Amaral pode usar da palavra se quiser de acordo com o Regimento
Eu não creio que tenha sido uma desconsideração, mas o Sr. Deputado é que sabe.

O Sr José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, eu explico quando se diz que uma pessoa mistifica dados e que não pode, certamente dormir com a consciência tranquila, penso que, numa questão como esta, o direito de defesa é dos raros casos em que merece aplicação.
Para perfeita elucidação da Assembleia vou ler o n.º 5 do artigo 171.º da Constituição da República «A lei prevista na alínea n) do artigo 167.º carece de aprovação por maioria de dois terços dos deputados presentes (...)» - e reparem bem -«( ) desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções» que era de 126. A proposta a que me referi obteve, 117 votos portanto quem não pode dormir com a consciência tranquila é o Sr. Deputado.

Aplausos do PS e do PSD

O Sr Roleira Marinho (PSD) - Muito bem! Não sabe fazer contas

O Sr Presidente. - O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito.

O Sr. José Vitorino (PSD) - Para interpelar a Mesa Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD) - Sr Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, nos termos regimentais, pede a suspensão dos trabalhos por 15 minutos

O Sr. Presidente: - O requerimento e regimental, pelo que a sessão está suspensa por 15 minutos.

O Sr Luís Beiroco (CDS): - Dá-me licença Sr Presidente?.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr Presidente, como interpelação a Mesa, pergunto a V. Ex.ª se e admissível no meio de um processo de votação, que era aquele em que estávamos, depois de o Sr Presidente ter declarado encerrado o debate e de termos passado a votação (no caso de um primeiro diploma a votação nominal, porque tal havia sido requerido, e num processo de votação normal de mais 2 diplomas), nesta fase do processo será admissível que qualquer grupo parlamentar use do seu direito potestativo de pedir a interrupção dos trabalhos? Eu penso que não.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que da leitura do Regimento resulta que qualquer grupo parlamentar tem a faculdade de requerer a interrupção dos trabalhos. Não vejo no Regimento nada que o impeça.
Portanto, Srs. Deputados, esta suspensa a sessão.

Eram 2 horas e 10 minutos

Apôs a suspensão assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Amaral

O Sr. Presidente: - Srs Deputados vamos proceder a votação do projecto lei n.º 367/III apresentado pelo CDS sobre segurança interna e protecção civil.

Submetido a votação, foi aprovado com votos a favor do PS do PSD do CDS e da ASDI, votos contra do PCP do MDP/CDE da UEDS e dos deputados Igrejas Caeiro (PS) e António Gonzalez(Indep. ) e com a abstenção do deputado Mário Adegas (PSD)

O Sr Presidente: - O Sr Deputado Rocha de Almeida pede a palavra para que efeito?

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Para uma interpelação a Mesa, Sr Presidente

O Sr Presidente: - Faça favor Sr Deputado

O Sr Rocha Almeida (PSD): - Sr Presidente, permita-me que faça uma declaração de voto para que eu possa dizer que votei favoravelmente em coerência com a declaração de voto que fiz por escrito em relação à proposta de lei.

O Sr Presidente: - V. Ex.ª apresenta-la-á por escrito para facilitar o processo.
O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que eleito?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para uma interpelação a Mesa, Sr. Presidente

O Sr Presidente: - Faça favor Sr Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, desejava saber o resultado da votação por fila.

O Sr. Presidente: - Não percebo, Sr Deputado. Por filas referi eu, com excepção dos Srs. Deputados Igrejas Caeiro e Mário Adegas.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr Presidente, refiro-me ao resultado numérico.

O Sr. Presidente: - Então o que pretende e que sejam contados os votos por filas Vamos proceder a essa ratificação.
Sr Deputado José Luís Nunes pede a palavra para que efeito?

O Sr José Luís Nunes (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs Deputados Sem me opor aquilo que foi requerido pelo Sr Deputado José Vitorino, lembraria, no entanto, que já estávamos nas declarações de voto antes de ser feito esse requerimento

Vozes do PS - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Almeida Mendes pede a palavra para que efeito?

O Sr. Almeida Mendes (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Queria comunicar à Assembleia que, por motivos da minha vida pessoal, não pude estar presente na votação pela proposta de lei n.º 71/III, mas que, se tivesse estado presente, teria votado a favor.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Esse jeito ao Governo é uma maravilha. Isto é cilada ou armadilha?

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Esta até obtém 3/4.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que V. Ex.ª acabou de fazer não constitui uma interpelação. Foi sim um processo subtil para fazer uma manifestação da sua parte em relação às votações anteriores.
Sr. Deputado José Vitorino, efectivamente quando V. Ex.ª pede para que se faça a contagem dos votos já é a destempo. De modo que não levará a mal, mas não vamos proceder à contagem dos votos até porque outros Srs. Deputados já entraram.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, temos o direito de saber o resultado numérico da votação.

O Sr. Presidente: - Foi pronunciado, declarado e proclamado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, o número de votantes a favor, contra e de abstenção não foi declarado e pedíamos que o fosse.

O Sr. Presidente: - Porque não o foi requerido com a oportunidade que se impunha.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, essa matéria não necessita de ser requerida. Eventualmente poderá ser necessário requerer o número de votantes por grupo ou pagamento parlamentar, mas o resultado da votação é um direito que assiste à Câmara e à opinião pública.

O Sr. Presidente: - É só um momento, Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira ter a bondade de aguardar um momento, porque entretanto a Mesa está a resolver o incidente levantado pelo Sr. Deputado José Vitorino.

Pausa.

Sr. Deputado José Vitorino, por maioria de votos da Mesa, vai-se então proceder à contagem de votos fila por fila, porque nos convencemos de que o Sr. Deputado pediu imediatamente a palavra logo após a proclamação dos resultados. Só que eu dei primeiro a palavra para uma interpelação ao Sr. Deputado Rocha de Almeida sem conhecer previamente a intenção do Sr. Deputado José Vitorino.
Como é regimental o pedido que V. Ex.ª formula, não é pelo facto de a Mesa ler concedido primeiro a palavra ao Sr. Deputado Rocha de Almeida que irá perder o direito que lhe assiste de requerer o que pediu.
Por maioria, a Mesa decidiu proceder a essa contagem.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, quero interpelar a Mesa no sentido de saber se V. Ex.ª não solicitará aos líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares que solicitem aos deputados que entretanto saíram da Sala que venham ocupar os seus lugares.

Vozes do CDS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados representantes dos grupos parlamentares entendem que há necessidade de se chamarem os Srs. Deputados que estiveram presentes à votação e que, entretanto, saíram?

Pausa.

Não havendo objecções, entendo que os Srs. Deputados não julgam isso necessário, pelo que vamos proceder de imediato à contagem dos votos requerida.

Submetido de novo à votação, foi aprovado, com 119 votos a favor, 43 votos contra e uma abstenção.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, quero apenas inscrever-me para uma declaração de voto a produzir após a votação seguinte.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado Octávio Cunha.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Votámos obviamente a favor do nosso projecto de lei. E votámos a favor porque pretendíamos e pretendemos uma lei de segurança interna eficaz, ou seja, uma lei de segurança interna capaz de conciliar equilibradamente a defesa da segurança da sociedade e a defesa da liberdade dos cidadãos.

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6352 I SÉRIE-NÚMERO 145

Provou esta discussão e votação que afinal, o diálogo e a discussão que aqui se estabeleceram não eram apenas entre duas posições, como aparentemente chegou a tornar-se quase evidente: a posição do PCP, que não queria nenhuma lei de segurança interna, e a posição obstinada do Governo, que defendia coisa nenhuma. Havia uma terceira posição -a posição da razão e do equilíbrio -, que mereceu a maioria do voto das bancadas democráticas desta Câmara.
Foram portanto a razão, o Parlamento e a democracia que venceram, connosco, esta votação.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento, subscrito por dez Srs. Deputados, entre os quais os Srs. Deputados José Luís Nunes e Fernando Condesso, que vai de imediato ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
Requere-se o prolongamento da sessão até ao esgotamento da ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e abstenções do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e o deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos de seguida procederá votação do projecto de lei n.º 370/III, da iniciativa da ASDI, sobre medidas especiais de prevenção ao terrorismo.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, solicito que a votação seja feita em termos idênticos àqueles que se verificaram em relação à votação do projecto de lei do CDS.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, o requerimento do Sr. Deputado José Vitorino só pode ter validade se a votação for nominal. Doutra forma, nos termos do n.º 3 do artigo 107.º do Regimento - nas votações por levantados e sentados, a Mesa anunciará a distribuição partidária dos votos - e só.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É sobre este tema que se deseja pronunciar. Sr. Deputado?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - É sim, Sr. Presidente. O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, cabe à Mesa processar a votação como entender. Se a Mesa entender que deve fazer a contagem, fá-la-á; se entender que basta levantados e sentados, não a fará, mas é claro que pode alguém vir pedir a contagem final.
Na minha opinião, a invocação do Sr. Deputado Magalhães Mota não tem razão de ser, mas ganharia em sentido regimental se tivesse sido feita antes da votação do projecto de lei do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condesso, segundo me foi informado, foi V. Ex.ª, que pediu em primeiro a palavra, antes de o Sr. Deputado José Luís Nunes o ter feito. Peço-lhe desculpa pelo facto de tardiamente me ter dado conta disso, mas não me leve a mal esta distracção - foi um lapso da minha parte.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, o meu companheiro de bancada pediu que se fizesse a contagem das diferentes expressões de voto, de modo numérico; o Sr. Deputado Magalhães Mota leu linearmente o Regimento.
No entanto, gostaria de dizer que é evidente que, pedida essa contagem, ela deve ser feita, até por que pode haver muitos partidos a votarem a favor e um ou dois contra. O problema não é só de partidos: é que, se houver poucos deputados para os muitos partidos e muitos deputados para os poucos ou para um único partido, o resultado pode ser diferente. É evidente que a leitura tem de ser feita em termos integrados e em termos de se saber o que se passa.
Portanto, creio que não vale a pena estarmos com este debate e mantemos o requerimento de que se faça a contagem numericamente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, talvez V. Ex.ª, numa interpretação literal do Regimento, tivesse razão. Só que, parece, tem-se estabelecido determinada praxe -haja em vista o que se passou precisamente na votação anterior -, com base na qual, já por mais de uma vez, se tem requerido esse processo de votação, sem que tivesse havido qualquer objecção, pelo que a Mesa entende que deve processar a votação, para se conhecer a expressão numérica, nos termos que foram requeridos.
Srs. Deputados, vamos pois proceder à votação do projecto de lei n.º 370/III, da iniciativa da ASDI, sobre medidas especiais de prevenção ao terrorismo, nos termos requeridos.

Submetido à votação, foi aprovado, com III votos a favor (do PS, do PSD, dos CDS e da ASDI), 43 votos contra (do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez) e 2 abstenções (dos deputados Cunha e Sá, do PS, e Mário Adegas, do PSD).

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Magalhães Moía (ASDI): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, verifiquei que vários Srs. Deputados entraram depois da votação e, tal como há bocado tiveram o cuidado de dizer, caso tivessem estado presentes, em que sentido é que votariam, não sei se quererão agora utilizar a mesma faculdade.

Risos.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, como não me dei conta dos Srs. Deputados que entraram, sinto-me inibido de lhes perguntar directamente, para poder satisfazer a vontade e o desejo do Sr. Deputado interpelante.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pede a palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - É para formular um protesto ao Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Presidente: - Não é possível, Sr. Deputado.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Então, quero utilizar a palavra para formular uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, quero dizer a V. Ex.ª que não sigo as suas instruções e não recebo ordens suas. Faço o que muito bem entendo e voto segundo a minha consciência.

Risos.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É esta a melhor altura para fazermos um resumo daquilo que foi a intenção dos nossos votos.
O que aqui se discutiu ao longo destes dias não foram apenas más propostas de lei.
O que aqui se discutiu foi a continuação do longo discurso/percurso do homem através dos séculos e das civilizações. O que aqui se discutiu foi algo de sempre inacabado. O que aqui se discutiu foram critérios/ideias que fazem do homem Homem e que lhe retiram progressivamente as suas características primitivas de animal incapaz de criar cultura.
Em relação a este tipo de «leis», sobre as quais votaremos sempre contra, devo dizer que pouco me preocuparia, embora me incomodasse, o facto de me lerem a correspondência, ouvirem conversas telefónicas ou me entrarem pela casa dentro.
O que nos preocupa é que homens que sempre estiveram do lado do progresso, da generosidade e, porque não, da utopia - a cidade ideal construída por homens ideais - tanto e tão depressa tenham caído nos abismos da pré-história cultural.
O que nos preocupa é que em termos de ideias se volte a imaginar que e pela força, pela violentação, pela institucionalização do arbitrário, que se mantém o poder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque somos favoráveis à existência de uma lei de segurança interna poderíamo-nos ter abstido na votação dos projectos de lei apresentados pela ASDI e pelo CDS, mas votámos contra, porque entendemos que uma proposta de lei de segurança interna não pode ser construída a partir de textos inquinados de flagrantes inconstitucionalidades, e continuamos a pensar que a baixa à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias dos textos discutidos teria permitido a elaboração de uma proposta alternativa que, essa sim, poderia ter constituído uma base válida de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, só é possível imaginar uma nova sociedade e novas relações sociais a partir de material memorizado, da experiência adquirida.
Para nós, que nos reclamamos de socialistas, quer dizer de homens que procuram «o novo que seja melhor», é claro que não esquecemos que o progresso, salvo raras excepções, se consegue passo a passo, tantas vezes no eseuro, na contradição, na angústia feita das incertezas que nos obriga a pôr permanentemente em causa o adquirido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, houve um tempo em que se falava do desafio americano. Milhões de homens pensaram que o «American way of life» representava a sociedade ideal, mantendo os olhos obstinadamente fechados a tudo o que nela constituía já o fermento da destruição.
Houve um tempo em que milhões de homens acreditaram na sociedade dita «comunista», cegos pela lógica de um discurso que, também ele, comportava já as palavras fermento da destruição.
Houve um tempo em que, perdida a confiança nos valores base da sociedade ocidental, os homens pensaram reencontrar a sua identidade no Extremo Oriente.
Houve um tempo, que ainda é hoje, em que os homens pensaram e pensam que se a sociedade ideal não existe é possível criá-la partindo dos erros do passado, dos insucessos da História.
Parece-nos que a esperança não está na realização de uma sociedade ideal, planetária, de contornos previamente traçados por um qualquer grande Engenheiro do Universo. Cada geração mudará o que a geração precedente construir e, fazendo-o, deslocará o ideal num sentido muitas vezes não compreensível imediatamente. Mas o que uma geração, a nossa geração, de todos, porque é hoje que vivemos, os mais novos e os mais velhos, não pode e não deve fazer é tolerar a perversão das ideias que fizeram de nós homens vivos em cidade morta e nos fizeram hoje contribuir para manter viva a cidade.
O nosso papel é limitado, como aliás será limitado o papel dos que virão depois. Diríamos que consiste apenas em aperfeiçoar a gramática, sabendo que não podemos compreender a semântica.
Terá muito de utópico, será mesmo só utópico o nosso papel. O facto é que, para nós, não é a utopia, fonte da imaginação e da evolução, que é perigosa. O que é perigoso é o dogmatismo que alguns utilizam para manter o seu poder, as suas prorrogativas, a sua dominância. O que é perigoso são as minorias e as maiorias radicalizadas que, por vias e com meios diferentes, recusam a discussão e não corrigem os erros com a humildade e a dignidade que se lhes exige.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra e votaremos sempre contra este tipo de «leis» que fazem o homem regredir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Cunha, desculpe-me interrompê-lo, o que faço, aliás, com bastante pena, mas terminou o seu tempo e não o posso prorrogar de modo nenhum.

Vozes do PS, do PCP e da UEDS: - Não há limite de tempo!

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O Sr Presidente: - De qualquer forma, tomando em consideraçâo o facto de ter sido um tanto ou quanto interrompido devido ao barulho registado na Sala, concedo-lhe a palavra para concluir a sua declaração de voto

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Ao fazê-lo, temos que reafirmar que as palavras, nenhumas palavras, poderão traduzir a nossa perplexidade, não face a este incrível texto, elaborado ainda hoje não se sabe por quem nem para servir que interesses, mas face à agressão que, em termos culturais e de ética, que e a base do comportamento do nosso povo, ele representa.
Sr. Presidente, Srs Deputados: As mulheres e os homens a quem se convencionou chamar de «esquerda» sempre transportaram em si a generosidade, a tolerância e a utopia. Esta proposta e estes projectos de lei negam todos estes princípios. Esta proposta de lei não pode nem deve nunca ser reivindicada pela esquerda e pelos socialistas

Vozes da UEDS: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr Deputado Lopes Cardoso.

O Sr Lopes Cardoso (UEDS): - Sr Presidente, se me permite recordarei à Mesa o n.º 2 do artigo 100.º do Regimento, que diz «O limite de tempo previsto no número anterior, não se aplica às votações na generalidade de leis ou de resoluções ou as votações de moções » O númeno anterior eé o n.º 1 deste mesmo artigo que fixa um tempo para as declarações de voto, tempo esse, que não se aplica às declarações de voto na generalidade

O Sr Presidente: - A Mesa aceita a correcção feita pelo Sr Deputado.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr Presidente, Srs Deputados, Srs. Membros do Governo. Votámos contra os projectos de lei apresentados pelo CDS e pela ASDI tal como tínhamos feito em relação à proposta de lei n.º 71/III. Mesmo sabendo registar as diferenças existentes e denunciadas ao longo das nossas intervenções mas correspondendo à verdade deste debate, partindo da matriz legislativa que o motivou, consideramos que, o que avulta do conjunto das reuniões plenárias em que foi debatido o tenebroso pacote de segurança interna e não a aprovação formal do projecto do CDS ou da ASDI mas a derrota do Governo

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo mais isolado do que nunca viu aprovada na generalidade a sua proposta de lei ao lado das do CDS e ASDI, com o amargo de boca de que, mesmo em relação às suas bancadas, teve de violentar consciências e os sentimentos de muitos que prezam as liberdades democráticas.
Mas o que aconteceu ao longo destes dias traduz, de uma maneira indesmentível uma clamorosa derrota dos que apostaram nos objectivos do Governo e na sua pressa em concretizá-los

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Tornou-se evidente perante o País o monumental erro de cálculo de Mário Soares e dos seus ministros quando pensaram que podiam fazer passar (como cão em vinha vindimada) esta celerada lei, apanhando a opinião democrática distraída e a Assembleia da Republica pronta a partir para férias.
Em vez disso a proposta provocou um vasto e poderoso movimento para onde confluíram todos os quadrantes da família democrática portuguesa, desde os mais consequentes aos mais conservadores, podendo afirmar-se que, ao longo destes anos de Abril raramente se terá verificado um tão amplo consenso em defesa das liberdades públicas

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Foram as tomadas de posição inequívoca de muitos homens e mulheres de diversas tendências com projecção política na vida nacional, foram as posições assumidas pelas mais diversas organizações sociais e profissionais, foram centenas de organizações dos trabalhadores que se pronunciaram, foram os plenários de trabalhadores (alguns com milhares de presenças), foram os colóquios, os abaixo-assinados e as mais diversas realizações
A conclusão é rotunda! Nenhum democrata, nenhuma organização, ninguém aceita a proposta de lei governamental e as cópias que dela foram feitas (designadamente pelo CDS).
Mesmo aqui na Assembleia chegou a pairar a dúvida quanto à paternidade desta coisa perante as contradições e o sacudir a água do capote de alguns ministros, sempre desacompanhados na tribuna pelos dois primeiros subscritores.
Pelo nosso lado orgulhamo-nos da contribuição que demos para a denúncia e o desmascaramento da ameaça que a proposta n.º 71/III constitui para o regime democrático, mas não temos, nem nunca tivemos, a ideia de que temos o monopólio da verdade da defesa das liberdades conquistadas com a revolução libertadora do 25 de Abril Se usámos todos os nossos direitos regimentais e constitucionais, se exigimos e persistimos nos esclarecimentos a que o Governo não respondeu, se mantivemos uma posição de firmeza ao longo destes dias de debate é porque entendemos que valeu e vale a pena perder horas e dias para debater e defender essas liberdades que custaram tantos sacrifícios e tantas vidas no passado, que custaram tantos anos a alcançar e sobre as quais se levanta agora ameaçadoramente o mostrengo jurídico proposto pelo Governo.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE

Sr Presidente, Srs Deputados Os projectos do CDS e da ASDI não escapam ao juízo da inconstitucionalidade mas o que avultou e ficou amplamente demonstrado foi a inconstitucionalidade da proposta governamental que viola, entre outros, os artigos 272.º, n.º 1 da Constituição (que define as funções de polícia); 272.º, n.º 2 e 3 (que definem os limites das medidas de polícia e da actividade da prevenção de crimes), 275.º (que define a missão das forças armadas), 19.º, 137.º, alínea c), 141.º e 164.º, alínea y) (que estabelecem as condições de declaração e os limites de estado de sítio e do estado de emergência), 35.º (que define os direitos e garantias dos cidadãos perante o uso de informática); 18.º (que garante a força jurídica dos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias, impondo rigorosos limites de legalidade, necessidade, proporcionalidade e adequação às leis restritivas), 27.º (relativo às condições taxativamente indicadas em que não pode haver privação da liberdade), 34.º (que garante a inviolabilidade do domicílio, da correspondência, das telecomunicações), 45.º (sobre o direito de reunião e manifestação);

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270.º (que restringe a possibilidade de limitações de certos direitos aos militares e agentes militarizados).
Importa particularmente acentuar que em relação às monstruosas medidas excepcionais propostas (buscas, escutas telefónicas, intercepção da correspondência, detenção, proibição de reuniões e manifestações, suspensão de espectáculos públicos), o Governo não demonstrou, nem de perto nem de longe, a sua adequação, necessidade e proporcionalidade aos fins e objectivos, revelando antes inconstitucionais planos de perseguição dos que legitimamente se erguem contra a sua política antipopular.
Valeu a pena este debate! Valeu a pena porque se provou que o governo de Mário Soares e Mota Pinto já não quer só um país de muitos trabalhadores com fome. Quer, precisa, de um país de homens e mulheres com medo, reagindo no plano legislativo como reagem os fracos e os intolerantes. É um caminho perigoso mas condenado ao fracasso!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Atenção porém: o cutelo fica suspenso!

E é preciso que se mantenha e incremente a vigilância democrática que impediu agora a aprovação final desta proposta tenebrosa. Há todas as razões para isso...
Não faz sentido, na verdade, que quem quer que seja venha brandir, em termos de exclusividade, a bandeira da luta pelas liberdades. As fronteiras rígidas e que por vezes se estabelecem quando aqui se discute uma lei sobre nacionalizações, ou reforma agrária, sobre controle de gestão ou o conceito de sindicalismo, sobre o conceito de justa causa para despedimento ou a melhor forma para resolver o drama dos salários em atraso, obedecem a razões de classe e à visão mais avançada ou recuada como se entende a transformação das coisas e do Mundo.
Mas agora estão em causa as liberdades públicas. E foi importante verificar que muitos democratas, mesmo que sabendo que esta proposta visava prioritária e fundamentalmente atingir o coração do movimento operário e sindical, que estava virada contra a coragem, a dignidade e a determinação dos que não se calam ao arbítrio, à repressão, à fome, foi importante, dizíamos, saber que muitos homens e mulheres, juristas, constitucionalistas, jornalistas, escritores, quadros técnicos, e tantos outros, entenderam dizer não a esta proposta fascizante.
No momento em que se assiste a uma autêntica guerra social movida por este governo aos trabalhadores, recuando ao passado recente, às greves gerais, às vésperas do fatídico 1.º de Maio no Porto, às greves dos trabalhadores dos transportes, às cargas da polícia sobre os trabalhadores da SOREFAME, da indústria naval, dos trabalhadores da Fontela, da Marinha Grande, da zona da Reforma Agrária, recordando o agressivo e desastrado (talvez propositado e de certeza mal calculado) discurso do Primeiro-Ministro nas vésperas da concentração nacional de 2 de Junho e durante o debate da moção de confiança, quando a liquidação da Reforma Agrária e o cerco às nacionalizações se transformam em objectivo, quando se procura liquidar as normas mais progressistas da Lei da Greve, dos despedimentos, das férias, feriados e faltas, quando existem mais de 500 mil processos que marcam passo nos tribunais de trabalho durante anos, quando o Governo fecha os olhos à repressão do patronato e se assiste ao agravamento da situação dos salários em atraso neste período de férias, quando se promove o aumento do desemprego e o escândalo dos contratos a prazo, percebe-se o medo e a má consciência deste governo. Percebe-se porque violentou consciências e tapou os ouvidos às vozes e às preocupações dos democratas de todos os quadrantes. Tem medo do exercício das liberdades. Tem medo da luta dos trabalhadores. Tem medo da luta dos democratas e dos seus princípios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O todo que constitui a democracia política, económica e social, o Abril concreto e as suas transformações é entendido pelo governo Mário Soares/Mota Pinto como um estorvo que é necessário ultrapassar a todo o custo e a qualquer preço para restaurar os valores e os privilégios do grande capital e do latifúndio.
Por isso e para isso, também, o Governo quer serviços de informações, que infestem de novos e velhos bufos as ruas, as fábricas, as cidades do nosso país.
Essa lei celerada já está votada na especialidade. Nela se cria um monstruoso centro de dados, através do qual é instituída a ficha do cidadão permitindo-se nela inscrever, com violação da Constituição, informações pessoais - todas as informações pessoais, verdadeiras ou falsas da esfera privada ou do domínio público, obtidas licita ou ilicitamente, sobre todo o tipo de actividades e naturalmente, em primeira linha sobre a actividade política, sobre a actividade sindical, sobre o movimento dos trabalhadores, sobre todos os que se recusem dizer que sim ao Governo e à sua política!
É ao lado do Centro de Dados, alimentando-o e alimentando-se dele, que estão os serviços de informações, particularmente os serviços de informações de segurança, virados para a devassa abusiva, para a pesquisa indevida, para a intromissão ilegítima e, eventualmente, quando isso for útil aos chefes máximos (quer dizer, ao Governo), montando minuciosamente a provocação antidemocrática.
Sabemos que o Governo queria mais! Queria poderes para passar das informações políticas à devassa, às prisões, à repressão individual e colectiva comandada pela Autoridade Nacional de Segurança. Não o conseguiu por agora. Não leva daqui a tão pretendida lei de segurança interna!
Jogou forte e perdeu mais uma batalha. Perdeu uma batalha decisiva porque os democratas perceberam que a questão das liberdades está para além da conjuntura e não têm só a ver com a luta do movimento operário e popular, porque foram muitos os homens e mulheres que perceberam que o passado e já bastante!...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP, apesar e para além destas votações, mantém as suas esperanças de que novas vozes e novos braços se levantarão, já não só para suster, mas para derrotar definitivamente esta sinistra operação do Governo, a que o CDS prestimosamente se associou. Nós estamos confiantes. Confiantes neste Abril onde reside a esperança e a força do futuro para derrotar esta operação do passado e os seus mentores, sejam quais forem as vestes que enverguem.
É esse o sentido mais profundo do nosso voto contra a proposta de lei n." 71/111 e os projectos do CDS e da ASDI. Disse!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, para dotar o Estado dos meios necessários ao combate à criminalidade de alta violência

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apresentou o Governo à Assembleia da República uma proposta de lei de segurança interna.
Ao submeter à aprovação da mais alta assembleia política do País um diploma deixou o Governo de, como tal, poder influir no seu conteúdo, cabendo à Assembleia da República a última palavra.
Do debate travado, na generalidade, ressaltou, liminarmente, a actuação do Grupo Parlamentar do PCP que, utilizando contra o seu fim, as mais diversas figuras regimentais desenvolveu uma táctica de obstrução parlamentar de que não há memória nesta Casa.
O PCP não é contra esta proposta de lei de segurança interna porque será sempre contra qualquer lei de segurança interna.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade a verdadeira segurança só terminará quando, atingida a sociedade sem classes, terminar a distinção entre explorados e exploradores, proletários e capitalistas, trabalhadores e patrões pois, para o PCP, a simples ideia de segurança é impossível na sociedade capitalista.
Tudo isto acabou, no «Arquipélago de Gulag», no sistema concentracionário, na loucura dos hospitais psiquiátricos.
Em nome da liberdade como dizia Lermontov, «transformaram a liberdade numa arma para o carrasco».
Ao PCP não interessa nenhuma lei de segurança que não seja a sua própria lei de segurança, nenhuma liberdade que não seja a sua liberdade, nenhuma democracia que não seja popular e, pasme-se, nenhuma ditadura que não seja (mais ou menos...) a do proletariado.
Nesta matéria o diálogo não é impossível à esquerda, é impossível a Leste ...

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não obstante, um outro grupo de posições tiveram expressão neste debate.
Houve quem tivesse desenvolvido críticas à proposta de lei do Governo na base de alguma imprecisão dos seus conceitos, um certo alargamento ou restrição no seu campo de aplicação, excesso ou defeito das medidas propostas bem como da sua natureza.
Ao nível dos grupos parlamentares encontrou este debate expressão nos projectos de lei apresentados pelo CDS e pela ASDI.
O primeiro pretende ser uma alternativa global à proposta de lei do Governo. Não obstante, funda-se em idêntica estrutura e princípios, tomando-a como matriz e, aligeirando tão-só um outro princípio conceituai, elimina um ou outro capítulo e insiste na jurisdicionalização de certas medidas de excepção.
O segundo, da ASDI limita-se a articular uma série de medidas especiais de «Prevenção do terrorismo» não se assumindo como alternativa global à proposta de lei em causa.
Ao nível individual foram mais diferenciadas as posições.
Para uns, ganha o texto governamental insuperáveis problemas no plano dos princípios. Para outros, a conjuntura não exigia ainda uma tomada de posição tão violenta. Para outros ainda a intenção de alterar profundamente e na especialidade um texto do Governo, indicaria desrespeito por esse mesmo Governo.
O Grupo Parlamentar do PS definiu, nesta conjuntura, uma actuação bem clara.
Partindo do princípio constitucional de que após a entrada na Assembleia da República de um diploma a iniciativa legislativa sai do âmbito governamental logo manifestou a sua intenção de introduzir, na especialidade, uma série de alterações susceptíveis de melhorar, substancialmente, o texto em causa.
Deixar-se-ão discriminadas algumas dessas alterações.
Em sede do capítulo 1.º, ganhar-se-ia, talvez, com uma enumeração geral dos objectivos da segurança interna que evitasse um carácter excessivamente doutrinário que parece susceptível de críticas.
Por outro lado, desce-se a um pormenor [alínea f)] que se afigura insólito e deslocado.
O artigo 2.º é susceptível de crítica na medida em que inclui, como se verá melhor mais adiante, a protecção civil como componente, essencial, da segurança interna.
E não só! Na verdade, não consegue fugir a um certo carácter doutrinário que é, pelo menos, discutível...
No que se refere ao capítulo 2.º, não se afigura conveniente, embora seja constitucional, a matéria do artigo 7.º, n.º 2.
Os magistrados do Magistério Público estarão representados pelo Ministro da Justiça e pelo procurador-geral da República.
Os Serviços de Informação Militar estarão, normalmente, representados pelo representante do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas.
Quanto aos juízes não se vê vantagem em qualquer referência específica, sendo certo que a redacção da norma foi infeliz ao falar em magistrados judiciais ou do Ministério Público como se estes não fossem magistrados judiciais.
O exposto levará, razoavelmente, a concluir pela eliminação do n.º 2 do artigo 7.º
Mais importante se afigura o conteúdo dos artigos 9.º e 10.º, pois o primeiro confere aos Presidentes dos Governos das Regiões Autónomas poderes que excedem, em muito, os permitidos pelo princípio da integridade da soberania do Estado (artigo 227.º, n.º 3 da Constituição).
O artigo 10.º cria uma espécie de pequenos gabinetes distritais de crise de duvidosa funcionalidade mais próprios de um estado federado do que de um estado unitário como o nosso.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - Importará, também, rever este normativo.
No que se refere ao artigo 11.º, n.º 3, trata-se de uma norma deslocada e tecnicamente mal elaborada.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - As Forças Armadas só podem agir para além dos limites normais da sua competência nos casos de estado de sítio ou de estado de emergência, e nestes casos não assumem especificamente a responsabilidade pela segurança interna mas tão-só o exercício das missões definidas na lei que declarar o estado de sítio ou o estado de emergência (artigo 68.º da Lei de Defesa Nacional).

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - Na sede de estados de excepção em que há suspensão (não restrição...) de direitos não são cometidas às forças armadas missões de carácter demasiado genérico.
O n.º 3 do artigo 11.º em causa refere ainda um problema da área da protecção civil (e não só...): requisição de meios próprios das Forças Armadas para certas ta-

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refas civis, o que sendo correcto e justo exorbita o objecto da presente lei

O Sr José Magalhães (PCP) - Sem dúvida!

O Orador: - Assim deverá ser eliminado o artigo 11.º, n.º 3
No que refere ao artigo 12.º, e duvidoso que os comandantes de Secção da Guarda Nacional Republicana devam ser considerados autoridades de polícia para os efeitos definidos nesta articulado

O Sr Carlos Brito (PCP) - E não só.

O Orador: - As normas constantes do artigo 13.º referentes a protecção civil e capitulo 4.º, serão eliminadas porquanto as primeiras exorbitam do âmbito da lei e as segundas se incluíram na lei dos serviços de informação
No que se refere às medidas especiais de polícia e aos poderes dos agentes policiais (artigos 20.º e 26.º) impõe-se, como regra geral, a sua aplicação por decisão de magistrado togado e, também, a eliminação de uma ou outra em que a proibição de manifestações e espectáculos públicos serão os casos mais gritantes

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Às medidas constantes dos artigos 22.º e 24.º devera aplicar-se o princípio de condicionar a sua aplicação à decisão de magistrado togado (Magistério Público ou juiz) após cuidada ponderação e tendo em vista os princípios de celeridade e da garantia dos cidadãos
Duas últimas reflexões em relação aos artigos 30.º e 31.º em que se impõe compreender quanto ao artigo 30.º que a matéria n.º 1 é matéria do regulamento interno das polícias, que a matéria do n.º 2 não pode manter o princípio de inversão do ónus da prova.
Quanto ao artigo 31.º importa eliminar o seu n.º 4 pois se refere a hipótese que só pode ocorrer em caso de estado de sítio ou estado de emergência.
Na verdade uma normal operação da PSP - curiosamente nunca ninguém se referiu a isso ou quando se referiu, referiu-se mal - comandada por um oficial das forças armadas não é uma operação militar nem sob comando militar
O artigo 34.º deverá, obviamente, ser eliminado pois inculca a ideia de que a segurança interna seria regime de excepção qualitativamente diferente do estado de sítio ou do estado de emergência O que não é o caso
Foi nesta esperança e nesta convicção que votámos, favoravelmente, a proposta de lei

O Sr José Magalhães (PCP) - Ah!

O Orador: - É nesta certeza que votaremos a lei que sairá deste Parlamento

O Sr José Magalhães (PCP): - Tem a certeza!

O Orador: - Agora a responsabilidade e nossa e compete a nós e só a nós decidir
A Assembleia da Republica estará à altura da sua missão

Saberá conciliar o estado que urge defender com a liberdade que importa manter, a ordem e a disciplina de que são tão caras aos portugueses.
Votamos a favor dos projectos de lei do CDS e da ASDI
A primeira tal como foi elaborada, é uma filha da proposta do Governo
Ficaria mal a um pai enjeitar a sua filha ou, dito de outra forma, o nosso sentido de voto move-se por razões de estado e não por razões de circunstância.
Votamos ainda a favor da proposta da ASDI Pouco debatida - embora, restrita, mediana e ate um pouco baça - o benefício da dúvida.
E nossa convicção que num curto espaço, o Estado disporá de meios excepcionais para combater actos excepcionais como é o terrorismo político
É preciso pensar sobretudo nas vítimas e ter coragem de governar

E nossa convicção que o povo português apoia e compreende o nosso voto e isso a tanto nos basta!

Aplausos do PS e do PSD

O Sr José Magalhães (PCP) - Essa e uma boa piada!

O Sr Narana Coissoró (CDS): - Vamos ver as vítimas Sr Deputado José Luís Nunes

O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado António Taborda.

O Sr António Taborda (MDP/CDE): - Sr Presidente, Srs Deputados Votámos contra o projecto de lei da ASDI exclusivamente por causa das inconstitucionalidades que, a nosso ver, contém e que já, em tempo oportuno, assinalámos

De todo o modo, queríamos, explicitar que estamos de acordo com a sua filosofia e o seu preâmbulo, na medida em que se insere, exclusivamente, em medidas contra o terrorismo e, principalmente, em alterações ao Código de Processo Penal.
Este nosso voto contra tem um sentido completamente diferente dos votos contra que demos à proposta de lei do Governo e ao projecto de lei do CDS, pelas razões que aquando da discussão da generalidade tivemos ocasião de referir.
Queria, por ultimo, dizer, ainda em relação à ASDI que, em todo este processo, foi talvez o único partido coerente em relação a proposta de lei governamental quando apresentou antecipadamente na Mesa uma série de propostas de alteração extremamente importantes e com as quais, na generalidade, estamos de acordo

O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Ângelo Correia.

O Sr Ângelo Correia (PSD): - Sr Presidente, Srs Deputados É desnecessário explicar o sentido de voto do PSD em relação à proposta de lei do Governo, mas convém deixar duas ou três ligeiras notas sobre o nosso sentido de voto, em relação aos projectos de lei da ASDI e do CDS.
Os projectos da ASDI e do CDS, o primeiro, no seu todo e o segundo na sua grande parte, bebem do articulado do Governo, baseiam-se nele. Não é uma atitude negativa, e tentar aproveitar, da proposta governamental, aquilo que, do ponto de vista desses partidos, possa permitir uma dupla situação o entroncar com a própria proposta do Governo a fim de que, no seu conjunto, a discussão seja, naturalmente, mais fácil e numa perspectiva política, a de lhe retirar algumas situações que possam, do ponto de vista desses partidos, enriquecer o debate
Apesar de termos votado favoravelmente o conjunto do projecto do CDS, não entendemos que a sua primeira parte contribua com algo de concreto e positivo Que esta nota fique registada a primeira parte do pró-

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tecto do CDS lenta retirar da primeira parte da proposta do Governo aquilo que, do ponto de vista deste partido são os aspectos eventualmente mais negativos, fica, todavia, um projecto que e uma meia tautologia face ao que existe, adiantando, nada atrasando.
Como tal, e meramente dispiciendo, é uma votação simbólica da nossa parte, visto que, ao fim e ao cabo, nada acrescenta à situação que se procura colmatar
Por isso., Sr Presidente e Srs. Deputados, o nosso voto mais que um sentido formal tem também um sentido político o de que haja, em relação a estes domínios, um consenso no âmbito da comissão especializada da Assembleia da República, de modo a que se garantam as condições essenciais a que o Governo se propôs - garantir uma organização sólida e eficaz do sistema policial, de modo a combater a criminalidade geral e que te encontrem algumas medidas especiais de polícia que combatam a criminalidade de alta violência e o terrorismo, movendo-se num quadro democrático.
É por isso que, respeitando esses objectivos, nos empenharemos para que os mesmos possam ser encontrados no máximo consenso possível e com o máximo de eficácia, necessários para salvaguarda dos princípios e dos desejos do povo português.

O Sr Presidente: - O Sr. Secretário irá ler um Requerimento que deu entrada na Mesa.

O Sr Secretário (Leonel Fadigas) - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República: Os deputados abaixo assinados propõem, nos termos regimentais, que a proposta e os projectos de lei aprovados baixem a uma Comissão Eventual constituída por 17 membros, formada por deputados das comissões de «Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias» e de «Defesa Nacional)», para procederem à discussão e votação na especialidade, no prazo de 45 dias, contados a partir da abertura da II Sessão Legislativa
A composição da Comissão será a seguinte 5 deputados do PS, 4 deputados do PSD, 3 deputados do PCP, 2 deputados do CDS, 1 deputado do MDP/CDE, 1 deputado da UEDS, 1 Deputado da ASDI.
São subscritores deste requerimento o Srs Deputados. José Luís Nunes, do PS e Fernando Condesso, do PSD, seguindo-se o número de assinaturas regimentais

O Sr Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr Deputado Jorge Lemos.

O Si Jorge Lemos (PCP) - Sr Presidente, queria solicitar a V. Ex.ª que o Requerimento fosse distribuído, uma vez que não tivemos oportunidade de o ouvir, na íntegra.

O Sr Presidente: - Vai sei distribuído, Sr Deputado.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes

O Sr José Luís Nunes (PS): - Sr Presidente, a elaboração e a composição da Comissão foram copiadas, se me permitem a expressão, da Lei dos Serviços de Informação por pensar tratar-se de matéria conexa e por a metodologia parecer ter dado bom resultado.

O Sr Presidente: - Sr Deputado Jorge Lemos, por se ter avariado a máquina fotocopiadora não foi ainda possível tirar fotocópias No entanto, lerei novamente o Requerimento, mais devagar, para que V. Ex.ª possa tomar consciência do respectivo conteúdo, de modo a ser depois colocado à votação.
Foi lido de novo

O Sr Presidente: - Srs Deputados, vamos proceder a votação do requerimento.

Submetido à votarão, foi aprovado, com vovos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI, com as abstenções do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

O Si Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Jorge Lemos.

O Sr Jorge Lemos (PCP): - Sr Presidente, Srs Deputados: Abstivemo-nos na votação deste requerimento em virtude de nos parecer totalmente injustificada a constituição, para apreciação de matéria que tem a ver com a proposta e os projectos de lei que acabamos de votar, de uma comissão eventual que integre deputados da Comissão de Defesa Nacional, uma vê? que esta matéria nada tem a ver com essa Comissão mas sim com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr António Taborda (MDP/CDE): - Sr Presidente, Srs Deputados: Abstivemo-nos na votação do requerimento de baixa à Comissão da proposta e dos projectos de lei que acabámos de votai, por entendermos ter dúvidas quanto à possibilidade de a discussão da proposta de lei ser feita em comissão, dada a necessidade, já por mim apontada, de se obter, para alguns dos seus artigos, se mantidos, uma maioria de dois terços, embora não desconheçamos o processo que foi adoptado na Lei de Defesa, que também baixou à Comissão.
Não conseguimos, porém, descortinar como é possível aplicar, na discussão em comissão, o n.º 5 do artigo 171.º quando ele parece referir-se, obviamente, ao Plenário.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, estão em discussão conjunta a proposta de lei n.º 84/III, que autoriza o Governo, através do Ministro das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante de USD 57 500 000 para aquisição de material e equipamento de defesa proveniente dos EUA. e a proposta de lei n.º 85/III, que autoriza o Governo, através do Ministro das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante de USD 45 000 000, para aquisição de material e equipamento de defesa proveniente dos EUA.

O Sr Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr Presidente.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr Carlos Carvalhas (PCP): - Sr Presidente, pensamos que estes empréstimos se enquadram nas negociações dos Acordos das Lages e, por isso mesmo, gostaria de saber se a Mesa possui esses acordos - e, aliás, temos pedido, reiteradamente, ao Governo que nos sejam fornecidos - e, em caso afirmativo, se nos poderia fornecê-los.

O Sr. Presidente: - Sr Deputado Carlos Carvalhas, limitei-me apenas a enunciar os pontos seguintes da

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ordem de trabalhos e julgo que a Mesa não dispõe desses elementos No entanto, vou procurar informar-me junto dos Srs. Secretários da Mesa

Pausa.

Sr. Deputado Carlos Carvalhas, efectivamente, a Mesa não dispõe desses acordos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Dá-me licença, Sr Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, uma vez que o Governo está aqui presente, talvez ele possa responder a esta questão.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional (Figueiredo Lopes): - Sr. Presidente, Srs Deputados Reforçar o prestígio e a capacidade operacional das Forças Armadas Portuguesa!», como instituição nacional ao serviço do povo português e indispensável à afirmação nacional no seio das nações, constitui preocupação da política de defesa nacional que tem vindo a ser prosseguida pelo Governo.
Torna-se com efeito necessário, para a prossecução da política de defesa nacional, organizar uma capacidade de defesa militar indispensável para assegurar a defesa de todo o território nacional e para exercer a presença aérea e marítima nos largos mares portugueses e no espaço Interterritorial.
Só umas forças armadas bem equipadas e treinadas podem satisfazer estes objectivos.
Deve, por isso, considerar-se como imperativo nacional indeclinável a implementação de medidas de reestruturação, modernização e reequipamento das Forças Armadas Portuguesas. Em suma, a organização de uma capacidade dissuasora adequada aos cenários de conflito ou de ameaça externa.
Tudo isto corresponde, em grande parte, a dotar as Forças Armadas com os meios necessários ao cumprimento cabal das suas missões e com um adequado nível de tecnicidade, de armamento e de equipamento. E é oportuno lembrar aqui a natureza das missões em que as nossas tropas estiveram, durante muitos anos, empenhadas em África -em operações próprias da luta de guerrilhas-, o que as afastou dos padrões europeus quanto a equipamentos militares e a requisitos técnicos exigidos pelos conflitos convencionais modernos.
Sr Presidente, Srs. Deputados: Nestas condições, as carências são elevadas e os planos de modernização e de reequipamento implicam a afectação de avultados recursos financeiros, que não são possíveis, na sua grande parte, de encontrar ao nível nacional.
Desde há anos que se tem vindo a procurar, junto dos países nossos amigos e aliados da NATO, iniciativas que visem obter apoio em material e em fundos financeiros para fins de reequipamento das Forças Armadas.
Esta acção é levada a cabo, principalmente, no âmbito dos acordos bilaterais relacionados com a concessão de facilidades em território nacional.
Aproveito para introduzir aqui um parêntesis para responder ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas que, efectivamente, parte das autorizações que estamos neste momento a subscrever se inscrevem no âmbito das negociações do Acordo das Lages, ultimamente celebrado.
No caso que agora nos interessa considerar, a comparticipação directa dos Estados Unidos da América é constituída por duas parcelas, no âmbito desse mesmo acordo, incluindo verbas «grant» (ou dádivas) e créditos especiais concedidos no âmbito dos programas FMS (Foreign Military Sales), que são, como se sabe, destinados à aquisição de material e equipamento produzido nos EUA.
Este sistema de ajuda, que se inscreve na política norte-americana de cooperação para o desenvolvimento da paz e da segurança entre os povos e para defesa das liberdades no mundo ocidental, funciona, para Portugal, desde há anos, tendo sido concedidas, nos últimos 3 anos, as seguintes verbas em 1982, dádiva 20 milhões de dólares, crédito 45 milhões de dólares; em 1983, dádiva 37,5 milhões de dólares, crédito 52,5 milhões de dólares; em 1984, dádiva 60 milhões de dólares, credito 45 milhões de dólares.
O Governo, tendo em conta, por um lado, as necessidades de modernização e reequipamento das Forças Armadas e, por outro lado, as condições especiais de ajuda proporcionadas pelos EUA, solicita à Assembleia da República autorização para celebrar os correspondentes contratos de empréstimo, conforme o previsto nos programas de assistência militar, quer naqueles que foram concedidos no presente ano fiscal quer ainda nos que foram previstos para 1982 e parte dos referentes a 1983, ainda não utilizados por carecerem de autorização parlamentar.
Estas verbas destinam-se a apoiar os nossos programas de reequipamento, elaborados em consonância com os planos gerais de modernização de cada um dos íamos das Forças Armadas.
Assim, encontram-se já em execução, utilizando, naturalmente, verbas concedidas através das dádivas - portanto, sem recurso ainda a créditos-, os seguintes programas: no exército, transformação dos carros de combate e das chaimites; na marinha, transformação e modernização das fragatas da classe João Belo, na força aérea, aquisição de uma segunda esquadra de Aviões A-7.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma última palavra sobre esta matéria
É no auxílio externo que se tem vindo a encontrar a principal fonte de financiamento dos projectos de reequipamento militar. Convém, porém, referir que em todos os acordos bilaterais com os Estados Unidos da América, com a Alemanha e, mais recentemente, com a França, têm sido incluídas cláusulas, privilegiando, directa ou indirectamente, a transferência de tecnologias de ponta e a cooperação industrial. O Ministério da Defesa Nacional tem vindo a desenvolver relações eficazes com a indústria nacional, no sentido de dar concretização a esses acordos, procurando-se, deste modo, incentivar a indústria nacional e fomentar a sua participação em projectos internacionais ou em fornecimento!) de bens e sei viços procurados no estrangeiro pelos nossos aliados, sendo, por isso, um estímulo importante para o desenvolvimento e o progresso tecnológico
As autorizações para os empréstimos que o Governo solicita a VV. Ex.ªs permitirão prosseguir na política de reequipamento e de modernização das Forças Armadas portuguesas, sem perder de vista os seus efeitos económicos, sociais, políticos e internacionais, fortalecendo os parâmetros e a estratégia de defesa nacional no seu sentido mais amplo.

Aplausos do PS e do PSD

O Sr. Presidente: - Estão inscritos, para pedirem esclarecimentos, os Srs. Deputados César Oliveira, António Gonzalez e Carlos Carvalhas.
Tem, pois a palavra o Sr. Deputado César Oliveira

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O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, devo dizer-lhe que a sua intervenção me deixou verdadeiramente perplexo.
V. Ex.ª foi testemunha presencial e recorda-se, certamente, de que, na antiga Sala do Senado, insisti várias vezes com o Prof. Mota Pinto - e também com V. Ex.ª - para que, atempadamente, fôssemos devidamente informados de quais as contrapartidas efectivas dos Acordos das Lajes e de como é que elas se poderiam inscrever, em termos orçamentais, no Orçamento do Estado referente a este ano.
Na realidade, várias vezes tenho insistido nessa direcção, e V. Ex.ª vem aqui agora, com o seu discurso, baralhar tudo completamente, dizendo que uma parte disto se refere às contrapartidas mas a outra parte não.
Portanto, o primeiro ponto que gostaria que me esclarecesse é este: que parte destes empréstimos absorvem as contrapartidas em materiais decorrentes do acordo sobre a cedência de utilização da Base das Lajes?
Para além disso, como. presumivelmente, isto não se destina a comprar velas que não se apaguem -ou que se apaguem, depende dos gostos -, penso que seria bom que V. Ex.ª precisasse qual o material que vai ser comprado com este empréstimo.
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado vem falar agora do reequipamento e da transformação das fragatas da classe João Belo, quando sempre me bati aqui, na Assembleia da República, pelo reequipamento e pela modernização da nossa Armada, em detrimento de outras modernizações que se façam quer no Exército quer na Força Aérea. Expliquei aqui sucintamente - e, aliás, já discutimos isso em sede própria na comissão - qual o objectivo que deveria presidir ao reequipamento da Armada, mas sempre no pressuposto de que viriam três fragatas. Agora V. Ex.ª vem dar novas, deixando pressupor que, afinal, o negócio das fragatas gorou-se. Não é uma reivindicação estrutural mas é, de qualquer modo, um fracasso que V. Ex.ª aqui vem assumir.
Gostaria, para já, que me respondesse cabal, efectiva e completamente a estas questões que lhe formulei.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ªs deseja responder já ou apenas no fim?

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional:- Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, dou de imediato a palavra ao Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, as minhas perguntas vão um pouco no sentido das que fiz aqui há 1 ano atrás.
No ano passado perguntei o que é que iríamos comprar com estas verbas. Ora, este ano o montante das duas verbas ascende a 15 milhões 344 mil 250 contos - à cotação de 149,7 escudos por dólar, que, creio, é a cotação de hoje -, o que é, realmente, uma quantia bastante grande, mesmo considerando que só começará a ser paga a partir de 1988 ou 1989.
Estamos num país que não aguenta despesas deste género, principalmente para este fim. Portanto, gostaria de perguntar se realmente todas estas verbas se destinam aos três fins que V. Ex.ª referiu, nomeadamente à transformação das fragatas.
Já agora pergunto que transformações se pretendem fazer nas fragatas. Será para a tornar capazes de actuar na área das pescas, isto é, no apoio às unidades de pesca nacionais, no controle à zona económica exclusiva ou vão receber unicamente equipamento de combate?
Em relação aos Aviões A-7, pergunto se não seria mais útil a aquisição de helicópteros mais adaptados às nossas necessidades e de aviões mais lentos.
Pergunto, ainda, se V. Ex.ª, não acha que estas verbas seriam muito mais úteis na aplicação aos problemas que o nosso País enfrenta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, V. Ex.ª já me informou de que, parte destes empréstimos se enquadram nas negociações do Acordo das Lajes. Porém, penso que não é só parte, na medida em que os créditos especiais que apresentou -de 45 milhões, de 52,5 milhões e de 45 milhões- são todos dos Acordos das Lajes não os esgotando.
A primeira questão que lhe coloco, e para a qual gostaria de obter uma resposta concreta, é esta: esta despesa está contida no Orçamento do Estado para 1984?
Segunda questão: por que razão é que V. Ex.ª e o Governo ainda não apresentaram a esta Assembleia os Acordos das Lajes?
Na realidade, nem a opinião pública nem este órgão de soberania têm conhecimento destes Acordos, o que é um desrespeito por esta Assembleia. Temos, reiteradamente, pedido ao Governo que nos dê conhecimento desses acordos mas este continua a ser relapso. Relapso é-o, ainda, esta noite, quando aqui vem pedir autorização para contrair empréstimos da ordem dos 15 milhões de contos.
Ora, esta questão das Lajes diz respeito a este órgão de soberania, pondo, inclusivamente, questões de independência e de soberania nacional, e, para além disso, como V. Ex.ª disse, diz também respeito à paz, à tranquilidade e à segurança dos portugueses, bem como aos seus direitos, liberdades e garantias.
O Governo apresenta agora aqui um novo pedido de autorização - a proposta de lei n.º 69/III -, onde nos dá a conhecer que a trabalhadores portugueses a trabalhar em Portugal não se lhes aplica a lei portuguesa. Eles têm, portanto, um estatuto diminuído, o que é uma vergonha e um escândalo, Sr. Secretário de Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É uma vergonha e um escândalo que a trabalhadores portugueses que trabalham na Base das Lajes não se lhes aplique a lei portuguesa.
Mas o Governo vai mais longe, pedindo mesmo na sua proposta de lei autorização para delimitar a competência dos tribunais em matéria de infracções criminais, de pedidos de indemnização, de questões emergentes do emprego de cidadãos portugueses. Isto é delimitar a competência dos tribunais portugueses, o que significa que para o Governo os tribunais não são competentes para determinados portugueses, e isto é inconstitucional.
Por isso mesmo pensamos que seria importante que o Sr. Secretário de Estado e o Governo apresentassem a esta Câmara esses Acordos.
Por último. Sr. Secretário de Estado, e passando por cima dos lapsos que apresenta aqui na proposta de lei n.º 84/III, logo na exposição de motivos gostaria de lhe perguntar o que é que significam, na alínea e), as taxas de juro normais para estes empréstimos. Quais são essas taxas de juro normais, Sr. Secretário de Estado?
Penso que esta é também uma questão central. Aliás, já no ano passado, em 15 de Julho, às tantas da noite.

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estivemos aqui a discutir este assunto. Este ano a questão repete-se ainda em relação à mesma lei e chegamos a este momento e o Sr. Secretário de Estado vem com uma nova proposta em que, em relação às taxas de juro, não concerteza absolutamente nada.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Muito obrigado, Sr Presidente.
Em primeiro lugar, gostaria de esclarecer o Sr. Deputado César Oliveira de que ..

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, não leve a mal que o interrompa só por uns momentos. Mas é que o Sr. Deputado Magalhães Mota, em função dos gestos que fez, pretende interpelar a Mesa.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, tinha-me inscrito há pouco e o Sr. Secretário Maia fez-me sinal de que tinha percebido a minha inscrição para pedir esclarecimentos. Era apenas isso, que queria relembrar à Mesa, antes de o Sr. Secretário de Estado intervir.

O Sr. Presidente: - Tive o cuidado de repetir os nomes dos Srs. Deputados que tinham feito a respectiva inscrição, mas de facto passei sobre o nome do Sr. Deputado.
Assim sendo, peco-lhe, Sr. Secretário de Estado, que não leve a mal que conceda a palavra ao Sr. Deputado Magalhães Mota para formular o pedido de esclarecimento que entender, no pressuposto de que foi lapso da nossa parte

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Muito obrigado. Sr. Presidente.

Sr Secretário de Estado, gostaríamos de obter alguns esclarecimentos que nos permitissem enquadrar melhor esta proposta de lei. Com efeito, a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas entrou em vigor há bastante tempo. Está largamente excedido o prazo fixado para a apresentação das propostas de lei complementares...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - ..., nenhuma delas surgiu e não se pode sequer iniciar a discussão do conceito estratégico de defesa nacional, do qual dependerão todas as outras matérias.
Portanto, nós não temos lei de programação militar, não temos um conceito estratégico e estamos a criar despesas em matéria de armamento, sem que elas se enquadrem em nenhuma destas planificações.
Estamos, portanto, a cumprir planos provavelmente desactualizados, estamos, portanto, a seguir orientações um pouco a esmo e à margem daquilo que a Assembleia votou a propósito da Lei de Defesa Nacional.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Assim sendo, teremos que ser naturalmente mais exigentes. A Assembleia da República - visto que a ela lhe compete, como parte do poder político, orientar e permanentemente dirigir a organização da defesa nacional - terá que saber que tipo de equipamento vai ser adquirido, quais as suas vantagens específicas e como é que se articula com as necessidades da defesa nacional
V. Ex.ª, Sr Secretário de Estado, falou-nos, grosso-modo na transformação de carro, de combate, na modernização das fragatas, na compra de uma nova esquadra de Aviões A-7 Perguntaria:_ os Aviões A-7 não se revelaram obsoletos, com dificuldades de sobresselentes, com dificuldades crescentes no prazo que é o da duração do empréstimo?

O Sr César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - As fragatas não revelaram a sua dificuldade de adaptação às necessidades da nossa marinha de guerra, que são natural e provavelmente de outros navios e de outro tipo? As fragatas da classe João Belo não estão já tão desadaptadas que a sua adaptação em termos modernos se revelará praticamente impossível, e por isso o governo projectava adquirir novas fragatas1!
Perguntarei ainda, Sr Presidente e Srs. Deputados, em que termos estes novos empréstimos vão pesar na nossa dívida externa e que tipo de ponderação foi feita em relação a esse peso e às suas consequências no endevidamento externo português

O Sr César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Secretario de Estado da Defesa, tem então a oportunidade de usar da palavra às questões que lhe foram formuladas

O Sr. Secretário de Estado da Defesa: - Sr Presidente e Srs. Deputados: Julgo que, em resumo, as perguntas que foram apresentadas pelos Srs. Deputados se referem fundamentalmente à questão da inserção ou não destes pedidos no contexto do Acordo das Lages e à problemática do equipamento, ou seja, do sentido destas verbas, além de outras matérias que estou disposto a esclarecer. Mas para já será bom responder a estas duas que considero principais.
Em relação à primeira, quero dizer que estas facilidades de crédito e de ajuda não estão isoladas. Elas foram objecto de troca de notas - aliás publicadas no Diário da República, de 5 de Maio de 1984, e que por isso estão ao dispor de todos os Srs. Deputados - e, nessa troca de notas foram estabelecidos princípios gerais de cooperação entre Portugal e os Estado Unidos, princípios esses que se traduziram e quantificaram nesta mesma troca de notas em garantias ou projectos de assistência dos Estados Unidos relativamente a Portugal É aí que se enquadra este conjunto de ajudas Por um lado, as doações, as dádivas, que são, como tive oportunidade de demonstrar, muito superiores aos créditos, sobretudo em 1984; e, por outro lado, esses mesmos créditos foram concedidos em condições especiais
Quanto ao desconhecimento que os Srs. Deputados têm acerca dos termos do Acordo das Lajes, julgo que não está agora em discussão nem o Acordo propriamente dito nem tão pouco a proposta de lei e os fins que a mesma proposta tem em vista, proposta de lei que foi recentemente apresentada pelo Governo e que visa obter autorização da Assembleia para regulamentar matérias de carácter excepcional inseridas nesse Acordo.
Assim que houver oportunidade de a Assembleia inscrever na sua agenda a discussão dessas matérias, o Governo dará toda a disponibilidade para prestar os mais amplos esclarecimentos sobre os termos do Acordo.
Mas neste momento não é propriamente disso que se trata. Esta matéria tem que ver com o Acordo das Lajes na única medida em que a celebração do Acordo e a concessão de facilidades em território nacional e aos Estados Unidos constituem uma base de afirmação ou de negociação que conduz à disponibilidade dos Estados Unidos e das suas finanças para apoiarem programas de modernização das Forças Armadas Portuguesas

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A Sr.ª Ilda: Figueiredo (PCP): - Mas é bom que se saibam as contrapartidas. Por isso é que se deve conhecer o Acordo.

O Orador: - Em segundo lugar perguntam-me que material. Eu na minha exposição, referi-me em termos gerais a duas vertentes, naquilo a que se poderia chamar o plano de mudança ou de reconstrução ou de reforma das Forças Armadas.
Por um lado, o plano de modernização e, por outro lado, o plano de reequipamento. E eu faço a distinção porque na verdade quando falo na conversão dos carros de combate e em outro plano nas fragatas João Belo o que está em causa e fundamentalmente a modernização. Trata-se de aproveitar aquilo que é essencial neste equipamento, aquilo que tem alguma capacidade operacional e introduzir elementos modernizados - nomeadamente no que respeita aos sistemas mais evoluídos de telecomunicações e de propulsão - para tornar estes mesmos meios mais aptos ao cumprimento das suas missões.
Nas fragatas, V. Ex.ª referiram e muito bem, que tinha omitido a aquisição de novas fragatas. Acontece que de facto não estamos perante a mesma situação. Quando falo de fragatas João Belo e da sua adaptação, refiro-me ao plano de modernização dos meios existentes, quando falo - e o Governo continua a falar e a lutar no sentido de levar a cabo este grande objectivo - na aquisição de leis novas fragatas para a Marinha de Guerra Portuguesa estamos perante um plano de reequipamento, um plano de reforço dos meios existentes.
Posso informar, a Assembleia de que o Governo não desistiu de prosseguir este objectivo. O que está em causa e a capacidade de financiamento desses meios que são extremamente caros. Não quereria a Assembleia, que eu incluísse este projecto no contexto dos créditos que aqui são concedidos, quando lhes informar que o valor global do projecto das novas fragatas anda na ordem dos 750 milhões de dólares É, portanto, um plano que tem de obter financiamento noutras fontes.
Relativamente, à referência que o Sr. Deputado Magalhães Mota tem quanto ao seu desapontamento de não temos ainda aprovado as propostas de lei complementares da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, a grande parte delas ou pelo menos aquelas que o Sr. Deputado referiu - e que me permito considerar também como as mais importantes -, pois, Srs Deputados, somos nós os primeiros a lamentar que, apesar de desde Fevereiro do corrente ano, essas propostas de lei terem dado entrada nesta Casa, elas não tenham tido ainda oportunidade de serem inscritas na ordem do dia e de terem sido discutidas, porque desde essa ocasião o Governo está pronto para aqui vir prestar-se a essa discussão temos esse conjunto de propostas de lei desde há bastante tempo presentes nesta Assembleia da República
Relativamente aos Aviões A-7 -questão muito importante, que tem sido citada com alguma frequência em órgãos de comunicação social -, posso confirmar ao Sr. Deputado que, os problemas dos Aviões A-7 e fundamentalmente um os Aviões A-7 são a fórmula encontrada pela Força Aérea Portuguesa de reapetrechar, em termos satisfatórios os seus meios, reconvertendo aviões usados Mas fazendo-o de tal forma que os pode transformar e adaptar às operações que lhes estão destinadas. O que aconteceu em relação a este material, que, como os Srs. Deputados sabem, está a ser recebido em Portugal há muito pouco tempo, foi ter sido detectada uma pequena deficiência num dos motores, o que o obrigou a uma revisão profunda por conta dos próprios construtores. Portanto não me parece que seja motivo de alarme a existência desse defeito e ainda bem que foi detectado a tempo, porque está a ser convenientemente reparado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Peço a palavra, para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª terá de reconhecer que disse pouco, e o pouco que disse foi pouco esclarecedor. Devo dizer a V. Ex.ª que a seu tempo se fará, e porventura brevemente, aqui, nesta Câmara, o processo da completa ineficácia e da completa incompetência da gestão Mota Pinto na defesa nacional. A seu tempo se fará tal processo aqui nesta Câmara.

O Sr Octávio Cunha (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Por agora farei apenas duas ou três notas em relação ao que V. Ex.ª disse então, onde estão os aviões-patrulha para a fiscalização eficaz da nossa Zona Económica Exclusiva?
Por que é que o Governo insiste nesta coisa que V. Ex.ª agora afirmou e que se traduz assim (são palavras de V. Ex.ª) - (...) a fórmula encontrada pela Força Aérea Portuguesa -. etc , etc
Então, o Governo não diz nada? Não é o Governo que planifica? Não é o Governo que programa? Então o que faz o Governo em termos da programação global do reequipamento das Forças Armadas Portuguesas?
Então é a Força Aérea que encontra a formula e o Governo não diz nada nesta matéria de tão grande e transcendental importância?
Ó Sr. Secretário de Estado, quanto aos aviões, A-7, quer-me parecer bem que não e só a deficiência do motor! ... E eu espero bem que a política de reequipamento das Forças Armadas Portuguesas não se traduza, como se traduziu sob a gestão de Santos Costa, em aceitar a sucata que os Estados Unidos querem impingir a Portugal, com a maior desfaçatez e de ânimo leve pelo Governo e pela gestão do Prof. Mota Pinto na Defesa Nacional.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr Deputado,

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, o meu protesto é devido por V. Ex.ª não ter respondido a uma pergunta que diz respeito ao cumprimento do Orçamento do Estado. Está ou não inscrita no Orçamento a verba do empréstimo que o Governo vem pedir? E isto porque das duas, uma, ou está inscrita no Orçamento e então não faz sentido vir aqui pedir a automação - e se está, devo dizer que ultrapassou a verba -, ou não está e, então, o Governo devia trazer aqui uma proposta de alteração do Orçamento concomitantemente com o pedido de autorização

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, protesto porque o Sr. Secretário de Estado veio-nos dizer - e isto diz respeito a todos os deputados - que não divulga os acordos relativos às Lajes. Ora, a opinião pública e este órgão de soberania desconhecem os termos dos acordos e não sabem quais são as contrapartidas.
O Sr. Secretário de Estado disse que há anos em que inclusivamente as dádivas são superiores aos emprés-

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timos Mas isso só diz respeito ao ano de 1984. E as contrapartidas? Os 1500 trabalhadores são «gente» de terceira classe, que fica com um estatuto diminuído? Como esta renegociação, já foi feita na vigência desta Constituição, ela é contrariada?
Quais foram as contrapartidas quanto às facilidades que deram em relação às, bases no continente, nomeadamente em Beja? Esquece-se de esconder isto à opinião pública. Sr. Secretário de Estado?
Vou relembrar-lhe, Sr. Secretário de Estado, a opinião do Secretariado Regional Socialista dos Açores «A voracidade financeira e a estreiteza de princípios com que o Governo Regional se tem movido nesta matéria desafia a nobreza de ideais e sentimentos, a segurança futura do território e das populações perante as quais nenhum tipo de contrapartidas financeiras ou outras são susceptíveis de sobrevaloração. Tais acordos envolvem...»

O Sr. Presidente: - Sr Deputado, terminou o tempo que dispunha para formular o protesto.

O Sr. António Gonzalez (Indep ). - Sr Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr. António Gonzalez(Indep.): - Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar quero protestar porque fiquei sem saber qual é a utilidade desta compra para a sociedade civil, na medida em que estas verbas seriam muito mais úteis para a remodelação da nossa economia, nomeadamente a açoriana
Em segundo lugar, porque para os ecologistas de todo o Mundo e, neste caso, para os portugueses, as despesas militares são não só desnecessárias como constituem um travão para o desenvolvimento de países com dificuldades, como é o nosso caso
Em terceiro lugar, porque se em 1983 em Portugal já apertávamos o cinto - como já aqui referi no ano passado -, em 1984 já o tirámos para o comer, e se não nos pusermos a «pau», em 1988, quando começarmos a pagar, seremos um país de nudistas forçados, apesar do desagrado que isso trará para alguns moralistas actuais da nossa praça.

O Sr Presidente: - Para contraprotestos, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Sr Presidente, Srs. Deputados Sem quebra do respeito que me merecem os Srs. Deputados, mas por consideraçâo para com o adiantado da hora e, sobretudo, porque vai haver muitas oportunidades de continuarmos este debate, não tenho mais nada a acrescentar aquilo que já referi anteriormente.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Então não responde se está ou não no Orçamento do Estado?

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo. É absolutamente inadmissível para esta Câmara a resposta que acaba de ser dada pelo Sr. Secretário de Estado, na medida em que há uma questão que foi levantada pelo meu camarada Carlos Carvalhas que é absolutamente essencial para se poder em votar ou não estas leis.

Protestos do PSD.

Srs Deputados, se quiserem usar da palavra inscrevam-se, façam protestos, pedidos de esclarecimento e, então, poderemos falar à vontade. Porém estarem a falar em surdina, sem darem a cara, não vale a pena, pois isso é só fazer perder tempo à Câmara

Protestos do PSD.

Estava eu a dizer que é absolutamente impossível votar estes diplomas enquanto não houver resposta clara a uma questão que aqui foi colocada pelo meu camarada Carlos Carvalhas, que é a seguinte: ou estas despesas - porque isto trata-se de despesas na óptica do Estado, na óptica dos Ministérios ligados às Forças Armadas - estão inscritas no Orçamento do Estado, ou não estão. O Sr. Secretário de Estado acenou com a cabeça e julgo que esse gesto quer dizer que não estão inscritos no Orçamento do Estado

O Sr Secretário de Estado da Defesa Nacional - Não podem estar!

O Orador: - É que se não estão inscritas no Orçamento do Estado não pode ser autorizada a realização de despesas - qualquer que seja o Ministério - sem que haja uma proposta de alteração do Orçamento do Estado

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional - Não é uma despesa. É um empréstimo!

O Orador: - Apesar da elevada hora da manhã, isso faz-me rir, Sr. Secretário de Estado! De facto, é um empréstimo que aqui se pretende, mas é um empréstimo para, como é referido nas próprias propostas, adquirir equipamento dos Estados Unidos para os Ministérios ligados ao Ministério da Defesa. O Sr. Secretário de Estado referiu concretamente os tanques para o Ministério do Exército, as fragatas para o Ministério da Marinha e os aviões para a Força Aérea.
Ora, há empréstimo por parte dos Estados Unidos e há despesa por parte do Estado português. Se estas verbas não estão inscritas no Orçamento do Estado para 1984, não é possível a esta Câmara votar essa autorização de despesa implícita na autorização de empréstimo, a não ser que haja um orçamento suplementai.
É absolutamente necessário que o Governo responda a esta questão para que a Câmara possa saber se vota ou não. Se essas verbas não estiverem inscritas no Orçamento e se não há um orçamento suplementar - como não há -, esta Câmara não pode votar favoravelmente desrespeitando o que está estatuído na Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado que, por sua vez, está muito claramente estatuído na Constituição da República Portuguesa.
Portanto, é absolutamente necessário e indispensável dar resposta e estas questões. E isto independentemente de o Sr. Deputado José Vitorino estar cansado e querer ir dormir e estar constantemente a fazer sinais, ao Sr Secretário de Estado para que ele não responda. Isso não é método, Sr Deputado.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado José Vitorino esta com vontade de ir dormir, vá dormir à vontade, pois certamente que haverá camaradas seus que poderão dirigir a sua bancada, mas não dê instruções que não deveriam ser admitidas neste Plenário para que o Sr. Secretário de Estado não responda.

Protestos do PSD

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Aguardo pois, que o Sr Secretario de Estado dê os esclarecimentos que, do nosso ponto de vista são indispensáveis para se poder votar conscientemente as propostas de lei que aqui nos trouxe.

O Sr José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra ao abrigo do direito de defesa.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, recuso as provocações de V. Ex.ª além do mais porque não percebeu o gesto que eu fiz. Por isso, quando não percebemos alguma coisa não nos devemos pronunciar porque caímos no risco de cair no ridículo, tal como aconteceu agora com o Sr. Deputado

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Octávio Teixeira para dar explicações se assim o desejar.

O Sr Octávio Teixeira(PCP): - Sr Deputado José Vitorino não se trata aqui de nenhuma provocação, e V. Ex.ª sabe que é verdade.
Aliás, posso dizer -lhe mais é que V. Ex.ª não só fez os gestos que eu referi como, quando o Sr Secretário de Estado se preparava para dar a resposta aos protestos formulados pelos meu camarada Carlos Carvalhas e pelos Srs. Deputados César Oliveira e Magalhães Mota, foi o Sr Deputado José Vitorino que se abeirou do Sr Secretário de Estado para lhe dizer «não responda, não prolongue», e o Sr. Secretário de Estado levantou-se e referiu aquilo que todos ouvimos.

O Sr José Vitorino (PSD): - Sr Presidente, peço a palavra para dar explicações.

O Sr Presidente: - Sr Deputado, V. Ex.ª não tem possibilidade de dar explicações, na medida em que invocou a figura regimental do direito de defesa. Portanto quem teve o direito de dar explicações foi o Sr. Deputado Octávio Teixeira. No entanto, se pretende fazer uma intervenção faça favor, Sr Deputado.

O Sr José Vitorino (PSD): - Não, Sr Presidente, não quero fazer nenhuma intervenção porque nós, Grupo Parlamentar do PSD, apenas usamos da palavra ao abrigo das figuras regimentais correctas.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a Palavra, Sr. Presidente.

O Sr Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes está a pedir a palavra para que efeito?

O Sr José Luís Nunes(PS): - É apenas para lembrar a Mesa que há um único gesto na História portuguesa que é absolutamente irrefutável e que foi criado por Rafael Bordalo Pinheiro e imortalizado na louça das Caldas. Não se tratando disso, creio que deveríamos terminar com esse incidente.

Aplausos do PS e do PSD

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Sr Presidente, peço a palavra.

O Sr Presidente: - Para que efeito Sr Deputado?

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, creio que a referência indirecta do Sr Deputado José Luís Nunes quis fazer com esta intervenção foi relativamente clara. Assim, se V. Ex.º me permitisse, daria uma explicação ao Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. Presidente: - Sr Deputado, creio que a posição que o Sr. Deputado José Luís Nunes tomou foi apenas uma posição de bom humor, na medida em que nem invocou nenhuma figura regimental para usar da palavra.
No entanto, se o Sr. Deputado Octávio Teixeira entende que ouve qualquer posição ou afirmação por parte do Sr. Deputado José Luis Nunes que constitua ofensa a sua dignidade, V. Ex.ª é juiz dessa figura regimental que irá invocar para poder ou não usar da palavra ao abrigo do direito de defesa.

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Sr Presidente, então utilizarei a palavra ao abrigo da figura regimental do direito de defesa para dizer muito rapidamente, porque não estou interessado em fazer perder tempo a Câmara, que os gestos públicos ou privados do Sr Deputado José Luís Nunes ficam com ele. No entanto, eles ficam mal nesta Câmara.

O Sr Presidente: - O Sr Deputado José Luis Nunes pretende dar explicações?
Porém, devo dizer que não devemos abrir um incidente apenas por causa de um gesto de bom humor.

O Sr José Luís Nunes (PS): - Exactamente, Sr. Presidente. Aliás, nem a expressão «gestos públicos ou privados» entrará na história do Parlamento.
Devo dizer que pensei que o Sr. Deputado Octávio Teixeira, que defende um partido que se reclama do povo, sentisse uma certa alegria por ver invocada nesta Assembleia essa figura nobilíssima do «Zé Povo», que no António Maria e em outras publicações do fim do século encheram de alegria os nossos bisavós e os nossos avos.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Lamentamos que o Sr. Secretário de Estado não nos tenha dito nada sobre se estava ou não inscrito no Orçamento do Estado tal pedido de autorização de empréstimos, nem em relação às taxas de juro. Pelo menos, em relação à Lei n.º 26/83, poderia dizer-nos qual foi a taxa de juro utilizada nos empréstimos.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa: - Dá-me licença que o interrompa, Sr Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Sr. Deputado, julgava ser óbvio que a inscrição no Orçamento se faz por ocasião da previsão da realização das despesas.
Neste momento, trata-se de adquirir fundos, de obter autorização para o Governo, no momento oportuno - e pode ser dentro de um, dois ou três meses ou daqui a um ano -, realizar despesas por conta destes fundos que agora vão estar a sua disponibilidade.

A Sr.ª Ilda Figueiredo(PCP): - Mas só o pode fazer se estiver orçamentado, Sr Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Estará orçamentado na altura em que eu realizar a despesa Nessa altura essa despesa será orçamentada

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A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O Orçamento é para todo o ano!

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Em segundo lugar, devo dizer que não valerá a pena continuar a dar resposta a questões que me parecem estar claras para toda a gente, menos para o Sr. Deputado, que insiste nelas. Creio, pois, que seria mais oportuno que essas questões fossem colocadas aquando da discussão do Orçamento.

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, como V. Ex.ª sabe, no Orçamento não há «sacos azuis». O Sr. Secretário de Estado sabe que o Governo já utilizou verbas que estão aqui e que já fez essas despesas. Portanto, essa desculpa, esse pretexto e esse expediente que utilizou são falsos e não redundam em benefício do Governo mas, pelo contrário, em seu desprestígio e em desprestígio desta Câmara.
Em relação às taxas de juros: isso também é de somenos?

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Não, Sr. Secretário de Estado.
Faça o favor de se inscrever para uma intervenção e deixe-me terminar.
Em relação à pergunta que lhe foi colocada acerca do peso destas verbas relativamente à dívida externa pergunto-lhe se 15 milhões de contos não têm qualquer significado. Era esta a prioridade? O que representam 15 milhos de contos, Sr. Secretário de Estado? Relembro-lhe que 15 milhões de contos correspondem à primeira fase do Alqueva, são mais do que o custo do projecto da beterraba sacarina, apresentado pela Tabaqueira e pela AGA.
15 milhões de contos, Sr. Secretário de Estado, dão para pagar os salários em atraso; 15 milhões de contos davam para a construção do porto de carvão em Sines, que não está realizado embora a central térmica esteja para arrancar; 15 milhões de contos dão para comprar 150 bons barcos de pesca!
Numa situação de economia degradada e com a dívida externa que temos, o Sr. Secretário de Estado veio aqui com uma proposta mal preparada, na qual nada nos diz e, inclusivamente, refere que não serão divulgados a esta Câmara os acordos das Lajes. E quer a aprovação destas autorizações legislativas!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições, vamos proceder às votações dos diplomas em discussão.
Assim, vamos votar na generalidade a proposta de lei n.º 84/III, que autoriza o Governo, através do Ministro das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante de USD 57 500 000, para aquisição de material e equipamento de defesa provenientes do EUA.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez, e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de lei n.º 85/III...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - O Sr. Presidente está a anunciar a passagem à votação da proposta de lei n.º 85/III, mas ainda não procedemos à votação na especialidade da proposta de lei n.º 84/III.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr.ª Deputada. Agradeço a sua colaboração, pois a esta hora ia passando à Mesa o cumprimento dessa obrigação.
Srs. Deputados, vamos pois entrar na discussão, apreciação e votação na especialidade da Proposta de Lei n.º 84/III, começando pelo artigo n.º 1, que é do seguinte teor:

ARTIGO 1.º

Fica o Governo autorizado, através do Ministro das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante de USD 57 500 000, para aquisição de material e equipamento de defesa provenientes dos Estados Unidos da América.
Srs. Deputados, está em discussão este artigo.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao artigo seguinte, que é do seguinte teor:

ARTIGO 2.º

Os empréstimos a que se refere o artigo 1.º da presente lei, assim como os autorizados pela Lei n.º 26/83, obedecerão às seguintes condições gerais:

a) Mutuante - Federal Financing Bank;
b) Mutuário - República Portuguesa;
c) Finalidade - aquisição de material e de equipamento de defesa provenientes dos Estados Unidos das América;
d) Prazo - 12 anos, sendo 4 de carência;
e) Taxa de Juro - a acordar entre o mutuante e o mutuário não podendo exceder as taxas prevalecentes no mercado para operações financeiras idênticas;
f) Amortização - em 8 anos, em prestações semestrais ou trimestrais. Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 3.º, que é o seguinte:

ARTIGO 3.º

Todos os pagamentos pelo mutuário, nos termos dos contratos, serão isentos de quaisquer impostos ou taxas em Portugal.

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Srs. Deputados, este artigo está em discussão

Pausa

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com voto? a favor do PS. do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS, e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr Presidente: - Srs Deputados, vamos passar ao artigo 4.º, do seguinte teor:

ARTIGO 4.º

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação
Esta em discussão

Pausa

Não havendo inscrições, vamos votar

Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, vai proceder-se a votação final global da proposta de lei n.º 84/III, cuja leitura por artigos presumo dispensada.

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr Presidente: - Srs Deputados, vamos proceder a discussão e votação na generalidade da proposta de lei n.º 85/III.

Pausa

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetida à votarão, foi aprovada, tom votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE. da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr Lopes Cardoso (UEDS): - Sr Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr Lopes Cardoso (UEDS): - Sr Presidente, queria sugerir à Mesa que, caso houvesse acordo do Plenário, se dispensasse a leitura, artigo por artigo, na votação na especialidade desta proposta

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Sr. Deputado, se não houver objecções, procederemos desse modo.

Pausa

Como não há objecções, assim faremos.
Srs. Deputados, esta em discussão o artigo 1.º

Pausa

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI

Era o seguinte:

ARTIGO 1.º

Fica o Governo autorizado, através do Ministro das Finanças e do Plano, a celebrar com o Federal Financing Bank contratos de empréstimo até ao montante de USD 45 000 000, para aquisição de material e equipamento de defesa provenientes dos Estados Unidos da América.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o artigo 2.º

Pausa

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

Era o seguinte

ARTIGO 2.º

Os empréstimos obedecerão às seguintes condições gerais

a) Mutuante - Federal Financing Bank,
b) Mutuário - República Portuguesa,
c) Finalidade - aquisição de material e de equipamento de defesa provenientes dos EUA,
d) Prazo - 12 anos, sendo 5 anos de Carência,
e) Taxa de juro - a fixar na data de utilização dos empréstimos, tendo em atenção as taxas prevalecentes no mercado para operações financeiras idênticas,
f) Amortização - Em 7 anos, em prestações semestrais ou trimestrais

O Sr Presidente: - Srs Deputados, está em discussão o artigo 3.º.

Pausa

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

Era o seguinte.

ARTIGO 3.º

Todos os pagamentos pelo mutuário, nos termos dos contratos, serão isentos de quaisquer impostos ou taxas em Portugal

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o artigo 4.º

Pauta

Não havendo inscrições, vamos votar

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP-CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

Era o seguinte.

ARTIGO 4.º

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global da proposta de lei n.º 85/III.

Submetida à votarão, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS, votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os planos ou projectos gerais de reequipamento e de modernização das Forças Armadas foram elaborados há vários anos e numa situação constítucional inteiramente diversa da que hoje vivemos Como tal, compreende-se mal que, após a revisão constítucional e após a votação da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, continuaremos a viver, no âmbito da defesa nacional, como se nenhuma modificação tivesse sido introduzida
Após a revisão constítucional, a Assembleia da República passou a deter em plenitude os seus poderes de fiscalização sobre todas as áreas da governação, incluindo a da defesa nacional. Por assim ser, é de estrita obrigação do Governo, que apresente à Assembleia da República, com clareza e atempadamente, esses projectos de modernização e de reequipamento e que eles se enquadrem nas disposições respeitantes à legislação complementar da Lei de Defesa Nacional
Tal como estamos, continuamos a aprovar coisas em termos de planos feitos há bastante tempo, sem uma orientação em termos de Lei de Defesa Nacional, sem orientação em termos de um plano político nem de orientação política dessa defesa nacional.
Continuamos, portanto, a funcionar como se a revisão constítucional fosse ignorada e, vez de ser o equipamento das Forças Armadas a submeter-se às orientações políticas, são as orientações políticas a submeter-se a factos consumados.
Creio, Si Presidente e Srs. Deputados, que esta situação - que já denunciámos o ano passado - não pode nem deve persistir E creio que o Governo, se pretende continuar a apresentar-nos pedidos desta natureza, tem que os apresentar de forma mais completa e mais exacta que permita à Assembleia pronunciar-se com algum rigor.
Creio, portanto, ter tornado claro que, sem pormos em causa - porque a reconhecemos - a necessidade de modernização e de reequipamentos das Forças Armadas, não nos parece ser este o melhor processo de conseguir que este reequipamentos e esta modernização de equipamento, sejam efectuados de uma forma politicamente consistente.
Gostaria ainda de salientar um outro aspecto, pensamos que a Assembleia da República tem obrigação de frisar, neste momento - e de o frisar com toda a clareza -, que é de muito difícil compreensão para nós deputados portugueses que, conhecidas as dificuldades financeiras e económicas que temos, conhecido o contributo que sempre temos dado em relação a defesa do Ocidente, que, por parte dos nossos aliados tradicionais, essa situação política, financeira e económica, não seja reconhecida como deve e não tenhamos da sua parte, para além de empréstimos, um auxilio a fundo perdido que pensamos claramente merecer e ter direito.
Estamos convencidos de que, sem tornar clara esta posição, a Assembleia da República não cumpriria a sua missão.
Sr. Presidente, Srs Deputados É nosso entendimentos que, numa negociação global como a que fizemos com o Governo dos Estados Unidos, também este Governo deveria ter dado - e de forma mais significativa - provas concretas da importância que atribui à situação estratégica de Portugal e ao contributo dado pelo nosso país à defesa Ocidental.
Cremos ainda, Sr Presidente e Srs Deputados, que os Estados Unidos têm particulares obrigações de solidariedade para com o Mundo Ocidental que, aliás, têm sobrecarregado por uma política interna monetarista, de modo que, também isso, em termos de negociações bilaterais, deve ser feito sentir.
Sr Presidente, Srs Deputados: Sob o ponto de vista das posições relativas ao destino último deste empréstimo, cremos ter tornado clara a nossa posição.
Gostaria de salientar que também não nos sentimos esclarecidos quanto ao peso destes empréstimos na situação da nossa dívida externa. Pensamos, no entanto - e foi isso o que motivou a nossa abstenção -, que o Governo terá ponderado essa situação e terá partido do princípio do que o afluxo financeiro representado por estes empréstimos e pela dilação no tempo do seu pagamento representa um benefício em termos daquilo que é naturalmente conhecido, qual seja, a da fungibilidade da moeda e, portanto, a possibilidade de este afluxo financeiro ser utilizado em termos genéricos pela economia portuguesa.
Esta razão - e apenas esta - levou a que o nosso voto não fosse negativo em relação a estas propostas de lei.
Mas daqui apelamos muito sinceramente para que, em próximas propostas de lei que venham a ter este âmbito e esta natureza, possam ser dados esclarecimentos mais completos à Assembleia da República.

Vozes da ASDI: - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.

O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP) - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Votámos contra porque o Sr. Secretário de Estado nos informou que esta autorização legislativa se enquadra nos acordos, ou melhor, na renegociação dos acordos das Leis.
Falou-nos desses acordos genericamente, mas nós sabemos de algumas contrapartidas - nomeadamente, a dos trabalhadores portugueses que trabalham em território nacional nas Lajes com um estatuto diminuído - e gostaríamos de conhecer outras, como por exemplo, as que dizem respeito à independência e à soberania nacional, à defesa, à paz e à segurança e tranquilidade dos portugueses.
O Sr. Secretário de Estado, porém, veio aqui pedir uma autorização legislativa sem divulgar por inteiro esses acordos a este orgão de soberania.
Votámos contra também porque o Sr Secretário de Estado, em relação à questão levantada sobre a autorização legislativa orçamental, não deu qualquer expli-

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cação. Pura e simplesmente, arranjou um argumento de pretexto para violar uma lei aprovada nesta Assembleia da República.
Em relação às taxas de juro, nada disse e aquilo que vem referido na proposta de lei não é nada! Dizer-se que se aplica a taxa de juro que é normal nestas operações, não significa nada! Qual é? 10%, 12%, 15%? É a do mercado de Londres? É a do Líbano? Qual e a taxa?
Depois, qual a ponderação do peso de 15 milhões de contos na dívida externa. Sr. Secretário de Estado, num país que tem uma dívida externa elevada e numa situação degradada? E qual a prioridade? Também não justificou! Refiro-me à prioridade em relação aos projectos de modernização e de reequipamento - ou mesmo de equipamento, como foi dito aqui no ano passado por um deputado do seu partido - sendo certo que, à luz da Constituição da República, essa prioridade devia-nos ser esclarecida.
Por tudo isto, não poderíamos deixar de votar contra e de protestar, mais uma vez, pelo facto de o Sr. Secretário de Estado e o Governo não darem conhecimento ao povo português e a este órgão de soberania dos acordos das Lajes por inteiro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais declarações de voto, passamos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que consiste na votação final e global da proposta de lei n.º 55/III.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Entretanto, o Sr. Deputado José Manuel Mendes pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, pretendia, sob a forma de interpelação à Mesa, anunciar à Câmara que ao abrigo das disposições regimentares o Partido Comunista Português vai requerer a avocação em Plenário de alguns artigos do diploma que consta do ponto em apreço da ordem de trabalhos.
E oferecia-me, desde já, para, subtraindo essa função à Mesa, ler o texto desse requerimento, se o Sr. Presidente assim o entender.

O Sr. Presidente: - A Mesa considera-se exausta e não põe objecções a que o Sr. Deputado faça essa leitura.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República: Ao abrigo do artigo 156.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, requerem a avocação da votação dos artigos 7.º, 21.º, 22.º e 23.º do texto da Comissão sobre o projecto de lei n.º 55/III (serviço de informações) nos termos e com os fundamentos seguintes:
Considerando que a proposta de lei n.º 55/III se insere no conjunto de propostas contra os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, onde avulta a proposta de lei de segurança interna que foi objecto de contundentes críticas durante a discussão na generalidade; considerando que da nossa parte exprimimos a clara posição que se procurava criar uma nova política; tendo em conta que as reservas e críticas que outros formularam pressupunham alterações na especialidade que delimitassem rigorosamente o âmbito desses serviços, reforçassem o sistema de fiscalização parlamentar e garantissem os direitos, liberdades e garantias do cidadão; tendo em conta que, entretanto, o debate na especialidade não só frustrou essas pretensões como, nalguns pontos de maior importância, agravou o conjunto de soluções constantes da proposta inicial - é o que se passa com a criação do centro de dados; tendo em conta que a proposta de lei sobre segurança interna e protecção civil tornou claros e evidentes os reais objectivos persecutórios e antidemocráticos que o Governo prosseguia com o pacote antiliberdades; assim, considerando que se torna assim legitima a necessidade de ser ponderada pelo Plenário da Assembleia designadamente pelos que votaram favoravelmente na generalidade e na especialidade, as disposições essenciais da presente lei; considerando que no texto avultam as disposições relativas do artigo 21.º (Serviço de Informações de Segurança); 23.º (Centro de Dados); e 7.º (Comissão de Fiscalização) e 22.º (secretário-geral da Comissão Técnica); considerando que nestes artigos está configurado o essencial de um sistema que visa a devassa da vida privada dos cidadãos, a discriminação e perseguição políticas a instrumentalização de serviços na defesa dos interesses político-partidários do Governo;
Considerando que quanto ao artigo 21.º o debate em torno do Serviço de Informações de Segurança, ao contrário de delimitar o seu âmbito e funções, conduziu a uma formulação não delimitada; considerando que, nos termos resultantes do debate na especialidade, todas as actividades lícitas dos cidadãos, de natureza política, sindical e cívica, poderiam passar a estar sujeitas a um indébito controle policial; considerando assim que desta forma o SIS ficou configurado como um verdadeiro serviço de informações políticas; considerando que a existência de uma nova polícia política é inaceitável no Portugal de Abril, contrariando os princípios democráticos e éticos que são o alicerce do regime consagrado na Constituição;

Vozes do PCP: - Muito bem!

III

Considerando, quanto ao artigo 23.º, que através de propostas de aditamento apresentadas pelo PS em sede de discussão na especialidade foi criado um Centro de Dados informatizados e dessa forma a famigerada ficha do cidadão; considerando que não são definidos limites quanto às informações a processar nessas fichas o que significa que se admite que nelas possam ser inscritas, contra o que é prescrito na CRP e contra os princípios democráticos e éticos informações sobre as convicções políticas, religiosas, partidárias ou sindicais e sobre a vida privada dos cidadãos; considerando que não é garantido o direito de acesso dos cidadãos ao que consta nos registos informáticos, direito previsto no artigo 35.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa; considerando que a constituição de uma pretensa "comissão de fiscalização de dados," configura mais uma forma de instrumentalização e governamentalização do ministério público, procurando dessa forma dar cobertura ao sistema;

IV

Considerando, quanto ao artigo 7.º que ao longo do debate na generalidade foi sucessivamente realçada a

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necessidade de uma adequada fiscalização parlamentar da actividade dos serviços de informações, considerando que foi entendimento unânime, no debate na generalidade, que os perigos e riscos decorrentes deste tipo de serviços reclamavam e impunham controle parlamentar exercido por uma comissão especializada, considerando que nos termos do artigo 181.º, n.º 2, da Constituição, as Comissões da Assembleia da República têm uma composição que deve corresponder à representatividade dos partidos, considerando que o Conselho de Fiscalização previsto no artigo 7.º é constituído só por 3 cidadãos, o que visando claramente excluir forças políticas com representação parlamentar frustra o citado preceito constítucional,

Vozes do PCP: - Muito bem!

Considerando as posições assumidas no debate na especialidade por deputados da própria maioria contra a solução constante do relatório, solução que se traduz em negar na prática uma fiscalização parlamentar exercida por todas, mas por todas as forças políticas no âmbito de uma Comissão Parlamentar;

O Sr. João Amara! (PCP) - Muito bem!

Considerando, quanto ao artigo 22.º, que no debate na generalidade foi sublinhada a importância da não concentração dos serviços, considerando que através da criação da figura do secretário-geral da Comissão Técnica (artigo 22.º, n.º 5) e do reforço dos poderes da Comissão Técnica, é criado um sistema centralizado de informações, misturando até informações da área da defesa nacional e da segurança interna considerando que, nestes termos, a Comissão Técnica com o seu secretário-geral e os seus serviços de apoio, se tornam num super-serviço de informações a mando do Primeiro-Ministro e Ministro da Administração Interna, entidades que no topo, comandariam todo o sistema em similitude com o solução constante da proposta de lei de segurança interna,

VI

Considerando que o sistema instituído no fundamental através destes artigos enquadrado nos projectos governamentais de legislação sobre segurança interna, se traduz não no combate à criminalidade em geral e ao terrorismo - como pretensamente o Governo tem invocado - mas na criação de uma policia política com vista à perseguição dos que legitíma e constitucionalmente criticam e se opõem ao Governo, considerando que se encontra assim justificada e se torna necessária, por imperativo democrático, a reconsideração do conteúdo global da lei dos serviços de informações apreciando, discutindo e votando em Plenário, à luz do dia, as suas disposições fundamentais.
Os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP requerem a avocação pelo Plenário da Assembleia da República do debate e votação na especialidade dos artigos 7.º (Conselho de Fiscalização), 21.º, (Serviço de Informações e Segurança), 22.º, (Comissão Técnica), 23.º, (Centros de Dados)

Aplausos do PCP

O Sr Presidente: - Sr Deputado José Manuel Mendes, o requerimento que acabou de ler tem de ser entregue na Mesa para ser ou não admitido Naturalmente que não vou admitir um requerimento para depois ele ficar aí na bancada do PCP Era um processo original, mas que nem a esta hora se admite!
Srs Deputados, o requerimento foi lido e esta conforme com o artigo 156º do Regimento, pelo que vai ser posto à votação.

Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PS, do PSD e da ASDI, com votos a favor do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do Sr Deputado Independente António Gonzalez, e a abstenção do CDS.

O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr José Magalhães (PCP): - Sr Presidente, Srs Deputados Visava-se com este requerimento uma reponderação, que era certamente bem necessária.
Dos trabalhos da Comissão restam as actas, pelo que vai ser possível conhecer, ponto a ponto, os fundamentos que foram aduzidos pró e contra as soluções finalmente consagradas Foi um debate interessante, e bem importa que essas actas sejam lidas atentamente por todos aqueles que a elas tenham acesso, urgindo que sejam publicadas.
A votação a que aqui se procedeu reflectiu que esta questão não era colocada ao Plenário da Assembleia da República de uma maneira forçada, era, todavia, necessário que os pontos mais graves, os mais melindrosos deste articulado, tivessem sido debatidos aqui, porventura com brevidade, mas com frontalidade e clareza de posições.

O Sr José Manuel Mendes (PCP) - Sem duvida!

O Orador: - Desde logo, a indelimitação chocante da definição do Serviço de Informações de Segurança Dizer-se que o Serviço (...) está incumbido da produção de informações destinadas a garantir a segurança interna e necessárias a prevenir a sabotagem, o terrorismo, a espionagem e (... )" - repare-se - "(...) a prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de direito constitucionalmente estabelecido", e abrir as portas a todas as formas de abuso, sobretudo se nos lembrarmos da forma absolutamente vaga como o diploma sobre segurança interna a define. Isto é, segurança interna é tudo, logo, os serviços podem investigar e obter informações sobre tudo.
Uma segunda questão diz respeito ao superbanco de dados. Tal e qual como apareceu prefigurado na Lei de Segurança Interna e foi transposto para o interior, para o bojo da lei dos serviços de informações, o sistema está configurado, sem que minimamente tivessem sido acauteladas as regras tendentes a prevenir a única coisa segura em matéria de informática, que é a não recolha, o não tratamento de certos dados. Não se instituiu uma única cautela fidedigna dessa matéria, ao mesmo tempo que se edificava um sistema que permite o tratamento informatizado de toda a espécie de dados, sem garantias adequadas de acesso - como os cidadãos têm direito, nos termos do artigo 35.º da Constituição - e sem garantias de fiscalização adequada, pretendendo-se, ainda por cima, envolver o ministério publico numa espécie de aparência fiscalizadora, altamente comprometedora para os seus proponentes. Esperemos que tenha a adequada consequência prática.
Uma terceira questão tem a ver com a supercentralização, ou seja, a criação da CT (Comissão Técnica) e do seu secretário-geral, sobre cujo modelo de comportamento a Comissão não apurou o ponto de vista, pelo que ficará em larga medida dependente da pratica - se prática vier a haver nesta matéria! É uma forma de centralização de informações tal que permite juntar até

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elementos respeitantes à segurança interna e à defesa nacional num mesmo vector, num mesmo ponto, centro com repercussões que é fácil calcular quais sejam. Este objectivo foi premeditado por parte daqueles que gizaram, engendraram esta criatura jurídica que agora vai ser debatida e aprovada em votação final global. Em todo o caso, é grave pelos seus aspectos de centralização e de concentração, pelo que o Plenário da Assembleia da República deveria ponderar de forma adequada.
Finalmente, elencando só as quatro questões que resolvemos trazer ao Plenário da Assembleia, uma quarta questão tem a ver com a fiscalização. Aqui estamos perante um verdadeiro escândalo. O Sr. Ministro de Estado Almeida Santos, durante o debate deste diploma na generalidade, teve ocasião de admitir, de reconhecei e de confessar que a proposta originária do Governo não se conformava com os padrões constitucionais no que diz respeito à garantia da representatividade de todos os partidos na estrutura fiscalizadora erigida. Desta confissão, Srs. Deputados, não se extraiu um mínimo coligação durante os debates.
Alguém engendrou, concretamente os deputados da coligação governamental - mas nem todos, uma vez que o Sr. Deputado Ângelo Correia se pronunciou contra - um sistema em que a competência fiscalizador e cometia não a uma comissão parlamentar mas a cidadãos eleitos por maioria de dois terços pela coligação governamental. A coligação governamental cria serviços para si e arrogou-se do poder da violação da Constituição e enfrauda a Constituição escolher aqueles dos seus membros que hão-de fiscalizar os seus serviços ao serviço da recolha de informações políticas para o seu Governo no quadro da aprovação do monstruosíssimo pacote contra as liberdades no nosso país.
Estes aspectos deviam ser todos ponderados - e bem ponderados -, não a esta hora mas à luz do dia, através de um amplo debate para que todos pudessem conhecer a dimensão do atentado perpetrado pela maioria.
Os Srs. Deputados, apesar da proposta que apresentámos, não quiseram reponderar estes aspectos. Ainda mal! Mas nem se furtarão ao juízo do povo português, nem vos está garantido que venha a lograr sucesso completo a operação que em má hora desencadearam e que culminou com esta recusa ilegítima, arbitrária e antidemocrática de apreciar aqui o que aqui deveria ser apreciado

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação final e global da proposta de lei n.º 55/III - Enquadramento dos órgãos e serviços do Estado a quem incumbe assegurar a obtenção, tratamento e difusão das informações necessárias à defesa nacional, ao cumprimento das missões das Forças Armadas, à segurança do Estado de direito e à garantia da legalidade democrática.

Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos contra do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este diploma sobre os serviços de informações, quanto a nós, revela as intenções da maioria e do Governo.
Aquando da votação na generalidade deste diploma, o MDP/CDE, por entender necessária a criação de um serviço de informações, embora entendesse que a proposta de lei apresentada não podia ter o seu acolhimento, absteve-se principalmente devido à intervenção do Sr Ministro de Estado Almeida Santos e às intervenções de alguns deputados do PS, que aqui prometeram, solenemente, modificar positivamente todo o articulado inicial da proposta de lei governamental.
Depois de larga discussão e de todo o trabalho profícuo desenvolvido na Comissão, a nosso ver, o resultado final não garante os princípios fundamentais que então defendíamos. Isto é, nós entendíamos, e continuamos a entender, que um serviço de informações deve, por um lado, defender a legalidade e a independência democráticas do País e, por outro, respeitar rigorosamente os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Para esse escopo necessário era, desde logo, que os serviços de informações não fossem serviços do Governo, mas da República Portuguesa ou, como propúnhamos, do regime de defesa constítucional. Alias, quanto ao título da lei houve algum progresso, visto que passou a chamar-se «lei quadro do sistema de informações da República Portuguesa».
Mas, em nossa opinião, o primeiro escopo necessário era a Comissão Parlamentar de Fiscalização que, curiosamente, existia na proposta de lei do Governo - embora fosse inconstitucional, visto que só previa que a Comissão fosse composta por três Deputados - desapareceu. Apesar das afirmações feitas, aquando da discussão do diploma na generalidade pelo Sr. Ministro de Estado e das afirmações feitas por alguns Srs. Deputados do PS, a verdade e que, por maioria, a Comissão Parlamentar de fiscalização desapareceu e, em seu lugar, apareceu num chamado Conselho de Fiscalização que, quanto a nós, não fiscaliza nada. Num sistema tão melindroso como este era necessário que a clareza e a transparência ficassem definitivamente assentes e, para que isso acontecesse, só uma Comissão Parlamentar de Fiscalização, com os poderes que tínhamos proposto, podia fazer a fiscalização desse sistema.
Entendíamos também que, sendo os serviços de informações serviços da República, o órgão de soberania Presidente da República devia ter assento em qualquer um dos órgãos dos serviços de informações e não, tal como constava da proposta de lei do Governo e continua a constar no texto do diploma que acabámos de votar, o mesmo ser informado pelo Primeiro-Ministro O MDP/CDE apresentou uma proposta no sentido de o Presidente da República presidir ao Conselho Superior de Informações.
Entendíamos que no Conselho Superior de Informações deviam ter assento representantes não políticos, fundamentalmente o procurador-geral da República e também isso não foi aceite.
Por outro lado, entendíamos que o director do Serviço de Informações de Segurança devia ser nomeado por maioria de dois terços pela Assembleia da República, sob proposta do Governo. Assim se daria uma maior responsabilidade, respeitabilidade e garantias de imparcialidade a alguém que tem tão difíceis como delicadas funções que podem bulir com todos os direitos, liberdades e garantias de cada cidadão. A proposta que apresentámos também não foi aceite, aliás como muitas outras.
Em resumo, apesar da nossa boa vontade, e no final da discussão na generalidade tínhamos dito que acreditávamos que era possível fazer um serviço nacional de informações da República Portuguesa com o mínimo de respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e de fiscalização por esta Assembleia - e dizíamos, talvez premonitoriamente: «oxalá não nos taxemos a nós próprios de ingénuos» -, a verdade é que, perante o resultado final, houve, de facto, uma inge-

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nuidade por parte do MDP/CDE. Lamentamos que assim tenha sido e por isso outro não...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Taborda, terminou o tempo de que dispunha.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Presidente peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Gonzalez (indep.): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa para saber se ficou bem clara a minha posição de voto como deputado do Partido «Os Verdes» referente à votação final global da proposta de lei n.º 55/III, sobre o enquadramento dos órgãos e serviços do Estado a quem incumbe assegurar a obtenção, tratamento e difusão de informações necessárias à defesa nacional, ao cumprimento das missões das Forças Armadas, à segurança do Estado de direito e à garantia da legalidade democrática.
A nossa posição foi contra. Penso que ficou bem claro.

O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado, ficou claro, apesar de, com o adiantado da hora, tudo se tornar já um pouco cinzento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, para uma declaração de voto.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, reparei em dois deputados que pediram a palavra antes de mim - os Srs. Deputados Luís Beiroco e João Amaral. Não sei se a Mesa não lhes quererá dar a palavra antes de mim.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado. V. Ex.ª está a dar uma contribuição preciosa à Mesa, que não tinha reparado nesses pedidos anteriores.
Mas parece que não há quaisquer dúvidas e o Sr. Deputado Jorge Lacão pode utilizar já a palavra para fazer a sua declaração de voto.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito obrigado Sr. Presidente e muito obrigado Srs. Deputados que me concedem o uso da palavra.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Acabámos de proceder à votação do diploma sobre o sistema do Serviço de Informações que revelou na prática - já referido, aliás, pelo PCP - um excelente trabalho da comissão que se encarregou dos trabalhos de especialidade.
É justamente a partir da avaliação dos actos dessa comissão que poderá ficar demonstrado à saciedade a afirmação que aqui acabo de produzir e que, de resto, permitiu a alguns partidos tomar posição diferente, pois não tinham votado favoravelmente no início a proposta de lei apresentada pelo Governo.
Foi também significativo verificar que, tendo alguns partido - como o MDP/CDE -levantado aqui imensas questões a propósito da Lei de Segurança Interna, sobre o que poderia ou não ser feito no âmbito de uma comissão de especialidade, onde se proeurou transformar uma proposta inicial que visava a constituição de três serviços de informações apenas num serviço, alterando os princípios, a estrutura, o âmbito e os objectivos da lei aqui aprovada na generalidade, tenham, depois, na comissão, mudado de atitude.
É, de facto, uma contradição flagrante por parte de um partido que tanto criticou a Lei de Segurança Interna e que na comissão de especialidade não teve rebuços em ter um comportamento completamente contraditório com a doutrina expendida a outro propósito.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: entendemos que a sistematização definida no artigo 13.º da Lei dos Serviços de Informações - ao definir a orgânica do sistema de informações -, uma clara precisão do objecto e do âmbito de cada um dos serviços e a definição das competências do Conselho de Fiscalização são, ao contrário do que se insinuou, suficientes para garantir em qualquer circunstância um devido controle sobre o funcionamento dos serviços de informações, nomeadamente através do relatório anual que a Comissão de Fiscalização deve apresentar na Assembleia da República.
Do nosso ponto de vista são erróneas as insinuações de que não estão criados os mecanismos de fiscalização suficientes para garantir a idoneidade do funcionamento dos serviços de informações.
A contribuição dos centros de dados e a contribuição de uma comissão de magistrados, que tem competência para fiscalizar a todo o momento os dados constantes desse centro, também permitem estabelecer a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Assinale-se aliás, Srs. Deputados, que uma norma constante da lei que acabámos de votar define com clareza a interdição da consignação de informações aos serviços de informações em matéria que viole os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
Qualquer insinuação em sentido contrário que se faça não tem o mínimo de cobertura na lei que acabámos de votar. Essas insinuações não têm fundamento legal e são apenas um processo de intenção de valor político, que não corresponde ao texto que acabámos de votar.
Igualmente a clara definição dos limites de actividade desses serviços de informações e do regime dos deveres e de responsabilidades dos agentes dos serviços permitiram definir uma versão final para este diploma que em nada viola as regras do Estado de direito e o regime de direitos, liberdades e garantias e dignifica o Governo que apresentou esta proposta e os deputados que lhe deram, na versão final, uma disposição que realça os trabalhos parlamentares num espírito altamente construtivo, que cada deputado ou cada cidadão interessado pode aferir ao compulsar as actas da comissão de especialidade.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração de voto o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar queria congratular-me, em nome da minha bancada, por o Estado de direito democrático estar, a partir de hoje, armado com um meio que até aqui lhe fazia claramente falta.
E óbvio que não foi fácil ao longo dos últimos anos em Portugal chegar-se a um consenso democrático para criar um sistema de informações. Foi possível vencer certos fantasmas do passado e o Estado democrático fica, a partir de hoje, com os instrumentos legais que vão permitir a criação desse sistema. Devemos congratularmo-nos todos com isso.
Em segundo lugar, queria congratular-me pelo bom trabalho feito pela comissão eventual que se ocupou da matéria. Era uma questão extremamente delicada e foi um trabalho extremamente construtivo que, creio, honra a Assembleia da República.
Finalmente, queria também congratular-me pela abertura que os partidos da maioria revelaram em relação às propostas de alteração que o CDS apresentou na especialidade...

O Sr. João Amaral (PCP): - Nunca lá esteve!

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O Orador: - No essencial, Sr. Deputado, estivéssemos o suficiente para fazer aprovar as propostas que apresentámos. Na verdade, o essencial das nossas propostas foi acolhido peia comissão eventual.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, e Srs. Deputados: Votámos frontalmente contra, denunciamos e denunciaremos a Lei dos Serviços de Informações por três razões fundamentais:

Primeiro, porque ela visa criar uma polícia política, consubstanciada no fundamental nos Serviços de Informações de Segurança, serviços sem limites de actuação, pensados para a devassa da vida privada e para a perseguição política e sindical.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, porque ela visa criar um centro de dados informatizados que, ultrapassando afrontosamente os limites constitucionais, constitui a base da aberrante e antidemocrática ficha do cidadão.
Terceiro, porque a criação destes Serviços de Informações e deste centro de dados se articula e é peça de um plano de brutal esmagamento dos direitos, liberdades e garantias de que a Lei de Segurança Interna é o expoente máximo.
O debate e votação na especialidade, sobre o qual foi dito que iria modificar profundamente a proposta de lei, traduziu-se na frustração das promessas e na liquidação das expectativas criadas. Foi confirmada a indefinição dos serviços; foi acrescentado o centro de dados (que não constava da proposta); foi reforçada a centralização do sistema; foi esvaziado de conteúdo o controle parlamentar, em termos que são claramente inconstitucionais. E para o Sr. Deputado Lacão digo-lhe que é isso que as actas demonstram! E é mau que assim seja!
As propostas apresentadas pelo PCP no sentido de definir os limites de actuação de efectivar a responsabilização dos agentes e de garantir os direitos dos cidadãos foram rejeitadas. Mas ficaram restrições, condições e as formas especiais de responsabilização que são uma verdadeira confissão dos perigos que o texto envolve e um labéu acusatório da sua natureza antidemocrática.

Aplausos do PCP.

Não se julgue assim que o Governo já ganhou a polícia política que queria. O vezo antidemocrático, as inconstitucionalidades patentes e a repulsa do País são o fundamento ético e jurídico que farão com que essa polícia política não venha a funcionar como quer o Governo e que esse centro de dados seja banido do Portugal de Abril.
No debate da Lei de Segurança Interna, ficou demonstrado que o que faz correr o Governo nesta operação contra as liberdades não é o combate contra a criminalidade e o terrorismo. O que o Governo quer são meios e instrumentos antidemocráticos para tentar calar e manietar o movimento dos trabalhadores, os democratas e as forças democráticas que legítima e patrioticamente condenam a sua política.
Na Lei de Segurança Interna o Governo foi derrotado.
Mas nesta lei também o Governo está derrotado, isolado perante a opinião democrática e o País, que não querem buscas, escutas e devassas da vida privada, nem querem bufos nem polícias políticas.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, estamos certos, não querem que esta peça tenebrosa se converta, algum dia, numa lei desta República que nasceu do 25 de Abril.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sempre considerámos, no debate na especialidade sobre esta proposta de lei, que o Estado português carecia de um instrumento que apoiasse as decisões dos órgãos de soberania. E, se qualquer estado carece desses instrumentos, um estado democrático carece deles adicionalmente, porque além da necessidade desses instrumentos no apoio às decisões dos órgãos de soberania, carece também de se prevenir contra aqueles que lutam e minam o próprio regime democrático.
A democracia não pode ser ingénua. A democracia não pode ficar nas mãos daqueles que a querem destruir aproveitando a natural permissividade do próprio sistema democrático.

Aplausos do PSD.

Por isso, lutámos e empenhámo-nos pela aprovação deste diploma que, no nosso entender, é um bom diploma.
Com realismo, dizemos também que a experiência deste sistema -que vai demorar seguramente 4 ou 5 anos a estruturar e a montar - vai mostrar eventuais defeitos, vai mostrar que há inevitáveis correcções a fazer, mas a estrutura central, o baseamento em que essa estrutura é hoje presente e está definida permite que ela se desenvolva com eficácia e com segurança dentro do regime democrático.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram apontados quatro defeitos fundamentais a esta lei.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Há mais, há mais!...

O Orador: - Eu referi fundamentais, Sr. Deputado!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Quatro, no mínimo!

O Orador: - O primeiro é o de que a Comissão Técnica, ou melhor, o secretário-geral dessa Comissão Técnica, seria o supercontroleiro de todo o sistema e referiu-se - veja-se! - o perigo de para ele se poderem vir a carrear informações de natureza da defesa nacional e da segurança interna. Ora, sabendo-se que o secretário-geral é um elemento de assessoria do Primeiro-Ministro e sabendo-se que o Primeiro-Ministro é, na estrutura constitucional do Governo, o responsável por toda a política nacional, se evitarmos que cheguem ao seu conhecimento todas essas informações, estamos naturalmente a minar a sua própria capacidade executiva. Donde, não estamos a prever uma situação de supercontroleiro; estamos sim a criar as melhores condições para o exercício da decisão política!
O segundo defeito que foi referido prende-se com o artigo 21.º, que consigna a criação dos Serviços de Informações de Segurança e que foi acusado de criar uma nova polícia política.

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Esta afirmação é gratuita e tem apenas o efeito de um eco exterior a esta Câmara para aqueles que procuram, à partida, todos os pretextos para encontrar motivos falsos de luta e, sobretudo, de falsos álibis.
É compreensível que alguns o façam, mas tal não é lógico nem coerente; e não o é porque no artigo 21.º está prevista a prevenção da espionagem e do terrorismo, está prevista a prevenção das acções que procurem minar ou alterar o Estado de direito democrático.
Não é dever de todos os democratas promover e conseguir obter do Estado uma estrutura que permita a consolidação do próprio regime democrático? Ou será que aos democratas não é permitido defender o sistema dentro das regras do próprio sistema?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O terceiro defeito que foi referido respeita a uma situação que nalgumas das críticas formuladas atinge a questão do Centro de Dados.
Porém, quero dizer que as limitações que o próprio texto impõe no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, de modo a que se garanta o exercício pleno de todas as liberdades consagradas na Constituição, é uma redução muito sensível àquilo que foi afirmado como demérito dos números respeitantes ao centro de dados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que a democracia ficou enriquecida, que o Estado democrático ficou mais protegido, que o Governo cumpriu a sua missão e a Assembleia também, permitindo que numa área essencial se estabelecesse um consenso democrático amplo, prenúncio daquilo que é desejável noutras áreas centrais da vida portuguesa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não fala da fiscalização!

O Orador: - Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o nosso voto de concordância, a nossa congratulação e o desejo de que no prazo de 120 dias - para a regulamentação deste diploma - nós possamos encontrar regulamentados e preparados, por acção do Governo, os instrumentos essenciais à sua concretização.
Com este diploma o País ganhou, a democracia também e só não ganharam aqueles que não querem que ela se consolide, pois não querem que o País continue a sua senda dentro do regime democrático!

Aplausos do PSD, do CDS e de alguns Srs. Deputados do PS.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, dado o adiantado da hora e consultados os diversos grupos e agrupamentos parlamentares, chegou-se a consenso no sentido de retirar os dois últimos pontos da ordem de trabalhos, ou seja, o projecto de lei n.º 177/III, apresentado pelo PSD, sobre o prazo de caducidade em acções de resolução de contratos de arrendamento, e o projecto de lei n.º 374/III, apresentado pelo PS, sobre a alteração ao n.º l do artigo 18.º do Estatuto dos Deputados.
Portanto, Sr. Presidente, propomos que se passe imediatamente à discussão do projecto de deliberação e demais documentos ainda presentes na Mesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, após a comunicação deste entendimento, não resta à Mesa senão declarar de que estes dois pontos saem da ordem de trabalhos e que passaremos à apreciação de um projecto de deliberação...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, na ordem de trabalhos que foi distribuída ao nosso grupo parlamentar e creio que a todos os outros, não consta qualquer ponto relativo à discussão e eventual aprovação de um qualquer projecto de deliberação. Assim, gostaríamos de saber em que preceito regimental se baseia a Mesa ou os proponentes para pretenderem que neste momento se aprecie e vote uma tal matéria.
Desde já queremos dizer que temos outro entendimento em relação a uma proposta que é subscrita por todos os grupos e agrupamentos parlamentares no sentido de que se realize uma reunião da Comissão Permanente na primeira quinta-feira do mês de Setembro e que pensamos que está em condições de ser votada.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. José Luis Nunes (PS): - Sr. Presidente, eu não devia ter pedido a palavra imediatamente, só o devia ter feito depois de V. Ex.ª se ter pronunciado sobre esta interpelação. Portanto, por agora prescindo da palavra.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fernando Condesso também pediu a palavra. V. Ex.ª deseja que a Mesa se pronuncie primeiro para depois intervir?

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, admiti este projecto de deliberação e, naturalmente, que considero não se tratar de um projecto de resolução, de um projecto de lei ou de uma proposta de lei, que naturalmente teriam de percorrer todos os trâmites que são habituais e estão consagrados no nosso Regimento e na nossa Constituição. Trata-se de uma deliberação da Assembleia e eu creio que uma deliberação da Assembleia pode ser tomada a qualquer momento dos trabalhos da Assembleia.
Nestas circunstâncias, não encontro razões regimentais ou constitucionais para não pôr à apreciação da Câmara o projecto de deliberação que deu entrada na Mesa.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, eu queria evitar um incidente regimental a esta hora, mas se V. Ex.ª forçar esta bancada a impugnar a admissão deste projecto de deliberação, fá-lo-emos, e terá de ser discutida a impugnação na próxima reunião.
Não queríamos recorrer a esses métodos. Entendemos que não está agendado na ordem do dia, não está previsto na ordem do dia; a ordem do dia é agendada com 24 horas de antecedência, esta matéria não foi agendada.
Queríamos, desde já, dizer o seguinte: se este projecto de deliberação se destina a que a bancada do PSD possa

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levar em carteira, para o Conselho Nacional de Setembro as medidas estruturais prometidas pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro Mota Pinto esteja descansado, pois a Comissão Permanente reunirá na primiera semana de Setembro e aí com calma, pode votar este projecto de deliberação e levar o papel na mesma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos eu mantenho a decisão na medida em que não se trata de uma iniciativa legislativa e, como tal, não creio que existam razões impeditivas de natureza regimental, para que não seja submetido a apreciação desta Câmara. Mas, naturalmente se me apresentarem argumentos de peso posso considerar na decisão que tomei.
Para interpelar a Mesa tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes

O Sr. José Luís Nunes(PS): - Srs. Deputados, as regras regimentais que foram citadas não têm nenhuma aplicação aqui.

O Sr José Manuel Mendes (PCP): - Não têm?!

O Orador: - É verdade. É espantoso como nenhum deputado lhe tinha dito uma coisa dessas, mas é verdade. Não tem aplicação aqui.

Risos do PS.

E não tem aplicação aqui pelo seguinte: e basta configurar a hipótese da necessidade de uma reunião de urgência da Assembleia da República supúnhamos por exemplo que hoje se tinha verificado por hipótese absurda uma grave perturbação da ordem pública...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Uma cheia!

O Orador: - que necessitasse... que necessitasse...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Neve?

O Orador: Não, neve não. Eu ía dizer que necessitasse de uma reunião urgente da Assembleia da República. Se se verificasse essa necessidade, obviamente que a Assembleia poderia convocar-se a si própria, para a continuação da sessão no dia seguinte. É isso que nos pensamos. Por isso consideramos que esta proposta de deliberação tem todo o cabimento e não tinha de estar fixada na ordem do dia.
E como não se trata, nem de uma resolução, nem de um decreto, nem de qualquer coisa que tenha de ser agenciada, o recurso que, porventura, por interposto, será discutido aqui mesmo, hoje, aqui e agora - como diria um grande poeta português - e será votado conforme a deliberação da maioria.

O Sr. José Magalhães (PCP) - Lá isso é que não!

O Orador: - Ah, eu garanto-lhe que sim.

O Sr Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr Presidente, eu continuo sem resposta a uma questão que coloquei à Mesa na minha primeira interpelação ao abrigo de que disposição regimental admitiu. V. Ex.ª este projecto de deliberação e o pretende fazer e ver discutido na presente reunião plenária.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, cicio que já lhe respondi ou seja não se ti alando de uma iniciativa legislativa, tratando-se de uma deliberação da Assembleia.

O Sr João Amaral (PCP) - É um voto, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - ... não há no Regimento, nada na minha opinião, que impeça este debate e uma apreciação, por parte da Assembleia, desta questão. Há aqui digamos, a capacidade do Presidente de integrar as lacunas do Regimento ou de interpretar bem ou mal uma questão desta natureza.
Nesse sentido admiti o projecto de deliberação e o Sr. Deputado Jorge Lemos se quiser recorre da minha decisão para o Plenário mas não há mais nada na minha opinião a discutir e a analisar nesta questão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente eu creio que a discussão que estamos a ter merece ser situada.
Sr. Presidente, nos turnos do Regimento as reuniões plenárias tem normalmente um período de antes da ordem do dia. Aí são discutidos votos, feitas intervenções de relevante esse, sobre política geral tem uma primeira parte em que são discutidas matérias adjectivas como esta que neste momento é posta à consideração e tem uma segunda parte que é a parte em que estamos em que são discutidas outras matérias projectos e propostas de lei.
Nós consideramos, Sr. Presidente que a pergunta que fizemos à Mesa - ao abrigo de que disposição regimental inscreveu V. Ex.ª este diploma - continua sem resposta. Estamos na segunda parte da ordem do dia, com uma ordem do dia fixada e anunciada na reunião de ontem da qual não constava a apreciação pela Assembleia da República de qualquer projecto de deliberação de convocação de qualquer novo período de prolongamento dos trabalhos parlamentares.
Portanto, Sr Presidente, eu volto a solicitar a V. Ex.ª, que me cite o artigo ao abrigo do qual foi admitido o projecto de deliberação ou tentar agendá-lo para hoje. Se a Mesa entender trocar opiniões, eu não me importo de aguardar o tempo necessário.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Lemos, na verdade esta questão é um pouco heterodoxa - para utilizar uma expressão adequada a uma situação destas.
Não há no Regimento nenhum preceito que expressamente conceda ao Presidente a capacidade para mandar proceder a discussão de um documento deste tipo, mas também não há nenhum preceito que lho proíba.

O Sr José Magalhães (PCP): - Há vários... muitos!

O Sr. Presidente: - ... , ou seja, creio que é um caso em que há uma lacuna regimental e eu vou explicar porquê não se tratando de uma iniciativa legislativa, este documento não carece naturalmente de uma fixação prévia na ordem do dia. Trata-se apenas, de uma deliberação da Assembleia que, na minha opinião - e salvo naturalmente uma melhor apreciação desta questão - pode ser tomada a qualquer tempo. Já não é a primeira vez que isso acontece. Recordo-me que já fizemos prolongamento de sessões, mediante um processo deste tipo, em Sessões legislativas anteriores.
Eu admiti o projecto de deliberação, mantendo a deliberação e só há aqui uma solução e a Assembleia deliberar sobre isto

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Neste momenio, dado o adiantado da hora e a perturbação que, naturalmente, a todos nos atinge, pelo cansaço, não me parece que valha a pena prosseguir neste debate. Por isso, eu mantenho a minha decisão e o Sr Deputado Jorge Lemos, se quiser, recorre para o Plenário da Assembleia da República.

Tem a palavra, o Sr. Deputado Jorge Lemos

O Sr. José Magalhães (PCP): — É um arromba!

O Sr Jorge Lemos (PCP). — Sr Presidente, eu solicitava a aclaração da decisão de V Ex ", no seguinte sentido já citei a V Ex •' os artigos quanto à fixação das ordens do dia Citava ainda ao Sr. Presidente o artigo 73 ", que define com rigor as matérias que devem ser mscntas na l n parte da ordem do dia, que nada têm u ver com iniciativas legislativas, como deliberação sobre mandatos de deputados, recurso das decisões do Sr Presidente, eleições suplemcntaics da Mesa, mqué-utos, assentimentos de ausência do Presidente da República, designação de titulares de cargos exlenoies à Assembleia dd República, alterações ao Regimento e outias matérias sobie as quais a Assembleia se deva pionunciar não compreendidas nas prioridades fixadas nos artigos antenores

Sr Presidente, é claro que a matei ía que aqui e posui à considciação da Assembleia neste momento cabe na primeira pai te da ordem do dia Estamos na segunda parte e essa matéria não loi anunciada, não foi agenciada, pelo que, não pode ser discutida neste momento. Sr. Presidente.

O Sr José Manuel Mendes (PCP). — Ora aí está!

O Orador: — Eu não quena recorrer da decisão de V. Ex •' e da Mesa porque penso que é o argumento da razoabilidade que nos deve levar, a estas horas tardias, a lei um pouco de bom senso. Sobretudo quando e possível obter o mesmo resultado na primeira reunião da Comissão Permanente em Setembro

Vo/es do PCP: — Muito bem'

O Sr Presidente: — Sr Deputado lorge Lemos, eu quero dai-lhe a seguinte lesposta. admiti o projecto de deliberação. Está admitido

O Sr José Magalhães (PCP) — Isso é exaltação da piepotência

O Sr Presidente: — Não vejo nenhuma razão para não o admitir Se se vai discutir ou não, é outro problema Não tinha nenhuma ra/ão para não admitir este proiecto de deliberação. Admito-o e mantenho essa decisão.

O Sr José Magalhães (PCP) — Mas vai passar à discussão'?

O Sr. Presidente: — Quanto a passar à discussão, naturalmente que tal acontecerá se os Srs. Deputados assim o quiserem, se os autores fi/erem questão nisso

Tem a palavra o Sr Deputado José Luís Nunes

O Sr José Luís Nunes (PS) - Vamos acabar com isto

V Ex/1 tomou uma decisão e só pode ser impugnada através do iccurso Eu penso que V. Ex.ª não deve dar a palavra a mais ninguém, a não ser para fundamentar qualquer recurso. Portanto, vamos votar.

O Sr. José Magalhães (PCP) mesquinho.

Risox do CDS

- É

prepotente e

O Orador: — Exacto, sou prepotente e mesquinho. Sr. Deputado

O Sr. Luís Beiroco (CDS). — Ah grande Zé Luís!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes

O Sr Marques Mendes (PDS). — Sr. Presidente, queria chamar a atenção do seguinte, está-se a invocar aqui matéria regimental esquecendo-se, salvo o devido respeito, um aspecto que eu considero muito importante, que é a nova redacção do artigo 177 u da Constituição Ó anterior n.º 2 do referido artigo dizia o seguinte.

A Sessão Legislativa decorre de 15 de Outubro a 15 de Junho, sem prejuí/o das suspensões que a Assembleia estabelecer.

O Sr. João Amaral (PCP). — Exactamente!

O Orador: — Di/.ia, Sr Deputado João Amaral, dizia. Agora não diz.

O Sr João Amaral (PCP) — Leia agora É uma lacuna!

O Orador: — O n º 3 desse artigo dizia e eu repito. Sr. Deputado João Amaral, para que tenha bem presente, dizia: «fora do período indicado no número anterior, a Assembleia reunir-se-á por iniciativa da Comissão Permanente ou, na impossibilidade desta e em caso de grave emergência, por iniciativa própria»

Actualmente o que é que diz9

O Sf. João Amaral (PCP) — Muito bem! Leia lá o que é que diz.

O Orador: — «Fora do período indicado no número anterior, a Assembleia da República pode funcionar por deliberação do Plenáno[. .]».

O Sr Jorge Lemos (PCP): — Quando devidamente agendada!

O Orador: — ...Não diz isso. Sr. Deputado, não está aqui.

Sr. Deputado, eu não tenho por hábito a indelicadeza de interromper VV. Ex mas quando estão no uso da palavra. Agradeço que mantenham a mesma delicadeza que eu costumo ter para com VV. Ex.™-

Diz o actual n.º 3 do artigo 177.º da Constituição. «Fora do período indicado no número anterior, a Assembleia da República pode funcionar por deliberação do Plenário, prorrogando o período normal de funcionamento, por iniciativa...» —e então, agora, é que refere— «.. da Comissão Permanente ou, na impossibilidade desta e em caso de grave emergência, por iniciativa de mais de metade dos deputados».

Ora, nós estamos a interpretar o Regimento, que é anterior à revisão da Constituição, à luz dos novos textos constitucionais. Não é interpretar ao contrário Não podemos fazer a interpretaçâo da Constituição à luz de um Regimento que foi elaborado com base no texto constítucional, mas temos de interpretar o Regimento tendo em conta as novas alterações constitucionais e eu cito este exemplo: suponhamos que hoje, era

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o último dia que estava previsto por deliberação anteriormente tomada...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Na Comissão Permanente!

O Orador: - ..., e que havia necessidade, por matérias que não estavam ainda deliberadas, de tomar essas deliberações. Eu pergunto: não podia o Plenário, de imediato, prorrogar para amanhã ou para depois de amanhã, o funcionamento da Assembleia?

Vozes do PCP: - Não!

O Orador: - Oh Sr. Deputado! Então eu pergunto porque se está aqui a deliberar?
Isto não é em vão, as palavras têm um sentido, têm um conceito e não podem ser interpretadas ao sabor como é hábito de VV. Ex.ªs, e como lhes apraz.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - Portanto, nós entendemos, Sr. Presidente, que a decisão está correcta e que é à luz da Constituição que V. Ex.ª tem, efectivamente, que interpretar esta questão, com a razoabilidade que a própria Constituição impõe.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu creio que a esta hora já não estamos em condições de interpretações subtis da Constituição e do Regimento.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas temos o dever de fazer interpretações constitucionais!

O Sr. Presidente: - Admiti o projecto de deliberação e não tinha nenhuma razão para não o fazer. O Sr. Deputado Jorge Lemos pode, naturalmente, recorrer da decisão da Mesa em admitir este projecto de deliberação.

O Sr. João Amaral (PCP): - Uma coisa é admitir, outra é agendar.

O Sr. Presidente: - Quanto a isso, penso que não haverá dúvidas de que a Mesa não tinha que recusar a admissão deste projecto de deliberação.
Quanto à sua discussão, julgo que só uma vontade maioritária da Assembleia o poderá decidir. Penso que se trata de uma decisão da Assembleia que não carece de um tratamento idêntico às iniciativas legislativas...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Por consenso; à bruta não!

O Sr. Presidente: - ..., nem de uma fixação na ordem de trabalhos, segundo as regras consagradas.
Nestas circunstâncias, o projecto está admitido e quanto à sua discussão competirá ao Plenário da Assembleia decidir se ela se fará ou não.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para recorrer?

O Sr. João Amaral (PCP): - Não, Sr. Presidente. Pretendo interpelar a Mesa com um sentido exacto, que é o seguinte: o Sr. Presidente anunciou que admitiu o projecto de deliberação, mas a questão que está aqui a ser discutida, não é essa. O Sr. Presidente sabe que a questão que está aqui a ser discutida é se ele foi ou não agendado. Ora, quanto a essa questão e a essa exactamente, nós somos da opinião de que ele não pode ser agendado.
É precisamente em relação a esse problema e só a esse que o Sr. Presidente não tem norma regimental para agendar, neste momento, um projecto entregue no decurso dos trabalhos e que, eventualmente, tenha ou não sido admitido.
Pode anunciar que o fez, alguém pode impugná-lo, mas o que se trata aqui é de não poder agendá-lo.
Eu devo recordar ao Sr. Presidente o seguinte: não é a primeira vez que estes trabalhos são prolongados depois de 15 de Junho.
Eu recordo ao Sr. Presidente que o anterior prolongamento dos trabalhos foi feito com anúncio prévio...

Protestos do PS e do PSD.

O Orador: - ..., entrega prévia dos projectos, agendamento na primeira parte da ordem do dia nos termos regimentais e anúncio na reunião anterior, de que a matéria ia ser discutida.
Sr. Presidente, é um apelo ao bom senso, é um apelo ao respeito das regras regimentais e é, no fundo, uma questão que não pode deixar de ser considerada estranha no quadro concreto de quem quer à força que isto seja discutido agora.
Pode haver interesses diferentes em torno disso, mas ao Sr. Presidente cumpre-lhe cumprir e defender o nosso Regimento.
E esse apelo concreto que eu lhe faço neste momento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, sempre tive a preocupação de fazer cumprir o Regimento. Não estou a fazer qualquer entorse ao Regimento, pelo que não hesito, por um lado, em considerar que o projecto de resolução está admitido e por outro, em pô-lo à discussão do Plenário da Assembleia da República.
Se quiser recorrer da decisão, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede a palavra para anunciar que vai recorrer da decisão da Mesa?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não, Sr. Presidente. É para anunciar que, nos termos regimentais, o meu grupo parlamentar requer a interrupção dos trabalhos por meia hora, para que possa considerar a actuação que deve ter face à questão colocada.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão está suspensa por 30 minutos.

Eram 6 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 6 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho conhecimento de que já se chegou a um acordo e se encontrou uma solução.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, estou naquela situação de um colega meu de liceu, a quem,

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durante todo o ano, o professor pedia para entregar o caderno diário com os sumários. Com um ar solene, ele respondia sempre: «O Sr. Professor ainda tem o caderno...»
Pois bem, eu ainda não tenho isto pronto, pelo que se V. Ex.ª não se importa, dar-me-á mais 2 ou 3 minutos para ver se consigo arranjar a tal solução.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a comparação com uma escola primária não é lá muito lisonjeira!

Risos.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, não estava de forma nenhuma a comparar a Assembleia da República com uma sala de aula, visto que nem eu tenho vocação para professor, nem V. Ex.ª - embora tenha sido um distinto mestre - exerce neste momento essas funções.
Dito isto à guisa de introdução, desejava, em nomes dos signatários, apresentar a proposta que se segue.
Os segundos e terceiro considerandos, seriam eliminados, ficando o projecto de resolução redigido desta forma: «Considerando o teor das deliberações da Assembleia da República de prorrogação do período normal de funcionamento de 15 de Junho a 14 de Julho e desta data até 27 de Julho de 1984, os deputados abaixo assinados dos Grupos Parlamentares do PS e do PSD propõem que a Assembleia da República delibere prorrogar o seu período normal de funcionamento entre 2 e 15 de Outubro próximo, com a agenda de trabalhos a decidir em Comissão Permanente.»
Os restantes pontos seriam eliminados.
É esta a proposta de resolução que apresentamos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, registamos as modificações agora propostas para o projecto de resolução e, pessoalmente, congratulo-me com esta solução.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que, a partir do momento em que há consenso para agendar este projecto de resolução se deve proceder ao respectivo agendamento.
Pela nossa parte, estamos de acordo e pensamos que os problemas regimentais suscitados pela bancada do Partido Comunista Português deixam de ter cabimento, na medida em que entendemos que será sempre possível o agendamento por consenso.
Por outro lado, queria perguntar ao Sr. Deputado José Luis Nunes qual o significado real da manutenção do primeiro considerando. De concreto e de substantivo o que há é que a Assembleia decide prorrogar o prazo normal de funcionamento entre 2 e 15 de Outubro. Então, o que é que se pretende dizer com «considerando o teor das deliberações....»? Pretende-se com isso estar a propor um agendamento já e de forma implícita? Considerar «o teor da deliberações anteriores» só tem sentido se elas e as matérias que nela se inscreviam forem consideradas integralmente.
É isto que significa a manutenção deste primeiro parágrafo?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, se deseja responder, tem a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, se V. Ex.ª me permitisse, não lhe ia dar esse esclarecimento: caso V. Ex.ª entenda que isto tem interesse, poderemos discutir este assunto noutra sede porque não ouvi a sua pergunta... Mas tenho receio de dizer que não ouvi porque o Sr. Deputado é capaz de querer repetir a pergunta...
O que proponho é que, a partir do momento em que se conseguiu um laborioso consenso sobre isto, se passe a entender o seguinte: houve um teor de deliberações da Assembleia da República para prorrogação do período normal de funcionamento, podendo esse teor ser interpretado de uma forma lata. Porém, a nossa interpretação é que aquilo que esteve na base dessa prorrogação foi a necessidade de agendar questões urgentes que não havia sido agendadas e trabalhadas até ao momento. Posteriormente, convocou-se uma nova sessão da Assembleia para os dias 2 a 15 de Outubro.
Por seu turno, o meu partido reserva-se o direito de, em declaração de voto, dizer à Assembleia da República o que é que vai propor que seja agendado nessa reunião de Comissão Permanente.
Foi esta a solução que encontrámos para que se pudesse sair deste impasse.
Por último, sugiro que se termine com esta sessão porque a hora já vai adiantada - e dizer, às 7 da manhã, que a hora já vai adiantada é um eufemismo!

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Beiroco pede a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luis Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, utilizando esta figura regimental, queria dizer que se acaba de estabelecer uma nova praxe: recomeçar os trabalhos sem que esteja presente um grupo parlamentar.
Devo dizer que quando cheguei deveria, em bom rigor, ter pedido meia hora de suspensão. Não o fiz, excepcionalmente, devido ao adiantado da hora, mas é possível que tenha agido mal porque talvez o devesse ter feito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Beiroco, tenho de lamentar o sucedido, mas nós não nos apercebemos da ausência do Grupo Parlamentar do CDS. Para que tal tivesse acontecido só há, Sr. Deputado, uma justificação: o estado de cansaço em que todos nos encontramos não é de molde a tornar mais agudos os nossos sentidos, muito pelo contrário.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pretendia associar-me à preocupação aqui trazida pelo Sr. Deputado Luis Beiroco.
Julgo que se não fossem as circunstâncias em que estamos a trabalhar e o cansaço - vimos deputados sentados nas últimas filas, que são os do PSD, mas não. reparámos na ausência do CDS - isto constituiria um caso muito grave, pelo que deveríamos pedir desculpa ao CDS. Porém, creio que o CDS compreende que não foi disso que se tratou, mas apenas de um lapso de todos nós em virtude do cansaço e do processo de discussão que aqui se estava a realizar.
Apesar de tudo, creio que é importante a questão que foi trazida, a chamada de atenção que foi feita e o entendimento de todos nós de que não se devem iniciar os trabalhos estando um grupo parlamentar ausente.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para intervir nesta matéria?

O Si. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, era para interpelar a Mesa sobre a matéria que está em discussão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. João Amaral (PCP) - A questão coloca-se neste momento nos seguintes termos. o projecto de deliberação tal como está configurado suscita algumas reservas quanto a sua admissão, nomeadamente por um entendimento adequado e completo do que está consignado no artigo 177.º da Constituição. Não é o caso de se discutir isso neste momento.
Quanto ao seu agendamento, da nossa parte ele seria sempre inadmissível se não houvesse consenso. A questão é que a substancial alteração que foi feita coloca todo o problema de uma forma diferente.
O texto resolutivo diz - pura e simplesmente que a Assembleia deve funcionar entre 2 e 15 de Outubro. Achamos que efectivamente a Assembleia deve iniciar os seus trabalhos antes do início da próxima Sessão Legislativa. Assim, como temos esse entendimento, não nos opomos a que isso se faça e damos expressamente o consenso ao seu agendamento.
Quanto à manutenção do considerando, ele carece de significado porque os considerandos não se votam, mas não será esse o aspecto mais importante. Ele carece de significado em si mesmo, porque é bom que se sublinhe que o que vai sei o conteúdo dessa sessão é aquilo que naturalmente resultar da evolução dos trabalhos em sede de Comissão Permanente e das urgências reais que se puserem na altura adequada e devida.
Nestes termos, suponho que ficou esclarecida a posição do nosso grupo parlamentar, sublinhando - faço-o, Sr. Presidente, para que não restem dúvidas - que se este projecto for aprovado é porque existe consenso de todos os grupos parlamentares e deputados Da nossa parte contribuímos para esse consenso, e se os outros grupos e agrupamentos parlamentares o derem então o projecto de deliberação poderá ser discutido e votado.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, na medida em que infelizmente se estabeleceu um consenso para se discutir o projecto de deliberação, com a reformulação que o Sr. Deputado José Luís Nunes anunciou e indicou à Mesa, se ninguém se inscreve para o discutir, vamos passar imediatamente à sua votação

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr Presidente: - Pedem a palavra para declarações de voto os Srs. Deputados José Luís Nunes e Fernando Condesso.
Tem a palavra o Sr Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, antes de mais vou referir em declaração de voto aquilo que há pouco devia ter dito ao Sr. Deputado Luís Beiroco.
O meu grupo parlamentar não se apercebeu da ausência do CDS. Obviamente que se o tivesse feito teria chamado a atenção da Mesa para esse facto, contudo não apresentamos desculpas ao CDS por uma razão simples: é que não temos culpa.
Dito isto, temos a seguinte declaração...

Pausa.

Srs. Deputados!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, a esta hora tudo se desculpa, mas não compete ao Sr. Deputado advertir os Srs Deputados.

Risos.

O Sr José Luís Nunes (PS) - Sr. Presidente, disse só "Srs. Deputados" porque ía entrar no tema, não adverti ninguém.
Srs. Deputados, queria solenemente declarar em nome do Grupo Parlamentar do PS que na Comissão Permanente que decidi agendar os temas para esta reunião suplementar de 2 a 15 de Outubro, votaremos sem alterações, correcções ou omissões os seguintes pontos:

1) Conclusão do processo de revisão do Regimento da Assembleia da República,
2) Apreciação e votação da proposta de lei n.º 77/III - que estabelece o regime das rendas livres, condicionadas e apoiadas nos contratos de arrendamento para fins habitacionais,
3) Apreciação e votação da proposta de lei n.º 83/III - que autoriza o Governo a definir o regime disciplinar aplicável aos funcionários e agentes da PSP,
4) Votações mais globais das iniciativas entretanto concluídas pelas comissões parlamentares e votação na especialidade dos projectos de criação de novas freguesias,
5) Qualquer outra matéria cuja urgência justifique o seu agendamento

Como os Srs. Deputados sabem e resultou do debate que tivemos na Assembleia a propósito de idêntica deliberação, a votação pela Assembleia de uma ordem de trabalhos tinha aqui sido entendida, entre outras expressões pelas doutas opiniões expendidas na altura pelo Sr. Deputado Luís Beiroco - como V. Ex.ª se deve recordar - , como uma votação não vinculativa.
Portanto, a situação em que se coloca a Assembleia é exactamente a mesma como se esse projecto tivesse sido votado, mas com uma adenda: é que a reunião da Comissão Permanente, onde os grupos parlamentares da maioria são maioritários, essa sim é vinculativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: creio que sobre esta matéria nada mais tenho a dizer.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mantemos a nossa posição de que o projecto de deliberação apresentado hoje na Mesa correspondia a uma possibilidade dos grupos parlamentares, logo era algo perfeitamente legítimo e poderia se; perfeitamente discutido. O meu companheiro de bancada referiu aqui, com base na alteração constítucional que ele citou, que esse era o nosso entendimento.
Com efeito, se no último dia da Sessão Legislativa está agendado certo leque de matérias e só nesse mesmo dia se conclui, em face do desenrolar dos trabalhos, que ele não é todo debatido e votado, é evidente que é nesse dia que se tem de poder agendar um projecto de deliberação, para no dia seguinte ou passados dois ou três dias se vir então aqui e acabar de discutir essa matéria.

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Só que apesar de o nosso entendimento sei este, em face da hora adiantada e em face daquilo que prevíamos desde já sejam expedientes criados pelo PCP baseados em alterações, aditamentos e exclusões, não vemos que valesse a pena estar aqui a prolongai um debate, sendo certo que - embora mal, no nosso entendimento - tem sido entendido que no período de prorrogação a resolução da fixação de matérias e respectiva ordem não seria vinculativa, ao passo que na Comissão Permanente pelo contrário - por certo ninguém irá contestar aquilo que é evidente - essa ordem será vinculativa.
Para nós essa ordem será realmente, tal como anunciou o Sr Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, aquela que já antes era considerada uma prioridade e que realmente tem que ver com o Regimento e com matérias que têm saído do Regimento e se prendem com o estatuto do deputado. Será, portanto, a possibilidade de reponderar toda esta temática, bem como a proposta de lei das rendas, que já estava para ser tratada neste período de prorrogação logo a seguir à proposta de lei de segurança interna e outras matérias que tínhamos como matérias importantes em termos de maioria.
Por isso, demos o assentimento a esta alteração, convencidos que com isso teremos lucrado e em termos de objectivos da maioria no Parlamento, a quem acima de tudo compete, dado que seu é poder considerar os mais adequado e mais eficazes.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr Presidente, Srs. Deputados Queremos congratularmo-nos pelo facto de neste quadro não ter prevalecido a prepotência anti-regimental

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A maioria tem que reconhecer os objectivos que pretende, tem de respeitar os direitos dos diferentes agentes parlamentares e tem que respeitar os preceitos e as normas regimentais.
Em segundo lugar, pretendemos dizer que o elenco de matérias para o período de funcionamento entre 2 e 15 de Outubro, está totalmente em aberto.
É bom que se relembre, Srs. Deputados do PS e do PSD, que, nos termos constitucionais e regimentais, é ao Sr Presidente da Assembleia da República que compete lixar as ordens do dia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pelo nosso lado, tudo faremos para que sejam discutidos, agendados e votados os diplomas que mais são reclamados pelos trabalhadores e pelo povo português, designadamente as iniciativas legislativas que se prendem com a situação dramática dos trabalhadores com salários em atraso, com a votação e discussão da lei quadro de municípios e a criação do Município de Vizela

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso, isso!

O Orador: - ..., e com a aprovação dos inquéritos parlamentares, designadamente aqueles referentes a casos de corrupção.
Por outro lado e em último lugar, tudo faremos também para que não sejam agendados projectos que, longe de corresponderem aos interesses do povo e do País, visam, isso sim, agravar ainda mais as já difíceis condições de vida deste mesmo povo.
Por isso mesmo, nos oporemos a que seja agendada essa proposta de lei iníqua que visa aumentar despudoradamente as rendas de casa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr Luís Beiroco (CDS) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio não ser, a esta hora da manhã, o momento de tecer considerações regimentalistas sobre a fixação das ordens do dia do período de prorrogação de Sessão Legislativa. Portanto, limitar-me-ei a fazer duas observações.
A primeira é para dizer que me parece que a maioria continua a ter mais olhos que barriga quando pretende, em 15 dias, acabar a revisão do Regimento e, simultaneamente, tratar da questão das rendas de casa

O Sr Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A segunda é para verificar que pelo caminho ficou o conceito estratégico de defesa nacional Afinal, não era tão urgente que a Assembleia apreciasse essa matéria.

Aplausos do CDS.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na mesa uma proposta do seguinte teor «A Comissão Permanente da Assembleia da República deverá reunir, ordinariamente, todas as quintas-feiras, sendo no entanto legítimo, nos termos do seu próprio Regimento, deliberação em contrário.
Nestes termos, propõe-se que a Comissão Permanente reúna na primeira quinta-feira do mês de Setembro de 1984, salvo se tiver de reunir por motivos de convocação extraordinária.»
Esta proposta é assinada por mim mesmo e por representantes de todos os grupos e agrupamentos parlamentares.
Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda há alguns documentos para anunciar, mas sei que começam a abandonar a Sala e não quero deixar de desejar a todos os Srs. Deputados boas férias - um sono reparador, para já -, bom ar, bom sol, um pouco de ginástica e ar livre e também contacto com o povo. Boas férias para todos.

Aplausos gerais.

Vai ser dado conta dos documentos entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas proposta de Resolução n.º 15/III, da iniciativa do Governo, que estabelece normas quanto à constituição de uma comissão de inquérito ao acidente de Camarate, que foi admitida, projectos de lei n.ºs 376/III, da iniciativa do Sr. Deputado Jaime Ramos e outros, do PSD, sobre alterações à Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, 377/III, da iniciativa do Sr. Deputado António Rebelo de Sousa, do PS, sobre a alteração do Código de Investimento Estrangeiro, que

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foi admitido e baixa à 5.ª Comissão; 378/III, da iniciativa do Sr. Deputado Silvino Sequeira, do PS, sobre a criação da freguesia de Gançaria, que foi admitido e baixa à 10.ª Comissão, 379/111, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Lage e Filhol Guimarães, do PS, sobre a criação da região demarcada de vinho de Valpaços, que foi admitido e baixa à 6.ª Comissão; 380/III, da iniciativa do Sr. Deputado Marques Mendes, do PSD, sobre a lei quadro do desporto, que foi admitido e baixa à 9.ª Comissão; 381/III, da iniciativa do Sr. Deputado Joaquim Gomes, do PCP, sobre a elevação de Vieira de Leiria à categoria de vila, que foi admitido e baixa à 10.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Está encerrada a sessão.

Eram 7 horas e 10 minutos do dia seguinte.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Socialista (PS):

António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Leonel de Sousa Fadigas.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Carlos Miguel Almeida Coelho.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
José Adriano Gago Vitorino.
José Vargas Bulcão.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Rui Manuel de Oliveira Costa.

Centro Democrático Social (CDS):

João António de Morais Silva Leitão.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Manuel Niza.

Partido Social-Democrata (PSD-PPD):

Agostinho Correia Branquinho.
Pedro Miguel Santana Lopes.

Partido Comunista Português (PCP):

Manuel Rogério de Sousa Brito.

entro Democrático Social (CDS):

Joaquim Rocha dos Santos.
José Vieira de Carvalho.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Votei favoravelmente a proposta de lei n.º 71/III, por entender que:

1.º Uma lei de segurança interna é necessária no presente momento histórico a qualquer estado e por maioria de razão a um estado democrático e totalmente desprotegido neste plano como é o nosso caso;
2.º A presente proposta de lei, embora imperfeita e contendo aspectos que necessitam ser, uns suprimidos e outros alterados, pode constituir ponto de partida para se atingir um enunciado legal correcto depois de a mesma ser devidamente tratada em comissão especializada. Sobre o consagrar destas modificações, correcções e supressões, em sede própria, já foi aliás dada garantia a esta Câmara quer por deputados da maioria e oposição quer por membros do Governo,
3.º A suspeição de que a presente proposta de lei possa vir a constituir instrumento de estrangulamento de liberdades carece, quanto a mim, de fundamento por entender que qualquer Governo que pretenda prosseguir uma política totalitária ou de aniquilação de liberdades não se preocupa em produzir leis regulamentadoras de actividades terroristas ou de crime organizado, arrostando embora com a impopularidade que esse acto lhe possa acarretar, antes se empenha em, através de hipócritas declarações de garantia das liberdades, salvaguardar um aspecto exterior de pureza e democraticidade que não e o seu.
Pelos motivos expostos e ainda porque caso, contra tudo o que está já indiciado, a presente proposta de lei não viesse a sofrer, em sede de especialidade, as correcções que a maioria já anunciou como mínimas necessárias, pretendo desde já manifestar a minha indisponibilidade para uma votação favorável aquando da sua apreciação na especialidade.

O Deputado do PS, José Augusto Fillol Guimarães.

Votei contra a proposta de lei n.º 71/III, por considerar que é necessário nesta matéria procurar conjugar a defesa da segurança interna com o respeito dos sagrados direitos do homem.
A proposta de lei viola de forma reiterada a Constituição pondo em causa princípios fundamentais caracterizadores de um estado de direito democrático.
Lamento não me ser possível acompanhar nesta votação a generalidade dos meus camaradas deputados do PS, mas faço-o para defesa da honra do Partido Socialista e da Assembleia da República, tal como as interpreto.

O Deputado do PS, José Leitão.

Votei favoravelmente a proposta de lei sobre «Segurança interna», a despeito das profundas divergências que dela me distanciam, na medida em que considero como adquiridas modificações na especialidade que a compatibilizem com a Constituição da República Portuguesa e a harmonizem com uma consciência democrática.
Aprovei também na generalidade os projectos de lei do CDS e da ASDI sobre a mesma matéria, os quais são uma inestimável contribuição para que a Assembleia elabore uma «Lei de Segurança» respeitadora das liberdades dos cidadãos e nunca um instrumento de intimidação dos mesmos.
Determinarei a minha posição na votação final da lei, pela consagração no texto definitivo das soluções e princípios que referi.

O Deputado, Carlos Lage.

Votámos favoravelmente a proposta de lei n.º 71/III, sobre Segurança Interna e Protecção Civil, confiantes

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que sejam introduzidas alterações na especialidade que não ponham em causa direitos, liberdades e garantias do povo português.

Os Deputados do PS: Belmiro Moita da Costa - Dinis Alves

O deputado abaixo assinado do Partido Socialista, António Jorge Duarte Rebelo de Sousa, votou favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei n.º 71/III, sobre Segurança Interna do Governo na pressuposição de que venham a ser introduzidas na especialidade, alterações substanciais que garantem nomeadamente

1.º A existência prévia de mandatos judiciais que legitime as buscas domiciliárias, as escutas telefónicas e outras restricões de natureza semelhante aos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos,
2.º A eliminação de toda e qualquer disposição que possibilite a proibição de manifestações excepto nos casos constitucionalmente previstos do estado de sítio e do estado de emergência,
3.º A eliminação de toda e qualquer disposição equívoca quanto à intervenção das Forças Armadas na Segurança Interna do País e a introdução dos reajustamentos tidos por convenientes quer no sentido de assegurar um mais adequado enquadramento da sobredita proposta de lei n.º 71/III, quer no atinente a questões relacionadas com o tratamento informático de dados.

Os supracitados pressupostos resultam da interpretação que o deputado abaixo assinado fez da intervenção dos membros do Governo aquando do debate, na generalidade, na Assembleia da República.
Considera, finalmente, o deputado abaixo assinado que, apesar de discordar de diversas cláusulas da sobredita proposta, a iniciativa do Governo se apresenta louvável, podendo contribuir para uma maior estabilidade e consolidação das instituições democráticas.

O Deputado do PS, António Rebelo de Sousa.

A Comissão Política da Federação Regional da Madeira do Partido Socialista, reunida no passado dia 18 do Corrente mês, tomou posição clara sobre a proposta de lei n.º 71/III, ora votada, posição constante de um projecto de resolução apresentado à Assembleia Regional da Madeira pelo grupo parlamentar socialista, cujo teor passo a citar:
«O Estado democrático carece de meios democráticos adequados para fazer face ao terrorismo, à violência e ao crime organizado.
Nessa perspectiva, entende-se ser necessária na sociedade portuguesa, legislação que defina os meios a adoptar para assegurar a segurança, num quadro do respeito pelos direitos e liberdades que constituem traço marcante do regime democrático recuperado com a revolução de Abril.
Entendendo ser necessária uma lei deste teor, a Assembleia Regional e de parecer que, na proposta de lei n.º 71/III, de iniciativa do Governo da República, deverão ser introduzidas as alterações que representem a melhoria da lei, num quadro de salvaguarda dos princípios democráticos, dos direitos e liberdades, em concretização da disponibilidade manifestada por representantes dos Partidos da coligação e compreendida pelo próprio Governo da República.
Medidas de excepção como buscas domiciliárias, escutas telefónicas e fiscalização de correspondência, não devem ser executadas sem prévia intervenção judicial, através da emissão dos respectivos mandatos, as Forças Armadas deverão ser afastadas das acções de segurança interna, salvo nos casos de estado de sítio ou de emergência, previamente regulamentados e definidos, o conceito de segurança interna deverá ser claro e concretamente definido, acabando com a situação da dúvida fomentadora da oposição à lei, a execução das medidas deverá ser confiada a instituições de Estado, sem atribuição de competências próprias, nesta matéria, a autoridades distritais ou regionais.
Nestes termos, a Assembleia Regional, solicitada pela Assembleia da República nos termos constitucionais, a emitir parecer sobre a proposta de lei n.º 71/III sobre «Segurança Interna e Protecção Civil» da iniciativa do Governo da República, e de parecer que é necessário aprovar legislação em matéria de segurança, não devendo porém a lei em questão, tal como se encontra, merecer o seu acordo, que só poderá vir a ser dado, com a adopção no processo legislativo, das medidas necessárias e adequadas, nomeadamente as constantes no teor desta Resolução.
O comunicado da Comissão Política, além da substância da citação feita, deliberava que fosse dado conhecimento ao deputado pelo círculo da Madeira, do PS, na Assembleia da República.
A posição oficial dum órgão regional do meu partido - que subscrevo na íntegra e uma reflexão pessoal profunda exigiram que votasse contra a proposta de lei n.º 71/III, o que em consciência deveria ter feito.
Abstive-me, porém.
Ao tomar esta posição, no entanto, pretendo exclusivamente significar que mantenho a esperança de que o texto que vier a sair da especialidade mereça na votação global, a rectificação do meu voto.

O Deputado do PS pelo Círculo da Madeira, Mota Torres.

Submeti-me à disciplina de voto dando o meu apoio, na generalidade, à proposta de lei n.º 71/III, porque me foram dadas garantias de que as versões final da lei - após a sua apreciação em sede de especialidade - será expurgada de todos os aspectos que, na oportunidade, considerei inaceitáveis no plano das minhas convicções mais profundas.
É este, pois, o sentido - exacto e escuto - do meu voto à proposta de lei n.º 71/III, com as alterações propostas pela bancada socialista e assumidas já publicamente pelo Executivo durante o debate.

O Deputado do PS, Réu Borges.

Dou o meu apoio na generalidade à proposta de lei n.º 71/III, no pressuposto que a versão definitiva respeitará as alterações introduzidas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista expressas na intervenção do deputado Jorge Lacão e assumidas durante a discussão pelo Governo

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Este é o sentido exacto do meu voto que condicionará a minha posição definitiva aquando da votação final global

O Deputado do PS, Raul da Costa Brito

Votei a favor desta lei, na generalidade, pelos seguintes motivos:

1.º Entendo não dever, à partida, inviabilizar uma lei que poderá ir ao encontro das preocupações do povo português, no que concerne à segurança de bens e pessoas, pacificações da sociedade, relacionamento social confiante, pelo combate ao terrorismo e ao crime organizado;
2.º O voto a favor representa a esperança de que na comissão da especialidade os aspectos mais negativos e mais chocantes desta lei, sejam modificados, melhoradas ou eliminados;
3.º A carga ideológica que formou a minha personalidade, numa luta de dezenas de anos, contra a prática discriminatória dos que se oponham ao regime anterior ao 25 de Abril, contra a prepotência e o arbítrio, contra a negação dos direitos cívicos, contra os mais elementares direitos do homem, obriga-me a reticentes dúvidas perante qualquer lei limitativa desses direitos. No entanto, se haverá uma razão, há também uma esperança. Espero e confio que a melhor razão prevaleça e a esperança não seja vã. Dai o meu voto a favor, que é um voto de confiança num governo democrático, no qual deposito a minha esperança e do qual tenho a certeza de que fará da lei um uso norteado pela razão e com objectivos de justiça social, como todos esperamos confiadamente.

O Deputado do PS, Hermínio de Oliveira

Votei favoravelmente, na generalidade, o projecto de lei do Governo convicto, como estou, de que, filtrado na especialidade, corrigido nos excessos que me parecem evidentes e que, nas mãos de outro governo, poderiam brigar com as liberdades e garantias que são o cerne das instituições democráticas.
Votei-a ciente de que, a democraticidade dos membros do Governo que são seus signatários e que o apadrinham e as promessas solenes que fizeram nesta Câmara, e, considerando que este parlamento tem nas mãos os instrumentos necessários para lhe introduzir as alterações que transformem esta lei numa lei inócua para as liberdades essenciais dos cidadãos, não tive dúvidas em dar o meu voto na generalidade.
Aliás, tenho a ingenuidade de acreditar nos homens e de lhes valorizar a intencionalidade, quando o seu passado e a sua prática nos dão garantias de que, nos momentos mais cruciais por que a liberdade passou neste país, sempre estiveram ao parapeito
Aliás se, por hipótese absurda, a purga a que vai sei sujeita a proposta do Governo, não a amputar de excrescências indesejáveis, ficará sempre ao alcance do signatário a possibilidade de votar contra na especialidade e na votação final global.

O Deputado do PS, Frederico de Moura

1 - Votei favoravelmente a proposta de lei n.º 71/III, sobre a segurança interna e protecção civil, tendo em conta os seguintes considerandos:

1.º Razões de ordem conjuntural e de oportunidade política, as quais, no meu entender, tornam premente a instituição de uma medida legislativa (ou mais) de segurança interna e de protecção civil que garanta a segurança dos cidadãos e assegure o normal funcionamento das instituições democráticas,
2.º O pressuposto de ter ficado assegurado no amplo debate efectuado no Plenário por parte do Governo e pelas bancadas dos partidos da maioria, de que a versão definitiva sofrerá através da discussão na especialidade, profundas alterações de articulado, expressas designadamente na intervenção sobre a proposta em apreço do deputado Jorge Lacão da bancada do Partido Socialista.

2 - Na sequência do exposto em 2.º, de que na versão definitiva fiquem inequivocamente asseguradas as disposições constitucionais no que concerne a direitos liberdades e garantias da pessoa humana

3 - Votei favoravelmente o projecto de lei n.º 367/III, apresentado pelo CDS com os mesmos condicionalismos atrás expressos para a proposta de lei n.º 71/III

4 - Abstive-me em relação ao projecto de lei n.º 370/III, apresentado pela ASDI por apenas enunciar medidas legislativas de pretensão do terrorismo

O Deputado do PS, Cunha e Sá

Votei contra o projecto de lei n.º 71/III, como e minha obrigação moral, dado que a consideramos como anticonstitucional pondo em causa o estado de direito e não respeitando as liberdades e direitos democráticos fundamentais. Com o meu voto salvaguardo a honra do Partido Socialista e respeito a sua tradição

O Deputado do PS, Eurico Figueiredo.

Voto favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei n.º 71/III, lei de segurança interna e protecção civil, no convencimento de que as alterações ao texto, apontadas em intevenções ao texto, apontadas em intervenções críticas de deputados do meu partido e ainda na intervenção do Sr Ministro da Justiça, serão consideradas quando da discussão na especialidade.
E quando for caso da votação na especialidade, certamente que estas alterações já estarão consideradas no texto final.
E o meu voto, nessa altura, já estará em consonância plena com o meu sentir e com as necessidades da defesa do estado democrático.

O Deputado do PS, Eurico Correia.

Votei contra a proposta de lei n.º 71/III, porque: - É inconstitucional;
- Contraria a concepção de estado de direito democrático,
- É uma ameaça aos direitos, liberdades e garantias do povo português.

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Com o meu voto pretendo salvaguardar as tradições de lutas pelas liberdades do Partido Socialista.

A Deputada do PS, Margarida Marques

Votei favoravelmente o projecto de lei n.º 367/III, «segurança interna e protecção civil», apresentado pelo CDS, por, no meu entender constituir uma contribuição para uma lei de segurança interna e protecção civil, entretanto sujeito às alterações que na especialidade venham a garantir inequivocamente os direitos, liberdades e garantias expressos na Constituição.

A Deputada do PS, Maria Ângela D. C. Pinto Correia.

Votei favoravelmente a proposta de lei n.º 71/III «lei de segurança interna e protecção civil» no pressuposto de que as propostas de alteração do Grupo Parlamentar do Partido Socialista serão consagradas na votação na especialidade

A Deputada do PS, Maria Ângela D. C. Pinto Correia

Dou o meu apoio, na generalidade, à proposta de lei n.º 71/III, no pressuposto que a versão definitiva respeitará as alterações introduzidas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista expressas na intervenção do deputado Jorge Lacão e assumidas durante a discussão pelo Governo.
Este e o sentido exacto do meu voto que condicionará a minha posição definitiva aquando da votação final e global.

A Deputada do Partido Socialista, Maria Helena Valente Rosa

Votei na generalidade a favor da proposta de lei de segurança interna apresentada pelo Governo porque considero urgente dotar o País de uma lei de segurança interna e porque as alterações que o Governo, designadamente através do Ministro Dr. Rui Machete, já anunciou aceitar serem introduzidas na discussão de especialidade, bem como a abertura para outras correcções, permitem concluir que o texto final terá o equilíbrio essencial entre os direitos e liberdades dos cidadãos e o reforço da autoridade do Estado para defender os indivíduos e as instituições contra todos aqueles que revolucionariamente atentem contra o direito a paz, a segurança e à estabilidade.

O Deputado Social-Democrata, José Vitorino

É imperioso que o Estado combata eficazmente, neutralize e aniquile o crime organizado e muito particularmente o terrorismo. razão acrescida para que os meios políticas, jurídicos, administrativos, humanos e materiais, sejam adequados e criteriosamente concebidos e implementados.
A insensatez, a ligeireza ou a estreiteza de vistas perante tão imensa e premente tarefa nacional poderão, sob a aparência de uma actuação enérgica, que correrá o risco de não ter plena aplicação prática, prejudique de facto o objectivo patriótico da defesa do Estado, da liberdade e da segurança dos cidadãos.
Os signatários, confrontados com a inadequação do texto da proposta de lei do Governo ao fim visado e com a necessidade de simultaneamente dar o seu contributo crítico e construtivo, em ordem a atingir a desejável adequação de forma a obter resultados efectivos, que é o que importa e o País anseia, consideraram sua obrigação fazer acompanhar o seu voto favorável da proposta de lei do Governo da presente declaração de voto.
A proposta de lei n.º 71/III (sobre Segurança Interna e Protecção Civil), apresentada pelo Governo, fere princípios basilares do estado de direito e não responde à necessidade real e urgente de melhorar a capacidade do Estado Português de dar combate mais eficaz ao crime organizado, onde sobressaem nomeadamente o terrorismo, o roubo e o tráfico de droga.
Assim, a proposta suscitou contundentes críticas.
As declarações do Governo no Parlamento durante o debate, em particular as do Ministro da Justiça, aceitando as necessárias alterações na especialidade, de tão substanciais bem justificariam a retirada de proposta governativa, em benefício de outros documentos em debate (projectos de lei n.º 367/III e 370/III, respectivamente do CDS e da ASDI), visando a mesma finalidade e apresentando-se na generalidade em termos aceitáveis.
Seria um gesto de elevação política e tradutor da capacidade de aceitar sem reticências o princípio mesmo da eficácia do combate ao crime organizado no quadro do estado democrático, o mais amplo consenso das forças e correntes democráticas, onde se deve inserir, aliás, como pedra angular, a dignidade e a proficuidade das relações entre o Governo e os deputados que integram os grupos parlamentares da maioria que o apoia.
Assim não aconteceu. E, ao invés, a Direcção do Grupo Parlamentar do PSD e a sua Comissão Política Nacional determinaram não só o voto favorável, como consideraram a aprovação na generalidade da proposta governativa uma questão decisiva para a credibilidade política e para a acção do Governo, corroborando, aliás, a própria postura deste.
Por outro lado, tomam-se como garantia de honra a declaração no debate do Ministro da Justiça, Rui Machete, a declaração já antes proferida pelo Ministro da Administração Interna, Eduardo Pereira, no sentido de aceitar as alterações que a maioria parlamentar entendesse introduzir e as declarações produzidas pelos deputados Jorge Lacão e Ângelo Correia, respectivamente do PS e do PSD, intervindo no debate formalmente em nome dos seus grupos parlamentares e por mandato expresso publicamente relendo das suas direcções, as quais, a serem concretizadas, arredarão as objecções fundamentais ao voto favorável da proposta governativa.
A este respeito, haverá que pôr em evidência:

A necessidade de restringir o âmbito da lei ao fim que ela pretende atingir (o combate ao crime organizado), dando carácter inequivocamente excepcional às próprias medidas excepcionais que se visa instituir e excluindo da proposta todas as matérias que lhe são alheias, as quais deverão ser objecto de diplomas específicos [Rui Machete: «Com efeito, só a nosso ver quanto ao crime organizado e de alta violência, ao tráfico de drogas e ao terrorismo, se põe com pertinência a adopção das medidas previstas», «encarar a

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hipótese de se repartirem em diplomas distintos as matérias relativas a segurança interna e à protecção civil dos cidadãos» - o que implica modificar ou eliminar em conformidade os artigos 1.º (Definição de Segurança Interna), 2.º (Política de Segurança Interna), 5.º, n.º 4 (Funcionários Públicos), 7.º (Conselho Superior de Segurança Interna e Protecção Civil), 9.º, n.º 1 a 6 (Regiões Autónomas), 13.º (Serviços de Protecção Civil), 16.º, 17.º e 18.º (Funcionamento e Fiscalização do Centro de Dados e Normas de Processo), 19.º (Comunicação de Informações), 25.º (Dever de Colaboração), 26.º (Proibição, Suspensão ou Dissolução de Reuniões e Manifestações), 28.º (Requisição de Serviços e Meios Materiais), 29.º (Restrições ao Exercício de Direitos) e 31.º (Polícia Judiciaria)], A necessidade de excluir inequivocamente as Forças Armadas das funções especificamente de segurança interna, salvo nos condicionalismos constitucionalmente previstos [Rui Machete «Esta fora de causa que as Forças Armadas possam exercer quaisquer actividades de segurança interna ou tomar medidas de polícia em situação normal» - o que implica a eliminação do n.º 3, do artigo 11.º],
A necessidade de atribuir à autoridade judicial a competência da decisão de medidas de política excepcionais, adoptando as adequadas alterações ao sistema vigente impostas pela celeridade [Rui Machete «Afastada a quebra da jurisdicionalização dos actos que possam brigar com direitos, liberdades e garantias dos cidadãos» - o que implica a alteração em conformidade dos artigos 22.º (Buscas), 23.º (Detenção de Suspeitos), 24.º (Escutas Telefónicas e Fiscalização de Correspondência), 27.º (Interdição Temporária de Saída do Território Nacional)]
A necessidade de urgentemente, na sequência das disposições constitucionais, regulamentai as situações de «estado de sítio e estado de emergência»
De qualquer modo, não se poderá deixai de registar a ideia de que este processo e a sua condução terão muito provavelmente causado prejuízo à finalidade que se pretende alcançar - a de dar combate mais eficaz a criminalidade organizada e em particular ao terrorismo
Nestes termos, decidimos e deve ser entendido o nosso voto favorável da proposta de lei n.º 71/III
E esta declaração de voto, para além das razões que o foro da consciência pessoal impõe, deve ser tomada como o cumprimento do dever de colaboração e de afirmação, no quadro da disciplina partidária, que o serviço e o engrandecimento de um Partido como o - nosso não só permitem, mas pedem e exigem

Os Deputados do PSD Correia Afonso - Carvalho Ribeiro - Machado Lourenço - João Salgado - Joaquim Pereira Costa - Mariana Perdigão - Amónio Capucho - Eleutério Alves - Gaspar Pacheco - João Salgueiro - Fernando Amaral - Margarida Salema - Rocha de Almeida - José de Almeida Cesário - Vasco Miguel - Fernando Figueiredo - Manuel António dos Santos - Luís Martins - Portugal da Fonseca - Virgílio Pereira - Abílio Guedes - Silva Marques - Leonel Santa Rita Pires - José António do Couto - Luís Riquito - Mário Santos - Anacleto Batista - Figueiredo Lopes - Silva Domingos - Vargas Bulcão - Mário Adegas - Pedro Paulo - Ourique Mendes - Montalvão Machado - Carlos Miguel Coelho.

Votei favoravelmente a proposta de lei n.º 71/III sobre Segurança Interna e Protecção Civil pois considero que se impõe dotar o País de uma lei de segurança interna e de uma lei antiterrorista A segurança das pessoas e dos seus bens em iodos os momentos e circunstâncias tem de ser devidamente garantida quando haja quem atente contra os direitos e liberdades das mesmas pessoas.
A existência de um Tribunal Constitucional, para além da posição assumida pelo Governo, designadamente através da intervenção do Ministro da Justiça, permitem-me concluir que, contrariamente às vozes surgidas em sentido contrário, os direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição serão devidamente acautelados e defendidos e que certas medidas restritivas, de cunho excepcional, o não sei ao nunca contra tais direitos e muito menos violadoras da lei fundamental.
Alem disso, aprovada na generalidade aquela iniciativa legislativa, cabe agora a Assembleia da República, no uso legítimo das suas competências alterar, aditai, modificar ou suprimir do texto original o que considere necessário, de modo a produzir legislação que, coadunando-se com a Constituição, contenha em si as virtualidades que lhe permitam contribuir para a cliente segurança dos cidadãos e dos seus bens e para o exercício dos seus direitos, liberdades e garantias, o que implica que simultaneamente conceda os meios necessários e eficazes de combate à criminalidade, ao crime organizado e a quaisquer formas de acções terroristas, pois sem este combate eficaz correm risco aqueles direitos, liberdades e garantias e a própria democracia
A Assembleia da República saberá em sede de especialidade corrigir o que considerar necessário para produzir uma tal legislação, mostrando saber estar à altura das suas altas responsabilidades, na certeza de que ao assim proceder não desrespeitara o orgão de soberania que foi autor da iniciativa legislativa

O Deputado do PSD, António Marques Mendes

Relatórios e pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos enviados à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 26 de Julho, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados

1) Solicitada pelo Partido Social-Democrata

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (circulo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva (esta substituição e pedida para os dias 30 de Julho corrente, 3 a 14 de Agosto próximo, inclusive, e 27 e 28 de Agosto próximo, inclusive)

2) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social

Henrique Paulo das Neves Soudo (círculo eleitoral de Setúbal por Manuel Jorge Pedrosa Forte Goes (esta substituição foi pedida para os dias 24 a 31 de Julho corrente, inclusive)

3) Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de pré-

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cedências das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais;

4) Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis,
5) Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais

6) O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão. Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) -Manuel Fontes Orvalho (PS) - António Machado Lourenço (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - João Antónia Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Luís Filipe Paes Beiroco (CDS) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - Antónia Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Em reunião realizada no dia 26 de Julho, pelas 23, horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados

1) Solicitadas pelo Partido Socialista

José Joaquim Pita Guerreiro (círculo eleitoral de Viana do Castelo) por José Luís Diogo de Azevedo Presa (esta substituição é pedida para o período de l de Agosto a 13 de Outubro próximos, inclusive).
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo (círculo eleitoral do Porto) por Juvenal Batista Ribeiro (esta substituição é pedida para o período de 30 de Julho corrente a 31 de Agosto próximo, inclusive).
José da Cunha e Sá (círculo eleitoral de Coimbra por Fernando Tomás dos Santos Ferreira (esta substituição é pedida para o período de 1 de Agosto a 30 de Setembro próximos, inclusive)

2) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social

Henrique Paulo das Neves Soudo (círculo eleitoral de Setúbal), por Manuel Jorge Pedrosa Forte Goes (esta substituição é pedida para o período de 1 de Agosto a 1 de Outubro próximos, inclusive)
3) Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais,
4) Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis,

5) Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer.
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
6) O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes

A Comissão: O Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, Mano Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Cosia (PSD) - Mana Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Francisco Menezes Falcão - (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS)

Voto de congratulação enviado à Mesa para publicação

O acordo que vai sei assinado pelos Presidentes da Associação Académica de Coimbra e do Club Académico de Coimbra é um acto histórico que, restituindo a Académica à Academia, restitui a cada um de nós um pouco de nós mesmos.
Por isso, mais do que realçar o seu significado desportivo, importa sublinhar o seu carácter cultural.
Para todos aqueles que passaram por Coimbra, a equipa de futebol da Associação Académica é um símbolo, um elo de ligação entre gerações, uma embaixada viva e permanente da História, da cultura e da afectividade coimbrãs, duma maneira de ser que e parte integrante do património cultural da cidade e do País
Com o regresso da Académica todos regressamos, de certo modo, a Coimbra Todos ficamos mais perto da nossa juventude e da nossa cidade. Do mesmo modo que, em cada Domingo, a Coimbra de ontem, de hoje e de sempre estará mais perto de todos os que, espalhados pelo país e pelas 7 partidas do Mundo, trazem no coração a camisola negra da Académica.
Repostas, assim, a verdade e a história, estamos certos de que o regresso da Académica constituíra um novo impulso para o engrandecimento da Academia e da cidade de Coimbra, ao mesmo tempo que enriquecerá o desporto português e a cultura nacional
Os abaixo-assinados, antigos estudantes de Coimbra e deputados à Assembleia da República, vêm por este meio associar-se ao júbilo de todos os académicos e saudar publicamente a Associação Académica de Coimbra/organismo autónomo de Futebol

Os Deputados: Manuel Alegre - Antónia Macedo - Nogueira de Brito - Manuel Queiró - José Luís Nunes - Octávio Cunha - Rui Neves - Belmiro Costa - Sottomayor Cardia - Cunha e Sá - Acácio Barreiros - Manuel Pereira - Eurico Figueiredo - Almerindo Marques - César Oliveira - Abílio Curto - Hernâni Moutinho - Maria Ângela Correia - Jorge Lacão - Mana da Conceição Dias Neto - Gomes de Pinho - Malato Correia - Miguel Anacoreta Correia - Horácio Marçal - Armando Oliveira - José Gama - Manuel de Almeida e Vasconcelos - Pereira da Costa - Frederico de Moura - Vilhena de Carvalho - José Manuel Mendes - João Amaral - Uno Lima - Costa

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Andrade - Machado Lourenço - José de Almeida Valente - António Taborda - Alexandre Reigoto - Montalvão Machado - Azevedo Soares
Os Redactores Ana Mana Marquei da Cruz - Cacilda Nordeste - José Diogo - Maria Leonor Ferreira - Carlos Pinto da Cruz.

Rectificação ao n.º 134, de 6 de Julho de 1984 (Intervenções do deputado da ASDI Magalhães Mota)

Na p 5756, col 1.ª III, onde se lê «Trata-se pois de uma petição» deve ler-se «Trata-se, repito, de uma petição»

Na p 5757, col 1.ª, 1.3, onde se lê «do debate que então travara» deve ler-se «do debate que então travaram»
Na mesma p. col 2.ª , l 8 e 9, onde se lê «Ora, tal questão obviamente se não punha porque» deve ler-se «Ora, tal questão obviamente se não punha neste caso porque»
Na p 5760, col 2.ª, l 57 e 58, onde se lê «creio que a conexão e evidente para todos os proponentes, das iniciativas legislativas que aqui temos» deve ler-se «creio que e evidente para todos os proponentes a conexão das iniciativas legislativas que aqui temos»
Nas mesmas p e col l l, alínea f), onde se lê «que e precisamente uma lei» deve ler-se «que é precisamente um projecto de lei»

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