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I Série - Número 149

Sexta-feira, 28 de Setembro de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

COMISSÃO PERMANENTE

ACTA DA REUNIÃO DE 27 DE SETEMBRO DE 1984

SUMÁRIO

Acta da reunião da Comissão Permanente do dia 27 de Setembro de 1984

O Sr. Presidente (Basílio Horta): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que podemos dar início aos nossos trabalhos.
Está aberta a reunião.

Eram 15 horas e 52 minutos.

Estavam presentes, além do Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares (António Vitorino), os seguintes Srs. Deputados:

Carlos Cardoso Lage (PS), vice-presidente.
Fernando Monteiro do Amaral (PSD), vice-presidente.
Zita Maria de Seabra Roseira (PCP).
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca, vice-presidente.
Américo Albino da Silva Salteiro (PS).
Almerindo da Silva Marques (PS).
José Eduardo Ferraz de Abreu (PS).
Acácio Manuel de Frias Barreiros (PS).
Rui Monteiro Picciochi (PS).
Agostinho de Jesus Domingues (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
Silvino Manuel Gomes Sequeira (PS).
Victor Hugo de Jesus Sequeira (PS).
Manuel Maria Moreira (PSD).
António Marques Mendes (PSD).
José Adriano Gago Vitorino (PSD).
João Luís Malato Correia (PSD).
José Augusto da Silva Marques (PSD).
José da Silva Domingos (PSD).
Carlos Alfredo de Brito (PCP).
Maria Ilda Costa Figueiredo (PCP).
Octávio Augusto Teixeira (PCP).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
José Luís Nogueira de Brito (CDS).
Henrique Manuel Soares Cruz (CDS).
Manuel António Almeida Vasconcelos (CDS).
João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).
Joaquim Jorge Magalhães Mota (ASDI).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para colocar uma questão prévia, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostávamos de colocar uma questão prévia que se reporta à abertura desta reunião à comunicação social, tal qual tem sido feito em reuniões anteriores, embora se tenha entendido que, sobre isso, deve fazer-se deliberação caso a caso. Levantamos de novo a questão porque entendemos que se verificam condições para esse efeito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, é apenas para anunciar que, tendo em conta os argumentos que já foram aduzidos nesta matéria e a importância que tem a publicidade dos trabalhos da Comissão Permanente, entendemos apresentar na Mesa uma proposta de alteração do Regimento da Comissão Permanente de forma que as sessões desta Comissão sejam abertas, permanentemente, aos órgãos da comunicação social.
Não sei se o Sr. Presidente pretende agendar esta matéria para o período da ordem do dia ou se a poderíamos discutir já, escusando estarmos a fazer decisões pontuais nesta matéria.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, pedi a palavra exactamente no sentido de solicitar a V. Ex.ª que a sessão fosse aberta aos órgãos da comunicação social.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Relativamente à questão suscitada pelo Sr. Deputado José Magalhães, tal como já nos exprimimos em outras reuniões da Comissão Permanente, a nossa opinião é a de que nada se opõe à abertura da reunião aos órgãos da comunicação social.
Todavia, aproveito para me pronunciar, desde já, acerca da questão levantada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota. Nós entendemos, e já tivemos oportunidade de exprimir essa orientação, a qual julgamos estar bem fundada no Regimento, que o agendamento da ordem do dia das reuniões da Comissão Permanente deve ser, naturalmente, marcado pelo Presidente ou a partir de tomadas de posição em reuniões precedentes daquela Comissão ou com o consenso de um representante de cada grupo parlamentar. Não tendo havido nem uma nem outra coisa, relativamente â iniciativa agora suscitada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, creio que não a poderemos agendar hoje para debate e apenas poderemos equacionar essa questão para uma próxima reunião da Comissão Permanente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com efeito, a proposta de substituição, agora apresentada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota não estava agendada e a Mesa não veria nisso oposição se não a houvesse por parle de algum grupo ou agrupamento parlamentar. Mas, havendo oposição e aplicando-se subsidiariamente o Regimento, a proposta não poderá ser agendada na ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não tenho nada a opor a esse entendimento, até porque é regimental, mas pedia apenas para a proposta ser distribuída e chamava a atenção para o facto de hoje ser, pela ordem natural das coisas, a última reunião da Comissão Permanente, visto que o Plenário reúne no dia 2.

O Sr. Presidente: - A Mesa vai providenciar no sentido da distribuição da proposta subscrita pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.
Tem a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para anunciar que o Grupo Parlamentar do PSD lambem não vê inconveniente em que hoje a sessão seja aberta aos órgãos da comunicação social, posição que tomámos já na última reunião da Comissão Permanente. Também não vemos objecção a que seja hoje discutida a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, Em lodo o caso, como foi levantada uma objecção pelo Sr. Deputado Lacão. não vemos possibilidade de ela ser discutida hoje.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Nós não vemos objecção a que se proceda nesta sede e neste momento a uma alteração do Regimento no sentido que foi aventado pelo Agrupamento Parlamentar da ASDI e cremos que são pertinentes as questões que foram colocadas à reflexão da Comissão Permanente, isto e, ou a alteração e feita neste momento, e temos possibilidade de deliberar positivamente, ou a questão será adiada, e ficará em suspenso durante um período que nos parece não ser adequado e conveniente. Nesse sentido, apelávamos a que se reflectisse ainda e se ponderasse mais adequadamente sobre a questão da inserção desta matéria na ordem do dia de hoje.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, concluo que a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota não será agendada na ordem do dia de hoje, em virtude de não haver consenso nessa matéria.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era só para não se poder concluir, do silêncio da bancada do CDS, que nós não estávamos de acordo com o agendamento da proposta na ordem do dia. Portanto, não juntamos o nosso silêncio à voz do Partido Socialista. Estamos em desacordo com o Partido Socialista e entendemos ser esta, realmente, a oportunidade de discutir a alteração regimental proposta pela ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ê evidente que damos o nosso apoio à proposta do Sr. Deputado Magalhães Mola e entendemos que ela deveria ser agendada.
O Sr. Deputado Magalhães Mola referiu que esta, naturalmente, será a última reunião da Comissão Permanente, pelo que também fazemos um apelo ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista no sentido de rever a sua posição, possibilitando, então, o agendamento da referida proposta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Costuma dizer-se que quem cala consente, mas aqui, para que se compreenda bem que o nosso silêncio consentia que se discutisse hoje a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, queremos dizer que, pela nossa parte, não tínhamos nenhuma objecção a que isso fosse objecto de debate neste momento.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, passamos à votação da proposta apresentada pelo

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Sr. Deputado José Magalhães no sentido de esta reunião ser aberta aos órgãos da comunicação social.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Podem, portanto, ser abertas as portas aos representantes da comunicação social.

ANTES DA QRDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Entraremos agora no período de antes da ordem do dia..
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Conselho de Ministros deliberou que cesse funções no próximo dia 30 de Setembro a Comissão Coordenadora das Acções Relativas aos Efeitos dos Temporais de Novembro de 1983. A consumar-se a decisão, constante do Decreto-Lei n.º 269/84, acabará cedo e num quadro lamentável esta Comissão, que surgiu demasiado tarde, laborou intensamente com meios escassos e inadequados, enfrentou bloqueamentos e resistências resultantes do centralismo, dos vícios de uma Administração Pública por reformar e acima de tudo da política governamental de asfixia financeira que fez marcar passo ou frustrou em absoluto propostas e sugestões que poderiam ter sido positivas.
Qualquer que seja o juízo definitivo que venha a merecer a sua acção, não poderia esperar-se realmente da Comissão o que cabe ao Governo, estando hoje completamente demonstrado que o Governo PS/PSD não soube enfrentar adequadamente a catástrofe e, tão irresponsavelmente ontem como hoje, extingue agora uma estrutura de coordenação, que talvez seja incómoda, como se tivessem findado as consequências do pesadelo de Novembro de 1983, que fez vítimas humanas, desalojou 621 famílias, causou prejuízos de mais de 14 milhões de contos.
10 meses depois, é certo que se multiplicaram as visitas e deslocações governamentais demagógicas, mas os mais lesados continuam lesados, há que reconhecê-lo. 209 famílias continuam por alojar, das 596 casas necessárias para substituir residências totalmente destruídas foram tomadas medidas que se anuncia virem talvez a assegurar 185. Em 10 meses, o Governo ainda não decidiu se o extinto Fundo de Fomento da Habitação receberá verbas para garantir as 119 casas que a Comissão propõe que lhe caibam. A indefinição é tal que paralisou a utilização de solos infra-estruturados oferecidos pelas autarquias, a canalização para a habitação de verbas da conta especial «Temporais 1983» marca passo: jazem sem aproveitamento dezenas de milhares de contos (incluindo cerca de dois terços dos 100 000 contos doados pela Fundação Gulbenkian), enquanto estão por garantir em absoluto 300 casos (prolongando-se situações como a que se vive entre os desalojados instalados na Casa Pia ou nas futuras instalações da GNR em Loures, cuja entrega à corporação tem por isso sido adiada). Isto é verdadeiramente um escândalo para o qual importa alertar a Assembleia da República nesta sede. Entendemos que o balanço da acção governamental, face aos efeitos das cheias, é desolador e em si mesmo uma condenação do Governo.
Comprovou-se a insuficiência e inadequação dos esquemas tardiamente instituídos para apoio às autarquias, às actividades económicas e à reconstrução de habitações.
Em vez de subsídios adequados a fundo perdido, houve empréstimos às autarquias que agravaram o seu endividamento e as levam a ter de onerar mais os munícipes com derramas, taxas e multas. Lembro, por exemplo, que um dos concelhos mais atingidos, Loures. com prejuízos de mais de 604 000 contos, recebeu 69000 contos a fundo perdido, terá de contrair empréstimos de 123 727 contos, vai ter de lançar uma derrama (sobre os rendimentos da contribuição predial e industrial mais elevados) que propiciará talvez 90 000 contos - cerca de 42 % da verba necessária para reconstrução de escolas e outros bens danificados.
Por outro lado, o esquema de concessão de 3 milhões de contos de crédito bonificado ao comércio, indústria e agricultura (duramente criticado pelos interessados, como se lembram e que chegou a esta Assembleia em várias petições, sem que o Governo os ouvisse) provou ser de tal maneira ineficaz e burocratizante que o presidente do SNPC pôde, aliás com razão, considerar que, se algum sector se pode considerar vítima principal dos temporais, esse é o sector das actividades produtivas. Ignora-se que verbas foram atribuídas, mas conhecem-se em contrapartida os protestos de centenas de pedidos recusados e as consequências disso para o funcionamento das empresas, designadamente para a sua falência.
A linha de crédito de 500 000 contos, tão propagandeada para recuperação habitacional, era inadequada - muitos dos casos eram clandestinos -, dada a natureza das habitações destruídas, e, pura e simplesmente, não funcionou. E isso é grave.
Quanto aos subsídios especiais do Ministério do Trabalho e Segurança Social, anunciados pelo próprio Ministro da Administração Interna no próprio Plenário da Assembleia da República, que estavam previstos no decreto-lei de Dezembro de 1983, se alguém os viu, importa que se acuse, porque nada transparece! Viu-se, sim, uma campanha incentivadora do lay-off nas empresas atingidas, o que é francamente lamentável.
Um segundo traço característico deste processo é que a administração central, em particular o Ministério do Equipamento Social, «cujo orçamento foi insuficientemente reforçado», deixou por realizar obras vitais de recuperação, suscitando críticas severas à Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, havendo casos escandalosos de atribuição de verbas e não atribuição de outras.
Quanto às corporações de bombeiros envolvidas nas cheias com elevada capacidade operacional, em vez de se proceder à fixação global e distribuição dos subsídios de forma transparente, o Governo procedeu à distribuição avulsa de alguns subsídios, através dos governos civis, havendo corporações sem qualquer financiamento das despesas graves que tiveram. E procura-se lançar sobre as autarquias a responsabilidade por estas despesas.
Finalmente, em vez das medidas de fundo em matéria urbanística e de ordenamento do território, o

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Governo produziu o inconstitucional pacote autárquico, não funcionou o grupo de trabalho criado pela resolução do Conselho de Ministros, realizou-se no âmbito do Ministério da Qualidade de Vida um espantoso seminário - promovido pelo Secretário de Estado Eugênio Nobre - a responsabilizar as autarquias pela situação que existe e o Governo ensaiou, em relação às autarquias, a tentativa de devolução de responsabilidades que quer institucionalizar através do pacote autárquico.
Concluímos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, alertando para este facto.
Segundo o Serviço Nacional de Protecção Civil, é de admitir que no próximo mês de Novembro se verifiquem altos níveis de pluviosidade. E a questão que se coloca é: como vai ser? Que destino vão ter as acções em curso? Como vai o Governo obviar às consequências da não resolução nem de questões imediatas fundamentais nem das questões de fundo?
Quais vão ser as competências da Comissão Coordenadora, nestas circunstâncias?
Independentemente da intervenção de outras entidades, em particular dos departamentos governamentais responsáveis pelas acções relativas aos efeitos dos temporais, a Assembleia da República deve pronunciar-se sobre esta matéria, estudar esta matéria. Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP, que apresentará em breve novas iniciativas, dirige, hoje mesmo, 61 requerimentos a vários departamentos da administração central e a algumas autarquias locais, com vista a obter um quadro rigoroso da situação existente, para que a Assembleia, designadamente no quadro do próximo debate orçamental, possa tomar as medidas que, lamentavelmente, ainda não foram tomadas e que o devem ser enquanto é tempo, para evitar situações como aquelas que vivemos dramaticamente em Novembro de 1983.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O anúncio de um próximo debate sobre a integração europeia e o facto de a Assembleia da República não ter realizado nenhum debate sobre esta matéria durante os sete anos de negociações oferece-nos, pelo menos, um ponto de reflexão, que tem importância para além das matérias que constarão da nossa ordem do dia.
Em Abril de 1974 estávamos na cauda da Europa e continuamos a estar nessa posição. Quer dizer que estão por definir os grandes programas necessários à modernização de Portugal, os grandes programas necessários à sua inserção na Europa e que não há, sequer, projectos imprescindíveis para a criação de riqueza e satisfação de necessidades básicas. Assim, sendo esta uma responsabilidade que recai sobre todos nós, creio que não podemos deixar de nos interrogar sobre algumas circunstâncias particularmente visíveis da nossa vida política e cívica, que merecem um pouco de atenção por todos nós.
Durante muito tempo - e queria focar como muitas vezes o sistema dos dois pesos e duas medidas funciona - se acusou, como uma das causas dos nossos males, o absentismo, as faltas ao trabalho, etc, etc. Pois bem, foi tornado público recentemente que durante meses um membro do Governo não comparece
no seu Gabinete, não despacha, sequer, os assuntos correntes, não assegura minimamente a gestão do seu departamento. E este fenómeno de absentismo ao mais alto nível, chamemos-lhe assim, passa perante a indiferença dos mais altos responsáveis pela condução política do País.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que uma situação deste tipo, arrastada ao longo do tempo, é qualquer coisa que nos faz reflectir.
E se um fenómeno destes não é desconhecido, então, com certeza a responsabilidade não é apenas de quem falta mas também de quem o deixa faltar e de quem continua, mesmo depois de esta situação ter sido publicitada, a fingir que a ignora e a não tomar sobre ela qualquer decisão.
Uma segunda questão, que também julgo ser merecedora da nossa reflexão, diz respeito - e na posição ontem tornada pública pelo Sr. Ministro da Justiça compreendem-se as dificuldades que o Governo parece sentir- à actividade exercida pela Sr.ª D. Branca. E o facto é, pelo menos, motivo de estranheza. E motivo de estranheza pelo seguinte: há cerca de 1 mês, ou menos, o Conselho de Ministros reuniu, tomou deliberações sobre a matéria e fez um aviso aos cidadãos. Bom, uma de duas: ou a actividade exercida por aquela senhora é lícita, legal, moral e até salutar, em termos de uma economia desanimada e que precisaria de fenómenos desta natureza, e então não parece que seja atribuição do Conselho de Ministros, através de comunicados, intervir na actividade de cidadãos que considera lícita, prejudicando essa actividade pelo alarmismo que causa - não creio que seja função de um Governo fazer terrorismo psicológico em relação a actividades económicas, que considera lícitas, de cidadãos -, ou então a actividade é ilícita, ilegal e irregular e alguma coisa falta na decisão do • Conselho de Ministros, na actuação do Governo e explica que a actividade seja protegida e prossiga sem que nada aconteça.
Em tempos, já há muitos anos, um grande poeta de quem fui muito amigo, refiro-me ao Ruy Bello, dizia «no meu país não acontece nada». Creio que mal vai um país quando estas coisas se passam e não acontece nada.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O assunto que me proponho abordar é suficientemente importante para não me sujeitar ao limite de tempo, que a Comissão Permanente nos impõe, dos 5 minutos. Quando estivermos em período normal de funcionamento da Assembleia, o CDS propõe-se tratar do assunto com mais acuidade e com mais profundidade. No entanto, e de tal modo preocupante a situação em que se encontra a política agrícola deste Governo que não podemos deixar de lançar aqui um grito de alerta.
Se estamos perante um Governo que está em greve, essa greve governamental é acentuada pela greve, e essa publicamente declarada, do Sr. Ministro da Agricultura.
É incompreensível a atitude de indisciplina que reina no Terreiro do Paço, no Ministério da Agricultura. Os Srs. Secretários de Estado recusam-se determinantemente a executar as ordens dadas pelo Sr. Mi-

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nistro e pelo Governo e a situação vem-se arrastando há meses sem que haja qualquer solução.
A consideração pessoal que tenho pelo Sr. Ministro levava-me a crer que ele há muito deveria ter tomado a atitude de se demitir. Efectivamente não o fez porque e mais uma peça desta máquina, toda ela demitida logo na altura em que tomou posse. A situação não seria tão preocupante se não fossem graves os reflexos que isto tem na vida económica portuguesa e na vida geral do País.
Não podemos, de maneira nenhuma, estar a sujeitar os agricultores, já de si uma camada social bastante deficitária, a esta situação de autêntico desregramento. Se formos abordar alguns aspectos sectoriais, nomeadamente o do vinho, veremos situações desse tipo: por exemplo, numa viagem que fiz há dias ao Norte do País foi-me dito, por pequenos agricultores do Minho, que foram obrigados a deitar à rua algumas pipas de vinho - e nem tão poucas como isso!... - porque não tiveram possibilidade de o comercializar nem tão-pouco foram contemplados com uma intervenção minimamente aceitável da parte da Junta Nacional do Vinho.
A situação dos vitivinicultores do Minho e de todo o Norte do País é deveras preocupante e não sei como vai decorrer a actual campanha.
Por outro lado, vêm notícias a toda a hora nos órgãos de comunicação social referindo que entram no País camiões de cereais contrabandeados. Pergunto: quando se põe termo a isto e quando será possível, de uma vez por todas, moralizar esta atitude?
Primeiro, foi o contrabando de gado, que foi, mais do que de carne, uma «importação» de doenças, pois deve-se a esse contrabando uma série de epidemias que foram semeadas no País. Agora, estamos perante a situação da «importação» de cereais, ou seja, cereais de contrabando.
Por outro lado, não há um mínimo de estruturas para fazer face à capacidade produtiva dos agricultores na área dos milhos, pois, não tendo secadores, são obrigados a entregar o milho em más condições, com níveis elevadíssimos de humidade, os quais, mais tarde ou mais cedo, se hão-de estragar, mas se não se estragam são sujeitos aos preços e è tutela pressionaria da EPAC.
É toda uma situação que se torna preocupante, tanto mais que se fala com alguma intensidade na entrada próxima de Portugal na CEE sem que se tenha preparado o mínimo de estruturas para que a adesão se faça, no domínio da agricultura.
No início do período revolucionário houve abandono de terras, o qual esteve na base de muitas das ocupações selvagens. No entanto, hoje vêem-se terras também abandonadas, que não estão a ser trabalhadas, portanto a lei que refere o nível mínimo de ocupação dos solos nunca foi posta em prática. Antes pelo contrário, o Ministério dessa área apenas se preocupou em introduzir algumas modificações de somenos importância à legislação já publicada, não passando de ligeiras alterações para pior, no nosso entender.
No último período de funcionamento da Assembleia discutiu-se a Lei de Segurança Interna. A maioria impôs-nos essa discussão para, no fim, os resultados práticos serem o verificar-se uma série de rebentamentos de bombas ainda agora em algumas zonas de agricultura, ou seja, em Montemor-o-Novo.
Pergunto: a Lei de Segurança Interna apenas visava tirar a preocupação de alguns dos seus dirigentes políticos terem os seus nomes nas paredes? Não era muito mais importante que se começassem a preocupar em pôr em prática esquemas de segurança que pudessem permitir a todos os portugueses trabalhar com o mínimo de segurança?
Eram só estas preocupações que eu gostaria de vos deixar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O que se está a passar em matéria de transporte escolar e de Acção Social Escolar traduz da parte do Governo não só a completa irresponsabilidade, incompetência e atabalhoamento, como revela, deve dizer-se sem hesitação, negligência grosseira, ou, ainda pior, clara má-fé. Aliás, muitos autarcas de diversos pontos do País o têm denunciado. Por exemplo, na Câmara de Cascais foi aprovada por unanimidade uma proposta que refere nomeadamente: «A posição da Câmara não pode, à partida, deixar de ser fortemente crítica em relação ao diploma e às situações que dele resultam [...] aqui se revela a incapacidade dos responsáveis em legislar e definir atempadamente o que já deveria ter sido feito há largos meses [...] a situação, se não fosse de certo modo trágica, seria motivo de riso. isto sem deixar de se salientar a ligeireza e incompetência com que se procede a esta descentralização, só para se aparentar que existe descentralização, transferindo-se os ónus e os problemas, que podem ser insolúveis, para os municípios, sem se lhes dar nem tempo nem dinheiro para cumprir o que lhes é legislado sem a sua intervenção. Mais uma vez, em lugar de transferência de competências, transferência de carências.» Isto é o que diz a Câmara de Cascais.
De facto, a escassos dias da abertura do ano escolar, o Governo quer à força concretizar a transferência para as autarquias locais da competência relativa àquelas áreas. O Decreto-Lei n.º 299/84, relativo ao transporte escolar, foi publicado apenas em 5 de Setembro, a menos de um mês do início do novo ano escolar.
O decreto-lei relativo à Acção Social Escolar ainda nem sequer está publicado e foi enviada às autarquias fotocópia do respectivo projecto somente há pouco mais de 8 dias; uma das portarias necessárias para regulamentar o decreto-lei do transporte escolar ainda não foi publicada e a outra apenas hoje apareceu publicada no Diário da Repúblico.
Que dizer disto, Srs. Deputados? É ou não justa a acusação ao Governo de completa irresponsabilidade com que está a tratar desta matéria?
Traduz ou não completo desrespeito pelos interesses e direitos de milhares e milhares de alunos e de pais?
Mas, para além de tudo isso, o que fica também claro é que, desta forma, o Governo dá tratos de polé à autonomia do poder local e ao respeito que lhe deviam merecer os órgãos autárquicos e os seus eleitos.
O escândalo resume-se em duas palavras. Primeiro, o Governo está a transferir competências sabendo que não tem cobertura legal nem orçamental para a necessária transferência de verbas. Segundo, o Governo

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transfere competências sabendo à partida que as verbas que projecta transferir são completamente insuficientes para os fins em vista.
E nos fins em vista não está pouco. De uma penada, o Governo passa para as autarquias a competência para o transporte dos alunos do ensino primário, preparatório TV, preparatório directo e secundário, oficial, particular e cooperativo. E passa ainda para as autarquias as competências relativas a refeitórios, alojamento e auxílios económicos nos ensinos pré-escolar, primário e preparatório TV, oficial, particular e cooperativo.
Na sua ânsia de transferir, o Governo até transfere competências que não tinha (como é o caso das relativas ao ensino particular e cooperativo!).
E o que está em jogo? Ê muito simples: está em jogo possibilitar a milhares e milhares de alunos as condições mínimas para frequência da escola. E não só: para o sucesso escolar, para razoáveis condições de vida.
Tudo isto num país em que, por força de uma política económica desastrosa, os Portugueses vêem diminuir constantemente o seu poder de compra. Num país em que, por isso mesmo, se exige um esforço suplementar dos meios públicos para atender às situações vividas pelas crianças.
Perante tudo isto, o que se pode dizer é que o Governo não está a transferir competências - está a alijar responsabilidades.
Têm as autarquias locais interesse real em aumentar a sua área de competência? É evidente que têm. Mas o Governo o que oferece às autarquias não é uma transferência de facto de competências, é, antes, um presente envenenado.
Algumas autarquias podem não se ter dado ainda conta do que se está a passar. É típico da actuação do MAI e da sua política de fancaria tentar embrulhar confusamente as malfeitorias que vão cozinhando! No entanto, por todos os lados do Norte ao Sul do País, as autarquias vão tomando posição contra esta situação.
Mas o facto é este: as verbas para financiar esta operação não têm cobertura no Orçamento. O Governo começou por querer obrigar as autarquias a contraírem empréstimos junto da Caixa Geral de Depósitos. Está escrita e é pública a circular em que disso informava as autarquias! A linha de crédito afinal não existe. No decreto-lei fala-se de transferência de verbas. Mas quem recorda a discussão do Orçamento, aqui na Assembleia, sabe perfeitamente que essa verba não está incluída no Fundo de Equilíbrio Financeiro e não existe em mais parte nenhuma! Se não existe, o Governo não a pode criar. Por uma razão simples: a competência para mexer no .Orçamento está reservada a esta Assembleia! Assim, a 3 dias do início do ano escolar, as câmaras continuam sem verbas para fazer face às competências transferidas e o Governo nem sequer se preocupou em atempadamente mandar à Assembleia da República o Orçamento Suplementar, que só depois de discutido e aprovado na Assembleia da República permite fazer as transferências de verbas anunciadas pelo Governo. É, pois, inadmissível que o Governo tenha atrasado o envio e apresentação do Orçamento Suplementar e que a coligação governamental impeça que no período suplementar este venha a ser discutido.
Ao mesmo tempo, o Governo vai anunciando os montantes das verbas que projecta transferir, verbas essas que na maior parte dos casos são manifestamente insuficientes. Um exemplo: para o total do populoso concelho de Setúbal a verba é de pouco mais de 7000 contos! Isto para transportes, para refeitórios, para alojamentos, para auxílios económicos!
Há concelhos que vão receber alunos doutros concelhos e não recebem nada para o IASE. Por exemplo: Sobral de Monte Agraço recebe apenas 16 contos para refeitórios e toda a Acção Social Escolar quando recebe alunos de Alenquer, Torres Vedras e Mafra. Como é possível? Como é possível, particularmente quando a evolução do custo de transporte é excessivamente gravosa, situando-se em +80% entre 1983/1984 e 1982/1983 e prevendo-se que seja de +65% entre 1984/1985 e 1983/1984?
O Governo não se esquece de dizer que as refeições têm de ser de qualidade. Mas onde estão os meios para assegurar essa qualidade? E quem vai pagar, por exemplo, os seguros dos transportes escolares, não previstos no cálculo das verbas a transferir?
Duas conclusões são assim evidentes: a operação do Governo feita de má-fé visa transferir para as autarquias o odioso da sua política feita à medida das exigências do FMI; a forma como está a ser executada pelo Governo esta operação faz correr o risco de situações de ruptura, de consequências gravíssimas para a nossa juventude.
É, esta situação que exponho à Comissão Permanente da Assembleia da República. Ê uma situação perigosíssima, a merecer uma intervenção decidida e urgente da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas algumas notas sobre intervenções aqui realizadas no período de antes da ordem do dia, em particular sobre as intervenções do Sr. Deputado Magalhães Mota, da Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo e do Sr. Deputado Soares Cruz.
O Sr. Deputado Magalhães Mota levantou uma questão que, sem dúvida nenhuma, se reveste de grande delicadeza e de grande importância, que é o conhecido «caso D. Branca» e estranhou que, até à data, não tivessem sido delineadas e tomadas medidas que pusessem cobro a uma situação que a todos parece irregular e imoral.
Também estranhamos esta situação e também consideramos que, eticamente, deixa muito a desejar a atitude de milhares de pessoas que colocam o seu dinheiro a 10% de juro ao mês, como se pudesse provir de uma actividade regular e normal numa economia sadia.
Também não podemos deixar de pôr algumas reticências à atitude da comunicação social que parece ter transformado em espectáculo perfeitamente neutro esta questão, quando se traia de um mau sintoma da sociedade portuguesa e se trata de uma atitude desprezível de muita gente que pretende enriquecer por meios fáceis.
Concordamos que é imprescindível que o Governo tome uma atitude definitiva nesta matéria e se passe das hesitações e das meias-tintas para uma acção que

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seja para todos os Portugueses. É que também por aqui se moraliza a vida pública e se reforça a autoridade do Estado.
Estamos, ainda, de acordo que o Ministério da Agricultura tem sofrido de uma crise endémica, mas quero aqui levantar algumas perplexidades face à atitude das oposições.
A oposição chega sempre tarde, parecendo como a coruja de Minerva que só levanta ao entardecer. É que essas questões deviam ser levantadas antes de os responsável governamentais terem já, de alguma maneira, anunciado que se ia proceder a uma remodelação nesse sector, atendendo a que o sector da agricultura portuguesa é um sector-chave para a integração europeia e modela o futuro do nosso país e o desenvolvimento da nossa economia. É certo que essas críticas são aceitáveis, mas era mais válido que fossem feitas no momento oportuno e não desta maneira, já fora do seu tempo, visto que as mudanças na equipa do Ministério da Agricultura já toda a gente percebeu que se vão realizar muito em breve.
Quanto ao problema dos transportes escolares, a Sr." Deputada lida Figueiredo fez algumas críticas relativamente às dificuldades práticas de executar esta descentralização. Mas podia ter tido uma palavra de apreço e louvor por uma decisão de carácter descentralizador. Não se pode querer a descentralização e com as dificuldades práticas que ela envolve pôr-se em causa, de alguma maneira, o princípio e o acto inicial de carácter descentralizados.
Penso que o Governo deu um bom passo na descentralização do Ministério da Educação - um passo parcial, prudente. Como todos se lembram pretendeu-se descentralizar de uma forma mais ampla e genérica, tendo nessa altura o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e do PSD, se não estou em erro, posto algumas dúvidas a uma descentralização demasiado apressada, mas todos aprovaram a descentralização do transporte escolar, por se considerar que isso permite racionalizar melhor a rede de transportes escolares, permite economia de meios e de esforços e, mais do que isso, pode permitir, conjuntamente com um melhor planeamento da rede escolar, que haja pequenos postos escolares que venham até a ser extintos porque só têm 3, 4 ou 5 alunos e as autoridades municipais podem ir buscar as crianças e colocá-las numa escola onde haja uma turma adequada num lugar mais adequado, quer sob o ponto de vista urbano, quer sob o ponto de vista de meio ambiente.
É claro que essas dificuldades práticas são evidentes, mas não há dúvida nenhuma de que a atitude de descentralizar a administração dos transportes escolares foi correcta. |á foram publicados alguns instrumentos legais que podem ter defeitos mas que, de qualquer forma, foram publicados antes do ano escolar ter início e também já foi feito algum reforço de verbas. Não se pode assim dizer que o Governo esteja a defraudar os municípios ou que esteja a ter uma atitude imprudente e desordenada. Trata-se de dificuldades práticas que não podiam deixar de existir, mas no próximo ano, dada a capacidade dos nossos municípios, dada a proximidade das autoridades municipais das escolas, creio que teremos grandes progressos a registar e estou convencido de que, nessa altura, teremos alguns louvores da Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, mesmo que não goste do Ministro.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Soares Cruz, Nogueira de Brito e Ilda Figueiredo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Uso da palavra para colocar algumas questões à intervenção do Sr. Deputado Carlos Lage, que não me parece poderem deixar de ser colocadas.

O Sr. Deputado Carlos Lage - regista-se a confissão no que ela tem de útil - classifica a atitude do Governo, no que respeita ao «caso D. Branca», como caracterizada por hesitações, meias-tintas (se não estou em erro), o que é de estranhar por parte da maioria apoiante do Governo, tanto mais quanto é certo que este desencadeou, com grande publicidade, esta «operação D. Branca» já lá vão 3 ou 4 meses. Ao fim deste tempo hesita, actua com meias-tintas, possibilita à D. Branca afirmar-se - quase que o poderíamos dizer - como uma verdadeira instituição de crédito nacional. «D. Branca voltou a pagar» - é o que dizem os jornais - e a operação desencadeada pelo Governo parece, pois, estar a redundar no êxito de D. Branca. Tudo isso é lamentável e, naturalmente, era isso que lamentava o nosso colega Magalhães Mota quando ao assunto se referia no início desta reunião.
Mas, Sr. Deputado Carlos Lage, não queria deixar de lamentar um outro aspecto da sua intervenção. Quando um fenómeno - como é o fenómeno da D. Branca - abrange, segundo tudo leva a crer, pelas notícias e fotografias pelos jornais, milhares de pessoas deste país, é lamentável que os membros desta Câmara entendam que o que cabe neste caso é criticar aqueles que, ingenuamente, confiaram nessa senhora e nos que com ela porventura colaboram.
Suponho, Sr. Deputado Carlos Lage, que seria preferível que V. Ex.ª se debruçasse sobre o que tem sido a actuação do Governo nesta matéria, isto é, sobre quais são as possibilidades de correcto investimento e de correcta aplicação financeira que a actuação do Governo no domínio económico-financeiro tem colocado à disposição dos Portugueses. Ê lamentável, a todos os títulos, que os Portugueses tenham, pela ausência de activos financeiros em que aplicar as suas economias, de cair nesta espécie de logro fácil que lhes é oferecido pela D. Branca. E isto que nós lemos de lamentar, e o voto que temos de aqui fazer é que a actuação do Governo e da Administração consiga ultrapassar casos destes e que não se fique por planos utópicos de reestruturação da D. Branca e por planos sempre repetidos e nunca executados de dinamização do mercado de capitais que não chegam a nenhuma situação positiva.
Sr. Deputado Carlos Lage, no que respeita ao Ministério da Agricultura, V. Ex.ª diz que as oposições vêm tarde, como de costume. E porquê? Porque, finalmente, o Governo anunciou a remodelação nesse Ministério. Mas, Sr. Deputado, quantas remodelações nos foram já anunciadas por este Governo em relação a este Ministério?
Quantos avisos prévios terão sido dados ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado? Há quanto tempo é que as situações roçam o escandaloso, com directores-gerais e Secretários de Estado que estão proibidos de entrar nos gabinetes dos Ministros, com directores-gerais que não podem despachar com os

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Secretários de Estado, situações que se somam e se multiplicam?
Para quando a remodelação, Sr. Deputado Carlos Lage? Será agora, finalmente? V. Ex.ª terá, com certeza, informações que nós não temos, por isso suponho que intervenções que aqui foram feitas não são atrasadas, são sempre oportunas. Veremos quando vem a remodelação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Deputado Carlos Lage, V. Ex.ª falou na falta de oportunidade da oposição a criticar. Depois de ter admitido que o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação de há muito está em crise, disse que éramos pouco oportunos em fazer a crítica, porque só falávamos depois de o Governo ter anunciado a remodelação nesta área.
Ora, perguntava a V. Ex.ª por onde é que tem andado? Não tem assistido 'às críticas que em tempo foram feitas no Plenário sobre esta política? Não assistiu à resposta que o Sr. Ministro deu, quando interpelado em Plenário, que tinha cento e tal diplomas em «pacote» para publicação imediata? Onde param esses diplomas? Onde pára esse dito pacote? Há quanto tempo existe uma crise denunciada e declarada entre o Sr. Ministro da Agricultura e o Sr. Secretário de Estado das Florestas, membro do seu partido?
Dá-me ideia que isso aconteceu logo no acto de posse. Houve desaguisados Jogo na posse, e já depois disso houve remodelação ministerial que passou ao largo do Ministério da Agricultura.
Finalizava perguntando-lhe se a remodelação governamental envolve, também, a pessoa do Sr. Vice-Primeiro-Ministro, porque me parece que pela pessoa dele passa algum desentendimento com o Ministério da Agricultura. Tanto quanto sei, surgiu em Conselho de Ministros um projecto de alteração da Lei de Bases da Reforma Agrária que nada tem a ver com aquele que o Ministro da Agricultura em tempo apresentou em Conselho de Ministros. Está, também, a pessoa desse alto governante envolvida na remodelação?

O Sr. Presidente: - Finalmente, tem a palavra a Sr.ª Deputada liga Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Carlos Lage, registe-se uma resposta que deu em relação às dificuldades práticas evidentes que se estão a registar nas câmaras municipais com o problema dos transportes escolares. Elas são demasiado evidentes para que as pessoas, nomeadamente os senhores deputados, as não possam ver, mas isso também revela a forma atabalhoada e irresponsável como o Governo está a fazer esta transferência de competências.
Ê que tendo falado nisso já há largos meses, aquando da aprovação do Orçamento do Estado para este ano, só agora, a poucos dias antes do início do ano escolar, é que, de facto, se está a fazer essa transferência, havendo ainda diplomas por publicar e sem haver transferência de verbas efectiva, porque, como sabe, não estão orçamentadas, e o Orçamento Suplementar, que eu saiba, ainda não deu entrada nesta Assembleia da República, e, quando der, só depois do agendamento,
da discussão e da aprovação é que o Governo poderá fazer essa transferência. Até lá quem é que suporta as despesas, mesmo com verbas insuficientes para os transportes escolares e para a acção social escolar? Quem é que vai suportar toda esta situação? As câmaras municipais, os pais dos alunos e as famílias?
É, enfim, toda uma situação que prejudica o início do ano escolar e que dificulta a vida das autarquias.
Queria ainda dizer-lhe que o que está em causa não é a descentralização de competências, mas sim o seu não acompanhamento por descentralização de meios. O Governo quer descentralizar competências, mas não quer descentralizar meios.
Esse é que é o problema, essa é que é a questão.
Por outro lado, quanto aos instrumentos legais que já estariam publicados, acabei de referir que não estão, pois hoje mesmo o Diário da República publica uma portaria em relação à questão dos transportes escolares, mas ainda faltam publicar outros instrumentos legais e, entretanto, está a começar o ano escolar.
Quanto a uma outra afirmação relativamente ao fenómeno D. Branca, gostaria de lhe perguntar se as afirmações que o Sr. Deputado fez se referem a uma crítica ou, pelo menos, a um desacordo em relação a afirmações recentes do Sr. Ministro Rui Machete.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não tem nada a ver uma coisa com outra!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ultrapassámos já o tempo regimental para o período de antes da ordem do dia em cerca de 3 minutos.
No entanto, eu propunha a VV. Ex.ªs que o Sr. Deputado Carlos Lage pudesse responder. Ainda estão inscritos os Srs. Deputados Carlos Brito e José Vitorino, que ficariam, se os Srs. Deputados não entenderem de outra forma, prejudicados na sua inscrição.
Portanto, ou se prolonga por consenso unânime o período de antes da ordem do dia - o que me parece não ser o caso - ou então deixávamos o Sr. Deputado Carlos Lage responder, se assim o entendesse, e depois encerrávamos este período.
Como não há oposição, é o que vamos fazer.
Faz favor, Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Vou tentar não esgotar os nove minutos a que teria direito, na medida em que, como o Sr. Presidente disse, o tempo regimental do período de antes da ordem do dia já terminou.
Relativamente às considerações que o Sr. Deputado Nogueira de Brito fez sobre as opiniões que emiti em relação à questão da D. Branca, pouco tenho a dizer, o que disse está dito. Há, no entanto, uma afirmação do Sr. Deputado Nogueira de Brito que não posso deixar passar sem comentários e que é a de, de uma maneira fácil, rotular como ingénuos os milhares de pessoas que colocaram - alguns colocaram verbas avultadas, como tivemos oportunidade de saber através da televisão e de outros órgãos da comunicação social - dinheiro nessa instituição, como o Sr. Deputado Nogueira de Brito lhe chamou.
Não há aí nenhuma ingenuidade, há, isso sim, um problema mais profundo da vida colectiva portuguesa, que, naturalmente, não tem a ver com este Governo, tem a ver com todos nós, e que é um conjunto de valores e de normas de ética a que todos deviam obede-

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cer, mas que não é vivido por todos. Ou seja, há um certo parasitismo em certas camadas da população que as leva a considerar como legítimo tudo aquilo que sirva para acumular dinheiro. Na verdade, ninguém com um mínimo de valores morais pode admitir que receber 10% ao mês de juro é uma actividade razoável como outra qualquer e que se as coisas falham a culpa não é dele próprio, mas é apenas ou de quem empresta, ou do próprio Governo. Acho até lamentável que o Sr. Deputado Nogueira de Brito falasse de uma maneira que dá a impressão que as pessoas são vítimas. Mas serão vítimas de quem? Talvez da D. Branca, talvez do Governo ...
A mim, o que me preocupou de alguma forma, numa certa interpretação que a comunicação social tem dado a este caso, é que dá a impressão que nem a dita senhora nem os emprestadores, passe a expressão, são culpados. Parece que os culpados somos todos nós, é a sociedade, é o Governo, a culpa é sempre dos outros. Ora, como sei que o Sr. Deputado professa uma moral individualista, ou seja, o responsável é sempre cada um por si mesmo, custa-me a crer que faça esta transferência.
Relativamente ao problema da remodelação ou da mudança no Ministério da Agricultura, apenas fiz uma afirmação: que a oposição anda com falta de ritmo. Critica quando o Governo já fez ou já vai fazer. Este é um caso, assim como o do debate sobre a integração na CEE, pois foi o próprio Governo que propôs esse debate e a oposição teve oportunidade de fazer interpelações sobre esta questão. Se eu estivesse no lugar da oposição teria feito uma interpelação ao Governo, na sessão legislativa anterior, sobre a problemática da integração na CEE. Estive até algumas vezes para perguntar, no Plenário da Assembleia da República, à oposição por que não fazia essa interpelação, já que era um serviço que prestava, inclusive, ao País. Mas a oposição não o fez e perdeu-se em coisas miúdas, algumas que ela crítica na própria actividade da maioria.
E quando o Governo faz essa proposta a oposição vem dizer que «também o mérito é nosso» - para isso está, aliás, aqui uma proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, que procura chamar o mérito para a oposição de se vir a travar este debate.
Quanto às questões relacionadas com quem é que remodela e se não vai ser remodelado também o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, esse é um tipo de humor que nem chega a ser, digamos, um humor arguto. Isto porque, como é visível, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro é um dos agentes da remodelação, porque, sendo presidente do PSD, é ele que determina a remodelação.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Vamos lá ver por quanto tempo é ele o remodelador.

O Orador: - Por conseguinte, ele condiciona, naturalmente em diálogo com o Partido Socialista, sobre quem sai ou quem entra.
De maneira que essa pergunta não passa de uma pergunta mal-intencionada.
Quanto aos problemas dos transportes escolares, a Sr." Deputada lida Figueiredo insistiu nas dificuldades práticas, que também reconheci. Mas quero dizer-lhe que se eu quisesse criticar o Ministério da Educação não seria por este lado que o criticaria. Mas o Partido Comunista adopta uma atitude globalista e
quando discorda de uma política tem de a criticar em todos os aspectos e pormenores, de uma forma obssessiva. Ora, isso é uma má crítica, porque a crítica é tanto mais eficaz, na minha opinião, quanto mais se distingue entre o essencial e o secundário, se critica o essencial e se deixa o secundário e quando se centra a crítica sobre os aspectos essenciais.
Neste caso vertente, a atitude de descentralizar, por parte do Governo, é correcta.
A oposição, em casos como este, numa atitude nacional, devia cooperar com o Governo para ajudar a vencer as dificuldades destes aspectos práticos, atendendo até que nesta matéria a oposição também tem responsabilidade, pois dirige muitos municípios - é o caso do Partido Comunista, que para além de dirigir muitos municípios também coopera na actividade administrativa de muitos outros em que, não tendo a presidência, tem um papel significativo.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar de seguida ao período da ordem do dia.
Vai ser lido um relatório da Subcomissão da Comissão Permanente.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Subcomissão da Comissão Permanente

Em reunião realizada no dia 27 de Setembro de 1984, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (círculo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva (esta substituição foi pedida por 1 dia, 25 de Setembro corrente);
Agostinho Correia Branquinho (círculo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva (esta substituição é pedida por um período não superior a 6 meses, a partir do próximo dia 2 de Outubro, inclusive).

Analisados os documentos pertinentes de que a Subcomissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelo aludido partido nos concernentes círculos eleitorais.
Foram, observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Subcomissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Presidente: - Passamos ao primeiro ponto da ordem do dia: projecto de deliberação apresentado pelo PCP com vista à adopção de medidas tendentes a garantir a abertura do novo ano escolar.
Este projecto de deliberação foi objecto de um projecto de substituição, que foi hoje distribuído.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais queria anunciar que substituímos o texto apresentado na anterior reunião por um novo texto, já que esta é, previsivelmente, a última reunião da Comissão Permanente. Ora, como propúnhamos que se abrisse um debate com o Sr. Ministro da Educação sobre a abertura do ano escolar e que a Comissão Permanente da Assembleia da República dedicasse a isso uma sessão, não teria sentido manter esse texto.
Nesse sentido, o que propomos e que esta Comissão abra hoje um debate sobre esta questão da abertura do ano escolar e possa tomar conhecimento sobre alguns dos casos mais graves que se verificam e tomar algumas medidas no sentido de responder a esses casos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o que se passa e que justifica esta nossa proposta e que o ano lectivo vai teoricamente abrir entre os próximos dias 1 e 8 de Outubro, mas a situação que se está a verificar em muitas zonas do País é uma situação de rotura completa do sistema de ensino. Isto é, o ano escolar vai teoricamente abrir, porque na prática verificam-se situações gravíssimas. Aliás, o Sr. Ministro da Educação reconhece isso em carta que enviou ao nosso grupo parlamentar e que fez chegar à imprensa e em que procura, no fundo, responder a vários dos pontos por nós colocados no projecto de deliberação. É o próprio Sr. Ministro que vem reconhecer também que há situações de rotura: é que as escolas vão abrir e milhares de estudantes estão por colocar.
As zonas onde se estão a verificar as situações mais graves são na Grande Lisboa, Setúbal e em algumas outras zonas do País, onde o problema é diferente. No resto do País a questão principal que se coloca é a de que os professores não estão ainda totalmente colocados.
Na zona da Grande Lisboa, Setúbal e ainda em algumas regiões do Porto há milhares de estudantes que ainda não sabem em que estabelecimento de ensino vão parar. É o caso, por exemplo, de Almada e do Seixal, onde há cerca de 3000 alunos. Convém dizer que já depois de termos apresentado aqui este número, cerca de 1500 alunos que residem na zona de Almada foram deslocados pelo Ministério para o Monte da Caparica. Ora, esses estudantes, ao serem colocados numa escola secundária do Monte da Caparica, para a poderem frequentar pagam por mês 4900$ em transportes escolares. Ou seja, para que o estudante possa ir para o estabelecimento de ensino onde o Ministério lhe arranjou lugar, cada pai tem de pagar 4900$ por mês. É fácil de depreender o que é que tal facto significa para a imensa maioria das famílias portuguesas! Mas, como já referi, sobram ainda cerca de 1000 alunos na zona de Almada e do Seixal.
Em Oeiras sobram 500 alunos, em Paço de Arcos 1200, em Carnaxide 1300, em Odivelas 700, na zona de Benfica 700, em Bobadela 900, em Sacavém 900 e na Portela 200.
Acerca destes 1500 estudantes que ainda estão por colocar da zona do Seixal, convém explicar como é que o Ministério fez. Colocou parte deles no Monte da Caparica e outra parte foi colocada numa escola do ensino primário, cujos alunos foram colocados num andar de um prédio de habitação. Portanto, colocou cerca de 800 estudantes do ensino secundário num estabelecimento do ensino primário. Ainda poderíamos dar muitos outros exemplos do que se está a passar, e só não o fazemos por falta de tempo.
O Ministério é verdadeiramente incapaz de solucionar este problema, de o equacionar a tempo. A única coisa que fez foi perguntar há alguns meses às escolas - e perguntar de uma forma que importa aqui denunciar - quantos metros quadrados tinham de área tapada (não quantas salas de aula é que as escolas dispunham), para daí fazer o cálculo de quantos estudantes lá iria meter.
Depois disto e em função do metro quadrado, deu indicações muito precisas para as escolas saberem como é que deviam meter esses alunos nesses chamados estabelecimentos de ensino ou armazéns de estudantes. Ora, isto tem graves consequências pedagógicas! Então, as instruções foram muito claras: aumentar as turmas para 34 alunos, usar todas as escolas, inclusive laboratórios e ginásios, como salas de aula regulares.
Devo dizer que tivemos conhecimento de que num liceu do Porto a situação e a seguinte: o número de estudantes e de turmas foi previsto fazendo o cálculo de haver sempre cinco professores de baixa. Isto é, a medida do ano passado apontava no sentido de que normalmente em cada dia faltavam 5 professores naquele estabelecimento de ensino do Porto. Sendo assim, as turmas são calculadas contando com a falta daqueles 5 professores e, portanto, com 5 salas vazias, onde se poderão dar outras aulas. Se, por acaso, por uma razão de saúde pública, os professores forem todos às aulas, há 5 turmas que não têm aulas, porque não há salas a contar para eles, na medida em que estão programadas de acordo com a baixa de 5 professores.
O Ministério preconizou ainda aumentar o tempo de funcionamento das escolas para 60 horas por semana, o que significa que vão funcionar sábado da parte da tarde.
Preconizou ainda outro aspecto, que é muito grave e para o qual chamo a atenção dos Srs. Deputados: foi a abertura do ensino nocturno para crianças a partir dos 14 anos. Até agora o ensino nocturno só era aberto aos jovens a partir dos 16 anos. Porém, este ano vai funcionar o ensino nocturno a partir dos 14 anos. E há anos lectivos inteiros, como é o caso nas escolas de Lisboa, em que o 9.º ano de escolaridade passa para o ensino nocturno, o que significa que aquelas crianças vão para as aulas precisamente na altura em que os pais chegam a casa e estão em casa quando os pais estão a trabalhar.
Tais factos são graves sobre todos os aspectos, não só pedagógicos - que sucesso escolar vão ter aqueles jovens? -, mas também em termos de sociedade e de família. Que juventude vai sair dali!
Além disso, aponta uma outra consequência, que os professores estão a denunciar: é que professores efectivos que têm direito a escolher o seu horário estão a ser obrigados a passar para aulas nocturnas. Tal facto

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está a ser usado como um método frequente e normal nos estabelecimentos das escolas de Lisboa.
O Ministério também está a recorrer à instalação do ensino secundário em escolas do ensino primário e sobretudo do preparatório, está a utilizar estabelecimentos de ensino particular para colocar estudantes do ensino oficial, pagando a diferença ao Ministério em concessão do paralelismo pedagógico. Importa salientar tal facto porque ele significa que, em vez de o Ministério preconizar a construção de novos edifício escolares públicos, está a utilizar estabelecimentos de ensino privado que já existem com o devido pagamento. Mas até o está a fazer abusivamente e vou-o denunciar através de 2 exemplares: um deles é na região de Lisboa, onde os estudantes são deslocados para um colégio particular, ao qual não têm acesso por transportes público, em vez de estarem na escola e nos pavilhões que o Ministério, em conjunto com a Junta de freguesia, se tinha comprometido criar.
Um outro caso passa-se no concelho de Caminha, em Viana do Castelo, onde o Ministério prometeu há muito tempo - aliás, o Sr. Ministro foi lá jantar com a população, com os pais, com a junta de freguesia, com toda a gente e até deu entrevistas para a imprensa regional - o funcionamento do ensino secundário em Viana do Castelo. Porém, nada disso se passou, pois apenas foram instaladas algumas turmas num colégio particular existente na região, que não tem condições para ministrar o ensino secundário, até porque não tem quadro para isso. O Ministério nem sequer abriu o quadro aos professores para poderem ministrar o ensino secundário.
A última medida que o Ministério preconiza é a construção de pavilhões pré-fabricados. Porém, esta medida consta em último lugar na política do Ministério.
Convém ainda dizer que o ensino público, por onde passa a larga maioria das crianças portuguesas, está em condições verdadeiramente degradadas. Aquilo não são aulas, não são estabelecimentos de ensino!
Em Portugal já não se constrói um ginásio desde 1980 e aqueles que existem são ocupados com aulas lectivas normais. O Ministério também acabou com a ocupação de tempos livres para aproveitamento dessas instalações para aulas normais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta situação não pode continuar! A Assembleia da República não pode ficar indiferente ao que isto significa para o futuro do nosso país e para os Jovens e não pode consentir que, em nome do atamancar de milhares de crianças que têm direito a ter uma escola e um ensino em condições, venham, pelo contrário, encontrar um ano lectivo ainda pior do que o anterior.
Em termos de condições pedagógicas ir-se-á verificar que este ano lectivo vai ser pior do que o anterior. O insucesso escolar vai aumentar, a situação já degradada que se vinha verificando em anos anteriores vai agravar-se.
A única coisa que vemos ser feita por parte do Ministério são discursos por todo o País. Agora, na véspera da abertura do ano lectivo, o Sr. Ministro tem andado a reunir com os governos civis para discutir como é que deve funcionar o ano lectivo em cada um dos distritos.
Como dizia ontem o professor que nos procurou, se a política educativa deste País fosse feita com os discursos do Ministro, há muito que estava solucionada a abertura do ano escolar. Só que não é! Não é nem com o discurso, nem com a propaganda que o Sr. Ministro anda fazendo por todo o País, mas sim com medidas concretas e com soluções a tempo e horas.
Estando a Assembleia da República para abrir os seus trabalhos e tendo agendado como um dos primeiros debates o Orçamento do Estado, é tempo de exigirmos do Governo que agora e já tome medidas para construir mais escolas para que esta situação não se continue a verificar e até a agravar-se.
Quando chegamos a Outubro todos os anos os vários ministros anunciam o plano de emergência de construções escolares. O Ministro Seabra fez o mesmo
- aliás, já é a segunda vez que o faz- e anunciou um protocolo assinado entre ele e o Ministério das Finanças e do Plano no valor de 2 200 000 contos para construir escolas. Porém, o que é certo é que durante este ano lectivo as escolas, não só não foram construídas, como temos que tomar medidas sérias
- e isso está claramente nas nossas competências - para criar novos estabelecimentos de ensino que evitem e impeçam o agravamento desta situação.
A minha camarada lida Figueiredo já colocou a questão do transporte escolar, mas vale a pena dizer que é particularmente grave por parte do Governo que seja exactamente na véspera da abertura do ano lectivo que se venha transferir para as autarquias não só o transporte escolar como toda a Acção Social Escolar.
Neste momento, o que se está a passar é que a maior parte das cantinas não vão abrir porque o Ministério não tomou as medidas necessárias e ninguém está a ver as câmaras municipais terem capacidades, meios e pessoal para, rapidamente, irem abrir cantinas e fazer refeições devidamente confeccionadas, tal como diz o decreto-lei do Governo, ao contrário do que fazia a Acção Social Escolar quando tinha a responsabilidade das cantinas, onde sabemos que deixou degradar a alimentação. Porém, agora diz para as câmaras «alimentação devidamente feita», nem que estas não tenham capacidade para solucionar problemas sobre o preço do livro escolar, das bolsas de estudo ou de equipamento de chuva. Este último é outro dos pontos que está com grande ironia no decreto-lei, mas que vale a pena salientar aqui, porque significa que na véspera da abertura do ano lectivo o Governo vem descartar «água do seu capote» e responsabilizar as autarquias por aquilo que elas nem sequer sabiam que lhes iria parar às mãos e de que iriam ter a responsabilidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É pena não termos mais tempo, porque o panorama em que o próximo ano lectivo vai abrir é alarmante - e não tive tempo de me referir nem ao ensino superior nem ao ensino pré-primário.
Estando o Governo a empenhar o sistema escolar está a empenhar o futuro do País. Não podemos admitir que haja milhares e milhares de crianças que vão ter escola nas condições que acabo de referir e que pecam muito por defeito.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

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O Sr. Agostinho Domingues (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento não me ter sido possível ouvir com agrado a Sr.ª Deputada Zita Seabra. Digo isto com algumas mágoas, porquanto noutras matérias, como é a questão do planeamento familiar, muito tenho apreciado as suas intervenções, como é o caso de um belíssimo artigo de opinião que a Sr." Deputada fez no jornal O Semanário.
Não deixa de ser curioso que, sendo a Sr. Deputada professora, como creio...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não sou professora. Sr. Deputado!

O Orador: - Peço imensa desculpa, mas estava convencido que o era, Sr. Deputada.
Como estava a dizer, não deixa de ser curioso que a Sr.ª Deputada não se pronuncie com a mesma atitude construtiva em matérias relativas à educação, tal como o faz em matérias relativas ao planeamento familiar.
Porém, passando à questão que agora nos ocupa, gostaria de acentuar que a posição do PCP me parece enfermar de uma política e de uma atitude oposicionista que não contribui seriamente para a solução de problemas tão graves, como sejam os da educação.
Na verdade, no que diz respeito ao ensino, o PCP continua a misturar questões estruturais com questões conjunturais. E é curioso o facto de ele não hesitar mesmo em apontar até questões como a do insucesso escolar, que é uma realidade triste no nosso país, mas que sabemos ser de dificílima solução, porque passa pela adopção de medidas estruturais. Enquanto continuarmos a fazer oposição por oposição, enquanto se confundirem questões de fundo que exigem soluções aprofundadas e alargadas no tempo com questões pontuais, que podem ser solúveis a curto prazo, naturalmente que não contribuiremos seriamente para a solução dos problemas.
Como questão número um - e é como questão número um porque até voltou a ela no período de antes da ordem do dia -, o PCP trouxe a questão dos transportes escolares e a da transferência de competências nessa matéria para as autarquias. O meu camarada Carlos Lage já se referiu suficientemente a isso, mas não posso deixar de acentuar que o PCP perde autoridade nesta matéria, sobretudo pela indefinição que mostrou aquando do debate desta questão no Parlamento.
Sem o saber, o PCP disse-nos concretamente o que é que pensa de descentralização de competências. E parece que não será ousado afirmar que quanto a descentralização o PCP tem a mesma visão que tem sobre as liberdades, ou seja, que a descentralização deve ser a mais ampla, como a liberdade também é a mais ampla, isto é, é nada!
Numa questão que suscitou polémica e que foi pública, até no seio dos partidos da coligação, o PCP remeteu-se a uma atitude demagógica. De facto, esta questão é difícil, mas ficaria muito bem ao PCP, e, sobretudo, seria um belíssimo contributo para a democracia, se reconhecesse que o Ministério da Educação numa conjugação de esforços com o Ministério da Administração Interna encontrou para já as soluções possíveis para este ano. Se há maior ou menor legalidade em algumas questões do decreto-lei, essa será uma questão que poderá ser demonstrada posteriormente. Contudo, o PCP não pode é deixar de reconhecer que se encontraram soluções que vão ao encontro de muitos dos desejos das autarquias e das necessárias soluções na problemática do ensino. Como todos sabemos, as verbas já estavam contempladas no fundo de equilíbrio financeiro das autarquias, e houve um reforço de verbas atribuído pelo Decreto-Lei n.º 299/84. Esta foi, pois, uma medida de emergência e não se pode dizer que as autarquias tivessem sido apanhadas de improviso, porque isso já figurava nas competências transferidas com os prazos necessários.
Quanto à grande questão de fundo das instalações, seria interessante que por parte de todos os partidos representados na Assembleia da República houvesse uma concertação de esforços no sentido de se definirem nacionalmente as prioridades de construções escolares. Todos sabemos que com a legitimidade que lhes cabe, naturalmente que os autarcas vão exigir que as escolas sejam construídas nas suas próprias zonas.
Muitas vezes há um conflito entre as posições dos autarcas e as prioridades nacionais que devem ser definidas. É evidente que os problemas são mais graves nas zonas de maior densidade populacional. Contudo, se quisermos fazer uma política séria neste domínio, concertemos esforços e façamos um levantamento nacional, mas façamo-lo não por atitudes demagógicas nem para fazer ruído, que pode perturbar a abertura já difícil do ano escolar, mas façamo-lo posteriormente.
Este debate que o PCP quer fazer deve ser proposto na altura devida! Deixemos abrir o ano escolar e então depois vamos verificar quais são as carências. Certamente que são muitas, mas será necessário distinguir aquilo que eventualmente possa ser culpa deste Ministério e aquilo que seja culpa de ministérios anteriores. Nessa altura também teremos oportunidade de separar as questões de fundo das questões conjunturais.
Portanto, seria bom que o PCP partisse definitivamente para esta atitude crítica responsável, porque, tal como o meu colega Carlos Lage aqui referiu, ele tem grandes responsabilidades neste país, além do mais até pela sua representação autárquica - é bom referir-se aqui esta questão, porque ela prende-se muito directamente com os próprios autarcas.
Mais do que ninguém, nós, Partido Socialista, estamos interessados no debate sobre estas questões. Porém, recusamos que os problemas sejam levantados com atitudes menos sérias, no momento em que podem perturbar a já difícil abertura do ano escolar. Portanto, esta questão deve ser posta posteriormente, depois de já termos condições para distinguir aquilo que é essencial do que é acessório, aquilo que pode ser resolvido a curto prazo e aquilo que vai exigir de todos um esforço sério de concertação, no sentido de se encontrarem as soluções de fundo.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, V. Ex.ª diz que nós misturamos questões de fundo com questões estruturais. Pois sim, Sr. Deputado, vamos discuti-las todas: as de fundo

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e as estruturais, os «entretantos» e os «filnalmentes» - como diz o outro -, porque elas estão todas erradas.
Quando o Sr. Deputado diz que fazemos uma política oposicionista devo dizer-lhe que a fazemos firmemente e que nos opomos à política educativa deste Ministro, que conduz a uma situação como a que acabei de relatar.
O Sr. Deputado diz que depois do ano lectivo abrir discutiremos esta questão. Porém, o «depois» significa que há milhares de estudantes que são deslocados para dezenas de quilómetros de distância, que inclusive dentro da cidade de Lisboa têm que fazer deslocações em que perdem horas nos transportes públicos e que ficam extremamente longe das respectivas residências. Dei o exemplo dos 800 estudantes de Almada que foram deslocados para o Monte da Caparica. Esta é uma situação inadmissível e incomportável para os pais, pois a larga maioria deles não pode pagar por transporte escolar 4700$ por mês. Então, o que é que isso significa? Significa que as crianças não vão frequentar o ensino secundário - aí se verifica o abandono escolar.
Portanto, as tais questões de fundo a que o Sr. Deputado se refere estão profundamente relacionadas com esta situação. Tanto o insucesso escolar como o abandono escolar estão profundamente relacionados com as questões que temos em cima da Mesa.
É, pois, muito grave que a Assembleia da República deixe iniciar-se o ano lectivo nestas condições, porque estamos mesmo a ver o que é que isto vai significar para milhares e milhares de crianças portuguesas.
O Sr. Deputado diz que é conveniente definir prioridades nacionais. Porém, o Sr. Ministro conhece-as. Há anos que andam grupos de trabalho do Ministério a estudar as prioridades nacionais - o Ministério e todo o País as conhece. Em Almada sobram 3000 alunos, em Oeiras 500, em Paço de Arcos 1200, na zona de Setúbal há situações de verdadeira ruptura, o concelho de Sesimbra não tem uma escola secundária e todos os estudantes deste concelho têm que ir para a Escola Secundária de Almada, o que significa que têm que pagar cerca de 5000$ por mês só de transporte.
Ora, essas situações de ruptura estão definidas, e o que é grave é que da parte do Ministério todos os anos chegamos à abertura do ano escolar e se diga: «A situação é esta e agora vamos remendá-la», remendando-a cada vez pior e com consequências em que cada vez se verifica mais insucesso escolar, mais abandono escolar.
Ora, isto não pode ser assim. Não podemos aceitar que em estabelecimentos de ensino haja crianças com 14 anos que têm de passar para o ensino nocturno - e não são os repetentes, nem os trabalhadores-estudantes, mas sim todo o 9.º ano. Que consequências é que isto vai ter para aqueles jovens, para as suas famílias e para o seu futuro?
Tem de haver outras soluções, e pensamos que estamos a tempo de, no imediato, preconizar soluções.
A verba que o Sr. Ministro anunciou que tinha negociado e que vem no Orçamento revisto - e não sei se é ou não verdade, porque não conheço o Orçamento revisto - aponta para 190000 contos para a
construção de pavilhões pré-fabricados, o que é verdadeiramente ridículo e não vai resolver nada. Vai ficar tudo como está, e estas crianças vão ter um ano lectivo que é fácil de antever.
Portanto, pensamos que está nos nossos poderes e nas nossas competências fazer algo de imediato para que este ano lectivo não signifique a degradação em que este panorama que acabo de mostrar se vai traduzir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Agostinho Domingues há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, a questão que se coloca em relação aos transportes escolares e à Acção Social Escolar, no que se refere à transferência de competências para, os municípios, é, como há pouco já tive ocasião de dizer, a seguinte: o que está em causa não é a transferência de competências, mas sim a forma atabalhoada como esta está a ser feita, em cima da hora, sem publicação do total da legislação que regulamenta esta transferência e, muito mais grave do que isso, sem ser acompanhada da respectiva transferência de meios. Esse é um problema gravíssimo não para o Ministério, mas sim para as autarquias, para os municípios e para os estudantes e as respectivas famílias.
Este é um problema grave, pelo aumento de encargos que isso significa para as autarquias, não só pelo pagamento que têm que fazer desta transferência de encargos em relação aos pagamentos directos aos estudantes e ao suporte das despesas com os transportes escolares, refeitórios, etc., mas também do respectivo pessoal que vai ter nas autarquias, no que se refere a esta transferência. Aliás, como o Sr. Deputado sabe, nada disto foi acompanhado de transferências de meios.
O Sr. Deputado disse que isto já estava orçamentado, mas a verdade é que não estava. Aliás, os próprios decretos-leis desmentem o Sr. Deputado. O Decreto-Lei n.º 299/84, de 5 de Setembro, no seu artigo 22.º, diz o seguinte:

Transferência de verbas

1 - A parcela a transferir para fazer face aos custos dos transportes escolares será anualmente integrada no Fundo de Equilíbrio Financeiro.
2 - O financiamento dos encargos com os transportes escolares relativos ao último trimestre de 1984 será assegurado pelo Governo através de transferências de verbas correspondentes aos custos previstos pelo município.
Se «será assegurado» é porque ainda não foi e, portanto, não foi transferido nas verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro que já foram transferidas

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para os municípios. Apenas no orçamento suplementar poderá vir essa transferência de verbas - se vier, o que eu ainda não sei, na medida em que, segundo creio, o orçamento suplementar ainda não chegou à Assembleia da República. Assim, só depois disso é que o Governo poderá fazer esta transferência de verbas e, pelo andar que isto está a ter, só lá para Novembro é que as autarquias poderão ter essas verbas.
O mesmo se passa com o decreto-lei da Acção Social Escolar, que ainda nem sequer foi publicado no Diário da República, e que apenas é conhecido das autarquias porque o Governo mandou uma fotocópia do documento aprovado em Conselho de Ministros para as autarquias, mas ainda não foi publicado, e hoje estamos a 27 de Setembro.
No artigo 21.º deste decreto-lei diz-se o seguinte:
O financiamento dos encargos referidos no número anterior relativos ao último trimestre de 1984 será assegurado pelo Governo através de verbas correspondentes aos custos previstos pelo Instituto da Acção Social Escolar por município.
Portanto, o problema é o mesmo. Só quando o orçamento suplementar for aprovado na Assembleia da República é que o Governo poderá fazer isso, pois ele não tem competência para transferir verbas não orçamentadas. Se fizesse isso estava a cometer uma total ilegalidade, absolutamente inconstitucional.
Daí que, Sr. Deputado, todas as críticas que fazemos em relação a esta questão tenham toda a razão de ser. Sc, de facto, o Governo queria transferir responsavelmente competências, é evidente que não seria agora que iria fazer isso, com um ano escolar a iniciar-se e com toda esta situação, que não dignifica e cria tremendas dificuldades aos municípios, aos alunos e aos pais.

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, uma das últimas frases de V. Ex.ª foi a de dizer que o PCP, ao levantar esta questão, pretende complicar e perturbar um problema que já é difícil. Esta é, pois, uma concepção muito errada, Sr. Deputado. Estes debates que se fazem na Assembleia da República não são para perturbar. Estamos a exercer uma das competências da Assembleia da República, que é a fiscalizadora.
Aliás, devo dizer que estes debates são construtivos. Propusemos esta discussão há Já uma semana atrás e, portanto, ainda poderia haver tempo para se tomarem algumas medidas. O sentido geral da nossa intervenção é o de prevenir esta situação de imprevidência, de leviandade e de irresponsabilidade.
É claro que os problemas não são só deste Governo - isso está fora de causa e não vamos pôr a questão nesses termos. Porém, ao longo deste ano vinha-se desenhando uma situação que se sabia que iria desaguar neste caos, que vai ser a abertura do ano escolar.
Acha o Sr. Deputado que nos deveremos calar perante isso? Não acha que a nossa intervenção, o nosso grito de alarme, o nosso grito de alerta, antes mesmo de a situação se verificar, pode ainda ajudar a remediar algumas coisas? Não acha que nós, responsáveis políticos e representantes do povo português aqui na Assembleia da República, devemos ter uma compreensão mais séria dessas coisas?
Por vezes é perante a dor e o1 caos que tomamos consciência de certas coisas! Quando discutirmos o orçamento suplementar e depois o Orçamento de Estado para 1985 vamos ter os olhos abertos e não vamos dizer «amén» a tudo aquilo que o Sr. Ministro Seabra e o Ministro das Finanças e do Plano propuserem.
Temos responsabilidades e por isso que estamos a apelar para a consciência de todos os Srs. Deputados, em especial a do Sr. Deputado Agostinho Domingues, que, além do mais é um docente e que devia sentir estas coisas com tanta ou mais paixão do que nós:
Sr. Deputado, não nos podemos refugiar em frases como estas:
Os deputados do PCP confundem questões estruturais com questões conjunturais.
Essa frase faz-me lembrar uma pessoa que dizia:
É preciso não sobrestimar! É preciso não sobrestimar!
Essas são frases que nada dizem em relação aos assuntos que estamos a discutir.
O Sr. Deputado fala do insucesso escolar, mas há insucesso escolar que é evidente e que não precisa dessas discussões profundas.
Num concelho do Algarve há crianças que se levantam às 5 da manhã para frequentar a escola secundária de Vila Real de Santo António e que regressam a casa às 21 horas, e o Sr. Deputado José Vitorino conhece muito bem esta situação. Como é que estas crianças podem ter aproveitamento escolar? E é preciso fazer grandes aprofundamentos para se perceber qual é a razão do insucesso escolar tanto nestes como em muitos outros casos, como a minha camarada Zita Seabra referiu? Todos nós conhecemos bem estes problemas.
A questão que aqui trouxemos é concreta e clara e tem em vista chamar a atenção para o facto de não continuarmos a improvisar. Não vamos resolver tudo de um dia para o outro, mas há medidas que importa acautelar, que têm de ser tomadas imediatamente. Aliás, essas medidas não são assim tão complicadas na medida em que sabemos quais são os distritos que estão em aumento de população escolar. Apesar da nossa estatística ser muito má e apesar de os ministérios funcionarem mal, temos esses dados e sabemos onde é que se vão dar as novas situações de ruptura para o ano que vem se não forem tomadas medidas. É isso que nós reclamos.
Portanto, a nossa atitude é construtiva. É uma crítica oposicionista, mas' é no sentido de chamar a atenção e de alertar para os problemas.
O que o Sr. Deputado diz em relação à descentralização também não é verdade. O Sr. Deputado não deve conhecer outros materiais do meu partido, mas conhece a nossa intervenção parlamentar. Então veja se na nossa intervenção parlamentar há alguma

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coisa que não seja claramente apontada para a descentralização.
Em relação aos transportes escolares a nossa posição é a de que se descentralizem os meios. Ora, qual é a nossa preocupação? Ê a de que não estão a ser descentralizados os meios - e corremos o risco de fazer cair sobre as autarquias uma massa de encargos que as vão afogar, quando hoje, na nossa administração, as autarquias são um oásis - e não me refiro só às da APU. Elas resolveram bem muitos problemas que não podiam ser resolvidos de outra maneira. Contudo, vamos «afogá-las» com encargos sem lhes dar os meios para que elas possam corresponder a esses encargos?
Essa é a grande preocupação que temos aqui colocado. Portanto, venham defender os meios para que elas possam fazer face aos encargos e nós seremos os primeiros a defender todas estas medidas descentralizadoras.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, gostaria de saber de que tempo disponho para responder aos pedidos de esclarecimento que me foram formulados, pois tenho o maior interesse em procurar fazê-lo o melhor que puder e souber.

O Sr. Presidente: - Dispõe de 9 minutos, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto aos pedidos de esclarecimento formulados pela Sr.ª Deputada Zita Seabra pouco tenho a dizer. A Sr.ª Deputada levanta questões pontuais concretas e, portanto, não me cabe a mim negar-lhes ou confirmar-lhes a validade. Naturalmente que só um conhecimento concreto dos problemas pode permitir dizer se há ou não razão nas questões que levanta, e isso cabe ao Ministério.
É evidente que muitas vezes não há princípios genéricos que possam ser aplicados. Por exemplo, não se pode dizer genericamente - e prescindo da situação que aponta - se e mal maior ou menor passar alunos de um determinado 9.º ano para a noite. Pode ser um mal menor.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Um mal menor?

O Orador: - Em situações determinadas pode ser um mal menor, Sr.ª Deputada - eu preciso a linguagem que estou a usar.
De facto, na situação em que o nosso ensino se encontra, com males profundos, que vêm de longe - repito -, muitas vezes há que ter o cuidado de adoptar males menores. Não são atitudes benéficas, mas sim males menores. Portanto, lamento não me poder pronunciar sobre essas questões, pois deve-as formular ao Ministério numa atitude que, mais do que legítima, é necessária para ajudar a esclarecer estes problemas.
A Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo volta à questão da transferência das verbas para as autarquias. Creio ser necessário alongar-me um pouco mais nesta matéria, pois não podemos, de forma alguma, ignorar este aspecto.
Este decreto-lei a que nos referimos pode ter dificuldades de implementação. A Sr.ª Deputada poderá porventura ter razão - e não estou a dizer se a tem ou não, admitamos que a tenha - quanto à necessidade de haver um orçamento suplementar para contemplar essas verbas. Contudo, o que não posso deixar de estranhar é que não haja, acima de tudo, que louvar a atitude concreta de procurar resolver um problema, buscando-se depois as medidas que reponham integralmente a legalidade. É curioso que o PCP esteja aqui a procurar furtar-se àquilo que devia considerar um aspecto positivo.
Na realidade, com este decreto-lei - e este é um facto em relação ao qual tive o cuidado de me documentar- foram atribuídas verbas que não estavam previstas. E porque é que isto aconteceu? Aconteceu porque muitos dos autarcas não prepararam a tempo o orçamento, ou melhor, não reservaram verbas que estavam no Fundo de Equilíbrio Financeiro para dar cobertura aos transportes escolares no primeiro período do ano lectivo de 1984-1985.
Consciente de uma certa legitimidade por parte dos autarcas - porque esta matéria foi polémica e porque houve um tempo relativamente curto entre o Orçamento do Estado e o termo do ano lectivo para que estas matérias fossem regulamentadas - o Governo, concretamente o Ministério da Educação e o Ministério da Administração Interna, adoptou uma solução política que em grande parte veio dar satisfação aos autarcas. E isto numa matéria em que é perfeitamente seguro que o Governo agiu bem porque esta questão levantou uma polémica seria - e foi sobre isso que o PCP se não quis pronunciar - entre os autarcas e os professores. Pela minha parte estou à vontade quanto a isso porque fiz uma intervenção na Assembleia da República que até não agradou totalmente ao meu partido - simplesmente é agradável para mim estar num partido democrático onde até a diversidade de opiniões se pode expressar em plena Assembleia.
Contudo, trago aqui esta questão para lembrar que, de facto, esta foi uma matéria polémica entre os autarcas e os professores e, curiosamente, o PCP foi incapaz de definir posição nesta matéria porque procurou agradar a gregos e a troianos e, pior do que isso, procurou lavar as mãos como Pilatos. e as questões não se resolvem dessa maneira.
Quanto a esta matéria, o PS e o PSD assumiram uma posição perfeitamente clara, corajosa e defensora do País, evitando um conflito que poderia ter sido acentuado entre 2 sectores muito importantes da vida portuguesa, como sejam os professores e os autarcas.
Temos, pois, que repor a verdade dos factos e elogiar o Governo, concretamente os Ministérios da Educação e da Administração Interna, por ter assumido atitudes corajosas e adoptado as medidas possíveis nesta conjuntura.
A transferência desta e de outras competências há-de continuar a exigir o debate necessário e nós, Partido Socialista, contamos com um empenhamento sério e com atitudes claras por parte do Partido Comunista Português para ajudar a encontrar as soluções, mas não encobrindo as suas posições à espera que se levante o sindicato A ou B para procurar

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agradar-lhes, muitas vezes contribuindo para dificultar a solução dos problemas.
O Sr. Deputado Carlos Brito entendeu mal aquilo que referi. V. Ex.ª disse que eu afirmei que o PCP pretende complicar o lançamento do ano escolar. Longe de mim atribuir essa intenção ao PCP.
Na realidade, o que afirmei foi que levantar esta questão neste momento, isto é, como pretendia antes o Sr. Ministro, fazer um debate no momento em que estão a ser envidados todos os esforços para minorar as dificuldades do lançamento do ano escolar, seria contribuir para complicar o problema. Porém, há um abismo entre esta afirmação e o facto de atribuir ao PCP intenções de pretender com isso complicar o lançamento do ano escolar.
O Sr. Deputado Carlos Brito disse que a intervenção do PCP nesta matéria tem a intenção de prevenir. A intenção é louvável, mas permitimo-nos discordar apenas quanto ao momento - não poderá levar isso a mal, Sr. Deputado.
Quanto à questão do insucesso escolar, devo dizer que o problema não está em considerar se o insucesso escolar é ou não evidente - neste país o insucesso escolar é mais do que evidente! O problema está, pois, nas causas do insucesso escolar e há causas que podem ser combatidas a curto prazo e há outras que exigem um longo esforço. Aproveito para dizer - pois tal aspecto ainda não foi referido - que uma das causas do insucesso escolar é a deficiente preparação de professores. É um domínio que exige um empenhamento de todos.
Quanto às construções de escolas, já apontei uma solução que me parece que pode ser acolhida, que é um levantamento e uma definição de prioridades com um verdadeira sentido nacional. Ora, isso irá implicar que se deixem de fazer escolas que são menos prioritárias em determinadas zonas para se fazerem onde elas são imprescindíveis para garantir as condições de dignidade mínima da função docente e da aprendizagem escolar.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, em vésperas da abertura do ano lectivo, na situação caótica de que referi apenas alguns exemplos, o meu partido não aceita que se diga que estas soluções são apenas um mal menor e que, logo, sendo um mal menor, são as únicas possíveis e boas. Sr. Deputado, essa afirmação é grave.
Não podemos responsabilizar o actual Ministro por toda esta situação? Mas ele está há um ano no Ministério e não fez nada para a debelar, porque esteve à espera de chegar à véspera da abertura do ano lectivo e então ir para o mal menor que é «enfiar» os alunos em algum sítio sem condições nenhumas. Ainda esta semana li um semanário em que se dizia que em vários países da Europa estão a adquirir computadores para cada escola do ensino secundário. Pois nós ainda estamos ao nível de ter o mínimo de salas de aula - já não me refiro a ginásios nem a laboratórios, mas sim a salas de aula.
O Sr. Deputado diz que um mal menor é o de «enfiar» os alunos no ensino nocturno. Sempre é melhor do que colocá-los numa praça pública ou num jardim para receberem aulas. Porém, com o que temos que acabar é com estas soluções de mal menor. Estas questões têm de ser planificadas e programadas a tempo e horas para que os estudantes tenham estabelecimentos de ensino com um mínimo de condições.
Ê verdade que há muitos factores para o insucesso escolar, mas há alguns que são óbvios e evidentes e que podem ser debelados a muito curto prazo, e um deles e a construção de novas escolas. Não podemos esperar que para o próximo ano quando chegarmos a Outubro se diga que se vão «enfiar» mais milhares de crianças no ensino nocturno, ou seja, que vai alargar-se mais o funcionamento das escolas e é importante que nos lembremos que se este ano elas já estão a Funcionar 60 horas, pois há aulas aos sábados à tarde, para o ano que vem elas começam a funcionar ao domingo. Quanto ao Sr. Deputado, este é um mal menor, pois é preferível que funcionem ao domingo do que a não haver aulas.
Ora, temos de acabar com questões deste tipo e lemos de programar a tempo e horas a abertura do uno escolar, porque estamos a empenhar o futuro do País e temos um mundo de problemas que se arrasta com estas situações. Que jovens e que estudantes vão sair de um sistema de ensino que não lhes dá preparação profissional, um sistema de ensino que tem um grau de insucesso escolar que é profundamente alarmante, que se tem vindo a agravar e que este ano ainda se vai agravar mais porque, por melhor preparação que os docentes tenham, não há docente a dar aulas nestas condições que possa ter rentabilidade em turmas com 34 alunos, e em alguns casos chegam a ultrapassar este número? Por melhor preparação que os professores tenham, não há nenhum que consiga resolver o problema do insucesso escolar.
Temos todas as condições e a obrigação para na Assembleia da República encarar a tempo e horas estas questões para não chegarmos a Outubro e dizer-se «então remende-se assim a situação», pois é um mau remendo, que é grave para o País e para a juventude.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para também formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Agostinho Domingues, sei que não é essa a sua intenção e, portanto, não lhe vou imputar essa culpa, mas por vezes V. Ex.ª manifesta-se de tal forma que parece que um debate parlamentar como o que suscitámos é apenas uma maneira de chatear o Governo. Essa é a concepção do governante que diz que o Parlamento só chateia - desculpe o calão, mas é para manifestar com toda a crueza aquilo que se poderia colher das suas palavras, embora eu saiba não ser essa a sua intenção. Estas discussões e outras que são suscitadas por outros deputados são contribuições decisivas para melhorarmos as coisas.
Em relação ao ensino, creio ser correcto termos a consciência de que isto vai de mal a pior. O início deste ano lectivo vai ser um dos piores em relação às circunstâncias em que muitas crianças vão ter

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aulas. Tal facto não pode deixar de nos alarmar, de reclamarmos medidas para ele e de responsabilizar a falta de previsão que levou a este estado.
Daqui por uns dias o Sr. Deputado vai ver que tivemos razão em suscitar este debate e que aquilo que aqui trouxemos não foram invenções da nossa cabeça. Vai ver que estas situações se vão dar e que os problemas se vão colocar com a crueza com que as questões se colocam. Repare que, apesar de tudo, o Sr. Ministro da Educação foi um pouco sensível à iniciativa que tomámos aqui na Comissão Permanente, pois respondeu logo e tomou posição ao ver que estes problemas eram sérios.
Portanto, pelo simples facto de termos levantado este problema, talvez tenhamos dado alguma contribuição quanto a ele, pois talvez algumas situações que não estavam e ser atendidas já estejam agora a ser consideradas. É assim que compreendemos o funcionamento das instituições democráticas que temos e nas quais nos inserimos responsável e construtivamente. Apesar de estarmos numa oposição global ao Governo, estamos dentro do Estado, dentro do regime e, por isso, a nossa acção é sempre construtiva para a melhoria do regime, do Estado e da resposta que este deve dar ao nosso povo e aos seus problemas.
Quanto aos transportes escolares, devo dizer que desconfiamos de certa descentralização que está a ser feita e, por isso, não cobrimos com paixão nem com entusiasmo certas formas concretas de descentralização. Vamos ver como é que fica a Lei das Finanças Locais e depois conversaremos.
Realmente temos algumas desconfianças em relação à maneira como se está a descentralizar alguns encargos para as autarquias e, portanto, estamos prevenidos. Embora sejamos descentralizadores, não faremos intervenções entusiásticas de apoio em relação a algumas medidas concretas de descentralização enquanto não virmos o quadro no seu conjunto e, sobretudo, enquanto não vimos como é que a Lei das Finanças Locais, que está pendente, sai da Assembleia da República.
Um preocupação que foi trazida por outros meus camaradas é a questão do Orçamento. Tanto nós como os Srs. Deputados sabemos que estamos numa situação de ilegalidade orçamental. Sabemos que o Governo está a fazer despesas em relação às quais não tem autorização da Assembleia da República. Por isso, tanto nós como outros partidos que não fazem parte do Governo temos insistido para que seja discutido o orçamento suplementar o mais rapidamente possível. E um dos aspectos em que o Governo está em ilegalidade e o dos transportes escolares.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de lembrar aquilo que tem vindo publicamente nos jornais no que diz respeito a uma série de obras adjudicadas pelo Ministério da Educação e propostas enviadas concretamente para adjudicação. Portanto, estão em ritmo várias construções e também há que verificar, no devido tempo, se o ritmo é ou não superior ao dos anos anteriores.
Em relação ao Sr. Deputado Carlos Brito devo dizer que o que aqui está em causa não é negar este debate, pois é evidente que ele é salutar. A questão que coloquei foi a da oportunidade do debate. O PCP teria feito igualmente este debate se aqui tivesse apresentado uma proposta no sentido de que fosse feito um levantamento da situação depois de aberto o ano escolar. Nessa altura poder-se-ia fazer a discussão da mesma maneira e com a mesma pertinência e o PCP teria outra legitimidade na maneira como apresentava o problema.
Quando o Sr. Deputado Carlos Brito volta a insistir que o que está em causa na descentralização é o modo como esta foi feita; não há dúvida que V. Ex.ª volta a trazer aqui a questão sempre levantada pelo PCP. O PCP fica sempre à espera que as coisas se façam e depois coloca-se na atitude de criticar aquilo que seja pontos negativos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É que aqui concretamente há um plano de conjunto composto por vários diplomas governamentais onde estão estas e outras medidas, como o pacote autárquico que estamos a discutir.
Ora, em relação a esse pacote há para nós uma lei que é fundamental, que é a Lei das Finanças Locais, e que vamos ver como é que ela fica. É perigoso estarmos a descentralizar obrigações e deveres sem descentralizar os meios para que as autarquias possam fazer frente a essas obrigações e a esses deveres, podendo destruir uma administração autárquica relativamente positiva como é aquela que temos.

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito, muito obrigado pela sua interrupção, mas volto à mesma: é pena que o PCP não tenha dito a tempo - e tinha obrigação de o ter dito no Parlamento - quais eram os caminhos que considerava que deviam ser adoptados para a descentralização. Porém, o PCP não fez isso porque - aliás, como sempre - ele coloca-se na expectativa para poder apenas criticar. Dessa forma, o PCP até mantém o seu eleitorado estável porque consegue corresponder a um certo sector crítico negativo de uma parte da opinião portuguesa que está sempre mais disposta a criticar do que a construir. Ora, o PCP mantém esse eleitorado a partir dessa atitude crítica porque nunca aponta claramente caminhos nem objectivos. Porém, isso não é útil à política nacional!
Nesta questão concreta, o PCP não disse como fazer e vem apenas criticar aspectos em relação aos quais até poderemos estar de acordo numa ou noutra questão, porque há sempre aspectos a criticar. Os partidos que estão no Governo não são cegos e até podem aceitar que haja aspectos negativos, pois há-os sempre. Porém, o PCP perde a legitimidade quando não apresenta alternativas em tempo oportuno e se limita depois a estar à espera dos lados negativos para acentuar o lado negro das questões.
Esta atitude de não apresentar alternativas nem de ajudar a construir parece-me negativa por parte do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não resisto à tentação de fugir a um cumprimento rigoroso das normas regimentais para exprimir o entendimento que acabo por ter da intervenção há pouco feita pelo Sr. Deputado Carlos Lage.
A intervenção do Sr. Deputado sobre o «caso D. Branca» deve vir na sequência das declarações do Sr. Ministro da Justiça. Quer dizer, o problema não é de legalidade, mas sim ético e moral. Ora, o Sr. Deputado entende que, sendo um problema ético e moral, quem tem culpa é o povo português ou, antes, são os elementos, pequenos e grandes depositantes, que confiaram na D. Branca. Realmente o Governo e a Administração não têm culpas, nem ninguém tem culpas, mas na realidade a intervenção veio na sequência do Sr. Ministro da Justiça ter considerado que não havia ponta legal por onde se pegasse.
Peço desculpa ao Sr. Presidente por ter feito esta introdução e vou agora debruçar-me sobre o problema em causa.
Não somos nós, CDS, que vamos negar a gravidade desta questão colocada pelo PCP, pois neste momento em Portugal a dificuldade em matéria de questões graves e uma dificuldade de escolha. Estamos num momento de crise gravíssima, já vimos aqui que há ministros que não vão aos ministérios, que não governam, que não ministram - tal como disse um actor brasileiro -, e, na realidade, o que é difícil é saber qual é a questão mais grave que vamos eleger para nos ocuparmos dela.
Esta questão do início do ano escolar é realmente grave, pois vem repetindo-se todos os anos e traduz-se num adiamento prejudicial para os alunos e para o País.
Também são graves os termos em que se opera esta transferência de competências para as autarquias locais. Designadamente, é grave que este diploma esteja a ser publicado nesta altura do ano, a poucos dias da transferência efectiva e da necessidade de assumir essas novas competências.
Porém, não estou de acordo com a proposta que o PCP nos faz. Concretamente, para que é esta proposta? É para a Comissão Permanente convocar a Assembleia, que vai começar a reunir na próxima terça-feira, para se ocupar desta questão da abertura do ano escolar? Se assim é, o que é que pretendemos ao tratar desta questão? Pretendemos dar ao público a ilusão de que podemos tomar medidas concretas sobre esta matéria? Isto e muito grave do ponto de vista da imagem pública desta Assembleia, porque mais uma vez vamos convocar a Assembleia dando a ilusão de que esta tem competências que não tem, porque esta questão e fundamentalmente de carácter e de foro administrativo.
Ora, os Srs. Deputados do PCP até nos chamaram a atenção para o facto de que não lemos limitações de competências, mas temos limitações orçamentais. Então, qual é a ideia que vamos dar ao público? Ou vamos, pura e simplesmente, armar uma grande discussão numa altura em que está atrasada a abertura do ano escolar?
O chamar a atenção para o facto tem aspectos positivos, mas terá aspectos mais positivos se o partido proponente fizer uma interpelação sobre esta
matéria, propuser medidas de carácter legislativo ou quando discutirmos o orçamento propuser medidas do foro orçamental que consigam evitar estes problemas. Nessa altura, cá estaremos para estudar e discutir estas questões.
Porém, criar no País a ilusão de que a Assembleia se vai ocupar desta matéria para a resolver quando não o podemos fazer, tal facto e grave para a imagem e para o prestígio desta Assembleia. Aliás, a imagem e o prestígio desta Assembleia, por actuação conjugada de várias forças, destacando-se entre elas o Governo e a maioria que o apoia, já andam muito por baixo no conceito do povo português. Portanto, não vamos contribuir para a pôr ainda mais por baixo, convocando-a para tratar de assuntos para os quais não tem competência.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, fiquei um pouco surpreendido com os termos da sua intervenção. Aliás, devo dizer que não sei onde é que V. Ex.ª foi encontrar essa ideia de que pretendemos convocar a Assembleia.
O que propomos e a realização de um debate sobre esse assunto na Comissão Permanente, debate esse realizado nos termos da alínea a) do artigo 182.º da Constituição da República. Uma das competências da Comissão Permanente é a de acompanhar a actividade do Governo. Portanto, este debate é para o acompanhamento da actividade do Governo num ponto fulcral, que é o da abertura do ano lectivo.
Por acaso não está hoje aqui o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que costuma estar presente ...

Vozes do PS: - Está aqui, está!

O Orador: - Perdão, já está, mas há pouco não estava. Mas se já está, naturalmente que este debate aqui, Sr. Deputado Nogueira de Brito, não é inócuo. Está aqui o representante do Governo, que tomará na devida conta o sentido da intervenção dos deputados, quer da oposição quer da maioria, e que levará ao Governo e ao departamento do Governo indicado no caso concreto o sentido das críticas, das propostas e das preocupações que aqui se manifestaram.
Portanto, não se trata de criar nenhuma falsa expectativa do País mas, isso sim, de aqui, na Assembleia da República, na Comissão Permanente, fazer-se o acompanhamento da actividade do Governo, formulando críticas e preocupações e adiantando sugestões.
Assim, não compreendo qual a razão de ser da intervenção do Sr. Deputado. Mais: também se trata de nos tornarmos conscientes das nossas - Assembleia da República - responsabilidades nesta matéria. Eu tive ocasião de dizer que vamos discutir o orçamento suplementar e dentro de algum tempo o Orçamento do Estado para 1935; pois, então, tenhamos presente qual e a realidade do País, aquela que os Srs. Deputados vão ver dentro de dias que e a realidade do País. E nós temos aí responsabilidades a que poderemos corresponder. Portanto, nós faremos as nossas propostas correspondentes à situação e a maioria da Assembleia votará a favor ou não. Nós cumpriremos

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a nossa obrigação; a maioria da Assembleia cumprirá ou não a sua.
É disto que se trata, Sr. Deputado Nogueira de Brito, e eu gostaria de ver esclarecidos estes pontos, pois fiquei sem entender muito bem a sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Carlos Brito, para responder necessitava do seu exemplar da Constituição. Espero que não se importe... e espero que não venha ensinada!

Risos.

Sr. Deputado, eu devo ter lido mal mas tenho aqui um texto - que porventura não será o último, pois parece que houve vários provocados pelas respostas do Governo - no qual se diz que:
Nestes termos e considerando a inquietação que a grave situação existente, confirmada agora pela nota governamental, está a gerar no País, a Comissão Permanente da Assembleia da República delibera, ao abrigo e para os efeitos previstos no artigo 182.º, n.º 3, alínea c), da Constituição da República Portuguesa, a abertura de um debate na presente reunião para a apreciação das condições em que se irá iniciar o próximo ano lectivo.
E a alínea c) do n.º 3 deste artigo da Constituição diz que compete à Comissão Permanente «promover a convocação da Assembleia sempre que tal seja necessário».
Portanto, eu concluí que se tratava de promover uma convocação da Assembleia.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É gralha, Sr. Deputado.

O Orador: - Então é gralha, Sr. Deputado!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É sim! Queríamos dizer alínea a).

O Orador: - Mas então se é gralha, eu peço desculpa pois embarquei na gralha. É de facto, a alínea a) que refere o acompanhamento da actividade do Governo.
Era mais grave se fosse realmente a convocação, mas está corrigido.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, isto é um esclarecimento muito rápido: seria absurdo nós propormos hoje a convocação da Assembleia quando ela está convocada para o dia 2. Manifestamente se via que se tratava de uma gralha.

O Orador: - Eu diria que a questão é quantitativa. Protesto do Deputado Carlos Lage (PS).
Não, não, mas a expressão «presente reunião» poderia ser no sentido de sessão e como é prolongamento da sessão legislativa poderia ser do dia 2 ao dia 15 ... Bom, isto tinha várias interpretações possíveis.
A questão é quantitativa porque seria mais grave se fôssemos deliberar aqui convocar para este efeito, o que poderia significar que deliberássemos incluir na ordem do dia de 2 a 15 de Outubro este lema. Foi este o sentido que atribuí à vossa proposta, lendo alínea c). Peço desculpa e está corrigida a gralha.
Mas, como disse, a questão é quantitativa porque 6 igualmente grave que a Comissão Permanente - que, terminando hoje as suas reuniões, poderia sempre reunir amanhã, no sábado, na segunda-feira ou até no domingo - ia expressamente pronunciar-se sobre esta matéria. E lá está: está certo que a alínea a) fala em acompanhar, fundamentalmente para exercer a nossa actividade fiscalizadora, mas sobre o acontecimento, e falando os Srs. Deputados do Partido Comunista Português de uma actuação preventiva, todas as pessoas ficariam a crer, e justificadamente, que nós íamos tomar medidas concretas sobre o assunto quando nós não o podemos fazer; o princípio da separação de poderes inibe-nos de o fazer. Portanto, iríamos dar uma ideia errada ao País e este esperaria desta convocação da Comissão Permanente para tratar deste assunto - que, aliás, seria certamente ampliada pelos meios de comunicação social - o milagre de resolvermos o problema do início do ano lectivo. E depois depararia com esta circunstância: meia dúzia de discursos muito fundamentados, ponderados, com maior ou menor acutilância, mas em que não adiantaríamos nada em matéria de abertura, até porque iríamos fazer a reunião praticamente sobre a abertura do ano lectivo.
Ora bem, é isso que leva a entender, a mim e aos deputados do meu partido, que não é útil esta reunião.
É útil discutir este tema, é grave este tema, entenda-se. Com a minha intervenção e com a nossa intervenção não queremos diminuir, o mínimo que seja, a importância, a gravidade e a oportunidade de o discutir na Assembleia, mas nestes termos é que nos parece que poderá conduzir a uma ideia errada o povo português.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr. Deputado, mas agora já não lhe posso conceder a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra na medida em que o Sr. Deputado Nogueira de Brito fez uma referência e eu não gostaria que pairassem dúvidas sobre o sentido das minhas afirmações, que o Sr. Deputado desviou do seu sentido original.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe imensa desculpa, mas agora é um pouco extemporâneo o seu pedido.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, eu na altura pedi a palavra.

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O Sr. Presidente: - Mas para fazer um protesto, Sr. Deputado? É que não foi entendido assim.
No entanto, se de facto é para fazer um protesto, uma vez que diz que pediu a palavra, se é esse o caso, tem a palavra, pois não queremos, de forma nenhuma, coarctar-lhe esse direito. Peço a V. Ex.ª que seja breve.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado Nogueira de Brito reconheceu que ia fazer uma referência fora do momento adequado à intervenção que eu tinha feito anteriormente.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito quis pôr-me em contradição e levar a uma conclusão pretensamente deduzida das minhas afirmações que não foi a conclusão que eu tirei ou que era lícito tirar do que afirmei.
Sr. Deputado, eu disse que a questão da D. Branca era não só uma questão legal - e por isso não desresponsabilizei o Governo - como também uma questão ética. Considerei errado que se procure sempre desculpabilizar o acto de cada um de nós, que se fuja a uma ética individual para que se responsabilizar os outros, para se considerar que os outros são sempre responsáveis, estando sempre nestes casos, em que até politicamente se querem tirar ilações, perante vítimas.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito acabou por dizer que eu, afinal, tinha culpado todo o povo português. Eu não culpei todo o povo português, Sr. Deputado. Afirmei que há qualquer coisa de doentio na sociedade portuguesa e na mentalidade portuguesa, mas isso é uma questão mais profunda que leva, de alguma maneira, a aceitar coisas deste género, a considerá-las como banais, a transmiti-las pela televisão como se fosse qualquer coisa destituída de importância, como mais um espectáculo. Estão 2000 pessoas à espera de receber aquele juro - que é um juro mais do que de agiotagem, um juro pecaminoso, para usar uma referência cristã - e isso é que é, quanto a mim, surpreendente e estranho.
Já agora permita-me que lhe cite, não professando eu esta ética, uma moralidade que é a seguinte:
Quem tudo quer, tudo perde. A cobiça acaba por perder aquilo que deseja e aquele que pretende mais do que lhe é devido merece perder o que tem.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado quer contraprotestar em relação a este protesto?

O Sr. José Vitorino (PSD): - O Sr. Presidente permite-me um ponto de ordem à Mesa?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Isso é nas reuniões do PSD!

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Se a Mesa me desculpa, todo este incidente resultou do facto de a Mesa ter permitido ao Sr. Deputado Nogueira de Brito que,
claramente fora de tempo, usasse da palavra sobre esta matéria. Eu também queria falar sobre o «caso D. Branca» e não falei porque não pude intervir no período de antes da ordem do dia.
Segundo, a partir daqui, a Mesa entendeu que devia dar a possibilidade de um protesto ao representante do PS que tinha sido invocado nas palavras do Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Agora surge um contraprotesto e a seguir espero que não surja o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quando a Mesa concedeu a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito era sobre outro tema e de facto o Sr. Deputado falou sobre ele. Teve um intróito breve e não é habitual a Mesa interromper os oradores quando estão no uso da palavra.
E agora concedo a palavra, para um protesto, ao Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Nogueira de Brito: Muito rapidamente e sob a figura regimental do protesto, eu diria que o Sr. Deputado sabe como se originou esta proposta de deliberação. Ela foi já apresentada numa reunião anterior da Comissão Permanente ainda na semana passada - portanto, bem distante da abertura do ano lectivo - e nessa altura tinha um objectivo muito concreto que era o de deliberar no sentido de fazermos aqui um debate com a presença do Ministro. Esse debate tinha um efeito prático evidente, pois poderíamos conhecer as posições do Ministro e criticá-las e até estarmos mais esclarecidos acerca de quais eram as expectativas governamentais a respeito da abertura do ano lectivo. Isso não se tornou possível porque houve uma alteração da ordem do dia e a nossa proposta de deliberação foi prejudicada em duas reuniões na semana passada, só hoje surgindo a possibilidade de a discutirmos.
Portanto, hoje propomos que, ainda assim, se aproveite a oportunidade para manifestarmos as nossas preocupações, as nossas críticas ao Governo em relação à situação que está errada e para propormos que se tomem medidas para evitar algumas situações caóticas como aquelas que denunciámos.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito sabe perfeitamente que o ano lectivo abre oficialmente no dia 1 e que há situações das que foram aqui referidas que não estarão resolvidas sequer no dia 15 ou dia 30.
Portanto, a nossa chamada de atenção, o trazer aqui certas preocupações, o alertar o Governo por intermédio do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares tem um efeito prático evidente. O debate que nós queremos é agora e o Sr. Deputado Nogueira de Brito está desafiado a pronunciar-se sobre estas questões, perante o debate que nós propusemos, ao considerar que não era oportuno fazê-lo. É isto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passam 5 minutos da hora regimental e não houve nenhum requerimento a pedir o prolongamento desta reunião. Portanto, penso conceder a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito para responder e depois encerrar a sessão.

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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, o debate iniciou-se às 15 horas e 55 minutos, isto é, com uma hora de atraso, pelo que o período de funcionamento terminará naturalmente às 18 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nós estávamos a guiar-nos pelo artigo 4.º, n.º 1, do Regimento da Comissão Permanente, que diz que esta reúne ordinariamente às quintas-feiras, das 15 às 18 horas, salvo deliberação em contrário. Portanto, o Regimento não põe um período de tempo, mas marca expressamente as horas de início e de encerramento das sessões.
Consequentemente, eu dou a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito para um contraprotesto.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Eu devo dizer que, atemorizado por qualquer nova intervenção que venha do Sr. Deputado José Vitorino e porque acho que o Sr. Deputado Carlos Brito não adiantou nada à questão, prescindo da palavra, não tendo que contraprotestar.
Estou esclarecido. O Sr. Deputado Carlos Lage adopta uma óptica individual na explicação dos fenómenos colectivos da sociedade portuguesa - e eu estou congratulado com isso; resolve a D. Branca com um conselho sábio ao povo português («Quem tudo quer tudo perde»), pelo que estamos resolvidos.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Eu penso que poderíamos esclarecer uma matéria que me parece controversa, qual seja a do encerramento desta reunião.
Creio que se, de facto, vamos terminá-la rigidamente às 18 horas, pelo menos duas coisas merecem ficar em aberto: primeiro, que um atraso no início da reunião, um atraso que não e da responsabilidade dos deputados, se pode traduzir no encerramento antecipado do tempo útil do funcionamento dessa reunião - e creio que isso seria um precedente extremamente grave na vida do nosso Parlamento; e, em segundo lugar, que isso impediria por completo a discussão da questão mais importante que aqui temos e que há pouco já foi de algum modo ventilada, qual seja a da resposta da Assembleia de República à sugestão apresentada para realização de um debate sobre a integração na CEE.
Creio que a leitura possível do encerramento da reunião sem que essa questão fosse debatida seria extremamente má em termos de opinião pública e permitir-nos-ia várias ilações não particularmente agradáveis.
Assim, eu pediria à Mesa e aos deputados que reconsiderássemos este problema e que a nossa sessão fosse considerada como devendo prosseguir até às 18 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, a Mesa partilha, como é óbvio, das suas preocupações em relação à importância dos temas agenciados. O problema está em que a Mesa é obrigada, como toda
a Comissão Permanente, ao cumprimento do Regimento. Nós não estamos a ser estritamente regimentalistas pois passam já 10 minutos sobre a hora regimental e não queríamos prolongar esta reunião por nossa iniciativa, pois estaríamos a violar um preceito regimental.
Se a própria Comissão Permanente entender que deve prolongar os seus trabalhos é óbvio que a Mesa mais não fará do que prosseguir nos temas agendados.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, para uma interpelação à Mesa, suponho.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, nós gostaríamos de fazer uma proposta no sentido de se prolongar a sessão, em primeiro lugar, para se votar este projecto de deliberação do PCP que estamos a discutir - e isto porque a discussão está praticamente esgotada, creio - e, em segundo lugar, para se colocar o problema relacionado com o agendamento do debate sobre a integração europeia.
Se se estabelecer aqui o consenso, como aconteceu na conferência de líderes parlamentares, no sentido de esse debate se dever fazer e se dispensar uma deliberação formal, então poderíamos evitar uma discussão sobre isso. Acaso se entenda que é necessário uma deliberação formal da Comissão Permanente, penso que então será melhor examinarmos essa questão.
Gostaria então que os grupos parlamentares, a seu tempo, se pronunciassem sobre isto, ou seja, em primeiro lugar votar o projecto do PCP e em segundo lugar examinar a questão do agendamento do debate sobre a integração europeia.
Julgo que podemos dispensar uma deliberação formal e um debate se houver consenso de que esse debate pode ser marcado quando for considerado oportuno.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE: - Sr. Presidente, eu iria ainda tecer ligeiras considerações sobre o projecto de deliberação apresentado pelo PCP. Em relação à proposta do Sr. Deputado Carlos Lage, acontece que houve uma reunião da Comissão de Integração Europeia, mas eu creio que o Sr. Deputado Magalhães Mota vai usar da palavra a seguir e ele terá uma explicação a dar sobre aquilo que nós decidimos esta manhã.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, eu queria dizer que em termos genéricos estou de acordo com a posição do Sr. Deputado Carlos Lage. Penso que deveremos esgotar as duas matérias que

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temos em debate, ou seja, encerrar este ponto, decidindo-se se se faz ou não um debate sobre esta matéria, pois parece que é esse o objecto da discussão, e, em segundo lugar, tratar da questão da integração europeia e ao longo do debate verificaremos se ele deve ser ou não objecto de uma deliberação expressa - o meu entendimento é que sim.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, julgo que devemos começar pelo princípio, pela razão das coisas e neste caso concreto a razão das coisas é simples: a reunião devia ter começado às 15 horas e portanto, quando se prevê que termine às 18 horas, supõe-se que ela terá uma duração de 3 horas. Como efectivamente começou 1 hora mais tarde, então os trabalhos devem prosseguir até esgotar as 3 horas implicitamente previstas como duração destas reuniões da Comissão Permanente. Nessa altura, então, se verá ou decidirá que outras decisões poderemos ou deveremos tomar.
Esta é a posição do Partido Social-Democrata.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, era para dar também a nossa posição relativamente a esta questão.
É um facto notório que esta reunião foi prejudicada e por razões que nem sequer tiveram a ver com o quorum, mas por uma questão relacionada com a presidência, questão que foi colocada imediatamente antes de ser anunciado que a reunião teria de começar obrigatoriamente mais tarde. Creio que isto é já um facto para admitirmos o prolongamento dos trabalhos.
Para além disso, nós sempre daríamos o nosso acordo ao prolongamento dos trabalhos, desde que fosse proposto por qualquer grupo parlamentar, havendo como há um conjunto de matérias pendentes que conviria arrumar e que não serão muito demoradas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, parece que há consenso para prolongar a sessão, pelo que iremos realmente prolongá-la, embora tivéssemos entendido que seria necessário antes das 18 horas um requerimento nesse sentido.
Uma vez que há consenso, vamos prolongar a sessão.
Entretanto, e só para recordar, no período da ordem do dia nós ainda tínhamos mais dois pontos, segundo a agenda que tenho na minha frente, ou seja, a organização dos trabalhos parlamentares de 8 a 12 de Outubro e diversos, nomeadamente o eventual agendamento da proposta de lei do orçamento suplementar e debate sobre a temática da integração europeia.
Penso que o entendimento dos Srs. Deputados é no sentido de a sessão prosseguir até se esgotarem os pontos inscritos na agenda. É este o entendimento?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Não e esse o entendimento do Partido Social-Democrata, Sr. Presidente, isto é, não temos por entendimento que a reunião prossiga até esgotar a ordem de trabalhos e, além do mais, há matérias que aparecem agendadas na ordem dos trabalhos e que entendemos que não há razões para o estarem, porque foram ontem abordadas na reunião de líderes e, por consenso, decidiu-se o que se deveria fazer.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, é para dar a nossa opinião, que vai praticamente no mesmo sentido da do Sr. Deputado José Vitorino.
Foram incluídos nesta ordem de trabalhos pontos que efectivamente não tinham de o ser: a organização dos trabalhos parlamentares de 8 a 12 de Outubro está a ser trabalhada em reunião de líderes; quanto ao eventual agendamento da proposta de lei do orçamento suplementar ela ainda hoje não deu entrada, pelo que não pode sequer ser agendada. Logo, pela ordem, passaríamos necessariamente para o ponto seguinte, que é o debate sobre a integração europeia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa entende que devemos prosseguir os trabalhos até às 18 horas e 55 minutos e que seguidamente devemos proceder à votação do projecto apresentado pelo Partido Comunista e imediatamente a seguir proceder ao debate sobre a temática da integração europeia.
Como ainda temos mais duas intervenções antes da votação do projecto do PCP, eu daria a palavra ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Desculpe, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, mas é que não ficámos com a ideia precisa da proposta que o Sr. Presidente fez. Há limitação de tempo? Há um período até ao limite do qual a reunião vai decorrer e depois ver-se-á? Qual foi a proposta concreta de V. Ex.ª?

O Sr. Presidente: - Há efectivamente um período durante o qual a reunião vai decorrer, que é até às 18 horas e 55 minutos. Foi essa, de resto, a sua proposta, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Gostava de dizer algo sobre o projecto do Partido Comunista Português.
O que se passa no sector do ensino no nosso país e extremamente grave na sua globalidade como, aliás, ficou demonstrado nesta Assembleia da República, há 2 meses, quando o Governo não foi capaz de dar resposta adequada às questões levantadas e aos exemplos apontados no decurso da interpelação do MDP/CDE ao Governo sobre esta importante matéria.
Alertámos, na altura, para o que poderia acontecer em Outubro na nova época escolar se não fossem adoptadas medidas positivas e imediatas. Infelizmente tínhamos razão. Nada foi feito. Agora verifica-se que o novo ano lectivo não foi devidamente estudado e equacionados os problemas existentes, com vista à sua solução.
Todos sabem que milhares de crianças não dispõem de escola e de salas de aula e as que as têm estão a molho, em aulas superlotadas; faltam funcionários administrativos, o que origina o atraso da abertura de muitas escolas; muitos milhares de jovens não dispõem de condições mínimas para poderem estudar - sem laboratórios de física ou de química, sem laboratórios de ciências, sem ginásios, sem bibliotecas, sem salas de estudo, sem cantinas, sem locais para se poderem abrigar da chuva nos intervalos das aulas, como acontece no liceu de um dos meus filhos, já que não há estruturas para os alunos ocuparem os seus tempos livres; não se garante transporte escolar, dando-se, até, o lamentável caso de o Sr. Ministro da Educação louvar crianças que palmilham quilómetros e quilómetros diariamente para atingirem as suas escolas.
Os livros destinados aos nossos jovens atingem preços exorbitantes, sendo vulgar um livro ultrapassar 1000$, e, até, os 2 contos, o que origina que inúmeros estudantes não possam comprar livros, pelo facto de os pais não terem possibilidades económicas, o que concorre, também, para um maior insucesso escolar.
Acrescentam-se a todo este panorama péssimos horários, que culminarão este ano com o facto de crianças a partir do 9.º ano passarem a ter aulas nocturnas. Só quem não conhece as realidades do nosso país é que poderá achar esta decisão como óptima.
O País continua sem ser dotado de um plano estrutural de fundo, de uma reforma de ensino capaz.
Em vez disso, assistimos a constantes promessas governamentais e a reuniões feitas à pressa - segundo o próprio Ministro -, como as que estão a decorrer desde Agosto, quando um problema desta natureza tem de ser encarado com muito maior antecedência. Aliás, é o próprio Gabinete do Ministro quem afirma que só a partir de amanhã - ou seja dia 28 de Setembro, apenas a 3 dias do início das aulas - é que haverá no Ministério uma «visão global» do problema. Notem bem, Srs. Deputados: só amanhã é que o Ministério saberá o que realmente se passa.
O próprio Ministro da Educação, hoje mesmo, afirma a um seminário que até ao dia 8 de Outubro não abrirão todas as escolas. Aliás, o Sr. Ministro nessa mesma entrevista considera como causa da falta de escolas o desconhecimento que o Ministério tem do excesso de população e sobre o aumento da taxa de
natalidade. Isto demonstra, por si só, como o Governo não estuda atempada e aprofundadamente os problemas, não desenvolve um planeamento de fundo nem se dispõe a fazê-lo.
A situação é preocupante e lamentável. Tem reflexos imediatos, como os terá futuros, muito graves para todo o País.
Um debate sobre este gravíssimo problema impõe-se. Ë oportuno. Por isso, o MDP/CDE é favorável à abertura, nesta reunião da Comissão Permanente, de um debate para se apreciarem as condições em que se irá iniciar o próximo ano lectivo. Antes que a situação se deteriore a Assembleia da República deve apreciar tão magno problema e não esconder a cabeça como a avestruz. Este problema diz respeito a todos e mau será que os deputados não o encarem de frente.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vamos obviamente entrar na questão de fundo que foi colocada pelo Partido Comunista.
O problema situa-se antes de mais um pouco na área que o Sr. Deputado Nogueira de Brito já referiu. Estamos, sem dúvida, perante um entorse, uma tentativa de enviesamento face às interpretações legais, designadamente quando se refere, em termos constitucionais, que a Comissão Permanente tem por competência acompanhar a actividade do Governo. Obviamente que acompanhar a actividade do Governo se pode fazer por múltiplas formas, designadamente através de intervenções no período de antes da ordem do dia.
Não interessará muito esta questão. O Partido Comunista viu derrotado o seu primeiro projecto de deliberação, fez um segundo com algumas alterações pontuais e penso que, como já aqui foi dito, se o Partido Comunista quer discutir esta matéria - como é seu direito - apresenta um pedido de interpelação ao Governo e o debate far-se-á daqui a alguns dias, já com mais elementos sobre a matéria e sobre as eventuais deficiências do princípio do ano lectivo.
Deficiências sempre as houve, nem nunca as deixou de haver. Até hoje, todos os Ministérios da Educação foram criticados, e severamente criticados. Em relação ao Partido Comunista, além do mais, não é apenas O Ministério da Educação que é criticado, mas todos eles; está na oposição, faz o seu papel. Fá-lo com mais ou menos dureza, com mais ou menos demagogia, mas essa é uma questão que não nos admira.
Houve questões levantadas que podem ter algum fundamento. Naturalmente que as transferências de competências geram sempre situações de dificuldade, de acerto e também não é só isso. Há também outros aspectos a tratar quando se discutir a ratificação desses documentos - para além disso, ainda por outras formas regimentais que nós próprios iremos abordar -, designadamente no que respeita àquelas empresas que tinham legítimas expectativas em relação ao transporte dos alunos, que construíram algumas delas uma frota nessa expectativa, e que agora, repentina e subitamente, se vêem cerceadas dessa possibilidade, ficando numa posição francamente difícil. Há que perguntar quem é que indemniza essas empresas. É um problema que ainda está ...

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É um problema que ainda se tem de pôr, que ainda se tem que aprofundar e aprofundar bem, repito, porque há que ver se o Estado e ou não uma pessoa de bem.
Esse é um aspecto que me preocupa particularmente até porque sei que pelo País fora várias questões destas se têm colocado. Mas, de qualquer forma, achamos que a sede para se discutir esta matéria não é aqui, não é agora. Há formas regimentais para o efeito. O Plenário da Assembleia vai iniciar os seus trabalhos, por isso nós votaremos contra este projecto de deliberação do PCP. Não o fazemos por sermos contra o debate, mas porque achamos que esta é uma forma inviesada de querer abrir um debate sobre esta matéria e, além do mais, porque um debate sobre essa matéria, aqui na Comissão Permanente, sem menosprezo para a própria Comissão Permanente, seria um debate que nunca atingiria a dimensão e a profundidade que a matéria efectivamente justifica.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vou seguidamente porá votação o projecto dê deliberação apresentado pelo PCP.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, queremos pedir 2 minutos de interrupção dos trabalhos ao abrigo das disposições regimentais.

O Sr. Presidente: - Com certeza. A reunião está suspensa por 2 minutos.

Eram 18 horas e 24 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 18 horas e 26 minutos.

O Sr. Presidente: - Vamos, então, proceder à votação do projecto de deliberação apresentado pelo PCP.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e votos a favor do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vamos entrar agora no último ponto da nossa ordem de trabalhos, ou seja, no debate sobre a temática da integração europeia.
Tem a palavra, para se pronunciar sobre este tema, o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na última reunião da Comissão Permanente, anunciei a apresentação de uma proposta de deliberação sobre esta matéria e afigura-se-me que ela não só carece de alguma justificação como essa justificação precisará de ser, de algum modo, mais desenvolvida depois de uma intervenção aqui feita, há pouco, pelo Sr. Deputado Carlos Lage.
De facto, o Sr. Deputado Carlos Lage acusou esta proposta de deliberação de pretender inverter as posições e de não reconhecer ao Governo o mérito da abertura deste debate. Ora, creio que talvez devêssemos ter evitado esta questão porque ela me leva a ter de pôr a matéria com alguma clareza para recordar que, de facto, foi o Governo quem, utilizando mais uma vez uma situação que não parece de perfeita lealdade parlamentar, utilizou avisos ou indicativos feitos no próprio Parlamento para, depois, dizer que são seus. Neste caso concreto, assim aconteceu mais uma vez. Se poderia enumerar variadíssimas ocasiões em que deputados sugeriram, por diversas formas, um esclarecimento, uma informação generalizada sobre o debate da integração europeia, bastaria ler neste momento o registo feito para o Diário da Assembleia da República da reunião da Comissão Permanente do dia 6 de Setembro, ou seja, uma semana antes do comunicado do Conselho de Ministros.
O Sr. Deputado Basílio Horta, nessa sessão, anunciou expressamente, em nome do CDS, que, no início dos trabalhos parlamentares, tomaria a iniciativa de provocar um debate sobre a integração europeia dada a situação a que se tinha chegado quanto às negociações e ao desconhecimento delas. Vários deputados, entre eles eu próprio, nos manifestámos em apoio dessa posição do Sr. Deputado Basílio Horta.
O Governo vem agora, uma semana depois, ignorar completamente essa intervenção aqui feita na Assembleia, registada no Diário da Assembleia da República e dizer:
Nós tomamos a iniciativa de abrir um debate sobre esta matéria.
Assim não! E assim não ainda por uma segunda razão: porque tendo o Governo um Ministro encarregado das relações com o Parlamento, existindo também um Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares, é dificilmente compreensível que o Governo paute as suas relações com a Assembleia da República através de comunicados dos Conselhos de Ministros.
Creio que o mínimo que o relacionamento entre dois órgãos de soberania justifica é que, se o Governo estava na disposição de propor à Assembleia da República um debate, deveria fazê-lo através dos órgãos para esse efeito existentes e não permitindo aos deputados que conhecessem pelos jornais uma iniciativa do Conselho de Ministros que uma semana depois o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares lhes comunica.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Estas matérias têm alguma importância e têm-na especialmente quando a pressa surge 7 anos depois de iniciadas as negociações!... Enfim, creio que tudo tem os seus limites ... Não é com certeza um defeito do actual Governo, é de todos, que este debate se não tenha efectivado. Penso que há mérito do Governo em manifestar a sua disponibilidade para a realização do debate, mas tenhamos alguma moderação e não haja nenhum exibicionismo fácil em relação a uma iniciativa que, de facto, é uma resposta a pedidos, e pedidos insistentes, por parte da Assembleia da República.
Em segundo lugar, todos sabemos que há dificuldades de ordem regimental para a realização deste debate e não se diga que nenhum partido provocou uma interpelação, porque se essa forma regimental está à disposições dos partidos também à disposição do Governo estava uma moção de confiança sobre a integração europeia. Também essa nunca foi pedida. O debate não se realizou porque, efectivamente, de parte a parte se encontraram dificuldades para a sua realização. Parece que neste momento o podemos efectivar, vamos então efectivá-lo e façamo-lo com

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todas as garantias de seriedade. E entre essas garantias de seriedade há uma que é indispensável - os deputados que não fazem parte da Comissão de Integração Europeia talvez não saibam, mas os que fazem parte da Comissão sabem com certeza: é que há sucessivas insistências de deputados (e eu incluo-me nesse número), feitas a todos os títulos oficiais e particulares, e a última informação escrita que o Governo prestou h Comissão de Integração Europeia sobre o estado das negociações tem data de 25 de Julho de 1983, ou seja, desde 25 de Julho de 1983 que o Governo não informa a Assembleia da República sobre o estado das negociações.
Sejamos claros! Se se pretende um debate com seriedade, com objectividade, com um mínimo de profundidade, que o mesmo não se traduza num mero suscitar de discursos sem significado, numa sessão aclamatória, ou declamatória ou condenatória mas que possa permitir aos Portugueses conhecerem - e vai sendo tempo de conhecerem - as implicações da adesão europeia. Creio que esse debate tem de ser feito com conhecimento de causa.
Quando a carta do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares fala em suscitar um debate para informação, creio que está a reconhecer essa deficiência de informação por parte do Governo, mas creio que, para que o debate se possa fazer, então é necessário que um mínimo de informação seja prestado atempadamente. F visto que a documentação existe, é fácil com certeza fotocopiá-la e fornecê-la à Assembleia da República, que tem o direito de conhecê-la, para que, através dela, a conheçam todos os portugueses.
Por isso, a proposta de deliberação que formulamos enuncia alguns pontos concretos mínimos que devem ser reconhecidos como preparação desse debate e que levantam as questões a nosso ver essenciais para que esse debate possa ser travado com profundidade. E, quando dizemos para que o debate deva ser travado com profundidade, não estamos obviamente a transferir o debate para as calendas gregas. Não! Nós pensamos que este debate é urgente, que ele está atrasado mas que é possível, se houver de facto vontade política para fornecer esta documentação; a documentação existe e está depositada no Secretariado da Integração Europeia, que tem condições para relatar ponto a ponto as várias posições assumidas. Aliás tem-nas escritas e por isso é só fotocopiá-las e fornecê-las à Assembleia da República amanhã, se assim for julgado útil e pertinente.
Creio, portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a última coisa que importa saber é como é que deve ser organizado este debate. Pela nossa parte, pensamos que um debate desta natureza e desta profundidade, deve ter uma formulação muito semelhante - e todos os partidos se deveriam pôr de acordo nesse sentido para que não seja necessária uma alteração do Regimento - nos mesmos termos ou em termos similares aos do debate sobre o Programa do Governo. Pensamos que só assim um debate destes pode ser feito com profundidade, com extensão, dando a todos oportunidade de se pronunciar. E creio estar tanto mais à vontade para pôr todas estas questões quanto terei sido das primeiras pessoas, já de há muitos anos, a defender com alguma decisão e algum empenhamento a adesão europeia. Fi-lo quando isso era difícil, fi-lo quando isso era acusado de traição a ideais ultramarinos e de expansão colonial, creio que estou agora
mais à vontade ainda para continuar a fazê-lo e para formular as críticas que formulei em relação à falta de informação à Assembleia da República sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições sobre esta matéria ...

O Sr. José Vitorino (PSD): - O Sr. Presidente dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - É apenas para fazer uma nota breve.
Esta matéria já ontem foi discutida na reunião de líderes e a maioria sempre concordou com a necessidade de se debaterem, de se aprofundarem e de se esclarecerem estas questões. Também estamos de acordo em que o debate se processe com tempo bastante para o aprofundamento das diversas matérias. Julgo que já ontem ficaram criadas todas as condições para que o debate se possa fazer com dignidade, com realização dos deputados e interesse para o País e, portanto, julgo que o problema não merece neste momento particular polémica.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE:) - A propósito do que disse o Sr. Deputado José Vitorino e também o Sr. Deputado Magalhães Mota, tenho a dizer o seguinte: o Sr. Deputado José Vitorino referiu uma reunião havida ontem (a conferência dos representantes dos grupos e agrupamentos parlamentares), mas acontece, Sr. Deputado José Vitorino, que hoje houve uma reunião importante da Comissão de Integração Europeia, que emitiu um parecer, aliás aprovado unanimemente - não sei se está na sua mão -, em que a Comissão recomenda à Comissão Permanente que se observe uma série de normas consideradas fundamentais para esse debate.
Acontece também, Srs. Deputados, que um debate desta natureza não pode ser feito desta maneira e a proposta de deliberação apresentada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota vem exactamente ao encontro de preocupações que hoje foram manifestadas na Comissão de Integração Europeia, na qual estavam representados todos os partidos da Assembleia da República. Nessa reunião foi exactamente considerado como importante solicitar ao Governo toda uma série de informações. Vai haver com certeza uma reunião prévia com o Sr. Primeiro-Ministro e com o Sr. Ministro das Finanças e possivelmente com o presidente da Comissão Europeia com a Comissão de Integração Europeia aqui, na Assembleia da República, reunião prévia ao debate parlamentar no plenário por se tratar de um debate que tem de ser bem preparado. No entanto, não poderá ser marcado pela conferencia de líderes, nem sequer a data poderá ser escolhida, porque, realmente, só depois de a Comissão de Integração Europeia receber todos esses documentos que vai solicitar ao Ministério, só depois de haver esse encontro preliminar prévio com membros do Governo, só depois de bem preparado esse debate, é que ele poderá ter lugar, embora tenha de ser feito com a máxima urgência,

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isto é, antes da última semana de Outubro, pois prevê-se que para fins de Outubro haja uma assinatura do acordo. De resto, o debate poderá ser importante para o próprio Governo, que poderá até inflectir a sua posição em relação a certas matérias. Creio, portanto, que esta proposta de deliberação do Sr. Deputado Magalhães Mota é extremamente importante e vem ao encontro das preocupações de todos os deputados dos grupos e agrupamentos parlamentares que integram a Comissão de Integração Europeia. Aliás, também terá de ser considerado o parecer que foi mandado para a Comissão Permanente pela Comissão de Integração Europeia, onde se manifestam certas preocupações e se fazem certas recomendações. Por isso, creio que esta proposta de deliberação do Sr. Deputado Magalhães Mota é importante, como é importante tudo o que ele disse em relação à insistência com que deputados de diversos partidos solicitaram, ao longo dos tempos, um debate aprofundado sobre esta matéria. É inadmissível que ao fim de sele anos e tal de negociações com a CEE, nunca tenha havido um debate na Assembleia da República. É caso único, nunca aconteceu em nenhum Parlamento dos dez países da Europa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Quero, em primeiro lugar salientar que a iniciativa que o CDS tomou nesta matéria, e que foi expressa por V. Ex.ª na primeira reunião da Comissão Permanente, vinha, aliás, no decurso de outras que já tínhamos tomado no âmbito da Assembleia da República e que a iniciativa do Governo, a que não queremos retirar mérito, não é senão numa tentativa de resposta a esta iniciativa. Seria bom, no entanto, que, a propósito deste tema que estamos agora a discutir, com vista a aprovar a realização do debate - não sei se vamos votar o projecto de carta de resposta que a ASDI apresentou, mas nesta perspectiva era bom que o Governo a recebesse ...! - seria bom, dizia, que o Governo esclarecesse perante a Assembleia o sentido da sua iniciativa, porque hoje fomos confrontados com notícias de acordo com as quais teria sido entregue em Bruxelas uma missiva do Governo Português na qual se pretendia que, independentemente do resultado das últimas negociações, tosse considerada a irreversibilidade do processo e que, inclusivamente, se apontasse no sentido de fazer uma certificação do acordo, independentemente da conclusão da negociação de todos os dossiers. É este o sentido de uma notícia que tenha na minha frente, que vem publicada no Diário de Notícias e que me parece que realmente servirá para caracterizar a iniciativa do Governo.
O que é que o Governo pretende afinal? É vir à Assembleia pôr-nos perante um facto absolutamente consumado, mesmo no que toca à conclusão dos processos que ainda não estão concluídos e que seriam concluídos antes de o Governo vir aqui à Assembleia? Seria bom que isto fosse esclarecido por quem tiver possibilidades de o fazer. E nessa perspectiva suponho que seria bom, como conclusão deste nosso debate, que votássemos o projecto de carta que a ASDI apresentou.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Creio que uma deliberação no sentido de se fazer um debate parlamentar começa a ser supérflua, visto que existe um acordo generalizado de que esse debate se deve fazer e já existem, inclusivamente, iniciativas para dar corpo a esse debate.
Ficamos a saber, por uma intervenção muito útil do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que a Comissão de Integração Europeia já se reuniu e já decidiu convidar o Governo para estar presente numa reunião, a fim de obter um certo tipo de informações para preparar esse debate, que terá lugar no Plenário da Assembleia da República. De forma que volto à questão que coloquei quando pedi o prolongamento desta reunião.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado, permita-me que o interrompa?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Mas o Governo pretende vir à Comissão de Integração Europeia antes do início do debate; antecipou-se mesmo a qualquer convite da Comissão de Integração Europeia.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Ah, bom ... O Governo também tomou a iniciativa de pedir à Comissão de Integração Europeia uma reunião. Estamos, portanto, mais numa zona de convergência, o que é saudável.

Risos.

Passando ao problema da necessidade de tomar esta deliberação, começo a considerá-la supérflua e já na conferência dos líderes parlamentares o Sr. Deputado Carlos Brito disse - se me é permitido fazer aqui essa citação - que a um debate desta importância não podem ser apresentados embaraços regimentais, porque, moldando ele, de alguma maneira, o futuro do País, teríamos de rever o próprio Regimento.
E volto àquilo que disse quando pedimos o prolongamento da reunião: ou não tomamos hoje nenhuma deliberação, porque já entendemos que se vai fazer esse debate - já a conferência de líderes parlamentares perspectivou mais ou menos a data desse debate, a Comissão de Integração Europeia também já tem uma iniciativa em curso, e o Governo, segundo informações recebidas, vai dar informações aos partidos - e ficamos por aqui, ou, a termos de tomar uma deliberação, lamento, mas temos de votar contra a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota. .Isto porque 'temos uma proposta anterior que se limita a dizer o seguinte:
- A Comissão Permanente da Assembleia da República pronuncia-se favoravelmente sobre a realização de um debate parlamentar relativo à integração na CEE, já proposto pelo Governo em carta enviada ao Sr. Presidente da Assembleia da República.
Ou seja, tomaríamos a deliberação pura e simples de se realizar o debate.
Quanto aos aspectos de carácter preparatório e organizativo, entendemos que eles competem à conferência de líderes parlamentares, visto que a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, querendo abarcar tudo,

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pode deixar coisas de fora, é evidente! Os pontos que o Sr. Deputado Magalhães Mota define como necessários para um esclarecimento e um debate com o Governo até são úteis mas poderão ser usados na reunião da Comissão de Integração Europeia, nas reuniões com o Governo, onde serão com certeza colocadas estas questões e outras mais, e no debate parlamentar a mesma coisa. Concluo, pois, que é um pouco perigoso dizer já numa deliberação da Comissão Permanente sobre o que é que o Governo deve ou não deve informar. Além disso, poderia até colocar-se o problema da legitimidade de se estar aqui a querer estabelecer um espartilho ao Governo sobre o que é que deve dizer, aos partidos sobre o que é que devem perguntar; em princípio, ficar-se-ia espartilhado ...
Parece-me, portanto, que a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, embora sendo bem intencionada e até sendo útil para nortear, de alguma maneira, na Comissão de Integração Europeia, algumas questões a pôr ao Governo, não é susceptível de uma deliberação.
Evidentemente que aceitaríamos - se se quiser tornar a deliberação mas insisto que me parece perfeitamente supérflua - pôr na nossa proposta um parágrafo final nos seguintes termos:
A Comissão Permanente considera necessário, para que o referido debate decorra com o vigor e a profundidade desejáveis, que seja precedido de uma informação completa sobre as negociações já efectuadas ou em curso.
ou seja, uma deliberação também genérica da Comissão Permanente no sentido do rigor e da informação completa. Isto corresponde, de algum modo, ao último parágrafo da proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota e da própria deliberação da Comissão de Integração Europeia, que, no último ponto diz:

[...] recomendar que, para que o debate possa decorrer com o rigor e a profundidade desejáveis, seja preparada uma informação completa e atempada das negociações efectuadas e em curso (ponto n.º 3 da deliberação da Comissão de Integração Europeia).

Resumindo: ou a Comissão Permanente não toma qualquer deliberação dada a sua desnecessidade, ou, a tomar-se uma deliberação, nós vamos votar contra a proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota pelas razões que já indiquei e acrescentaremos à nossa proposta de deliberação o parágrafo que já li e que é subscrita conjuntamente por nós e pelo PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queremos dizer que estamos de acordo com muitas das considerações que foram feitas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota na apresentação da sua proposta de deliberação, diria mesmo com quase todas, particularmente com as considerações com que iniciou as suas alegações e quando insistiu em sublinhar a precedência das iniciativas parlamentares nesta matéria: aquela que citou, outras anteriores e até uma proposta de deliberação por nós apresentada nesse mesmo dia 6, em que se fazia uma referência expressa à questão das negociações com a CEE e que foi rejeitada pelos 2 partidos que apoiam o Governo. Ê uma nota importante e cremos também que outras considerações que foram produzidas têm bastante interesse, estando nesse caso algumas considerações, notícias e apreensões que aqui foram trazidas pelos Srs. Deputados Nogueira de Brito e João Corregedor da Fonseca.
Em todo o caso, temos algumas apreensões em relação ao texto que nos é proposto pelo Sr. Deputado Magalhães Mota. Não é manifestamente uma «carta», como lhe chama o Sr. Deputado Nogueira de Brito, pois tem uma série de instruções internas que não são para o Governo mas sim para a Assembleia da República. Começa por ser um voto de regozijo, depois é uma recomendação, depois, mais adiante, é uma proposta de deliberação, quando se refere à figura regimental dentro da qual os debates se realizariam, e finalmente também mandada a conferência dos grupos parlamentares relativamente a algumas questões. É realmente um texto muito complexo e, quanto a nós, cabe mal nas competências da Comissão Permanente.
Entendemos e vimos a vantagem de se aprovar alguma coisa mas em relação a este texto temos algumas dificuldades, nomeadamente em relação à alínea 6) do n.º 2, isto é, à figura regimental. Ontem discutimos esta questão na conferência dos grupos parlamentares, onde afirmei aquilo que o Sr. Deputado Carlos Lage me atribuiu, mas a figura que então utilizei foi considerada uma hipótese de trabalho. Mas, por exemplo, a possibilidade de se fazer o debate sob a forma de uma interpelação, como institucionalizá-la, é outra questão que gostaríamos de ponderar.
Portanto, parece-nos muito precipitado estarmos a deliberar, já neste momento, nos termos que são propostos na alínea b) do n.º 2 da sua proposta.
Na verdade, entendemos que seria bom aprovar alguma coisa e tendo sido aprovada, hoje de manhã, na Comissão para a Integração Europeia, um texto que nos parece bastante sério e adequado à circunstância, creio que a Comissão Permanente poderia tornar seu este texto e dar-lhe mais força, visto que já foi aprovado por uma Comissão. Talvez isso preenchesse a preocupação que aqui nos foi trazida pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, sem incorrermos nos escolhos e nas dificuldades da proposta que nos é trazida pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.
Quero dizer, finalmente, em relação à proposta do Sr. Deputado Magalhães Mota, que nós acolhemos com muito respeito toda uma série de sugestões, que aqui são feitas, sobre como o debate deve decorrer, e isto devia tornar-se em verdadeira exigência da Assembleia da República,. No entanto, votar este texto é que, quanto a nós, constitui uma dificuldade insuperável.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sou sensível a alguma da argumentação que foi produzida neste debate e penso que, em todo o caso, teremos avançado algumas coisas e recolhido alguns instrumentos de trabalho quanto à preparação do debate.
Pela minha parte, preferiria a última sugestão apresentada, ou seja, a adopção, como texto da Comissão Permanente, do texto do parecer da Comissão de

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Integração Europeia. Creio que essa deliberação é suficiente como deliberação genérica da Comissão Permanente. Penso que os Srs. Deputados ficarão habilitados com o elenco da matéria que não considero exaustivo - a própria Comissão de Integração Europeia hoje pediu alguns elementos que não constam desta proposta, mas que, em todo o caso, constitui um roteiro para os Srs. Deputados. Assim, não estou de modo nenhum arrependido de que o meu agrupamento parlamentar tenha elaborado a proposta que subscrevi.
Assim sendo, se for apresentada uma proposta de assunção como deliberação pela Comissão Permanente do parecer da Comissão de Integração Europeia, pela minha parte retirarei a proposta de deliberação apresentada e votarei essa proposta.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, pode concluir-se, portanto, da sua intervenção que desiste do seu projecto de resposta - eu não chamaria mais carta -, aderindo, antes, à aprovação pela Comissão Permanente do parecer da Comissão de Integração Europeia?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Exactamente. O Orador: - Muito bem, estou esclarecido.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu tinha algumas considerações a fazer, as quais já perderam oportunidade face às últimas propostas do Partido Comunista e, por último, da aceitação que o Sr. Deputado Magalhães Mota fez ao retirar a sua proposta.
A maioria já trocou impressões sobre esta matéria e o Sr. Deputado Carlos Lage, que é o primeiro subscritor da proposta que apresentámos, poderia formalizar a aceitação do parecer da Comissão de Integração Europeia e a retirada da proposta que apresentámos.
De qualquer forma, o Partido Social-Democrata entende que os termos em que o parecer da Comissão de Integração Europeia foi proferido servem e adaptam-se perfeitamente aos objectivos de todos os grupos e agrupamentos parlamentares, e só acrescentava que
está implícito que a organização do debate será feita na reunião de líderes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado José Vitorino já definiu qual é a posição da maioria. De facto, não temos nenhuma dificuldade em retirar a nossa proposta e em assumirmos a da Comissão de Integração Europeia, porque são sensivelmente iguais. Ou seja, com o acréscimo que fizemos à nossa proposta, que é equivalente ao n.º 3 da proposta da Comissão de Integração Europeia, elas são sensivelmente idênticas e esta última preenche perfeitamente os objectivos e as intenções da nossa proposta feita na reunião anterior da Comissão Permanente. Para acelerarmos os nossos trabalhos e chegarmos a uma deliberação positiva, retiramos a nossa proposta e subscrevemos a da Comissão de integração Europeia, a qual poderá constituir, assim, deliberação da Comissão Permanente.

O Sr. Presidente: - Estão, portanto, retiradas as duas propostas e, consequentemente, apenas fica de pé a confirmação, se assim se pode chamar, ou a adopção, pela Comissão Permanente do relatório da Comissão de Integração Europeia.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Naturalmente, iremos aprovar os pontos 1, 2 e 5 da proposta e não, propriamente, o preâmbulo, porque este diz: «A Comissão hoje reunida [...]»

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Portanto, está em votação o parecer da Comissão de Integração Europeia na redacção actual dos seus pontos 1, 2 e 3.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos, pelo que declaro encerrada a reunião.

Eram 18 horas e 58 minutos.

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