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6562 - I SÉRIE - NÚMERO 150

bem não vejo a necessidade de criar uma autoridade nacional de segurança para depois se escrever na alínea seguinte que ela é o Primeiro-Ministro. Então não será sempre este que, no fundo, é o responsável por todos os actos e iniciativas do governo a que preside, incluindo a elaboração do presente projecto de lei? Quem conhece o passado do Dr. Mário Soares ficará, decerto, de boca aberta ao passar os olhos pelo artigo 5.º, referente às «medidas especiais de segurança».

Na opinião de Oliveira Marques, o diploma sobre segurança interna agora em apreciação «continua por não definir quem superintende nas policias», muito embora fale no chamado Conselho Superior de Segurança e Protecção Civil.
«Se essa atribuição está cometida ao Ministro da Administração Interna, também não acredito que se vá muito longe», observa, cepticamente, aquele especialista, adiantando que a coordenação das polícias «deve ser incumbida a um técnico, e não a um político, que é substituído ao sabor das mudanças políticas e governamentais».
Então o que dizer das medidas consideradas arbitrárias por muitos juristas e políticos, que estão contempladas no diploma e que violam não só a Constituição, como até a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a que Portugal aderiu por iniciativa do PS durante um governo presidido por Mário Soares?
«Não me parece, na verdade», acentua Oliveira Marques, «que, face à criminalidade existente em Portugal e mesmo que se tenha comprovado a total ineficácia das polícias e do sistema judiciário, numa lei normal sejam invocados poderes excepcionalmente gravosos para as liberdades e direitos dos cidadãos. Que o estejam em leis especiais que enquadrem associações de malfeitores que ponham em perigo o normal funcionamento do Estado democrático!»
Paralelamente à aprovação desta lei e com ela intimamente relacionado, o Governo pretende ver criado o Serviço de Informações de Segurança, cujo diploma foi já aprovado na generalidade pela maioria, encontrando-se agora na comissão parlamentar para exame na especialidade. Oliveira Marques, embora concorde com a existência de tal serviço, considera, no entanto, «aberrante» a forma como a comissão parlamentar de controle às suas actividades é composta, ou seja, por maioria:

Em minha opinião, essa circunstância é muito grave, uma vez que permite uma nítida partidarização de um serviço que deveria apresentar uma grande limpidez e transparência. Por isso é que, quanto a mim, essa comissão de controle deveria ser composta proporcionalmente por deputados de todos os partidos com assento parlamentar.
Há regras básicas a seguir [prossegue], e é assim que na maioria dos países democráticos os serviços não dependem deste ou daquele ministro, mas apenas da lei e dos seus directores. Por isso, a forma de nomeação destes terá de ser acautelada, num grande equilíbrio e transparência de processos. E não há que ter receios.
E não há que ter receios porquê? Oliveira Marques adianta:

O Primeiro-Ministro, na qualidade de responsável superior pela «política de informações», poderá sempre invocar o segredo de Estado face à tentativa da comissão parlamentar de «penetrar» no interior dos serviços. E, mesmo que a maioria decida fazê-lo, os deputados ficarão, de qualquer modo, vinculados ao «segredo de Estado», sujeitando-se a sanções legais caso utilizem para fins pessoais informações que por essa via vierem a obter.

Um outro factor reputado como importante para o nosso interlocutor é «a necessidade de retirar toda a componente policial ao serviço de informações, pois não se trata de um qualquer policia: não prende, não interroga, nem tão-pouco é agente de investigação judiciária».
É agente de delatores, «bufos», denunciantes, ou outras quaisquer designações que se lhe queiram atribuir? Não poderá haver o risco de, pelo menos, uma parte significativa de cidadãos ser apanhada nessa «teia» só porque participou em quaisquer actividades «subversivas» ou «antidemocráticas», consoante os interesses e conveniências em jogo num dado momento? Em suma, a criação de um tal serviço de informações poderá transformar-se num convite à delação? A esta questão aquele oficial dos comandos respondeu:

Penso que não. É apenas um convite à colaboração. E que não há país nenhum dotado de um serviço de informações que não disponha de uma rede capaz de informadores.

E acrescenta:

Ora, as informações obtêm-se por dois processos: ou através de infiltração, ou por vigilância, nas suas mais diversas formas. Quer uma, quer outra, apoiam-se em pessoal e meios técnicos. Em termos de serviços, 80 97o das informações recolhidas são o que nós chamamos «abertas» e 20 % são «cobertas». Quer dizer que apenas uma pequena parte necessita de meios mais sofisticados, e é no âmbito desses 20 % que se balanceia o legal e o ilegal. Eu prefiro, no quadro actual da segurança do País, remeter-me à parte legal.

E se lhe perguntasse se as informações obtidas através de meios mais sofisticados (portanto, em princípio, as mais importantes e valiosas) poderão envolver métodos menos ortodoxos e até ilegais? - perguntámos.
Oliveira Marques, sorrindo, concluiu: «Depende ..., mas poderá acontecer.»

2.17: ANTÓNIO ARNAUT( *) («O JORNAL», 20.7.84)
A proposta de lei de segurança interna em discussão na Assembleia da República provocou as mais duras críticas e profundas apreensões na consciência

(*) Ex-deputado, ex-dirigente e cofundador do PS.