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3212 I SÉRIE - NÚMERO 86

ilha de Sanchão, S. Francisco Xavier se despedia da terra com palavras de esperança, na fronteira de dois mundos, em face da então impenetrável China. Que esta, grande potência habituada secularmente à gestão dos grandes espaços, poderia sempre tomar as medidas que entendesse a respeito do pequeno território entregue à responsabilidade de um pequeno país, não era ignorado por ninguém; mas que a China, um Estado mestre na arte da diplomacia, cuidadoso sempre de manter a face, pudesse considerar o problema de Macau igual ao de Hong-Kong e prioritário em relação à Formosa, onde lida com interlocutores de maior porte, não parecia provável tendo em conta a ideia que transmite da dignidade com que enfrenta os problemas internacionais nas relações com as grandes potências, nem parecia necessário na coerência das relações que secularmente manteve com Portugal.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O imprevisto deve ter esse aspecto só porque ignoramos os factos, visto que o respeito que a China inspira, o sentido da responsabilidade com que reentrou na comunidade internacional em mudança, não deixam supor que gratuitamente quisesse adoptar o procedimento que objectivamente nos desgosta em vista das circunstâncias. É certo que as informações conhecidas sobre a política chinesa referente às Special Economic Zones (SEZs), elemento central da estratégia que desenvolve desde 1979 para atrair investimentos estrangeiros e tecnologia externa, mostravam que Macau seria um elemento da Zhuhai Special Economic Zone, mas daí não decorria necessariamente ter de alterar a posição de Portugal, sempre cooperante. De resto, esta política parece apenas secundária e auxiliar do grande objectivo de estabilizar e desenvolver as suas relações económicas com os Estados Unidos da América, Japão e Ásia, de modo a criar uma área regional para o desenvolvimento económico da China no Pacífico. Parece, todavia, estar a caminho de fazer vencimento a tese publicamente exposta, há cerca de 1 ano, em Macau, pela gerência da empresa Nan Kwong, que preconizava a recuperação de Macau pela soberania da China, obedecendo a estas simples regras: «Um país, dois sistemas»; «Macau governado pelos próprios habitantes»; «Manutenção do sistema capitalista por 50 anos após o retorno da soberania à China»; «Oficialização da língua chinesa».
As notícias que nos chegam sobre a evolução das relações de Portugal com a China parecem anunciar ao Parlamento, que recusa a revisão constitucional, uma derrogação de alguns preceitos sem que a sua intervenção seja necessária. Neste caso, porém, o poder normativo dos factos não se manifesta à margem da intervenção dos homens, e a Assembleia parece dever estar preparada para avaliar a responsabilidade dos agentes da soberania, decidir sobre se os interesses portugueses, em primeiro lugar, e os interesses comuns da China e de Portugal foram e vão ser servidos da maneira mais conveniente e possível. Perguntas para as quais deveríamos ter ao nosso dispor os elementos de que efectivamente não dispomos, a começar pelos textos dos acordos que actualmente regem as relações entre os dois países, e cujo articulado nunca foi comunicado a esta Câmara.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não parece aceitável que matéria de tanto melindre para os interesses de Portugal, e de tanta importância que o texto constitucional se lhe refere em mais de um passo, esteja regido por documentos que parecem resguardados pelo segredo de Estado, a tal ponto que órgãos da soberania como é a Assembleia da República, possam ser eles próprios surpreendidos com a sua aplicação e desenvolvimento.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Nesta intervenção não se trata de fazer julgamentos sobre acções desconhecidas, nem sobre um processo ignorado, nem sobre circunstâncias não declaradas, mas simplesmente de tornar evidente que em matéria de tanta monta o Parlamento nem sequer está informado sobre um elemento fundamental, o qual é um acordo que obriga internacionalmente dois países que há séculos convivem intimamente, prestando um serviço ao conhecimento e entendimento do Ocidente com o Oriente.
Apenas para recordar a antiguidade das nossas relações com a China, lembraremos que foi em 1508 que D. Manuel I instruiu o comandante da frota Diogo Lopes de Sequeira, encarregado de fazer descobrimentos na região entre Madagáscar e Malaca dizendo-lhe: «Perguntareis pelos chins, e de que parte vêm, e de quão longe.» Mas o ano de 1554 é um ponto de referência fundamental nas relações de Portugal com a China, porque foi nessa data que o capitão Leonel de Sousa assinou com o Governador de Cantão um «assentamento» regulando os interesses mútuos e marcando os primeiros contactos com Macau, chamado Baía do Espelho em Forma de Concha, ou Porta da Baía do Espelho de Água, ou Porto da Deusa A-Ma, rainha dos céus e padroeira dos navegantes. Quando, em 1583, os moradores de Macau se organizaram em moldes municipais e instituíram um Senado da Câmara, cujos membros elegiam, deram origem à primeira República Democrática do Oriente, mais tarde (1586) chamada Cidade do Nome de Deus na China, com os mesmos privilégios de Évora, a qual cidade mereceu de D. João IV a divisa «Não há outra mais leal», e o qual Senado recebeu de D. João VI, em 1810, pela sua firmeza, a designação, única em todo o Império, de Leal Senado. Nada tem de comum, portanto, com as instalações estrangeiras na China baseadas nos «tratados desiguais», como em Cantão, Amoi, Fuchau, Mingho e Xangai, depois da guerra do ópio (1839-1844).

Aplausos do CDS.

Por isso foi respeitada pela República de 1912, e pela República Popular em 1949.

O próprio Mao-Tsé-Tung afirmou ser «Portugal o único país da Europa que permaneceu na China sem nunca lhe ter feito guerra».
Durante os anos que decorreram entre a admissão de Portugal na ONU e a Revolução do 25 de Abril, nunca a 4.ª Comissão da Assembleia Geral, nem o Conselho de Tutela, nem as várias conferências anticolonialistas que entretanto se realizaram em vários lugares do mundo, se atreveram a incluir Macau entre os territórios cujo destino estaria na sua competência, nem a China consentiu alguma vez em deixar qualificar de colónia a cidade dos portugueses. Nada, na presença portuguesa, ofendeu a sua dignidade de grande país, sede de uma grande cultura, e uma voz portu-

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