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DIÁRIO

Da Assembleia da República

Sexta-feira, 31 de Maio de 1985

III LEGISLATURA

2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE MAIO DE 1985

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas

António Roleira Marinho

José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às IO horas e 30 minutos.

Antes do ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação e resposta a vários requerimentos, bem como da apresentação de vários diplomas.

A Sr.ª Deputada Mariana Lanita (PCP), a propósito da comemoração no próximo sábado do Dia Mundial da Criança, alertou a Assembleia para as situações dramáticas e degradantes em que vivem muitos milhares de crianças no nosso país.

A Sr.ª Deputada Rosa Albernaz (PS) chamou a atenção da Assembleia para a necessidade de o poder central prestar particular atenção às carências e condicionamentos do concelho de Espinho, estimulando a sua vocação turística, melhorando a sua rede viária, bem como construindo infra-estruturas desportivas que respondam ao crescente movimento desportivo e de recreio, que são grandes aspirações da cidade. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Portugal da Fonseca (PSD) e Horácio Marçal (CDS).

O Sr. Deputado João Amaral (PCP) considerou a necessidade de corrigir um erro no mapa vi do Orçamento do Estado, em virtude do qual um conjunto de 30 municípios ficariam a receber, a título de Fundo de Equilíbrio Financeiro, verbas que, em relação a 1984, representariam acréscimos inferiores a 10 % e, como tal, em violação do artigo 59.º da Lei Orçamental.

O Sr. Deputado Neiva Correia (CDS) acusou o Ministério da Administração Interna de governar por manipulação, pressões e factos consumados, bem como de esvaziar, à revelia das leis, os Serviços de Fomento da Assembleia Distrital de Lisboa, contradizendo-se entre a retórica da regionalização e a prática de jacobinismo centralista do Governo.

O Sr. Deputado Faria dos Santos (PSD) referiu-se à necessidade do desenvolvimento e estruturação da formação profissional no sector das pescas, relançando o ensino profissional ao nível das principais comunidades piscatórias. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Carlos Espadinha (PCP).

A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE), a propósito dos trágicos incidentes verificados ontem em Bruxelas durante o desafio de futebol entre o Juventus e o Liverpool, transmitidos directamente pela televisão, apelou à Assembleia no sentido de essa intervir junto da RTP fazendo pressão sobre a ideia de que a agressão só pode gerar agressividade e que não há necessidade de se repetir a transmissão daquelas imagens. Respondeu no fim a pedidos
de esclarecimento dos Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), Carlos Lage (PS), Nogueira de Brito (CDS), Amélia de Azevedo (PSD), Jorge Lemos (PCP) e César Oliveira (UEDS).
O Sr. Deputado José Lelo (PS), o propósito das remodelações do Aeroporto de Pedras Rubras, defendeu que as mesmas se processassem numa perspectivo integrada, de que as ligações em termos de transportes suburbanos de ligação ao Porto será um aspecto relevante, nomeadamente as ligações ferroviárias.

Ordem do dia. - Foi aprovado o pedido de prorrogação do prazo por mais 15 dias formulado pela Comissão Eventual de Inquérito à Torralta para conclusão dos seus trabalhos.

Foram igualmente aprovadas as contas da Assembleia da República de 1984.
Conclui-se a discussão das ratificações n.º 144/III, l46/III e l47/III, respectivamente, do PCP, do PSD, do PS e do CDS, relativas ao Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, que aprova o Código do direito de Autor e dos Direitos Conexos.
Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro da Cultura (Coimbra Martins), os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), José Niza (PS), Luís Francisco Rebelo (PCP), Margarida Salema (PSD). José Manuel Mendes (PCP), Magalhães Mota (ASDI) e Hasse Ferreira (UEDS).
Foi, depois, aprovado um projecto de resolução do PCP, no sentido da suspensão de alguns artigos do decreto-lei em ratificação e da repristinação de correspondentes normas constantes do Decreto-Lei n.º 46 980 e da Lei n.º 41/80.

O Sr, Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.

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I SÉRIE - NÚMERO 87

Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António do Manuel do Carmo Saleiro.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto Händel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Rosado Correia.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Monteiro Picciochi.
Teófilo Carvalho dos Santos. Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Agostinho Correia Branquinho.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cecília Pita Catarino.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Monteiro Amaral.
João Evangelista Rocha de Almeida.

Jão Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José de Almeida Cesário.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Francisco Rebelo.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
José Luís Nogueira de Brito.

Manuel António Almeida Vasconcelos.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
Francisco Alexandre Pessegueiro.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

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ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

De Francisco Luís Martins, referente à sua integração como funcionário dos caminhos-de-ferro.

Ofício

Da Câmara Municipal da Moita, protestando contra a transferência de verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro para aquela autarquia.

Telegrama

Da Real República de Lysos, apelando à urgente publicação da lei referente às casas fruídas pelas repúblicas de estudantes.

Telex

Do Secretariado da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Químicas e Farmacêuticas, manifestando solidariedade com os trabalhadores da Reforma Agrária.

Deliberação

Da Câmara Municipal de Coimbra, exarando um voto de pesar pela morte do Prof. Doutor Carlos Alberto da Mota Pinto.

Mensagem

De agradecimento do Presidente da República Federativa do Brasil, Dr. José Sarney, em resposta ao voto de pesar aprovado por unanimidade por esta Assembleia da República por ocasião do falecimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves.

O Sr. Secretário (Roleira Marinho): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Neiva Correia; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Adriano Moreira; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Carlos Brito e Margarida Tengarrinha; à Secretaria de Estado das Pescas (2), formulados pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha; ao Governo, formulado pela Sr.ª Deputada Rosa Albernaz; aos Ministérios da Indústria e Energia e das Finanças e do Plano (2), formulados pelo Sr. Deputado João Amaral; à Secretaria de Estado das Obras Públicas, formulado pelo Sr. Deputado Maia Nunes de Almeida; ao Ministério da Educação e ao Governo (2), formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Cachado e outros; à Câmara Municipal da Nazaré, formulado pelo Sr. Deputado Gomes dos Santos; à Direcção-Geral dos Portos, formulado pelo Sr. Deputado Reinaldo Gomes; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados António Mota e Ilda Figueiredo; a diversos ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado António Gonzalez.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Vitorino, nas sessões de 19 de Junho e 22 de Março; Zita Seabra, na sessão de 19 de Setembro; José Magalhães, nas sessões de 16 de Outubro e 12 de Novembro; Jorge Lacão, na sessão de 24 de Outubro; Vidigal Amaro e outros, nas sessões de 13 de Novembro e 29 de Março; João Rodrigues e Álvaro Brasileiro, na sessão de 13 de Novembro; Magalhães Mota, nas sessões de 27 de Novembro, 24 de Janeiro, 26 de Fevereiro e 5 de Março; Nunes da Silva, na sessão de 6 de Dezembro; Rocha Santos e João Abrantes, na sessão de 13 de Dezembro; Roleira Marinho e outros, na sessão de 19 de Dezembro; António Mota, nas sessões de 24 de Janeiro, 14 e 15 de Fevereiro; Álvaro Brasileiro e Luísa Cachado, nas sessões de 24 e 25 de Janeiro e 26 de Fevereiro; Pedro Paulo Silva e lida Figueiredo, na sessão de 21 de Fevereiro; Margarida Marques, na sessão de 8 de Março; Figueiredo Lopes, na sessão de 13 de Março; António Gonzalez, na sessão de 13 de Março; Manuel Fontes Orvalho, na sessão de 21 de Março; Horácio Marçal, na sessão de 22 de Março; Joaquim Miranda, na sessão de 28 de Março; Jorge Lemos e Maria Ângela Pinto Correia, na sessão de 16 de Abril; Gomes de Almeida e Custódio Gingão, na sessão de 16 de Abril.
Deram ainda entrada na Mesa os seguintes diplomas: projectos de lei n.ºs 513/III, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que contribui para assegurar o acesso dos cidadãos à justiça administrativa, revogando o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho - foi admitido e baixa à 1.ª Comissão; 514/III, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre o enquadramento da concessão de subsídios, subvenções e outros benefícios financeiros - foi admitido e baixa à 5.ª Comissão; 515/III, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, sobre a defesa das empresas nacionalizadas contra actos inconstitucionais de alienação ou oneração dos seus bens - foi admitido e baixa à 1.ª Comissão.
Deram igualmente entrada na Mesa as ratificações n.ºs 160/III, apresentada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 115-G-85, de 18 de Abril, Diário da República n.º 90, suplemento, que estabelece normas sobre as operações de importação e exportação dos produtos agrícolas e da pesca; 161/III, apresentada pela Sr.ª Deputada Luísa Cachado e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 169/85, de 20 de Maio, Diário da República n.º 115, que determina que aos docentes do ensino oficial não superior, ainda que este não se insira na rede pública de ensino dependente do Ministério da Educação, incluindo os docentes dos postos de recepção oficiais do ciclo preparatório TV, seja contado, para efeitos de aposentação, o tempo de serviço docente prestado no ensino particular; 162/III, apresentada pelo Sr. Deputado José Luís Nunes e outros, do PS, ao Decreto Lei n.º 176/85, de 22 de Maio, que estabelece normas sobre as facilidades aduaneiras a conceder aos viajantes que entrem ou saiam do território nacional. Todos estas ratificações foram admitidas.

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O Sr. Presidete: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Lanita.

A Sr.ª Mariana Lanita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No próximo sábado, dia 1 de Junho, comemora-se o Dia Mundial da Criança, o que significa que durante 1 dia no ano será dedicada atenção especial às crianças. Ouviremos falar delas na rádio, na televisão e nos jornais. No domingo tudo terá acabado. É uma data importante, mas cujo conteúdo não pode nem deve ser esgotado nesse dia. E é por isso que quero aqui falar das crianças que serão com certeza pouco faladas nos programas especiais de dia 1.
Quero alertar esta Assembleia para as situações degradantes e dramáticas em que vivem muitos milhares de crianças no nosso país. É isso que me vem à memória quando se fala em comemorar o Dia Mundial da Criança.
Penso naquelas crianças que acompanharam as suas mães quando vieram a Lisboa junto dos órgãos de soberania exigir o cumprimento da legalidade nos campos da reforma agrária, que têm direito a um futuro feliz mas que devido a uma política contra o 25 de Abril vêem as suas esperanças frustradas.
Penso logo nas crianças com fome e nas que morrem subalimentadas.
Penso também nas crianças abandonadas, maltratadas, negligenciadas, que vivem em condições sub-humanas.
Quantas se encontram em instituições cujas condições de acolhimento são completamente desaconselháveis? Ainda recentemente os jornais davam notícia de situações de irregularidade e abuso de autoridade, verificados em internatos de crianças, órfãs e abandonadas, O que fez o Governo para pôr cobro a estas situações?
Diz o artigo 69.º da Constituição:

As crianças, particularmente os órfãos e os abandonados, têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, contra todas as formas de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo de autoridade na família e nas demais instituições.

Não é admissível, à face deste preceito constitucional, que nada se faça ou se diga quando comparecem nos bancos dos hospitais crianças com traumatismos, muitos deles de consequências graves e irreversíveis, provocadas por espancamento e maus tratos infligidos pelos educadores (sejam pais, tutores, professores ... ).
Ninguém tem o direito de espancar seres indefesos só porque têm a cargo a sua educação.
Mas não é só a crueldade física. Há também a crueldade psicológica, verbal, a brutalidade, as violências sexuais e a pornografia. Há ainda a exploração do trabalho infantil e a falta de ternura e de carinho que marcarão a criança para toda a vida.
Mas penso também nas crianças do nosso país que desde muito cedo começam a viver em conjunto com as suas famílias o drama da falta de dinheiro para comer. Crianças que lutam pela sua própria sobrevivência e dos seus familiares. Crianças que têm de mendigar nas ruas para entregar uns tostões em casa. Crianças que não vão à escola porque não há dinheiro para os transportes e os livros.
Crianças que percorrem quilómetros a pé para ir à escola. Crianças com mau aproveitamento escolar por que assistem às aulas com fome. Crianças que não têm infância. «Homens que nunca foram meninos», como diria Soeiro Pereira Gomes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é a realidade cruel de um grande número de crianças do nosso país e os senhores sabem-no bem.
A situação tem vindo a piorar nos últimos anos. Os salários em atraso e o desemprego são dois factores essenciais de agravamento das condições de vida das famílias.
Por isso mesmo, quando se fala em crianças com fome, vem-nos à memória os trabalhadores com salários em atraso.
E este Governo o que é que tem feito? E aqui mesmo, na Assembleia, que medidas foram aprovadas para pôr cobro a estas situações? Foi com a maior indiferença que os deputados da maioria PS/PSD votaram contra as medidas de garantia do pagamento dos salários em atraso, propostas pelo PCP.
A Assembleia, através da sua maioria parlamentar tem, por diversas vezes, voltado as costas ao sofrimento dos muitos milhares de homens, mulheres e crianças.
15to não pode continuar! Não foi para isto que fizemos o 25 de Abril. O Dia Mundial da Criança tem de ser comemorado todos os dias, sem excepção, com medidas e iniciativas concretas que dêem às crianças do nosso país aquilo a que elas têm direito: uma vida digna, uma infância e um futuro felizes.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Albernaz.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi o mar, com os seus recursos, e as potencialidades da região em que Espinho está inserido, os factores determinantes para a fixação permanente de um núcleo de pescadores que, com a sua actividade económica, originou o nascer de uma aldeia piscatória que em 1807 albergava 125 casas e que com o evoluir dos tempos se tornou um concelho com inúmeras potencialidades.
É Espinho, portanto, uma localidade de formação recente mas que, mesmo assim, conseguiu um desenvolvimento espantoso no seu panorama físico e humano.
A evolução impressionante do concelho é uma realidade para a qual muito contribuíram homens que ligaram os seus nomes a grandes empreendimentos e que engrandeceram a minha terra. Homens como: José Salvador, Henrique Alves Brandão, Augusto d'Oliveira Gomes, Dr. Castro Soares, e tantos outros.
A própria autarquia local, que muito se tem esforçado para que um conjunto de carências e condicionantes seja ultrapassado, carências e condicionantes essas que se devem a um ciclo normal de expansão numa terra como Espinho, que aspira a conquistar novos horizontes, mas que não pode nem deve ser ignorada e, pelo contrário, deverá merecer particular atenção por parte do poder central, de modo a que os seus problemas sejam ultrapassados e melhorado o quadro de vida da população espinhense.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem Espinho um lugar privilegiado na zona turística da Região Norte devido às enormes potencialidades turísticas existentes neste concelho, potencialidades que terão de ser desenvolvidas para que se possa responder ao incremento e crescimento natural desta actividade.

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Urge, pois, estimular a vocação turística desta terra e aumentar: não é só melhorar as belezas naturais, construir hotéis, organizar festas, mas acompanhar, também, com acções e medidas que permitam ultrapassar problemas relacionados com equipamentos e infra-estruturas que terão de ser apoiados e desbloqueados pelas instâncias competentes.
A população de Espinho e a sua edilidade interrogam-se se terão de esperar mais umas dezenas de anos para que as suas grandes aspirações sejam uma realidade. E quando falo em dezenas de anos, vêm-me logo à memória os 50 anos - sim, Srs. Deputados, 50 anos - que, com paciência e calma, os espinhenses têm aguardado que a variante à estrada nacional n.º 109 seja construída. É necessário realçar o valor que este eixo rodoviário tem para o concelho, dado que todo o tráfego interurbano e de longo curso passa pelo centro da cidade, com todas as suas implicações.
Chamo também a atenção para a inexistência de uma ligação à auto-estrada do Norte que, passando apenas a cerca de 3,5 km da cidade, proporcionaria melhores níveis de acesso ao concelho, assim como a uma zona industrial circundante, onde a indústria transformadora da cortiça ocupa papel primordial, sendo responsável por 35 milhões de contos/ano de exportações, movimentando diariamente cerca de 2400 t, quer de matéria-prima, quer de produtos acabados.
Será que um sonho do passado não poderá ser a realidade do futuro?
Esperemos que sim. Assim como esperamos que a inexistência de instalações adequadas do Tribunal de Espinho seja rapidamente ultrapassada, pois encontra-se instalado no edifício da Câmara Municipal, o que ocasiona graves transtornos ao regular funcionamento da justiça e dos serviços camarários, em virtude das péssimas condições em que vêm funcionando os dois juízos.
Este processo arrasta-se já desde 1975, tendo passado por várias vicissitudes, encontrando-se, presentemente, em fase de anteprojecto, com vista à apreciação dos serviços superiores. Todavia, essa apreciação continua também a tardar e não só não se arranca com o novo edifício, como não se instala um 3.º juízo que foi superiormente aprovado.
Neste sentido, apelo ao Ministério da Justiça para que se torne possível o novo Tribunal Judicial de Espinho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há longos anos que Espinho tem sido uma terra mártir, suportando investidas do mar, não obstante as obras de defesa já realizadas; mas, mesmo assim, continua ainda a existir o perigo da invasão marítima, agora mais acentuadamente ao sul, onde as populações vivem, diariamente, angustiadas à espera que o mar lhes entre pela porta dentro, o que já tem acontecido, tornando-se pois evidente a necessidade da defesa da costa ao sul de Espinho, na zona de Paramos, e por isso chamo a atenção interessada do Ministério da tutela.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Termino, levantando um problema que embora não seja, neste momento, do foro do poder central, é um anseio dos espinhenses, já de há muitos anos: o «parque da cidade», no qual se pretende construir importantes infra-estruturas desportivas que venham a dar resposta ao crescente movimento desportivo e de recreio, que são grandes aspirações da cidade.

É um problema ainda não ultrapassado, em virtude de parte dos terrenos do parque não estar ainda na posse da autarquia local. E não estão por virtude de um recurso para o Supremo Tribunal Administrativo que mereceu deste um acórdão favorável aos requerentes. Espera a Câmara que, através do diálogo, já encetado, se consiga chegar a um acordo, acordo esse que melhorava a qualidade de vida das populações e preservava e melhorava o ambiente ecológico e paisagístico da cidade de Espinho.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Porque, Srs. Deputados, se «viver em Espinho é hoje, ainda, o usufruto de uma certa tranquilidade, a possibilidade de residir num espaço onde ainda impera a dimensão humana», como se diz num documento objectivo e precioso que é «Os estudos de planeamento do concelho de Espinho», não podemos, portanto, adormecer em face de carências e condicionantes, que podem colocar em perigo essa tranquilidade de vida, essa possibilidade de residir em local aprazível - o que, evidentemente, implica a salvaguarda cuidadosa dos interesses mais legítimos da população local.

Aplausos do PS, do PSD e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr.ª Deputada Rosa Albernaz, quero dar-lhe os meus parabéns pela coragem da intervenção que hoje produziu.
Nós, que somos do distrito de Aveiro, sentimo-nos orgulhosos quando ouvimos falar das nossas jóias. Espinho é uma jóia naquela jóia do distrito de Aveiro - jóia, porque é a segunda cidade daquele distrito; jóia porque o distrito de Aveiro é aquele que, depois de Lisboa e Porto, mais contribui para o erário público.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quer queiramos, quer não, Aveiro é o terceiro distrito deste país que, muito longe do quarto e do quinto, paga para o erário público. Mas, em contrapartida, que recebemos? Já uma vez referi que não recebíamos nada, tal como dizia José Estêvão. Ora, não recebemos nada porque, tal como a Sr.ª Deputada referiu, somos o distrito que pior rede de estradas tem neste pais. Será que Aveiro se estará a tornar no interior deste país? Será que um dia teremos de reclamar as compensações do custo de interioridade para o distrito de Aveiro?

Vozes do PSD, do PS e da UEDS: - Muito bem!

O Orador: - É que aquela gente, que a Sr.ª Deputada conhece tão bem como eu, só quer que lhe dêem as infra-estruturas necessárias para andar, porque pés têm elas, cabeça têm elas, braços temos nós.
Sr.ª Deputada, os meus parabéns pela intervenção que produziu. Faço votos para que este Governo e os outros que hão-de vir - porque os passados não entenderam - ouçam as suas palavras, assim como as dos deputados pelo distrito de Aveiro, que não querem fazer chicana, mas que têm o direito de exigir

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aquilo que é minimamente exigível para um distrito que não quer favores, mas sim que o deixem trabalhar.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Rosa Albernaz, há mais um orador inscrito para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex. a deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr.ª Deputada Rosa Albernaz, foi com muito prazer que ouvi a intervenção que V. Ex.ª produziu.
Realmente Espinho é um dos grandes concelhos do distrito de Aveiro, foi a segunda cidade do nosso distrito e é o concelho que confina com o Porto. É um concelho altamente próspero com os problemas que a Sr.ª Deputada aqui focou - e muito bem - e quando nesta Câmara forem apresentadas as divisões administrativas da área metropolitana, espero que a Sr.ª Deputada use da palavra em defesa da unidade do nosso distrito que ultimamente tanto tem sido atacada não só pelo Norte como pelo Sul.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Comungo, pois, com as palavras que V. Ex.ª aqui produziu.
Contudo, como a Sr.ª Deputada pertence ao Governo, gostaria de saber que medidas foram tomadas e o que é que o Governo pensa não só em relação aos problemas que focou, mas, e principalmente, em relação à defesa do litoral da costa de Espinho.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Albernaz.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Srs. Deputados, muito obrigado pelas palavras que me dirigiram.
Temos de encarar os problemas relacionados com o nosso distrito com muita objectividade e calma. Como referi há pouco, não devemos desistir nem deixar de sonhar porque «água mole em pedra dura tanto dá até que fura». Por isso, vamos ter uma certa esperança de que os processos já iniciados irão ter um fim, um resultado.
Quanto ao problema da defesa do litoral da costa de Espinho, como o Sr. Deputado Horácio Marçal sabe, as obras já foram iniciadas e têm dado resultados palpáveis. Como sabe, há alguns anos, o mar galgava constantemente todos os Invernos a costa do meu concelho e houve casas que foram levadas pelo mar e populações que viveram noites de verdadeira angústia.
Porém, neste momento, em face das obras realizadas, vivemos em Espinho já com uma certa calma. Contudo, é necessário que os estudos que já existem e que foram apresentados pela autarquia local sobre a defesa da costa ao sul na zona de Paramos, que neste momento está em perigo, sejam concretizados. Foi por isso que levantei este problema e agradeço o apoio que os Srs. Deputados me deram.
Como já referi, vamos ter esperança que esse problema seja solucionado de vez.

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Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao mapa vi do Orçamento do Estado, um conjunto de 30 municípios distribuídos por 12 distritos de todo o continente recebem, a título de Fundo de Equilíbrio Financeiro (excluídos os montantes para Acção Social Escolar e transportes escolares), verbas que, em relação a 1984, representam acréscimos inferiores a 10%, isto em violação do disposto no artigo 59.º da Lei Orçamental.
É o caso, entre poucos, dos municípios de São João da Madeira, Barrancos, Vila Velha de Rodão, Tábua, Peniche, Loures, Marvão, Lousada, Torres Novas, Seixal, Cinfães e Lamego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este erro do mapa vi do Orçamento do Estado terá de ser corrigido, já que o mapa tem de reflectir o conteúdo do articulado da lei, tal como foi votado e vigora.
Importa recordar a origem do artigo 59.º
Na proposta de lei apresentada pelo Governo à Assembleia da República em 10 de Janeiro de 1985, a redacção do preceito (então artigo 55.º) era a seguinte:

O montante global a atribuir a cada município no ano de 1985 em resultado da aplicação do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de Março, deduzido da verba destinada aos transportes escolares e à Acção Social Escolar, não pode ser inferior ao que em 1984 lhe foi atribuído nas mesmas condições.

Da análise do mapa vi resultava que muitos municípios recebiam verbas com acréscimo em relação a 1984, significativamente inferiores à inflação verificada. Escandalosa e muito referida na opinião pública foi precisamente a situação dos municípios que recebiam aumentos inferiores a 10%. Essa denúncia teve efeitos: no começo do debate na generalidade, ou seja, 2 semanas depois da apresentação da proposta do Orçamento, o Governo altera o artigo, substituindo-o pelo seguinte:

O montante global a atribuir a cada município no ano de 1985, em resultado da aplicação do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de Março, deduzido da verba destinada aos transportes escolares e à Acção Social Escolar, não pode ser inferior ao que em 1984 lhe foi atribuído nas mesmas condições, acrescido de uma percentagem de 10% ou seja a verba teria de ser superior à de 1984 em mais 10%.

Foi esta a disposição aprovada na especialidade. Para quê, Srs. Deputados? Há ou houve dúvidas em algum de vós que a alteração significava que o mapa vi teria de ser mexido, precisamente para que não houvesse nenhum município que recebesse menos de 10%? E se o mapa vi publicado no Diário da República não foi alterado, deve ou não a anomalia ser corrigida?
Não se diga que a questão deveria ter sido sanada na redacção final. É sabida a pressa com que foram feitos os trabalhos da redacção final, o que já motivou várias correcções, incluindo a de um mapa inteiro, o mapa da Segurança Social!

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Só que o Ministério da Administração Interna, num parecer elaborado sobre um requerimento de rectificação que apresentei ao Sr. Presidente da Assembleia da República, resolveu tirar uma carta da manga: vem dizer que o Fundo de Equilíbrio Financeiro de 1984 continha uma verba para a Acção Social Escolar pelo que a percentagem de 10% não deve ser calculada sobre a totalidade do Fundo de Equilíbrio Financeiro de 1984, mas só sobre parte dele.
É falso, Srs. Deputados! Embora da parte do Governo possa ter havido a intenção de que as câmaras suportassem os novos encargos com as verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro, isso não se concretizou pelo que na revisão orçamental de Novembro de 1984 foi feito um reforço de verba de 775 000 contos, precisamente para transportes escolares e Acção Social Escolar, tendo em vista os encargos só então assumidos pelas câmaras, e só para o último trimestre do ano. É o que está escrito nas actas da Comissão de Economia (2.ª série, n.º 10, p. 218, reunião de 30 de Outubro de 1984). Aliás, é exactamente esta verba de 775 000 contos que a Sr.ª Secretária de Estado Maria Helena Torres Marques refere no debate do Orçamento de 1985, como se pode ver no Diário da Assembleia, 1ª série, n.º 41, p. 1574, de 24 de Janeiro de 1985.
Acresce que a verba prevista este ano, para todos os trimestres, para transportes escolares e Acção Social Escolar é de 3 milhões de contos, verba realmente proporcional, como se constata, à de 775 000 contos prevista o ano passado para um único trimestre!
Sr. Presidente, é com estes fundamentos que apresento a V. Ex.ª reclamação do despacho de indeferimento que exarou sobre o requerimento de rectificação que apresentámos, solicitando-lhe que sobre a matéria seja ouvida a Comissão de Economia, Finanças e Plano.
É também, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a seriedade dos trabalhos da Assembleia que está ameaçada.
Nem a reserva mental nem a simulação podem fazer vencimento perante os dispositivos da lei!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, quero informar V. Ex.ª que irei dar o caminho que foi requerido ouvindo a Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Neiva Correia.

O Sr. Neiva Correia (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por declarar a finalidade da minha intervenção.
Em primeiro lugar, defender a legalidade contra o método socialista de governar por manipulações, pressões e factos consumados, que vem sendo utilizado pelo Ministério da Administração Interna.
Em segundo lugar, defender os Serviços de Fomento da Assembleia Distrital de Lisboa ameaçados de esvaziamento, à revelia das leis.
Em terceiro lugar, e neste caso concreto, mostrar a contradição entre a retórica da regionalização e a mais férrea prática de jacobinismo centralista deste Governo.
Declaro, desde já, também o meu interesse e a minha razão de ciência: é que estes Serviços se integram na Assembleia Distrital de Lisboa de que fui presidente, por inerência das funções de governador civil do distrito, durante os governos da Aliança Democrática.

São razões que em consciência me obrigam a trazer aqui, hoje, este protesto em relação a uma situação e a um procedimento que considero escandalosamente ilegais e incorrectos.
Fazendo um pouco de história.
Estes Serviços vieram das antigas juntas distritais, que sucederam às juntas de província quando da extinção deste nível administrativo. Com eles vieram também outros serviços de natureza cultural e assistencial, sendo uns e outros integrados nas assembleias distritais, criadas pela Constituição de 1976 e pela Lei n.º 79/77 que definia as atribuições das autarquias e competências dos respectivos órgãos.

Desta última Lei mantém-se em vigor o capítulo referente ao distrito em que estão contidas as disposições relativas às assembleias distritais.
Assim e de acordo com o artigo 295.º da Constituição:

1) Enquanto as regiões não estiverem instituídas, subsistirá a divisão distrital;
2) Haverá em cada distrito uma assembleia deliberativa composta por representantes dos municípios, presidida peio governador civil.

Por outro lado, de acordo com o artigo 87.º da Lei n.º 79/77, compete à assembleia distrital, deliberar sobre a criação ou manutenção de serviços que, na área do distrito, apoiem tecnicamente as autarquias.
São exactamente estes serviços de fomento, objecto da minha intervenção, que apoiam tecnicamente as autarquias do distrito, nomeadamente elaborando estudos, projectos e planos directores.
A sua criação ou manutenção - repete-se e sublinha-se - é da competência da assembleia distrital, que é composta por representantes dos municípios.
15to é a lei. Vejamos como procede este Governo: primeiro cria um grupo de trabalho para a transferência dos serviços das assembleias distritais para a dependência dos serviços da administração central.

Paralelamente promove-se a instabilidade entre o pessoal, divulgando-se que não há verbas para salários senão até Maio, agora generosamente estendidas até Outubro e criando-se um grupo ad hoc para a transferência do pessoal, sem que qualquer lei ou deliberação da assembleia distrital tenha determinado a extinção daqueles Serviços.
Mais, contrariando as deliberações reiteradas da Assembleia Distrital de Lisboa que têm reconhecido o interesse da manutenção daqueles Serviços para os municípios do distrito.
Por último, um decreto-lei ainda não publicado manda aplicar ao pessoal das assembleias distritais o regime jurídico do pessoal da administração central e aplicar medidas de mobilidade, decreto que, curiosamente, afirma no seu preâmbulo que as «Actividades de fomento [...] cada vez menos se coadunam com as competências que estes órgãos deveriam exercer», matéria esta que é da competência desta Assembleia da República e não do Governo.
Para cúmulo, completam-se todos estes métodos do PREC, comunicando ao pessoal, através do vice-governador civil a «filosofia do Governo», nova concepção legiferante, que neste caso consiste no «esvaziamento dos serviços» e transferência, só parcial, para a Comissão de Coordenação Regional com dispersão do restante pessoal.

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Eis o que queria dizer quanto ao primeiro ponto, para defesa da legalidade. Mas quero aqui deixar expresso que todos estes atropelos atingem injustamente um serviço concreto e é este o segundo ponto que me proponho tratar.
Em 1980, os Serviços de Fomento da Assembleia Distrital de Lisboa estavam a funcionar insatisfatoriamente. A disciplina, a assiduidade, a pontualidade, eram objecto de censura fundada por parte dos representantes dos municípios, verificando-se claramente uma baixa produtividade e rentabilidade dos serviços.
A situação era atribuída a uma frustração generalizada e havia uma quase aceitação fatalista de que esse era o estado normal de um serviço público.
No entanto, a nomeação de um director dinâmico, competente e disciplinador, em fins de 1980, veio inverter essa situação.
Foi definido como critério o valor da produção dos serviços, calculado de acordo com as tabelas oficiais, que, como em qualquer gabinete de projectos, teria necessariamente de ser superior aos custos.
Essa meta, que foi considerada irrealista, foi atingida e esses serviços foram recuperados com muito trabalho e persistência, merecendo público louvor.
Tomando como base o ano de 1980, o valor da produção, corrigida da inflação, foi 2,5 vezes maior em 1981 e 3,3 vezes maior em 1982, atingindo a produtividade o factor 4 vezes em 1984.
Quanto à rentabilidade, calculada como a diferença entre o valor da produção e o seu custo, em percentagem desse custo, variou de menos 60 % em 1980 para mais 77 % em 1984. Ou seja, em 1980 gastaram-se 28 000 contos para produzir projectos no valor de 11 000 contos, em 1984 gastaram-se 47 000 contos para produzir projectos no valor de 84 000 contos.
É este Serviço que se regenerou exemplarmente, que devia ser apoiado e respeitado, que se determina que seja esvaziado e disperso, em nome da «filosofia do Governo».
Filosofia de jacobinismo centralista, como é próprio do Partido Socialista, legítimo herdeiro do Partido Democrático da I República.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E isto traz-nos ao terceiro ponto da minha intervenção, que é a contradição clara entre a realidade e a retórica da regionalização, no comportamento do Partido Socialista no Governo, surpreendente e contraditória imagem como as que diariamente nos chegam no Telejornal do Dr. Mário Soares nos seus ágapes empresariais com as suas novas afinidades electivas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Com grande sentido de humor, terá dito no Porto o Sr. Deputado Carlos Lage, do Partido Socialista, citado no Diário de Notícias, de 28 do corrente, que a «paralisia» em que se encontra a regionalização assenta numa «cultura política centralista» e que são as elites político-administrativas instaladas na capital que paralisam o processo de regionalização. Grande e sábia constatação sobre o Ministério da Administração Interna do Sr. Ministro Eduardo Pereira.
Porque aos distritos e às assembleias distritais deverão suceder as regiões administrativas e os seus órgãos; porque os serviços das assembleias distritais, que dão apoio técnico às autarquias, deverão ser conservados para serem oportunamente transmitidos às regiões administrativas; porque esvaziá-los ou entregá-los às comissões de coordenação regional, órgãos da administração central é ir ao arrepio da regionalização.
Mas para ver o que é a «cultura política centralista», basta comparar a proposta de lei n.º 84/II de delimitação das actuações das administrações central, regional e local em matéria de investimentos, de quando era Secretário de Estado o engenheiro Roberto Carneiro, que bem mostra a necessidade destes serviços para o exercício das competências da região administrativa, com o Decreto-Lei n.º 77/84 deste Governo e com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 21/84 sobre «política de desenvolvimento regional» que, como as omeletas sem ovos, faz a política de desenvolvimento regional sem regionalização.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra para, segundo penso, formularem pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados César Oliveira e Alberto Avelino. Acontece, no entanto, que o Sr. Deputado Neiva Correia não dispõe de tempo para responder.
Mesmo assim, se os Srs. Deputados pretenderem formular os pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, vou dar ao Sr. Deputado Neiva Correia um minuto e meio do tempo que disponho para ele responder aos pedidos de esclarecimento que lhe vou formular.
Sr. Deputado Neiva Correia, julgo que grassa no CDS uma doença obsessiva, que é a do socialismo.

O Sr. Neiva Correia (CDS): - Ainda não, felizmente!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não é no CDS, é no País!

O Orador: - Ultimamente, o CDS vê socialismo em tudo e mais alguma coisa; o CDS levanta uma cadeira e o socialismo está por baixo dela. Os senhores estão perfeitamente obcecados com o socialismo! Tanto assim é que V. Ex.ª, Sr. Deputado, no seu discurso fez uma coisa notável: começou por falar sobre o método socialista de governar pelo facto consumado e, estranhamente, desassociou o PSD do método de governar pro esse modo. Pergunto: porquê? Será que novos ventos sopram e V. Ex.ª agora apenas pretende isolar o Partido Socialista na miragem de, de novo, o CDS ter acesso ao Poder, obviamente em coligação com o PSD porque sozinho será difícil lá chegar e nomear o Primeiro-Ministro? Será essa a razão por que V. Ex.ª enveredou por esta táctica de não associar o PSD a nenhum dos malefícios que apontou? Será por isto?
Por outro lado, porque é que V. Ex.ª considera que o governar pelo facto consumado é um método socialista? É que é também um método salazarista, marcelista, será centrista, será o método daquelas pessoas que o praticam. De modo nenhum é apanágio socialista, não lhe parece, Sr. Deputado?
Posto isto, a pergunta fundamental que quero fazer-lhe é a de saber porque é que V. Ex.ª, em toda a sua intervenção, não tem uma palavra de crítica para o

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PSD. 15so era um bocado intrigante, se antecipadamente eu já não soubesse a resposta que me vai dar a essa questão.

O Sr. Presidente: - Pergunto ao Sr. Deputado Alberto Avelino se, porventura, também quer formular algum pedido de esclarecimento.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Queira então ter a bondade de o formular.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Deputado Neiva Correia, de facto parece haver aí a doença do socialismo. É pena que não haja a doença do tiranismo ou da tirania!
Não duvido da competência da pessoa citada, mas ela é um tirano absoluto e penso que isso é que devia aqui ter posto. Aliás, devo dizer que não considero que a disciplina, tal como disse, seja actos tirânicos. Conheço suficientemente bem aquela casa e a pessoa que o Sr. Deputado referiu.
Por outro lado, foram adiantados números sobre os projectos apresentados até 1980 e sobre os apresentados depois de 1980. Bom, há muita maneira de fazer contabilidade com o montante de cada um dos processos.
Por acaso, eu trouxe hoje para aqui o processo de captação de água para Torres Vedras, Sobral, Alenquer e Arruda, e não creio que um processo do tamanho do que aqui tenho sirva para tudo. No entanto, o valor global que está neste processo é de milhares de contos e com a respectiva tabela, com facilidade, se atinge esses milhares de trabalho produzido.
Volto a dizer que não duvido da competência do Sr. Engenheiro-Director, mas já duvido muito das suas relações pessoais - aliás, tenho a certeza de que não são nada famosas.
Por outro lado, como sabe, as assembleias distritais, nomeadamente a Assembleia Distrital de Lisboa, têm serviços médico-sociais, culturais; aliás, não sei o que é que não tem. Eram, pois, duas as questões que gostava de lhe pôr: primeira, queria saber se aceita o paralelismo de actuação de serviços desta natureza, juntamente com outros ministérios e, enquanto governador civil, V. Ex.ª transferiu para a Misericórdia algumas obras sociais e isso não foi por acaso; segunda, quanto aos Serviços de Fomento da Assembleia Distrital de Lisboa - que, parece, devem existir - pergunto quem deve suportar os encargos com esses serviços.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Neiva Correia, peço-lhe o favor de, com a sua capacidade de síntese, responder às questões que lhe foram postas pelos dois Srs. Deputados num minuto e meio.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Mas eu dei ao Sr. Deputado Neiva Correia um minuto e meio para ele responder à minha pergunta!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César Oliveira, penso que V. Ex.ª é capaz de ter a generosidade bastante para permitir que o Sr. Deputado Neiva Correia ocupe um pouco do tempo que lhe concedeu a responder também ao Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Dou mais 1 minuto!

O Sr. Neiva Correia (CDS): - Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Alberto Avelino quiser que eu lhe responda, suponho que terá também de contribuir um pouco para esta contabilidade.
Para economizar tempo, desde que já vou responder aos Srs. Deputados César Oliveira e Alberto Avelino sobre a questão de saber se o CDS vê socialismo em toda a parte.

O Sr. Paulo Barral (PS): - Porque a bancada é grande!

O Orador: - Neste momento o País está representado nesta Assembleia da República por um partido que não se reclama do socialismo e por três partidos e outros minipartidos que, de uma ou de outra forma, se reclamam de diversas formas de socialismo. Bom, o socialismo está em toda a parte: neste momento, há um bloco central, foi feita uma coligação entre o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata, tendo nós avisado, antes das eleições, que isso ia suceder, o que foi negado, mas, no entanto, tal veio mesmo a suceder.
O facto de eu não ter mencionado - e agora respondo ao Sr. Deputado César Oliveira - o Partido Social-Democrata foi porque, parece, nesta questão o Partido Social-Democrata não foi visto nem achado. A posição do Partido Social-Democrata no Ministério da Administração Interna, na prática, parece ser inexistente. As instruções sobre a filosofia do Governo não são transmitidas pelo governador civil, mas pelo vice-governador civil, sendo o primeiro do PSD e o segundo do PS. É pela via do Partido Socialista que essas instruções são transmitidas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Foi por isso que ignorei o Partido Social-Democrata, que entrará nesta querela se assim entender e não para o proteger. O Partido Social-Democrata já é maior e vacinado...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... e estará com o Partido Socialista enquanto assim o entender e lhe convier e estará fora quando assim o entender e pensar que lhe convém. Essa é uma matéria que não me diz respeito e, por isso, não a mencionei, pois não vinha ao caso.

O Sr. Presidente: - Queira concluir o seu pensamento, Sr. Deputado.

O Orador: - Quanto às referências que o Sr. Deputado Alberto Avelino fez, devo dizer que na minha intervenção sublinhei bem a diferença que deve haver entre os serviços que, na área de distrito, devem apoiar tecnicamente as autarquias e os outros serviços. Na alínea c), do artigo 87.º da Lei n.º 79/77, incluem-se os serviços de fomento e não os serviços de assistência social. Para além dos serviços de fomento - e dos serviços de cultura -,todos os outros serviços não tinham como função apoiar tecnicamente os municípios.
Ora, segundo a Constituição, a assembleia distrital é constituída por representantes dos municípios, o que significa que os outros serviços teriam de ter um tra-

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tamento completamente diferente do dos serviços de fomento e do dos serviços de cultura e teria de haver uma estratégia de viabilização por parte dos serviços da assembleia distrital que fosse compatível com as disponibilidades. Ainda hoje essas disponibilidades, apesar de restritas, são perfeitamente suficientes para manter os serviços de fomento e os de cultura, já que o duodécimo que ela está a receber é da ordem dos 13 mil e tal contos e os encargos com o pessoal dos serviços de fomento e os de cultura são da ordem dos 4000 contos por mês.
Desde que seja conduzida uma estratégia de gestão correcta e adequada, é perfeitamente possível viabilizar aqueles serviços, que a lei determina ser da competência exclusiva da assembleia distrital criar e manter.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Faria dos Santos.

O Sr. Faria dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desenvolvimento e estruturação da formação profissional no sector das pescas é tema que tem merecido a melhor atenção desta Câmara e servido como base de dissertação às intervenções de deputados dos mais diversos partidos aqui representados. Sem procurar esgotar o tema, mas juntado-lhe apenas a voz de quem há muito com ele se preocupa e a visão envolvente que os sociais-democratas 1he atribuem, permito-me hoje chamar sobre ele a atenção dos distintos colegas e, concomitantemente, apelar ao Governo no sentido da premência da sua solução.
Grande parte da frota pesqueira portuguesa dispõe já de tecnologia avançada, estando mesmo algumas das unidades equipadas com o que de mais moderno se produz em equipamentos, desde a propulsão à pesquisa ou da navegação à conservação de pescado. Nestas condições, é evidente que essa frota exige, dia a dia, pessoal do mais alto gabarito profissional, sob pena de existirem investimentos deficientemente aproveitados. Podemos mesmo afirmar que no campo da navegação e pesquisa electrónica a maior parte dos equipamentos embarcados não está a ser utilizada em mais do que 30% das suas capacidades. Acrescentemos ainda que são muito elevadas as quantidades de pescado que são rejeitadas pelas autoridades sanitárias ou são lançadas no consumo em deficientes condições por falta de aproveitamento dos equipamentos ou conhecimentos actualizados sobre conservação de pescado.
Urge, portanto, quer atendendo à frota existente, quer pensando na renovação que esta mesma exige, preparar rapidamente os profissionais que a bordo chefiarão as equipas mais responsáveis ou assumirão ainda as mais altas funções e responsabilidades.
Um velho e ilustre almirante inglês declarava preferir navios velhos com guarnições eficientes, a navios modernos com guarnições incapazes ou deficiententemente preparadas. Sigamos, pois, esse inteligente conselho.
A preocupação base nos últimos 3 anos foi a de relançar em funcionamento a Escola Profissional de Pesca de Lisboa, preparando-a para assumir as funções de uma verdadeira escola nacional de pescas. A preparação dos profissionais ao mais alto nível exige a existência de equipamentos e professores que dificilmente são possíveis de adquirir ou contratar. Registe-se o salto tecnológico do ensino ministrado naquela escola e o aumento significativo da sua frequência.

Todavia, não pode o atraso verificado ser recuperado apenas através dessa instituição de ensino. A falta de preparação profissional era já endémica antes de 1974 e agravou-se drasticamente quando, de modo inqualificável, foi decidido o encerramento de todas as escolas de pesca que funcionavam junto das antigas Casas dos Pescadores. Muito embora fosse deficiente a formação aí efectuada, era contudo a única de que regionalmente se dispunha. Com a sua destruição condenou-se a progressão profissional de uma geração de pescadores. Cometeu-se um dos mais graves atentados às pescas portuguesas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Urge recuperar o tempo e corrigir os erros cometidos, relançando o ensino profissional de pescas ao nível das principais comunidades piscatórias, dotando-as, de imediato, da capacidade de formar «moços» e «marinheiros pescadores». Simultaneamente, deviam os centros de formação profissional serem capazes de preparar os marinheiros pescadores e contramestres, que tendo o tempo de embarque para ascenderem na respectiva carreira, possam, mediante curso intensivo a ministrar na escola nacional de pescas, obter tal desiderato. Só mais tarde e mediante análise da potencialidade de cada comunidade piscatória, se poderá decidir acertadamente quais os centros de formação profissional que deverão possuir os dispendiosos equipamentos exigidos e dotados de professores capazes para aí se efectuar toda a formação, começando, como é evidente, com o acesso a contramestre pescador.
Tal como já tenho afirmado, a formação profissional para a pesca ultrapassa o âmbito de responsabilidade do Ministério do Mar e situa-se, em grande parte, no do Ministério do Trabalho.

É da estreita cooperação entre estes dois Ministérios, felizmente já iniciada, que poderá surgir a curto prazo o funcionamento dos novos centros de formação profissional para o sector da pesca.
Mas as necessidades são tão grandes e o tempo para as colmatar tão curto, que há necessidade de se encontrar novas soluções. Um mestre ou um contramestre é, além de um profissional de alto gabarito, um líder de equipa. Ora, é indispensável dispor de número elevado de marinheiros pescadores para que do seu seio saiam, com a frequência que se necessita, os líderes das equipas que constituem as tripulações. 15to é, os mestres e os contramestres. Por outro lado, urge ainda que dessas equipas façam parte elevado número de «marinheiros pescadores». Quer a escola nacional de pescas, quer os centros de formação profissional não poderão responder atempadamente às exigências da frota e é neste sentido que penso competir à Armada portuguesa uma excelente participação.

Como é do conhecimento geral, a maior parte dos nossos pescadores não cumpre o serviço militar na Armada. Constituindo muito cedo família e assumindo responsabilidades profissionais que determinam o seu empenho na exploração das embarcações, os pescadores chamados ao cumprimento do serviço militar optam normalmente pelo Exército dado ali encontrarem menor tempo de serviço e maiores facilidades para poderem, nos tempos livres, efectuar algumas « marés de mar».
Por outro lado, é tradicional entre os pescadores a propensão para cedo abandonarem os estudos, ficando muitas vezes com apenas a chamada «6.ª classe». Ora, a Armada necessita, face à elevada tecnologia dos

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meios com que está equipada e ao limitado tempo de que dispõe para preparar os jovens recrutas, de incorporar aqueles que maiores garantias lhe dão de aproveitamento.

É, para além de outros, pelos condicionalismos descritos que se verifica uma enorme ausência de pescadores entre os jovens recrutas admitidos para a Armada, muito embora se reconheça que eles possuem uma das exigências mais difíceis de obter: a adaptação orgânica e anímica à vida de bordo.

A solução que se preconiza consiste essencialmente na criação de uma incorporação anual na Armada de um contingente de pescadores que, cumprindo o serviço militar obrigatória, obteriam simultaneamente o direito à categoria profissional de «marinheiro pescador». Seriam normalmente da especialidade de manobra, mas a sua preparação militar englobaria também as matérias indispensáveis para poderem regressar à sua profissão em condições de assumirem as funções de «marinheiro pescador» e possuírem, portanto, as bases para ascenderem profissionalmente.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a execução da solução que acabo de expor, a Armada poderia contribuir, de modo muito significativo, para a recuperação do atraso verificado pela falta de «marinheiros pescadores» suficientemente habilitados a prosseguir a carreira profissional.

Sem procurar de modo algum esgotar o tema poderemos afirmar que uma estruturação curricular adequada, uma utilização consciente do magnífico equipamento escolar que a Armada possui e um treino orientado no sentido dos objectivos propostos, permitiriam preparar excelentes profissionais de pesca. Para um jovem pescador, isolado na sua comunidade, empenhado na faina diária da pesca e incapaz de encontrar localmente as condições, estruturas e professores capazes de lhe permitirem a progressão profissional, a hipótese de, através do cumprimento do serviço militar obrigatório, solucionar tal aspiração, será certamente acolhida com o maior interesse.

Registe-se ainda que os jovens pescadores postos em contacto com quem detém o dever de fazer cumprir a legislação marítima beneficiariam de tal contacto, reconheceriam a finalidade de tal legislação e regressariam à sua profissão esclarecidos e empenhados na defesa do património comum dos pescadores, que são os stocks de peixe existentes nas águas portuguesas.

Finalmente e apenas em abordagem muito rápida, quero aqui registar o enorme interesse em se aprofundar a cooperação entre a Escola Náutica do Infante D. Henrique e a Escola Profissional de Pesca de Lisboa (futura Escola Nacional de Pescas). A necessidade de possuirmos profissionais com elevados conhecimentos pesqueiros, capazes de constituírem o escol das nossas pescas longínquas e os quadros técnicos que faltam na maior parte das nossas empresas de pesca, determina que a cooperação na coordenação de cursos e utilização de equipamentos deve ser encontrada rapidamente entre as direcções das escolas atrás citadas.

Saibamos nós enfrentar o problema da formação profissional no sector das pescas e o período de pré-adesão de que dispomos para a integração plena na Comunidade Económica Europeia será suficiente para vencer o atraso de que presentemente enfermamos.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Ao que suponho para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha, que dispõe de 2 minutos. Acontece, contudo, que o Sr. Deputado Faria dos Santos não dispõe de tempo para responder, mas V. Ex.ª dividirá o tempo a meio.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Presidente, talvez os 2 minutos nos cheguem aos dois.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Deputado Faria dos Santos, ao ouvir com interesse a sua intervenção, lembrei-me de lhe colocar uma questão, quando o ouvi falar da Escola Profissional de Pesca de Lisboa.
O Sr. Deputado Faria dos Santos, ex-Secretário de Estado das Pescas, sabe bem - aliás, disse-o na intervenção - que o ensino profissional das pescas é uma das reivindicações das organizações dos pescadores, dos trabalhadores do sector. Na altura em que o Sr. Deputado Faria dos Santos era Secretário de Estado das Pescas as organizações dos trabalhadores, os sindicatos, a Federação das Pescas, etc., muitas vezes lhe levantaram a questão do ensino profissional. Só que durante o período - salvo erro, de 3 anos - em que o Sr. Deputado Faria dos Santos foi Secretário de Estado das Pescas, nunca foi posto em prática aquilo que eram as reivindicações dos trabalhadores do sector que, ao fim e ao cabo, iam ao encontro do que disse agora na sua intervenção.
O Sr. Deputado sabe que apresentámos aqui um projecto de lei de criação de uma escola de pescas no Norte. Em nossa opinião, os centros de formação profissional não vão resolver a questão do ensino em si e pensamos que com a criação de uma escola de pescas no Norte do País - essa é uma das grandes reivindicações dos pescadores do Norte - essa questão vai ser resolvida. Aliás, na deslocação que membros da Subcomissão das Pescas fizeram ao Norte do País, por todos os portos por onde passámos, uma das questões que nos puseram foi a da criação de uma escola de pescas no Norte.

Pergunto, pois, ao Sr. Deputado Faria dos Santos o que é que diz em relação a isto, assim como à criação de uma escola de pescas no Sul do País.
Muitas vezes dissemos-lhe que os pescadores não tinham condições para se instalarem em Lisboa durante 5 ou 6 meses ou até durante 1 ano, a fim de tirarem os cursos, apesar da necessidade que todos temos de ter esses cursos. Apesar disso, nessa altura nada foi feito.
Pergunto, pois, ao Sr. Deputado Faria dos Santos o que é que pensa sobre a criação de escolas de pescas, tanto no Norte como no Sul do País, e o que é que, de concreto, fez durante o período em que foi Secretário de Estado das Pescas.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Espadinha não foi nada generoso, porque consumiu todo o tempo de que dispunha. Em todo o caso, a Mesa está na disposição de conceder a palavra por 2 minutos ao Sr. Deputado Faria dos Santos para poder responder.

O Sr. Faria dos Santos (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

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Sr. Deputado Carlos Espadinha, como sabe, a única escola da responsabilidade directa da Secretaria de Estado das Pescas é a Escola Profissional de Pescas de Lisboa, é sobre essa que detemos as verbas necessárias ao seu desenvolvimento; foi esse o esforço que fizemos. E mais: aos profissionais de pesca que vieram tirar os seus cursos a Lisboa, pela primeira vez nos últimos 10 anos, foram pagos subsídios a esses profissionais que tiraram cursos na Escola de Pescas de Lisboa. Foi o satisfazer de uma reivindicação há muito tempo exigida por esses profissionais.
Quanto aos centros de formação profissional, tivemos de ir para essa designação, dado que é através dessa designação que vamos obter os fundos necessários ao seu equipamento e funcionamento, fundos esses que, como sabe, são comunitários.
Penso que alguns dos centros de formação - e o de Matosinhos ou o de Olhão poderão ser um deles - caminharão rapidamente para se transformarem em escolas de pesca.
O que não podemos é distribuir, ao longo de toda a costa, equipamentos caríssimos, nem temos possibilidade de encontrar professores e técnicos capazes de ensinar e fazer a manutenção de todos esses equipamentos.
Penso que alguns dos centros de formação profissional caminharão para escolas de formação até ao nível de mestre e, portanto, será assim satisfeita a aspiração.
A resposta, Sr. Deputado, não está na estrutura; a resposta vai estar na comunidade. É a comunidade que vai dizer se realmente é capaz de merecer uma escola de pesca e não apenas um centro de formação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, levo ao vosso conhecimento de que se encontram entre nós alunos e professores da Escola Secundária Alfredo da Silva, do Barreiro.
Agradeço o favor de assinalarem este momento para que eles levem daqui a melhor recordação.

Aplausos gerais.

Como o Sr. Deputado Fernando de Sousa, que estava inscrito para fazer uma intervenção, não se encontra presente, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, para uma intervenção.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção tem apenas o objectivo de chamar a atenção da Câmara para o facto de ontem, no noticiário das 23 horas e 30 minutos da Antena 1, o correspondente de Bruxelas prometer que a RTP daria hoje, por cedência da televisão de Bruxelas, as imagens da terrível tragédia ocorrida ontem num estádio antes de começar um jogo de futebol. São imagens de agressividade que, entendemos, não devem ser reproduzidas. Penso que aquilo que se viu já chega!
Queria saber se a Câmara estaria disposta - e a forma de o fazer será através da vontade do Sr. Presidente e dos Srs. Deputados - de intervir junto da RTP, no caso de eles estarem realmente convencidos de que é útil passarem as imagens, fazendo pressão sobre a ideia de que a agressão só pode gerar agressividade e que não há necessidade nenhuma de repetir tais imagens.
Era só isto o que eu queria dizer.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, embora eu perfilhe da opinião que lançou, o certo é que não vejo qualquer canal para que, de algum modo, possa fazer-se essa pressão, como pretende. Em todo o caso, poderei informar a RTP sobre a declaração que V. Ex.ª acaba de prestar.
O Sr. Deputado Magalhães Mota pede a palavra para que efeito?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, sob a forma de pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura - esta é a forma regimental de que disponho -, queria dizer, em primeiro lugar, que penso que a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura tem inteira razão no comentário que faz e que, de facto, seria um acrescento de agressividade e uma nota de sensacionalismo, que, suponho, não tem real interesse informativo nem nenhum interesse em termos daquilo que pode ser a tarefa de uma televisão, a transmissão dessas imagens.
Creio que todos nós - esse é o sentido do pedido de esclarecimento que faria - tomámos consciência do horror que é o transformar-se aquilo que devia ser uma festa de confraternização e um encontro de homens para um simples jogo numa manifestação de agressividade e violência e que o sentimento desse horror, esse sim, devia ser matéria informativa.
Assim, estou de acordo com o apelo que é feito e queria pedir à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura - visto que eu disse que faria um pedido de esclarecimento - que me dissesse se não haveria outras formas de a RTP demonstrar que, de facto, o desporto é festa, é convivência, é convívio, é alguma coisa que tem importância na formação e na recriação das pessoas e não é violência, não é agressividade, não é a morte nem o luto.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a questão levantada pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura é uma questão que se reveste de grande significado. Por isso, não queria deixar de pronunciar algumas palavras.
Em primeiro lugar, não nos compete dar instruções à televisão, mas compete-nos, sim, exprimir o nosso próprio ponto de vista sobre aquilo que aconteceu ontem e que poderá ser susceptível de um juízo de valor quanto aos efeitos públicos e quanto ao significado que se lhe possa atribuir.
O que mais me chocou nos acontecimentos registados ontem no estádio em que se desenrolou o desafio de futebol entre o Liverpool e o Juventus foi que tão grande tragédia tivesse, de alguma maneira, sido encarada com insensibilidade e com naturalidade pelas dezenas de milhares de espectadores que se mantiveram no campo, reagindo com um frenesim extraordinário ao que se passou a seguir, como se nada tivesse acontecido no início.
Este é o lado negro e não o lado de festa do espectáculo de massas desportivo. É um sintoma mórbido e doentio.
Julguei que a civilização e o espírito europeus estavam imunes a estes acontecimentos, a estas tragédias

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e a esta barbaridade. Enganei-me! Afinal, no fundo da alma humana, existe uma agressividade e uma selvajaria que, se tiver oportunidade de se desencadear, e se além disso tiver como aliciante uma certa droga, chame-se ela desporto ou tenha outro nome, pode levar a consequências verdadeiramente inenarráveis e a aspectos absolutamente bárbaros.
O espectáculo que ontem se verificou nesse desafio de futebol não tem nada a ver com o espírito de humanidade, de solidariedade, de amor ao próximo ou de respeito pelos outros. É uma manifestação de insensibilidade e de brutalidade que nos compete repelir com indignação.
Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acontece que neste momento, os diversos partidos já não dispõem de tempo para intervir.
No entanto, tendo em consideração a gravidade do assunto e o facto de o Parlamento dever manifestar-se acerca destes acontecimentos, vamos conceder 2 minutos a cada um dos grupos e agrupamentos parlamentares que, porventura, já não tenham tempo disponível para se manifestarem sobre este assunto.
Assim tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço, reconhecido, esta possibilidade que me foi dada para, de certo modo, pedir um esclarecimento. No fundo, mais do que pedir um esclarecimento, pretendo comentar as afirmações das Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
Gostaria, em primeiro lugar, de acentuar um aspecto que já foi aqui referido a propósito e que consiste em, acima de tudo, pretender esta Câmara - e dever pretender - preservar a independência da televisão.
Já há uns dias, a propósito de um debate que está aqui a decorrer, tivemos ocasião de nos pronunciar sobre o assunto e não serão demasiadas as oportunidades para o salientar e para o sublinhar.
Através da intervenção da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, a Câmara não toma nenhuma resolução. Aliás, não lhe foi proposta qualquer resolução que contenha uma determinação ou um inciso dirigido à RTP.
A Câmara apenas faz um comentário - nisso é perfeitamente livre - sobre a intenção de a RTP retransmitir ou transmitir mais completamente a notícia e as imagens sobre o que ontem se passou em Bruxelas.
Assim, o nosso comentário será no mesmo sentido do que fez a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
Não parece conveniente a esta Câmara que o espectáculo de violência volte a ser colocado perante os olhos dos Portugueses, muito embora se pudesse pensar que ele poderia ter um sentido pedagógico, isto é, o sentido de, através do horror que a todos nós causaram aquelas imagens, nos afastar de tais práticas de violência.
Supomos, no entanto, que será mais acertado evitarmos tal espectáculo e evitarmos principalmente o contraste chocante entre o que foi o horror dos acontecimentos que precederam o desafio e a total indiferença que, no desenrolar do desafio, aquela multidão demonstrou perante esses horríveis acontecimentos.
Queríamos ainda fazer um voto, Sr. Presidente, o voto de que a nossa próxima entrada na Europa não

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nos faça correr o risco de contágio com tal violência que, felizmente e apesar de tudo, anda ainda alheia dos nossos espectáculos desportivos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Alguns dos Srs. Deputados que me precederam no uso da palavra já disseram alguma coisa daquilo que eu pretendia dizer.
Todavia, convém frisar que o que a Assembleia da República poderia fazer era expressar um voto de pesar e de repulsa - de uma repulsa veemente - por tudo quanto se passou ontem no estádio belga onde ia decorrer o desafio entre o Juventus e o Liverpool.
Não há dúvida nenhuma que há certas claques de certas equipas que são useiras e vezeiras no tumulto, nas ofensas corporais, nas injúrias. Ontem, o espectáculo atingiu o cúmulo do afrontamento, ficando prostrados pelo chão vítimas inocentes de sentimentos de perversidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que a Câmara não tem de fazer pressão - sublinho, pressão sobre a comunicação social, seja ela a RTP, seja qualquer outro canal de informação. Temos de preservar a independência da RTP. A tal nos obriga a nossa concepção sobre a independência dos meios da comunicação social.
No entanto, não sei se esconder ensina alguma coisa a quem quer que seja. Tenho visto imensos filmes, alguns com passagens verídicas de episódios de guerra e tenho visto também filmes que, baseados igualmente na história de guerra, são histórias fantasiosas. Temos visto o holocausto dos judeus na 2.ª Guerra Mundial.
Ora, creio bem que esses filmes, embora aterrorizem, embora horrorizem, alertam a consciência das pessoas para aquilo que é a guerra, para aquilo que são os horrores dos confrontos, para aquilo que, em suma, constitui um verdadeiro atentado à humanidade.
O que ocorreu ontem naquele estádio foi um verdadeiro atentado à humanidade. No entanto, deve ser transmitido à nossa juventude e a toda a gente para que todos tenham a consciência do que é a violência no desporto.
Não deixo de lembrar aqui uma recomendação do Conselho da Europa que, por todos os meios, quer levar junto dos espectadores e da juventude, em especial, o cuidado a ter precisamente na preservação desse ideal do desporto, que é um ideal de solidariedade e nunca um ideal de confrontação levado a este extremo horroroso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo nosso lado, também nos associamos às palavras que aqui foram produzidas pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
Usando da figura de pedido de esclarecimento, gostaríamos, em primeiro lugar, de dizer que, quanto à possibilidade de a Assembleia da República intervir ou

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não junto da RTP, pensamos que a RTP cumprirá e actuará como entender. Ela dispõe do juízo moral das várias bancadas da Assembleia da República e actuará como entender, sendo sempre conveniente lembrar que a RTP tem o seu funcionamento enquadrado por uma lei desta Assembleia da República que consagra especificamente os fins da RTP. Ora, em nenhum desses fins da RTP se encontra a divulgação ou o apeio à violência, antes pelo contrário!
Em segundo lugar, permitam-se que lhes diga que a brutalidade verificada nos momentos que antecederam o início do jogo entre o Liverpool e o Juventus não pode também estar alheada do que os meios de comunicação social, por essa Europa fora, andam a fazer junto das populações. Penso no que se passa na RTP quando nos são impingidas séries sucessivas sobre violência, em que a vida humana é tratada como algo para destruir e não como algo a preservar. Pergunto se também não será por actuações da comunicação social como estas que há actuações sociais de manifestação e de extravasamento de determinados sentimentos para que há apelo a partir dos meios de comunicação social.
Em último lugar, gostaria de deixar uma reflexão a todos nós. É que, episódios como aquele a que ontem tivemos oportunidade de assistir na RTP fazem com que perguntemos que Europa se está a construir e que futuro se está a construir, bem demonstrado por algumas atitudes que ontem se verificaram.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero fazer filosofia política nem tirar dividendos de nenhuma espécie do que ontem se passou em Bruxelas. Penso que é lamentável que tais coisas aconteçam.
Por outro lado, creio que o espectáculo de violência não é só apanágio de Bruxelas. Todos vimos, há dias, o que se passou em Portugal, em Barcelos, em relação a Espanha.

O Sr. José Lelo (PS): - Muito bem! É verdade!

O Orador: - Portanto, invocar Bruxelas a respeito da violência não nos pode fazer esquecer do acto indecoroso e inconcebível a que assistimos aqui em Portugal no final da transmissão do jogo de hóquei em patins Portugal-Espanha.
O que me parece importante é que as autoridades portuguesas possam precaver-se face a eventuais casos como este que possam acontecer na próxima época desportiva relativamente a Portugal.

A Sr.ª Amélia Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - As autoridades e o Governo português têm a responsabilidade de evitar que casos como aqueles se possam repetir em Portugal. Os gradeamentos, o controle das claques que vêm do estrangeiro e da claque portuguesa é uma estrita obrigação das autoridades, sobretudo daquelas a quem cabe o pelouro do desporto.
Em relação à RTP, solidarizo-me com as palavras proferidas pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura. Mas tenho as minhas dúvidas quanto a podermos fazer qualquer tipo de pressão porque isso era a Assem-

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bleia da República assumir, por mote próprio, aquilo que tanta gente reprova aos executivos portugueses e que é o fazer pressão sobre os órgãos de comunicação social. É por essa razão que não me parece curial assumirmos a responsabilidade de efectivarmos pela prática aquilo que, muitas vezes, criticamos que os executivos portugueses assumam.

O Sr. Presidente: - Se desejar responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria começar por dizer que a minha sugestão foi no sentido de que o Sr. Presidente e esta Câmara se informassem junto da Televisão sobre se ela realmente estava na disposição de transmitir o material que lhe for fornecido pela Televisão belga.
Parece que a Câmara está de acordo com esse pedido de informação, o que não quer dizer, de forma nenhuma, que haja pressão por parte da Assembleia. Há, simplesmente, a consciência cívica que não pode estar afastada da consciência política de qualquer cidadão, muito menos sendo ele deputado.
Quanto à violência, de acordo com o que disse o Sr. Deputado Magalhães Mota e um pouco em dúvida quanto à pedagogia que o Sr. Deputado Nogueira de Brito diz poder haver, devo dizer que se a agressividade fosse pedagógica as guerras já tinham acabado neste mundo.
O que está escrito em qualquer tratado sobre agressividade - e muitos há e em diferentes épocas - é que a agressividade gera a agressividade, tal como o suicídio gera o suicídio. Quer dizer, o homem sente-se sozinho e, em situação de agressividade, age ao contrário do que agiria em situação de solidariedade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Lelo.

O Sr. José Lelo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esquecendo a violência, dirigir-me-ei a questões bem mais pacíficas.
Assim, antes de mais, como deputado socialista pelo círculo do Porto, não quero deixar de exprimir a minha profunda solidariedade ao dinâmico e empreendedor concelho de Espinho e ao progressivo distrito de Aveiro, solidariedade esta que vai tão longe que se inclina mesmo para uma solidariedade mais intima e cooperante com este concelho de Espinho no âmbito do espaço económico, social e cultural, definido pela área metropolitana do Porto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Aeroporto de Pedras Rubras irá em breve ser objecto de uma profunda remodelação que implicará com a construção de infra-estruturas que visarão servir, numa primeira fase, 1,5 milhões de passageiros/ano e, numa segunda, 3 milhões de passageiros/ano.
Este vultoso investimento resulta e decorre da total inadaptação das actuais estruturas aeroportuárias do Norte às exigências de uma região laboriosa, que representa 70% das remessas de emigrantes e gera cerca de 60% das exportações nacionais.
Assim, compreender-se-ia que o alargamento do aeroporto do Porto se processasse numa perspectiva integrada, de que as ligações em termos de transporte suburbanos de ligação ao Porto serão um aspecto relevante a ter em devida conta.

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Neste contexto, tendo em consideração que, para este tipo de ligações, o caminho-de-ferro se afirma, quer pela qualidade do serviço, quer pela rapidez, conforto e preço, parecerá ser aconselhável que esta hipótese seja acolhida em termos de apoio ao novo aeroporto, como acontece na maioria dos capitais europeias. Esta solução perfila-se como exequível e rentável, designadamente, tendo em conta a grande proximidade da linha da Póvoa da zona da futura gare de Pedras Rubras.
Acrescerá referir que esta ligação se, por um lado, possibilitaria o transporte rápido entre a cidade e o aeroporto, também, por outro, contribuiria para mitigar os conflitos de trânsito automóvel nas vias de acesso à zona aeroportuária. No entanto, a inserção desta nova via ferroviária na rede da CP conduziria também a que os benefícios dessa ligação rápida se estendessem de imediato às cidades da Póvoa de Varzim e Matosinhos e, por que não dizê-lo, à cidade de Espinho.
Estas perspectivas de rentabilização de um equipamento tão importante como o caminho-de-ferro, com uma grande vocação para o transporte suburbano de passageiros, terão de ser encaradas pelo Governo. Principalmente, tendo em conta que, neste domínio, a área metropolitana do Porto, uma grande urbe de dinâmica e laboriosa actividade económica, tem sido postergada em função dos interesses de Lisboa que, neste domínio, tudo tem: metropolitano e caminho-de-ferro.
Urgirá pois que, paralelamente com a implementação desta nova via de ligação do Aeroporto de Pedras Rubras à rede ferroviária envolvente da cidade do Porto, seja também estudada e viabilizada a utilização da linha de cintura interna. Uma rede que já existe e que, mercê de um diminuto investimento inicial, poderia, de imediato, contribuir para a criação de um verdadeiro metropolitano de superfície na zona limítrofe do Porto.
Estas e outras questões, tão importantes para a região do Porto, como a linha dupla electrificada para o Marco de Canaveses que facultaria o desenvolvimento metropolitano para o interior do distrito, terão de ser encaradas com determinação e empenhamento, pois o tempo urge e o Norte exige.

Aplausos do PS e de alguns Srs. Deputados do PSD.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando agora no período da Ordem do Dia, temos para apreciação pelo Plenário um pedido de prorrogação por mais 15 dias, formulado pela Comissão Eventual de Inquérito à Torralta.
Vamos, pois, votá-lo.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão igualmente em apreciação as contas de gerência da Assembleia da República de 1984.

Pausa.

Não havendo nenhum Sr. Deputado inscrito, passamos à sua votação.

Submetidos a votação, foram aprovadas por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos agora na 2.ª parte da Ordem do Dia, da qual consta a apre-

ciação das ratificações n.ºs 144/III, 145/III, 146/III e 147/III, propostas respectivamente pelo PCP, pelo PSD, pelo PS e pelo CDS, do Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, que aprova o Código do Direito de Autor e Direitos Conexos.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Volto à RTP, desta feita para colocar uma questão que tem a ver com algo que se passa no nosso país, que se liga directamente com a realidade portuguesa.
Na cobertura dos trabalhos da Assembleia da República, o Telejornal e os serviços noticiosos da Televisão incluíram reportagens acerca do debate do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos que puderam ser entendidas pela esmagadora maioria da opinião pública como exemplo acabado de manipulação.
Sem pretender tomar demasiado tempo à Câmara, direi rapidamente o que se passou: não houve imagens da intervenção do Sr. Dr. Luís Francisco Rebelo, neste momento deputado independente na bancada do PCP, nem qualquer alusão a ela, não obstante ter sido qualificada por todos os intervenientes no hemiciclo como relevante e mesmo essencial para o debate que estávamos a travar.
Pelo contrário, uma frase utilizada em termos puramente judicativos e - permita-se-me que, judicando também, o diga - de mau tom, pelo Sr. Deputado José Niza, acabou por ser aproveitada para dar da intervenção do Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo a ideia de alguma coisa que estaria desfasada no tempo e desadequada à discussão que aqui tinha lugar.
Não se trata já de puros critérios informativos, mas de uma total manipulação do que se passou nesta Câmara, com vista a suscitar, junto dos telespectadores, tomadas de posição que nada têm a ver com a realidade dos factos, pelo que se configura uma violação descarada à Lei da RTP, à legislação que norteia a imprensa em Portugal, uma violação aberta das regras do pluralismo e da objectividade, que têm consagração constitucional e, como disse no início das minhas palavras, um exemplo malsinado e descabelado de manipulação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não pode esta bancada deixar de denunciar, com extrema veemência, segura de que será coonestada por todos os outros deputados presentes, uma tal forma de reportar os trabalhos do Parlamento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Interpelo, pois, a Mesa, directamente o Sr. Presidente, no sentido de saber que medidas julga poder accionar de imediato com o fim de restabelecer a legalidade democrática, por que é disso que se trata, e de repor a justeza da transferência para a opinião pública do debate que estamos a efectuar e que, deste modo se vê vil e grotescamente deturpado.

Aplausos do PCP e de alguns Srs. Deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em função da interpelação que nos é feita, quer dizer a V. Ex.ª que

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na forma normal e habitual que tenho tomado no meu posicionamento em relação à Televisão não faço nunca pedidos e nem sequer exigências, porque não tenho cobertura legal para o efeito. O assunto já foi tratado numa conferência de líderes, o que me inibe, portanto, de qualquer relacionamento com a Televisão, como, aliás, com quaisquer outros meios de comunicação social. Em todo o caso, perfilhando grande parte das afirmações que fez, vou apenas retirar o extracto daquilo que referiu e mandar para a Televisão para que tome conhecimento do protesto que V. Ex.ª aqui fez. Não vejo, infelizmente, outros campos de actuação onde a Mesa e o Presidente da Assembleia da República se possam movimentar, sob pena de quebrar a isenção e a independência com que pretendemos e desejamos actuar sempre.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, uso a figura da interpelação à Mesa porque acho que poderia ser redutor do significado e do alcance da intervenção do Sr. Deputado José Manuel Mendes ela ficar cingida à bancada em que ele se integra nesta Assembleia.
Todos nós tomámos conhecimento do que se passou no outro dia com a forma como foi dada a público e noticiada a primeira parte do debate sobre as ratificações relativas ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, e não podemos deixar de sentir uma sensação mista de espanto e de repugnância pelo que se estava a passar.
Há pouco reivindiquei, aqui mesmo, a independência da Radiotelevisão Portuguesa face a esta Assembleia, e é na perspectiva dessa mesma independência que agora interpelo a Mesa com um sentido fortemente crítico em relação à forma como foi elaborada essa cobertura noticiosa.
Realmente, essa cobertura, pelo menos na aparência, releva de autêntica manipulação dos factos, e quero recordar ao Sr. Deputado José Niza que ele, no outro dia, a propósito de uma das normas do Código do Direito de Autor reivindicou, com grande frequência, a circunstância de o actual governo presidido pelo Dr. Mário Soares, não ser nunca capaz de se dedicar a tarefas desse tipo e de utilizar uma norma como o artigo 72.º
Sr. Presidente, realmente vejo no que se passou na Televisão, no outro dia, um caso muito claro de manipulação, e interrogo-me sobre quão longe se poderia ir com uma norma como é o artigo 72.º
Que tudo isto constitua para nós um motivo de reflexão, e agradecia que V. Ex.ª, no uso de poderes que lhe cabem como Presidente desta Assembleia - e encarregado, portanto, de dirigir os seus trabalhos e de a representar perante o exterior -, faça sentir à Televisão o sentido da nossa crítica, que é muito veemente?

Aplausos do CDS, do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Em relação às declarações agora prestadas por V. Ex.ª, Sr. Deputado Nogueira de Brito, e tal como referi em relação ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, farei chegar à Televisão as declarações que acabou de prestar.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

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A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Presidente, é evidente que todos nós partilhamos do mesmo sentimento no que respeita à forma como foi feita a notícia: foi tendenciosa, parecia que o artigo 72.º estava já a funcionar e que este debate não era do interesse público.
Sugeria ao Sr. Presidente, se estivesse de acordo, que pedisse à Radiotelevisão um novo bloco sobre este assunto - que o merece - de forma a que os partidos e todos os que intervieram neste debate pudessem dar ao povo português conta daquilo que estão a fazer nesta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não posso, infelizmente, dar inteira cobertura àquilo que V. Ex.ª agora refere, na medida em que não peço nada à Televisão nem a qualquer outro meio de comunicação social. Eles é que têm obrigação de estar atentos aos problemas que no País têm relevo. É isso que distingue o bom jornalista, e neste caso também os bons profissionais, que devem acompanhar e procurar saber dos acontecimentos que, de algum modo, condicionam a vida do nosso país. Se o não fazem ficarão qualificados como tal, mas eu não quero lançar qualquer juízo sobre esse posicionamento ou relacionamento.

Aplausos da Sr.ª Deputada Margarida Salema (PSD).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Cultura, Srs. Deputados: Já aqui abordamos alguns dos problemas suscitados pela publicação do Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, aprovando uma nova versão do Código do Direito de Autor.
Fizemo-lo então, na perspectiva das relações entre os dois órgãos de soberania, que são a Assembleia da República e o Governo, e da necessidade de chamar a atenção do País para os perigos que o próprio regime democrático corre, sempre que os titulares do poder político não cuidam de evitar que a realização de objectivos meramente pessoais ou partidários possa contribuir para agravar um certo clima de tensão entre as instituições, infelizmente já instalado entre nós.
Entendíamos então, como continuamos hoje a entender, que a publicação pelo Governo de um decreto-lei sobre matéria, em relação à qual se encontrava pendente um projecto de lei - o projecto de lei n.º 291/III, da autoria de dois deputados do CDS corresponde a uma situação desse tipo.
Não houve, é certo, violação de qualquer dispositivo regimental ou constitucional, tendo o Governo usado uma competência legalmente indiscutível.
Mas houve uma quebra, sem precedente, das praxes respeitantes às relações entre os dois órgãos de soberania, que remetem para o respeito da iniciativa prioritária sempre que esteja em causa o exercício de uma competência concorrente.
Respeito que, como é óbvio, não teria impedido o Governo de aqui apresentar uma proposta sua, a fim de ser apreciada em conjunto com a iniciativa dos deputados.
Impedia-o, isso sim, de ter exercido isoladamente ; sua competência legislativa, remetendo a Assembleia todos os interessados para as contigências próprias de

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um processo de ratificação, tal como se encontra previsto na Constituição e no Regimento.
Soubemos, entretanto, e já aqui o demos a conhecer, que a intenção do Sr. Primeiro-Ministro era afinal a de se limitar à apresentação da proposta, tendo mesmo considerado que teria sido essa a forma utilizada, neste caso, conforme confissão feita a alguns órgãos de informação.
Resta-nos, no entanto, lamentar que o Sr. Dr. Mário Soares exerça com tanta leviandade ou, pelo menos, distração, uma das mais importantes competências do Governo, como é, sem dúvida, a de legislar através de decretos-lei e fazer votos para que deixe definitivamente de assinar de cruz todos os papéis que lhe põem à frente, quanto mais não seja como treino para as tarefas de promulgação a que, pelos vistos, tanto aspira.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Voltemos, porém, ao assunto que constitui o objectivo da nossa sessão de hoje, para, em sede de apreciação da generalidade do Decreto-Lei n.º 63/85 - curiosamente requerida por quase todos os partidos com assento parlamentar, incluindo o partido integrado na maioria a que pertence o Ministro da Cultura -,analisar mais detidamente as soluções aí consagradas, bem como para justificar de modo sumário a posição do CDS.
No que respeita ao novo Código aprovado, dir-se-á, antes de mais, que se trata de um texto com estrutura em tudo semelhante à do projecto do meu partido, descontando obviamente as falhas mais grosseiras, como seja a inclusão das regras respeitantes ao regime internacional dos direitos de autor, no capítulo referente apenas à definição do próprio conceito de autor e à sua identificação, ou os casos de simples arrumação formalmente diferente como seja a dos dispositivos relativos à utilização das obras protegidas.
Interessa, no entanto, salientar que todas as matérias tratadas no novo Código, incluindo aquela cuja consagração legislativa foi aqui apontada como correspondendo à grande originalidade deste diploma - e estamos dispostos a aceitá-lo! - ou seja a dos direitos afins conexos ou vizinhos, constavam já do projecto do CDS.
Quanto ao mais, houve a preocupação evidente, já apontada a propósito da arrumação dos dispositivos sobre a utilização em especial, de fazer obra diferente, com o óbvio intuito de insinuar junto do público a ideia de que entre o Código do IX Governo e o projecto do CDS nada há de comum, tratando-se agora de obra inteiramente original, fruto de um labor todo ele renovado, sem ofensa de quaisquer direitos de autoria, mesmo que para isso se tenha corrido frequentemente o risco de introduzir modificações ou transformações de que resultaram erros e insuficiências manifestas.
Aconteceu, isso, por exemplo com o pequeno toque «inovador» dado no texto do normativo correspondente ao artigo 32.º sobre a reciprocidade no tratamento dos autores estrangeiros (já não pequeno!), ou como resultante da introdução do complicado regime sobre o prazo mínimo para divulgação das obras póstumas, correspondente ao n.º 3 do artigo 70.º, que teve como efeito lançara ideia de que se pretendia reduzir o prazo de protecção quando transferido para os herdeiros.

E todo esse esforço de não deixar, aparentemente, pedra sobre pedra, acabou por ser inútil, sendo certo como é que o Sr. Ministro da Cultura e o Governo não necessitava de se afadigar em alterações formais para que o seu código aparecesse aos olhos de todos como inteiramente diferente do aqui apresentado pelos deputados do CDS.
É que a diferença fundamental entre os dois textos ,resulta, mais do que da forma, da filosofia de base com que encaram e resolvem os vários problemas postos a um regime jurídico dos direitos de autor.
Enquanto o projecto de lei n.º 291/III aparece nitidamente inspirado sobretudo pela ideia da protecção dos autores e de todos quantos dão um contributo pessoal à transmissão da obra artística (os titulares dos direitos vizinhos, na sua terminologia), o código do Governo do bloco central não consegue disfarçar um autêntico preconceito face aos autores e artistas.
Preconceito, concretizado, como se verá, em vários dos dispositivos do Código e que assenta em duas razões consideradas naturalmente como fundamentais, numa óptica socialista e por isso mesmo centralizadora.
Por um lado, na necessidade de acautelar, contra o interesse privado dos criadores intelectuais e artísticos, o interesse público na divulgação dos bens culturais, argumentação que, em última análise, pode conduzir, como já tem conduzido, à situação absurda de justificar a limitação do tempo de protecção dos direitos do autor individual com a assunção pelo Estado do encargo de protecção do colectivo dos autores, dos autores como classe, através de esquemas como o do «domínio público remunerado».
Por outro lado, a circunstância de sermos um país predominantemente importador de bens culturais o que faria, em última análise, que a protecção dos seus criadores acabasse por se traduzir numa causa indirecta de sangria de divisas.
Mas se é, em princípio falsa e preconceituosa, a posição que se traduz em considerar sempre que o interesse geral só se alcança e realiza sobre o sacrifício dos interesses privados, no caso da primeira razão invocada, trata-se de uma perspectiva completamente errada das realidades concretas que importa considerar.
Com efeito, o interesse geral da divulgação dos bens culturais só será realizado se e enquanto houver efectiva criação cultural e esta acabará certamente por desaparecer se autores e artistas não forem devidamente incentivados, o que passa pela existência de uma protecção eficaz dos direitos inerentes à criação, designadamente dos seus aspectos patrimoniais.
Tudo o mais não passa de fantasias mais ou menos românticas, aliadas a uma atitude patológica de desconfiança perante a iniciativa individual e a sua capacidade para, mesmo no domínio restrito da criação cultural, promover, por si, a realização do interesse geral.
Do mesmo modo, o trazer à colação a situação das nossas contas com o exterior - que supúnhamos já em estado que dispensasse tal invocação - para em nome da necessidade de promover o seu equilíbrio, controlar a actividade e a iniciativa das pessoas, mesmo no caso dos próprios criadores culturais, releva de uma atitude de péssimo e de resignação que os Portugueses não podem continuar a aceitar.
Especialmente numa altura em que os principais parâmetros invocados se não compaginam com institui-

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ções que já aceitamos, como seja a livre circulação das pessoas e o direito de estabelecimento, no quadro das comunidades europeias.
Mas foi em nome, ao menos aparentemente, destes dois erros que se consagraram soluções como as que se traduziram e cito a título de exemplo:

Na inversão da presunção da titularidade do direito de autor, no caso das obras criadas em execução de um dever funcional ou contrato de trabalho;
Na possibilidade de modificação das obras criadas, quando exigidas pelo fim a que o seu uso se destina;
Na aparente redução do prazo de protecção no caso das obras póstumas ( e digo « aparente», Sr. Ministro, porque aceito que a ideia dos 15 anos não terá feito senão lançar uma grande confusão nos espíritos. Mas lançou-a, pode o Sr. Ministro estar certo!);

Na já célebre e aqui tão invocada possibilidade de restringir ou proibir a circulação, representação e exposição da obra por razões de interesse público;
No regime consagrado para a cópia, para uso privado;
No regime estabelecido para a protecção dos direitos conexos ou vizinhos, com a redução dos prazos de garantia - e alguns já estabelecidos! - e com o estabelecimento de prazos curtos, inexplicavelmente diferentes dos consagrados para os direitos de autor e diferentes daquilo que se encontra estabelecido em grande número de legislações estrangeiras.

E é, também, no fundo a mesma atitude de menos consideração para com os direitos dos criadores culturais que levou o Governo, sem ter até agora definido frontalmente a sua atitude face à política definida no Código Penal, a aderir agora à tendência despenalizadora nele consagrada, invocando-a mesmo para justificar a redução, por essa via, da protecção dos autores e dos titulares de direitos vizinhos.
Tudo ponderado, Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Srs. Deputados, o CDS entende apresentar para apreciação propostas de alteração a todos os normativos do Código agora publicado, identificadas todas com o texto do nosso próprio projecto, ressalvados, é claro, os casos em que chegámos já a acordo no âmbito da Subcomissão especial, constituída no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e cujo labor não me cansarei de enaltecer afirmando, designadamente, o muito gosto e honra que tive em participar nos respectivos trabalhos.

Ao mesmo tempo, Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados, submeteremos à aprovação da Câmara uma resolução com vista à suspensão total do Código até conclusão dos trabalhos de apreciação do Decreto-Lei n.º 63/85.
Ao fazê-lo esperamos que a Assembleia assuma as suas responsabilidades e saiba dar ao Governo a lição de que, sem dúvida, necessita e de que se tornou merecedor neste caso concreto.

Aplausos do CDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Niza pediu a palavra para formular um pedido de esclarecimento. Mas o Partido Socialista já não dispõe de tempo ...

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, se me permite, por dádiva generosa da UEDS, fomos contemplados com 10 minutos - bem como outros partidos.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado, para formular o pedido de esclarecimento.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nogueira de Brito: Esperava esta intervenção e, se quer que lhe diga, não penso que ela tenha sido desenquadrada do enquadramento geral que precedeu os debates e o nosso trabalho na Subcomissão. No entanto, queria dizer-lhe que, embora muito agradável e que dignifica esta Câmara! - que seja o próprio líder parlamentar do CDS a defender o seu projecto e a participar neste debate, estranho, no entanto, que o ex-Ministro da Cultura, Lucas Pires, e o ex-Secretário de Estado da Cultura, Gomes de Pinho - autores deste projecto do CDS - não tenham tido uma participação, digamos, mais activa (até este momento) neste debate! Seguramente que o poderiam enriquecer. Independentemente da boa substituição e do bom advogado de defesa que têm no Sr. Deputado Nogueira de Brito, gostaria que eles também tivessem tido a possibilidade de participar.
Referiu o Sr. Deputado que este diploma foi «assinado de cruz» pelo Primeiro-Ministro. Não me levará a mal que diga que penso que deverá ser o CDS, como partido democrata-cristão, a ter o privilégio de «assinar de cruz» e não o Partido Socialista.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Há falta de melhor!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É essa a confusão habitual do CDS!

O Orador: - Quanto à questão que colocou - e que me parece a mais importante de todas - sobre os direitos vizinhos penso que houve aqui uma confusão sua, pois o Sr. Deputado confundiu o interesse privado com o interesse estrangeiro, digamos assim. Na minha intervenção de ontem coloquei aqui a nossa posição em relação à defesa intransigente dos interesses dos autores nacionais e do País em relação ao estrangeiro. E quando falei na balança de pagamentos e nos pagamentos ao estrangeiro logicamente eles decorriam de toda a equiparação que se fizesse entre nacionais e estrangeiros em que estes últimos, beneficiariam, na medida em que tinham, digamos, uma quota maior na área das edições e divulgações das suas obras em Portugal.
Portanto, nada há aqui contra o privado, mas sim uma defesa do País em relação ao estrangeiro. E não é à custa do privado, porque se este, por exemplo, for para as editoras ou produtoras - que são empresas privadas - verá que elas, pela primeira vez, são contempladas com remunerações e compensações que não constavam dos códigos anteriores. E se for ver as legislações internacionais nesta matéria verá que, em relação aos direitos conexos ou direitos vizinhos, a protecção que nós damos aqui está talvez acima da média dos países europeus - independentemente das propos-

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tas divergentes que existem. Portanto, além de ser uma inovação, a protecção dos direitos vizinhos é justa e talvez até ultrapasse aquilo que o País neste momento pode conceder. E digo-lhe que talvez ultrapasse, porque em muitos casos - designadamente, em relação aos direitos dos artistas, dos executantes e dos intérpretes - eles são sensivelmente superiores àquilo que se passa em outros países europeus. Tive o cuidado de consultar essas legislações e verifiquei que, se fizermos uma média, aquilo que concedemos neste momento, com a nossa proposta de alteração - os 35 anos -, é superior àquilo que se passa no estrangeiro.
Finalmente, uma outra questão importante em relação aquilo que anunciou no final: a suspensão do Código enquanto ele não for revisto e, portanto, enquanto não sair da Comissão dos Direitos, Liberdades e Garantias.
Perguntaria ao Sr. Deputado Nogueira de Brito o seguinte: qual é a alternativa? A suspensão deste Código vai deixar, logicamente, sem cobertura - ou com a cobertura anterior - toda esta situação. Perguntar-lhe-ia se não concordaria comigo - dado o trabalho já feito, o consenso verificado e a previsão de uma rapidez de resposta dos trabalhos da nossa subcomissão ou da Comissão dos Direitos, Liberdades e Garantias -, que seria, mais útil, em termos de eficácia, não suspender o Código e apresentá-lo alterado num curto espaço de tempo, para não causar na sua interpretação, naqueles que o têm de manusear e utilizar, uma grande confusão. Tenho a impressão de que a revogação feita dos diplomas que constam deste Código, e agora a sua suspensão, causará e lançará uma grande confusão na opinião pública e, nomeadamente, naqueles que têm de trabalhar com ele.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Luís Francisco Rebelo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, manifestar a minha quase total concordância com a intervenção brilhante do Sr. Deputado Nogueira de Brito, nomeadamente quanto à parte final da sua intervenção, em que se referiu à apresentação do pedido de suspensão do Código de Direito de Autor e dos Direitos Conexos.
Queria dizer que o Partido Comunista Português, ao pedir, antes de qualquer outro dos partidos representados nesta Assembleia, a ratificação desse diploma considerando a urgência que havia em proceder à mesma -, apresentou um projecto de resolução que termina precisamente por propor que a Assembleia se pronuncie pela inscrição na ordem do dia da ratificação n.º 144/III, com vista à urgente suspensão do Decreto-Lei n.º 63/85, nos termos regimentais.
Queria também acrescentar o seguinte: este pedido de suspensão tem uma justificação muito séria e que vem a ser a de que por parte das autoridades policiais está a verificar-se uma sistemática abstenção de intervirem em casos flagrantes de violação do direito de autor, que pode levar ao generalizado incumprimento da lei nesta matéria.
Temos - e tive ocasião de em sede de subcomissão parlamentar apresentar a respectiva documentação comprovativa - vários ofícios emanados de autoridades policiais que dizem que, face aos termos em que

se encontra redigido o actual diploma, os poderes de intervenção que lhes eram concedidos por legislação anterior lhes foram retirados. 15to está a gerar uma situação extremamente grave que justifica, por conseguinte, que o Partido Comunista Português, ao ter pedido a ratificação deste diploma, tome uma posição consonante com a que consta do projecto de resolução, oportunamente apresentado.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nogueira de Brito: Ouvi atentamente a sua intervenção e devo confessar que, independentemente do juízo político que formulou relativamente à metodologia adoptada pelo Governo quando estava pendente na Assembleia um projecto de lei da iniciativa do CDS sobre a mesma matéria, fiquei sem perceber uma coisa.
É que das duas uma: ou o decreto-lei do Governo é uma cópia do projecto de lei do CDS, com algumas modificações - e então não é tão mau como isso e, portanto, o que importa é prosseguir o debate da ratificação e alterá-lo naquilo que seja necessário e discordante do projecto do CDS -, ou o decreto-lei é péssimo e então o Sr. Deputado deveria ter proposto a recusa da sua ratificação. O que penso que não faz muito sentido é que termine a sua intervenção dizendo «vamos pedir a suspensão da execução do decreto-lei».
Como foi aqui dito e observado por deputados que me antecederam, há um diploma sobre a matéria do direito de autor de 1966, que foi revogado pelo decreto-lei agora em vigor e que vai ser objecto de alterações. Assim, já o concluímos, e que já foi sendo dito pelos vários intervenientes neste debate e que, portanto, dará origem a uma lei de emendas do decreto-lei, que entrará em vigor quando for publicada, obviamente, e que introduz modificações no decreto-lei em vigor.
Por outro lado, se assim é, como é que é possível que com a suspensão da execução, que implica o retomar das normas entretanto em vigor, V. Ex.ª possa aceitar que na ordem jurídica portuguesa, num prazo curto de 5 ou 6 meses, vigorem quatro diplomas distintos sobre a mesma matéria? Então, aquilo que foi agora observado pelo Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo ainda acarretará mais distúrbios, digamos assim, no que toca à actuação das actividades policiais e administrativas, já que ao abrigo do Código anterior tinham a possibilidade de actuar nos casos de violação dos direitos de autor.
Não seria então mais lógico, naquelas disposições que V. Ex.ª considera não corresponderem àquilo que o CDS prevê, que a suspensão da execução se remetesse pura e simplesmente apenas a essas disposições? Por exemplo, no caso da disposição agora citada pelo Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo - e terei ocasião de o dizer na intervenção que vou proferir -, que é o artigo 207.º do Código de 1966, segundo o qual o titular de direitos de autor pode reclamar junto de entidades policiais, administrativas e judiciais do lugar onde se verifique a violação de direitos a imediata suspensão da representação, execução, recitação ou exibição da sua obra intelectual, não seria muito mais curial,

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do ponto de vista da protecção dos direitos que aqui estão em causa, que se pedisse então a suspensão parcial da vigência do decreto-lei?
Nomeadamente, também não posso compreender como é que se pede essa suspensão in totum, quando nesse Código, pela primeira vez, se protegem muitos direitos e, designadamente, os direitos que designou de afins, vizinhos e a que o Código chama «direitos conexos».

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, começaria naturalmente por responder ao Sr. Deputado José Niza, dizendo que felizmente tenho uma atitude diferente na Comissão e no Plenário. E digo felizmente porque é possível na Comissão chegarmos mais rapidamente a soluções de conjunto, mas essa possibilidade é parte da minha resposta á Sr.ª Deputada Margarida Salema.
Sr. Deputado José Niza, temos uma divisão de tarefas no partido que, creio, não teremos de a discutir no Parlamento. Quem assinou esse projecto - e bem, pois assumiu na altura a responsabilidade política por ele, depois de ter tido um lavor intenso na sua preparação, enquanto Ministro da Cultura, acompanhado por aquele companheiro de partido, que serviu com ele no Ministério como Secretário de Estado da Cultura foi o nosso presidente e um dos nossos vice-presidentes da Comissão Política. E foi no contexto da divisão do trabalho que se faz no partido e nos cargos de direcção do partido que o líder parlamentar teve este encargo que assumiu com muito gosto de vir aqui defender um texto que era do presidente do seu partido e dos seus colegas vice-presidentes. Não vejo que isso tenha mal e não aceitarei, mesmo, discuti-lo para além desta pequena explicação que, com muito gosto, dou ao Sr. Deputado José Niza.
Quanto ao «assinar de cruz», Sr. Deputado José Niza, isso não tem nada a ver com partidos democratas-cristãos. «Assinar de cruz» é uma expressão que o povo português utiliza, que não tem direitos de autor. Outra coisa seria assinar com cruz, mas eu não quis ir tão longe.

Risos.

Nunca atribuí ao Sr. Primeiro-Ministro essa necessidade de assinar com cruz - valha-me Deus! O que ele faz, é «assinar de cruz» algumas vezes.

Risos.

Sr. Deputado José Niza, não há dúvida alguma de que uma das razões fundamentais deste Código, repetida exaustivas vezes aqui e na Comissão - nesse aspecto é verdade, o Sr. Deputado José Niza fê-lo várias vezes -, é a da necessidade do equilíbrio da nossa balança de pagamentos com o exterior. Não sabíamos que era esta a matéria. 15to faz-nos lembrar o Dr. Álvaro Cunhal, que é quem costuma falar dos cachimbos que importamos, etc. Não sabia que era por aqui que lá íamos, mas se é assim, está bem!

O Sr. José Niza (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

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O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Eu considero a balança de pagamentos não apenas em termos de divisas ou de moeda. Há uma balança cultural que me preocupa, fundamentalmente, se estiver desequilibrada a favor do estrangeiro. Há uma balança cultural e um mercado comum da cultura. É nesse sentido que eu lhe agradeço que entenda este tipo de preocupações minhas.

O Orador: - Sr. Deputado José Niza, o que eu lhe digo é o seguinte: nos parâmetros do tratado que vamos assinar - porventura, na próxima semana - e nas perspectivas que por aí se abrem, não vejo que possamos continuar a utilizar em termos práticos esta filosofia, que é fundamentalmente proteccionista e que, neste caso concreto, se traduz em desproteger ou diminuir a protecção dos artistas nacionais, visando protegê-los da concorrência dos artistas e dos autores estrangeiros. 15so é negativo, é o tal sentido de pessimismo e de resignação que eu entendo que os Portugueses não podem continuar a utilizar.
Portanto, não aceito que essa razão, que é também uma razão de interesse público - o interesse público perpassou e marcou este Código tal como foi publicado pelo Governo -, seja aceite para consagrar as soluções adoptadas no Código.
Quanto ao Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, só resta congratular-me com as suas palavras e dizer-lhe o seguinte: já fiz, há dias, algumas observações à sua intervenção e, Sr. Deputado, não tendo presente o texto da sua proposta de resolução, acontece que nós também apresentámos um projecto de resolução com o mesmo objectivo.
Passo agora a responder à Sr.ª Deputada Margarida Salema, dizendo o seguinte: não acho estranho e, quiçá, por isso é que o meu partido decidiu fazer a suspensão in totum.
E não é estranho, Sr.ª Deputada, porque está demonstrado, em primeiro lugar pela natureza e pela extensão das reacções solicitadas por este Código, que os interessados ou destinatários dele com certeza que considerarão preferível passar, num curto período de tempo, por três regulamentações, seja a do Código de 1976, a deste malfadado Código ou a do novo Código que há-de sair desta Assembleia.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - E o outro?

O Orador: - Esse já era conhecido e agora volta, Sr.ª Deputada. Era um regime que já era conhecido. Em termos de regimes propriamente ditos, há três regimes, mas se a Sr.ª Deputada quer quatro regimes, sejam.
Continuando, entendo que será preferível do ponto de vista dos interessados a passagem por três regulamentações do que a circunstância de estarem sujeitos a este Código, do qual tanto se têm queixado e tantas são as vozes a queixar-se.
Sr.ª Deputada, V. Ex.ª não diga mal porque eu sei que a Sr.ª Deputada tem também uma perspectiva crítica. Doutra forma, não seria possível nos pontos fundamentais deste Código termos chegado em comissão a acordo sobre as modificações introduzidas.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

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O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Deputado, peço desculpa pela interrupção, mas se me permite devo dizer que tenho uma perspectiva crítica pontual e não global, o que é totalmente diferente. aliás, penso que também é essa a perspectiva do CDS, ao dizer que o decreto-lei do Governo é, um pouco, a reprodução, embora não para uso privado, do vosso projecto de lei.

O Orador: - Sr.ª Deputada, já abordo essa questão. É, aliás, minha obrigação, de cortesia e parlamentar, responder a essa questão fundamental que a Sr.ª Deputada me colocou.
O que é que o CDS diz? O CDS diz o seguinte: o esquema é o mesmo, quase rigorosamente. Há aí, também o intuito de fazer uma coisa aparentemente diferente, mas, como já disse, o esquema é o mesmo. As matérias versadas são as mesmas e isso, realmente, é um ponto muito importante, por causa dos tais direitos vizinhos ou conexos. É verdade, são as mesmas! A redacção, com manifestas infelicidades das soluções agora consagradas, é praticamente toda diferente e é-o, no nosso entender, com manifesta infelicidade. Esta é a primeira razão para que, na realidade, seja diferente.
A segunda razão para que seja diferente é a seguinte: em aspectos fundamentais - e que a Sr.ª Deputada Margarida Salema conhece muito bem -, a filosofia inspiradora do conteúdo vasado tem uma forma diferente, é completamente diversa. 15to é, num caso protegem-se fundamentalmente os direitos dos criadores culturais, e no outro caso protege-se o interesse público, a balança de pagamentos, etc., e não se protegem devidamente os criadores culturais.
15to dá-se, para além dos passos positivos que, sem dúvida alguma, se deram com o alargamento à protecção dos direitos vizinhos. Mas, mesmo aí, as soluções, como a Sr.ª Deputada sabe, são diametralmente opostas, ou melhor, muito opostas, quantitativamente opostas. 15to tem reflexos importantes na prática deste mesmo Código.
Há outra questão que a Sr.ª Deputada põe e que tem de ser respondida, Pergunta V. Ex.ª por que é que não recusamos a ratificação. Eu respondo-lhe que não o fazemos, em homenagem a uma questão de economia legislativa. Apesar de tudo, será preferível aproveitarmos - dado o trabalho que todos já fizemos e o que estaremos dispostos a fazer em comissão - as possibilidades que resultam de o esquema ser o mesmo, o facto de as matérias tratadas serem as mesmas e o processo próprio da ratificação, do que recusarmos essa ratificação. Fazemo-lo, pois, em nome do interesse de ter, rapidamente, um novo Código dos Direitos de Autor.
No fundo, trata-se de aproveitar o processo legislativo que verdadeiramente foi aqui desencadeado pelo CDS e que tão mal foi compreendido pelo Governo. Essa é a razão que nos assiste. Se fizéssemos de uma maneira diferente aí é que poderíamos estar a prejudicar o interesse de muitos que é o de terem, rapidamente, um novo código.
Quanto aos interesses mais fundamentais dos destinatários - e não falo dos direitos vizinhos, mas, por exemplo, os direitos dos produtores -, em certo sentido foram diminuídos na regulamentação dos direitos vizinhos, Sr.ª Deputada. Quero dizer-lhe que esses di-

reitos estarão mais protegidos, designadamente com todo o esquema penal do Código de 1966 do que estão com o Código actual.
Uma última questão para o Sr. Deputado José Niza. Não estive a defender interesses estrangeiros - suponho que ficou ciente disso - e os criadores culturais portugueses sentem também isso. Eles preferem suportar a concorrência com os criadores estrangeiros a terem um estatuto diminuído, como é o que resulta deste Código. Nessa matéria V. Ex.ª é a autoridade maior porque é um criador cultural que todos conhecemos e apreciamos.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Teria agora a palavra o Sr. Ministro da Cultura. Contudo, gostaria de saber se V. Ex.ª vai demorar mais de 10 minutos na sua intervenção, porque se o fizer intervirá da parte da tarde.

O Sr. Ministro da Cultura (Coimbra Martins): Demoro mais de 10 minutos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Já que demora mais de 10 minutos, V. Ex.ª desculpará, mas a sua intervenção fica para a parte da tarde.
Vamos, pois, antecipar o intervalo regimental, recomeçando os trabalhos cerca das 15 horas.

Eram 12 horas e SO minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, queria perguntar à Mesa se é possível distribuir o projecto de resolução, apresentado pelo CDS, relativo à suspensão da vigência do Decreto-Lei n.º 63/85.

O Sr. Presidente: - Sim Sr.ª Deputada, vai proceder-se a essa distribuição desde já.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura (Coimbra Martins): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde o primeiro dos raros discursos que fiz nesta Assembleia, prometi «também em cultura seremos pluralistas». E noutro passo: «Seremos contra a acção cultural exclusiva.» Foi na apresentação do programa deste IX Governo,
Não tenho sido infiel a este propósito que corresponde a uma arreigada convicção pessoal. O Ministério da Cultura tem sido pluralista. Não discriminei contra ninguém. Não discriminei contra nenhuma forma de cultura.
Ao elaborar no meu Gabinete um projecto de Código do Direito de Autor também não discriminei contra nenhuma das partes interessadas. E assumi um encargo do qual não tinham outros conseguido desempenhar-se. Todos concordavam em que estava velho o Código de 1966. Em 1977 tinha-se constituído um grupo de trabalho interministerial para revisão do

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articulado respectivo. Mas do grupo de trabalho, como tantas vezes sucede, infelizmente, com grupos e comissões, ficara o trabalho no papel.
Assumi o encargo. Em Março do ano passado, estava concluído o projecto do meu Gabinete. Tinham-se consultado, através das entidades representativas, os autores, os editores, os produtores, os intérpretes, os artistas, os arquitectos, os peritos na matéria... Tinham-se compulsado projectos anteriores, esboços de projectos, projectos incompletos. A proposta de lei subiu a Conselho de Ministros em 3 de Maio. Foi aprovada, sob reserva de redacção definitiva a cargo de quatro ministros.
Parece que um mau génio se obstinava contra o Código. A reunião não se fez, antes de expirar a validade de aprovação. Entretanto os interessados na actualização do articulado de 1966 não cessavam de me fazer sentir a sua impaciência. Incorporando emendas, e tendo em conta sugestões dos ministros interessados, o Código foi de novo a Conselho de Ministros, com projecto de decreto-lei. Com efeito o Governo dispunha de uma autorização legislativa - Lei n.º 25/84, de 13 de Julho - para definição de ilícitos criminais ou contravencionais, fixação das correspondentes penas e normas processuais, que lhe dava competência para aprovar. E aprovou, remetendo, porém, o texto para comissão restrita que o deveria afinar em pontos controversos.
Como a autorização legislativa ia expirar, o trabalho da comissão foi, não apenas aturado, mas também apressado. Daí um certo número de lapsos, por exemplo em remissões que punham em conexão artigos ou pontos que não a tinham, porque a ordem das cláusulas fora alterada por introdução ou desdobramento de artigos ou pontos, por supressão doutros, por inversões de ordem. Quando começaram a aparecer as críticas, já o meu Gabinete pedira a rectificação de muitos desses desacertos.
Piores que os lapsos eram certas redacções apressadas. Delas derivam aparentes contradições como a que foi relevada por Augusto Abelaira entre o ponto 1 e o ponto 2 do artigo 63. º, sobre modificações da obra. Apresentada em caricatura, dir-se-ia que o ponto 1 proíbe as modificações, sem consentimento do autor, claro, e o ponto 2 as autoriza. Na verdade, proíbem-se as modificações, mas pretende-se estabelecer que o consentimento do autor para uma transferência de modalidade - exemplo, a obra que transita de romance para filme - implica o consentimento para as modificações estritamente técnicas que a própria transferência reclama, sob condição, todavia, de elas não desvirtuarem a obra. Eu mesmo sugeri aos deputados sobre este assunto uma nova redacção da doutrina, que me parece justa.
Mas deixemos, por enquanto, a substância do Código.

A oposição, e especialmente o CDS pela voz do Sr. Deputado Nogueira de Brito, criticaram com acrimónia que o Governo tenha optado pelo decreto-lei, porquanto havia nesta Assembleia, agendada ou à espera de agendamento, uma ou mais propostas de Código. E assim era, na verdade. Mas não as havia só na Assembleia. Como já disse, também mas tinham deixado no Ministério da Cultura. E até cada especialista do direito de autor tinha, em ideia, esboço, ou redacção, a sua própria. E cada grupo, movido pelo interesse que o definia, sonhava com o Código que lhe con-

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vinha. Uma lei como esta contende com muitos interesses, e arbitra entre muitos interesses que contendem uns com os outros. O novo Código já se tinha feito esperar muito tempo. Tempo excessivo, como todos reconhecerão...
Seja como for, a questão - se questão houvesse, e defendemos que não há - estaria ultrapassada. É como uma controvérsia sobre o acidente que neste debate ocupa tempo. Impede que se trate do essencial.
É um outro artigo 72.º Se não existissem seria necessário inventá-los. Uma e outra - a querela do artigo 72.º e esta questão de correcção ou incorrecção (o Sr. Deputado Nogueira de Brito achou que o Governo tinha cometido acto feio) fornecem ao leigo, a quem não tem tempo para mais , a facilidade de uma opinião, afinada, para espiritual conforto de cada qual, pelas belas e grandes causas e pelas boas maneiras.
Que Governo este! Legislando comete um acto feio, e o resultado é mais feio ainda; portas abertas à censura. Mala parta, mala dilabuntur.
Perguntou o Sr. Deputado que vantagem teria resultado da iniciativa legislativa do Governo. Eu acho que ela está à vista. O CDS tinha submetido uma proposta à Assembleia, é verdade. A proposta baixou à Comissão, mas nunca foi agendada. Hoje, se estamos aqui a discutir, é porque o Governo cometeu o tal acto que o Sr. Deputado acha feio. E o articulado estará ratificado, conforme planeou por unanimidade a Comissão dos Assuntos Constitucionais, dentro de 30 dias. Não será este resultado uma real vantagem?
Eu não reconheço por experiência própria que o Governo recuse trabalhar com a Assembleia, ou tente diminuir a sua capital importância. Quando o CDS apresentou a sua proposta de lei de bases do património, aqui estive a explicar, sobre ela e votando por ela, o ponto de vista do Governo. E muitos dos complementos e afinações de que ela veio a beneficiar em trabalho de Comissão foram discutidos entre os deputados que a integravam, e o meu Gabinete.
Mas quanto ao Código, quanto ao Código, terá realmente havido, da parte do Governo, qualquer coisa como uma manobra de antecipação? Eu não recuso o exame.
É verdade que o CDS apresentara em 1 de Março de 1984 à Assembleia a sua proposta de decreto-lei. Em 1 de Março. Mas eu anunciara, numa entrevista ao Diário Popular, em Fevereiro, que o Ministério da Cultura estava a ultimar o seu Código, e revelara até algumas disposições inovadoras desse articulado. A entrevista não terá passado desapercebida, porque se estendeu ao longo de toda uma semana.
Sendo assim, e deve ser porque as datas têm a sua eloquência, quem é que se antecipou? E era realmente do CDS, um dos dois deputados a que ainda agora se referiu o Sr. Deputado Nogueira de Brito sobre o projecto apresentado? Não seria antes o articulado elaborado no Ministério da Cultura, enquanto o Secretário de Estado e o Ministro da Cultura eram dirigentes do CDS?
O Sr. Deputado Nogueira de Brito ironizou com o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, porque o projecto deste defendera essa curiosa singularidade, a que chamam o domínio público remunerado. Telhados de vidro! O projecto que encontrei no Ministério da Cultura, e de que tenho fotocópia comigo, também defendia o domínio público remunerado. Meditanda coincidência! E a proposta de decreto-lei submetida

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pelo CDS à Assembleia da República, se formos à página em questão, não é outra coisa senão fotocópia do que se preparara e ainda se encontra no Ministério da Cultura, na qual fora apagada e mal esta só cláusula. cito:
Artigo 44.º, alínea b): «Fixar, por portaria, as taxas devidas pela utilização de obras caídas no domínio público».

Nem mais, nem menos: o domínio público remunerado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exacto! Obrigado!

Risos do PS.

Mas não falemos senão de antecipação, já que só disso o Sr. Deputado Nogueira de Brito acusou o Governo, na sua primeira intervenção. Ao depositar o seu projecto de Código nesta Assembleia não era a primeira vez que o CDS se antecipava. De resto, isso em política, é corrente. Mas já que estamos em qualificações de bonito e feio: será isso bonita política?

Aplausos do PS e do PSD.

Eu justifico. Se a lei de bases do património exigiu tanto tempo de estudo e discussão à Comissão que a examinou na especialidade, é porque foi apresentada prematuramente. E o articulado submetido a esta Assembleia pelo CDS não era outro, também nesse caso, senão o que tinha sido elaborado, mas não dado por pronto no Ministério da Cultura. Já nesse caso houvera, pois, apropriação e manobra de antecipação.
Mas abordemos a questão do próprio Código. Não há bela sem senão, nem lei que a todos contente. Passou-se, no caso desta, como se a todos ela tivesse descontentado. E não foi assim. Parafraseando o paradoxo de um político, de que outros são correntemente lembrados nesta Assembleia, e até já o foi algum pelo Presidente Reagan, eu arriscaria que por tão pouco nunca tão poucos gritaram tanto. Porque na verdade não são muitos os verdadeiros pomos de discórdia.
Porque é que se fala tanto do artigo 72.º, e até neste hemiciclo, se o Governo, pela voz do Primeiro-Ministro, já se pronunciou pela sua supressão? Porque é que se continua a falar? É gastar cera com defuntos que uns acharão muito ruins, e outros menos, e outros nada.

Aplausos do PS.

Já que os Srs. Deputados tanto se espraiaram sobre esta questão, e até a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura deplorou que eu tivesse assinado decreto com tal «nódoa», não seria bonito evitá-la eu mesmo nesta ocasião. Quanto mais não fosse, em atenção ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, eu esforçar-me-ei por não me tornar culpado de actos feios, nem de feias omissões.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Declarou, pois, o Sr. Primeiro-Ministro, que é favorável à supressão da «nódoa». Como membro do Governo também o sou, obviamente. E como cidadão, no meu foro intimo, também.

Mas perdoar-me-ão que vos precise «como cidadão, no meu foro intimo, também», porque não apenas me oponho a todas as formas de censura, como até a todas as aparências dela, ainda quando sejam, como neste caso, aparências - ou aparências artificialmente sugeridas - que iludem. E não falta quem julgue que foram artificialmente sugeridas para iludir. Senão, vejamos.
O artigo 42.º da Constituição estabelece que é livre a criação intelectual, artística e científica, e que esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra, incluindo a protecção legal dos direitos de autor.
Sem embargo o artigo 50.º da Lei de Imprensa, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro, e alterada pelo Decreto-Lei n.º 181/76, de 9 de Março, estipula em que condições pode o tribunal ordenar a apreensão judicial e obstar à difusão de publicação que tenha incorrido em crime de abuso de liberdade de imprensa.
Ninguém duvidará de que este crime pode e deve ser punido nos termos legais, nem de que a protecção dos direitos de autor, que a Constituição justamente faz decorrer da liberdade de criação, não iliba quem o tenha cometido, das consequências penais em que por isso incorre.
Também o ponto 3 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 254/76, de 7 de Abril, estipula em que condições podem o Ministério Público ou as autoridades policiais, militares e administrativas apreender impressos e outros objectos de conteúdo pornográfico.
Sem falar do artigo 107.º do Código Penal que declara perdidos a favor do Estado os objectos susceptíveis de pôr em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública.
Ninguém, que eu saiba, atacou estes artigos de lei, assimilando-os a disposições censórias. E o artigo 72.º do Código não fazia senão declarar que a protecção do direito de autor, que a Constituição dá por corolário da liberdade de criação, não tolhe a faculdade de permitir, restringir ou proibir, nos termos legais, a representação, ou a exposição de qualquer obra, quando o interesse público o exigir. 15to é, o artigo 72.º não trazia nenhuma disposição restritiva nova. Só estabelecia que as vigentes não eram anuladas pelo novo Código.
De jure constituendo, referiremos agora que a circulação de certos tipos de videograma vem fazendo ponderar que os Estados se encontram legislativamente desarmados para obviar aos inconvenientes indubitáveis da generalização desta comunicação. A última reunião dos Ministros da Cultura dos países do Conselho da Europa em Berlim, em 1984, adoptou entre outras, e por unanimidade, uma recomendação aos Estados membros no sentido de adoptarem as medidas apropriadas quanto à circulação de videogramas de conteúdo violento e brutal - faço notar que não se trata aqui de pornografia - susceptíveis de exercer uma influência nociva sobre crianças e adolescentes.
E ainda agora a Sr. Deputada Helena Cidade Moura advertiu a Assembleia contra os inconvenientes de a Televisão mostrar as violências e brutalidades que sucederam ontem na Bélgica, e enlutaram o desporto, e que certamente farão reflectir o mundo civilizado. Diremos que a Sr.ª Deputada, que tanto deplora o artigo 72.º, está a abrir portas à censura? Diremos que restringiu o direito do produtor de algum videograma que já

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corra na Bélgica - e estou em crer que correrá entre nós -, mostrando as cenas de ontem, e que os senhores verão ou não na televisão?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A criação intelectual, artística e científica é livre. Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação, e a protecção legal dos direitos de autor. Mas esta protecção não tolhe o que, em observância do interesse público, e em direito constituído ou a constituir, a lei estipule por outro lado.
É esta adversativa que se recusa, embora, como também tem sido notado, ela seja preceito vigente da Convenção de Berna, de que Portugal é signatário. Não se recusam, decerto, ninguém recusou, que o abuso da liberdade de imprensa deva ser punido; que a circulação e a afixação de objectos de carácter pornográfico deva ser condicionada... E até se reclama, em altas instâncias internacionais, e o Sr. Deputado e o seu partido estão certamente de acordo com esta reclamação que venha a ser controlada com mais cuidado ainda a circulação de videogramas de conteúdo violento e brutal. De facto a imagem tem ido muito longe na imitação do sadismo, da tortura, e até do canibalismo... 15to, a título de exemplo. Nós não somos, decerto, os Srs. Deputados não são com certeza pela livre circulação por todas as mãos, perante todos os olhos, de sequências como as que estou a evocar. Mas entendem que o Código não tem, não obstante, que explicitar que a protecção do direito de autor não tolhe o direito e o dever de os poderes constituídos agirem, nos casos em apreço, nos termos legais. Entendem certamente que isso é óbvio. A bom entendedor meia palavra basta. E, pelo visto, até palavra nenhuma.

Aplausos do PS.

Convosco, repito, também me oporei - sempre me opus - a todas as formas de censura. Sempre me oporei a todas as aparências de censura. E com alegria no coração. Muitas coisas mudaram definitiva, cabal e felizmente no nosso país. Eu sou do tempo - ainda há uns quinze anos - em que muito se suava para se colher mais uma assinatura mal legível num tímido manifesto contra a censura. E até muitos, muitos nos respondiam que não assinavam, não porque não estivessem de acordo, mas porque, em lúcido entender, achavam que tal manifesto, em tal momento, era contraproducente. Nunca era momento azado para o manifesto. Nunca era momento azado para a intentona.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Agora então foi um salutar e benéfico e geral alarido. Só uma voz perfeitamente clara, lúcida, serena e isenta se levantou, que me pareceu analisar com perfeita justeza, o «celerado» artigo 72.º: a de Arons de Carvalho em O Jornal do dia 19 de Abril. Artigo excelente que terminava, referindo-se à ratificação do Código:

«[... ] estou certo de que essa será a ocasião para, sem demagogia, alterar alguns preceitos deste diploma».

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Na verdade, desde logo juntei os meus votos aos deste artigo: ponderar com tino, discutir sem demagogia, modificar para melhor. Confio nesta Assembleia.

Aplausos do PS e do PSD.

Inquietaram-se também os produtores de fono e videogramas, porque, em seu entender, o Código, tal como foi aprovado, retira competência às autoridades policiais para reagirem em casos de importação, exportação, venda e distribuição de cópias não autorizadas. Competência esta que lhes era antes atribuída pelo n.º 5 do artigo 8.º da Lei n.º 41/80, de 12 de Agosto, agora revogada. Mediante o Código, artigo 209.º, os actos ilícitos acima referidos teriam passado a constituir meras contra-ordenações, cujo processamento competiria ao director-geral dos Espectáculos e do Direito de Autor.
Na verdade, houve a preocupação, no novo diploma, como bem resulta do seu articulado, de o expurgar das disposições que têm o seu assento no Código Penal e no Código de Processo Penal. Uma lei não pode conter todas as leis, e a lei, no seu sentido largo, é o que resulta da conjugação de todas. O que não se pode é pretender que o Código preveja, no seu dispositivo penal, contra-ordenações apenas. Define igualmente crimes. Por exemplo, o aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada é- até classificado de crime público no artigo 204.º
Por outro lado, quer perante crime, quer perante contra-ordenação, não foi retirada competência às autoridades policiais. Porque o Código define e outras leis vigentes estabelecem o procedimento.
Perante contra-ordenação, deverão as autoridades policiais tomar conta de todos os efeitos ou circunstâncias, susceptíveis de fundamentar a responsabilidade, e tomar as medidas necessárias para impedir o desaparecimento de provas, com direitos e deveres equivalentes aos que têm em matéria criminal, e obrigação de remeter às autoridades administrativas a participação e as provas recolhidas. 15to, segundo o artigo 48.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 22 de Outubro.
Tratando-se de crime deverão proceder a inquérito preliminar nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 605/75, de 3 de Novembro, que remeterão ao agente do Ministério Público competente, nos termos do artigo 5.º do mesmo diploma legal. E, quer se trate de crime, quer se trate de contra-ordenação, deverão proceder às necessárias apreensões nos termos do artigo 202. º do Código de Processo Penal, só lhe estando interditas as apreensões domiciliárias sem autorização do juiz de instrução [artigo 2,º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 605/75 na redacção dada pela Lei n.º 25/81].
Quanto à natureza dos objectos a apreender, por reprodução ilícita de fonogramas e videogramas, o Código não exclui, ao contrário do que se pretendeu, máquinas e equipamentos destinados à referida reprodução.
Preceitua o artigo 205.º, n.º 1, que «serão sempre apreendidos [ ... ] os exemplares de cópias das obras que serviram ou estavam destinadas a servir para a prática dos crimes de contrafacção ou usurpação». É certo que não fala das máquinas. Mas, estabelecendo que as cópias serão sempre apreendidas, não diz, nem subentende que só elas o serão. E o Código Penal preceitua (artigo 107.º) que são perdidos a favor do Estado os objectos que sirvam para a prática de um crime (e a

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contrafacção é crime), quando ofereçam sérios riscos de serem utilizados para o cometimento de novos crimes. Caso, evidentemente, dos aparelhos reprodutores
não inutilizados.
Sem embargo, não me opus ao prepararem-se as emendas ao Código, a que ele estipulasse, explícita e superfluamente, a competência das autoridades policiais
quanto à distribuição de cópias ilícitas de fono e videogramas, e quanto à apreensão de equipamentos destinados à reprodução. Será preferível a menção supérflua, à omissão que deixe margem para dúvidas.
O que todavia quero esclarecer, e tenho de esclarecer, é que o Governo recusa categoricamente ter aberto portas à pirataria, em matéria de reprodução áudio, ou reprodução vídeo, ou reprodução de impressos.
Muito pelo contrário. No Conselho de Ministros do passado dia 23 foi aprovado um diploma do Ministério da Cultura que regulamenta, pela primeira vez, por meio de classificação obrigatória, a distribuição de videogramas, e que claramente estipula no n.º 1 do seu artigo 8.º que «serão apreendidos os exemplares ou cópias não autorizados de videogramas e respectivos invólucros, bem como os materiais, máquinas ou demais instrumentos ou documentos utilizados na prática da infracção, ou a ela destinados».
E é o novo Código, que se disse que abria a porta à pirataria, o primeiro instrumento legal que empreende regulamentar a fotocópia de impressos, no seu artigo 76.º, alíneas d) e e), embora considere a legitimidade de reprodução para uso privado, mas com limitações, que se nos afiguram razoáveis, no seu artigo 82.º
Então esta Assembleia só veria defeitos, omissões, contradições, potencialidades censórias no Código? Eu quero aqui agradecer aos partidos em geral, aos especialistas de direito de autor, aos intervenientes na controvérsia: o Código tem sido muito atacado, e pouco referi do que foi o Ministério da Cultura que o apresentou. Quero agradecer: eu tenho sido poupado. Nem Coimbra Coimbra sensor. Nem Coimbra Martins rua. Lá vira o tempo, se eu tiver tempo... Mas ainda não
veio.

Risos do PS.

Num artigo de um membro da Associação de Arquitectos, publicado a 28 no Jornal de Letras, dá-se como exemplo da «maldade» do Código o famoso artigo 72.º, mas não deixa de se reconhecer, como a custo ... Não deixa de se reconhecer, cito:
Nele às vezes se detectam velhas aspirações, exigências justíssimas que há longos anos se vêm fazendo, mas que, na confusão de articulados atrapalhados, perdem-se.
Velhas aspirações a que pela primeira vez se atende... mas como se perderá o atendimento se ele está inscrito no corpo da lei? Só o Expresso é que insinuou que o português do Ministério da Cultura andava um pouco por baixo. Em casa de ferreiro, ou de ferreiro presumido, espeto de pau.

Risos do PS.

E também o Dr. David Mourão-Ferreira. A linguagem do Código não lhes agradou. Entendeu que o português de lei, não: «o português desta lei» não valerá o das outras. Resigno-me assim a ver este malfadado Código excluído do florilégio, para uso das escolas e formação do gosto, do nosso corpo legislativo. E disponho-me a castigar, na leitura daquele semanário, o português de que sou capaz, ou pelo visto incapaz. Só reparo, todavia, que cada qual sublinha, explícita ou implicitamente, a grande parte que teve na elaboração da lei maldita.

Risos do PS

Cada qual entende, ou dá a entender, que, se o Código, que lhe deve tanto, tivesse sido acabado por ele, se não tivessem nele intervindo outras mãos, até estaria muitíssimo bom.

Aplausos do PS.

Visto assim que tantos têm responsabilidade no Código, mas eu não, não será arriscado, nem imodesto fazer eu o respectivo elogio, recapitulando ou completando o que já disse sobre esta matéria o Sr. Deputado José Niza.

Pela primeira vez protegem-se os direitos conexos, nomeadamente os dos intérpretes, dos produtores de fono e videogramas, de organismos de radiodifusão. Porque protestam tanto os artistas, inclusivamente, a Sr.ª D. Amália Rodrigues?

Fixam-se normas precisas e razoáveis para a relação edição/autor, pelas partes que tocam à revisão de provas, à fiscalização de tiragens, à aprovação da capa.

Regulamenta-se o recurso à fotocópia, e constitui-se o direito a compensação pela fotocópia.

Define-se quando, por acordo entre o realizador e o produtor, se considera pronta a obra cinematográfica.

Luta-se efectivamente contra a pirataria no audiovisual, reconhecendo-se ao produtor o direito de fiscalizar os estabelecimentos de prensagem e duplicação; estabelecendo-se a obrigação, para os que fabricam e vendem, de comunicar as quantidades à Direcção-Geral de Espectáculos...

Compensam-se os direitos referentes ao fono ou videograma, pelo uso privado e circulação em privado, mediante uma taxa sobre os gravadores.

Constitui-se pela primeira vez em termos razoáveis o direito do arquitecto.
Disseram o diabo deste Código. Ele não é tão mau como o pintam...

Tem virtudes. Parece que dá virtude a quem trata dele. A quem se indigna contra ele. Severíssimo contra o artigo 72.º o PCP arvora-se em campeão da liberdade de criação cultural, da qual o Constituição faz decorrer a protecção do direito de autor. Ora ainda bem, ora até que enfim! E que o seu exemplo, o exemplo do PCP, aproveite aos partidos irmãos...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Cultura, V. Ex.ª terminou o seu tempo. V. Ex.ª terá de concluir o seu pensamento.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, nós dispomos de 7 minutos. Mas como, naturalmente, precisamos de ficar com algum tempo, oferecemos ao Sr. Ministro cerca de 5 minutos do tempo de que ainda dispomos.

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No entanto, há mais ofertas e assim o Sr. Ministro vai ter tempo para nos continuar a propiciar a sua bela intervenção.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Está certo, Sr. Deputado Carlos Lage.
Sr. Ministro, a Sr.a Deputada Margarida Salema concede também a V. Ex.a mais 5 minutos.
Portanto, Sr. Ministro, V. Ex.ª dispõe de 10 minutos.
Sr. Deputado César Oliveira pede a palavra?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, também damos tempo ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Cultura, faça o favor de prosseguir com a sua intervenção, pois tem tempo bastante.

O Orador: - Como eu dizia, severíssimo contra o artigo 72.°, o PCP arvora-se em campeão da liberdade de criação cultural, da qual a Constituição faz decorrer a protecção do direito de autor. Ora ainda bem, ora até que enfim! E que o exemplo do PCP aproveite aos partidos irmãos e nomeadamente àqueles que estão no Governo, e não precisam de coligações, nem receiam eleições.

Aplausos do PS.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Tudo isto para falar em coligações.

O Orador: - Que lhes aproveite!
O Código tem virtudes! Já no dia 27, na televisão, o Sr. Presidente da Sociedade de Autores, deputado APU ad hoc nesta Assembleia, declarava que afinal se ia facilmente chegando a um consenso sobre o Código. Por sinal uma emissão singular. Eu pedia a vossa atenção para este ponto da televisão. Uma emissão singular.
Por parte do Ministério falou quem não defendeu o Código inteiramente. Por parte da oposição, quem não o atacou inteiramente. Quem, pela voz e pela imagem, argumentou decidida e eficazmente contra, inteira e indubitavelmente contra, foi a locutora da televisão. Até me pareceu que estava a ouvir, por sua voz fidelíssima, as teses da Associação de Produtores de Fono e Videogramas. Ilusão minha, com certeza. Mas fiquei admirado.
E mais admirado quando, depois do que tem sido radiodifundido e impresso, o Sr. Deputado Nogueira de Brito, e depois também o Sr. Deputado José Manuel Mendes, relevaram que a televisão só se interessava por este debate quando falava o deputado José Niza. E agora repare-se: não estando presente neste momento a televisão - porque não está! -, perde ela o único discurso favorável ao Código que podia gravar nesta Assembleia.
Não, neste caso do Código a oposição tem trabalhado magistralmente. Ocupou o terreno completamente! A televisão completamente. E até pescou nas águas do Governo. Notabilíssimo! Dou os meus parabéns à oposição!
Eu sei. Eu reconheço. O Código não protege os programas de computador. Não arrisca normas em matéria de televisão por satélite. É que, nós, em Portugal,
pagamos os programas de computador dos outros, mais do que exportamos os nossos. Até nem sei que exportemos os nossos. Mas o Sr. Deputado Nogueira de Brito...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É muito bom em computadores!

O Orador: - ... há-de me dizer quais.

Risos do PS.

O Orador: - Receberemos muito mais de satélite, do que em satélite poremos, e por enquanto ainda não pomos nada. Porque nos iríamos obrigar a protecções que beneficiarão os estrangeiros, e nos farão a nós gastar divisas? Quando não há ainda convenções sobre programas de computador, nem sobre televisão por satélite? Qual será a razão dessa pressa em gastarmos o nosso dinheiro? Para quem estamos impacientes de pagar? Para que estrangeiros estamos impacientes de pagar?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Essa não estou a ver!

O Orador: - Vai ver melhor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É que essa não é para mim com certeza!

O Orador: - Não só!
Com este Código, tal como foi promulgado, já estávamos muito bem situados, em matéria de protecção aos intérpretes relativamente à Convenção de Roma, que não assinámos, e que também não ratificaram um número importante de países da CEE. A Convenção de Roma pretende que a prestação de artistas intérpretes e executantes deve ser protegida pelo menos 20 anos.
Vinco bem: nem todos os países da CEE assinaram. Longe disso. E nós também não. Todavia, tal como foi promulgado, o Código propunha 25 anos.
Nós somos, também em cultura, e sê-lo-emos por muitos anos e bons, um país muito mais importador que exportador de bens. Livros, discos, filmes, fonogramas, Videogramas, emissões de televisão, equipamentos... Só não cuidamos em cultura da cobertura das importações. Quanto mais longa for a protecção, mais pagaremos aos outros. Mas sempre os outros nos pagarão pouco a nós, porque muito pouco importam do que é nosso.

O Sr. José Niza (PS): - Muito bem!

O Orador: - É evidente que a Sociedade de Autores defende as protecções máximas e mais rigorosas. Mas o Estado, atento ao direito de autor, como o vem demonstrando, tem de atender sobretudo ao interesse nacional. E também ao interesse do consumidor. Tem de arbitrar.
O Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo acha que este é um argumento «estafado». Mas não disse que fosse um argumento falso. Disse só «estafado».

O Sr. Luís Francisco Rebelo (PCP): - Sofístico!

O Orador: - Já vamos ver do sofisma, já lá vamos.
Pretenderam decerto, e com razão, os Srs. Deputados
Nogueira de Brito e Luís Francisco Rebelo, que o me-

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lhor meio de combater o desequilíbrio da balança cultural é fomentar a cultura e apoiar e estimular os criadores no nosso país.
15to está certíssimo. Nesse ponto estou eu de acordo com ambos. Mas enquanto os resultados almejados, isto é, enquanto o equilíbrio não se conseguir, vamos proceder, contrariamente ao nosso interesse, como se já tivesse sido alcançado?
Confusa polémica, e surpreendente pelas posições que assumiram as personalidades e as organizações. Os artistas a atacarem a lei que pela primeira vez reconhece o seu direito. Os produtores de fono e videogramas, indignados contra a lei, porque ela penalizava pouco. O CDS, talvez com saudades do domínio público remunerado do qual se descartou in extremis, a denunciar a lei, portanto liberal, como manifestação de totalitarismo.

Aplausos do PS.

E o PCP longe, muito longe dos tempos do jdanovismo, integralmente de acordo com uma sociedade muitíssimo meritória, a que eu pertenço, e que eu mesmo condecorei, mas que é uma sociedade privada com regalias objectivas de monopólio. Andaremos nós todos ao contrário dos nossos ideais e ideologias? Por que não? Talvez seja a maneira de nos entendermos. Oxalá.

Aplausos do PS e do PSD.

Faço minhas as palavras do Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo na televisão: já nos vamos aproximando do consenso. Nesta democracia turbulenta, um código consensual seria uma bonita coisa, após um acto feio. Como ensinava o Presidente Mao Tse-tung, transforma-se uma coisa má numa coisa boa.
De uma maneira geral, as propostas de alteração, apresentadas pela Comissão de Assuntos Constitucionais correspondem a reparos feitos procedentemente pela SPA. Embora não os retomem todos, nem em maioria.
Quanto a esses reparos, o Ministério da Cultura divulgou a sua posição num extenso documento policopiado. Mas o Governo não se opõe a nenhuma das soluções consensuais que a Comissão sugere, muitas vezes na sequência de contactos com o Ministério.
Além destas propostas, tomámos conhecimento das do PCP, do MDP e esta manhã das do CDS. As do PCP não são outra coisa senão o Código que defende a Sociedade de Autores, desde a terminologia aos conceitos. Exemplo, a opção pela expressão «obra literária, artística ou científica», em vez de «obra literária ou artística». Na verdade, a Convenção de Berna, que nós seguimos, inclui a obra científica na compreensão da literária.
Quanto aos conceitos, considera ainda o de «encobridor» proposta de alteração do artigo 206.º, n.º 3 - que desapareceu dos quadros da comparticipação do Código Penal vigente.
Em matéria de fundo, referiremos o que diz respeito à protecção de obra de arquitecto. O Código do Governo estipula que, na hipótese de modificações, cabem ao arquitecto, que não esteja de acordo com elas, o direito de repudiar a obra, e obter indemnização por perdas e danos. A solução de alternativa a esta, que defendemos, é conferir ao arquitecto o direito, manifestamente excessivo, de embargar a obra. Mas estas soluções constituem de facto uma alternativa. 15to é: ou uma ou outra. Ou se confere o direito de repudiar, ou o de embargar. O projecto do PCP mantém o nosso articulado - artigo 64.º, pontos 1, 2 e 3 - mas junta-lhe uma cláusula sobre o direito de embargar. Quer dizer que o arquitecto poderia embargar e ainda por cima ser indemnizado.

O Sr. João Amaral (PCP): - E muito bem!

O Orador: - Não reteremos nada deste conjunto de propostas, que, de uma maneira geral, nos é apresentado pela segunda vez. E não, porque retivemos a seu tempo o que nos pareceu de reter, e isso já figura no Código em apreço. Foi uma das bases de trabalho, a que não é de voltar nesta fase final.
Também não reteremos o conjunto de propostas que faz o MDP, em seu próprio nome. Notamos que o seu texto discrimina sempre entre obra divulgada e publicada, quando a publicação está para o conceito de espécie como a divulgação para o de género.

Vozes do PCP: - Está mal!

O Orador: - Está bem. Sobre contrato de edição, estipula que, quando a retribuição do autor consistir numa percentagem sobre o preço de capa, incidirão no seu cálculo os aumentos do respectivo preço. É clausular o óbvio! Como não haviam de incidir, se se escolheu a percentagem, em vez da remuneração fixa!
De resto, não estamos a tempo de considerar contributos que não sejam consensuais. Não queremos fazer do emaranhado deste Código a teia de Penélope. Nem deixá-lo cair pela ribanceira, como a pedregulho de Sísifo, após o termos levado todos ao cume da discussão em que se encontra agora.
De uma maneira geral as propostas do MDP revelam um cuidado louvável em si mesmo mas pouco técnico, de clareza e explicitação. Em relação ao bom discurso jurídico - não fosse eu profano - diria que se encontram insuficientemente formuladas, donde o risco de produzirem o efeito contrário ao que procuram. Em vez do laconismo, que a muitos - é verdade - aperta e incomoda, um pendor didáctico, até simpático, mas despropositado, que se espraia em demasias.
Lembrarei enfim que o Código do Governo, no ponto 2 do seu artigo 79.º protege pela primeira vez a lição inovadora de obra alheia, e que quem redigiu esta cláusula o fez em atenção a muitos casos gritantes, entre os quais o das lições de Eça de Queirós pela deputada Helena Cidade Moura, lições que cada qual utilizou a seu talante sem a menor satisfação a quem as tinha inteligentemente e laboriosamente fixado. Não se encontra nada de semelhante a esta cláusula, pela primeira vez formulada, em nenhum dos projectos ou propostas de código que compulsámos, nem em legislação estrangeira que conheçamos. Donde a Sr.ª Deputada poderá concluir que nenhum articulado serve melhor os seus interesses que o decreto do Governo, sem embargo do seu artigo 72.º, polarizador de atenções. Não por serem os seus interesses, decerto, mas por isso ser de imprescindível justiça.
Quanto às objecções de fundo do CDS, feitas esta manhã, voltam, afinal, à questão da forma. Não gastarei mais tempo com essa. E põem também a questão do regime internacional.

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Por outro lado, o Sr. Deputado Nogueira de Brito entende que o Codigo do Governo é o do CDS disfarçado. Mal disfarçado...
Já outros deputados argumentaram que, se assim fosse, não se justificaria o pedido de suspensão que este partido apresenta.
O que eu sustento é que as diferenças, em que consiste o tal «disfarce», não são tão más como isso, nem tão despiciendas.
Referiu-se, por exemplo, o Sr. Deputado Nogueira de Brito ao regime internacional, cláusula nos seus artigos 33.º e 34.º A escolha do exemplo é dele. Pois bem, quanto à definição de país de origem, o código do CDS não faz mais que reproduzir, repito, o código do CDS não faz mais que reproduzir a noção de país de origem explicada na Convenção de Berna na alínea 4) do artigo 5.º Mas a própria Convenção de Berna estabelece que a protecção no país de origem é regulada pela legislação respectiva. Ora, este regulamento consta do Código do Governo, artigos referidos, mas não do código do CDS.
O que nos parece fundamental na posição do Sr. Deputado é a maneira convicta e forte com que ele defende que é precisamente no momento da nossa adesão à CEE que devíamos cessar de recorrer ao argumento de protecção necessária ao artista português, argumento que o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, como já lembrei, considera estafado. Aderimos à CEE, fronteiras abaixo, venha a nós todo o produto estrangeiro e, sobretudo todos os produtos culturais!
É esquecer duas coisas, Sr. Deputado, e o esquecimento é surpreendente, quando a oposição, tantas vezes, pretende que o Governo estava a negociar fracamente com a CEE sem atender aos interesses portugueses. O Sr. Deputado não ignora que a assinatura do Tratado de Adesão não significa que súbita e bruscamente, passemos a praticar, em perfeita simultaneidade e totalidade, o livre cambismo da CEE.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sim, sim! Enfim o que importa é isto.

O Orador: - 15to ainda não sucede com a Grécia, por exemplo, que já lá está. A adesão assina-se agora. Os efeitos práticos da adesão processam-se segundo acordos e planos que não excluem as cláusulas de protecção. O Sr. Deputado quereria outra coisa?
Mas há mais, Sr. Deputado, há mais. Hoje cada qual defende as suas teses, tentando dar-lhes uma necessidade decorrente da adesão à CEE. Se me permite, Sr. Deputado, a adesão à CEE é pau para toda a colher! E o que eu quero lembrar-lhe, muito seriamente, é que, na cultura, essa adesão, implica estudo, prudência, cuidado e medidas. Pense o Sr. Deputado no problema com que está defrontado o cinema português por consequências indirectas - perfeitamente controláveis e superáveis, mas que ainda não o foram - da adesão à CEE. Eu quero confessar-lhe, Sr. Deputado, que estou preocupado com a situação do livro no nosso país. E muito mais ainda com a situação do cinema. Eu não estou a fazer demagogia, Sr. Deputado. Nem as minhas palavras têm nenhum intuito, senão aquele e único que o seu claro sentido exprime...
Há mais, Sr. Deputado. Argumenta V. Ex.ª com a adesão à Europa. Não separemos o problema - que é o seu argumento e também o do Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo - dos nossos artistas, da nossa pro-

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dução cultural, do problema do artista em geral e de produção cultural em si mesma. Mas, Sr. Deputado, a própria CEE se preocupa, e relativamente à concorrência, com os seus criadores, com os seus artistas, com os seus produtos culturais, com as suas indústrias culturais.
Neste momento, o principal empenho dos responsáveis da cultura na CEE é preservar o livro e sobretudo o audiovisual europeu dos efeitos da pujança das produções americana e japonesa. Preservar o que chama o espaço audiovisual europeu da invasão americana e japonesa. Por isso, Sr. Deputado, me surpreende o seu ponto de vista, dados sobretudo o tradicional patriotismo, senão nacionalismo, do seu partido.
Enfim o que importa é isto: o Governo não se opõe a nenhuma das soluções consensuais que a Comissão de Assuntos Constitucionais já encontrou. Não se poderia opor. Mas pede que ela retenha igualmente o seu ponto de vista, o ponto de vista do Governo. Que ela considera a Comissão que a protecção mínima e a protecção máxima, têm, uma e outra, sérios inconvenientes. Que ela se aplique a encontrar a linha de equilíbrio, conveniente ao caso português.
É evidente que, nestas polémicas e debates parlamentares, que se prestam a isso, o nosso carácter latino e português comunica um vigor ao discurso, uma ênfase à expressão e uma hostilidade à ideia, que fazem cair em exageros e até pecar por contraverdades. Serenidade e lucidez, aliadas à isenção, facilmente os evitariam. Mas também o inconveniente não será grande. A opinião pública vai dando o desconto.
Terei incorrido eu próprio nestes pecados - o que gostaria me fosse revelado - durante a defesa, que tenho feita, deste Código polémico. O mesmo terá sucedido com uma pessoa tão estimável como o Sr. Deputado Gomes de Pinho que nele disse ter visto uma clara manifestação da tendência do Governo para o totalitarismo cultural. Valha-nos Deus! Entende o povo, na sua suma ciência, que a gente às vezes nem nos seus próprios olhos deve acreditar. Nesse dia, Srs. Deputados, eu desconfiei dos meus ouvidos.

Risos do PS.

Proposta de lei inicialmente, era destino do novo Código de Direito de Autor ser discutido nesta Assembleia. O que tem de ser, tem muita força.
E ainda bem que assim foi. Porque também ele terá muito mais força, aparecendo finalmente como fruto da reflexão conjunta do Governo e da Assembleia. E nós, no nosso país, precisamos de boas leis e de leis com força, que é para serem realmente e integralmente cumpridas, e não se hesitar em as fazer cumprir.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, eu adquiri alguma familiaridade com as matérias que ele trata durante a elaboração, no meu gabinete, deste Código, em que tanto me empenhei. Fico à disposição da Assembleia para, com a Comissão, que lhe vai dar os últimos retoques, continuar a discutir. Movido apenas pelo intuito que me animou até aqui: desbloquear e levar a cabo o que estava empatado; não prolongar a hesitação perante os diversos caminhos; dotar o nosso corpo legislativo do melhor Código possível, atentas a situação do País e as suas cotas de importação e exportação de produtos culturais; defender eficazmente o direito do autor e os di-

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reitos conexos, em principal benefício dos autores, dos artistas e dos produtores portugueses, sem deixar de atender na justa medida ao interesse do consumidor e sobretudo ao interesse da República, que se sobrepõe a todos os outros.

Aplausos do PS e do PSD.

Em suma, está quase pronto o Código, corrigido e afinado nesta Assembleia, e completado. Tantos viram nele a mão de tantos outros, tantos intervieram efectivamente na discussão das questões sobre as quais ele decide - as partes interessadas, os grupos profissionais, a Sociedade de Autores, os especialistas na matéria, o Governo, os partidos, a Assembleia - que eu lhe noto afinal mais um defeito importante (e dirijo-me aqui à oposição, a fim de ela aproveitar mais este, porque a acho um tanto à míngua de argumentos): não haveria cláusula, neste Código, que nos esclarecesse, se fosse necessário decidir, sobre a quem cabe o direito de autor pela sua criação. Do que não há dúvida é de que, rectificado e ratificado conforme se pede, conforme o Governo pede, e se os Srs. Deputados quiserem, este será o nosso Código.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra, ao que suponho para fazer pedidos de esclarecimentos ao Sr. Ministro da Cultura, os Srs. Deputados Nogueira de Brito, José Manuel Mendes, Luís Francisco Rebelo, Helena Cidade Moura e José Niza.
Mas sucede que o Sr. Ministro não dispõe de tempo para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. César oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, a UEDS dá 5 minutos ao Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, vamos ver se S. Ex.ª, o Sr. Ministro da Cultura, com a sua capacidade de síntese - aliás, não demonstrada - poderá responder às perguntas que lhe vão ser formuladas.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Em primeiro lugar, quero felicitar o Sr. Presidente pela ironia de que foi capaz, agora,...

O Sr. Presidente: - Boa fé, Sr. Deputado.

O Orador: - ... Bom! ...

Sr. Ministro, estava a ver que teria de começar por defender também V. Ex.ª contra mais este comportamento estranho da Televisão, que não filmava o discurso do autor do Código do Direito de Autor em vigor, que seria, necessariamente e a todos os títulos, importante. Ou então, que teria de reclamar contra essa manipulação ao contrário, no fundo, manifestação de má consciência, talvez.
Mas V. Ex.ª disse uma palavra e as luzes acenderam-se e o filme começou. Portanto, não tenho nada que protestar: tudo bem, o seu discurso vai ser transmitido juntamente com o do Sr. Deputado José Niza...

Risos.

... como discursos defensores do código.

O Sr. João Amaral (PCP): - O discurso e o eco!

O Orador: - Sr. Ministro, V. Ex.ª começou por falar na autorização legislativa e agradeço-lhe muito isso, porque nos permite esclarecer uma questão importante em todo este processo.
O Governo, coitado, teve de andar depressa, não ligou à Assembleia, porque tinha uma autorização legislativa que se estava a esgotar. E houve pessoas que entenderam, pela maneira como estava redigido o preâmbulo do decreto-lei que a autorização era, até, para fazer todo o Código do Direito de Autor.
Já hoje de manhã disse, Sr. Ministro, que V. Ex.ª não precisava de autorização para esse efeito; precisava, sim, para alterar a lei penal respeitante aos direitos de autor, isto é, para despenalizar os crimes de usurpação e de contrafacção, como aconteceu na realidade.
Mas, Sr. Ministro, V. Ex.ª tinha outro expediente ao seu alcance, como já várias vezes tive ocasião de aqui dizer. V. Ex.ª não precisava da autorização legislativa para nada, a qual, estranhamente, foi pedida a esta Assembleia, em geral - sem ter referido o Código do Direito de Autor -, para completar a legislação, a leges imperfecta de que falava o Sr. Ministro da Justiça quando aqui veio. Esta seria uma das tais leges imperfecta - não estou a fazer-lhe uma crítica, Sr. Ministro - e era imperfecta porque, sem a parte penal, seria imperfeita.

Risos.

A autorização foi pedida, em geral, para completar as leis imperfeitas e nunca se falou em direitos de autor. Os deputados reclamaram, mas a maioria entendeu que devia conceder a autorização legislativa, sem nos passar pela cabeça que a autorização legislativa ia servir para fazer o Código do Direito de Autor. Mas, mais do que isso, ela até foi e é usada como desculpa para se ter publicado o Código do Direito de Autor, tal como foi publicado, isto é, o Sr. Ministro andou depressa, não veio à Assembleia, não disse nada à Assembleia, porque tinha uma autorização legislativa que estava a acabar e que era preciso utilizar.
Mas, Sr. Ministro, mais uma vez lhe pergunto: porque é que não mandou para aqui a sua proposta de lei se, afinal - como se conclui da parte final do seu discurso - esse era o seu desejo máximo, ou seja, ter obra comum? Devo dizer-lhe que, a certa altura, desconfiei que não fosse esse o seu desejo, porque o Sr. Ministro chegou a fazer alguns reparos ao trabalho da Assembleia. Mas depois arrepiou caminho e considerou - e bem - o trabalho aqui feito por todos nós, em conjunto. É que se o Código puder ter a marca de cada um e de todos nós - como, felizmente, têm tido algumas obras legislativas desta Assembleia -, será um código mais respeitado pelo País.
Mas, se é assim, porque é que isto não veio sob a forma de proposta de lei? Nada o justifica, Sr. Ministro. Foi um lapso. Lapso que, realmente, vamos esquecer porque será ultrapassado, não sem ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, esgotou o tempo para pedir esclarecimentos. Faça, pois, o favor de concluir o seu pensamento.

O Orador: - Sr. Presidente, vou concluir o meu pensamento, como V. Ex.ª diz.
Talvez demore um bocadinho, mas vou concluir o meu pensamento.

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O Sr. Presidente: - Quero crer que sim, mas vai pôr à prova a sua capacidade de síntese.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
A Sr.ª Deputada Margarida Salema já nos chamou a atenção para as vicissitudes desagradáveis que podem resultar do processo de ratificação. O outro processo tinha sido melhor, porque até perante uma certa falta de iniciativa do CDS para agendar, estaria a iniciativa enorme do Governo para agendar, quando entendesse, a proposta que aqui tivesse.
Sr. Ministro, tudo bem, Mas o Sr. Ministro terá de reconhecer que tudo se faria de maneira mais perfeita do que aquela que foi utilizada.
Falou também V. Ex.ª no projecto e na iniciativa, quem tem direito de autor, quem copiou e quem não copiou. O que acontece, Sr. Ministro, é que o projecto do CDS, subscrito, rigorosamente, pelos dois deputados que ocuparam funções no seu Ministério, é - nunca o negámos e, pelo contrário, afirmámo-lo aqui várias vezes - o produto do trabalho que fizeram no Ministério e em relação ao qual estavam dispostos a fazer o que V. Ex.ª aqui fez hoje. Na realidade, este Código tem, pela primeira vez, uma pai. O Primeiro-Ministro enjeitou-o rapidamente e a gente já não sabia se ele tinha pai ou mãe, como é que era isto. Agora, V. Ex.ª assumiu - e bem - a sua paternidade.
Ficou-lhe bem esse gesto.

Risos do CDS.

Ora bem, Sr. Ministro, o que acontece é que os Srs. Deputados Francisco Lucas Pires e António Gomes de Pinho, estavam dispostos - principalmente o primeiro - a assumir a responsabilidade política do Código que, com as pessoas que o ajudarem a preparar, iriam apresentar ao Governo ou a esta Assembleia, como proposta - na altura não estava pendente nenhum projecto. Esse Código é o Código que eles apresentaram aqui como projecto de lei, na sua qualidade de deputados. Sr. Ministro, nunca criticámos esta atitude porque é correcta. É, realmente, uma iniciativa política e seria a paternidade política que estaria em causa se o Código tivesse sido publicado quando eles estavam no governo, como foi a paternidade política que o Sr. Ministro aqui assumiu hoje. Assumiu hoje aqui, e muito bem, porque estávamos a ver que não havia paternidade política para o Código.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não esqueceu a sua promessa, pois não?

O Orador: - Não, Sr. Presidente.
Vou apenas fazer uma rápida referência, porque o Sr. Ministro fez-me hoje uma honra muito grande, que não posso deixar de agradecer. É que fez algumas referências a outros deputados, mas centralizou a oposição em mim, e tenho de lhe agradecer isso.
O Sr. Ministro falou sempre voltado para mim, mesmo quando falava de assuntos dos quais eu não tinha tratado.
Quanto ao artigo n.º 72.º, em que é que ficamos, Sr. Ministro?
Desculpe voltar ao assunto, pois nem fui eu quem mais insistiu, embora me tenha referido a ele.
Mas reconheço uma coisa: o Sr. Ministro diz que o artigo 72.º pode cair - o Sr. Primeiro-Ministro também o diz, todo o Governo e a toda a gente da

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Comissão o diz -, mas hoje não deixou de tecer vários elogios - não diria elogios, mas enfim -, não deixou de levantar e fazer o elenco das vantagens que dele poderiam resultar.
Em que é que ficamos, Sr. Ministro? Qual é a posição do Governo e de V. Ex.ª nesta matéria? Ficamos com o artigo 72.º? Era importante sabermos isto porque nos chegámos a convencer de que o artigo 72.º teria sido um mero lapso. E, uma vez que o Governo confessou o seu lapso, não havia mais que tratar dele. Mas V. Ex.ª acabou por, digamos, nos dar uma ideia um pouco contrária. Gostaria, pois, que nos dissesse alguma coisa sobre isso.
Quanto a abrir as portas à pirataria, Sr. Ministro, não é diminuindo o tempo de protecção aos produtores de fonogramas e videogramas e eliminando a referência do actual Código à possibilidade de busca pelas autoridades administrativas, e de apreensão que isso se consegue. É evidente, Sr. Ministro, que o recurso às leis penais e de processo penal poderá resolver esta matéria. Mas há exemplos concretos de recusa de actuação desse tipo, precisamente porque a referência expressa na lei deixou de existir. É que, muito simplesmente, as pessoas raciocinam da seguinte maneira «já não está no Código».
Uma última questão, relacionada com a CEE. O que não quero, Sr. Ministro, é que o País se proteja através da desprotecção dos seus criadores intelectuais e artísticos. Essa é a questão e a questão há-de ser essa. Se essa for a filosofia, a de nos protegermos à custa da desprotecção dos nossos, o Sr. Ministro saberá compaginar que essa não tem sido a política do meu partido.
Quando o meu partido chama a atenção para a conveniência e necessidade de se negociar atentamente os acordos de adesão, coloca-se nessa perspectiva: a nós, Sr. Ministro.
Será uma atitude de pessimismo e de resignação que não podemos aceitar, a de proteger o Pais desprotegendo os seus cidadãos. É isso que nós não aceitamos, Sr. Ministro. Não tenho tempo para mais e ninguém me dá mais tempo, por isso termino.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Deu-lho o Sr. Presidente!

O Orador: - Ainda queria dizer mais qualquer coisa mas, por agora, ficamos por aqui.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Ministro, ao cabo de uma hora de oratória, compreendeu, finalmente, que o nosso código não era o código que trazia na algibeira do Conselho de Ministros, isto é, terá de ser, fatalmente, um outro, expungido das más soluções técnico-normativas e políticas que esse inicialmente continha.
Mas, do alto daquela tribuna, crispou levemente o debate, defendeu o Código do Governo - a que, sistematicamente, chamou «Código do Governo» -,fez a história do percurso ataralhoucado por que ele passou até chegar a esta Câmara, omitindo, todavia, algumas passagens relevantes e muito curiosas. Teceu longas - e, apesar de tudo, perfunctórias - considerações

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acerca do artigo 72.º, desenvolveu perorações genéricas, adejantes, em torno de alguns normativos que compõem o Código e não se eximiu a, em lugar de proceder a um diálogo vivo com as questões concretas levantadas pelos deputados, responder a jornais e a comentadores que estão ausentes deste hemiciclo, que nada têm a ver com a discussão que estamos a travar e que, naturalmente, terão direito a serem receptadores da sua palavra noutras ocasiões e em espaços e meios bem diferentes.
Não se coibiu também de fazer alguma referência à presença do Dr. Luís Francisco Rebelo nesta bancada, chamando-lhe deputado ad hoc. Seria, da minha parte, um gracejo de mau gosto retorquir dizendo que o Sr. Ministro Coimbra Martins, pelo discurso que produziu, revelou ser, perfeitamente, um ministro ad hoc, com tudo o que a expressão ad hoc contém.

Risos do PCP.

Mas não vou cometer a deselegância de responder com uma pirueta de mau gosto a outra pirueta de mau gosto. Afirmarei, entretanto, que, depois de tudo o que se passou, a questão que se coloca não é a de «Coimbra Martins rua», é, provadamente, a de, também neste Ministério, a política que o Executivo vai seguindo nos impor o que, desde há muito tempo, vimos reclamando: Governo rua!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo na sua globalidade, incluindo, naturalmente, o Ministério da Cultura, porque está solidário com ele.
O Sr. Ministro defendeu, como eu não esperava ser possível ver defendido por um político socialista, a autarcia cultural sem nenhumas pontes de ligação com a realidade do mundo e do País, o nosso fechamento, a nossa oclusão em torno da pobre conjuntura que constituímos.
Advogou também, e de maneira algo agastada, algumas das más soluções que o Código do Direito de Autor trouxe do Conselho de Ministros.
Depois de tudo isto, chegámos à altura de saber o que é que vai resultar, em termos concretos, de toda a longa peça que teve ensejo de nos ofertar.
Uma ideia que, desde logo, aflora é a seguinte: a de que este debate está deslocado, pois não é apenas o Sr. Ministro Coimbra Martins que, do ponto de vista formal, de alguma maneira se autodeslocou dele, na medida em que quis dialogar com pessoas exteriores ao Plenário e em que trouxe para aqui o que aqui não tinha sido chamado. O debate está deslocado no próprio tempo porque o Código do Direito de Autor deveria ter sido analisado, artigo a artigo, proposta a proposta, através de uma iniciativa de lei material que o Governo tivesse apresentado a Câmara. Não o fez, utilizou uma autorização legislativa, de modo indébito e tecnicamente canhestro, como ontem tive oportunidade de dizer e poderei provar. E fê-lo de modo tão írrito e tão absolutamente incongruente que se vê agora na contingência de o seu Código ser, ao cabo e ao resto, alvo de modificações significativas em todos os terrenos. Ou seja, o Sr. Ministro Coimbra Martins veio a esta Casa, assumiu em tom veemente e compungido a paternidade dolorosa de um ser escabroso, um pouco na postura da Sr.ª Duquesa de Bradante, que só ela chorava pelo filho morto. Ora, o enquadramento do

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problema é bem outro: é o de um conjunto de deputados estarem a festejar a morte justa de um ser que ninguém desejava e que ninguém pode aceitar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para já, e dada a escassez do tempo, era isto que pretendia. Mas como espero por si nos trabalhos de especialidade, poderá ouvir-me em muitas outras matérias.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo.

O Sr. Luís Francisco Rebelo (PCP): - Sr. Ministro, muito haveria a dizer da sua longa intervenção. Infelizmente, o tempo de que disponho não me permite ir muito longe. Por isso, limitar-me-ei a uma observação, a uma pergunta e a uma rectificação.
A observação diz respeito ao famigerado artigo 72.º. O Sr. Ministro perguntou, na sua intervenção, porque é que se perdeu tanto tempo e se gastou tanta cera com tão ruim defunto.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Se é defunto, é defunto!

O Orador: - Estamos de acordo com o «ruim defunto». Mais valera que nem sequer tivesse chegado a nascer!
Mas a resposta à sua pergunta é muito simples: é porque o artigo 72.º está no Código do Direito de Autor, porque o Governo aprovou o Código com esse artigo e porque o decreto que o aprovou ainda está em vigor. Por conseguinte, enquanto não for revogado, há que falar no artigo 72.º
E a verdade é que também o Sr. Ministro perdeu tempo e gastou cera com este ruim defunto pelo que, certamente, o Sr. Deputado José Niza irá considerar o seu discurso desactualizado, tal como considerou o meu, visto que já há consenso no sentido da eliminação do artigo 72.º
A pergunta diz respeito a duas disposições do Código que não foram aludidas na intervenção do Sr. Ministro da Cultura. Como é que o Sr. Ministro compatibiliza o estabelecimento de licenças obrigatórias em matéria de radiodifusão de obras gravadas e da comunicação pública de obras radiodifundidas com o direito exclusivo que o Código reconhece aos respectivos autores nessa matéria e com a independência, entre si, dos vários modos de utilização dessas mesmas obras?
Mais: que razões levaram o Governo a alterar um sistema que tem funcionado na prática sem atritos e sem queixas de qualquer das partes interessadas, desde que a rádio e a televisão operam em Portugal?
Finalmente, e ainda sobre este ponto: que interesses visa a introdução destas licenças obrigatórias ou, melhor ainda, que benefício advém para a colectividade e para o consumidor do estabelecimento destas licenças obrigatórias?
A rectificação é apenas esta: na sua intervenção, o Sr. Ministro aludiu à sua qualidade de membro da Sociedade Portuguesa de Autores.
A Sociedade Portuguesa de Autores sente-se, evidentemente, feliz e honrada por o ter como seu membro. Mas permita-me, Sr. Ministro, chamar-lhe a atenção para uma melhor informação acerca da Sociedade de

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que é um membro ilustre: é que ela não pertence ao sector privado, pois é uma cooperativa e a Constituição delimita claramente os sectores público, privado e cooperativo.

Aplausos do PCP e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE) Sr. Ministro, teria de começar por fazer um esclarecimento e, ao mesmo tempo, um protesto que diz respeito ao deputado Luís Francisco Rebelo.
Há uma coligação que se chama APU, que é constituída pelo Partido Comunista Português, pelo MDP/CDE e por deputados independentes que só o Partido Comunista Português pode convidar, porque nós não temos número suficiente de deputados para convidarmos independentes para o nosso grupo.
Essa coligação APU desfaz-se no dia em que são publicados os resultados eleitorais. Quanto aos deputados que estão nesta bancada, que pertencem ou à independência dos partidos, ou ao Partido Comunista ou ao MDP/CDE, o seu mandato foi verificado através da Comissão de Regimento e Mandatos desta Assembleia, e estão todos aqui por direito próprio do voto popular.
Posto isto, queria ainda dizer-lhe que as propostas de lei do Governo podem entrar nesta Assembleia da República com urgência e prioridade, e é da praxe desta Assembleia dar-se-lhes essa urgência e essa prioridade.
Pena foi, de facto, que não se tivesse tomado esse processo legislativo que era muito mais digno de um Código do Direito de Autor, de um Ministro da Cultura e da própria Comissão que sobre ele se tem debruçado.
Na análise do seu discurso, quando a fizer calmamente daqui a uns tempos, o Sr. Ministro, que sabe e é competente em estruturas literárias, verificará até que ponto as suas posições contraditórias e a incomodidade da sua posição teórica está patente na estrutura do seu discurso, de tal forma que tive até o desgosto de ouvir palmas de retórica da parte do seu partido. Compreendo que o tenham querido apoiar; simplesmente, a altura em que o apoiaram foi aquela que é menos digna para o Sr. Ministro, isto é, foi na altura em que falou mais alto e não na altura em que falou mais certo.
Quanto ao Código do Direito de Autor, devo dizer e ainda para responder, pois no outro dia não tive possibilidade de o fazer, àquilo a que o Sr. Deputado José Niza chamou «a obsessão do artigo 72.º». É verdade: eu estou, o meu partido está, qualquer democrata que não esteja no Governo está obcecado pelo artigo 72.º, pelo significado que ele tem. De tal maneira tenho razão para estar obcecada por esse artigo, que o Sr. Deputado José Niza apenas encontrou como argumentos que «o camarada Mário Soares e o camarada Coimbra Martins nunca seriam capazes de instaurar a censura em Portugal».

O Sr. José Niza (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Ora, quando as leis têm de ser justificadas pela presença das pessoas que estão no Governo, pergunta-se se são realmente leis que possam sossegar todo o povo.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, faça o favor de concluir o seu pedido de esclarecimento.

A Oradora: - Sr. Presidente, tenho tempo e julgo que estou a ocupar o meu tempo.

O Sr. Presidente: - Não se trata de uma questão de tempo, mas de figura regimental que determina que o pedido de esclarecimento tem de ser feito em 3 minutos, independentemente do tempo que se possa ter.

A Oradora: - Nesse caso posso fazer uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça então favor de continuar no uso da palavra, Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Oradora: - Ora, o artigo 72.º é de tal maneira perigoso que precisou de uma justificação de duas pessoas que estão no Governo para o tornar inócuo.
Todos nós sabemos que em democracia os governos mudam e que para um governo totalitário nada será mais agradável do que encontrar uma legislação feita pelos democratas que anteriormente o precederam. São casos históricos, que o Sr. Ministro conhece tão bem ou melhor do que eu.
Há, realmente, que tomar cuidado naquilo que se faz em cada dia porque a responsabilidade das pessoas é exactamente a do futuro quando se está a viver o presente.
Em relação ao Código do Direito de Autor, talvez a coisa mais grave que há aqui, a seguir ao artigo 72.º, em que insisto, seja uma certa vaguidade na definição dos direitos de autor. Não há só contradições, há vaguidade.
Ora, a vaguidade não é um conceito democrático, não é um conceito concreto. Contra a vaguidade da lei não se pode dialogar, e o diálogo é indispensável para se clarificarem as situações.
Tenho aqui anotados alguns exemplos - e mais haveria a juntar, mas não tive tempo -, como é o caso da contradição que existe no n.º 2 do artigo 73.º, do artigo 45.º e do artigo 71.º
Tudo isto nos leva a perguntar quais são o âmbito, os limites e o conteúdo da expressão «direitos de autor». Penso que isso não está suficientemente expresso.
Trata-se de um Código de Direitos de Autor e não de uma lei de imprensa ou de uma lei contra a pornografia. O que está em causa são os direitos de autor e nada mais.
Quanto às propostas pedagógicas do MDP/CDE, queria dizer-lhe que isso é normal. Somos, de facto, um partido pedagógico.
Não sei se o Sr. Ministro tinha intenção de me atribuir a mim todas as propostas, mas, de qualquer forma, devo dizer-lhe que, de facto, tenho muito trabalho nesta Assembleia, mas não tanto que me permitisse fazê-las isoladamente. Elas são fruto do trabalho de um grupo de escritores pedagógicos, de editores pedagógicos e, pelos vistos, de advogados não pedagógicos, já que, segundo o Sr. Ministro, elas são vagas, o que é, realmente, um defeito. Há que repor esse facto e para isso trabalharemos na Comissão.
Gostei, também, muito de tudo o que o Sr. Ministro disse a respeito da CEE e de todo o raciocínio intelectual que fez sobre o assunto.

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Devo dizer-lhe que partilho as suas preocupações. De facto, a integridade do País, a absorção cultural dos seus valores tem de ser extremamente velada e vigiada - e não só na cultura.
Partilho ainda de todas as suas apreensões sobre os livros e a este respeito gostaria de lembrar ao Sr. Ministro - porque o tempo já vai longe - o seu programa de governo e aproveitar para lhe fazer uma pergunta, o que faz parte da acção pedagógica do MDP/CDE nesta Assembleia, como em toda a parte.
Não sei se o Sr. Ministro se recorda do ponto 4.2.9 do programa do seu governo. Diz-se aí:
[ ... ] colaborar com o Ministro da Educação na implementação de um programa nacional de educação de adultos, abrangendo o analfabetismo funcional, com o consequente apoio à formação de monitores de alfabetização e de outros agentes de animação cultural e formação profissional.

Sr. Ministro, o MDP/CDE concede-lhe o resto do tempo de que ainda dispõe para que esclareça o que foi feito pelo Ministério da Cultura nesta matéria, que é tão grave.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Ministro da Cultura, em primeiro lugar, gostaria de, muito brevemente, elogiar o discurso de V. Ex.ª no sentido geral do seu conteúdo e também pela resposta cabal e exaustiva que deu a todas as questões que foram aqui levantadas.
Fui ontem confrontado com algumas perguntas que diriam mais respeito ao Governo e cujas respostas V. Ex.ª acabou de dar em momento oportuno e de uma forma cabal. De tal maneira essa forma se traduziu em clarificação e em esclarecimento que, depois daquilo que ouvi da parte dos Srs. Deputados das restantes bancadas, penso que aquilo que ficou vivo, apesar de já estar morto, foi apenas o célebre artigo 72.º
Há um aspecto que gostaria de sublinhar e que os Srs. Deputados que me antecederam não sublinharam, que é o da disponibilidade manifestada pelo Sr. Ministro da Cultura em participar nas reuniões da Comissão onde iremos acabar a redacção deste diploma. Penso que essa disponibilidade, essa participação e essa mostra de verdadeira democracia e de respeito pela Assembleia em relação a um trabalho que ainda fica por acabar deve ser aqui sublinhada, até por não ser muito comum relativamente a situações anteriores.
Quanto às palmas que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista deu - e neste momento falo também em nome do meu grupo parlamentar -, devo dizer que elas sublinharam os aspectos da sua intervenção que considerámos mais importantes. Queria esclarecer, a este respeito, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não funciona, em termos de palmas, por reflexos condicionados. As teorias de Pavlov têm sido adoptadas na União Soviética pelo marxismo-leninismo, que não perfilhamos. Penso que aí, sim, os reflexos condicionados têm sido aproveitados, explorados ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e patenteados em relação a manifestações desse tipo.

Funcionamos por reacções espontâneas, na base da análise daquilo que ouvimos e da nossa própria crítica.
Em relação às situações ad hoc que, eventualmente, se verifiquem nesta Assembleia, penso que o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo não é um deputado ad hoc; diria antes que é um deputado de passagem, passagem essa que sublinhei como muito positiva em relação a esta Assembleia. Seria até bom que ele cá continuasse, mas isso já é uma questão que tem a ver com a bancada do Partido Comunista e não com a nossa.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Deputado também está cá de passagem!

O Orador: - Estou cá de passagem há 10 anos, uma vez que não estava cá antes do 25 de Abril.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É em relação ao último mandato!

O Orador: - Ah, estava a referir-se ao último mandato! ... Mas, enfim, já tenho 9 anos de serviço e, portanto, já começo a pertencer...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - E eu tenho 10!

O Orador: - Então, fica para a acta que o Sr. Deputado Carlos Brito tem mais 1 ano de passagem nesta Assembleia do que eu, o que registo com muita satisfação. 15so significa que, de acordo com o novo Estatuto dos Deputados, tem mais 4 % do que eu.

Risos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - 15so é materialismo!

O Orador: - Estou a falar de materialismo, mas não do dialético; estou a falar do materialismo financeiro.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Pavlov explica isso!

O Orador: - Bem sei que esses 4 % vão reverter...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Niza, desculpe-me interrompê-lo, mas devo adverti-lo de que tem de acabar o pensamento que começou. Queira, pois, fazer o favor de não dialogar.

O Orador: - Sr. Presidente, o meu pensamento nunca se acaba; às vezes interrompe-se. E agora eu estava exactamente a dizer ao Sr. Carlos Brito...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Deputado Carlos Brito, faz favor!

O Orador: - ... que esses 4 %.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É da praxe!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito e líder parlamentar da bancada socialista...

Risos do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - 15so é um acto falhado! ...

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O Orador: - Estava eu a dizer, que sei que esses 4 % vão reverter a favor dos cofres do Partido Socialista ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Outro acto falhado! Passe adiante! ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - 15so nunca! ...

O Sr. Presidente: - Não há dúvida de que as interrupções trazem estes inconvenientes: confundimo-nos!

O Orador: - Efectivamente, prova-se que fui confundido, embora tenha ficado perfeitamente claro aquilo que queria dizer.
Falando ainda de dinheiro, gostaria de dizer que o Sr. Ministro da Cultura também não é um ministro ad hoc. O que ele é é um ministro sem «pasta», e quanto a isso estou solidário com ele, porque o Orçamento do Estado deixou-o nessa situação de ser um ministro sem «pasta».

O Sr. Joaquim Miranda: (PCP): - Mas foram vocês que votaram o Orçamento.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pretende usar da palavra para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Presidente, se me desse licença, queria fazer um pedido ao Sr. Ministro da Cultura antes de ele responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram feitos. Não sei que figura regimental posso utilizar para este efeito, mas creio que é exactamente a de um pedido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Ministro da Cultura, agradecia que explicasse o que é que são palmas de retórica, visto que o conhecimento do Eça nesta Assembleia não é assim tão generalizado quanto isso, já que se trouxe à baila o Pavlov quando não era nada disso que se tratava.
São as palmas que o Eça de Queirós e o Ega ouvem quando vão ao Grémio Literário, pensam que é o Alencar e dizem-lhes «Não, não é o Alencar; são as palmas de retórica.»

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É só um problema de cultura, para alguns deputados!

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Ministro da Cultura. Dispõe de 15 minutos.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção foi bastante criticada e algumas vezes com adjectivos que me surpreenderam.
Em todo o caso, penso que o objectivo implícito, não declarado, destes pedidos de esclarecimento era fazer-me repetir a dita intervenção. Na verdade, de uma maneira geral, os Srs. Deputados da oposição que me pediram esclarecimentos convidaram-me a novas exposições e explicações que já estavam contidas no discurso em que me alarguei.
Nesse mesmo discurso, terminei caracterizando estas ocasiões de polémica, de debate parlamentar, como ocasiões que propiciam certos desvios de linguagem ou certa ênfase na apresentação, e eu mesmo pedi aos Srs. Deputados que me revelassem o ter, eventualmente, incorrido nesses defeitos.
Não me parece que, dada a polémica que se acendeu sobre o Código do Direito de Autor e neste momento preciso da mesma, esses defeitos me caracterizem singularmente a mim, atento, até, ao que ouvi depois do debate, em que a minha intervenção, ou, pelo menos, alguns dos seus passos, foram classificados pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes de histéricos...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Não!

O Orador: - Não foi isso o que disse?! Então fui eu que ouvi mal. Mas parece-me que outros ouviram como eu.
Bom, passemos sobre isso.
O que se trata é das observações que foram muitas vezes, ou as mais das vezes, feitas, nomeadamente quando o Sr. Deputado José Manuel Mendes falou sobre o fundo da minha intervenção.
Certamente que o Sr. Deputado José Manuel Mendes não negará que disse que eu crispei o debate.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Disse, sim senhor!

O Orador: - Se realmente o fiz, não era esse o meu intento, como, aliás, o declarei no decorrer da minha intervenção.
Também me foi perguntado qual era, então, a intenção da minha intervenção.
O Código do Direito de Autor está, neste momento, em reconsideração na Comissão e o que quis com a minha intervenção foi propor à Comissão todos ou, pelo menos, a maior parte dos argumentos - porque eles não se podem esgotar, de maneira nenhuma, numa intervenção feita na Assembleia - que se podem e devem aduzir e que o Governo considera válidos em defesa do Código. Proponho-os à Comissão, ela fará deles, evidentemente, o que entender e para a sua análise tem, se o quiser, a minha colaboração.
Não há no mundo verdades absolutas e também não há, em matéria de direitos de autor, sobretudo quando eles se traduzem em prazos de protecção, uma bondade exclusiva característica dos 17 anos contra os 15 anos. Há que optar e para Comissão poder fazê-lo, pareceu-me que a minha atitude coerente, como membro do Governo e co-responsável por este Código deveria ser apresentar à Comissão tudo quanto pode e deve ser aduzido em defesa desse Código.
É evidente que tudo quanto está no Código não é da responsabilidade do Ministério da Cultura, como não é da responsabilidade deste ou daquele, mas da responsabilidade, conjunta e sintética, do Governo de que faço parte.
Esta foi a minha intenção.
Quanto ao Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, creio que não terá sido ofensiva aquela fórmula que empreguei e que foi referida nos pedidos de esclarecimento.

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Mas o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo relevou um erro na minha intervenção, o qual peço-lhe que me perdoe. Como certamente observou, fiz a minha intervenção bastante desviada do papel, não fui escravo do que tinha escrito e, querendo empregar o termo que se opunha a «nacionalizado», empreguei não aquele que, realmente, era o exacto mas um outro que não convinha.
Vou responder agora à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, começando do fim para o princípio, dado que terminei com o Sr. Deputado Nogueira de Brito. Vou fazê-lo até para, de certa forma, dar seguimento à observação que ele fez, ou seja, de que considerava que eu me ocupava dele em primeiro lugar e sobretudo dele. Deixá-lo-ei, agora, em observância do que ele disse, para o fim.
Perguntou-me a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, salvo erro, o que são palmas de retórica ou se me contento com elas. Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que nas ocasiões em que as palmas podem vir ou não vir, enfim, em todas as ocasiões em que estiver a pensar, acederei em estar presente, e veremos se reserva para mim as de retórica ou outras. Estou habituado a todas elas, não faz diferença! Depois, classificaremos juntos o que tiver sucedido.
Nunca me furtei a ocasiões de palmas nem de vaias e estarei consigo para tentar definir se as que me convidar a postular serão de retórica, ou serão outras, ou não serão palmas de maneira nenhuma.
Respondendo ainda à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, gostaria de dizer que, para não sair dos conceitos literários a que o debate com ela, naturalmente, induz, parece-me que este Código põe uma questão de literatura comparada e que, na verdade, para se chegar a uma conclusão sobre o que aqui referiu, ou pretendeu referir, o Sr. Deputado Nogueira de Brito - e não só ele - seria necessário um trabalho de literatura comparada exaustivo sobre os esboços e as minutas de código que estiveram em presença. Mas isso comecei eu mesmo por dizer, e que tinha atendido a todas.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito - desculpe-me, mas isto é incidentemente e só por estar neste assunto - disse esta manhã que o Governo tinha no seu projecto de código do direito de autor uma coincidência de matérias com aquele que estava no Ministério da Cultura e de que era responsável a anterior equipa do Ministério. Mas como não havia de ser assim se a matéria é o direito de autor? Creio que não era possível ser de outra forma!
É evidente que em projectos de códigos há sempre coincidências inevitáveis, porque a matéria as exige e as opções não são todas diversas, assim como, também há divergências específicas e tão fortes que, realmente, fundamentam a alterabilidade.
Ora, havia, precisamente, semelhanças flagrantes entre o Código que encontrei no Ministério da Cultura e o projecto da Sociedade Portuguesa de Autores e, aliás, citei uma. Por outro lado, também há diferenças específicas, que citei na minha intervenção, que são perfeitamente singulares e que são características do Código que o Governo aprovou como decreto-lei.
Parece-me que nesta altura do debate cada qual reclama neste Código, que é tão atacado, uma parte iminente de responsabilidade. Todos os que criticam esse Código querem aparecer como os principais responsáveis dele e, ao mesmo tempo, excluir dessa responsabilidade o Governo e obter uma crítica e uma condenação, tanto quanto possível, larga do mesmo Governo.

Este paradoxo deve, em meu entender, ser meditado e creio que o seu significado é muito importante.
O Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo falou da licença obrigatória, mas creio que essa objecção da Sociedade Portuguesa de Autores já está respondida no documento que o Ministério fez circular.
A licença obrigatória é permitida pela Convenção de Berna, a qual dispõe que compete às legislações dos países da União regular as condições do exercício dos direitos de radiodifusão sonora ou visual.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Não foi isso o que perguntámos! A questão não é essa!

O Orador: - Então, é a da compatibilidade. Ou seja, perguntaram se o autor que autorizou a fixação comercial não deu implicitamente autorização para a radiodifusão.
Ora, uma coisa é a fixação e outra é a fixação comercial. Com que intuito, senão o da difusão, pode ser fixada comercialmente - e digo bem, comercialmente - uma obra? Parece-me que isto é evidente!
Terminando a minha intervenção, gostaria de dizer que ofereci aos Srs. Deputados mais um motivo de censura ao Código que não foi aproveitado, ou porque seria inoportuno ou porque seria mau. Mas as intervenções seguintes fizeram-me pensar que, realmente, a minha iniciativa foi oportuna, porquanto os Srs. Deputados, em geral, voltaram precisamente àqueles cavalos de batalha que foram preparados contra este Código. De novo se voltou ao artigo 72.º, de novo se voltou à questão - invocada, sobretudo, pelo CDS da maneira como este diploma foi aprovado, ou seja, de ter sido sob a forma de um decreto-lei e não de uma proposta de lei. Porém, acho que não vale a pena voltar a estes argumentos.
Só interessa, e não posso deixar de o fazer, registar que, voltando a estes argumentos cuja repetição já censurei na minha intervenção, os Srs. Deputados da oposição mostram que não encontram outros contra o Código.
Só quero dizer, pois perguntaram-me claramente isso, qual foi então o meu objectivo ao desenvolver a questão do artigo 72.º
Creio que terei sido claro. O artigo 72.º é um artigo enterrado - assim o disse o Sr. Primeiro-Ministro. Todavia, quis mostrar aos Srs. Deputados, na minha intervenção, que não havia maldade nenhuma nem qualquer implicação nociva nesse artigo 72.º ...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Ministro, peço-lhe desculpa e agradeço-lhe, ao mesmo tempo, a circunstância de me permitir a interrupção.
É que suponho que, em volta do artigo 72.º, tem sido dita muita coisa de atender e o Sr. Ministro retoma a grelha explicativa que expendeu na sua oratória inicial.
Há uma questão concreta que tem de ser colocada, que não pode deixar de ser colocada; que não pode sequer ser escamoteada. A norma será, porventura, inútil; pode não ter estado na mens legislatoris - se é que

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a mens legislatoris era a do Sr. Ministro Coimbra Martins -, mas o que é facto é que a maldade que daí adviria era tão só esta: um diploma contendo, na ordem jurídica portuguesa, um preceito como o do artigo 72.º é inconstitucional porque briga violentamente com as disposições da nossa Constituição. E não é pensável que um qualquer governo, um qualquer ministro, uma qualquer personalidade democrática, nesta Câmara ou fora dela, defenda, como inócua e de bom tom, uma regra como aquela, que é, à revelia da lei fundamental, um atentado às liberdades e estimuladora, sem dúvida, de soluções censórias.
Não vale a pena discutir mais. Mas o que é facto é que, tendo o artigo 72.º surgido no diploma, surgiu com a gravidade tão-só - e já bastante - de ser claramente inconstitucional.

O Orador: - Não voltarei então à discussão do artigo 72.º, mas reitero isto: felicito-me por esta posição do PCP tão escrupulosa quanto às liberdades.

Aplausos de alguns deputados do PS.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Tem razões para isso! Mas, já agora, podia provar que o artigo não era inconstitucional!

O Orador: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito falou da porta aberta à pirataria.
Bom, creio que durante a minha intervenção me expliquei, largamente, sobre esse problema. Se há porta aberta à pirataria é por haver um laticismo no Código que, não contendo todas as leis, repete para as leis vigentes que permitem o combate à pirataria - e ele tem disposições novas sobre a pirataria. Não obstante, Sr. Deputado Nogueira de Brito, expliquei também que estou convencido que é assim.
O Governo adoptou, no penúltimo Conselho de Ministros, um diploma que refere claramente a possibilidade e o dever da apreensão das máquinas e que dá meios novos, até aqui inéditos, de combate à pirataria. De toda a maneira, já que os efeitos do Código parecem ser maus, por incompreensão de quem tem de se referir aos articulados legais, pois muito bem: que se insira essa possibilidade de apreensão das máquinas e até, eventualmente, que se levantem as penas no caso especial - e visto que a tendência no mundo é para a despenalização - do combate à pirataria audiovisual. Que se levantem então ligeiramente as penas a fim de se conseguir o combate à pirataria, que no nosso país é, realmente, indispensável.
Todavia, fomos os primeiros que introduzimos, que legalizámos, um processo de classificação que tenta sujeitar a uma legalidade o comércio e a distribuição dos videogramas entre nós.
Agora, de facto, faço este prognóstico: a circulação dos videogramas virá a impor a esta Assembleia normas restritivas quanto a essa circulação, dado o carácter violento, brutal, perfeita e indiscutivelmente nocivo de certos videogramas. E não podemos admitir que o autor desses videogramas venha depois invocar ...

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Ministro.

O Orador: - Então, como não posso desviar todos os argumentos, só quero dar-lhe um e voltarei ao problema da televisão.

O Sr. Deputado Nogueira de Brito marcou, realmente - se me permite a expressão vulgar -, um tento, quando notou que afinal a televisão, como se tivesse dito fiat lux, tinha aparecido.
Pois muito bem, Sr. Deputado: remeto agora V. Ex.ª para o primeiro livro branco que o CDS publicou sobre este Governo que o seu partido combate. E nesse livro branco, e sobre o Ministério da Cultura, havia esta crítica: o Sr. Ministro da Cultura nem sequer aparece na televisão. Ora, Sr. Deputado, para andar ao gosto da oposição hei-de aparecer, mais ou menos, na televisão?! ...

Aplausos de alguns deputados do PS.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Era para comunicar à Mesa que, ao abrigo das normas regimentais, pedimos uma suspensão de 15 minutos nos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Conjugando o pedido formulado pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura e pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, vamos interromper os nossos trabalhos, considerando também o intervalo, pelo que recomeçarão quando forem 18 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 12 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Margarida Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, SRs. Deputados: O debate que temos vindo aqui a travar na generalidade consiste na apreciação, pela Assembleia da República, do Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, que aprova o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, Código esse que faz parte integrante do citado decreto-lei.
Talvez não seja de mais aqui repetir e explicitar que este debate surge na sequência e por força de vários requerimentos apresentados por todos os partidos representados nesta Câmara, à excepção do PSD - diga-se em abono da verdade -, requerimentos esses que visaram trazer à Assembleia da República o diploma sobre o direito de autor e direitos afins, para efeitos de o alterar ou de recusar a sua ratificação. 15to, se bem que nesses requerimentos não constasse o efeito que os seus subscritores pretendiam obter.
Esta explicação deve-se ao facto, que lamentamos, de este decreto-lei já ter sido designado por tudo menos por aquilo que ele é: de projecto de lei, de proposta de lei e de outras coisas.
Para que não haja dúvidas, nem para que a este propósito se estabeleçam quaisquer confusões, deve acentuar-se que o mecanismo de apreciação pela As-

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sembleia da República, ora em apreciação, corresponde ao exercício de um poder constitucionalmente cometido a este órgão de soberania, o qual, no sistema político-democrático português, é o órgão legislativo por excelência.
Daqui decorre que o decreto-lei em causa entrou em vigor nos termos habituais. E, a menos que seja votada favoravelmente a suspensão, já requerida, quer total quer parcial, da sua vigência, permanecerá em vigor na sua formulação até que seja publicada lei que o venha a alterar. E a este propósito, sobre os projectos de resolução apresentados pelo CDS e pelo PCP, me debruçarei adiante.
O PSD, face ao desencadeamento do processo a que aludi, comprometeu-se a diligenciar, no sentido de que o debate fosse agendado com urgência e desenvolveu todos os esforços no sentido de que o diploma ratificando fosse objecto de um trabalho preparatóriono seio da Comissão competente, em ordem à preparação de propostas comuns de alteração, bem como ao equacionar dos pontos, objecto de maior polémica, e em relação aos quais se suscitavam muitas dúvidas acerca das soluções consagradas.
Creio que o trabalho produzido pela Subcomissão, cujo relatório foi aliás lido no início deste debate, foi muito útil, não apenas para os deputados que nele se empenharam, mas até para o bom funcionamento dos trabalhos parlamentares, e creio que talvez possa constituir um bom exemplo relativamente a outros processos legislativos e até de ratificação, tendo em vista a elaboração de leis mais justas, mais correctas e mais adequadas.
Não poderia entrar na apreciação deste Código sem antes referir alguém do PSD, que já foi deputado desta Casa, e que tem tido especiais responsabilidades na matéria do direito de autor.
Afirmava o Dr. António Maria Pereira, em recente depoimento a um jornal, que esteve associado à elaboração do Código, na medida em que presidiu ao grupo de trabalho interministerial que preparou o seu primeiro projecto e cuja redacção final (a do primeiro projecto) é da sua autoria. Acrescenta que esse primeiro projecto passou, posteriormente, por tantas mãos que, embora a estrutura global e numerosas soluções tivessem sido mantidas, houve modificações pontuais que bastante o alteraram.
Assim, refere o Dr. António Maria Pereira, e justificando os protestos que foram aduzidos relativamente ao artigo 72.º - e hão-de compreender que o PSD também aqui tome posições acerca desse famigerado artigo, acusado de abrir caminho à censura -, que este artigo não constava do seu projecto.
Este preceito dispõe o seguinte:

Os direitos reconhecidos ao autor não tolhem aos poderes constituídos a faculdade de permitir ou proibir, nos termos legais, a circulação, a representação ou a exposição de qualquer obra, quando o interesse público o exigir.

E reproduz, com pequenas alterações de forma, o texto do artigo 81.º do projecto do Código do Direito de Autor, submetido à defunta Câmara Corporativa, em 1973:

Em defesa da inclusão deste artigo no Código, poderá argumentar-se que ele reproduz, quase ipsis verbis, o artigo 17.º da Convenção de Berna,

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relativa à protecção das obras literárias e artísticas, cujo objectivo principal era salvaguardar nos Estados membros o direito de censurar as obras intelectuais nos seus territórios.

E o Dr. António Maria Pereira finaliza, dizendo:

Quanto ao nosso país é evidente que desde a institucionalização da democracia deixou de fazer qualquer sentido manter numa lei interna uma disposição destinada a permitir a censura.

Por isso ele fez questão de não a reproduzir no seu projecto.

Em qualquer caso, e apesar de já haver concordância, a nível de Comissão, na apresentação de uma proposta de eliminação do artigo 72.º, que, creio será objecto de votação favorável unânime, não posso deixar de, a este propósito, citar o Guia da Convenção de Berna, para que não haja confusões sobre aquilo que se tem dito a propósito deste artigo 72.º, que reproduz o tal artigo 17.º da Convenção de Berna. Diz o Guia:

Este artigo permaneceu quase sem modificação desde o texto original de 1886; o seu alcance foi, contudo, objecto de algumas discussões aquando da revisão de Estocolmo (1967).
Trata-se aqui do direito que compete aos governos de tomarem todas as disposições que julguem úteis para a manutenção da ordem pública [...]
Aquando das deliberações de Estocolmo (1967), foi geralmente admitido que este artigo se referia essencialmente à censura, quer dizer, ao poder de «controlar» uma obra destinada a ser posta à disposição do público com o consentimento do seu autor e, com base nesse controle, «permitir» ou «proibir» a disseminação dessa obra.

Só que - e diz-se adiante, no comentário ao artigo 17.º da Convenção de Berna -, obviamente, um texto de tratado internacional não pode imiscuir-se na esfera interna dos Estados, pelo que caberia a cada Estado determinar, na sua lei interna, a possibilidade de aplicação desta disposição.
Creio, pois, que não se deve dizer que este artigo não introduz a censura. Ele é considerado, internacional e geralmente, como estabelecendo tal faculdade aos poderes constituídos e é claro que o PSD não poderia, de forma alguma, aceitar a sua inclusão e a sua manutenção neste Código.
Quanto a outras disposições do Código, que têm sido severamente criticadas, importa debruçarmo-nos sobre elas para que o respectivo debate não fique confinado às paredes da Comissão, como já foi observado pelo Dr. Luís Francisco Rebelo, esperando nós que o Governo, como aliás já anunciou, participe activamente nos trabalhos da discussão e votação na especialidade da Comissão competente.
Começando por um aspecto relativo à atribuição do direito de autor, o Código prevê, após afirmar que o direito de autor pertence ao criador intelectual da obra literária ou artística, que, no caso da obra feita por encomenda ou por conta de outrem, a titularidade do conteúdo patrimonial do direito de autor se determina de harmonia com o que for tácita ou expressamente convencionado. E que na falta de convenção, pelo menos assim parece resultar do que se dispõe no Có-

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digo, se presume que a obra pertence à entidade que a custeia ou publica, se é realizada no exercício de um dever funcional ou de um contrato de trabalho.
Embora aqui se configure apenas uma presunção juris tantum, e que, portanto, é ilídivel por prova em contrário, e se dúvidas não se suscitam quando a obra é feita expressamente por encomenda, já temos muita dificuldade em encarar que, no caso de obra feita por conta de outrem, a presunção não se estabeleça em favor do autor ou de criador intelectual. Ou seja, de harmonia com a regra do Código que atribui a titularidade do direito de autor ao seu criador intelectual.
Claro que nos impressiona o argumento aduzido em favor da solução consagrada no Código, por exemplo pela Associação Portuguesa dos Editores e Livreiros (APEL), segundo a qual, no dia-a-dia e na generalidade dos casos, os contratos de trabalho não são reduzidos a escrito - é um facto - ou nada se estabelece entre as partes que permita apurar qual a sua vontade no que respeita à titularidade do direito de autor na sua vertente patrimonial. E que se alguém contrata com outrem no cumprimento de um contrato de trabalho, deve pressupor-se que, na falta de estipulação em contrário, tal direito pertence à entidade patronal.
Mas se este argumento tem algum peso, e se, por outro lado, não são aqui postos em causa os direitos morais, também convém, ao invés, notar que o conteúdo patrimonial do direito de autor abrange não apenas o aspecto da remuneração mas também o direito de o autor dispor da sua obra, direito este que, a nosso ver, poderá ultrapassar a mera prestação de trabalho por conta de outrem.
Entendemos, por outro lado, que as partes devem sempre convencionar o que pretendem quando realizam obras no caso que temos vindo a analisar, sob pena de não poderem acautelar devidamente os seus respectivos interesses. É um aspecto que releva até em termos pedagógicos e que, em nossa opinião, poderá incrementar algo que nos parece essencial - transferir para o domínio dos interesses de quem contrata a defesa desses mesmos interesses, porque ninguém melhor que os próprios o sabe acautelar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Um preceito que foi vivamente criticado é o n.º2 do artigo 63.º, segundo o qual:

Na medida exigida pelo fim a que o uso da obra se destina, é lícito proceder a modificações que não a desvirtuem.

Aqui está um preceito que permite introduzir modificações na obra sem o consentimento do autor.
Salvo o devido respeito, creio que as críticas aduzidas foram algo exageradas, e interpreto este artigo de forma algo diferente, que passo a expor.
Em primeiro lugar, este dispositivo aparece sistematicamente integrado no artigo que começa por estabelecer no seu n.º1, que:

Não são admitidas modificações da obra sem o consentimento do autor, mesmo naqueles casos em que, sem esse consentimento, a utilização da obra seja lícita.

Em segundo lugar, este artigo vem na sequência do artigo 60.º, que estipula que, independentemente dos direitos de carácter patrimonial, e ainda que os tenha alienado ou onerado, o autor goza durante toda a vida do direito de reivindicar a paternidade da obra e de assegurar a genuinidade e integridade desta, opondo-se a toda e qualquer mutilação, deformação ou outra modificação da mesma e, de um modo geral, a todo e qualquer acto que a desvirtue e possa afectar a honra e reputação do autor.
Este artigo corresponde, aliás, ao artigo 6.º-bis, alínea 1) da Convenção de Berna, pelo que importa citar de novo o Guia da Convenção de Berna para que não restem dúvidas de quais os propósitos do legislador ao introduzir esta solução.
Diz o Guia da Convenção de Berna que a prerrogativa do autor é a de se opor a qualquer deformação, mutilação ou outra modificação da obra, ou a qualquer atentado à mesma obra, que possam prejudicar a sua honra ou reputação. A forma é muito maleável e remete para os tribunais um amplo papel na interpretação dos factos e na apreciação das intenções.
Quem for autorizado pelo autor a utilizar uma obra (por exemplo, por via de reprodução ou de representação) não a pode modificar, quer através da prática de cortes ou de supressão de elementos, quer procedendo a acrescentamentos.
Por exemplo, um encenador não pode, por sua própria iniciativa, amputar uma peça de teatro de algumas cenas; um editor não está habilitado a ignorar alguns capítulos de um texto. O problema torna-se mais delicado - e este tem sido o exemplo apresentado quando se trata da adaptação de uma obra: por exemplo, ao escrever uma peça de teatro ou ao realizar um filme a partir de um romance é difícil impor ao adaptador uma fidelidade servil ao romance, porque os modos de expressão são tão diferentes e a transposição para a cena ou para o ecrã acarretará forçosamente modificações.
E foi nesse sentido, em que se prevê especificamente os casos em que é preciso proceder a modificações de carácter técnico quando a obra é utilizada para um determinado fim, que resulta aliás do dispositivo legal, que nós, PSD, apresentámos a este propósito uma proposta de eliminação deste dispositivo.
Mas, em contrapartida, entendemos que ele deve ser transferido para outra sede, para que não haja equívocos de interpretação quanto ao objectivo que se pretende. E a sede que por ora nos parece mais adequada, sem prejuízo de um debate posterior na Comissão, é a do artigo 172.º, em que se fala na possibilidade de transformação da obra, e em que se diz que a transformação só pode ser feita mediante autorização do autor.
Se introduzirmos aqui o dispositivo que referi há pouco, dizendo que algumas modificações de carácter técnico podem ser introduzidas, sem que com isso se ponha em causa a necessária autorização do autor nem que a obra seja desvirtuada, resolveremos o problema das interpretações equívocas que a este propósito se têm suscitado.
O artigo 70.º, por seu turno, também foi objecto de interpretações equívocas, havendo quem dissesse que se pretendia reduzir o prazo de protecção de obras póstumas de 50 anos para 35 anos.
Julgamos que nada disso decorre desse artigo. O que dele decorre é que os direitos que caberiam ao autor

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se tivesse divulgado a obra em vida não se constituem para os seus sucessores se estes não utilizarem a obra dentro de 15 anos a contar da morte do autor, salvo
em caso de impossibilidade ou se a divulgação tiver sido demorada por poderosos motivos de ordem moral, que podem ser apreciados pelos tribunais.
O que parece ter sido a intenção do legislador é motivar os sucessores do autor a trazer a obra ao conhecimento público num prazo que se considerou ser razoável (15 anos). No entanto, manifestámos dúvidas que essa divulgação não se possa efectuar após esse prazo e à revelia dos sucessores do autor, e que, caso assim se venha a prever, estes devam perder os direitos pelo facto da não divulgação.
Esta questão, para nós, ainda está um pouco em aberto, e penso que também deverá ser objecto de aprofundamento no debate na especialidade.

O artigo 82.º, que consente a reprodução, num único exemplar, de obras ainda não disponíveis no comércio ou de obtenção difícil no tempo necessário à sua utilização, e ainda no caso de reprodução para uso privado desde que não atinja a exploração normal da obra nem cause prejuízo injustificado aos interesses legítimos do autor, deve ser entendido com cuidado.
Com efeito, temos de pensar que a vulgarização da utilização da fotocópia e outros meios de reprodução levam a que muitas vezes se reproduzam obras inteiras e que tais reproduções até sejam utilizadas com fins lucrativos ou outros, prejudicando assim manifestamente o autor.
Se bem que os casos aqui contemplados no artigo
82.º não sejam para nós passíveis de censura, por corresponderem a necessidades práticas da vida quotidiana, não podem, no entanto, de forma nenhuma, serem entendidos sem também conjuntamente se utilizar o artigo 76.º, que já prevê a possibilidade de utilização lícita das obras sem consentimento do autor, e até
considera numerosas e variadas possibilidades de utilização.
No entanto, julgamos que a redacção do artigo 82.º deve ser retocada de forma a que especifique melhor os casos que pretende contemplar. E nesse sentido
apoiamos e subscrevemos uma proposta que já está entregue na Mesa em que estes casos são especificados de uma forma mais restritiva.
Quanto ao artigo 83.º - e este artigo não pode deixar de ser objecto de um comentário aqui no Plenário, aliás o Sr. Deputado José Niza já teve ocasião de
se referir a ele amplamente -, queria dizer que se trata de um artigo em que estão muito em causa interesses diversos.
Determina-se nesse artigo que no preço de venda ao público de todos e quaisquer aparelhos mecânicos, químicos, eléctricos, electrónicos ou outros, que permitam
a gravação e reprodução de obras literárias ou artísticas e, bem assim de todos e quaisquer suportes materiais das gravações e reproduções, inclui-se uma quantia destinada a beneficiar os autores e os artistas nacionais, quantia essa que será fixada posteriormente por decreto regulamentar após o que o Ministro da
Cultura poderá determinar o seu regime quanto à percepção e distribuição dessa quantia.
Entendem alguns que o leque dos beneficiários dessa quantia deverá ser alargado aos produtores fonográficos e videográficos e aos organismos de radiodifusão.
A este propósito não ficaria bem com a minha consciência se não dissesse que me parece ser exagerada a posição de alguns como, por exemplo, o Grupo Português de Produtores de Fonogramas e Videogramas quando pretendem consagrar neste dispositivo a imposição, no preço de venda ao público de aparelhos de gravação e reprodução, de um royalty de 5 %.

Temos de ter cuidado com determinados tipos de propostas, na medida em que sendo a solução consagrada no decreto-lei suficientemente flexível ela dificilmente permitirá que amanhã nos venham acusar de, por esta via, termos introduzido um imposto ou uma taxa que se vá repercutir necessariamente sobre o público consumidor.

Cremos, portanto, que, neste caso também, se deverá atender a este aspecto do problema.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É necessário dizer, portanto, que o objectivo louvável de protecção de uns não deve acarretar os efeitos exactamente inversos do que se pretende à primeira vista.

Continuando a análise do Código, gostava de dizer - e sempre relativamente aos artigos objecto de maior polémica- que uma das questões bastante discutidas é a que se relaciona com a transmissão por satélite e a distribuição por cabo.

Foi dito que não seria necessário regulamentar esta matéria no Código porque não faria sentido, com o estado de evolução em Portugal, proteger os autores em relação a esta formulação.

Queria observar, no entanto, que há uma disposição do Código - o artigo 68.º, n.º 2, alínea e)- que já diz que ao autor assiste o direito de difusão pela fotografia, pela telefotografia, pela televisão, pela radiotelefonia, por qualquer outro processo de produção de sinais, sons, imagens, comunicação pública por altifalantes e instrumentos análogos, por fios, sem fios, ondas hertzianas, fibras ópticas, cabo ou satélite, quando essa comunicação for feita por outro organismo que não o de origem.

Portanto, de alguma maneira esta questão já está abordada, se bem que ainda não esteja regulamentado, em termos de direito de autor, o facto de saber se a transmissão ...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, está esgotado o tempo de que dispunha o PSD.

No entanto, V. Ex.ª beneficia da tolerância que foi concedida aos outros Srs. Deputados. Por isso, faça favor de prosseguir.

A Oradora: - Quanto a esta questão da previsibilidade e da inclusão da previsão da regulamentação por cabo ou por satélite, punha-se a questão de saber se, quando essa transmissão é feita, estava em causa ou não a necessidade de uma nova autorização em termos das obras que são transmitidas.

Creio que nós, na Subcomissão, já equacionámos de algum modo essa questão, mas julgo que sobre ela ainda devemos ouvir alguns técnicos especializados sobre a matéria que nos possam fornecer alguma ajuda - e é bom que as Comissões especializadas da Assembleia, que muitas vezes abordam matérias técnicas, ouçam aqueles que, nos nosso país, vêm trabalhando sobre essas questões- para que, assim, se consiga chegar a uma solução consensual neste domínio.

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Por outro lado, não poderia deixar de referir aqui um artigo que foi objecto de muita crítica: aquele que respeita à radiodifusão de obra fixada.
Foi aqui dito que o Código permite a radiodifusão sem consentimento do autor.
Ora, estes artigos devem ser entendidos nos seus devidos termos.
De facto, o Código diz, 10 artigos atrás, que depende de autorização do autor a fixação da obra, acrescentando-se nesse mesmo artigo que a autorização para executar em público, para radiodifundir ou transmitir de qualquer modo a obra fixada (estão aqui abrangidas, portanto, todas as formas de utilização) tem de ser dada por escrito pelo autor, podendo até ser conferida a uma entidade diferente daquela que procedeu à fixação da obra.
Assim, dizer-se que no artigo 151.º se vem estipular o contrário, equivaleria a que o intérprete deste Código dissesse que o legislador quis num sítio uma coisa e noutro sítio outra coisa.
Não há aqui, uma contradição insanável, de modo algum, pelo que a harmonização entre estes dois preceitos dever ser feita conforme já tive ocasião de dizer na Subcomissão e como consta de uma proposta de alteração que apresentei e que está anexa ao relatório da Subcomissão. Ou seja, quando o autor grava a obra para efeitos comerciais - e quando aqui se diz «para efeitos comerciais», pode-se abranger, por exemplo no caso da gravação de um disco, a sua venda, a sua radiodifusão ou outras formas de utilização da obra -, ou se está a abranger implicitamente ou a exigir-se que o autor expressamente diga quais as formas de utilização da obra que autoriza.
É por isso que o artigo 151.º vem dizer que, quando o autor previamente autorizou que um disco seu seja não só vendido mas também radiodifundido, não se torna necessário a um organismo de radiodifusão ou à televisão ir pedir ao autor consentimento especial por cada vez que põe um disco seu a tocar.
Portanto, o artigo 151.º deve ser interpretado no sentido de que não é necessário o consentimento especial do autor para cada vez que a sua obra é utilizada. Não há aqui, pois, a tal coisa horrível que se pretendeu ver neste artigo 151.º
Passarei agora à matéria dos direitos afins, à matéria da protecção dos direitos dos artistas, dos intérpretes, dos produtores fonográficos e videográficos.
Discutiu-se muito o problema da direcção da protecção. Salientou-se o argumento segundo o qual quando se protege um autor português se está a abrir mão dessa protecção para proteger uma série indeterminada de artistas estrangeiros e que, portanto, haveria aqui um excesso de zelo em relação à protecção dos artistas estrangeiros em detrimento óbvio dos artistas nacionais.
Ora, a minha interpretação é a seguinte: quando o Código diz que protege os artistas - e os protege por determinado prazo -, e os produtores - também por determinado prazo -, refere-se aos nacionais.
De facto, no título específico dos «direitos conexos» não há um princípio de extensão de igualdade de tratamento aos estrangeiros. Na realidade, a existir esse princípio, das duas uma; ou era referido no Código, ou era aplicável ao Estado Português por força da adesão a uma convenção internacional que, nessa matéria, impusesse a igualdade de tratamento.
Ora, se a matéria da igualdade de tratamento é imposta a Portugal por força da adesão à Convenção de Berna e à Convenção Universal, já não é verdadeiro, pelo menos, na minha óptica, que essa protecção seja exigida por qualquer convenção internacional, nomeadamente pela de Roma - e nós não aderimos à Convenção de Roma.
Portanto, a menos que, aqui no Código digamos que é estabelecido um princípio de igualdade de tratamento entre os artistas estrangeiros e os nacionais ou que estabeleçamos um princípio de reciprocidade, nada me leva a concluir que estamos aqui a proteger os artistas estrangeiros ou que a importação de produtos intelectuais estrangeiros leva a desproteger os artistas portugueses. Por isso, não me parece que tal seja verdade em matéria de prazo de duração da protecção.
Creio que as pessoas que colaboraram nos trabalhos da Subcomissão já sabem a nossa opinião quanto à matéria do ilícito criminal e da contra-ordenação prevista na parte final do Código do Direito de Autor.
Devo dizer, no entanto, que, em matéria de ilícitos, talvez a forma como foi regulamentada não seja muito clara, na media em que nem sequer se fala na distinção entre responsabilidade civil e responsabilidade criminal, e na concatenação entre ilícitos criminais e contra-ordenações.
Por outro lado, revoga-se tacitamente a- Lei n.º 41/80, sobre a protecção dos fonogramas - e foi-nos dito que o Conselho de Ministros já tinha aprovado um diploma no que respeita aos videogramas, mas de que ainda não temos conhecimento.
Talvez haja necessidade - e aqui o PSD abre excepção quanto à possibilidade de suspensão da vigência do Código - de, sobre esta matéria, voltarmos à vigência do Código anterior, razão pela qual o PSD quer aqui afirmar que votará favoravelmente o projecto de resolução que foi apresentado pelo PCP em ordem à suspensão parcial dessa parte do Código do Direito de Autor, sem que, no entanto, possa concordar com os considerandos que constam desse mesmo projecto de resolução. No entanto, o PSD entende dever pedir aos autores desse projecto de resolução que especifiquem, em matéria de repristinação das normas, quais as que vão voltar a vigorar, para que, no período curto em que vai vigorar de novo o Código antigo, não se suscitem dúvidas quanto aos artigos que vão, efectivamente, vigorar. Será, portanto, a parte final do Código de 1966 e uma parte da Lei n.º 41/80, naquilo em que não contrarie o que não for agora revogado deste decreto-lei.

Aplausos do PSD, do PS e de alguns deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados José Manuel Mendes, Luís Francisco Rebelo, Hasse Ferreira, José Niza e Nogueira de Brito.
Devo dizer, no entanto, que a Sr.ª Deputada Margarida Salema já não dispõe de tempo para responder. E, apesar de hoje os tempos terem sido desrespeitados, gostaríamos que a sessão terminasse antes das 20 horas.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, prescindo da minha inscrição.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, eu também prescindo do uso da palavra.

O Sr. Presidente: - Os restantes Srs. Deputados mantêm a inscrição?

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O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, a minha inscrição não se destina a pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada, cuja intervenção foi, aliás, suficientemente esclarecedora, mas sim para uma curtíssima intervenção, uma vez que julgo que ainda dispomos de algum tempo.

O Sr. Presidente: - Bom, depois de os Srs. Deputados José Manuel Mendes e Luís Francisco Rebelo pedirem os esclarecimentos, darei à Sr. Deputada Margarida Salema o tempo estritamente necessário para as respostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Deputada Margarida Salema, correspondendo à parte final da sua intervenção, tenho todo o gosto em esclarecer a Câmara do seguinte - e pedia à Mesa que procedesse, «por interposta mão», à aposição dos números que indicarei no nosso projecto de resolução: propomos a suspensão da parte sancionatória do Decreto-Lei n.º 63/85, com a consequente repristinação das normas que vigoravam até aqui do Decreto-Lei n.º 46 980, de 27 de Abril de 1966, e da Lei n.º 41/80, de 12 de Agosto. Os artigos repristinados por via deste mecanismo serão os seguintes: 190. º a 214. º do Decreto-Lei de Abril de 1966, e 7.º, 8.º e 9.º da Lei n.º 41/80, de 12 de Agosto.
Creio que, com esta especificação, não restarão dúvidas de que as normas recolocadas em vigência não deixam na anomia penalizatória as prevaricações que venham a ocorrer, a todo o tempo.
Dada a dificuldade com que todos nos debatemos em matéria de tempos, não poderei agora fazer alguns pedidos de esclarecimento à Sr.ª Deputada Margarida Salema, ficando-me por esta informação, talvez útil para a Câmara.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, agradecia que fizesse chegar à Mesa as modificações que acabou de sugerir.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo.

O Sr. Luís Francisco Rebelo (PCP): - Serei muito breve e limitar-me-ei a fazer uma pergunta à Sr.ª Deputada Margarida Salema, na sequência da intervenção que fez, sem de modo algum pretender antecipar a discussão na especialidade.
Refiro-me à disposição do n.º 2 do artigo 63, que, a meu ver, é clamorosamente contrária ao princípio da intagibilidade da obra e da obrigatoriedade de respeitar a obra, que o Código estabelece no seu artigo 60.º
A interpretação que a Sr.ª Deputada Margarida Salema deu a esta disposição leva-a a concordar com a eliminação deste n.º 2 do artigo 63.º e a propor a sua transferência para o artigo 172.º
Pergunto então se, considerando que o que realmente importa é preservar o respeito pelo espírito e pelo sentido da obra, será, de facto, desnecessária essa transposição, uma vez que, na formulação do artigo 172.º que consta do Código, já se diz no n.º 3 que o beneficiário da autorização - visto que a transformação da obra não pode ser feita sem a autorização do autor dessa mesma obra - deve respeitar o sentido da obra original.
Parece-me que aquilo que a Sr.ª Deputada Margarida Salema pretendia já está contido no artigo 172.º, e, por conseguinte, bastará, pura e simplesmente, eliminar o n.º 2 do artigo 63.º para se obter o objectivo desejado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Deputado Luís Francisco Rebelo, não creio que a norma seja inútil porque senão não tinha proposto a sua transferência para outra sede. O que entendo - e creio que o Sr. Deputado não discordará de mim - é que aquilo que se pretendia contemplar era a possibilidade de introduzir modificações técnicas, que são lícitas e, portanto, para as quais não é preciso obter o consentimento do autor, quando a obra for objecto de uma adaptação.
Ora, o n.º 3 diz que o beneficiário da autorização deve respeitar o sentido da obra original, o que é óbvio, porque em todas as disposições do Código isso vem-se reflectindo e, de facto, o próprio n.º 2 do artigo 63.º diz que a obra não pode ser desvirtuada e que, portanto, o verdadeiro sentido da obra não pode ser posto em causa, de todo em todo. Só que aquelas pequenas modificações técnicas que são necessárias, em virtude da adaptação de uma obra, não podem deixar de ser introduzidas. E para que na prática não se suscitem dúvidas quanto a isso é que entendemos que há utilidade em preservar essa norma, se bem que devidamente integrada no dispositivo que respeita à adaptação, de forma a que não se diga que se pretendeu outra coisa que não aquilo que estou exactamente agora a dizer.
Precisamente quando se trata de clarificar, não é demais, quod abundant non nocet, introduzir essa clarificação neste dispositivo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Acontece, por vezes, nos pequenos grupos e agrupamentos parlamentares, que o deputado que trabalhou e estudou uma matéria não pode depois participar no respectivo debate.
É isso que acontece hoje, pois o meu colega de bancada Vilhena de Carvalho, que foi quem acompanhou toda esta matéria, por motivos de outro trabalho parlamentar, não pode produzir a intervenção do meu agrupamento parlamentar, que terá de ser feita por mim. Aceito gostosamente o encargo e naturalmente que espero a compreensão da Câmara para as condições em que esta intervenção terá de ser feita. Julgo, no entanto que tanta coisa já foi dita que, de algum modo, esta intervenção resultará naturalmente facilitada.
Penso, em primeiro lugar, que talvez não seja inútil - apesar de tudo quanto aqui foi referido e reflectido - pensarmos um pouco no sentido profundo deste debate. Direi que, mesmo por princípio, aquilo que é obra humana foi sempre susceptível de reprodução. 0 que uns homens haviam feito outros podiam

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refazer, em todas as épocas discípulos copiaram obras de arte a título de exercício, mestres as reproduziram para lhes assegurar difusão e falsários as imitaram para obter ganho material.
Mas as técnicas de reprodução são um fenómeno novo que se desenvolve ao longo da história e o nosso tempo é o tempo em que o autor e a sua obra se defrontam com técnicas cada vez mais aperfeiçoadas para reproduzir e para fazer chegar a cada vez mais pessoas aquilo que o autor foi capaz de imaginar e de criar.
Creio que no nosso tempo talvez só algumas criações sejam capazes de manter o seu carácter original e, por isso, aquilo a que chamamos autenticidade talvez não seja mais do que o sinal da presença do autor e de que a obra é uma sua extensão.
Talvez seja este o sentido profundo de termos modificado um pensamento, durante muito tempo corrente, e passarmos a considerar os direitos de autor, não no campo dos direitos de propriedade, mas no campo dos direitos do homem.
É nesse lugar que me pretendo colocar, tal como a Declaração Universal de 1948, para dizer que aquilo que está em causa é, no fundo, o respeito por alguém que foi capaz de criar alguma coisa que é expressão do seu pensamento, da sua sensibilidade e da sua vontade e por isso dom de si mesmo.
Creio que uma segunda vertente desta reflexão tem a ver com o comportamento dos sucessivos poderes em relação àquilo que constitui o acto de criação. Direi que, porque criar é introduzir o novo no mundo, a função de criação é de subversão essencial, atentatória ao conservadorismo e por isso é essa função prometiana que os vários poderes suportam mal.
É por isso que não há governo da cultura e é por isso também - e desculpar-me-á o Sr. Ministro - que a existência de um Ministro da Cultura é, só por si, algo que é de mau sinal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito se falou já dos defeitos do Código, e o trabalho feito em subcomissão permitiu, de modo particular, evidenciar uma concordância generalizada sobre alguns deles.
Relativamente ao artigo 83.º, relativo à compensação pela fixação e reprodução de obras, pergunto por que é que o decreto regulamentar, por exemplo, o remete para outro campo e para outro momento. Quando e como essa situação? E digo «decreto regulamentar» porque «despacho» não é possível e porque o n.º 5 do artigo 115.º o impede expressamente.
Não deixarei também de referir as remissões erradas, as contradições, a possibilidade de modificações no artigo 63.º E não falemos mais, porque o tempo já não é muito, no artigo 72.º
Já que estamos em matéria de direitos de autor, seja-me permitido recordar, dos irmãos Karamazov, a vinda à Terra, incógnito, de Cristo no século XVI e o seu encontro com o grande inquisidor que lhe dizia:

Afinal os homens não querem a liberdade, os homens querem a segurança; a segurança dou-lhe eu, não tu.

E concluía essa citação - anotei-a - com o seguinte: «Tu Cristo» (explica o Cardeal), «vieste para libertar os homens, o que é teoricamente melhor, com certeza, mas provocaria tantos problemas que mais vale que voltes para o Céu deixando-me agir, pois conheço os homens melhor do que tu.» Creio que esta poderia ser uma explicação da introdução deste artigo 72.º

O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma teoria!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não queria deixar de focar um último aspecto, que tem a ver com algo que muitas vezes aflorou ao longo deste debate e que foi chamado de dependência cultural.

Creio que o nosso tempo, também, é um tempo em que Robinson está perdido e o seu ciclo definitivamente encerrado, aliás como uma personagem de um conto de Cortazar, que é atingida na deserta ilha grega pelo desastre do avião que ele antes tinha servido. Creio que esse é, de facto, o fim do ciclo, porque, enquanto Robinson chegava à ilha por um naufrágio, não obstante dominava os elementos e construía uma nova existência, a personagem de Cortazar chega à ilha por sua vontade e é o naufrágio que o procura e que destrói a sua procura de uma nova existência.
O teatro perdeu também as suas paredes convencionais e o «teatro del mundo» deixou de ser uma simples metáfora para ser realmente uma realidade.

Um país como o nosso não pode ignorar, ou pretender ignorar, a sua abertura às correntes culturais universais. E creio mesmo que o sentido da universalidade que caracterizou a época mais rica da nossa história tem de ser retomado, muito mais do que a ideia de um equilíbrio cultural impossível e - direi - miserabilista de balança comercial.
Somos abertos, devemos ser abertos ao exterior e à sua influência cultural. Seria pueril e, além do mais, nocivo tentar lutar contra meios poderosos de criação e de irradiação cultural que, com características de alcance universal, aqui nos chegam. O que é importante, o que é realmente importante, é que tal exposição a correntes e influências culturais, as mais diversas, se não degrade em «seguidismo» imitativo.
Daí que uma atenção particular ao património cultural português possa e deva ser uma constante. Daí a importância fundamental de chamar a atenção, designadamente, para o nosso contributo para o processo histórico de criação cultural na Europa e, sobretudo, para a sua irradiação universal.

Quando, por exemplo, a Televisão portuguesa perceber que mais do que a promoção de alguns lhe interessaria fazer a promoção do todo que é o País que é nosso, creio que alguma coisa ganharíamos no sentido de alguma coisa criarmos em termos de independência cultural autêntica.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É já ponto assente nesta Câmara que vamos ratificar o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, introduzindo-lhe modificações que, de tal modo se impunham, quase todos os grupos e agrupamentos parlamentares presentes nesta Câmara suscitaram a sua ratificação e que, logo nos trabalhos preliminares da subcomissão, foi possível chegar-se a largo consenso quanto a modificações a introduzir e, por exemplo, à eliminação pura e simples do controverso artigo 72.º Penso que esse é um progresso manifesto. Com isso gostaria de terminar.
Muitas vezes, sucessivos governos têm invocado a necessidade de eficácia e de celeridade para legislarem por decreto-lei. Creio que aqui está uma lição - uma lição extremamente evidente - de como o debate parlamentar, apesar daquilo que provavelmente ele tem de mais demorado, tem, pelo menos, a virtude que lhe in-

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troduzem a controvérsia, o diálogo e a transparência e de permitir corrigir aquilo que os governos, por celeridade, fizeram menos bem.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, do CDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira, que dispõe de 3 minutos para esse efeito.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Cultura: De forma sucinta, e essencialmente para explicar o sentido do nosso voto, produzo esta curtíssima intervenção.
Subscrevemos o pedido de ratificação que nesta Assembleia foi apresentado conjuntamente por deputados da UEDS, da ASDI e do MDP/CDE, devido a erros e insuficiências do decreto-lei em discussão, que terão aparecido em evidência neste debate. Efectivamente, diversas intervenções abordaram criticamente vários pontos do articulado, que merecem ou ser imediatamente revogados ou a breve trecho alterados.
De qualquer forma, em nosso entender, as deficiências do decreto-lei não justificarão que nós deliberemos pela suspensão da sua vigência. Parece-nos, antes, que a conjugação da suspensão imediata dos artigos 201.º a 215.º, tal como já foi proposto, com a análise em comissão e subcomissão deste decreto-lei, visando a alteração de artigos como o 63.º, o 72.º e outros, aqui já largamente criticados, constituirá uma solução mais adequada e ponderada do que a suspensão pura e simples de todas as disposições do decreto-lei, suspensão essa também já aqui proposta, que não merecerá, no entanto, o nosso acolhimento.
Neste debate cedemos tempo a vários dos intervenientes (facto de que não nos arrependemos), tendo o Sr. Ministro e vários deputados usado com brilho da palavra sobre este assunto. Neste momento, clarificada na generalidade a nossa posição, coerente, aliás, com o pedido de ratificação que oportunamente subscrevemos, julgo que não nos resta mais do que a obrigação, que assim cumprimos, de clarificar os nossos sentidos de voto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há mais oradores inscritos (aliás, todos os tempos estão esgotados ou no limite), declaro o debate encerrado.
Vamos passar à votação de dois projectos de resolução e de um requerimento de baixa à Comissão.
Os referidos projectos de resolução, relativos ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, são da autoria do PCP e do CDS. Vamos votar em primeiro lugar o projecto de resolução do CDS, que visa a suspensão na totalidade do diploma. A seguir, votaremos o projecto de resolução do PCP, porque ele tem como consequência a suspensão parcial do mesmo diploma.
Há alguma objecção?
Pausa.

Não havendo objecções, vamos então proceder à votação dos referidos projectos de resolução.
Penso que os Srs. Deputados dispensam a leitura na íntegra dos projectos de resolução.
Algum dos Srs. Deputados pretende que a leitura seja feita?

Pausa.

Não havendo quem pretenda a leitura dos projectos de resolução, fica dispensada essa leitura.
Vamos, pois, proceder à votação do projecto de resolução do CDS, relativo ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, o qual, a ser aprovado, tem como consequência a suspensão na totalidade do diploma.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, da UEDS e da ASDI e votos a favor do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do Sr. Deputado Independente (António Gonzalez).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação do projecto de resolução do PCP, relativo ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, o qual, a ser aprovado, conduz à suspensão parcial do diploma, com a consequente repristinação dos artigos 190.º a 214.º do Decreto-Lei n.º 46 980, de 27 de Abril de 1966, e dos artigos 7.º, 8.º e 9.º da Lei n.º 41/80, de 12 de Agosto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação de um requerimento, apresentado por deputados de quase todos os partidos, no sentido de o referido diploma baixar à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para discussão e votação na especialidade das propostas entretanto chegadas à Mesa.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Niza pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, era para anunciar que entregarei na Mesa uma declaração de voto por escrito sobre as votações acabadas de realizar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não me parece que valha a pena passarmos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que consiste na discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 28/111, do PCP, proíbe a instalação, armazenamento, estacionamento ou trânsito de armas nucleares em Portugal. Parece-me mais adequado que esta matéria passe para a próxima terça-feira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, as nossas ordens de trabalhos da próxima semana já estão preenchidas. A sessão de segunda-feira é sobre problemas locais e regionais, na de terça-feira existe uma marcação do MDP/CDE e na quarta-feira uma do PCP. A primeira sessão disponível para continuarmos a agenda creio que é a do dia 12, já que a do dia 11 é uma marcação do CDS.

O Sr. Presidente: - Nessas circunstâncias, Srs. Deputados, a ordem de trabalhos de amanhã é constituída pelas perguntas ao Governo. As ordens de trabalhos das sessões seguintes constarão da ordem de trabalhos distribuída, passando este diploma para data posterior.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira.

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O Sr. Vítor Hugo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, uso da palavra para fazer uma pequena rectificação àquilo que o Sr. Deputado Jorge Lemos, certamente por lapso, informou.

Acontece, de facto, que os trabalhos estão agendados para a próxima semana, como o Sr. Deputado Jorge Lemos disse. Acresce, no entanto, que na próxima terça-feira a sessão se inicia às 10 horas com período de antes da ordem do dia e, após ele, até às 13 horas, continuar-se-á com a ordem do dia da sessão anterior. Só às 15 horas é que há marcação do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Nessas circunstâncias, parece-me que este diploma transitará para esse período, que não tem ainda nenhum diploma agendado.

Em qualquer dos casos, em futura conferência de líderes parlamentares esta matéria poderá ser melhor precisada. Com este entendimento ficamos hoje por aqui.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5O minutos.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
enviado para publicação

Em reunião realizada no dia 30 de Maio de 1985, pelas 10 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitadas pelo Partido Socialista:

Eurico Faustino Correia (círculo eleitoral de Faro) por Ferdinando Lourenço de Gouveia. Esta substituição é pedida para os dias 30 de Maio corrente a 23 de Junho próximo, inclusive.

João Joaquim Gomes (círculo eleitoral de Lisboa) por Carlos Justino Luís Cordeiro. Esta substituição é pedida por um período não superior a 60 dias, a partir do dia 28 de Maio corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Abílio Gaspar Rodrigues (círculo eleitoral de Santarém) por Anacleto da Silva Baptista. Esta substituição é pedida para os dias 30 de Maio corrente a 14 de Junho próximo, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.

Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) - José Manuel Niza Antunes Mendes (PS)- Beatriz Cal Brandão (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Teófilo Carvalho dos Santos (PS)- Manuel Portugal da Fonseca (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Alexandre Correia Carvalho Reigoto (CDS) - Francisco Menezes Falcão (CDS).

Declaração de voto do grupo parlamentar do Partido Socialista
enviada para publicação

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra o projecto de resolução do CDS pelas seguintes razões:

Em primeiro lugar, porque o conteúdo das propostas de alteração, subscritas por unanimidade por todos os deputados da Subcomissão, dão resposta cabal às preocupações expressas em relação aos aspectos mais polémicos ou controversos do decreto-lei.
Em segundo lugar, porque a suspensão do actual decreto levaria a um vazio legal de difícil compreensão, interpretação e cumprimento;
Em terceiro lugar, porque o trabalho já produzido pela Subcomissão, a natureza das propostas colectivamente subscritas e, sobretudo, o prazo de 30 dias para conclusão das votações correctivas do diploma não aconselham nem justificam a suspensão do decreto-lei em causa.

Votámos a favor do projecto de resolução do PCP porque, embora rejeitando os considerandos, ele visa a suspensão de preceitos do actual Código em vigor cuja manutenção já provou ter criado dúvidas nas autoridades policiais em relação à sua acção junto dos infractores ao Código. 15so mesmo foi referido na minha intervenção no presente debate como posição da minha bancada sobre a qual, aliás, há consenso total dos partidos.

O deputado do PS, José Niza.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António da Costa.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José dos Santos Meira.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Armando António Martins Vara.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.

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31 DE MAIO DE 1985

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Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Jorge Lacão Costa.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Basto Mota Torres.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria Helena Valente Rosa.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Anacleto Silva Baptista.
António d'Orey Capucho.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Guilherme Branco Gonzalez
António da Silva Mota.
Custódio Jacinto Gingão.
João António Ribeiro Rodrigues.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Lopes Porto.
Joaquim Rocha dos Santos.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel Jorge Forte Goes.
Manuel Tomas Rodrigues Queiró.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Ruben José de Almeida Raposo.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Almerindo da Silva Marques.
João Luís Duarte Fernandes.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

António Augusto Lacerda de Queiroz.
Fernando José Roque Correia Afonso.
José António Valério do Couto.

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I SÉRIE - NÚMERO 87

José Augusto Seabra.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Pereira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

António José Monteiro Vidigal Amaro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Paulo Areosa Feio.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

António José Bagão Félix.
Francisco António Lucas Pires.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António Poppe Lopes Cardoso.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

Os REDACTORES: Carlos Pinto da Cruz - José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz.

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