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I Série - Número 41
Segunda-feira, 10 de Março de 1988

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1988)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE MARÇO DE 1986
(Posse de S. Ex.ª o Presidente da República)

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
António Eduardo de Sousa Pereira
José Manuel Mala Nunes de Almeida

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 9 horas.

Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Alípio Pereira Dias.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Adindo da Silva André Moreira.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel ardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe Ataíde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.

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José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Marques Montargil.
Manuel Maria Moreira.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Manuel Ferreira Vitorino.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva. .
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Carlos Montez Melancia.
Helena Torres Marques.
Fernando Henriques Lopes.
Jaime José Matos dá Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Mário Nunes da Silva.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
António Miguel de Morais Barreto (Indep.).
António Poppe Lopes Cardoso (Indep.).
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles (Indep.).

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto, Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de. Carvalho Ganopa.
Fernando, Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho de Silva Ramos.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Lopes Ferreira Casal.
José Luís Correia de Azevedo.
José Maria Vieira Dias de Carvalho.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
José Torcato Dias Ferreira
Maria Cristina Albuquerque.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Rui José dos Santos, Silva.
Tiago Lameiro Rodrigues Bastos
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva..
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa
Carlos Manafaia.

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Cláudio José Santos Percheiro..
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Maria Amélia Mota Santos (Indep.).

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Francisco Manuel Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Fernando Silva Monteiro.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

O Sr. Presidente: - A ordem de trabalhos de hoje é a posse do Presidente da República eleito perante a Assembleia da República, nos termos dos artigos 130.º da Constituição e 262.º e seguintes do Regimento.
Como eu, bem como os membros da Mesa e os Srs. Vice-Presidentes temos necessidade de receber as autoridades e S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, interrompo os trabalhos, que recomeçarão pelas 9 horas e 50 minutos.

Eram 9 horas e 2 minutos.

Às 10 horas entrou na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Sr. Presidente da República, general António dos Santos Ramalho Eanes, o Sr. Presidente da Assembleia da República, o Sr. Presidente da República eleito, Dr. Mário Alberto Nobre Lopes Soares, o Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, os Secretários da Mesa, a Secretária-Geral da Assembleia da República, o chefe, o adjunto e os secretários do Protocolo.
Na Sala encontravam-se já, especialmente convidados, além da comitiva do Presidente da República, os Ministros da República para os Açores e para a Madeira, os ministros, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, os Chefes dos Estados-Maiores dos três ramos das Forças Armadas, o presidente do Conselho Nacional do Plano, os Presidentes da Assembleia e do Governo Regional da Madeira, o Provedor de Justiça, os conselheiros de Estado, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o governador civil de Lisboa, os deputados, o procurador-geral da República, o secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, os presidentes do Supremo Tribunal Administrativo, do Tribunal de Contas e do Supremo Tribunal Militar, o comandante naval do continente e os comandantes-gerais da Guarda Nacional Republicana, da Guarda Fiscal e da Policia de Segurança Pública.
Encontravam-se ainda presentes: nas tribunas A e B, os chefes das delegações estrangeiras convidados; na galeria I, o corpo diplomático; na galeria II, as altas individualidades estrangeiras convidadas e respectivas comitivas; em parte da galeria II, os secretários de Estado; nas tribunas C e D e em parte da galeria II, os representantes dos órgãos de comunicação social; e nas galerias IV, V e VI os demais convidados.
Na Sala do Senado, assistindo à cerimónia pela televisão, encontravam-se muitos outros convidados.
Formou-se então a Mesa com o Sr. Presidente da República à direita e o Sr. Presidente da República eleito à esquerda do Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 10 horas.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai proceder à leitura da acta da reunião da assembleia de apuramento geral da eleição do Presidente da República.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes) procedeu à leitura da acta, do seguinte teor:

Acta da reunião da assembleia de apuramento geral da eleição do Presidente da República

2.º sufrágio

No dia 24 de Fevereiro de 1986, pelas 9 horas, nesta cidade de Lisboa e no Tribunal Constitucional, reuniu a assembleia de apuramento geral da eleição do Presidente da República, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 105.º a 110. º do Decreto-Lei n. º 319-A/76, de 3 de Maio, aplicáveis por força do disposto no artigo 113.º do mesmo diploma, sob a presidência do conselheiro presidente Armando Manuel de Almeida Marques Guedes. com os conselheiros Mário de Brito e Mário Augusto Fernandes Afonso, os licenciados Maria Salomé Alves do Rosário Lucas, Maria João Azevedo Fernandes Mendonça Santos e Vasco Manuel Azevedo Coutinho, professores de Matemática, e comigo, António Joaquim Baginha Miranda, secretário.

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Aberta a reunião, iniciaram-se as operações de apuramento com a análise das actas respeitantes aos distritos de Aveiro, Beja, Bragança, Castelo Branco; Coimbra, Évora, Faro, Guarda, Leiria, Lisboa, Portalegre, Santarém, Setúbal, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu, Região Autónoma da Madeira e território de Macau; - e apenas estas, porque ainda não foram recebidas todas as actas respeitantes aos distritos de Braga e Porto e à Região Autónoma dos Açores. Interrompidos os trabalhos cerca das 13 horas, foi designado para a continuação desta assembleia o dia de amanhã, pelas 17 horas, solicitando-se, entretanto, telefonicamente, a remessa urgente das actas em falta.
No dia 25 de Fevereiro de 1986, pelas 17 horas, com a mesma composição, prosseguiu a assembleia os trabalhos de apuramento geral da eleição do Presidente da República, passando a fazer a análise das actas respeitantes aos distritos de Braga e Porto e à Região Autónoma dos Açores, que nesta data foram recebidas.
Iniciadas as necessárias operações, verificou-se, quanto à 2ª assembleia distrital do circulo eleitoral do Porto, que na determinação do número total de votos a favor do candidato Freitas do Amaral se deu um erro material de menos
10 000 unidades. Feita a rectificação, o número total de votos obtidos pelo candidato Freitas do Amaral nos concelhos de Gondomar, Matosinhos e Vila Nova de Gaia, indicado na respectiva acta como sendo de. 115 779, passou a ser de
125 779. Concluídas as operações de contagem, apuraram-se, nos termos do disposto no artigo 108.º do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de Maio, os seguintes resultados:

Número total de eleitores inscritos no círculo eleitoral - 7 612 733;
Número total de votantes no círculo eleitoral - 5 937 100;
Número total de votos obtidos pelo candidato Diogo Pinto de Freitas do Amaral
2 872 064;
Número total de votos obtidos pelo candidato Mário Alberto Nobre Lopes Soares
3 010 756;
Número total de votos em branco - 20 436;
Número total de votos nulos - 33 844.

A reunião foi interrompida cerca das 18 horas.
No dia 26 de Fevereiro de 1986, pelas 12 horas, com a mesma composição, reuniu novamente esta assembleia na sala de actos do Tribunal Constitucional e pelo Sr. Presidente foram proclamados os resultados do apuramento geral, tendo sido considerado eleito, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 319-Ai76, de 3 de Maio, o cidadão Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Para constar se lavrou esta acta, que depois de lida vai ser devidamente assinada;

Armando M. Marques Guedes - Mário de Brito - Mário Afonso - Maria Salomé Alves do Rosário Lucas - Maria João de Azevedo Fernandes Mendonça Santos--- Vasco Manuel de Azevedo Coutinho - António Joaquim Baginha Miranda.

O Sr. Presidente: - Seguidamente, S. Ex.ª o Sr. Presidente da República eleito prestará a declaração de compromisso a que se refere o artigo 130.º,n.º 3, da Constituição e subscreverá comigo o auto da sua posse.

De pé, o Sr. Presidente da República eleito prestou juramento sobre o original da Constituição, lendo a fórmula constitucional, do seguinte teor:

Juro, por minha honra, desempenhar fielmente as funções em que fico investido e defender e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa.

Após a prestação do compromisso do Sr. Presidente da República eleito, a Banda da Guarda Nacional Republicana, colocada junto aos Passos Perdidos, executou o Hino Nacional.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai ler o auto de posse.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes) procedeu à leitura do auto de posse, do seguinte teor:

Auto de posse

Aos 9 dias do mês de Março de 1986, perante o Plenário da Assembleia da República, para o efeito reunido na Sala das Sessões do Palácio de S. Bento, tomou solenemente posse o Presidente da, República Portuguesa eleito em 16 de Fevereiro de 1986, Sr. Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Depois de lida pelo secretário da Mesa a acta da assembleia de apuramento geral da eleição do Presidente da República, S. Ex.ª o Sr. Mário Alberto Nobre Lopes Soares prestou juramento solene pela forma prescrita no n.º 3 do artigo 130.1 da Constituição Portuguesa.
Para constar se lavrou o presente auto de posse, que vai ser assinado por SS. Ex.as o Presidente da República eleito e o Presidente da Assembleia da República.

O Presidente da República, MÁRIO ALBERTO NOBRE LOPES SOARES. - O Presidente da Assembleia da República, Fernando Monteiro do Amaral.

Em seguida, o Sr. Presidente da República e o Sr. Presidente da Assembleia da República assinaram o auto de posse, após o que o Sr. Presidente da Assembleia da República acompanhou ao centro do hemiciclo o Sr. Presidente da República cessante, apresentando-lhe os seus cumprimentos.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente da Assembleia da República retomou o seu lugar na Mesa, convidando o Sr. Presidente da República a tomar assento à sua direita.

Aplausos gerais, de pé.

Finalmente, usou da palavra o Sr. Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Sr. Presidente da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Membros do Governo, Srs. Conselheiros de Estado, ilustres convi-

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dados, minhas senhoras e meus senhores, Srs. Deputados: Foi com enorme receio e profunda emoção que me submeti ao impulso de escrever o que agora vos transmito.
Receio, porque, surpreendendo a grandeza deste momento, temia não poder subir ao topo das vossas exigências legítimas, das vossas expectativas, dos vossos desejos.
É que falar em nome do Parlamento é sentir a pesada responsabilidade de um querer colectivo, é assumir o pensamento de um povo, é realizar a convergência de todos quantos, pela sua confiança, depositaram no Presidente da Assembleia da República o mandato de uma representação geral.
Porém, a consciência da generosidade, do respeito e da cordialidade que me haveis dispensado durante o meu mandato foi esbatendo aquele receio para dar lugar à inefável sensação de que, estando entre os meus pares, tanto bastaria para que aquele se esfumasse.
Emoção profunda, dizia eu, Srs. Deputados, por estar participando num dos actos mais altos da minha curta experiência política. Da minha experiência política e da longa e admirável caminhada da nossa história parlamentar.
Estamos aqui reunidos, Srs. Deputados, para testemunhar um compromisso e consagrar uma investidura.
Neste hemiciclo, onde a vontade do povo se faz lei, quiseram os constituintes servir a Assembleia da República com uma prerrogativa que significasse o mais subido sentido de solidariedade institucional que deve estar presente aos órgãos da soberania.
Nessa elaborada visão do entrosamento dos seus órgãos souberam conjugar, de forma feliz, a independência de cada um com o esforço convergente e necessário à unidade de Estado.
Por causa dela convocámos o Plenário.
Esta é a sua ordem do dia: simples, directa, precisa.
O Presidente eleito toma posse perante a Assembleia da República.
O acto é transcendente na sua simplicidade, grandioso pela força directa do seu conteúdo, precioso pela concisão do seu objecto.
Se um acto de posse é sempre uma tomada de compromissos, para quem a recebe e para quem a dá, ele tem um inexcedível significado se se trata da posse do Supremo Magistrado da Nação.
Ele é um acto cimeiro a culminar todo um processo eleitoral que constituiu uma admirável jornada de afirmação política, a garantir a democraticidade de um povo adulto, que legitimamente se pode rever na exemplar vivência das opções feitas, na seriedade e consciência com que afirmou a sua participação responsável e livre.
O diálogo aberto, a discussão acalorada ou a polémica por vezes acidulada fizeram larga sementeira de ideias, de propósitos, de projectos e até de sonhos.
Foi uma jornada de fé e de esperança, sem vencedores nem vencidos, porque todos se mostraram dignos de um debate concorrencial onde os primores do pensamento atingiram a transparência e a grandeza das aspirações do povo que somos.
O testemunho dado é uma vitória da liberdade, uma vitória de Portugal, uma vitória da República, uma consagração da democracia.
Por isso, é com sentida alegria, com profunda emoção, com os mais elevados sentimentos, que fazemos deste momento um dos mais altos e gratificantes da actividade parlamentar.
Na grandeza da nossa missão de deputados, penso que nenhum outro acto terá maior dignidade e nobreza do que o de testemunhar e receber o juramento que acabámos de ouvir.
Feito perante os eleitos do povo, feito perante nós, deputados de Portugal, é sentir a subida honra de participarmos, com a nossa presença, na construção do presente de olhos postos no futuro.
Estamos fazendo história, depositária da nossa originalidade e garantia incontestável da nossa identidade, partilhando do solene significado deste acto, para reforçar o ânimo e o entusiasmo para um trabalho cada vez mais fecundo e necessário.
É que a força trepidante das exigências do nosso tempo só cede perante quem generosa e confiadamente a ela se entrega com entusiasmo e com fé.
Somos, Srs. Deputados, a expressão viva de um órgão de soberania, sede do diálogo, da compreensão, da firmeza, do ajuste confiado de soluções pelo exercício democrático das faculdades e poderes que do povo recebemos.
A liberdade, expressa no direito à diferença, no direito à contestação e à crítica, no direito de opor e propor, tem aqui a sua sede por excelência.
A democracia, no ritual dos seus processos; na responsabilidade das suas afirmações, na riqueza dos seus intentos, tem aqui o fulcro dos seus propósitos. Aqui se luta, com galhardia, com entrega, com convicção, com seriedade e responsavelmente, por um futuro mais justo, mais fraterno, mais humano.
É por aquilo que somos, por aquilo que devemos fazer, por aquilo que representamos que a arquitectura constitucional concedeu à Assembleia da República o privilégio da participação que estamos vivendo.
Como representantes do Pais temos tarefas ingentes a realizar num trabalho que se não compadece com demoras ou adiamentos.
Trabalho que tem sido uma exigência que se procura com entusiasmo e entrega e não um fardo que se suporta.
Só nesse estado de espírito poderemos corresponder ao que de nós se espera.
Neste momento histórico a muitos títulos, a Nação Portuguesa tem os olhos postos nas instituições que realizam a força telúrica dos seus desejos 'de construir um país mais justo, mais progressivo, que conquiste e acompanhe o ritmo da Europa.
Não se nos perdoaria que não correspondessemos de pronto e a cada momento ao império dessa vontade colectiva que o povo vem manifestando e que nós sentimos como um apelo instante, profundo, permanente, inalienável.
Sejamos, pois, dignos deste povo, pelas responsabilidades que assumimos, para que, pelo trabalho, nos coloquemos nos espaços da recuperação necessária e urgente, preferindo o dever à conveniência, a justiça à popularidade, o direito ao favor.
Parafraseando um grande pensador da humanidade, sinto-me autorizado a dizer que somos um povo que «obedece mas não serve; respeita os chefes mas não aceita senhores; obedece às leis, mas só obedece às leis e é pela força das leis que não obedece aos homens».
E porque é um povo que tem arreigada e fortalecida esta consciência ele não poupará a sua censura, a sua condenação, a quem não dê testemunho desse trabalho na reconstrução esperada.

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A obra é empolgante, exigentes são as metas e o tempo urge.
O momento é propício, os ventos estão de feição. Lancemo-nos, confiadamente, a essa tarefa, num esforço solidário à realização dessa nova gesta.
Tenho a certeza, a convicção plena, de que o vamos conseguir.
Ao traçar a sua rota estamos assinalando-a, aqui e agora, com um novo padrão de coragem, de determinação e de fé no futuro, que desejamos.
Temos rompido no tempo com alguma dificuldade, vencendo procelas, escolhos e ventos contrários.
Mas temo-lo feito com uma vontade indomável de vencer, de realizar, de cumprir esse destino.
O 25 de Abril nasceu com a força e a audácia de um destino irrenunciável que tem de ser cumprido.
Os militares de Abril, na expressão autêntica da vontade colectiva que tão bem souberam assumir, haverão de ver realizado, concretizado, defendido e animado o sonho que os motivou, o projecto que os justificou, as certezas que movimentaram.
Tem sido difícil a caminhada mas os vencimentos feitos autorizam-nos à confiança. Os méritos conseguidos, dão-nos direito à esperança numa política cada vez mais audaciosa, com rupturas mais espectaculares, com mudanças mais profundas, num realismo mais exacto.
Nessa caminhada auspiciosa, muitas têm sido as lutas, as discussões, os diálogos, as mensagens, as armadilhas, as polémicas na formação e gestação de um pensamento novo, de uma nova consciência, de um novo relacionamento, de uma nova maneira de estar no mundo.
Sair do fosso em que vegetámos por muitos e dilatados anos é tarefa ingente mas aliciante, a realizar em cada momento, em todos os dias, com firmeza, com dedicação, com honestidade, com coragem.
O povo português, os políticos e responsáveis, do nosso tempo, que têm vivido a angústia de cada momento, na formação de tal pensamento, no desenvolvimento da nossa cultura, não esquecerão o homem que teve de suportar a procela das contradições, a euforia incontrolada dos momentos da vitória ou a decepção amarga de muitas vicissitudes, no processo de formação política de Portugal, para ser, ponto de referência da serenidade, da compreensão, da firmeza, numa diligência atenta às emulsões necessárias de uma gestação social, impetuosa porque revolucionária, revolucionária porque urgente e necessária.
O Presidente cessante, Sr. General Ramalho, Eanes, neste período difícil da nossa história, onde a grandeza foi tantas vezes mesclada pelo atropelo e a violência, soube manter, de forma ajustada, o equilíbrio das forças democráticas.
É sempre fácil escolher entre extremos. A opção é demasiado simplista.
Mas manter o equilíbrio das tensões, num trabalho consequente e eficaz, manter-se acima das salutares paixões políticas, para ajustar soluções e obter a justiça de compromissos,, é a suprema e difícil função dos governantes e, muito especialmente, a pesada responsabilidade do Presidente da República.
Dela se desempenhou, por entre louvores e criticas acerbas, por entre aplausos e censuras, com tal serenidade e firmeza, com tal isenção e independência; com tal dignidade que não desejo perder esta oportunidade solene para manifestar a V. Ex.ª, Sr. General Ramalho Eanes, o meu reconhecimento.
O equilíbrio e a moderação manifestados prestigiaram as instituições democráticas, asseguraram a estabilidade política possível, garantiram a liberdade dos Portugueses.
Tive com V. Ex.ª, Sr. General Ramalho Eanes, vários contactos, por exigência da função, e troca de impressões que ultrapassaram, muitas vezes, o frio rigor dos parâmetros ditados pela «solidariedade institucional». Eles habilitaram-me à formulação do juízo de que estava na presença de um homem honesto, que, como diria Bernanos, «se dá ou se recusa, mas que nunca se empresta». Esta a homenagem que devo a V. Ex.ª e que aqui lhe deixo expressa.
Srs. Deputados: se é certo, como dizia um poeta, que «nem sempre se entende este povo sem noite que em cada crepúsculo vê uma madrugada» de esperança, não, é menos verdade, dizemos nós, que são essas madrugadas que fabricam a intrepidez e a audácia de ultrapassar os riscos ou os temores para correr à aventura, num desejo incontido de afirmar a nossa irrequietude, a nossa insubmissão para, em cada dia, irmos mais longe na garantia da nossa soberania, da nossa independência, da nossa identidade.
Estamos em nova madrugada que Garrett, Oliveira Martins, Sacramento Monteiro e tantos outros há muito haviam pensado.
Dela se fez projecto para integrar o ideal da nossa geração, como uma necessidade económica, uma exigência política, um imperativo de ordem histórica, geográfica e cultural.
No fluxo indomável da história retornamos às origens. Estamos na Europa para, pela força dos sentimentos e da inteligência que cimentam as comunidades, darmos e recebermos, num esforço comum e solidário, os contributos que façam dela uma vivência, mais livre, mais democrática, mais justa, mais equilibrada, na paz, na tranquilidade e na segurança do mundo.
Para nós será ainda uma opção histórica que se repercutirá profundamente nas estruturas económicas, sociais e políticas da vida dos Portugueses.
Esta Europa aliciante, «centro da humanidade pensante e actuante», «pátria da discórdia criadora», será espaço sedutor para desenvolver as nossas virtualidades, a nossa imaginação, a nossa criatividade, o nosso trabalho.
Penso que não será uma aposta nem sequer um desafio... É a fatalidade apetecida de um desejo feito projecto que corresponde ao apelo do «espírito europeu».
Na órbita deste nos fizemos portugueses.
Há séculos, andámos pelo Oriente e lá deixámos um padroado que é expressão daquele espírito, daquela cultura; rumámos às Américas e lá deixámos a expressão mais viva e portentosa da nossa lusitanidade que também foi consagração dessa cultura; andámos pela África, e por lá fizemos sementeira promissora do espírito europeu.
Cruzámos o mundo, como nação de corações por ele repartida, para deixarmos as primícias desse espírito europeu, dessa cultura.
Através dela, a Europa, a humanidade tomou consciência de si própria, das suas capacidades, das suas limitações. E prossegue, cada dia, com mais vigor, com mais vontade, em busca da felicidade e da verdade, desfazendo de dia a teia que teceu de noite para, com novos fios e mais fortes, construir a paz na liberdade, na justiça.

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É toda esta ambiência de projecto nacional que nos leva a viver emocionadamente este momento.
É que, na construção daquele destino, está o homem que hoje vitoriamos.
É tão grande, tão transcendente o que ora sentimos e vivemos, que pensamos que não haverá um só português que não experimente o perpassar do frémito da esperança, carregada de desejos de um futuro melhor.
Tão grande, tão transcendente, que não poderíamos contê-lo tão-só no que somos.
Por isso vieram até nós ilustres representantes de outros Estados a quem nos ligam a amizade, o respeito e a admiração.
Por isso temos connosco intelectuais, pensadores, artistas, jornalistas, políticos, de primeira linha, que, pelas formas próprias, se isolaram da massa dos homens comuns para, caminhando à frente, por cima e ao lado daquela, apontarem horizontes, analisarem passados, interpretarem, reformularem e construírem o futuro da humanidade.
O que dizem, o que fazem, o que pensam são também nosso património de cultura.
Revejo na vossa presença o delicado sentido da vossa solidariedade com o povo português, que nesta data, está escrevendo uma das suas páginas mais importantes.
Mas se é solidariedade, também é admiração e respeito pelo que somos e estímulo encorajante para prosseguirmos o projecto encetado.
Pelo que sois, pelo que representais, pelo que fazeis, pelo que fareis, pelo calor e carinho da vossa presença, eu vos saúdo e agradeço.
Srs. Deputados, este será mais um dos momentos decisivos do nosso percurso de séculos, aureolados pelos fulgores da glória de heróis, de mártires, de sábios, de santos.
No centro das nossas atenções, dos nossos desvelos, das nossas esperanças, dos nossos compromissos, está um homem com quem tive o privilégio de trabalhar, de conviver, de conhecer.
Quem há que o não conheça em Portugal e no mundo entre os políticos mais responsáveis e os pensadores mais atentos à evolução e transformação sociais da humanidade?
Ele aqui está, entre nós, porventura no acto mais responsável da sua vida de cidadão, de pensador, de político, de português.
Não será mais possível pensar a história, pensar a Revolução de Abril, reflectir sobre o ideário político e social das últimas décadas sem ter presente a figura de Mário Soares.
O jovem ardente que, tomado pelos ideais de liberdade, agitou ideias, mobilizou vontades, rasgou caminhos, destruiu barreiras.
Por causa deles foi perseguido, pagou o tributo injusto da prisão, do desterro, do exílio.
Pela liberdade asfixiou emoções, suportou o peso esmagador de silêncios, travou sofridamente as comoções do desânimo e tantas vezes terá afivelado o rito do conformismo para poupar à esposa e aos filhos o desespero chorado da angústia da separação forçada.
Da ardência dessa juventude onde a doação e a entrega caldearam e fortaleceram convicções seguras surge o político, construtor de ideias, animador de projectos, mobilizador de vontades.
Num discurso, ora arrebatado ora sereno, ora exuberante e forte, ora moderado e reflexivo, foi ganhando a estatura do político de primeira fibra.
Arrastou multidões, fez adeptos, ganhou amigos. Por multidões foi contestado, combatido, negado e suscitou adversários animosos.
Mas por entre o fragor das lutas políticas, dos seus êxitos e dos seus fracassos, sempre ressurge a sua figura indomável de lutador incansável, disposto a prosseguir com firmeza, com determinação, com coragem renovadas.
Foi autor de artigos e escreveu livros. Penso, porém, que o seu livro mais belo, o seu único livro, é a sua própria vida, como testemunho eloquente e vivo de quanto ela vale quando posta ao serviço da liberdade.
Seu defensor impenitente, paladino dos direitos do homem e da justiça, ganhou o respeito e a admiração "dos Portugueses e o reconhecimento dos políticos grandes que, noutros espaços e latitudes, prestam homenagem aos méritos da coragem, da determinação, da audácia dos que põem em jogo, sem cálculo, os seus interesses e a própria vida, ao serviço da grande causa: a liberdade, a democracia, a justiça.
Vida exuberante, a sua, esmaltada de ricos contrastes, onde o lutador fogoso se conjuga com a cândida e descontraída bonomia; onde a firmeza obstinada se entrosa com um natural pendor conciliatório e dialogante; onde a visão austera do Estado se desfaz perante a simpatia de um convívio fácil; onde a consciente responsabilidade do interesse nacional se aquece ao calor de uma afectividade sem preconceitos.
Srs. Deputados, Srs. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Srs. Convidados: É este português, que outros retratariam melhor, que o povo escolheu para Presidente da República de Portugal.
Ao testemunharmos a sua posse estamos processando um virar de página e de tal modo que, valendo-me de Garrett, com ele poderei dizer: «A sociedade já não é o que foi; não pode tornar a ser o que era; mas, muito menos ainda, poderá ser o que é.»
Com V. Ex.ª Sr. Presidente da República, vamos prosseguir em nova caminhada, com renovado alento, já que novos horizontes nos esperam.
Fazemo-la sob a bandeira que tão acrisoladamente teceu: Unir os Portugueses; servir Portugal.
Por isso aqui estamos, Sr. Presidente da República, para, em nome próprio e no desta Assembleia da República, vos saudar efusivamente e vos desejar todas as felicidades, que o mesmo será dizer: servir Portugal.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Seguidamente, vai usar da palavra, por direito próprio,
S. Ex.ª o Sr. Presidente da República.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente de República: - Sr. Presidente da Assembleia da República, Exmos. Chefes de Estado, Primeiros-Ministros e Altos Representantes de Estados e Povos Amigos, Sr. Primeiro-Ministro, Membros do Governo e Altas Autoridades Portuguesas, Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores: Depois de ter jurado por minha honra «cumprir e fazer cumprir a Constituição», as minhas primeiras palavras são para saudar o povo português, garante da perenidade da Pátria - uma Pátria com mais de oito séculos de história e que representa uma cultura, uma forma peculiar de estar no mundo e uma língua hoje falada por cerca de 150 milhões de seres humanos. É aos Portu-

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gueses, a todos os Portugueses, sem esquecermos emigrantes espalhados pelo vasto mundo, e que com o seu trabalho honram Portugal, que exprimo o compromisso do meu empenhamento e da minha solidariedade.
Fui eleito pelos Portugueses para desempenhar o alto cargo de Presidente da República nos próximos cinco anos, que considero decisivos para assegurar um futuro de desenvolvimento a Portugal, no quadro da Comunidade Europeia, a que agora pertencemos por direito. Findo o período de transição para a democracia plena, sou o primeiro Presidente civil eleito, directamente, pôr sufrágio popular.

Aplausos gerais, de pé.

É uma escolha que me honra e que me responsabiliza.
Tudo farei para estar à altura da responsabilidade histórica que me foi confiada pêlo voto livro dós Portugueses. Com isenção e independência, ao serviço, tão-só de Portugal e do que Portugal representa no mundo.
Sou um homem de convicções e de fidelidade. É com humildade que lhe agradeço, Sr. Presidente da Assembleia da República, as generosas palavras de confiança e de apreço que me dirigiu, com a autoridade democrática e o talento que lhe são unanimemente reconhecidos. Foi com igual humildade e com o sentido pesado das responsabilidades que assumi, perante os Srs. Deputados, legítimos representantes do povo português, o meu compromisso para com a Nação.
Sempre considerei - e considero - a Assembleia da República como o centro vital da democracia. Honro-me de ter sido parlamentar. Deputado às Constituintes, fui sucessivamente reeleito em todas as legislaturas. Nos últimos dez anos vivi momentos históricos, exaltantes, neste hemiciclo, de que guardo indelével recordação.
Num regime pluralista e pluripartidário, como o nosso, o papel do Parlamento é primordial e insubstituível. É da eficácia da sua acção, no plano político e no plano legislativo, que em grande parte depende o regular funcionamento das instituições democráticas, de que sou, a partir de agora, constitucionalmente, garante.
A Assembleia da República pode contar com o meu respeito, com a minha solidariedade e com a minha cooperação. Estarei atento, como é meu dever, às indicações desta Casa, que todos os democratas têm o dever de prestigiar, e manterei com V. Ex.ª, Sr. Presidente da. Assembleia, e com todos os partidos aqui representados um diálogo atento e permanente.
Muito me honra, também, a presença, neste acto solene, de Chefes de Estado, de Primeiros-Ministros e de Altos Representantes de nações amigas com que Portugal mantém relações especiais. Desejo agradecer-lhes e saudá-los calorosamente.

Aplausos gerais.

A sua ilustre presença é um testemunho de solidariedade para com o povo português, que muito me sensibiliza. É mais uma prova de que Portugal saiu definitivamente do isolamento internacional, em que tantos anos viveu, e que é hoje, graças ao 25 de Abril, um país prestigiado e respeitado da comunidade internacional.

Aplausos gerais.

Há, no entanto, um lugar vazio nesta Sala que impede que o nosso regozijo seja completo. Esse lugar deveria ter sido ocupado por um grande estadista, por um humanista, defensor das causas nobres e generosas, um amigo sincero de Portugal. Refiro-me a Olof Palme. Um atentado brutal e absurdo - como todos os actos terroristas - roubou-lhe a vida. Curvo-me, respeitosamente, perante a sua memória. Foi. um homem de diálogo, de tolerância e de paz. Honro-me de ter sido seu amigo e companheiro de ideal durante quase três décadas.
O terrorismo representa hoje uma das principais ameaças ao desenvolvimento da democracia. Nos planos nacional e internacional. Por isso, as democracias têm de saber defender-se, pondo-se de acordo numa acção concertada e eficaz de luta contra o terrorismo, fruto amargo da violência, do fanatismo e da intolerância. Nas sociedades abertas a segurança é um bem tão precioso quanto a liberdade. O terrorismo, flagelo até há pouco desconhecido em Portugal, não pode ser hoje arredado, infelizmente, das nossas mais instantes preocupações. Tudo farei para que lhe seja dado um combate efectivo e sem tréguas.
O povo português, tradicionalmente pacífico e tolerante, elegeu-me porque confia na minha capacidade para unir os Portugueses, contribuindo assim para criar condições de convivência cívica e de colaboração responsável entre todos, ao redor de objectivos claros que nos são comuns. Essa vontade de promover um clima de concórdia nacional não exclui firmeza e exigência, no respeito pelas regras democráticas e pelas leis da República. Nesse aspecto, serei inflexível. Consciente do perigo que sucessivas crises representam para o regime, tenho defendido que a estabilidade política e a paz social são condições indispensáveis para o desenvolvimento e a modernização de Portugal. O desenvolvimento, com a verdadeira dimensão social - o que pressupõe correcções e aperfeiçoamentos do sistema político e económico -, é, com efeito, o grande desafio com que estamos confrontados, até ao fim do século, e que justifica o nosso empenhamento colectivo, com vontade de ganhar. É o desígnio capaz de unir os Portugueses nos próximos anos, congregando energias e boas vontades - a inteligência, a criatividade e o entusiasmo de muitos, e em especial dos jovens, para construir uma sociedade aberta, justa e de bem-estar, e lutar sem descanso contra a pobreza, a ignorância e a intolerância que ainda atingem, infelizmente, tantos portugueses.

Aplausos do PS.

Para tanto, exige-se a responsabilidade solidária e a cooperação leal dos órgãos de soberania, cabendo ao Presidente da República, pelas suas próprias funções, ser um factor essencial de estabilidade, o natural mediador dos consensos possíveis. Esse será o meu principal objectivo.
Conheço bem as dificuldades de governar e sei, portanto, medir a importância que tem, para a acção governativa, a compreensão e o estímulo do Presidente da República. Sempre considerei um erro opor maiorias que não devem ser, em termos de defesa do regime, oponíveis. Por isso afirmei, antes e após serem conhecidos os resultados eleitorais, que a maioria que me elegeu se esgotou no próprio acto da eleição. Para evitar ambiguidades. Considero assim ser meu dever trabalhar lealmente com os governos que tenham a confiança

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da Assembleia da República ou que por esta sejam viabilizados, quaisquer que forem. Asseguro pois ao actual Governo, embora minoritário, o meu apoio leal e a minha solidariedade, nos termos expressos.
Conheço e compreendo os problemas dos partidos, quer estejam no Governo quer na oposição. Os partidos são instituições essenciais à democracia - tão essenciais que sem eles não há democracia - e, por isso, é dever de todos os democratas prestigiá-los. Tendo renunciado a todos os cargos, direitos e deveres partidários, uma vez eleito Presidente da República - por os julgar incompatíveis com a função presidencial -, estou em condições de assegurar a todos os partidos, com imparcialidade, e designadamente aos que têm representação parlamentar, uma cooperação isenta e que tenha em conta tão-só o interesse nacional. Tal como a entendo, a função presidencial não deve ser interferida por projectos pessoais nem por egoísmos partidários, sejam de que natureza forem. Durante o meu mandato os Portugueses estão certos de que isso não acontecerá.
Vivi por dentro todas as crises políticas do regime e penso conhecer-lhes as razões e os mecanismos subtis. Sei o que custam ao País. Os Portugueses têm a garantia de que tudo farei para as evitar, poupando perdas de tempo irreparáveis e recursos que nos fazem falta e serão melhor aplicados numa estratégia nacional de desenvolvimento.
Disse-o aos Portugueses durante a campanha eleitoral e reafirmo-o hoje, com solenidade: serei o Presidente de todos os portugueses e não apenas daqueles que em mim votaram.
É nessa qualidade que desejo prestar uma homenagem sincera, neste momento e neste lugar, ao meu ilustre antecessor, o Presidente da República cessante, general Ramalho Eanes.

Aplausos gerais, de pé.

Conhecidas que são algumas divergências que pertencem agora ao passado, estou à vontade para enaltecer o papel que desempenhou o Presidente Eanes no processo político e militar complexo que conduziu à estabilidade democrática, ao longo dos seus dois mandatos.
Desejo igualmente saudar, com todo o respeito, os candidatos à Presidência da República que defrontei na primeira e na segunda volta das eleições presidenciais e o valioso contributo que deram para o esclarecimento democrático dos Portugueses.
Completa-se hoje um ciclo da vida portuguesa. Outro começa, em plenitude democrática, que gostaria fosse marcado pela confiança dos Portugueses em si próprios e nas potencialidades de desenvolvimento de Portugal. Podemos hoje olhar o futuro com esperança.
No passado próximo, vivemos crises difíceis, um processo político-social complexo e sinuoso, ultrapassámos dificuldades económicas e financeiras que pareciam invencíveis, sofremos frustrações e choques de diversa índole, alguns de grande gravidade. A tudo resistimos. E resistimos sem nunca pôr em causa os interesses nacionais essenciais e sabendo preservar e aprofundar as instituições democráticas pluralistas, nascidas com o 25 de Abril.
É o momento de prestar homenagem aos militares de Abril, sem a coragem e o patriotismo dos quais nada teria sido possível.

Aplausos gerais.

Não esqueceremos nunca o que lhes devemos. E é tempo, igualmente, de saudar a instituição militar - as Forças Armadas -, que, na sua hierarquia, profissionalismo, disciplina e lealdade democrática tem contribuído decisivamente para consolidar, por forma que representa um grande exemplo, o regime saído da vontade popular.

Aplausos gerais.

Às Forças Armadas, de que sou a partir de hoje, por inerência, o Comandante Supremo, incumbe, constitucionalmente, o importante papel da defesa militar da República. Dotá-las das condições necessárias ao cumprimento das suas missões, à sua modernização e reestruturação, é pois uma exigência nacional.
A segurança dos Portugueses e a absoluta garantia dos seus direitos e liberdades, bem como dos seus direitos e deveres económicos, sociais e culturais, são imperativos constitucionais do Estado democrático. Os tribunais são órgãos de soberania a quem incumbe, na administração da justiça, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados. Saúdo, respeitosamente, os magistrados portugueses, de todas as categorias, que são um pilar essencial na manutenção e aperfeiçoamento do Estado de direito.

Aplausos gerais.

Como garante da unidade do Estado, desejo saudar os órgãos próprios das regiões autónomas e assegurar-lhes uma leal e efectiva cooperação. A autonomia regional constitui uma das grandes realizações da nossa democracia, que importa prosseguir e desenvolver, visto que trouxe inúmeros benefícios às populações insulares.

Aplausos gerais.

É unanimemente admitido que o poder local constitui uma pujante realidade democrática. Por isso merece toda a minha solidariedade. Com efeito, as autarquias têm sido uma escola de democracia, possibilitando a participação e o empenhamento de milhares de cidadãos na vida da comunidade e em defesa dos interesses locais e regionais. Aprofundando a tradição municipalista, tão celebrada por Herculano. o poder local tem modificado, com as suas realizações, a própria estrutura de Portugal e trazido às populações melhoramentos sem paralelo na nossa história contemporânea.
Durante a campanha eleitoral assumi voluntariamente compromissos políticos e culturais, que desejo neste momento reiterar. Agirei no respeito escrupuloso das minhas competências, observando em relação aos outros órgãos de soberania a separação e interdependência estabelecidas na Constituição. Tudo farei para garantir a estabilidade política e institucional, de acordo com a responsabilidade que me foi conferida pelos Portugueses. É nesse quadro que considero ser meu dever tomar as iniciativas que entenda adequadas aos grandes objectivos nacionais. Sempre entendi que o Presidente deve acompanhar a acção governativa, mas não tem que se intrometer nas decisões de política corrente. O Presidente da República é portador de um desígnio nacional e compete-lhe, no âmbito dos seus poderes, ser um factor de orientação e de referência, em termos genéricos, que permita a realização progressiva daquele desígnio, com tempo, serenidade e moderação.

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Não hesito em identificar esse desígnio nacional, nesta nova fase da vida portuguesa, com a estratégia para o desenvolvimento, a reforma do Estado, a modernização da sociedade e a afirmação da vitalidade indesmentível da nossa cultura. São objectivos interligados que importa prosseguir sem perda de tempo, suscitando para tanto amplos consensos e fazendo apelo aos portugueses de boa vontade. É óbvio que há divisões, conflitos e contradições na sociedade portuguesa, que se exprimem livremente, como é próprio das sociedades abertas, e que se não podem ignorar. Mas longe de nos paralisarem devem estimular a nossa criatividade e capacidade de concertação, dado que em democracia os conflitos se dirimem pelo voto e pela aceitação da regra da alternância democrática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero endereçar à população de Macau a expressão da minha solidariedade e apreço. Tudo farei para lhe garantir as melhores condições de estabilidade, de progresso e de desenvolvimento.
Desejo também exprimir aqui a minha preocupação relativamente à situação de Timor Leste, que tem sido acompanhada por Portugal, nos últimos anos, com realismo e persistência, de harmonia com as regras do direito internacional. Nos termos da Constituição, Portugal continua, relativamente a Timor Leste, vinculado às responsabilidades que lhe incumbem. É na fidelidade a esses princípios e responsabilidades que continuaremos a afirmar e a lotar, na medida das nossas possibilidades, pelo direito imprescritível do povo de Timor Leste à autodeterminação e independência.

Aplausos gerais, de pé.

Neste momento solene e na presença tão honrosa de ilustres personalidades nacionais e estrangeiras, seja-me permitido endereçar, em nome de Portugal, as nossas saudações à comunidade internacional.

Aplausos gerais.

Portugal é hoje uma nação de paz e que luta, esforçadamente, pela paz no mundo. Fiel às suas alianças tradicionais, membro fundador da Aliança Atlântica e membro de pleno direito da CEE, Portugal não esquece os laços fraternos e de excepcional afectividade e solidariedade que o unem aos países irmãos de África de língua oficial portuguesa e à grande nação brasileira.

Aplausos gerais, de pé.

Não esquece, igualmente, a presença portuguesa que a história deixou repartida pelo mundo e que o trabalho dos nossos emigrantes, que efusivamente saúdo, rejuvenesce cada dia.

Aplausos gerais.

A fidelidade às nossas origens e o culto renovado da nossa identidade cultural são trunfos decisivos na batalha do futuro, em que estamos empenhados neste final do século. Ao Presidente da República competirá dar o seu patrocínio a acções que visem promover externa e internamente a cultura portuguesa e a voz da Pátria.
Queremos fazer de Portugal uma terra de gente livre e solidária. Uma terra de progresso, de prosperidade e de cultura. É um sonho que está ao nosso alcance realizar. Retomemos a esperança e ganhemos confiança no esforço próprio. Muito depende de nós. Saibamos despertar a iniciativa criadora de trabalhadores e empresários. Façamos confiança à inteligência portuguesa aos nossos professores, cientistas, técnicos, escritores, artistas. Demos à juventude condições para construir, pelas próprias mãos, o futuro que lhe pertence. Sejamos, sobretudo, solidários com os mais pobres e os mais carecidos - os idosos, os doentes, os deficientes. Com eles está a preocupação permanente e a solidariedade activa do Presidente da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta hora de responsabilidade e de alegria, nesta sala de tantas e tão antigas tradições liberais, na presença dos nossos convidados, seja-me permitido reafirmar o meu compromisso nacional: unir os portugueses, servir Portugal.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores, está encerrada a sessão.
Neste momento, a Banda da Guarda Nacional Republicana executou de novo o Hino Nacional.

Eram 11 horas e 20 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alfredo José Somera Simões Barroso.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

João Barros Madeira.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Luís Manuel Loureiro Roque.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
Hernâni Torres Moutinho.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
António José Borges de Carvalho (Indep.).

PREÇO DESTE NÚMERO 35$00

Depósito legal n. 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

PORTE PAGO
PREÇO DESTE NÚMERO 35$00

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