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2476 I SÉRIE-NÚMERO 74

filantrópica a capitalização da dívida convertida em direitos sobre os activos patrimoniais. Por outras palavras, o leilão das empresas nacionais serve hoje em muitos países para pagar a dívida externa.
Na década de 80, cresceu o clamor em prol de uma nova ordem económica internacional que, embora sem eliminar o intransponível abismo existente entre os países industrializados e os não desenvolvidos, reduzisse as desigualdades, atenuando-as através de um intercâmbio menos espoliativo.
A favor dessa estratégia de gradual redução do processo exploratório estava e está a esmagadora maioria da humanidade. Novos obstáculos entretanto surgiram, dificultando a tentativa da sua implementação. Nesta Primavera do ano de 1991, quando já não explodem bombas no Golfo, quase não se ouve falar mais da nova ordem económica internacional.
Agora, alude-se sobretudo ao projecto da nova ordem internacional, ideado e defendido pelo presidente George Bush. A componente económica que deveria contribuir decisivamente para a humanização da vida de milhares de milhões de pessoas foi retirada da fórmula. A ordem internacional ambicionada pela Casa Branca apresenta os contornos de uma ordem imperial. Por isso mesmo, desponta como projecto vocacionado para o malogro. A sua essência carrega a negação do objectivo enunciado. Não pode merecer o consenso da humanidade uma ordem internacional caracterizada pela hegemonia de uma potência que se propõe a cumprir o papel de polícia do Planeta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cooperação não é, não deve ser entendida como forma de caridade. Não justifica, também o nome, se assentar numa política de ganância ou de propaganda.
O facto, inocultável, de Portugal ser também um país dependente, de economia frágil, constitui por si só um factor de diferenciação impeditivo de veleidades hegemónicas no tocante à cooperação com Estados do Terceiro Mundo, nos moldes em que ela é praticada pelas grandes potências ocidentais. Isso não significa que Portugal não esteja em condições de desempenhar um importante papel - facilitado pela sua condição de membro da CEE - na cooperação internacional, nomeadamente no que diz respeito aos PALOP. Seja qual for o Governo em qualquer dos Cinco, podemos e devemos reforçar as nossas relações com esses Estados. Caminhámos juntos durante cinco séculos. O esforço para embelezar ou enegrecer esse tempo é igualmente absurdo e vão. Houve nesse meio milénio luz e sombra. A história não muda quando tentam apagar-lhe o curso para a reescrever.
O colonialismo marcou um período da evolução da humanidade e os Portugueses não foram nele a excepção absoluta como alguns saudosistas continuam a sustentar. Mas, no relacionamento existente com os povos dos PALOP, abrem-se novas possibilidades à emergência do que de mais permanente e significante, uns e outros, Portugueses e Africanos, soubemos forjar.
A melhor maneira de conquistarmos a estima e confiança desses povos e de as mantermos pelo tempo adiante será a aplicação coerente e firme de princípios correctos nas acções de cooperação desenvolvidas por Portugal como Estado membro da CEE.
Até agora não o temos feito, como seria desejável e possível.
Durante anos, a política africana de sucessivos governos foi assinalada por atitudes equívocas que desceram, com frequência, à cumplicidade com o Governo da África do Sul, no auge do apartheid.
Não foi, aliás, por má consciência assumida que os doze países da CEE acabaram, no final da década de 80, por aprovar as sanções contra Pretória, contribuindo para o isolamento do Estado racista sul-africano. O distanciamento não resultou de um impulso ético.
Nestes dias, em que a proximidade da assinatura de um acordo de paz em Angola, cuja importância temos salientado e continuaremos a salientar, serve de pretexto ao Governo e ao PSD para um aproveitamento partidário e eleitoral do tema, penso ser oportuno recordar que a mudança da situação global na África Austral somente se tomou possível porque o Governo de Angola, tão insultado e caluniado, e o seu partido, o MPLA, que levou o povo à independência, estiveram nas circunstâncias mais difíceis à altura dos desafios da história.
Se a Namíbia se tomou um Estado independente, se o presidente Frederik de Klerk pôde dar, embora timidamente, início ao processo de desmantelamento do odioso regime do apartheid, se forem criadas as condições que permitiram a libertação de Nelson Mandela, se pudemos festejar esses acontecimentos, foi porque, numa hora entre todas decisiva, a agressão militar sul-africana foi contida na planura de Cuito Cuanavale.
Os historiadores do amanhã registarão que a África do Sul se sentou à mesa das negociações somente quando compreendeu que não podia impor a Angola uma solução militar. Cuito Cuanavale ficará na história como acontecimento de viragem, comparável à batalha de Ain Jalut que no século XIII fechou as portas de África à invasão dos Mongóis.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A cooperação não se limita, todos o sabemos, ao terreno da economia. Para um país como o nosso, cuja língua é falada por 180 milhões de pessoas em enormes espaços descontínuos, que cultura assume, na aventura humanista da cooperação, uma importância prioritária.
Que temos feito, pergunto, para responder positivamente a esse fascinante desafio do diálogo cultural? Que temos feito no aproveitamento da arma da linguagem para chegarmos a uma aproximação e a um entendimento mais profundo e multiforme com a gente que contempla a terra em português?
Pouco, quase nada. É pena porque a língua, falada e escrita, é para cada povo o caminho da descoberta da vida, o instrumento maravilhoso que lhe permite olhar, sentir, pensar, o mundo circundante.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - As nossas relações com o Brasil não saíram até agora do pântano de uma hibernação identificável no discurso oficial das pompas e do formalismo estéril, recheado de solenes promessas de mudança.
No tocante às comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, o panorama é igualmente desolador. Três a quatro milhões de emigrantes portugueses são cortejados pelo poder porque constituem fonte de divisas imprescindível ao equilíbrio da balança de transacções correntes, mas, na prática, quando lhes apreciam e discutem direitos e reivindicações, recebem o tratamento de cidadãos de 2.ª classe.
A responsabilidade por esse estado de coisas não é somente do actual governo. Vem de muito longe. Portugal não elaborou uma estratégia de cooperação. Não dispomos, nunca dispusemos, de uma política de cooperação autêntica, planificada. Não temos, sequer, uma política de cooperação para médicos, para professores, digna desse nome.

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