O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1 DE JULHO DE 1992 2671

Em segundo lugar, e em função deste conceito anterior, o projecto de lei do PS assenta ainda num conceito de arquivo que corresponda às novas realidades dos séculos XX e XXI, época de crescimento exponencial de material arquivístico, caracterizada ainda pelo aparecimento das novas tecnologias (disco óptico, banda magnética, microfilme).
Ou seja: enquanto o Governo parece preocupar-se essencialmente com códices, documentos medievais de diversos tipos ou registos paroquiais, no essencial salvaguardados, em melhores ou piores condições, pelos diversos arquivos públicos ou pelas universidades, sem menosprezar a importância destes documentos, o PS preocupa-se também e muito particularmente com as centenas de quilómetros de materiais espalhados em sótãos e caves de ministérios, direcções-gerais, hospitais, escolas, repartições de finanças, governos civis, empresas públicas e privadas, particulares.
A título de exemplo, poderemos apontar que só na Área Metropolitana de Lisboa o ex-Instituto Português de Arquivos recenseou, para cerca de 12 direcções-gerais, perto de 100 km de documentos e fez uma estimativa da existência de mais de 600 km de documentação só nesta área geográfica. Quantos milhares de quilómetros não existirão, pois, nos demais distritos do País?
Precisando melhor, diria que para o PS um arquivo não é um conjunto de documentos avulsos, mas um sistema significante, cuja organização, as suas inter-relações e interdependências e o habitus arquivístico constituem por si mesmos uma excepcional fonte de informação para a história institucional, para a determinação de modelos burocráticos e para a definição do desenho funcional e orgânico das instituições, necessária, inclusive, à sua modernização. 15to independentemente dos conteúdos informativos dos documentos.
Finalmente, e como terceiro elemento informador do nosso projecto de lei, referirei o conceito de rede com o qual o Sr. Secretário de Estado parece não estar de acordo no sentido mais aberto e plural possível, isto é, uma rede consubstanciada em adesões voluntárias e participantes, que não seja uma consequência da intimação estadual governamental mas, sim, o resultado de contrapartidas técnicas e culturais e de incentivos económicos. Trata-se, pois, de um conceito de rede que assenta, sobretudo, no princípio da democratização da informação contida no material arquivístico e não num processo puramente administrativo.
Partindo ainda do pressuposto de que se trata de matéria de interesse nacional, sobre a qual há que estabelecer uma vasta discussão e um vasto consenso, promovemos em torno do nosso projecto de lei um debate bastante participado com especialistas e técnicos, ao mesmo tempo que levámos a cabo a distribuição do nosso diploma pelos diversos arquivos públicos e por várias personalidades interessadas, que corresponderam com interesse e até com contributos críticos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em flagrante contraste com estas preocupações e com esta metodologia, que faz o Governo? Envia a esta Assembleia uma proposta de lei de autorização legislativa, numa linha- importa dizer de menosprezo do Governo por esta Câmara e pela dignidade da sua função legislativa.
Mas o Governo, com este comportamento, não só parece ignorar, com arrogância, o trabalho consubstanciado no nosso projecto de lei- susceptível, claro está, de melhorias e correcções como também manifesta ter, pelos vistos, "arquivado" - seja-nos permitida a ironia- o diploma que entretanto havia sido elaborado pelas equipas que integraram o extinto Instituto Português de Arquivos.
Com efeito, é do domínio público que há um projecto de diploma de bases dos arquivos, da responsabilidade essencialmente do Professor José Mattoso, aprovado pelo conselho consultivo do IPA e entregue, em Dezembro de 1989, à então Secretária de Estado da Cultura Diploma este que, na sequência de várias circunstâncias, foi reformulado pelo mesmo conselho e pelo sucessor do Professor Mattoso na presidência do IPA, o Professor Aires Augusto Nascimento, dando origem a uma segunda versão, já entregue, há mais de um ano, ao actual Secretário de Estado da Cultura.
Deste modo se verifica que, pelos vistos, o Governo desvaloriza o trabalho legislativo emanado desta Câmara e menospreza o que é produzido pelos próprios organismos especializados que integram a Secretaria de Estado da Cultura e pelos responsáveis nomeados para tais tarefas, preferindo resguardar-se e ocultar-se por detrás de um pedido de autorização legislativa.
Estes factos, porém, não devem constituir razão de espanto nem de admiração. Tudo há a esperar deste governo em matéria de cultura. Tudo isto se integra, afinal, numa filosofia geral que explica ainda decisões como aquela, aqui já noutros momentos criticada, de extinção do Instituto Português de Arquivos, com a consequente desagregação de uma equipa competente e a aniquilação de um trabalho positivo que começava a dar os seus primeiros frutos. Instituto esse entretanto amalgamado numa entidade imaginosamente chamada Arquivos Nacionais/Torre do Tombo.
É-nos permitido concluir que o Governo só aparentemente, na retórica de circunstância, se ocupa da tão falas a identidade nacional e da sua salvaguarda e que, por conseguinte, não está nada preocupado com os arquivos dos séculos XX e XXI. Possivelmente, talvez até só se interesse, de facto, pelos registos paroquiais donde seja possível aferir a árvore genealógica de alguns dos seus insignes membros e, em última instância, decerto só verdadeiramente o motiva o que se passou, se tem passado ou venha a passar no horizonte temporal da sua vigência e daquele que o separa das próximas eleições.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.

O Sr. Carlos Lélis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Marques, estou inteiramente de acordo consigo quanto às suas considerações sobre a memória e a identidade nacionais e sobre o sentido de responsabilidade que faz o PS aqui trazer o seu projecto de lei.
É verdade que o projecto de lei apresentado pelo PS precedeu a entrada na Mesa da Assembleia da República do pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo. Não ignoremos nem iludamos os factos! Seria desequilibrada a participação do Governo se este não tivesse feito acompanhar a sua autorização legislativa da entrega, em data muito recente, ainda ontem, de um texto de suporte de todo o desenvolvimento previsto e "cabimentado" na autorização legislativa.
O que gostaria de dizer-lhe, Sr. Deputado, é que me parece que chegar antes foi o caso do seu diploma-

Páginas Relacionadas